Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar - Prefeito - Prescrição da preten- são punitiva - Pena in concreto - Extinção da punibilidade - Assunção de obrigação no último ano de mandato ou legislatura - Crime de mera conduta - Prova -...
Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar - Prefeito - Prescrição da preten- são punitiva - Pena in concreto - Extinção da punibilidade - Assunção de obrigação no último ano de mandato ou legislatura - Crime de mera conduta - Prova - Condenação
Ementa: Penal. Preliminar. Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar. Prescrição da pretensão punitiva. Pena in concreto. Lapso prescricional transcorri- do entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória. Mérito. Crime de assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura. Absolvição. Impossibilidade. Amplo conjunto probatório. Crime de mera conduta. Reprimenda mantida.
APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0637.05.029118-5/001 -
TJMG - Jurisprudência Criminal
Comarca de São Lourenço - Apelante: Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx, ex-Prefeito Municipal de Pouso Alto/MG - Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Relatora: DES.ª XXXXX XXXXXXX XXXXX
Acórdão
Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM ACO- LHER PRELIMINAR MINISTERIAL E DECLARAR EXTINTA A PUNIBILIDADE DO APELANTE PELA PRESCRIÇÃO EM RELAÇÃO AO DELITO DO ART. 359-B DO CÓDIGO PENAL. NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 1º de setembro de 2009. - Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx - Relatora.
Notas taquigráficas
DES.ª XXXXX XXXXXXX XXXXX - Trata-se de recur- so de apelação interposto por Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx, ex- Prefeito de Pouso Alto/MG (f. 289) contra sentença ori- unda da Vara Criminal da Comarca de São Lourenço, f. 273/287, que o condenou nas sanções dos arts. 359-B e 359-C, na forma do art. 69, todos do Código Penal Brasileiro.
Segundo a denúncia, o nacional, no exercício da função de Prefeito Municipal de Pouso Alto/MG, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato, expi- rado em 31.12.04, ordenou e autorizou a assunção de obrigações, cuja despesa não pôde ser paga no mesmo exercício financeiro, por ausência de disponibilidade de caixa, bem como ordenou e autorizou a inscrição em restos a pagar das mesmas despesas, que excedem o limite estabelecido na lei.
Portanto, contraiu obrigações de despesa que não puderam ser cumpridas integralmente dentro de seu
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valor da coisa subtraída e sua insignificância no contexto econômico ou no patrimônio da vítima ou do réu, não impli- cando a ausência de lesão em descriminação, pois, inde- pendentemente de valores reais econômicos, o que se preserva com a responsabilização do agente que se dispõe a burlar a lei penal são os valores morais, cobrados pela sociedade [...] (TACrimSP - AC. 1330533/5 - Rel. Xxxx Xxxxxx
de Mello - 11ª Câmara - DJ de 11.11.2002).
O próprio legislador já ponderou situação em que, havendo um grau menor de ofensa ao bem jurídico, alia- do às circunstâncias subjetivas favoráveis ao agente, aplica-se o privilégio com o benefício da substituição da pena de reclusão pela de detenção, ou, alternativa- mente, a diminuição de dois terços da mesma, ou, ainda, aplica-se exclusivamente a pena de multa como procedeu, no caso em voga, o douto Magistrado prime- vo ao aplicar a redução de 2/3 (dois terços) à pena do apelante em sua r. sentença a quo.
Ressalte-se, por fim, que a alegação defensiva de erro de tipo fundada no abandono da res pela vítima se afigura totalmente descabida ante o conjunto probatório.
Restou amplamente comprovado que o apelante era colega de trabalho da vítima e tinha plena ciência do costume desta de sair para jantar e deixar o rádio no local de trabalho.
Dessa forma, absurda e desatrelada das provas dos autos a tese de que o apelante apenas se apoderou do rádio, porque pensou que a vítima o havia descartado.
A alegação defensiva de atipicidade da conduta por inexistência de prejuízo à vítima, por sua vez, tam- bém não merece maiores considerações, pois tal prejuí- zo foi aferido quando da dosimetria da pena durante a análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, qual seja nas consequências do crime.
Anote-se que, in casu, o ilustre Magistrado a quo considerou favoráveis ao apelante as consequências do crime ao considerá-las inexistentes.
Logo, as provas produzidas nos autos autorizam a manutenção da condenação do apelante no delito pre- visto no art. 155, § 2º, do Código Penal, afastando o decreto absolutório.
Bem dosada e aplicada a substituição da pena, mantenho, assim, inalterada a r. sentença fustigada.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso do apelante Xxxx Xxxxxxx xxx Xxxx, mantidas as cominações legais da r. sentença a quo.
Custas, ex lege. É como voto.
Votaram de acordo com o Relator os DESEMBAR- GADORES XXXXXXX XXXXXXXXX e XXXXX XXXXXXX XXXXX.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.
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mandato, também não havendo disponibilidade de caixa para pagamento posterior.
Em razão, disso foi condenado à pena final priva- tiva de liberdade de um ano de reclusão e seis meses de detenção, regime inicial aberto, sendo aquela substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária de dez salários-mínimos à APAE de Pouso Alto, e pena de dez dias-multa.
Inconformada, a defesa apresentou as razões de f. 290/308, onde pugna pela absolvição do réu, alegando que o mesmo não causara prejuízo ao erário, agindo conforme determina a lei.
Contra-arrazoando o recurso, f. 318/328, sustenta o ilustre Representante do Ministério Público o improvi- mento do apelo e manutenção do decisum.
Instada a se manifestar, a douta Procuradoria- Geral de Justiça, em parecer da lavra do ilustre Procurador Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, opinou, pre- liminarmente, pela prescrição da pretensão punitiva e extinção de punibilidade do réu quanto ao delito do art. 359-B do Código Penal e, no mérito, pelo provimento parcial do recurso, reduzindo o valor da prestação pecu- niária (f. 332/337-TJ).
É, em síntese, o relatório.
Conheço do recurso, visto que presentes os pressu- postos de sua admissibilidade e processamento.
Antes de tudo, acolho preliminar suscitada pelo Órgão Ministerial de cúpula para declarar desde já extin- ta a punibilidade de Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx, ora apelante, no delito do art. 359-B do Código Penal (inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar), pela prescrição da pretensão punitiva, pela pena in concreto, pois, sendo matéria de ordem pública, deve ser decreta- da, quando reconhecida, em qualquer fase do processo, de ofício ou a requerimento das partes, sendo este tam- bém o entendimento de Celso Delmanto:
A prescrição da pretensão punitiva sobrepõe-se a qualquer outra questão e precede o mérito da própria ação penal (Código Penal comentado. 3. ed., p. 176).
Quanto aos marcos interruptivos, verifica-se que os fatos delituosos ocorreram no ano de 2004 (f. 02), tendo a denúncia sido recebida em 2 de maio de 2005 (f. 154) e a sentença publicada aos 2 de julho de 2008 (f. 288), impondo ao nacional a pena privativa de liberdade de seis meses de detenção para o delito em apreço.
A sentença transitou em julgado para a acusação, por isso, em face da pena aplicada, é que deve ser ana- lisada a ocorrência, ou não, da prescrição da pretensão punitiva do Estado, ex vi do disposto no art. 110, § 1º, do Código Penal.
Pela mesma, estipulado se tem o lapso pres- cricional em 2 (dois) anos, consoante o disposto no art. 109, inciso VI, do codex, valendo destacar os termos do art. 119 do Código Penal: “no caso de concurso de
crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente”.
Logo, tendo decorrido lapso temporal superior entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença, declaro extinta a punibilidade do apelante no crime do art. 359-B do Código Penal, pela prescrição do ius puniendi estatal, com suporte nos arts. 109, inciso VI; 110, § 1º; e 119, todos do Código Penal Brasileiro. Prosseguindo no exame do delito subsistente, art.
359-C do Código Penal (assunção de obrigação no últi- mo ano do mandato ou legislatura), após minuciosa análise, tenho que a decisão monocrática condenatória se mostra irretocável.
Sabe-se que Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade do administrador público na gestão fiscal.
Segundo Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx (artigo – “Os aspectos penais da Lei de Responsabilidade Fiscal - as inovações introduzidas pela Lei nº 10.028, de 20 de outubro de 2000”), referida lei:
Objetiva equilibrar as contas públicas e propor aos gover- nantes um maior comprometimento com a elaboração dos orçamentos para que sejam alcançados os resultados pre- tendidos. Proíbe a renúncia de receitas e o aumento irres- ponsável das despesas, evitando que a nova gestão, ao assumir a Administração, tenha que arcar com dívidas da gestão anterior. Propõe um regime de gestão fiscal respon- sável que procura dissipar as desigualdades regionais, reduzindo o déficit, público e estabilizando o montante das dívidas interna e externa em relação ao Produto Interno Bruto. Enfim, estabelece regras de conduta a serem obser- vadas pelos administradores públicos, que, se não as cumprirem, estarão sujeitos a sanções de ordem institucional
e pessoal.
Algumas das condutas que contrariam referida lei, por sua gravidade, foram erigidas ao status de crime, estando dispostas no Capítulo IV do Código Penal - “Dos Crimes Contra as Finanças Públicas”.
Dentre elas, prescreve o art. 359-C:
Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos 2 (dois) últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legis- latura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de disponi- bilidade de caixa:
Pena - reclusão, de 1 (um) ano a 4 (quatro) anos.
Referido dispositivo visa coibir prática corriqueira em que o agente público detentor do mandato ou da legislatura se utiliza do poder da “máquina pública” para a realização de diversas despesas, com o cunho pre- dominantemente eleitoreiro, sem programar receitas para quitá-las, causando sérios problemas para o suces- sor e, principalmente, para a população em geral.
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Antigamente, ao final do seu mandato, o Chefe do Executivo assumia inúmeras obrigações, fazendo novas contratações, iniciando obras, compras e demais despe- sas, deixando na memória do povo essa lembrança final, mas, em contrapartida, deixava a conta para seu suces- sor, sem qualquer consequência legal.
Hoje, tal conduta possui implicação civil e penal.
Sua incidência ocorre sempre que o art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal for descumprido, o qual assim determina:
É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integral- mente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.
Parágrafo único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e despesas compro- missadas a pagar até o final do exercício.
Trata-se de crime de mera conduta, que não exige qualquer resultado naturalístico, ou seja, basta que o agente público responsável pelo ordenamento ou auto- rização para assunção de despesa (prefeito, presidente da câmara ou servidor que receber tal delegação) con- traia despesas nos dois últimos quadrimestres do manda- to ou da legislatura que não possam ser integralmente cumpridas até o encerramento do exercício ou tenham parcelas a serem pagas até o exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para tanto.
Com isso, coíbe-se a contratação de qualquer obrigação nos dois últimos quadrimestres do mandato ou legislatura para ser paga no exercício seguinte sem que seja deixada a correspondente disponibilidade de caixa para o seu pagamento.
In casu, conforme documentação acostada aos autos e confissão do apelante (f. 172/173), o mesmo contraíra despesas ao final de seu mandato (nos dois últimos quadrimestres), estando ciente de que não tinha como quitá-las no mesmo exercício financeiro e tam- pouco deixar crédito para sua liquidação no mandato seguinte.
Ainda que assim tenha agido para pagar despesas com educação, saúde, APAE, Polícia Militar, dentre ou- tras, invocando a supremacia do interesse público, ressalto que a conduta criminosa em questão não exige qualquer fim especial de agir e tampouco resultado na- turalístico como dano ao erário, locupletamento ilícito, etc. Ressalto que o acusado confirma que “fez as despesas mesmo sabendo da impossibilidade de cober-
tura”.
E, ao contrário da manifestação ministerial de cúpula, mantenho a pena alternativa em dez salários- mínimos, uma vez que tal não necessita ser proporcional à pena privativa de liberdade, devendo ser sopesada na sua fixação a capacidade econômica do condenado para que não perca seu caráter socializador. A defesa, diga-se de passagem, não se insurgiu contra seu quantum.
Por tudo isso, nego provimento ao recurso. É como voto.
Custas, ex lege.
Votaram de acordo com a Relatora os DESEMBAR- GADORES HÉLCIO VALENTIM e XXXXX XXXXXXX.
Súmula - ACOLHERAM PRELIMINAR MINISTERIAL E DECLARARAM EXTINTA A PUNIBILIDADE DO APELANTE PELA PRESCRIÇÃO EM RELAÇÃO AO DELI- TO DO ART. 359-B DO CÓDIGO PENAL. NO MÉRITO, NEGARAM PROVIMENTO.
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Furto qualificado - Crime tentado - Autoria - Materialidade - Valoração da prova - Prisão em flagrante - Ausência de nulidade - Concurso de pessoas - Emprego de chave falsa - Qualificadoras - Exclusão - Inadmissibilidade - Fixação da pena - Multa - Princípio da proporcionalidade
Ementa: Penal. Processo penal. Apelação. Preliminar. Nulidade do flagrante. Não ocorrência. Furto dupla- mente qualificado tentado. Depoimento testemunhal. Condenação mantida. Concurso de agentes e emprego de chave falsa. Decote de qualificadoras rejeitado. Pena de multa. Redução. Necessidade.
- Caracteriza o flagrante quando o agente é preso, por força de rastreamento, pouco tempo depois da tentativa do delito, na posse de instrumento do crime.
- O reconhecimento do sujeito ativo e de seu comparsa, por testemunha de visu, ratificado pela prova oral, é sufi- ciente para comprovar a autoria do delito contra o patrimônio e seu cometimento em concurso de agentes.
- Para o reconhecimento da qualificadora inserta no inciso III do § 4º do art. 155, basta que o sujeito ativo utilize de uma chave mixa para abrir a fechadura ou dar partida ao veículo que se visa subtrair, sendo irrelevante que o instrumento não tenha a forma da chave ver- dadeira.
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Assim sendo, a condenação era de rigor.
No mais, observo que a reprimenda foi devida- mente aplicada no mínimo legal para a espécie, sendo reconhecida a atenuante da confissão espontânea e, ao final, substituída por uma pena restritiva de direitos de prestação pecuniária e pena multa.
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