Contract
EXCELENTÍSSIMA CONSELHEIRA-SUBSTITUTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE GOIAS HELOÍSA XXXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXX XXXXXXX, NOS TERMOS DA RESOLUÇÃO TCE Nº 12/2012.
EMENTA: Representação. SANEAGO. Contratações diretas de empresas intermediadoras de shows. Ausência de distinção nas contratações diretas entre shows de artistas e bens e serviços para viabilização desses shows. Ilegalidade das despesas. Concessão de liminar para bloqueio do pagamento. Comunicação ao Ministério Público do Estado. Aplicação de multa aos responsáveis.
1 – A realização de contratações diretas de shows, por meio de empresas não detentoras de real exclusividade e englobando bens e serviços que não os estritamente previstos no inciso III do artigo 25 da Lei de Licitações (LLC), ofende o disposto nesse mesmo dispositivo e os artigos 19, I, e 37, XXI, da CF/88;
2 – Porque se exige a fiel observância da LLC, descabe o pagamento de despesa decorrente de atuação contrária à lei e à Constituição;
3 – Presentes a fumaça do bom direito e o perigo da demora, impõe-se a concessão de liminar, para obstar a quitação de despesa realizada manifestamente contrária ao ordenamento jurídico;
3 – Da irregularidade da despesa, decorre o dever de a Corte de Contas aplicar sanções aos responsáveis;
4 - Irregularidades que indicam a possível ocorrência de atos delituosos e de improbidade: art. 10, incisos V e VIII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/92; art. 89 da LLC. Dever de comunicação ao MP-GO, em razão do disposto no artigo 102 da LLC.
EXCELENTÍSSIMA CONSELHEIRA-SUBSTITUTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE GOIAS HELOÍSA XXXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXX XXXXXXX, NOS TERMOS DA RESOLUÇÃO TCE Nº 12/2012.
O MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS DO
ESTADO DE GOIÁS, no desempenho de sua missão institucional de defender a ordem jurídica, o regime democrático, a guarda da Lei e fiscalizar sua execução, no âmbito das contas do Estado de Goiás, com fundamento no inc. V do artigo 91 da Lei nº 16.168, de 11 de dezembro de 2007, c/c o inciso V do artigo 235 do Regimento Interno TCE-GO, vem oferecer a seguinte
R E P R E S E N T A Ç Ã O
C / C P E D I D O L I M I N A R
I N A U D I T A A LT E R A P A R T E
em face dos Avisos de Inexigibilidade de Licitação nºs 6.2-010/2013, 6.2-11/2013, 6.2-012/2013 e 6.2-013/2013 --- respectivamente, de 12 de abril, 17 de maio, 10 de maio e de 10 de junho, todos fundamentados no caput do artigo 25 da Lei nº 8.666/93 e no artigo 33 da Lei Estadual 17.928, de 27 de dezembro de 2012 --- e das correlatas contratações diretas, atos esses realizados pela SANEAMENTO DE GOIÁS - SANEAGO, por intermédio de seu Diretor-Presidente, XXXX XXXXX XX XXXXX, pelas razões que se colocam.
I – DOS FATOS
1. No Diário Oficial do Estado de Goiás do dia 30 de julho de 2013, a SANEAGO fez publicar 04 (quatro) avisos de inexigibilidade de licitação para a contratação direta de artistas, para a divulgação junto às respectivas populações locais da importância de Estações de Tratamento de Água e de Esgoto Sanitário da SANEAGO, conforme abaixo especificado:
Nº do Aviso | Artista | Empresa Contratada | Valor | Dia do Evento | Dia da Assinatura do Ato | Local do Evento |
6.2-010/2013, | Leonardo | MR Transportes e Serviços Ltda. | R$ 150 mil | 14.05.13 | 12.04.13 | Acreúna |
6.2-11/2013, | Xxxxxxx Xxxxx | MR Transportes e Serviços Ltda. | R$ 140 mil | 24.05.13 | 17.05.13 | Corumbaíba |
6.2-012/2013 | Guilherme & Santiago | HC ROSA PROMOÇÕES ARTÍSTICAS LTDA. | R$ 140 mil | 10.05.13 | 10.05.13 | Goianésia |
6.2-013/2013 | Racyne & Xxxxxx, Xxxx Xxxxxx & Xxxxxxx e Xxxxxxxx | MR Transportes e Serviços Ltda. | R$ 280 mil | 14.06.13 | 10.06.13 | Itumbiara |
(doc. 01, xxxx://xxx.xxxxxx.xx.xxx.xx/XXX/0000/00/00/000.xxx, em anexo).
II – FUNDAMENTAÇÃO
A – DA AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO
1. O princípio do interesse público baliza a definição do âmbito dos fins passíveis de legítima persecução pela Administração Pública.
2. Conforme magistério de Xxxxx, Xxxxxx e Stober, o princípio do interesse público é “um princípio estrutural, não escrito, de toda a forma de manifestação da Administração. Por isso, a atuação no interesse público faz parte dos elementos conceptuais e funcionais mais marcantes da Administração Pública (...) e constitui o fundamento da execução administrativa”1.
3. De acordo com o magistério de Xxxxxx Xxxxxx, a Administração Pública “não tem por função atender a esse interesse secundário, pessoal, mas sim realizar o interesse coletivo, público, primário, visto que o interesse secundário, pessoal, da Administração Pública, assim como qualquer interesse secundário dos particulares, só pode ser atendido em caso de coincidência, e nos limites da coincidência, com o interesse público”2.
4. O interesse público primário somente se concretiza com a tutela do interesse coletivo, do bem comum, do que é do interesse da cidadania. Em suma, interesse público primário, o verdadeiro interesse público, só pode ser, sempre, o interesse coletivo:
“Verdadeiros interesses coletivos públicos são os interesses da Comunidade. Estes orientam-se para a existência de uma ordem social pacífica, para a salvaguarda da dignidade e da honra do ser humano, para a possibilidade de posse, de propriedade e de relações jurídicas (Rechtsverkehr), para a possibilidade e a promoção da imagem, da cultura, da economia e do ambiente; em suma, para a criação ou a salvaguarda de uma situação jurídica material que seja conforme às realidades em causa” (XXXXX et alii, idem, p. 427).
1 In Direito Administrativo, vol. 1, p. 424, Fundação Calouste Gulbenkian, 2006.
2 In Sistema Istituzionale del Diritto Amministrativo Italiano, p. 152, Giuffrè Editore, 1953.
5. Sendo a persecução do interesse público primário a realização desses verdadeiros interesses coletivos, é evidente que os fins da ação do Poder Público, ou dizendo-o, numa linguagem mais jurídica, as funções do Poder Público, só poderão ser a tutela desses verdadeiros interesses coletivos.
6. No caso presente, o interesse público cabalmente anda em sentido contrário ao da realização de despesas dessa natureza, notadamente porque, por meio da Resolução nº 009, de 19 de outubro de 2011, que aprovou “ad referendum do Plenário do CIPAD projeto de subdelegação de sistemas de esgotamento sanitário em áreas urbanas de 5 (cinco) cidades pela Saneamento de Goiás S/A – SANEAGO”, se considerou que “a situação atual das finanças do Estado de Goiás, e em consequência da Saneamento de Goiás S/A – SANEAGO, que mostram dificuldades no investimento de curto prazo para financiar a expansão dos sistemas de esgotamento sanitário em todo o território goiano, com a concessão desta modalidade de serviço público à empresa ou consórcio de empresas, representa uma alternativa legal e viável econômica e financeiramente para a melhoria efetiva das condições de vida e saúde da população goiana” (doc. 02, xxxx://xxx.xxxxxx.xx.xxx.xx/XXX/0000/00/00/000.xxx, em anexo).
7. Por conseguinte, carecedora de recursos que é para investimentos em sua atividade-fim (por isso busca a realização de subdelegações --- sem se adentrar o mérito de sua (im)possibilidade jurídica), injustificada é a feitura de eventos artísticos, com o fito de propalar a inauguração de Estações de Tratamento Sanitário ou de Água, ainda mais porque a SANEAGO não se encontra em um regime concorrencial e suas ações não estão em livre oferta no mercado bursátil; disso resulta a flagrante desnecessidade de tais despesas, que, em verdade, se revelam inúteis, antieconômicas e possivelmente com cunho meramente eleitoreiro.
B - DA INDEVIDA CONTRATAÇÃO DIRETA
8. Os avisos de inexigibilidade de licitação revelam o favorecimento de empresas não detentoras de real exclusividade e o possível açambarcamento de bens e serviços que não os estritamente previstos no inciso III do artigo 25 da Lei de Licitações (LLC), em ofensa ao disposto nesse mesmo dispositivo e aos artigos 19, I, e 37, XXI, da CF/88.
9. Em tempos de recursos escassos, com muito mais razão deve o gestor buscar a planejada, transparente, eficaz e eficiente aplicação de recursos públicos.
10. No entanto, diversamente do esperado, o Presidente da SANEAGO, XXXX XXXXX XX XXXXX, está a possibilitar a realização de contratações, com fundamento no já transcrito inciso III do artigo 25 da LLC, não “diretamente ou através de empresário exclusivo”, mas sim por meio de empresa interposta (DOE-GO mencionados), o que onera indevidamente os custos da contratação3, além da contrariedade frontal ao citado dispositivo da LLC.
11. Tão somente a título de exemplo, porquanto em todos os 04 (quatro) atos aqui vergastados foram favorecidas empresas interpostas, o cantor XXXXXXXX é artista cujo representante exclusivo é a empresa TALISMÃ, conforme informação retirada da página eletrônica do próprio artista, in verbis:
“Criada em 2005 para administrar a carreira do cantor Xxxxxxxx, a Talismã Music é um dos maiores escritórios do show business brasileiro. As experiências adquiridas nos primeiros anos abriram novas oportunidades para a expansão e profissionalização da empresa. Hoje, a Talismã Music se destaca em todas as áreas de atuação, especialmente no agenciamento de artistas exclusivos como Xxxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxx, Xxxxxxxxx Xxxxxx,
3 Ingenuamente, onera-se, no mínimo, com a incidência de duplo ISS: o primeiro, que o artista embute no preço cobrado do empresário que lhe contrata; o segundo, que o empresário contratado pelo Estado inclui no preço, pois tem de pagar à Prefeitura pelo serviço.
Xx Xxxxxxx e Xxxxxx, Xx Xxxxxx & Xxxxxxx e Trio Xxxxxx Xxxx. A empresa desenvolve projetos inovadores relacionados à música, shows, divulgação, selo e editora musical. Essas ações buscam potencializar e amplificar o público do seu cast. Seu portfólio inclui produções de grandes eventos, exposições, gravação de CD s e DVD s, campanhas publicitárias e cinema” (in
xxxx://xxxxxxx.xxx.xx/0000/#xxxxxxx/, acesso em 31 de julho de 2013).
12. Com efeito, a MR TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA. não é representante exclusiva dos cantores escolhidos para a realização dos eventos, mas, sim, apenas possui prévia e “coincidentemente” contratos com referidos artistas, para a realização de shows nos dias e nas localidades em que a SANEAGO a contratou. Prova disso é o documento colacionado a esta inicial, comprovando que a MR TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA. contratou com a empresa TALISMÃ ADMINISTRADORA DE SHOWS E EDITORA MUSICAL LTDA., esta sim representante exclusiva do cantor XXXXXXXX (doc. 03, em anexo).
13. A propósito da empresa MR TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA., recente matéria na mídia local (doc. 04, em anexo) noticia que referida empresa possui endereço fictício, situação que indica mais uma irregularidade a preocupar o MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS e a sociedade goiana, pois a despesa, além de irregular, tende a ser de difícil recomposição ao erário.
14. No tocante à empresa 2 HC ROSA PROMOÇÕES ARTÍSTICAS LTDA., revela-se que os valores contratados a título de inexigibilidade envolve a prestação de serviços que deveriam ser licitados (“No valor do cachê acima citado, estão inclusas todas as despesas com transporte, alimentação e cachês banda e equipe técnica”) (doc. 05, em anexo).
15. Não sendo as empresas beneficiadas empresárias exclusivas dos artistas, as inexigibilidades de licitação favoráveis a elas são contrárias à lei e lesivas ao erário.
16. É de se notar que a contratação direta de artistas ou empresários exclusivos é pressuposto básico para configuração da inviabilidade de competição. No entanto, as negociações estão a ocorrer com empresas intermediárias, tornando-se, portanto, necessária a observância da regra geral que impõe o dever de licitar.
17. Regra geral e de forma contrária à lei, as empresas contratadas utilizam-se de cartas de exclusividade limitadas a determinados dias e locais. A exclusividade temporária afasta a premissa da inviabilidade de competição e, consequentemente, a aplicação do inciso III do art. 25 da Lei nº 8.666/93, haja vista que, em outras datas e com outros empresários e empresas, o mesmo artista poderia ser contratado por valor diverso.
18. Sobre o assunto, leciona Xxxx xx Xxxxxxx Xxxxxxx com extrema precisão para o caso presente, ipsis verbis:
“O cerne desse requisito (ele está a se referir ao inciso III do artigo 25 da LLC) é impedir que o contrato seja firmado com empresário que não seja exclusivo. Poder-se-ia supor que a razão dessa exigência seja tributária da obrigatoriedade da licitação pública, porquanto, se há mais de um empresário, presume-se a possibilidade de competição entre eles. Entretanto, não faria sentido realizar licitação sob essas condições. Em vez de abrir disputa entre supostos empresários, é mais sensato firmar o contrato direto com o artista, eliminando atravessadores e economizando dinheiro.
A proibição de contratar com empresário não exclusivo é medida prestante a impedir que terceiros aufiram ganhos desproporcionais às custas dos artistas. Ora, o empresário exclusivo tem com o artista contrato que lhe assegura a exclusividade, cujas cláusulas provavelmente estipulam qual o montante sobre porcentagem dos valores recebidos. Já o empresário não exclusivo paga ao artista o valor por ele estipulado e, com isso, vê-se livre para acertar com o Poder Público o preço que quiser cobrar, o que lhe faculta estabelecer a sua remuneração em valores bastante elevados, até bem acima do que ganha o artista. Assim sendo, por obséquio à economicidade e à moralidade administrativa, que se celebre o contrato diretamente com o artista.
...
Em que pese tais considerações, reconhece-se que tem havido abusos no que tange às intermediações de empresários. Há empresários que apresentam contrato de exclusividade com data e local determinados. Trocando-se em miúdos: exclusividade para show no dia XX e no Município XX. Em muitos desses casos, o gestor público entra em contrato com o empresário e relata o interesse em contratar o artista para apresentação numa determinada data comemorativa. O empresário, então, entra em contato com o artista e assina o contrato de exclusividade para o dia e local específico. À evidência, o empresário não é exclusivo. Tal contrato é um embuste, simulação para justificar a contratação direta por meio de empresário que não é exclusivo, em desalinho ao determinado pelo inciso III do artigo 25 da Lei nº 8.666/93” (in Dispensa e inexigibilidade de licitação pública, editora Fórum, 3ª edição, 2011, com destaques acrescidos).
19. Na jurisprudência pátria, notadamente a do Tribunal de Contas da União, são múltiplos os precedentes, sendo que deles se extraem trechos do Acórdão nº 2.070-Plenário, de 10 de agosto de 2011:
“[Consulta formulada por Assessor Especial de Controle Interno do Ministério do Turismo/MTur acerca de contratações artísticas com pagamento de cachê. Contratação por inexigibilidade. Não conhecimento da consulta por não preencher requisitos de admissibilidade. Considerações sobre o tema.]
[ACÓRDÃO]
9.1. não conhecer da presente consulta, por não preencher os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1º, inciso XVII, da Lei nº 8.443/1992 c/c arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU;
[VOTO]
A presente consulta, encaminhada a este Tribunal pelo Assessor Especial de Controle Interno do Ministério do Turismo, Sr. [omissis], oferece as hipóteses abaixo elencadas e questiona se, para fins de aprovação dos planos de trabalho de convênios concernentes a contratações artísticas com pagamento de cachês, a serem firmados junto ao Ministério do Turismo, este Tribunal entenderia que foram atendidas as determinações do TCU insertas no Acórdão nº 2.163/2011-TCU-2ª Câmara:
a) apresentação de contrato entre artista e empresário e de outro contrato entre empresário e uma empresa, ambos registrados em cartório; o último com data específica para a apresentação artística; a empresa apresenta a carta de exclusividade com a proposta de preços direcionada ao convenente;
b) apresentação de contrato entre artista e empresário, de declaração do empresário afirmando que uma empresa detém a exclusividade da data indicada para a apresentação artística e de carta de exclusividade da empresa com proposta de preços direcionada ao convenente;
c) apresentação de procuração ou declaração de artista para empresa, autenticada em cartório, em vez de contratos; a procuração/declaração é juntada ao plano de trabalho, sob alegação de proteção do contrato por sigilo comercial;
d) apresentação de declaração de empresa em que informa a propriedade de banda musical e da marca respectiva.
2. A zelosa 5ª Secretaria de Controle Externo - 5ª Secex, em instrução sucinta, dispôs com clareza o posicionamento desta Corte a respeito do assunto, notadamente o entendimento contido nos Acórdãos nº 2.163/2011-TCU-2ª Câmara e 96/2008-TCU-Plenário.
3. Sem embargo, concordo com a unidade técnica quando demonstrou a inadmissibilidade desta consulta à luz do art. 1º, inciso XVII, da Lei nº 8.443/1992 c/c arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU, e art. 113 da Resolução-TCU nº 191/2006. Na esteira do arrazoado consignado na instrução, o qual incorporo a este voto e adoto como razões de decidir, não conheço da consulta formulada pelo Assessor Especial de Controle Interno, por não atender aos requisitos de admissibilidade pertinentes.
4. Nada obstante, reputo necessário encaminhar ao ilustre consulente cópia da presente deliberação, acompanhada do relatório e voto que a fundamentam, para fins de subsídio, e arquivar os autos, nos termos propostos.
[RELATÓRIO]
II - DA ADMISSIBILIDADE
Com relação aos requisitos de admissibilidade, previstos no art. 1º, XVII, da Lei 8.443/92, c/c art. 264, do Regimento Interno do TCU, e art. 113 da Resolução TCU 191/2006, verifica-se que o Assessor Especial de Controle Interno do MTur não possui legitimidade para formular consultas a este Tribunal. No caso do Poder Executivo, somente possuem legitimidade para formular consultas ao TCU os Ministros de Estado ou autoridades de nível hierárquico equivalente.
Também não foi atendido o requisito de que a consulta verse quanto a dúvidas suscitadas na aplicação de dispositivos legais e regulamentares. A dúvida suscitada refere-se a procedimentos a serem adotados em casos concretos de análise de propostas de convênios.
Destarte, com base nos arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU, propõe-se o não conhecimento da consulta formulada, por não preencher os requisitos de admissibilidade.
Não obstante a ausência dos requisitos de admissibilidade, apresentamos, no tópico a seguir, comentários a respeito das circunstâncias que motivaram a remessa do expediente pelo Assessor de Controle Interno do MTur.
III - EXAME TÉCNICO
O subscritor menciona que a área técnica do MTur tem se deparado, na análise de propostas de convênios, com quatro situações específicas (peça 1, pp.1-2):
a) é apresentado o contrato entre o artista e o empresário, outro contrato entre o empresário e uma empresa, ambos registrados em cartório, e o último com data específica para a apresentação, e a empresa apresentando a carta de exclusividade com a proposta de preço direcionada ao convenente;
b) é apresentado o contrato entre o artista e o empresário, uma declaração do empresário dizendo que uma empresa detém a exclusividade da data específica para a apresentação, e a empresa apresentar a carta de exclusividade com a proposta de preço direcionada ao convenente;
c) o artista e o empresário alegam que seu contrato tem xxxx xxxxxxxx não podendo ser apresentado no plano de trabalho, no entanto apresenta-se uma procuração/declaração do artista para a empresa autenticada em cartório;
d) é emitida uma declaração informando que uma empresa é proprietária da banda e da marca.
Em anexo ao ofício, foram apresentadas cópias de contratos e de declarações relativas a essas situações (peça 1, pp. 04-24).
A dúvida suscitada está relacionada ao cumprimento da determinação contida no subitem `9.3.2.1 do Acórdão 2163/2011 - 2ª Câmara (TC 016.324/2009-3), que, por sua vez, remete ao subitem 9.5.1 do Acórdão 96/2008 - Plenário (TC 003.233/2007-3):
`9.3.2.1. sejam observados os requisitos constantes do subitem 9.5.1 do Acórdão 96/2008-TCU-Plenário, não devendo ser aceitos contratos de exclusividade restritos às datas e às localidades das apresentações artísticas, ou que não tenham sido registrados em cartório (subitem 9.3.2.1 do Acórdão 2163/2011 - 2ª Câmara);
(...)
9.5.1. quando da contratação de artistas consagrados, enquadrados na hipótese de inexigibilidade prevista no inciso III do art. 25 da Lei nº 8.666/1993, por meio de intermediários ou representantes:
9.5.1.1. deve ser apresentada cópia do contrato de exclusividade dos artistas com o empresário contratado, registrado em cartório. Deve ser ressaltado que o contrato de exclusividade difere da autorização que confere exclusividade apenas para os dias correspondentes à apresentação dos artistas e que é restrita à localidade do evento; [...]
Analisando-se as situações mencionadas pelo Assessor de Controle Interno do MTur, as duas primeiras são, basicamente, similares. Referem-se a casos em que o
empresário, que detém a exclusividade do artista, celebrou contrato com terceiro, transferindo a este a posse de uma determinada data de apresentação do artista. Nos planos de trabalho das propostas de xxxxxxxxx foram apresentados: o contrato de exclusividade celebrado entre o artista e o empresário; e o contrato (ou declaração, no segundo caso) de data específica de apresentação entre o empresário e um terceiro. A proposta de preço contida no plano de trabalho se refere à remuneração do terceiro, que detém a data de apresentação coincidente com a da realização do evento.
Como determina o Acórdão 96/2008 - Plenário, somente deve ser aceito como válido para a contratação por inexigibilidade, o contrato de exclusividade entre o artista e seu empresário, registrado em cartório, não prestando o contrato que contém mera exclusividade de data para tal fim. Assim, o contrato e a declaração referentes à data da apresentação, celebrados com terceiros, não devem ser aceitos como elementos de suporte à contratação por inexigibilidade.
Com relação ao terceiro caso, em que o artista e o empresário alegam que o contrato não pode ser apresentado no plano de trabalho por possuir xxxx xxxxxxxx, tampouco deve ser aceita a contratação por inexigibilidade, à luz do que determina o Xxxxxxx 96/2008 - Plenário. Vale repetir, para a contratação enquadrada na hipótese prevista no art. 25, III, da Lei 8.666/93, deve ser apresentada cópia do contrato de exclusividade do artista com o empresário contratado, registrado em cartório. Além disso, como preconiza o princípio administrativo da legalidade, não há que se admitir a contratação por inexigibilidade, no caso em comento, sem que se ateste a existência dos requisitos estabelecidos em lei”.
20. A situação acima descrita encaixa-se naquelas rechaçadas na lição de Xxxx xx Xxxxxxx Xxxxxxx, transcrita anteriormente.
21. Antes que se alegue que os valores a serem pagos pela SANEAGO S/A incluirão a aquisição de outros bens e serviços, é de se ter em conta que os serviços prestados pelos artistas diferem radicalmente dos demais serviços de apoio à apresentação, quais sejam, palco, iluminação, segurança, sonorização, hospedagem, traslados etc.
22. Diversamente do permissivo legal previsto no inciso III do artigo 25, a albergar a contratação “de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública”, os demais
serviços e bens são abarcados pela regra geral prevista no inciso XXI do artigo 37 da CF/88 e no artigo 2º da LLC.
23. Incluir bens e serviços de apoio aos eventos artísticos no âmbito da contratação direta de serviços artísticos resulta na utilização de hipótese de inexigibilidade de licitação a itens não abarcados pela norma excepcionante da licitação, em burla ao princípio da obrigatoriedade da prévia licitação para a contratação com a Administração Pública.
C – Do Indevido Retardamento das Publicações
24. Os atos foram supostamente assinados entre 10 de maio e 10 de junho deste ano, entretanto, somente foram publicados no DOE-GO de 30 de julho de 2013, ou seja, mais de 30 (trinta) dias do transcurso do prazo limite previsto no artigo 26 da Lei de Licitações, a saber:
“Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos”.
25. A toda evidência, tal atraso na publicação, além de ser um claro cerceamento ao acesso à informação, impede a efetividade do controle sobre os atos da administração e permite toda mazela de irregularidades em que uma Administração descontrolada pode incorrer; tal irregularidade deve ser sofrer grave reprimenda por parte do órgão de controle externo.
III - Da Medida Cautelar
26. O artigo 119 da Lei Estadual nº 16.168/07 (Lei Orgânica do TCE-GO) prescreve que “O Tribunal, em caso de urgência, de fundado receio de grave lesão ao erário ou a direito alheio ou de risco de ineficácia da decisão de mérito, poderá, de ofício ou mediante provocação, adotar medida cautelar, nos termos estabelecidos no Regimento Interno, determinando, entre outras providências, a suspensão do ato ou do procedimento questionado, até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão suscitada”. Referida previsão é essencial para a adequada proteção do patrimônio público e da preservação da idoneidade dos atos administrativos.
27. Na visão instrumentalista do processo judicial, que se amolda com perfeição aos processos da Corte de Contas, “O processo, em outras palavras, é instrumental que apenas tem valor quando serve ao direito material e aos escopos da jurisdição” (Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, in Novas linhas do processo civil, Editora Malheiros, 3ª edição, 1999, p. 100).
28. No caso em questão, a concessão de medida liminar almeja suspender
inaudita altera parte qualquer pagamento aos beneficiários.
29. Certo. A concessão de liminar, inaudita altera parte, se faz necessária para se determinar ao Presidente da SANEAGO S/A, XXXX XXXXX XX XXXXX, a imediata suspensão de qualquer procedimento tendente ao pagamento das empresas contratadas, por evidente violação ao disposto no inciso III do artigo 25 da Lei de Licitação.
30. Para a concessão dessa pleiteada e necessária medida liminar --- apta a mitigar o desrespeito à lei de licitações e ao desperdício de recursos públicos ---, estão presentes os requisitos da fumaça do bom direito e do perigo da demora.
31. Certo. A fumaça do bom direito decorre do atentado que se comete ao princípio da legalidade e à regra constante no inciso III do artigo 25 da LLC e de realização de shows sem o atendimento do interesse público.
32. No pertinente ao perigo da demora, sua ocorrência está na possibilidade de pagamento em franca contrariedade ao inciso XXI do artigo 37 da CF/88 e ao inciso III do artigo 25 da LLC, originando despesas irregulares.
33. Note-se que não há se falar em periculum in mora reverso nem em boa-fé, pois, conforme precedente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, “Exigindo Constituição Federal, e a Lei nº 8.666/93 a licitação quando pretende o poder público contratar, não se pode admitir o pagamento que as contrarie, porque, se assim fosse, ferido de morte estaria a exigência de sua realização, já que porta aberta e larga, para fraudes, se abriria” (5ª Turma Cível do TJDFT, unanimidade, relator Desemb. Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx, APC 2010.01.1107571-0)
IV – DOS PEDIDOS
34. Isto posto, requer o Ministério Público de Contas, preliminarmente, a concessão de liminar, inaudita altera parte, para se determinar ao Diretor-Presidente da SANEAGO S/A a imediata suspensão de qualquer procedimento tendente ao pagamento das empresas contratadas, por evidente violação ao disposto no inciso III do artigo 25 da Lei de Licitação.
35. No mérito, requer seja citado o Diretor-Presidente da SANEAGO S/A, XXXX XXXXX XX XXXXX, para, nos termos do inciso V do artigo 258 do Regimento Interno do TCE-GO4, apresentar suas razões de justificativa para as contratações diretas das empresas mencionadas, conforme descrito anteriormente, sem prejuízo de o Ministério Público de Contas requerer posteriormente a citação de todos os envolvidos nesses procedimentos de contratações diretas, à medida em que tiver acesso aos documentos públicos; requer também seja determinado ao Diretor-Presidente da SANEAGO S/A que forneça os documentos referentes às contratações acima impugnadas, incluindo os referentes às respectivas prestações de contas.
36. Apresentadas as razões e/ou decorrido o prazo legal para fazê-lo e realizada a regular instrução do feito nos termos do artigo 102 do RITCE-GO --- que, no caso presente, desde já, se pleiteia célere, para que possa ser útil ---, requer-se sejam declarados ilegais e lesivos ao erário os atos de inexigibilidades já mencionados, bem assim as consequentes contratações diretas, aplicando-se multa ao Diretor-Presidente da SANEAGO S/A, XXXX XXXXX XX XXXXX, sem prejuízo da conversão dos autos em Tomada de Contas Especial, nos termos do inciso III do artigo 99 da Lei Estadual nº 16.168, de 11 de dezembro de 2007 (LOTCE-GO).
37. Confirmadas as irregularidades aqui apontadas, solicita-se, com fulcro no artigo 102 da Lei nº 8.666/93, seja comunicado o Ministério Público do Estado de Goiás do
4 “Art. 258. Ao apreciar processo relativo à fiscalização de atos e contratos, o Relator ou o Tribunal de Contas do Estado:... V – determinará a citação do responsável para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar razões de justificativa, quando verificada a ocorrência de irregularidades decorrentes de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico, bem como infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária ou patrimonial”.
resultado do julgamento desta representação, ante a possibilidade de ocorrência de ações vedadas nos artigos 10, incisos V e VIII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/92, e 89 da LLC.
38. Em caso de descumprimento da decisão da Corte, solicita-se a incontinenti
aplicação das medidas do § 1º do artigo 2595 e do artigo 2606, ambos do RITCE-GO, em caso.
Nestes termos,
Pede e espera deferimento. Goiânia, 31 de julho de 2013.
Xxxxxxxx xxx Xxxxxx Carneiro Procurador do MPC-TCE-GO
5 “Art. 259. Verificada a ilegalidade de ato ou contrato em execução, o Tribunal de Contas do Estado assinará prazo, de até 15 (quinze) dias, para queo responsável adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, com indicação expressa dos dispositivos a serem observados, sem prejuízo do disposto no inciso IV, do caput do art. 99, bem como de seus §§ 1º e 2º, da sua Lei Orgânica. § 1º No caso de ato administrativo, o Tribunal, se não atendido: I – sustará a execução do ato impugnado; II – comunicará a decisão à Assembleia Legislativa e ao Chefe do Poder Executivo; III – aplicará ao responsável, no próprio processo de fiscalização, ressalvado o disposto no art. 210, a multa prevista no inciso VII, do art. 313, ambos deste Regimento”.
6 “Art. 260. O responsável que injustificadamente deixar de adotar as providências determinadas pelo Tribunal de Contas do Estado, no prazo de 15 (quinze) dias contados da ciência da decisão, ficará sujeito à responsabilização e ao ressarcimento das quantias pagas e outros danos causados ao erário após essa data, sem prejuízo de outras sanções legais”.