A educação escolar das comunidades tradicionais de Paraty
A educação escolar das comunidades tradicionais de Paraty
Um balanço de 2 anos do Plano Municipal de Educação (2015-‐2017)
Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada
Fórum de Comunidades Tradicionais Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba
Falar em educação diferenciada significa reconhecer que os processos de aprendizagem de comunidades tradicionais se diferem da educação padronizada dos currículos escolares, pois traz em sua prática os conhecimentos e as formas de sua transmissão próprios da comunidade, da cultura e do território em que vivem. Desta forma, buscamos demarcar educação escolar diferenciada como a incorporação dos conhecimentos tradicionais e das práticas de sua transmissão nas escolas, em seus diversos segmentos. Garantir o acesso à educação escolar para as comunidades tradicionais deve ser uma forma de valorização de suas culturas e de defesa de seus territórios.
Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada
Paraty, 2018
A educação escolar das comunidades tradicionais de Paraty:
um balanço de dois anos do Plano Municipal de Educação
Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada Fórum de Comunidades Tradicionais
-‐ Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba -‐
A educação escolar das comunidades tradicionais de Paraty:
um balanço de dois anos do Plano Municipal de Educação (2015-‐2017)
Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada
Fórum de Comunidades Tradicionais -‐ Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba Paraty, 2018
Esse documento foi elaborado em fevereiro de 2018 pelo Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada do Fórum de Comunidades Tradicionais, com a contribuição de Xxxxx Xxxxx xxx Xxxxxx, Xxxxxxx xxx Xxxxxx, Xxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx (Xxxxxx), Xxxxxxx xx Xxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxx, Xxxxxx Xxxxx França, Xxxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxxxx. Fotografia de capa: Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Editoração: Xxxxx Xxxxxxxx.
Sumário
Introdução 5
1. O Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra, Paraty e Ubatuba e a luta pela Educação Diferenciada 7
2. O marco legal da educação diferenciada em Paraty: direitos previstos na lei e negados na prática 10
3. Educação escolar caiçara 17
4. Educação escolar quilombola 20
5. Educação escolar indígena 23
7. Demandas e recomendações 27
Anexo: Meta 7 do Plano Municipal de Educação de Paraty (2015) 31
Referências 35
Introdução
Este documento tem por finalidade apresentar um resumo da situação da educação escolar das comunidades tradicionais de Paraty -‐ caiçaras, quilombolas e indígenas -‐ com o objetivo de evidenciar as dificuldades e os entraves que se interpõem ao pleno direito das comunidades tradicionais à educação diferenciada, conforme previsto em lei. Busca também registrar os avanços obtidos desde 2015 e apontar caminhos necessários para a efetivação do acesso a uma educação escolar diferenciada para a valorização da cultura tradicional e a defesa dos territórios. A escolha do ano de 2015 como referência se deve ao fato de que foi nesse ano que o Plano Municipal de Educação foi aprovado, com uma meta específica voltada para a Educação das Comunidades Tradicionais. Passados dois anos, é importante observar o que avançou e o que ficou parado em relação às metas e diretrizes do PME. O documento se encerra com uma síntese de demandas e solicitações necessárias para atender, no contexto atual, a educação das comunidades tradicionais de Paraty.
Falar em educação diferenciada significa reconhecer que os processos de aprendizagem de comunidades tradicionais se diferem da educação padronizada dos currículos escolares, pois traz em sua prática os conhecimentos e as formas de sua transmissão próprios da comunidade, da cultura e do território em que vivem. Desta forma, buscamos demarcar educação escolar diferenciada como a incorporação dos conhecimentos tradicionais e das práticas de sua transmissão nas escolas, em seus diversos segmentos. Garantir o acesso à educação escolar para as comunidades tradicionais deve ser uma forma de valorização de suas culturas e de defesa de seus territórios.
O Dossiê foi elaborado para ser entregue ao Ministério Público Federal, por ocasião de uma reunião lá realizada em fevereiro de 2018. Desde então, alguns avanços se fizeram notar nas ações do poder municipal e estadual, avanços estes que precisam ser consolidados e ampliados, mas que já são um resultado imediato da atuação do movimento social, não só junto as instâncias do Poder Público, mas também na base comunitária que sustenta a luta pelo direito à educação das comunidades tradicionais.
No âmbito da educação escolar caiçara, em maio de 2018 houve finalmente a
chegada de mais professores, totalizando 4 professores para atender as turmas de 6o, 7o e 8o ano das escolas da Praia do Sono e do Pouso da Cajaíba. A formação dos professores nos anos iniciais do Ensino Fundamental da Zona Costeira de Paraty também teve início em março de 2018, atendendo oito escolas situadas em comunidades caiçaras. Ainda está pendente a regulamentação.
Na educação escolar indígena, o ano se iniciou com a perspectiva da criação do magistério indígena, que, foi aprovado pelo Conselho Estadual de Educação e planejado para iniciar em julho de 2018. Os primeiros seminários de planejamento curricular foram programados para maio e junho e se realizarão em Angra dos Reis.
Já na educação escolar quilombola, o movimento de reorientação curricular nos anos iniciais das escolas do Cabral e do Campinho tiveram prosseguimento, mas ainda está pendente sua regulamentação. Por outro lado, a Secretaria Municipal de Educação ainda não apresentou resposta satisfatória em relação aos anos finais do Ensino Fundamental quilombola.
1. O Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra, Paraty e Ubatuba e a luta pela Educação Diferenciada
O Fórum de Comunidades Tradicionais -‐ FCT é um movimento social de base comunitária que surgiu a partir da união de indígenas, quilombolas e caiçaras da região da Bocaina -‐ Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, em busca de fortalecimento e solução para problemas comuns relacionados a direitos básicos e principalmente, para assegurar o direito ao território.
O FCT foi criado em 2007, a partir do surgimento de políticas importantes para os Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil, como o Decreto 6040/2007 que institui a Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e tem como principal objetivo: promover o desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua identidade, suas formas de organização e suas instituições.
Mesmo possuindo práticas e conhecimentos passados de geração a geração e um importante papel na conservação dos recursos naturais, sendo reconhecidas como verdadeiro patrimônio cultural, as populações tradicionais vivem graves conflitos territoriais, que ameaçam constantemente o seu modo de vida -‐ especulação imobiliária, grandes empreendimentos, privatização de territórios tradicionais, turismo desordenado, algumas práticas repressivas de órgãos ambientais, precariedade de serviços essenciais como educação, saúde, lazer e saneamento, dentre outros.
Embora tenham direitos constitucionalmente garantidos, a pressão de órgãos ambientais, a especulação imobiliária e ausência de políticas públicas específicas expõem ao risco a reprodução social das comunidades tradicionais, colocando em xeque não só a cultura, que garante a diversidade da sociedade brasileira e o patrimônio cultural (material e imaterial) do país, mas a sua própria sobrevivência.
Com o objetivo de implementar, nos níveis federal, estadual e municipal, os objetivos e princípios estabelecidos por essa política e legislações que protegem os povos tradicionais, desde 2007, o FCT da região, formado por quilombolas, indígenas, caiçaras, vem se consolidando e fortalecendo a luta pelos direitos dessas populações.
O FCT se articula em rede de associações comunitárias e entidades parceiras, buscando o fortalecimento das comunidades tradicionais. Exerce o controle social, pressão participativa e luta pela democracia, atuando em espaços colegiados como conselhos, redes e fóruns regionais. Promove defesa dos direitos essenciais e territoriais das populações tradicionais por meio de articulação, mobilização e diálogo com instituições governamentais e não governamentais que atuam na defesa desses povos, como Ministério Público, Defensoria Pública, universidades, centros de pesquisa e ONGs. O FCT exerce ainda atuação importante como criador e indutor de políticas públicas a representantes do poder legislativo.
O Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada é uma rede que se formou em apoio ao Fórum de Comunidades Tradicionais, um movimento espontâneo que se consolidou a partir do trabalho de lideranças do FCT que se dedicavam à causa da Educação Diferenciada, aproximando e fortalecendo trabalhos realizados inicialmente de forma isolada. O Coletivo também reuniu pessoas próximas às comunidades tradicionais, que de alguma forma se vinculavam às pesquisas e demandas na área da Educação Diferenciada, como professores da educação básica, pesquisadores e estudantes de instituições como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal Fluminense (UFF) -‐ de Angra dos Reis e Niterói -‐, a Fundação Xxxxxxx Xxxx (FIOCRUZ), a ONG Verde Cidadania, o Grupo de Extensão Raízes e Frutos (UFRJ) e a Pontifícia Universidade Católica (PUC-‐Rio), entre outras. Desde 2013, diversos encontros foram realizados buscando atender a uma das principais demandas do FCT e se criar uma proposta de pesquisa para a Educação Diferenciada. Mas somente em 2015 o Coletivo veio a se consolidar.
Com a formação do Coletivo, os participantes definiram que o principal ponto a ser enfrentado era o novo Plano Municipal de Educação (PME) de Paraty, cujo debate já estava prestes a ocorrer em junho de 2015. O Coletivo atuou na formulação e envio de propostas que pudessem ser votadas na Conferência Municipal de Educação, ocorrida no mesmo ano, tendo como resultado o documento base do Plano Municipal de Educação para o decênio 2015/2025. Os participantes do Coletivo estiveram presentes e participaram dos grupos de trabalho dos eixos “Educação Para as Comunidades Tradicionais” e “Educação para a Diversidade”, discutindo e apresentando estratégias para a implementação de uma educação que respeitasse a diversidade cultural do
município. O resultado dessa participação foi a previsão, em lei, de uma importante meta para a educação das comunidades tradicionais, que visa à oferta de Educação Básica para as comunidades tradicionais e populações do campo nas próprias comunidades, articulando seu currículo com o contexto rural, étnico, e com as tradições locais; e se desdobra em 31 estratégias presentes no Plano Municipal de Educação de Paraty.
Ao final de 2015, o Coletivo participou ativamente das reuniões realizadas com a Secretaria Municipal de Educação (SME) para a implantação do 2o Segmento (Anos finais, 6o ao 9o ano)1 do Ensino Fundamental na Zona Costeira2, iniciando pelas praias do Sono e Pouso da Cajaíba. Ao longo das discussões, o Coletivo assumiu a responsabilidade de elaborar uma proposta pedagógica junto às comunidades e professores para essa nova etapa de ensino a ser implantada, uma vez que as escolas passariam a implantar um currículo diferenciado.
Em 2016, as ações do Coletivo ficaram focadas na implantação do 6º ano nas Praias do Sono e Pouso da Cajaíba, especificamente no apoio à formação inicial e continuada dos professores e sua proposta pedagógica, processo coordenado pelo Instituto de Educação de Angra dos Reis da Universidade Federal Fluminense (IEAR/UFF). Em 2017, iniciou-‐se a formação escolar diferenciada quilombola nos quilombos do Campinho e Xxxxxx e as negociações visando um acordo para a formação escolar diferenciada do 1o segmento da costeira. Todos os processos são coordenados pelo IEAR/UFF, sendo que a formação do 1o segmento da costeira será realizada com a participação do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Diferenciada do Colégio Xxxxx XX (NEPEDIF/CPII).
1 O Ensino Fundamental é dividido em 1o segmento ou "anos iniciais", que compreende o 1o ao 5o ano (antigo CA a 4a série) e 2o segmento ou "anos finais", que compreende o 6o ao 9o ano (antiga 5a a 8a série).
2 As escolas de Paraty se dividem entre xxxx xxxxxx, xxxx xxxxx e costeira. A zona costeira corresponde a oito escolas cujo o acesso depende do uso de barcos, são elas: Xxxxx xx Xxxx, Xxxxx xx Xxxxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxxx, Xxxxx Xxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxx, Saco do Mamanguá, Ponta Grossa e Ilha do Araújo.
2. O marco legal da educação diferenciada em Paraty: direitos previstos na lei e negados na prática
Como já mencionado, o Fórum de Comunidades Tradicionais esteve presente de forma ativa no processo de discussão e nas votações ocorridas na Conferência Municipal de Educação, buscando incluir no Plano Municipal de Educação (PME) os importantes avanços em relação a garantia dos direitos à educação.
O PME está baseado em diversas legislações que afirmam os direitos das comunidades tradicionais, questão que ganhou relevância nas últimas duas décadas do século XX. As convenções 107 e 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tratam dos povos tradicionais, foram formuladas e reconhecidas no início da década de 1990. No Brasil, o Decreto nº 5051/2004 reconhece e promulga as referidas convenções. Uma característica relevante das convenções, já derivada das lutas dos movimentos, é o princípio da autodeterminação, como critério fundamental para sua aplicação.
No âmbito das lutas e conquistas desses povos do campo nasceu também o Decreto 6040, de 2007, que promulga a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Esse documento evidencia o reconhecimento das formas de vida dos Povos e Comunidades Tradicionais caracterizando-‐os como: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição (Decreto 6040, 2007).
Ainda como marco legal, no seio das unidades de conservação no Brasil, destaca-‐ se o Sistema Nacional das Unidades de Conservação (SNUC, lei nº 9.985/2000) e suas posteriores regulamentações (Decreto 4340/2002) e emendas, que afirmam direitos de permanência de comunidades tradicionais em diversas categorias de áreas protegidas.
Em relação à escolarização, os povos do campo e as comunidades tradicionais já conquistaram um conjunto de direitos relativos ao acesso e ao tipo de educação a ser realizada em seus lugares de vida, sem precisar migrar. A própria Convenção 169 da OIT,
em seu artigo 27, enfatiza a importância da criação de um sistema educacional próprio para as comunidades consideradas tradicionais:
Artigo 27:
1. Os programas e os serviços de educação destinados aos povos interessados deverão ser desenvolvidos e aplicados em cooperação com eles a fim de responder às suas necessidades particulares, e deverão abranger a sua história, seus conhecimentos e técnicas, seus sistemas de valores e todas suas demais aspirações sociais, econômicas e culturais.
2. A autoridade competente deverá assegurar a formação de membros destes povos e a sua participação na formulação e execução de programas de educação, com vistas a transferir progressivamente para esses povos a responsabilidade de realização desses programas, quando for adequado.
3. Além disso, os governos deverão reconhecer o direito desses povos de criarem suas próprias instituições e meios de educação, desde que tais instituições satisfaçam as normas mínimas estabelecidas pela autoridade competente em consulta com esses povos. Deverão ser facilitados para eles recursos apropriados para essa finalidade.
Já a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) apresenta, dentre seus objetivos específicos, a necessidade da existência do diálogo entre educação formal e saber informal no âmbito escolar:
Garantir e valorizar as formas tradicionais de educação e fortalecer processos dialógicos como contribuição ao desenvolvimento próprio de cada povo e comunidade, garantindo a participação e controle social tanto nos processos de formação educativos formais quanto nos não-‐formais (PNPCT, 2007).
Outra importante legislação é a da Educação do Campo. O Decreto n° 7.352/2010 passou a regular a Educação do Campo no Brasil, tornando-‐a uma política pública consistente e garantindo direitos, inclusive para caiçaras e quilombolas.
Artigo 1: Para os efeitos deste Decreto, entende-‐se por: I – populações do campo: os agricultores familiares, os extrativistas, os pescadores artesanais, os ribeirinhos, os assentados e acampados da reforma agrária, os trabalhadores assalariados rurais, os quilombolas, os caiçaras, os povos da floresta, os caboclos e outros que produzam suas condições materiais de existência a partir do trabalho no meio rural. II – escola do campo: aquela situada em área rural, conforme definida pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -‐ IBGE, ou aquela situada em área urbana, desde que atenda predominantemente a populações do campo.
É a partir desse aparato institucional legal que as comunidades tradicionais de Paraty vêm se mobilizando com vistas a assegurar uma educação de qualidade para as suas comunidades, entendendo que esse é um direito que lhes vem sendo negado há décadas.
A partir da discussão com as comunidades tradicionais, o Plano Municipal de Educação incorporou alguns dos preceitos de uma educação do campo diferenciada, indicando a intenção de reconhecer e atender o direito dessas comunidades. O PME faz referência a essas diversas legislações: Convenção 169 da OIT, Decreto Federal 6040/2007, Diretrizes para a Educação Escolar Quilombola, Resolução CNE nº 04/2010, Deliberação CEE/RJ nº 286/2003 e a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012, mas deixando de fora a legislação referente à Educação do Campo, apesar de fazer referências a Educação do Campo em suas diretrizes.
O Plano Municipal de Educação de Paraty (2015)
Dois anos após a data em que a nova lei passou a valer (dezembro de 2015), constatamos que houve alguns poucos avanços e muitos pontos de estagnação em relação ao que está previsto no PME.
Sobre os avanços, é importante registrar o início da implantação do 2o segmento do Ensino Fundamental nas comunidades do Sono e do Pouso, a partir de 2016, com a formação continuada dos professores visando uma reorientação curricular diferenciada. O mesmo processo de formação teve início em 2017 no 1o segmento do Ensino Fundamental nas comunidades quilombolas do Cabral e do Campinho da Independência. Entretanto, os pontos de estagnação ainda são muitos, conforme descreveremos a seguir. A meta 7 do Plano Municipal de Educação visa "Garantir a oferta da Educação Básica, em especial dos anos iniciais do Ensino Fundamental, para as comunidades tradicionais e populações do campo nas próprias comunidades, articulando o seu currículo com o contexto rural, étnico, e com as tradições locais, atendendo às determinações legais vigentes e respeitando a articulação entre os ambientes escolares e
comunitários".
As 31 estratégias da Meta 7 contêm tanto objetivos gerais, válidos para todos os segmentos e comunidades tradicionais, quanto objetivos específicos relacionados à
educação quilombola, indígena e caiçara. Também existem objetivos relativos a diversos níveis de ensino -‐ 1o e 2o segmentos do Ensino Fundamental, Ensino Médio, Educação de Jovens e Adultos, etc.
Destacaremos, nesse primeiro momento, as estratégias 7.2, 7.6, 7.9, 7.11, 7.21, 7.26, 7.27 e 7.31. Esses itens se referem ao conjunto das comunidades tradicionais, enfocando o Ensino Infantil e o Ensino Fundamental (anos iniciais e finais).
7.2 -‐ priorizar e garantir o acesso e a permanência à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental, em especial dos anos iniciais, nas escolas das comunidades tradicionais e populações do campo, limitando a nucleação dessas escolas e o deslocamento de crianças, de forma a atender às especificidades dessas comunidades, garantindo consulta prévia livre e informada quando necessário, com atenção especial às comunidades costeiras de dificílimo acesso, com a oferta dos anos finais do Ensino Fundamental Regular e Ensino Médio;
A oferta de ensino nos anos finais do Ensino Fundamental só tem ocorrido nas comunidades da Praia do Sono e do Pouso da Cajaíba. No caso do Pouso, que poderia nuclear outras comunidades, como Xxxxx xx Xxxxxxx, Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx x Xxxxx xx Xxxxxxxx, não há disponibilidade de barco para as crianças matriculadas no 2o segmento, questão apontada em carta ao Prefeito entregue em outubro de 2017. No caso de outras comunidades como Ponta Negra e Saco do Mamanguá, também não há oferta do 2o segmento. A demanda do Xxxxxx Médio ainda não está sendo colocada no momento, mas em breve virá a ser.
7.6 -‐ implantar, conforme o Plano de Ações Articuladas (PAR), ao longo deste PME, salas de recursos multifuncionais e garantir a formação político-‐ pedagógica continuada de professores e professoras para o atendimento educacional especializado nas escolas do campo e das comunidades tradicionais.
A infraestrutura das escolas do Sono e do Pouso da Xxxxxxx ainda se encontra muito precária. Em dois anos de funcionamento do 2o segmento, não conseguiram colocar internet nas escolas, que permanecem sem impressora3. Os aparelhos de
3 Enquanto no Pouso da Cajaíba a impressora parou de funcionar e não foi consertada, na Praia do Sono existe apenas uma impressora doada pelo Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada através de recursos do Programa de Apoio à Formação de Educadores (PAFE), um edital do Instituto Xxx Xxxxx.
datashow em uso são emprestados pelos Pontos de Cultura Caiçara do Sono e do Pouso. Portanto, não houve implantação de salas de recursos multifuncionais.
Quanto à formação político-‐pedagógica continuada, esta vem sendo realizada pelo IEAR/UFF no 2o segmento (escolas do Sono/Pouso) e no 1o segmento (escolas Campinho e Cabral). É demanda premente do FCT estender essa formação para o 1o segmento caiçara, como já previsto para iniciar em 2018, e para o 2o segmento quilombola.
7.9 -‐ fomentar o desenvolvimento sustentável e a preservação da identidade cultural nas escolas das comunidades tradicionais, garantindo a participação da comunidade na definição do modelo de organização pedagógica e de gestão das instituições, consideradas as práticas socioculturais e as formas particulares de organização do tempo;
7.27 -‐ promover o processo de gestão democrática em todas as escolas das comunidades tradicionais, de acordo com a legislação vigente, garantindo a autonomia dos Conselhos Escolares e sua participação na construção do Projeto Político Pedagógico;
A participação da comunidade no modelo de organização pedagógica e na gestão ainda não está sendo garantida. As escolas da Praia do Sono e do Pouso da Cajaíba continuam sem Conselho Escolar e Associação de Pais e Mestres, mesmo após três mães do Sono terem se oferecido para a formarem. Os nomes foram passados à SME, mas a oficialização não foi à frente.
7.11 -‐ promover a elaboração de currículos e propostas pedagógicas específicas para educação escolar nas escolas do campo e das comunidades tradicionais, em conjunto com as comunidades, com abordagens interdisciplinares que organizem de maneira flexível conteúdos teóricos e práticos articulados, respeitando todos os seus aspectos e incluindo os conteúdos culturais, sociais, políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia, correspondentes às respectivas comunidades, considerando o fortalecimento das práticas socioculturais e da língua materna de cada comunidade indígena, garantindo a produção e a disponibilização de materiais didáticos específicos;
A elaboração de currículos e propostas pedagógicas específicas está ocorrendo no 2o segmento das escolas da Praia do Sono e do Pouso da Cajaíba e deve iniciar no 1o segmento das escolas do Campinho e do Cabral. Mas ainda não está sendo realizada nas
demais escolas. Está prevista para 2018 também o início da reorientação das escolas de 1o segmento da Costeira.
7.21 – propor a criação de instância no prazo de até 03 (três) anos, observada a LRF (Lei 101/2000) a contar da data de publicação desta Lei, no âmbito da Secretaria Municipal de Educação que garanta de forma permanente a organização, o acompanhamento, a avaliação e a socialização das ações para implementação da educação diferenciada nas comunidades tradicionais do município, em conformidade com o Decreto Federal 6040, de fevereiro de 2007, com a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012 e Convenção 169 da OIT; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 028/2015)
Em dois anos de publicação do PME, não houve nenhum movimento da SME para a criação de instância responsável pelo desenvolvimento da educação diferenciada.
7.26 -‐ garantir que na organização, administração e gestão da educação para as comunidades tradicionais, os critérios científicos e pedagógicos prevaleçam sempre sobre quaisquer critérios de natureza administrativa ou outra que claramente não se compatibilize com as escolas e práticas educativas que delas decorrem;
Em muitas situações, os critérios pedagógicos estão sendo colocados em segundo plano em função de imperativos administrativos (Ex: ausência de coordenação; número de professores; organização em ciclos, com turmas de dois anos, etc.)
7.31 – Implementar a expansão do Ensino Fundamental nos anos finais nas comunidades tradicionais e do campo, em pelo menos 02 escolas, a cada 02 anos, mediante estudo da necessidade das comunidades em questão, considerando a Pedagogia da Alternância e em conformidade com as metodologias participativas e dialógicas.
A última estratégia da Meta 31 é bem específica ao definir o número de escolas a serem atendidas e o prazo de cumprimento. Nos dois primeiros anos de PME, a Prefeitura de Paraty cumpriu a estratégia, abrindo turmas de 2o segmento na Praia do Sono e no Pouso da Cajaíba, embora tenha prometido uma terceira escola ainda em 2015. Passados dois anos, não houve nenhuma ampliação de 2o segmento em comunidades tradicionais, apesar das demandas pelo 2o segmento nas escolas do Campinho, do Saco do Mamanguá e da Ponta Negra.
Nos tópicos seguintes, apresentamos a situação da educação escolar em cada uma das três etnias que compõem o Fórum de Comunidades Tradicionais em Paraty, buscando avaliar os objetivos do PME em função do que avançou e do que ficou parado.
3. Educação escolar caiçara
Paraty possui diversas comunidades caiçaras, algumas delas em localidades com acesso à estrada, outras somente acessíveis de barco ou trilha -‐ a chamada Zona Costeira. Entre as escolas acessíveis pela estrada, podemos citar Tarituba, São Gonçalo, Paraty-‐ Mirim e Trindade, nas quais existem escolas de 1o segmento e o acesso às escolas de 2o segmento da cidade ou da zona rural (Barra Grande). Já na Zona Costeira existem oito escolas de 1o segmento: Prxxx xx Xxxx, Xxxxx Xxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxx, Saco do Mamanguá, Ponta Grossa e Ilha do Araújo. Todas essas localidades são consideradas comunidades caiçaras. Essas escolas cobrem a maior parte da demanda de 1o segmento na Zona Costeira, pois existe ainda o deslocamento de barco de alunos residentes em pequenas comunidades para escolas situadas em comunidades maiores. Mas mesmo no 1o segmento, ainda há crianças em idade escolar sem atendimento, como no caso da praia de Xxxxxx xx Xx e Saco das Anchovas.
A falta de escolas em algumas comunidades tem levado muitas famílias caiçaras a migrarem para outras localidades em busca desse direito negado, abandonando assim seus territórios tradicionais. É o caso, por exemplo, da comunidade do Cairuçu das Pedras, onde as famílias com crianças em idade escolar se mudaram para a Ponta Negra.
A situação é mais crítica no acesso ao 2o segmento do Ensino Fundamental. Até 2015, quando o PME foi aprovado, não havia escolas de 2o segmento de Ensino Fundamental para as comunidades da Zona Costeira de Paraty. As comunidades da Ilha do Araújo e de Ponta Grossa, situadas mais próximas ao centro de Paraty, têm usufruído de transporte marítimo para acessarem as escolas da cidade, mas as demais se encontram em distâncias marítimas muito grandes, o que dificultaria esse transporte. No caso do Saco do Mamanguá, o atendimento existia, apesar do enorme tempo dispensado no translado de barco e ônibus até a escola mais próxima (cerca de 3 horas para ir e 3 horas para retornar), mas nas demais comunidades nem mesmo esse translado era oferecido.
Ao longo do tempo, o histórico de negligência do Poder Público no atendimento à demanda do 2o segmento do Ensino Fundamental na Zona Costeira fez com que sucessivas gerações fossem alijadas da conclusão do 9o ano (antiga 8a série). Poucos
adultos dentro das comunidades ultrapassaram o 5o ano, alguns só o fizeram através da
modalidade de Ensino de Jovens e Adultos (EJA), após a descontinuidade de seus estudos. Nesse contexto, diversas mobilizações foram feitas, nos anos mais recentes, para que a Prefeitura Municipal oferecesse o 2o segmento do Ensino Fundamental regular nas comunidades caiçaras, especialmente na Praia do Sono e no Pouso de Cajaíba, que são as que apresentavam maior demanda e se encontravam em lugares de dificílimo acesso para o deslocamento de alunos para as escolas do centro urbano de Paraty.
Também historicamente as condições de trabalho dos professores da costeira são precárias. Além da pouca estrutura física e de material das escolas, a Secretaria Municipal de Educação somente oferecia barcos para o deslocamento dos professores a cada semana, fazendo com que muitos fiquem em isolamento e não tenham o interesse em trabalhar nessas localidades e/ou desistam no meio do processo.
É nesse contexto que surge, em 2015, o Plano Municipal de Educação, com uma Meta específica para a Educação para as Comunidades Tradicionais (Meta 7) e a proposta da Prefeitura Municipal de Paraty para implantar o 2o segmento em três escolas da Zona Costeira: Praia do Sono, Pouso da Cajaíba e uma terceira, que acabou não ocorrendo. Aqui destacamos os principais pontos do PME relacionados às comunidades caiçaras e o processo de implantação do 2o segmento do EF na Praia do Sono e no Pouso da Cajaíba. As principais estratégias do PME que tratam sobre a educação caiçara são o 7.14 e o 7.30:
7.14 -‐ garantir, em até 03 anos, a adequação de escolas em núcleos caiçaras inseridos ou não em UC’s, assegurar a regulamentação da Educação Caiçara, com a participação dos Movimentos Sociais e Comunitários garantindo o direito às comunidades de preservarem suas manifestações culturais, valorizando a pedagogia Griô, considerando a Pedagogia da Alternância e a sustentabilidade do território, em conformidade com o Decreto Federal 6040, de fevereiro de 2007, com a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012, com a Convenção 169 da OIT; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº027/2015)
7.30 -‐ reconhecer as especificidades das comunidades costeiras, atendendo a toda demanda de acesso à educação escolar, independente do número de crianças em idade escolar, garantindo a escolarização em nível fundamental, em unidades escolares mais próximas à comunidade de origem; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 030/2015).
Na redação original, o prazo estipulado era de 2 anos, que foi estendido para 3
anos na votação na Câmara Municipal. Esse item fala expressamente em "adequação das escolas inseridas em núcleos caiçaras" e "regulamentação da Educação Caiçara".
Consideramos "adequação" as reformas necessárias para receber o número de turmas e alunos de 1o e 2o segmentos, bem como para residência dos professores oriundos da sede municipal. A adequação deve visar também ao bem estar da prática educacional, com mobiliário, materiais e instrumentos que atendam aos alunos em sua aprendizagem. Já a "regulamentação da Educação Caiçara" consiste na aprovação e publicação das resoluções que validam a expansão para o 2o segmento, que estabelecem o currículo diferenciado, desenvolvido em ciclos e a inserção dessas escolas nas categorias de Escolas do Campo. A questão do "número de crianças" precisa também ser observada, para que não se recuse possíveis aberturas de turmas em função do baixo número de crianças.
4. Educação escolar quilombola
No Quilombo do Campinho, situado no município de Paraty, a Associação de Moradores do Campinho (AMOC) já desenvolve há mais de uma década um trabalho de fortalecimento da cultura quilombola. O objetivo é contribuir para a compreensão da importância da cultura afro brasileira na educação quilombola, com a participação da comunidade em grupos de jongo, capoeira, samba, dança afro e hip hop. Em 2016, com o lançamento da campanha dos 10 anos do Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT + 10), e o convite para os alunos das oficinas se apresentarem, estas ganharam novo fôlego. A partir daí, nasceu o Bloco Afro.
Além das atividades culturais, a comunidade do Campinho também tem atuado politicamente para a melhoria da educação escolar quilombola. A luta pela educação quilombola existe desde os tempos da titulação. Ao longo desse período, houve algumas iniciativas: instalação do ponto de cultura na escola (2005), retirada do mesmo pela SME (2006), projeto na escola patrocinado pelo Itaú Unibanco (Vivencia de Saberes). Entretanto, há um histórico de “queda de braço” com as gestões e com os professores (que muitas vezes resistem à lógica da educação quilombola) e ainda um racismo institucional implícito.
Em 2014, instalou-‐se uma crise por conta das condições da escola (teto em más condições, instalações elétricas precárias, morcego, mofo e questões de insalubridade de um modo geral). As mães da comunidade se uniram por melhores condições e fizeram uma primeira greve: os alunos não foram estudar. Houve uma negociação com a Prefeitura, na qual foi acordada uma reforma mínima emergencial e uma reforma completa nas férias escolares. Não houve reforma nas férias. Houve outra greve então em 2015. Junto com essa crise na escola, foi ganhando adesão junto à comunidade a proposta da educação quilombola, ganhando terreno durante o debate do PME e formação do GT para discutir educação quilombola, organizado no âmbito do Fórum de Comunidades Tradicionais.
Em 2016, aconteceu uma série de reuniões com a Secretaria Municipal de Educação, reivindicando, entre outras coisas, a implantação das diretrizes da educação quilombola na escola da comunidade. Após muitas negociações, e com o apoio
fundamental do IEAR/UFF, conseguiu-‐se o compromisso da Prefeitura de avançar nessa pauta.
Como resultado de uma luta que tem mais de uma década, no ano de 2017, foi iniciada a implementação de um programa de formação continuada visando a reorientação curricular do 1o segmento da educação escolar quilombola, coordenado pela IEAR/UFF e realizado com professores da UFF e uma doutoranda da PUC, direcionado aos professores das escolas dos Quilombos do Campinho e Xxxxxx. Este é um trabalho de longo prazo, que encerra seu ciclo em 2021.
Além disso, ainda no ano de 2017, outro evento no território fez com que se abrisse uma brecha para um avanço em relação à educação escolar quilombola no Ensino Fundamental pleno, como estabelecido no PME. A escola Pequenina Calixto, que fica na zona urbana e atende a maior parte dos alunos de 2o segmento do município de Paraty, foi interditada por problemas de infraestrutura do prédio (parte do telhado caiu). Com isso, os alunos de 2o segmento, inclusive os oriundos do Quilombo do Campinho, tiveram que ser remanejados para os espaços em outros bairros periféricos da cidade. Muitos alunos não se adaptaram à nova realidade, e a comunidade, em processo de negociação com a SME, conseguiu que fosse implantado um "estudo dirigido"4 para esses alunos no Quilombo do Campinho, com uma professora da rede municipal.
Em 2018, a comunidade tem se organizado para conseguir a implantação do 2o segmento no quilombo, nos moldes da experiência em educação diferenciada que já está acontecendo na educação caiçara. Houve reuniões com a SME, com o Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada e com a comunidade, que se manifestou para que o pleito seja atendido. Entretanto, até o momento, o que se conseguiu foi a implantação de uma turma de estudo dirigido com apenas dois professores (matemática e português) com previsão de término em maio. A comunidade tem buscado uma agenda com o prefeito para discutir a questão juntamente com a SME, ainda sem sucesso.
4 O estudo dirigido consistia numa aula, dada por uma única professora, reunindo os alunos dos quatro anos do 2o segmento do Ensino Fundamental, cobrindo todas as disciplinas. Essa medida foi tomada apenas como um paliativo para se concluir o ano letivo sem prejuízo para os alunos, no que diz respeito ao excesso de faltas decorrente das dificuldades encontradas em se reinserirem rapidamente nos novos espaços.
A comunidade reivindica o que está previsto no próprio PME, como se pode ler na estratégia 7.23:
7.23 -‐ garantir, no prazo de 02 anos, em conjunto com as comunidades Quilombolas, a implantação da Escola Quilombola, em regime de cooperação entre a SME e as Associações Quilombolas, conforme preconizam a LDBEN 9394/96 e a Resolução CNE nº 04/2010, e Diretrizes Curriculares para Educação Quilombola, visando à oferta da Educação Infantil e do ensino fundamental pleno de forma articulada com o contexto rural, étnico e tradicional dessas comunidades, considerando a Pedagogia da Alternância.
Já expirou o prazo de cumprimento da implantação da Escola Quilombola, com oferta de ensino fundamental pleno. Isto obriga os jovens das comunidades quilombolas a permanecerem nas escolas urbanas, situação que tem contribuído, ao longo do tempo, para a evasão escolar dos mesmos. Além disso, conforme já mencionado anteriormente, também já expirou o prazo de implantação da expansão do 2o segmento do ensino fundamental em mais duas escolas nas comunidades tradicionais, como também prevê o PME na seguinte estratégia 7.31, quando fala em "implementar a expansão do Ensino Fundamental nos anos finais nas comunidades tradicionais e do campo, em pelo menos 02 escolas, a cada 02 anos".
Outra questão que aparece no PME é referente ao Encontro da Cultura Negra.
7.24 -‐ prever no calendário escolar a participação efetiva das Escolas Quilombolas municipais no ENCONTRO DA CULTURA NEGRA, que se realiza anualmente no Quilombo do Campinho da Independência, e consequentemente, o recesso escolar quando necessário, de forma articulada com o Conselho Escolar da Unidade Escolar;
O recesso de um dia após o ENCONTRO DE CULTURA NEGRA nunca foi autorizado, o que faz com que a comunidade se desgaste para entregar a escola em condições de ter aula no dia seguinte ao evento. Além disso, a comunidade (crianças e adultos) também fica extenuada após os 3 dias do evento mais importante da comunidade.
5. Educação escolar indígena
É de direito dos povos indígenas uma educação escolar específica, intercultural, bilíngue, comunitária e diferenciada. Cabe ao estado e aos municípios garantir estes direitos, enquanto a coordenação de ações referentes às políticas de educação escolar indígena compete ao Ministério da Educação, conforme o Decreto no 26 de 4 de fevereiro de 1991.
Na Constituição Federal, o artigo 231 reconhece os costumes, línguas, crenças, tradições e organização social dos povos indígenas e o artigo 210, parágrafo segundo, determina que o ensino nas comunidades indígenas deve ser dado em língua portuguesa desde que respeite a língua materna e seus próprios processos de aprendizagem.
O Artigo 78 da LDB estabelece dois objetivos da educação indígena a partir de programas integrados de ensino: resgatar as memórias históricas de suas comunidades e reafirmar a identidade e valorizar a sua cultura, língua e ciência, garantir à comunidade o acesso às informações, conhecimentos científicos e técnicos da sociedade indígena e não-‐ indígena nacional. O Artigo 79 contempla as comunidades indígenas estabelecendo o apoio técnico e financeiro da União aos sistemas de ensino para desenvolverem programas integrados de ensino para uma educação intercultural das comunidades indígenas.
Em 2008, foi criada a Lei nº 11.645, de 10 março de 2008, que obriga a inclusão da temática “História e Cultura Afro-‐Brasileira e Indígena” no currículo das escolas públicas e privadas. O conteúdo a que se refere a lei deve contemplar os diversos aspectos da história brasileira, reconhecendo a importância do estudo da história e luta dos negros e dos indígenas e das suas contribuições nas áreas sociais, políticas e econômicas para a formação da sociedade brasileira.
Em 2009, através do Decreto nº 6.861, foram estabelecidos os Territórios Etnoeducacionais – TEEs que buscam organizar a educação escolar indígena, como
um espaço de articulação das políticas públicas voltadas à Educação Escolar Indígena, envolvendo seus diferentes atores e agentes (MEC, FUNAI, estados, municípios, Universidades, Institutos Federais, ONGs) na discussão e planejamento conjunto das ações. (...) isso pode se dar a partir do diálogo de gestores da educação com povos ou grupos de povos com identidades ou
processos históricos e culturais articulados, para além do alcance das divisões territoriais de unidades federativas ou municipais (Decreto 6.861/2009)
O artigo sexto deste decreto dispõe que esta organização se dará a partir das definições dos territórios etnoeducacionais estabelecidas pelas comunidades indígenas envolvidas, entes federativos, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena, Conselhos Estaduais de Educação Escolar Indígena e Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI). O artigo quinto estabelece que a União prestará apoio técnico e financeiro para a construção de escolas, formação inicial e continuada de professores indígenas e outros profissionais da educação, produção de material didático, alimentação e ensino médio integrado à formação profissional. Este apoio técnico e financeiro deve ser orientado a partir das ações do plano de cada território etnoeducacional e devem estar conforme as diretrizes curriculares nacionais da educação escolar indígena. Este plano de ações deve conter, segundo o artigo oitavo, um diagnóstico incluindo a descrição dos povos, população, aspectos da cultura e da língua e as demandas educacionais do respectivo território etnoeducacional, um plano de ações para o cumprimento destas demandas, uma descrição de cada responsabilidade e informações dos que participam da educação escolar indígena, além de construção das escolas, contratação de professores e profissionais indígenas da educação, produção de material didático e alimentação escolar.
O resultado da implantação dos TEEs está longe de ser satisfatório, pois não existe uma regulamentação do regime de colaboração, prejudicando as comunidades indígenas de diferentes cidades, como aponta o próprio MEC
i) a falta de regulamentação sobre o regime de colaboração que rege a relação entre as três esferas de governo; ii) a descontinuidade da ação dos sistemas de ensino, a dificuldade de estabelecer um diálogo intercultural, ouvindo e compreendendo as perspectivas indígenas; iii) problemas de gestão que mantêm as escolas indígenas sem receber insumos básicos para seu funcionamento, como merenda escolar e material didático; iv) falta de transparência na aplicação dos recursos públicos. (Brasil, 2007)
Para que a implantação dos TEEs seja efetiva, é necessário que haja a regulamentação e que seja definida claramente a responsabilidade entre as três esferas de governo.
A Resolução No 5 de 22 de junho de 2012 do Conselho Nacional de Educação, define as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Indígena na educação básica, que tem como objetivos:
d) orientar a organização da educação escolar indígena no âmbito dos territórios nacionais e fortalecer o regime colaborativo dos sistemas de ensino da União, Estados e Municípios, e também orienta estes sistemas quanto à inclusão e colaboração de especialistas em saberes tradicionais, como contadores de histórias, de instrumentos musicais, rezadores, parteiras, organizadores de rituais, conselheiros e demais funções necessárias; [...] (p. 02)
No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, somente em 2003, o CEE-‐RJ publicou o Decreto Estadual no 33.033, que criou a categoria "Educação Escolar Indígena" no sistema estadual de ensino. Por outro lado, as Secretarias Municipais ainda não incluíram a categoria "Educação Escolar Indígena" nos seus Sistemas, (mesmo em Maricá, onde a escola indígena funciona pela SME) e também não criaram ainda um setor específico na sua estrutura organizacional.
QUADRO 1: POPULAÇÃO INDÍGENA EM PARATY
ALDEIA | ETNIA | LOCALIDADE | HABITANTES | SITUAÇÃO FUNDIÁRIA | ÁREA |
Itaxĩ | Guarani Mbya | Parati-‐Mirim/ Parati | 171 | Homologada | 79 ha |
Araponga | Guarani Mbya | Parati | 40 | Homologada | 213 ha |
Rio Pequeno | Guarani Nhandeva | Parati | 20 | Em Identificação/ estudo | ? |
Somente em 2004 a Deliberação do CEE-‐RJ no 286 é publicada estabelecendo normas para autorização, estrutura e funcionamento das escolas indígenas no âmbito da educação básica no sistema de ensino estadual do Rio de Janeiro e criando o CIEGKKR – Colégio Indígena Estadual Guarani Karai Kuery Renda.
O Plano Municipal de Educação de Paraty (2015) coloca alguns objetivos para a educação indígena. Aqui citamos e comentamos cada um deles.
7.10 – garantir junto ao governo do estado conforme a legislação específica que nas comunidades indígenas, seja ofertada a educação infantil tradicional em
língua materna e a oferta bilíngue nos anos iniciais do ensino fundamental, em língua materna e em língua portuguesa, a reestruturação e a aquisição de equipamentos, a oferta de programa para a formação inicial e continuada de profissionais da educação e o atendimento em educação especial, que considerem as especificidades de cada comunidade, bem como processos pedagógicos presentes na cultura Guarani, respeitando as faixas etárias escolares, conforme Deliberação CEE/RJ nº 286/2003, definidas em consulta, prévia livre e informada; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 026/2015).
Cabe a cada comunidade indígena discutir suas demandas próprias por educação infantil ou não, pois vai depender das condições sócio culturais em que os diferentes grupos infantis vivem e as diferentes concepções de infância de cada etnia. O município pode contribuir estimulando esse debate que integra a construção do PPPI -‐ Projeto Político Pedagógico Indígena.
7.17 -‐ garantir a participação efetiva de representação municipal, em especial das lideranças comunitárias, no Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena (CEEEI-‐RJ), reconhecendo este como espaço de discussão sobre a educação diferenciada Guarani, em todos os níveis e modalidades
O município de Parati tem acertadamente ocupado seu acento no CEEEI-‐RJ, através de representação da SME. O Conselho foi formado em fins de 2017 e desde então a SME tem enviado sua representação, legitimando o CEEEI-‐RJ.
7.18 -‐ fortalecer, em regime de colaboração com a SEEDUC/RJ, o processo de criação da categoria professor indígena, possibilitando a realização de concurso específico para as escolas Guarani.
O processo deve ser aberto pela SEEDUC/RJ, mas o município pode contribuir criando também a categoria Professor Indígena no seu sistema, de maneira que possa eventualmente colaborar no atendimento às escolas indígenas.
7.19 -‐ garantir o cumprimento das determinações legais vigentes para a educação diferenciada das comunidades tradicionais, com destaque para a deliberação nº 286/04 do CEE/RJ no que se refere à educação para os povos indígenas.
O município pode ajudar a cumprir a lei, assumindo seu papel num regime de colaboração com o Estado do Rio de Janeiro.
7. Demandas e recomendações5
A principal reivindicação do Fórum de Comunidades Tradicionais é que seja garantido o direito à Educação Diferenciada às comunidades caiçaras, indígenas e quilombolas do município de Paraty, ou seja, a Educação Básica para as comunidades tradicionais e populações do campo nas próprias comunidades, articulando seu currículo com o contexto cultural, étnico, social, territorial e tradicional, conforme está previsto em seu Plano Municipal de Educação. A seguir, registramos as principais reivindicações por cada uma das etnias que compõem o FCT.
Demandas da educação escolar caiçara
1. Cumprir os prazos estabelecidos por lei no Plano Municipal de Educação (2015), quanto à criação de instância da SME para trabalhar com a educação diferenciada em 3 anos (estratégia 7.21), adequar as escolas situadas em núcleos caiçaras (estratégia 7.14) e abrir duas escolas em comunidades tradicionais a cada dois anos (estratégia 7.31).
2. Definir administrativamente as escolas situadas em comunidades caiçaras como Escolas Caiçaras, dentro da categoria Escolas do Campo, e realizar concurso específico para essas comunidades.
3. Implementar um programa de reorientação curricular nas escolas de 1o segmento com formação continuada dos professores, para incorporar os elementos da cultura caiçara e do território no ensino;
5 O Dossiê foi elaborado para ser entregue ao Ministério Público Federal, por ocasião de uma reunião lá realizada em fevereiro de 2018. Desde então, alguns avanços se fizeram notar nas ações do poder municipal e estadual, avanços estes que precisam ser consolidados e ampliados, mas que já são um resultado imediato da atuação do movimento social, não só junto as instâncias do Poder Público, mas também na base comunitária que sustenta a luta pelo direito à educação das comunidades tradicionais.
No âmbito da educação escolar caiçara, em maio de 2018 houve finalmente a chegada de mais professores, totalizando 4 professores para atender as turmas de 6o, 7o e 8o ano das escolas da Praia do Sono e do Pouso da Cajaíba. A formação dos professores nos anos iniciais do Ensino Fundamental da Zona Costeira de Paraty também teve início em março de 2018, atendendo oito escolas situadas em comunidades caiçaras. Ainda está pendente a regulamentação. Na educação escolar indígena, o ano se iniciou com a perspectiva da criação do magistério indígena, que, foi aprovado pelo Conselho Estadual de Educação e planejado para iniciar em julho de 2018. Os primeiros seminários de planejamento curricular foram programados para maio e junho e se realizarão em Angra dos Reis.Já na educação escolar quilombola, o movimento de reorientação curricular nos anos iniciais das escolas do Cabral e do Campinho tiveram prosseguimento, mas ainda está pendente sua regulamentação. Por outro lado, a Secretaria Municipal de Educação ainda não apresentou resposta satisfatória em relação aos anos finais do Ensino Fundamental quilombola.
4. Garantir a participação da comunidade na gestão democrática da escola, através dos diferentes mecanismos participativos (Ex: conselho escolar, associação de pais e mestres, construção coletiva do Projeto Político Pedagógico das escolas).
5. Regulamentar todo o processo de implantação do 2o segmento de Ensino Fundamental nas comunidades caiçaras (termo de cooperação SME e UFF, ampliação das escolas para o 2o segmento, currículo diferenciado).
6. Disponibilizar pelo menos quatro professores da rede municipal para lecionarem nas escolas onde já está ocorrendo processo de reorientação curricular (Praia do Sono e Pouso da Cajaíba), tendo em vista atender a diferentes áreas do conhecimento -‐ nos dois últimos anos somente três professores atenderam as escolas caiçaras de 2o segmento, sob a alegação de falta de verba para a manutenção de mais um professor nessas comunidades;
7. Organizar as turmas em pelo menos dois ciclos (6o e 7o ano/ 8o e 9o ano), de modo a evitar a concentração de alunos de mais de dois anos diferentes na mesma turma -‐ nos dois últimos anos só havia turmas de 6o e 7o, mas em 2018 teremos além destas séries, o 8o ano, e, em 2019, os quatro anos do 2o segmento do Ensino Fundamental;
8. Estabelecer a Escola Municipal Cajaíba, no Pouso da Cajaíba, como polo para atender as comunidades de seu entorno (Itaoca, Ipanema, Calhaus, Praia Grande da Cajaíba e Ponta da Juatinga), garantindo transporte marítimo para os alunos moradores das mesmas. Atualmente, há mais de 10 crianças nessas praias da Cajaíba com o 1o segmento do Ensino Fundamental concluído, mas sem acesso ao 2o segmento;
9. Atender os alunos da comunidade de Ponta Negra para que tenham acesso ao 2o segmento regular, uma vez que a escola da comunidade só oferece o 1o segmento. Uma estimativa atual indica que há entre 25 e 30 alunos que concluíram o 5o ano mas não puderam continuar os estudos, pois não há escola de 2o segmento na comunidade, nem transporte para a escola na comunidade vizinha (Praia do Sono), nem para a cidade.
10. Atender aos alunos das comunidades do Saco do Mamanguá para que tenham acesso ao 2o segmento regular. Uma estimativa atual indica que cerca de 25 a 30
alunos precisam fazer um deslocamento diário de pelo menos três horas, com travessia de barco e ônibus para estudarem na cidade, ocasionando perda de aulas, dificuldade no desempenho e abandono da escola.
11. Oferecer condições de infraestrutura adequadas para o funcionamento das escolas das comunidades caiçaras, com a disponibilidade de equipamentos (datashow, impressora/xerox, computadores), material escolar (livros didáticos, biblioteca, material de consumo) e instalação de internet, garantindo recursos para a melhor preparação das aulas e atividades.
12. Garantir condições de trabalho adequadas aos profissionais da escola, especialmente alojamento e transporte para os professores/as e funcionários/as.
13. Oferecer merenda escolar durante todo o ano, do primeiro ao último dia de aula. As dificuldades de contratação de merendeiros/as é sempre apresentada como um problema, mas é preciso buscar soluções como a contratação de merendeiros/as das comunidades ou dispostos/as a irem para elas, através de seleção específica e em período anterior ao início do ano letivo.
14. Dar prosseguimento ao trabalho de reorientação curricular no 2o segmento das escolas do Sono e do Pouso e ampliá-‐lo para as escolas que vierem a ser abertas para atender as demais comunidades.
Demandas da educação escolar quilombola
15. Cumprir a estratégia 7.23 do PME que indica a implantação de uma escola quilombola no Ensino Fundamental pleno (com 1o e 2o segmento), escola essa que tem sido defendida no Quilombo do Campinho.
16. Dar continuidade à reorientação curricular no 1o segmento das escolas dos quilombos do Campinho e do Cabral e ampliar essa formação para o 2o segmento.
17. Atender as demandas de Educação de Jovens e Adultos para a concluírem o 2o segmento do Ensino Fundamental na escola do Campinho.
Demandas da educação escolar indígena
18. Efetivar o Regime de Colaboração entre Estado e município, previsto na Constituição e na LDB.
19. Garantir o transporte dos Conselheiros Indígenas de Parati (Aldeias de Parati Mirim, Araponga e Rio Pequeno) às reuniões mensais do CEEEI-‐RJ.
20. Colaborar com o transporte dos alunos indígenas ao Ensino Médio Indígena que terá início em 2018 no Bracuí, Angra dos Reis.
21. Ceder professores do Município de 6o ao 9o Anos para atuarem no Colégio Indígena (Aldeia Paraty Mirim).
Anexo: Meta 7 do Plano Municipal de Educação de Paraty (2015)
Educação para as Comunidades Tradicionais
META 7 -‐ Garantir a oferta da Educação Básica, em especial dos anos iniciais do Ensino Fundamental, para as comunidades tradicionais e populações do campo nas próprias comunidades, articulando o seu currículo com o contexto rural, étnico, e com as tradições locais, atendendo às determinações legais vigentes e respeitando a articulação entre os ambientes escolares e comunitários.
Estratégias:
7.1 -‐ fomentar a articulação de parcerias institucionais, mediante consulta prévia livre e informada à comunidade diretamente envolvida, em conformidade com o Decreto Federal 6040, de fevereiro de 2007, com a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012, com a Convenção 169 da OIT e Diretrizes para a Educação Escolar Quilombola, para garantir a oferta de Educação Infantil às populações do campo, prioritariamente das comunidades Caiçaras, comunidades indígenas e quilombolas, nas respectivas comunidades, mediante a avaliação, o acompanhamento e a supervisão da Secretaria Municipal de Educação.
7.2 -‐ priorizar e garantir o acesso e a permanência à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental, em especial dos anos iniciais, nas escolas das comunidades tradicionais e populações do campo, limitando a nucleação dessas escolas e o deslocamento de crianças, de forma a atender às especificidades dessas comunidades, garantindo consulta prévia livre e informada quando necessário, com atenção especial às comunidades costeiras de dificílimo acesso, com a oferta dos anos finais do Ensino Fundamental Regular e Ensino Médio;
7.3 -‐ desenvolver, através de parceria entre a SME, movimentos comunitários e outras instituições, tecnologias pedagógicas atuais, com a implementação da energia elétrica, mesmo que de fonte alternativa com comprovada eficiência e devida manutenção, que combinem, de maneira articulada, a organização do tempo e das atividades didáticas entre a escola e o ambiente comunitário, considerando as especificidades das escolas do campo e das comunidades tradicionais, sob a perspectiva da inclusão digital através da escola, garantindo a consulta prévia livre e informada;
7.4 -‐ articular com instituições públicas a garantia de matrículas gratuitas de Ensino Médio integrado à Educação Profissional, observando-‐se as peculiaridades das populações do campo e das comunidades tradicionais, assegurando às mesmas consulta prévia livre e informada;
7.5 -‐ fomentar a articulação intersetorial para a implantação de programas de educação e de cultura para a população de jovens e adultos do campo e comunidades tradicionais, assegurando às mesmas consulta prévia livre e informada, priorizando os que estejam fora da escola e/ou com defasagem no fluxo escolar, visando promover sua qualificação social e profissional;
7.6 -‐ implantar, conforme o Plano de Ações Articuladas (PAR), ao longo deste PME, salas de recursos multifuncionais e garantir a formação político-‐pedagógica continuada de professores e professoras para o atendimento educacional especializado nas escolas do campo e das comunidades tradicionais.
7.7 -‐ garantir a alfabetização de crianças do campo e de comunidades tradicionais nas suas próprias comunidades, buscando quando necessário sob consulta prévia a produção de materiais
didáticos específicos, construídos em conjunto com a comunidade, e desenvolver instrumentos de acompanhamento que considerem as especificidades de cada comunidade e seus processos pedagógicos, bem como o uso da língua materna pelas comunidades indígenas e a identidade cultural das comunidades tradicionais;
7.8 -‐ promover, em articulação com associações comunitárias, movimentos sociais e com entidades públicas e privadas, o atendimento às escolas do campo e de comunidades tradicionais na oferta de educação em tempo integral, com base em consulta prévia livre e informada, considerando-‐se as peculiaridades locais;
7.9 -‐ fomentar o desenvolvimento sustentável e a preservação da identidade cultural nas escolas das comunidades tradicionais, garantindo a participação da comunidade na definição do modelo de organização pedagógica e de gestão das instituições, consideradas as práticas socioculturais e as formas particulares de organização do tempo;
7.10 – garantir junto ao governo do estado conforme a legislação específica que nas comunidades indígenas, seja ofertada a educação infantil tradicional em língua materna e a oferta bilíngue nos anos iniciais do ensino fundamental, em língua materna e em língua portuguesa, a reestruturação e a aquisição de equipamentos, a oferta de programa para a formação inicial e continuada de profissionais da educação e o atendimento em educação especial, que considerem as especificidades de cada comunidade, bem como processos pedagógicos presentes na cultura Guarani, respeitando as faixas etárias escolares, conforme Deliberação CEE/RJ nº 286/2003, definidas em consulta, prévia livre e informada; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 026/2015).
7.11 -‐ promover a elaboração de currículos e propostas pedagógicas específicas para educação escolar nas escolas do campo e das comunidades tradicionais, em conjunto com as comunidades, com abordagens interdisciplinares que organizem de maneira flexível conteúdos teóricos e práticos articulados, respeitando todos os seus aspectos e incluindo os conteúdos culturais, sociais, políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia, correspondentes às respectivas comunidades, considerando o fortalecimento das práticas socioculturais e da língua materna de cada comunidade indígena, garantindo a produção e a disponibilização de materiais didáticos específicos;
7.12 -‐ fomentar o atendimento do ensino médio gratuito integrado à formação profissional para as populações do campo e para as comunidades tradicionais, de acordo com os seus interesses e necessidades;
7.13 -‐ assegurar o atendimento específico às populações do campo e comunidades tradicionais, em relação a acesso, permanência, conclusão e implementação de programas específicos para formação de profissionais de educação diferenciada das comunidades, garantindo a atuação desses profissionais nessas escolas;
7.14 -‐ garantir, em até 03 anos, a adequação de escolas em núcleos caiçaras inseridos ou não em UC’s, assegurar a regulamentação da Educação Caiçara, com a participação dos Movimentos Sociais e Comunitários garantindo o direito às comunidades de preservarem suas manifestações culturais, valorizando a pedagogia Griô, considerando a Pedagogia da Alternância e a sustentabilidade do território, em conformidade com o Decreto Federal 6040, de fevereiro de 2007, com a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012, com a Convenção 169 da OIT; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº027/2015)
7.15 -‐ garantir que a alimentação escolar respeite a legislação vigente do PNAE, incorporando elementos que respeitem a cultura alimentar local, observando as peculiaridades do ambiente e a sustentabilidade, valorizando a agricultura tradicional e agroecológica, dialogando com os mestres xeramões, griôs e de saberes locais;
7.16 -‐ estabelecer critérios para o perfil do profissional que atuará nas escolas das comunidades tradicionais e assegurar que a atividade docente seja exercida, preferencialmente, por professores (as) oriundos (as) das mesmas, conforme preconiza a Convenção 169 da OIT e Diretrizes Curriculares para a Educação Quilombola, estabelecendo prazos para a realização de concurso público específico, implementando formação específica para a atuação dos docentes;
7.17 -‐ garantir a participação efetiva de representação municipal, em especial das lideranças comunitárias, no Conselho Estadual de Educação Indígena, reconhecendo este como espaço de discussão sobre a educação diferenciada Guarani, em todos os níveis e modalidades;
7.18 -‐ fortalecer, em regime de colaboração com a SEEDUC/RJ, o processo de criação da categoria professor indígena, possibilitando a realização de concurso específico para as escolas Guarani;
7.19 -‐ garantir o cumprimento das determinações legais vigentes para a educação diferenciada das comunidades tradicionais, com destaque para a deliberação nº 286/04 do CEE/RJ no que se refere à educação para os povos indígenas;
7.20 -‐ desenvolver, mediante consulta prévia à comunidade diretamente envolvida, em conformidade com a Convenção 169 da OIT, em articulação com os entes federados e universidades, pesquisas de modelos alternativos de atendimento escolar para a população do campo e comunidades tradicionais que considerem as especificidades locais e as boas práticas nacionais e internacionais, além da Pedagogia da Alternância, garantindo a socialização dos resultados em linguagem apropriada;
7.21 – propor a criação de instância no prazo de até 03 (três) anos, observada a LRF (Lei 101/2000) a contar da data de publicação desta Lei, no âmbito da Secretaria Municipal de Educação que garanta de forma permanente a organização, o acompanhamento, a avaliação e a socialização das ações para implementação da educação diferenciada nas comunidades tradicionais do município, em conformidade com o Decreto Federal 6040, de fevereiro de 2007, com a Lei Municipal 1835, de 10 de janeiro de 2012 e Convenção 169 da OIT; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 028/2015).
7.22 -‐ promover, através da SME, em conjunto com as comunidades tradicionais, em articulação com outras entidades, a realização de estudos sobre a educação das mesmas, articulando essas comunidades com as escolas do entorno, tendo como finalidade criar e implementar metodologias diferenciadas de trabalho docente dirigidas para o reconhecimento e a valorização da identidade, da Cultura e da Memória, visando a elevação da autoestima destes povos, em especial crianças e jovens;
7.23 -‐ garantir, no prazo de 02 anos, em conjunto com as comunidades Quilombolas, a implantação da Escola Quilombola, em regime de cooperação entre a SME e as Associações Quilombolas, conforme preconizam a LDBEN 9394/96 e a Resolução CNE nº 04/2010, e Diretrizes Curriculares para Educação Quilombola, visando à oferta da Educação Infantil e do ensino fundamental pleno de forma articulada com o contexto rural, étnico e tradicional dessas comunidades, considerando a Pedagogia da Alternância.
7.24 -‐ prever no calendário escolar a participação efetiva das Escolas Quilombolas municipais no ENCONTRO DA CULTURA NEGRA, que se realiza anualmente no Quilombo do Campinho da
Independência, e consequentemente, o recesso escolar quando necessário, de forma articulada com o Conselho Escolar da Unidade Escolar;
7.25 -‐ promover a articulação com a SEEDUC/RJ, de forma a garantir o atendimento do Ensino Médio gratuito, podendo ser integrado à formação profissional para as populações do campo e para as comunidades tradicionais, em seus territórios, de acordo com os seus interesses e necessidades;
7.26 -‐ garantir que na organização, administração e gestão da educação para as comunidades tradicionais, os critérios científicos e pedagógicos prevaleçam sempre sobre quaisquer critérios de natureza administrativa ou outra que claramente não se compatibilize com as escolas e práticas educativas que delas decorrem;
7.27 -‐ promover o processo de gestão democrática em todas as escolas das comunidades tradicionais, de acordo com a legislação vigente, garantindo a autonomia dos Conselhos Escolares e sua participação na construção do Projeto Político Pedagógico;
7.28 -‐ garantir a implementação de calendários escolares diferenciados, respeitando os tempos e atividades de cada comunidade tradicional;
7.29 – (Suprimida) – Emenda Supressiva nº 001/2015 (Texto suprimido: 7.29 -‐ criar Conselho Deliberativo de Educação Diferenciada das comunidades tradicionais, composto por movimentos sociais e comunitários, além da SME, para definir e regular o modelo de organização pedagógica e gestão da educação escolar das mesmas);
7.30 -‐ reconhecer as especificidades das comunidades costeiras, atendendo a toda demanda de acesso à educação escolar, independente do número de crianças em idade escolar, garantindo a escolarização em nível fundamental, em unidades escolares mais próximas à comunidade de origem; (Redação dada pela Emenda Modificativa nº 030/2015).
7.31 – Implementar , a expansão do Ensino Fundamental nos anos finais nas comunidades tradicionais e do campo, em pelo menos 02 escolas, a cada 02 anos, mediante estudo da necessidade das comunidades em questão, considerando a Pedagogia da Alternância e em conformidade com as metodologias participativas e dialógicas.
Referências
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