AUTONOMY IN THE ROUSSEAU'S SOCIAL CONTRACT ]
AUFKLÄRUNG, João Pessoa, v.9, n.esp, Nov., 2022, p.109132 DOI: xxxxx://xxx.xxx/00.00000/xxx.x0xxxx.00000 Recebido: 30/05/2022 |Aceito: 30/10/2022 Licença: Creative Commons 4.0 International (CC BY 4.0)
A AUTONOMIA NA OBRA CONTRATO SOCIAL DE XXXXXXXX
[AUTONOMY IN THE XXXXXXXX'X SOCIAL CONTRACT ]
Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx Xxxxxx * Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx **
Universidade Federal de Rondônia, Brasil
Resumo: O conceito de autonomia, enquanto auto legislarse, foi amplamente discutido durante o Iluminismo e a Modernidade, sobretudo por filósofos ligados à ética e filosofia política. Xxxxxxxx desenvolveu, em sua teoria política, uma relação intrínseca entre autonomia e a plena participação política do cidadão no soberano, isto é, no corpo político ou no conjunto de pessoas que, unidas em contrato, formam a sociedade. O objetivo deste artigo é desenvolver reflexões acerca da autonomia e sua importância na teoria filosófica expressa no Contrato Social de Xxxxxxxx. Ao analisar a obra, é possível afirmar que a autonomia gera implicações na organização social proposta pelo pensador genebrino. Pode se dizer ainda que elementos como cidadania, educação civil, igualdade, liberdade, patriotismo e a vontade geral, que são conceitos fundamentais para a compreensão do contratualismo de Xxxxxxxx expresso no Contrato Social, têm ramificações do conceito de autonomia e são por isso implicações, ou seja, consequências naturais desse conceito basilar. Para isso, a pesquisa está embasada em uma revisão de literatura de estudos publicados sobre o tema e a análise da obra Contrato Social. Em suma, o artigo demonstra como a autonomia é basilar na visão rousseauniana para a “saúde” do corpo político e sua própria manutenção enquanto pessoa moral, em
Abstract: The concept of autonomy, as self legislation, was widely discussed during the Enlightenment and Modernity, especially by philosophers linked to ethics and political philosophy. Xxxxxxxx developed, in his political theory, an intrinsic relationship between autonomy and the full political participation of the citizen in the sovereign, that is, in the political body or in the group of people who, united in contract, form society. The objective of this article is to develop reflections about autonomy and its importance in the philosophical theory expressed in Xxxxxxxx'x Social Contract. By analyzing the work, it is possible to affirm that autonomy generates implications in the social organization proposed by the thinker from Geneva. It can also be said that elements such as citizenship, civil education, equality, liberty, patriotism and the general will, which are fundamental concepts for the understanding of Xxxxxxxx'x contractualism expressed in the Social Contract, have ramifications from the concept of autonomy and are therefore implications, that is, natural consequences of this basic concept. For this, the research is based on a literature review of published studies on the subject and the analysis of the work Social Contract. In summary, the article demonstrates how autonomy is fundamental in Xxxxxxxx'x vision for the "health" of the political body and its own
* Mestre em Filosofia pelo PPGFil da Universidade Federal de Rondônia. Professor – Servidor na Secretaria de Estado da Educação de Rondônia (SEDUCRO) Email: xx.xxxxxx.xx@xxxxx.xxx. ** Professor Doutor na Universidade Federal de Rondônia. Email: xxxxxxxx@xxxx.xx
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contrapartida, a falta da mesma causa a morte do soberano.
PalavrasChave: Autonomia. Contrato Social. Rousseau. Política. Soberano.
Introdução
maintenance as a moral person, on the other hand, the lack of the same cause the death of the sovereign.
Keywords: Autonomy. Social Contract. Rousseau. Politics. Sovereign.
AUFKLÄRUNG, João Pessoa, v.8, n.2, MaiAgo, 2022, p.109132
O
presente estudo busca analisar a relação entre o conceito de autonomia apresentado na obra Contrato Social de Xxxxxxxx e suas implicações dentro
de sua proposta de pensamento. A autonomia está presente em vários elementos do seu Contrato Social e no cerne das estruturas políticas que facilitariam a instalação da liberdade civil do ser humano, bem como sua perpetuação na sociedade desenhada como escala de referência por Xxxxxxxx. A análise é importante porque é através da apropriada compreensão do conceito de autonomia que podemos entender suas implicações, sendo essas implicações basilares para a filosofia rousseauniana.
Assim, nosso objetivo principal é responder a seguinte pergunta fundamental: Qual é o conceito de autonomia na obra Contrato Social de Xxxxxxxx e qual sua importância? Nesse sentido, buscase elucidar quais conceitos presentes na obra Contrato Social podem ser compreendidos como implicações dessa autonomia e, além disso, ver qual a importância desses mesmos conceitos para a estruturação do devido entendimento políticofilosófico na obra de nosso autor. Para isso, faremos uma revisão de literatura acerca do que publicaram alguns intérpretes de Xxxxxxxx, buscando também argumentos na própria obra aqui estudada.
Inicialmente, convém registrar e destacar que Xxxxxxxx não usa literalmente o termo “autonomia” em sua obra, mas fala de auto legislarse, de ser senhor de si mesmo, de obedecer só a si mesmo, de não se sujeitar sem seu consentimento, etc. Por exemplo, ele afirma: “cada homem tendo nascido livre e senhor de si mesmo, ninguém pode sob pretexto algum sujeitálo sem seu consentimento” (XXXXXXXX, 2006, p. 129); além disso, ele ressalta que cabe “acrescentar à aquisição do estado civil a liberdade moral, a única que torna o homem verdadeiramente senhor de si, porquanto o impulso do mero apetite é escravidão, e a obediência à lei que prescreveu a si mesmo é liberdade” (XXXXXXXX, 2006, p. 26). Inclusive, ao falar sobre o “pacto social” e sobre a “liberdade de cada homem”, primeiro, ele cita a “dificuldade”: “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindose a todos, só obedeça, contudo, a si mesmo e permaneça tão livre quanto antes”; e, logo depois, ainda declara: “Este é o problema fundamental cuja solução é fornecida pelo contrato social” (XXXXXXXX, 2006, p. 20 21). Assim, fica claro o uso da noção ou do conceito de autonomia, enquanto auto legislarse ou como faculdade ou direito de se governar por si mesmo ou de se reger por leis próprias, na obra Contrato Social de Xxxxxxxx.
Assim, com o título “Elementos fundamentais da obra Contrato Social”, buscaremos os subsídios da escala de referência contida no Contrato Social para toda e qualquer convenção social que seja ordenada para possibilitar a autonomia, criando um ambiente para que a participação política se desenvolva e ganhe a importância. A partir do estado de natureza, analisaremos a construção filosófica do contrato rousseauniano, que busca resolver esse problema. Depois do contrato instalado e o Estado estabelecido, a liberdade que auxiliou o ser humano a sair do estado de natureza passa a ocupar o cerne do processo de legislação, que é feito em assembleias pelos cidadãos. Assim, o ato de se auto legislar é o que garante a igualdade moral e de direito. Essa condição, por sua
vez, é o principal elemento da sociedade civil rousseauniana unida em contrato. Segundo Xxxxxxxx (2006, p. 129), “cada homem” nasceu “livre e senhor de si”. Mas, a liberdade também é fruto da educação, quando esta se propõe a ser libertadora, condição necessária a um pacto verdadeiro, além de ser uma das práticas mais importantes para a atividade política em seu modelo republicano de organização social. Assim, em maior ou menor grau, as implicações da autonomia estão presentes no Contrato Social.
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Nas considerações finais, veremos as constatações adquiridas com a revisão de literatura e os argumentos apresentados no decorrer do texto. Assim, veremos que Xxxxxxxx ainda é atual e seu pensamento pode ajudar uma humanidade que precisa, sempre mais, de esclarecimento e pensamento crítico para não se deixar levar pela heteronomia, mas sim pela autonomia.
ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA OBRA CONTRATO SOCIAL
A seguir, analisaremos elementos oriundos da obra Contrato Social e sua relevância para o conceito de autonomia intrínseco dentro do pensamento de Xxxxxxxx. Para tal, serão sumarizados componentes importantes da obra e de sua ligação com o conceito de autonomia. Para iniciar, buscaremos analisar os seus conceitos de estado de natureza e de pacto social.
O estado de natureza e o pacto social de Xxxxxxxx
Ao estudar o estado de natureza e o pacto social de Xxxxxxxx, salta aos olhos a forma como esses elementos são estruturados. Procuraremos ver as suas principais especificidades na teoria rousseauniana. O seu conceito de estado de natureza é fundamental para entender o de pacto social e, mais ainda, para a compreensão do seu conceito de autonomia.
A hipótese de estado de natureza apresentada por Xxxxxxxx permite vislumbrar a interação dos seres humanos no início do que seriam “protocomunidades” antes da instalação do pacto social. Identificase certas características naturais da autonomia, como potencialidade, no homem natural dentro dessas interações entre agentes, mesmo que ainda não seja uma sociedade civil e que não haja envolvimento político entre os indivíduos. Nas obras em que trata do contratualismo (Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, de 1755, e Contrato Social, de 1762), Xxxxxxxx constrói uma narrativa com elementos que trazem uma aparente cronologia ao aperfeiçoamento das relações entre os seres humanos em estado de natureza: “A história da humanidade [...] conduziu o homem do estado de natureza, de linguagem nula e liberdade negativa, ao termo atual, de desigualdade social, no seu sentido mais amplo” (ITUASSU, 2002, p. 185).
Assim, em Xxxxxxxx, a liberdade é a engajadora do esclarecimento dos indivíduos e do progresso da sociedade e, ainda, fator fundamental para a estruturação do governo na política. Xxxxxxxx destaca, no Contrato Social,a necessidade de o cidadão ter participação ativa nos caminhos que o Estado tomará. Já que, ao contrário do estado de natureza onde tudo era comum, no estado civil, a liberdade e a moral são frutos da lei: “No estado de natureza, em que tudo é comum, nada devo àqueles a quem nada prometi, e não reconheço como de outrem senão o que me é inútil. O mesmo não se passa no estado civil, no qual todos os direitos são estabelecidos pela lei” (XXXXXXXX, 2006, p. 46).
Vemos a importância da lei, que se reforça no ser humano depois do pacto social. Para Xxxxxxxx, uma lei precisa vir diretamente da autonomia humana, precisa ser
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ratificada com total liberdade. Essa liberdade é algo da natureza do ser humano:
Essa liberdade comum decorre da natureza do homem. Sua primeira lei consiste em zelar pela própria conservação, seus primeiros cuidados são aqueles que deve consagrar a si mesmo, e, tão longo alcança a idade da razão, sendo o único juiz dos meios adequados à sua conservação, tornase por isso seu próprio senhor. (XXXXXXXX, 2006, p. 10).
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Ao tornarse seu próprio senhor a partir da idade da razão, o ser humano experimenta a liberdade de escolha, que está acima das ações puramente instintivas do puro estado de natureza. A partir de então surge a necessidade de qualquer ordenamento necessariamente ser ratificado diretamente pelo ser humano no gozo de sua autonomia:
Toda lei que o povo não tenha ratificado diretamente é nula, não é uma lei. O povo inglês pensa ser livre, mas está redondamente enganado, pois só o é durante a eleição do Parlamento; assim que estes são eleitos, ele é escravo, não é nada. Nos breves momentos de liberdade, pelo uso que dela faz bem merece perdêla. (XXXXXXXX, 2006, p. 114).
Dessa forma, os ordenamentos civis do Estado rousseauniano devem limitar a liberdade dos cidadãos para que não ocorra de os indivíduos prejudicarem uns aos outros. O contrato rousseauniano, portanto, é válido somente quando cria o Estado e seu governo fundindo liberdade e limites:
À primeira vista, autonomia e cidadania parecem encaixarse facilmente e perfeitamente no modelo contratualista. Afinal o contrato é concebido para promover a desejada reconciliação entre liberdade e algemas, entre autonomia e lei. A autonomia política, isto é, a cidadania viva de cada um, impõe a estrutura de todas as ações do Estado. (HERB, 2019, p. 113).
Xxxxxxxx desenvolve seu estado de natureza como uma hipótese em que o progresso do ser humano se assemelha a uma teoria cronológica, embora não seja de fato uma narrativa histórica como o próprio autor sugere:
Não se devem considerar as pesquisas, em que se pode entrar neste assunto, como verdades históricas, mas somente como raciocínios hipotéticos e condicionais, mais apropriados a esclarecer a natureza das coisas do que a mostrar a verdadeira origem e semelhantes àquelas que, todos os dias, fazem nossos físicos sobre a formação do mundo. (XXXXXXXX, 1973, p. 242).
A intenção aparente de Xxxxxxxx com seu estado de natureza é desvencilhar o homem de seus atributos sociais, buscando deixálo com a “originalidade total”, dotado somente de suas paixões naturais e da liberdade natural mais comum a todos. No estado de natureza rousseauniano, portanto, temos um ser humano “selvagem” em uma existência em que a liberdade é muito mais uma independência.
Adiante no desenvolvimento do estado de natureza, mas ainda na condição pré social, há a formação de povos baseados nas interações, pois os seres humanos se aglomeram com aqueles que têm costumes comuns a eles. Isso ocorre antes da formação da sociedade civil em si, porque não há relação política ou societária entre os agentes, apenas relações casuais de acordo com a conveniência. Vemos isso, por exemplo, afirmado no Segundo Discurso ou no Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens (1755), a saber: “Portanto, antes de examinar o ato pelo qual um povo elege um rei, seria bom examinar o ato pelo qual um povo é um povo. Porque esse ato, sendo necessariamente anterior ao outro, consistiu no verdadeiro fundamento da sociedade” (XXXXXXXX, 2006, p. 19).
Assim, ocorre um percurso de transformação e aprimoramento. Devese ter
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cuidado com a teoria rousseauniana, já que essa abordagem de Xxxxxxxx sobre o puro estado de natureza, na qual se busca retirar do ser humano tudo aquilo que lhe foi artificialmente acrescentado pela vida em sociedade, seguida da narrativa hipotética sobre a passagem às relações sociais. Xxxxxxxx apenas quer que sua hipótese leve o ser humano ao seu estado de natureza sem que este carregue consigo elementos do homem civil ao homem natural: “Enfim, todos falando incessantemente de necessidade, de avidez, de opressão, de desejos e de orgulho, transportaram para o estado de natureza ideias que haviam tirado da sociedade: falavam do homem selvagem e descreviam o homem civil” (XXXXXXXX, 1999, p. 160161).
A liberdade é uma característica presente no estado de natureza, já que esse é o período, segundo Xxxxxxxx, em que o ser humano mais gozou desse conceito. No entanto, a sua teoria contratualista precisa explicar a motivação de sair de um estado de maior liberdade para um estado em que o ser humano tem compromissos morais que limitam essa liberdade natural ou independência que se tinha anteriormente.
Xxxxxxxx faz de seu estado de natureza a formação hipotética de uma construção quase que social primitiva. Existem dois estágios nessa construção de Rousseau: o puro estado de natureza e o estado de relação comunitária. Na primeira parte do Discurso sobre a Origem da Desigualdade entre os Homens, é teorizado um ser humano totalmente livre e independente, que não tem lastro social algum. Assim, o ser humano, em estado de natureza, não tem consciência de várias coisas e segue apenas as paixões mais básicas. Este ser humano tem uma independência e escolhe tudo aquilo que seus instintos lhe podem induzir a desejar. Este ser humano vive unicamente para comer, dormir e se reproduzir, como qualquer outro animal:
As paixões, por sua vez, originamse de nossas necessidades, e seu progresso em nossos conhecimentos, pois só se pode desejar ou temer as coisas conforme as ideias que se pode ter delas, ou pelo mero impulso da natureza; e o homem selvagem, privado de qualquer tipo de luzes, só experimenta as paixões dessa última espécie; seus desejos não ultrapassam suas necessidades físicas. Os únicos bens que conhece no universo são a alimentação, uma fêmea e o descanso; os únicos males que teme são a dor e a fome; digo a dor, e não a morte, pois nunca o animal saberá o que é morrer, e o conhecimento da morte e de seus terrores é uma das primeiras aquisições que o homem fez ao distanciarse da condição de animal. (XXXXXXXX, 1999, p. 175).
No segundo estágio, o ser humano deixa de ser mais próximo aos outros animais, ganha atributos mais específicos à medida que exerce sua liberdade e seu grau de progresso se acentua. Aqui vemos como Xxxxxxxx define as interações e a consciência da liberdade como principais fatores do desenvolvimento de suas faculdades e de suas ideias e elemento para a distinção do ser humano dos demais animais. Portanto, isso surge como uma das especificidades mais importantes desse período e, assim, a liberdade pode ser levada a um patamar maior:
Aliás, as ideias gerais só podem introduzirse no espírito com o auxílio das palavras e o entendimento só as aprende por via de proposições. É essa uma das razões pelas quais não poderão os animais formar tais ideias, nem jamais adquirirem a perfectibilidade que depende delas. (XXXXXXXX, 1973, p. 255)
Além disso, em Xxxxxxxx, o pacto é um compromisso recíproco entre o público e os particulares; resumidamente, é como se o “público” já existisse em algum grau e de algum modo, antes mesmo do pacto social definitivo que lhe dá origem, ao soberano:
Os homens, até então errantes pelos bosques, depois de adquirirem uma situação mais fixa, aproximamse lentamente, reúnemse em diversos grupos e formam por
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fim, em cada região, uma nação particular, uniforme nos costumes e nos caracteres, não por regulamentos e leis, mas pelo mesmo gênero de vida e de alimentos e pela influência comum do clima. (XXXXXXXX, 1999, p. 210).
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Essa é, na teoria rousseauniana, a fase em que ocorre a formação das primeiras culturas, no entanto, não dos primeiros povos. Nessas organizações, não há um vínculo político unindo os indivíduos que compõem esses grupos. Para ser um “povo”, tão como o referido termo ocorre em Contrato Social, necessariamente deveria haver padrão moral, que só viria com as leis e com a convivência política entre os agentes. Xxxxxxxx torna, com esse argumento, possível abrir as portas para a posterior construção do contrato social pautado pela autonomia civil:
A primeira diferença entre Xxxxxxxx e os seus antecessores jusnaturalistas é a sua interpretação acerca do estado de natureza [...]. Em Xxxxxxxx, há uma preocupação detalhada em construir, mesmo que de forma hipotética, um telos que impulsionasse o homem primitivo no sentido físico, metafísico e ético. (VASCONCELOS; XXXXXX; XXXXX, 2018, p. 212).
Verificamos que Xxxxxxxx usa essa construção do seu ser humano no estado de natureza para enaltecer seu objetivo principal, que tem relação com a liberdade como parte fundamental de todo ser humano, seja qual for sua condição ou seu estágio de progresso. Independente das interações com outros seres humanos, independente da formação de tribos e mesmo se for colocado o contrato social como forma de convivência entre as pessoas, ao contratar o pacto social, o ser humano ainda mantém sua liberdade, sendo uma pessoa continuamente livre:
Xxxxxxxx não quer que as coerções impostas pelo contrato social sejam vistas como restrições à liberdade, mas, ao contrário, como o meio pelo qual se garante a existência de uma forma de associação em que cada um obedece apenas a si mesmo, permanecendo assim integralmente livre. (MARQUES, 2010a, p. 105).
Xxxxxxxx propõe com sua escala de referência a modificação de fatores despóticos, que surgiram após a saída do estado de natureza e com as interações cada vez mais constantes entre seres humanos, que levaram à sociedade com artificialidades de paixões e de desejos corruptores do ser humano. Assim, o contrato xxxxxxxxxxxxx tenta propor um “deverser” para sanar essas lacunas e habilitar a autonomia do ser humano de jugo autoimposto pela corrupção da sua própria natureza:
No Contrato Social, Xxxxxxxx buscou resolver a questão de como alcançar a paz e estabilidade internas de uma comunidade sem apelar para o despotismo hobbesiano, fornecendo uma garantia contra as agressões e assegurando o respeito à vida e à propriedade, ao mesmo tempo em que preservava a liberdade política dos indivíduos. Para Xxxxxxxx, e ao contrário do que propunha Xxxxxx, o objetivo da vida em comunidade não é apenas atender aos interesses de sobrevivência e de uma vida confortável, mas é antes moral, ligado ao exercício autônomo da liberdade, fazendo com que a obediência à lei seja a obediência à expressão da vontade geral. Essa é a solução de Xxxxxxxx para o problema da política. (MARQUES, 2010b, p. 23).
Para Xxxxxxxx, a liberdade é inalienável e não pode ser usada para barganha; logo, não é possível ao ser humano abrir mão de sua condição livre nem mesmo para fazer parte da sociedade civil. Assim, o momento em que o seu contrato social se faz é justamente quando se completa o movimento de alienação (positiva1x), conforme palavras do próprio Xxxxxxxx. Os sujeitos que formam o contrato devem firmar um acordo de obediência ao corpo político para assim formar o soberano, conforme Xxxxxxxx (2006, p. 21):
As cláusulas desse contrato são de tal modo determinadas pela natureza do ato que a menor modificação as tornaria inúteis e sem efeito. [...] bem compreendidas, essas cláusulas se reduzem todas a uma só, a saber, a alienação total de todo associado, com todos os seus direitos, a toda a comunidade. Pois, em primeiro lugar, cada qual dandose por inteiro, a condição é igual para todos, e, sendo a condição igual para todos, ninguém tem interesse em tornála onerosa para os demais.
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Somente dessa maneira e unicamente nesse momento e nessas condições, a alienação pode ser permitida. Essa “alienação total” seria o penhor da liberdade, e não a subtração dela. Consequentemente, em Xxxxxxxx, não se perde nada alienando a liberdade natural ao Estado, pois se receberá por esse “depósito” a liberdade civil. Mais adiante, esse movimento será melhor explicado quando tratarmos das liberdades expostas no Contrato Social de Xxxxxxxx.
Porém, isso parece um paradoxo se levarmos em conta que a liberdade das pessoas não pode ser perdida ou trocada de forma alguma e, momentos depois na mesma obra, parece ser afirmado que os homens precisam alienarse ao pacto social. Mas, a solução do filósofo para tal desafio é justamente a submissão ao “soberano”, do qual todos os pactuantes são membros. Dessa maneira, não se perde a liberdade, que se transmuta em autonomia civil:
Xxxxxxxx deixa claramente delimitada a tarefa filosófica proposta pelo seu “Contrato social”: explicar em que condições o contrato político de submissão universal ao poder da lei pode ser legítimo do ponto de vista das exigências da razão. Partindo da consideração da liberdade humana como um fato natural, Xxxxxxxx pretende compreender como o homem pode alienála ao poder do Estado e mesmo assim permanecer ainda livre. (XXXXXXX, 2013, p. 76).
Podemos encontrar nessa lógica a resolução do suposto paradoxo entre autonomia e submissão ou obediência, já que o pacto não é feito dos indivíduos para com um representante personificado na figura de uma assembleia de aristocratas, de um nobre, chefe de governo ou representante popular. No Contrato Social, a “alienação total” não é destinada a nenhum agente político em específico, logo, não podemos dizer que seja personificada. Afinal não há essa “figura” ou título que conduzirá unicamente por sua posição o movimento do corpo político por “procuração popular”, tendo poderes unicamente por ocupar um cargo. Certa despersonificação do corpo político é uma importante etapa da escala de referência apresentada por Xxxxxxxx, porque no pacto social de Xxxxxxxx a alienação não é feita em favor de uma pessoa particular, um indivíduo, e sim em favor de uma pessoa pública/moral formada pela união de todos os pactuantes. Notase em Contrato Social que é a união dos próprios contratantes em pacto que forma uma “entidade”, isto é, o “soberano” (corpo político ou pessoa moral):
No movimento da alienação de todos criase uma «pessoa pública», una, soberana, na qual todos individualmente considerados estão encarnados e da qual não podem separarse. Assistese assim a um desdobramento importante na república (a
«pessoa pública» ou corpo político) em Estado (quando pensada na sua dimensão passiva) e Xxxxxxxx (quando ativa). Os indivíduos, pelo pacto, adquirem novas identidades: tornamse povo, quando considerados coletivamente; cidadãos em particular, e súditos enquanto submetidos às leis do Estado. (COSTA, 2017, p. 50).
A única alienação possível ao ser humano sem que se desfigure sua condição de livre é o pacto social legítimo. Esse contrato precisa ser unânime, pois quem discorda dessa fundação social fica sendo como um estrangeiro: sem direitos pela ausência dos deveres, afinal fazer parte da sociedade implica em aceitar a pessoa moral. O pacto
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precisa ser aceito por todos para ser validado. De acordo com Xxxxxxxx (2006, p. 129): “Há somente uma lei que, por sua natureza, exige um consentimento unânime: é o pacto social, pois a associação civil é o mais voluntário de todos os atos do mundo.”
Assim, para contextualizar devidamente o fim do estado de natureza e o início da sociedade civil, sem que se perca o ideal de liberdade que havia na condição natural, é importante dizer que a liberdade civil que o sujeito recebe após o pacto é um progresso da liberdade natural, que apenas parcialmente é alienada.
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Na condição inicial, a liberdade era apenas física, destinada ao limite dos engenhos e das faculdades. Quando o pacto é feito e a liberdade tornase civil, os preceitos de moralidade são acrescentados a ela. Essa é a vantagem primordial da liberdade civil em detrimento da liberdade natural, isto é, o conjunto de padrões morais que balizam as relações entre as pessoas. Assim, a liberdade natural acaba sendo alterada, envolvendo também a autonomia.
À vista disso, percebese que, no contratualismo rousseauniano, apesar de abrir mão da liberdade natural parcialmente, para o ser humano há vantagens em aceitar o contrato social e viver dentro de uma sociedade civil. É importante ressaltar que, sem necessariamente ser feita uma barganha ou ver anulada sua liberdade ao alienarse em sociedade, o movimento de alienação positiva garante, ao entregar voluntariamente a liberdade natural, o recebimento de forma impessoal de uma liberdade civil (e moral) melhor da sociedade:
Passamos a ser livres e autônomos porque podemos romper com a escravidão dos nossos desejos e viver sob uma lei que proporcionamos a nós mesmos. No estado natural o homem desfruta de uma liberdade natural que é física e não vai além de suas forças. No contrato social o homem renuncia a liberdade natural em favor da liberdade civil, que é circunscrita pela vontade geral. No estado civil o homem adquire liberdade moral, já que ele passa a obedecer à lei que ele instituiu a si próprio em vez de seguir o impulso. (ZATTI, 2008, p. 24).
Para ressaltar a importância do pacto, mas não sua obrigatoriedade, Xxxxxxxx cogita essa vantagem da moralidade e da liberdade civil sendo necessárias aos homens para estabelecer a autonomia. Ou seja, pactuar do contrato é revestirse de uma lei maior que apenas a vontade particular, mas tendo autonomia, criar seus próprios ordenamentos sociais enquanto partícipe do exercício da soberania, o chamado estado social de direito:
Dessa forma, o homem abre mão de sua liberdade natural, mas não para se submeter a uma lei vazia, tal como a de um estado social corrompido, que de forma alguma deveria receber o nome de lei, pois que não passaria então de mero decreto de uma vontade particular. O estado social de direito vem na verdade transformar a liberdade natural do homem em liberdade civil, acrescentandolhe o poder de estabelecer a si mesmo as leis a que deve obedecer. É esta precisamente a definição da liberdade em seu momento civil, que nada mais é senão autonomia, em seu sentido etimológico de legislarse a si mesmo. (XXXXXXX, 2006, p. 19 20).
Xxxxxxxx descreve a liberdade como uma faculdade do ser humano que o torna hábil a escolher para si algo diverso do que o natural sugere. Com essa faculdade, o ser humano pode ter engenhos novos que não são determinados pela sua natureza, liberdade natural ou independência. Assim, em uma sociedade tal qual a expressa em Contrato Social por Xxxxxxxx, a liberdade dos cidadãos, não mais natural, mas agora civil, usando a autonomia, cria as leis do Estado (cf. XXXXXXXXX, 2008, p. 62). Por isso, a seguir, veremos mais aspectos sobre o conceito de vontade geral em Xxxxxxxx.
A vontade geral: expressão máxima da autonomia dos cidadãos unidos em contrato
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Para entendermos o porquê de a vontade geral ser outro elemento relevante da obra Contrato Social relacionado à autonomia e os motivos pelos quais ela emerge como elemento distintivo à formação de um pacto que serve como referência de funcionamento do Estado que prima pela liberdade de seus cidadãos, primeiramente precisamos vislumbrar o significado desse conceito na Teoria de Estado de Xxxxxxxx. No caso, podemos dizer, resumidamente, que a vontade geral é a expressão do poder soberano e um dos reguladores mais importantes do soberano e, além de regrar seu poder, traz a certeza de que a liberdade dos sujeitos unidos em contrato seja respeitada pela sociedade e pelo governo civil:
O sucesso do pacto social seria nulo sem a submissão de todos à lei, e a lei é a expressão da vontade geral. O conceito de vontade geral é um dos mais importantes na arquitetura da teoria política de Xxxxxxxx e, igualmente, um dos mais complexos. De um modo amplo, podese dizer que a vontade geral é uma certa forma da vontade dos cidadãos manifesta em uma deliberação da qual todos eles devem participar; sendo sempre justa, ela tende sempre à utilidade pública. Obedecer à lei, portanto, equivale a ser livre. (XXXXXXXXX, 2009, p. 85).
A vontade geral, para além da manifestação do desejo do soberano que precisa ser obedecida, tem o objetivo de esclarecer os limites da liberdade civil. Em sua obra Contrato Social, Xxxxxxxx tem o intuito de elucidar como o homem se entrega a um tratado social para formar o Estado e, mesmo assim, não o faz abrindo mão da sua liberdade, mas a amplia conquistando a autonomia civil:
Com o contrato social, a liberdade típica do homem natural é substituída pela liberdade civil. Esta, conforme as palavras de Xxxxxxxx, consiste em não contrariar a própria vontade, que, na sociedade do pacto rousseauniano, identificase com a volonté générale. A vontade geral, por sua vez, é o que ratifica as leis que deverão ser seguidas pela sociedade. (XXXXX, 2006, p. 31).
Podemos encontrar argumentos em favor da vontade geral em todos os quatro livros que formam a obra Contrato Social de Xxxxxxxx, sendo essa uma das implicações mais elementares do conceito rousseauniano de autonomia. Inclusive, podemos qualificar a vontade geral como garantidora das motivações principais da sociedade civil, a saber, a igualdade e a liberdade:
O contrato social, ao considerar que todos os homens nascem livres e iguais, encara o Estado como entidade de um contrato no qual os indivíduos não renunciam a seus direitos naturais, no caso a liberdade, mas ao contrário, entram em acordo para a proteção desses direitos, que o Estado é criado para resguardar. (XXXXXX XXXXXX; SOBREIRA, 2012, p. 171).
A vontade geral se enquadra no movimento desse Estado para salvaguardar que todos os indivíduos unidos em contrato possam expressar sua autonomia. Logo, podemos entender esse conceito como a união das livres intenções e pensamentos que formam um único intuito da pessoa moral formada pelo pacto social, a saber, o soberano: “O Estado é a unidade e como tal expressa a "vontade geral", porém esta vontade é posta em contraste e se distingue da "vontade de todos", a qual é meramente o agregado de vontades, o desejo acidentalmente mútuo da maioria” (XXXXXX XXXXXX; SOBREIRA, 2012, p. 171).
A configuração rousseauniana de pessoa moral em sua teoria resolve o problema da liberdade; mas, o soberano nãonatural fica complexo em relação às configurações de
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soberano personificado. Assim, é complicado entender e organizar os interesses e as intenções do corpo político, já que esse soberano é formado por agentes autônomos, que, por terem liberdade, podem querer coisas diferentes. Assim, quando se pensa em uma pessoa moral para legislar, podemos pressupor que por ser um corpo dotado de movimento como qualquer corpo natural teria também vontades:
Nessa conexão, a vontade geral não é outra coisa senão a “vontade do corpo político” entendido como “ser moral” – é a vontade do soberano. Como pessoa moral, o soberano teria uma vontade, em sentido análogo ao que ocorre com as pessoas naturais. (REIS, 2010, p. 12).
É possível afirmar, após analisar Xxxx (2010, p. 12), que a vontade do corpo político é sempre “geral”. Aqui cabe um questionamento crítico, pois o quão factível é essa afirmação? Podese questionar esse pensamento justamente na pretensão rousseauniana de que todas as vezes que a pessoa moral decide algo sobre a sociedade civil, está levando em consideração a vontade geral. Aqui existem alguns paralelos a serem feitos no que tange a escala de referência que é o Contrato Social e a prática aplicada desses elementos nos Estados reais. No âmbito dos princípios expressos no Contrato Social de Xxxxxxxx, é possível afirmar que a vontade do soberano sempre é geral; no entanto, em um contexto prático, as deliberações dos cidadãos no exercício da soberania podem, por vezes, ter algum nível de particularidade:
Decorre do exposto que a vontade geral é invariavelmente reta e tende sempre à utilidade pública; mas daí não se segue que as deliberações do povo tenham sempre a mesma retidão. Desejase sempre o próprio bem, mas não é sempre que se pode encontrálo. Nunca se corrompe o povo, mas com frequência o enganam, e só então ele parece desejar o mal. (XXXXXXXX, 2006, p. 37).
Xxxxxxxx faz sua autocrítica ao aceitar que na prática sua escala poderia não funcionar como o esperado o tempo todo. Entretanto, isso não representa por si só algo impraticável do deverser do filósofo, e sim das desarmonias inerentes à vida política dos povos, nas quais constantemente não se convergem interesses públicos e privados.
Além disso, a vontade geral, para Xxxxxxxx, é a guardiã da liberdade e da igualdade, que são as principais fontes da justiça na filosofia rousseauniana. Temos na vontade geral uma importância estratégica para o modelo político defendido pelo iluminista genebrino, guiado pela correta formulação das leis: “Lei, por sua vez, é toda norma que reúne a generalidade da vontade e a do objeto, ou seja, é o resultado de uma ordenação da vontade geral sobre um objeto que também seja de interesse comum de todos os cidadãos” (CONSANI, 2018, p. 100).
Todavia, nem todos os assuntos são de interesse comum, porque resta uma parte das vidas dos cidadãos que é privada. Nessa esfera, cada um pode decidir por si mesmo o que é melhor, de acordo com seus gostos e suas preferências pessoais. Sobre isso, inclusive Xxxxxxxx (2006, p. 39) afirma:
Mas, além da pessoa pública, temos que considerar as pessoas privadas que a compõe e cuja vida e liberdade são naturalmente independentes delas. Tratase, pois, de distinguir entre os respectivos direitos de cidadãos e do soberano, e dos deveres que os primeiros devem cumprir na qualidade de súditos, e o direito natural que devem gozar na qualidade de homens.
Logo, se um cidadão tem interesses em relação ao bem comum, projetos que visam toda a comunidade, intenções que levam em conta seus concidadãos e vontades que se submetem perfeitamente às leis da república, da coisa pública e/ou do interesse público, então ele está em conformidade com a vontade geral. Xxxxxxxx (2006, p. 48) chama de “república a todo Estado regido por leis, qualquer que seja sua forma de
administração, porque só então o interesse público governa e a coisa pública significa algo. Todo governo legítimo é republicano”.
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Portanto, a vontade geral é composta pela “intersecção” das vontades particulares, sendo levado em conta o que há de “comum” entre elas: de modo que o objeto da lei sempre seja seguido e que as vontades particulares sejam respeitadas, mas o conjunto que forma a vontade geral seja soberano (cf. XXXX, 2010, p. 2527). Diante disso, o Estado deve oferecer a possibilidade de legislatura aos seus membros ao passo que os cidadãos devem estar em conformidade com o soberano, submetendo totalmente as suas vontades particulares à vontade geral: “Não se trata da submissão a qualquer autoridade, mas à autoridade da lei, considerada legítima. Por essa razão, a liberdade não está igualmente atrelada a qualquer Estado, mas a um Estado legítimo, que é o republicano.” (CONSANI, 2018, p. 100).
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx (2014, p. 198199), o contrato feito para dar origem à sociedade civil cria simultaneamente a conformidade da vontade do ser humano (vontade particular) e do dever social (bem comum/vontade geral) perante às leis e à justiça. Xxxxxxxx, conciliando essas duas intenções, explica que a obrigação de cumprir as leis e a autonomia, que vem da liberdade de fazêlas, podem conviver através de uma força que as equilibra e esse dispositivo é a vontade geral, que tem forma despersonificada e coletiva e é aplicada a todos os envolvidos no chamado pacto social:
Quanto à liberdade, podese dizer que os cidadãos a mantêm ao obedecer somente a si próprios, pois a vontade geral a qual todos devem respeitar nada mais é do que o interesse comum a cada um dos indivíduos que compõem o corpo político. No contrato social, o poder soberano estabelecido pertence a todos e somente o que este soberano homologar através da vontade geral se torna lei. O interesse comum fez com que os indivíduos se unissem, daí que tudo o que for de interesse comum
– vontade geral – xxxx xxx. (XXXXX, 2006, p. 30).
Na obra Contrato Social de Xxxxxxxx,vemos que o pacto é inútil se os indivíduos não submeterem suas vontades particulares à vontade do soberano e às leis, tendo em vista o movimento desse corpo político em direção ao bem comum. Assim, temos garantidos por leis os limites morais das liberdades dos particulares que formam o corpo político, à medida que temos um acordo do que é correto a todos:
Então, preciso abrir mão de minha liberdade de fazer tudo que os meus desejos pedem para que também um outro não possa ter uma liberdade ilimitada. Preciso abrir mão de prejudicar alguém para que também alguém não me prejudique. E essa opção sim é liberdade, pois é uma decisão racional de fazer aquilo que devo, e não somente aquilo que quero, o que na opinião de Xxxxxxxx é escravidão ao invés de liberdade. (HAÜPTLI, 2016, p. 39).
Por conseguinte, para Xxxxxxxx, a vontade geral é uma das principais propulsoras da autonomia e um dos elementos primordiais da escala de referência. Entretanto, mesmo sendo um dos pilares que sustentam o soberano, esse dispositivo é frágil e altamente volátil. Uma das formas de “matar” o corpo político, levando em conta o expresso na obra Contrato Social, é atacando seu “coração”, que, de acordo com o pensador de Genebra, é o Poder Legislativo:
O princípio da vida política repousa na autoridade soberana. O poder legislativo é o coração do Estado; o poder executivo, o cérebro, que dá movimento a todas as partes. O cérebro pode paralisarse e o indivíduo continuar a viver. O indivíduo tornase imbecil e vive, mas, tão logo o coração deixa de funcionar, o animal morre. (XXXXXXXX, 2006, p. 107).
O corpo político gerado a partir do pacto social depende do respeito às leis
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oriundas da vontade geral para se manter vivo. Na sociedade civil, a única dependência dos cidadãos é para com o Estado, a dependência social de uns com os outros e de todos para com o poder da “máquina política”:
A fim de que o pacto social não venha a constituir, pois, um formulário vão, compreende ele tacitamente esse compromisso, o único que pode dar força aos outros: aquele que se recusar a obedecer à vontade geral a isso será constrangido por todo corpo – o que significa apenas que será forçado a ser livre, pois essa é a condição que, entregando à pátria cada cidadão, o garante contra toda dependência social, a condição que configura o artifício e o jogo da máquina política, a única a legitimar os compromissos civis, que sem isso seriam absurdos, tirânicos e sujeitos aos maiores abusos. (XXXXXXXX, 2006, p. 25).
Mas, já que para viver dentro da legitimidade da sociedade do Contrato Social é necessário aos indivíduos esforçarse para convergir as vontades particulares à vontade geral, surge o questionamento: como podemos qualificar a vontade geral para seguila? Identificar o melhor para todos não é tarefa fácil, ainda mais em meio a tantas vontades diversas sempre cruzandose o tempo todo, porém é a condição para que uma vontade seja geral.
Contudo, a missão de encontrar o equilíbrio da sociedade para identificar o bem comum, que deve ser o objeto da lei, fica a cargo da própria população. Assim sendo, para Xxxxxxxx (2006, p. 113), o uso de representantes chega a representar a ruína do Estado:
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Numa cidade bem dirigida, todos correm às assembleias; sob um mau governo ninguém quer dar um passo nesse sentido, porque ninguém se interessa pelo que nelas se faz, porque sabe de antemão que a vontade geral não prevalecerá e porque, enfim, os cuidados particulares tudo absorvem. As boas leis permitem fazer outras melhores, as más conduzem a piores. Quando alguém diz, referindose a negócios do Estado: que me importa?, podese ter certeza de que o Estado está perdido.
Assim, cogitar meros representantes significa atestar que o Estado vai mal, já que a população que precisa se ver representada parece não querer se envolver nos assuntos políticos. Para Xxxxxxxx, isso é um sinal de enfraquecimento do patriotismo e um forte indício de não realização da própria vontade geral em si:
O arrefecimento do amor à pátria, a atividade do interesse privado, a imensidão dos Estados, as conquistas, o abuso do governo fizeram com que se imaginasse o recurso dos deputados ou representantes do povo nas assembleias da nação [...] a soberania não pode ser representada da mesma forma que não pode ser alienada; consiste essencialmente na vontade geral, e a vontade geral não se representa: ou é a mesma, ou é outra – não existe meiotermo. Os deputados do povo não são, pois, nem podem ser seus representantes; são simples comissários, e nada podem concluir definitivamente. (XXXXXXXX, 2006, p. 113114).
Por isso, a crítica à factibilidade da vontade geral que normalmente se faz é pertinente, uma vez que, na maioria das vezes, essa vontade é “geral demais”, e sem diretrizes de como organizar sempre o entendimento para regularizála fica complicado organizar um Estado que seja maior que uma CidadeEstado. Inclusive, até mesmo se inspirar na vontade geral é problemático. Se refletila como possibilidade de ser um elemento pacificador dos problemas institucionais, cairíamos em um problema de centralização estatal das instituições na condução das decisões de Estado:
[...] os próprios integrantes do conjunto social, além de se aperceberem de sua mútua dependência, também reconhecem que esta última cria um interesse comum na regulação estabilizadora de suas interações, que torna possível a instituição de
um centro decisório colocado necessariamente acima de suas relações e cuja razão de ser só pode ser, essencialmente, a de tentativa determinar tal interesse comum, de zelar por sua identificação e promoção, por mais problemática e arriscada que seja a implementação desse desiderato. (TORRES, 2020, p. 26).
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Assim, determinar o interesse comum parece muito complicado dentro de um conjunto social que seja diverso. A homogeneidade é fator determinante para o que uma sociedade aplique a vontade geral: “cabe lembrar que Xxxxxxxx, além de pensar a vontade geral como tendo que ser objetivamente efetiva, resultante da geração real de um dado povo como um ser coletivo” (XXXXXX, 2018, p. 76). Fica menos factível ainda aplicar essa vontade observando essa característica. Uma sociedade com mais de um credo, mais de uma etnia, mais de uma cultura, mais de um povo teria mais chances de insucesso ao aplicar a vontade geral, pois fica mais complexo que os interesses convirjam em função de suas diferenças. Saber o que é a vontade geral é realmente um dos pontos mais questionáveis de seus princípios do direito político que Xxxxxxxx visou colocar em prática quando publicou o Contrato Social, já que qualificar o que é o bem comum é o preceitochave da legislação:
E o que qualifica essa vontade é seu objeto: geral, em um caso, particular, no outro. Mais importante, portanto, do que o sujeito a que se atribui à vontade – à pessoa moral do soberano ou à pessoa natural dos cidadãos – é o objeto a que ela se refere. E esse objeto não é outro senão o interesse ou o bem comum. (REIS, 2010, p. 13).
Esse bem comum é o melhor para o soberano, ou seja, melhor para o povo. Analisando essa máxima podemos chegar a um novo impasse: seria a vontade geral a “soma da maioria dos votos” como geralmente é a lógica para uma decisão “democrática”? Para Xxxxxxxx, não é tão simples. A vontade geral está acima da vontade da maioria, ela não é somente uma soma das vontades particulares: “Via de regra, há muita diferença entre a vontade de todos e a vontade geral; esta se refere somente ao interesse comum, enquanto a outra diz respeito ao interesse privado, nada mais sendo que a soma de vontades particulares” (XXXXXXXX, 2006, p. 37).
Sabese que há paixões individualistas nocivas e que, por vezes, elas prejudicam as deliberações públicas. Com isso, vemos que existem algumas paixões oriundas da vida social que podem afetar a inclinação ao correto objeto da lei, ou seja, o bemestar social. Portanto, é comum a vontade da maioria divergir da vontade geral, pois frequentemente a vontade da maioria é irracional e voltada a grupos ou facções. Um grupo majoritário pode levar em conta no processo decisório a intenção de promover somente um interesse que lhe parece melhor ou mais conveniente para o intento daquela facção, mesmo que tal decisão se contraponha ao bem comum da república. Portanto, a formação de partidos e agremiações diversas tende a formar grupos dominantes que, em seu sentido mais degenerado, são classificadas por Xxxxxxxx como facções. Esses grupos com interesses semelhantes se juntam para minar a vontade geral e disfarçar seus interesses pessoais como interesses do corpo político.
Logo, para que a vontade geral realmente seja colocada em prática, a pessoa a tomar essa vontade é a pessoa moral, não as agremiações particulares. Conforme lemos em Alves (2019, p. 158): “Seguindo a reflexão de Xxxxxxxx, constatase que as facções comprometem a liberdade, pois alteram o cerne da vontade geral nas assembleias públicas ao serem conduzidas por uma vontade particular ou por vontades corporativas. ”
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Em Xxxxxxxx, a formação de facções degenera a moral e a coletividade autêntica, além de incentivarem a desunião e a intolerância ao inviabilizarem quaisquer interesses de quem não professa os discursos desses grupos ou quem não partilha dos mesmos
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pensamentos. Apesar de não serem classes sociais, facções também promovem as desigualdades e a estratificação, têm seus próprios desejos, funcionam como uma espécie de “Estamento” e tornam o bem comum algo “negociável”.
É verdade que Xxxxxxxx estabelece muito claramente, como condição para a manifestação da vontade geral, que não apenas seu objeto seja geral (e não há objeto mais geral do que o bem comum ou o interesse geral), mas também que seu sujeito seja o mais geral possível: ela tem de “partir” de todos. No entanto, essa insistência na generalidade do sujeito é mais uma maneira de enfatizar o compromisso com uma ideia forte de igualdade do que um reforço da ideia de atribuir a vontade geral à pessoa moral do soberano. (REIS, 2010, p. 15).
Assim, um dos males mais perigosos provocados pela formação de parcialidades é que, ao propor programas individuais, fica prejudicada tanto a forma quanto o conteúdo da vontade do soberano. O corpo político em que ocorre a formação de facções tende a degenerarse, assim a desigualdade retorna ao cenário. Como visto, na visão de Xxxxxxxx, a falta de igualdade provoca em uma sociedade a alienação do bem inalienável, ao qual o contrato social legítimo protege, a saber, a liberdade.
Nesse contexto, um dos fundamentos mais importantes do pacto se perde e uma das corrupções sociais mais tóxicas à ordem civil, a desigualdade social excessiva, espalhase. A desigualdade impede uma sociedade ordenada, pois mina as instituições, corrompe os magistrados e desfigura o Legislativo, matando a vontade geral. Em uma sociedade na qual a corrupção está bastante difundida, ele esclarece que não há as condições necessárias para uma ordem civil republicana ser fundada e prosperar. Ou seja, quando existe desigualdade, inexiste legitimidade e a sociedade se vê guiada pelo dinheiro e pelo luxo:
Xxxxxxxx salienta, além do mais, que o luxo torna os homens brandos e servis, e ao difundir a corrupção elide a virtude cívica. As diferenças antagônicas entre ricos e pobres abrem precedente também para que um cidadão passe a depender de uma vontade particular, podendo guiar um homem a trocar a sua liberdade pela riqueza de outrem, ou seja, se alguém encontrase em posição de destituição material e vendese a um homem rico, comprometendose a obedecêlo, ele estará resignando a sua própria liberdade. (XXXXX, 2017, p. 78).
Assim, a parcialidade de interesses provocada pelas agremiações corrompe os valores coletivos. Nas associações, os sujeitos podem obter vantagens que imaginam ser um bem comum, no entanto, enquanto cidadãos podem estar indo contra a vontade legítima. Ou seja, nesses indivíduos ocorre a deturpação moral dos desígnios da vida social. Os interesses superam o senso crítico em relação à coletividade. A facção passa ser o grupo ao qual o sujeito pertence e não mais a toda a sociedade:
No contrato social a vontade geral constrange a vontade particular a abrir mão de seus desejos inserindo a noção de dever. Na passagem do estado de natureza para o estado civil, o homem adquire moralidade, pode consultar sua razão antes de ouvir suas inclinações. (ZATTI, 2008, p. 17).
Para Xxxxxxxx, sem a ideia de dever para com todos os membros do corpo político indiscriminadamente, o uso da autonomia é prejudicado, pois esta fica alheia à justiça. Sem a moralidade coletiva guiandoos, os cidadãos que fazem parte de facções comprometem o bem comum sem perceberem. Assim, acreditando estarem corretos, os cidadãos agremiados ferem o corpo político.
Enfim, para Xxxxxxxx, o dever precisa se colocar acima de qualquer singularidade com os demais concidadãos para que o corpo político tenha um movimento legítimo e, assim, possa ser entendido como soberano de todos. Esse dever
para com o bem comum não pode ser colocado à disposição de ninguém, seja instituição, grupo ou pessoa. Ora, nosso autor chamará isso de virtude cívica:
Aquela que Xxxxxxxx denomina de virtude cívica, a qual, podemos supor, de antemão, se apresenta como um combustível imprescindível para mover os cidadãos em prol da defesa da liberdade e lhes conferir a maestria de deliberarem nas assembleias públicas em consonância com a vontade geral. (XXXXX, 2017, p. 265).
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Segundo o Contrato Social, facções são formas de minar o soberano com parcialidade, o que fere a primeira convenção do capítulo V do livro I e o próprio pacto apresentado no capítulo VI desse mesmo livro, já que ali está estipulado que não se pode alienar partes das liberdades e, por isso, não pode um homem servir a outro; ademais, não há nada o que se alienar a um particular, já que o contrato exige a alienação total de todos os indivíduos, de todos os direitos, ao soberano. A vontade geral está profundamente atrelada à liberdade civil limitada pela lei, que só é possível em sociedades sem agremiações: “A liberdade do cidadão tem seu nascimento no exato momento da instituição da vontade geral, visto que ela nada mais é que a vontade comum dos associados, pela qual se institui as leis sob as quais deve estar igualmente submetido o cidadão” (XXXXX, 2008, p. 86).
Em consequência, vemos que a liberdade civil também é uma das implicações do conceito de autonomia na obra de Xxxxxxxx. Por isso, na sequência, dissertaremos sobre a importância desse outro elemento relacionado à autonomia, a saber, a liberdade.
A LIBERDADE CIVIL E MORAL COMO AUTONOMIA NO PACTO SOCIAL
Um dos objetos de reflexão de Xxxxxxxx ao escrever a obra Contrato Social foi definir como uma sociedade garantidora da liberdade poderia surgir de um pacto social, que necessariamente teria que subjugar os membros. Ora, o próprio conceito de contrato social normalmente buscava a entrega da liberdade em troca dos benefícios de uma sociedade civil. Como vimos acima, a vontade geral resolve boa parte do problema. Assim, neste subtópico, buscase compreender como é a liberdade apresentada na obra e quais suas relações com autonomia. Sobre a liberdade em Xxxxxxxx, afirma Xxxxx e Xxxxxx (2018, p. 55):
Xxxxxxxx busca compreender a veracidade da liberdade do homem, criticando assim a sociedade que prende o homem como faz a sociedade francesa. Da mesma forma, o filósofo pretende descobrir como o homem pode manter sua liberdade diante do pacto social, tendo uma pergunta oculta acerca da verdadeira liberdade do homem.
Vimos que a liberdade do estado de natureza foi cerceada pela corrupção social, e esta, por sua vez, é personificada na celebração de um contrato social baseado sobretudo na propriedade e na desigualdade. A liberdade natural não é possível nesta sociedade fazendo com que as pessoas vivam de forma desigual, escravizadas pela riqueza, “que corrompe ao mesmo tempo ricos e pobres, uns pela posse, outros pela cobiça” (XXXXXXXX, 2006, p. 83):
Notese, inicialmente, que Xxxxxxxx não faz uma distinção entre os oprimidos que estão a ferros e os opressores que os mantêm sob sujeição, como agradaria pensar às mentalidades revolucionárias. O que ocorre, nas sociedades existentes, é que todos estão igualmente na situação de escravos. (MARQUES, 2008, p. 3).
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A pior de todas as formas de organização entre indivíduos é a corruptora, aquela que escraviza. A sociedade que é pautada pela escravização de seus membros e pelas inspirações pessoais das vontades particulares das classes mais influentes, esse pacto acirra as discrepâncias naturais, fazendo surgir as desigualdades política e jurídica.
No entanto, Xxxxxxxx desenvolve a tese de que, em estado civil, se pode recuperar um dos elementos benéficos mais importantes daquela condição, isto é, a liberdade, que é readquirida quando o contrato legítimo se celebra: “Xxxxxxxx, no Contrato social, nos diz que a total alienação de cada pessoa à comunidade toda é a condição para estabelecer uma sociedade igualitária e livre.” (XXXXX, 2008, p. 65).
Além disso, em Xxxxxxxx, a liberdade tem variações de formas e de intensidades à medida que o raciocínio da obra Contrato Social vai avançando em sua reflexão. É importante dizer que todas elas representam a autonomia humana de alguma maneira e em algum momento, mas que tem sua plenitude na liberdade civil e liberdade moral. Em resumo, na obra Contrato Social, podemos identificar alguns tipos de liberdades distintas:
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Por conseguinte, a noção rousseauniana de liberdade declinase em vários níveis: como independência ou liberdade natural, como liberdade civil e política (convencional) e como liberdade moral, sendo esta última a que dá pleno sentido à segunda. A consideração moral da liberdade leva a estabelecer em sede de liberdade civil uma distinção qualitativa entre uma [falsa] liberdade que consistisse apenas em seguir os impulsos das paixões (e que, segundo o filósofo, não seria mais do que escravidão) e a verdadeira liberdade (entendida como o ser efetivamente senhor de si, o obedecer à lei que a si próprio se dá). (SANTOS, 2017, p. 322).
Assim, a melhor forma de compreender toda essa manifestação de liberdade na obra Contrato Social é entender que o ser humano deve agir com autonomia, sendo senhor ou legislador de suas próprias leis:
Xxxxxxxx define liberdade, nessa obra, como a obediência que o homem deve à lei que se determinou a si mesmo, ou seja, a lei que ajudou a elaborar a partir do que há de comum nas vontades particulares. A liberdade, para o filósofo, torna o homem senhor de si mesmo, com autonomia da vontade, e não escravo, quando age por impulso. (BRIGHENTE; POI, 2013, p. 21.756).
Assim, a liberdade é uma das implicações diretas do conceito de autonomia na obra Contrato Social de Xxxxxxxx. Quando a liberdade positiva é obstruída por outrem, temos o cerceamento da liberdade política e o impedimento da livre atuação civil (cf. BERLIN, 2002, p. 229). Em sociedade civil, a liberdade positiva é expressa na autonomia dos homens em criar as leis que eles irão obedecer, já que são necessários argumentos para sustentar as normas, como disserta Berlin (2002, p. 105): “Quando perguntamos por que um homem deve obedecer, estamos pedindo explicação do que é normativo em noções como autoridade, soberania, liberdade e a justificação de sua validade em argumentos políticos. ”
A autonomia, como já vimos, é a capacidade de todo o ser humano de auto legislarse. Por vezes, autonomia e liberdade convergem, se entrelaçam e são, às vezes, até considerados sinônimos. Entretanto, quando acirramos as interpretações notamos diferenças conceituais importantes, sobretudo no que tange as afirmações do final do livro I da obra Contrato Social, em que Xxxxxxxx afirma que o pacto social é uma constituição em vão se ele não for obedecido na íntegra ao se manifestar pela vontade geral, já que essa é a condição para que o soberano funcione como legitimador da liberdade (cf. XXXXXXXX, 2006, p. 29). Portanto, é evidente que Xxxxxxxx demonstra “restrições” ou “coerções” à liberdade natural individual para libertar o ser humano ou
tornálo um “homem livre”:
Ninguém negaria, é verdade, que a vida em sociedade exige restrições da liberdade de cada indivíduo para tornála compatível com a liberdade dos demais. O que surpreende na afirmação de Xxxxxxxx não é que coerções devam ser impostas, mas que sejam elas, essencialmente, que tornem o homem livre. (MARQUES, 2010a, p. 103).
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Assim, poderíamos dizer que há um suposto paradoxo nesse raciocínio presente no Contrato Social, já que ao se tratar de um livro sobre liberdade, fala também de obediência quase que irredutível às leis do soberano. Ora, esse dito paradoxo só existe realmente quando não se dá a devida acepção ao conceito de liberdade em Xxxxxxxx.
A ideia de autonomia rousseauniana é justamente dar às leis um devido processo republicano de formação, a fim de que elas por si só signifiquem a expressão da liberdade e, assim, não possam ser questionadas, pois foram expressadas pela vontade geral. Portanto, para Xxxxxxxx, não se pode imaginar um “paradoxo” da liberdade versus obediência quando há uma lei que foi promulgada pela autonomia dos cidadãos unidos em contrato:
Mas – poderseia dizer – tudo isto é um equívoco, porque se está tentando aplicar a Xxxxxxxx uma concepção de liberdade que não é a dele. Xxxxxxxx teria, supostamente, um conceito “diferente” de liberdade; e se chegássemos a entender qual é esse conceito, suas afirmações deixariam de soar problemáticas. (MARQUES, 2010a, p. 108).
“Xxxxxx, como compreender que as pessoas estejam vinculadas às outras e, ainda assim, continuem "tão livres como antes"? Bem, como já se sabe, a saída é a "vontade geral" do modo como Xxxxxxxx a explica” (LIMA, 2015, p. 3). Analisando corretamente o conceitochave que é a vontade geral, e a relação desta com a liberdade civil, a liberdade moral e a autonomia, podemos perceber que o pensamento de Xxxxxxxx não é necessariamente paradoxal, já que o Contrato Social, enquanto escala de referência para os Estados, cumpre o papel de ser um “dever ser” político acerca da república.
Nesse sentido, é necessário entender a coerção e, em certa medida, dentro dos padrões, o Estado republicano proposto por Xxxxxxxx como uma forma necessária de manutenção da autonomia cidadã e da liberdade civil e moral. O Estado da escala de referência de Xxxxxxxx prima pela verdadeira liberdade e mais ainda pela concessão da autonomia. Isso só é possível administrando as fronteiras entre as liberdades dos cidadãos para promover igualdade. Assim, a república de Xxxxxxxx é um conjunto de liberdades reguladas pela vontade geral.
No caso, pensar que o homem é um agente naturalmente livre implica em reconhecer que esse agente pode agir contra seus instintos, têm engenhos e faculdades que lhe permitem “desobedecer” a suas paixões. Sendo a liberdade um dos principais conceitos relacionados à autonomia no Contrato Social, ela deve ser vista como algo benéfico ao ser humano, ainda que signifique subjugarse às leis do soberano. Nesta sequência, foi a própria caminhada do ser humano rumo à formação social que o impossibilitou de voltar a ser livre como antes. Assim, a escala de referência, apresentada no Contrato Social, traz a problemática de como submeterse ao Estado e, ainda assim, manter elementos intrínsecos da liberdade humana:
A liberdade permite que o homem aja na direção contrária à sua natureza, sendo capaz de, já no estado civil, tornálo escravo. Porém, não é o caso de que, desta feita, se figure um novo homem; ao contrário, é o próprio desenvolvimento de suas características distintivas, como a liberdade e a perfectibilidade, que
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possibilita o afastamento de sua natureza ou, de outro modo, sua efetivação, matéria do Contrato Social. Então o homem desnaturalizase, mas suas qualidades essenciais permanecem intrínsecas. (KOHN, 2013, p. 19).
Além disso, nunca é demais lembrar que o que se apresenta no Contrato Social é justamente uma experiência epistemológica, ou seja, é um discurso sobre o “deverser” de uma sociedade plenamente livre e promotora dessa liberdade. Aplicálo em sua totalidade é algo quase que infactível para o próprio Xxxxxxxx. Assim, o plano de implantar algo que possa realmente ser executado não consta diretamente no Contrato Social:
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Se é certo que as divergências interpretativas não podem ser de todo anuladas, elas podem, contudo, ser atenuadas e matizadas, nomeadamente, caso se tenha em conta não só a complexidade da obra do filósofo como também alguns aspectos metodológicos da sua abordagem. Em primeiro lugar, o que se poderia chamar o estatuto epistêmico do discurso político do filósofo genebrino, que nos obriga, em cada caso e em cada obra, a averiguar o plano em que o seu autor se implanta: tratase de um programa para ser executado efetivamente ou de uma conjectura hipotética? De fato, mais do que uma vez Xxxxxxxx expõe o seu pensamento político e social como se procedesse a uma experiência mental. (SANTOS, 2017, p. 307).
Ora, o “poder ser” das leis é justamente um dos elementos problemáticos no suposto paradoxo da liberdade. O “como as leis deveriam ser” sugere que Xxxxxxxx está criando uma hipótese reflexiva sobre os limites da obediência e as fronteiras da liberdade civil, tendo como principal delimitador a vontade geral. Assim, apesar de muitos considerarem “infactível” a reflexão rousseauniana, podemos verificar que, na realidade, ela serve para enriquecer o debate acerca da liberdade e da autonomia e mostrar, como já assinalado, uma escala de referência aos Estados reais, a fim de que estes possam se aproximar dessas referências conceituais:
Na mesma medida em que a vontade geral se apresenta como um conceito puramente abstrato e reflexivo, uma ideia reguladora para melhor conduzir o Estado, limita sob muitos aspectos a ação política e a factibilidade da prática legislativa. Ao mesmo tempo em que oferece mais vigor ao debate teórico da política, é limitada e insuficiente para solucionar todos os problemas da esfera prática desta área. (XXXXXXX, 2015, p. 76).
Além disso, Xxxxxxxx (2006, p. 129) afirma: “cada homem tendo nascido livre e senhor de si mesmo, ninguém pode, sob pretexto algum, sujeitálo sem seu consentimento”; isto é, a esse ser humano liberto cabe ainda a virtude cívica, que é o comportamento moral do respeito à lei. Assim, essa obediência não prejudica a autonomia conquistada via pacto legítimo:
O homem livre, em Xxxxxxxx, é aquele capaz de escolher para si o que lhe for favorável, não deixando que ninguém o faça em seu lugar. Ele não precisa ser conduzido, pois é senhor de si mesmo, logo, não é escravo e, também, não é um opressor. (BRIGHENTE; POI, 2013, p. 21761).
A autonomia é parte importante da vida cívica em Rousseau, pois é a expressão da liberdade dentro da sociedade civil, na qual os cidadãos gozam dela em relação aos outros enquanto indivíduos, sem manter xxxxx nos assuntos políticos. Portanto, a escala de referência proposta, no Contrato Social, leva em conta a possibilidade de assegurar a autonomia dos cidadãos nos assuntos políticos.
Assim, no ContratoSocial, buscase criar um pacto em que a verdadeira liberdade seja um elemento fundamental da vida política. Além disso, a formação da sociedade
elimina a liberdade natural, pois na vida social não cabe mais a total independência que caracteriza o estado de natureza; logo, é preciso mais do que somente uma organização civil. Só assim os verdadeiros princípios do direito político se pautarão na liberdade e na igualdade:
A saída rousseauniana para o impasse da desigualdade social e política na sociedade civil é a configuração de um Estado cujo poder reside no povo, na cidadania, por meio da vontade geral [...] assim apenas esse Estado, um Estado de Direito, fundado nas leis definidas pela vontade geral, seria capaz de limitar os extremos de pobreza e riqueza presentes na sociedade civil e promover educação pública para todos – meio decisivo para a livre escolha. (BEHRING; XXXXXXXXX, 2006, p. 58).
Além disso, verificamos que é a liberdade que nos difere dos demais seres existentes, pois, para Xxxxxxxx, o ser humano pode ser um “agente livre”, por um “ato de liberdade”:
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Em cada animal vejo somente uma máquina engenhosa a que a natureza conferiu sentidos para recomporse por si mesma e para defenderse, até certo ponto, de tudo quanto tende a destruíla ou estragála. Percebo as mesmas coisas na máquina humana, com a diferença de tudo fazer sozinha a natureza nas operações do animal, enquanto o homem executa as suas como agente livre. Um escolhe ou rejeita por instinto, e o outro, por um ato de liberdade, razão por que o animal não pode desviarse da regra que lhe é prescrita, mesmo quando lhe fora vantajoso fazêlo, e o homem, em seu prejuízo, frequentemente se afasta dela. (XXXXXXXX, 1973, p. 248249).
Assim, diferente dos demais animais, que são totalmente intuitivos e estão presos aos instintos, impossibilitados de agirem de forma livre, o ser humano goza da liberdade, sendo algo ímpar. Na filosofia rousseauniana, o que torna o ser humano único é a capacidade de saber que somos livres e, partindo disso, viver conforme a autonomia de legislação própria, sendo senhores de nosso destino:
Para Xxxxxxxx, a liberdade é a mais nobre das faculdades do homem, é um dom que, tal como a vida, os homens obtêm diretamente da natureza, na sua qualidade de homens, e seria ofender a natureza e o autor da natureza renunciar ao mais precioso de todos os seus dons, um dom que coloca ao lado do da própria vida, pois sem liberdade a vida não é digna de ser vivida. (SANTOS, 2017, p. 317318).
Ora, se o que nos torna seres humanos é essa capacidade única de agir com autonomia, perdêla em algum momento, por quaisquer que sejam as razões, está fora de questão, não é algo possível, pois não há como negociar essa parte do que somos. Não se é de fato humano se não se é livre para agir autonomamente. Esse atributo é uma questão central do Contrato Social,já que a busca é “encontrar uma forma de associação” em que todos sejam livres:
Com efeito, se a liberdade é o atributo natural por excelência do homem, e se como diz Xxxxxxxx constitui em sua diferença específica, então esse atributo deve estar presente nele em todas as condições existenciais em que possa se encontrar, pois a diferença específica é sua essência necessária. O que significa que, na falta desta, o homem deixa de o ser. (SILVA, 2008, p. 90).
Assim, por ser parte inerente e essencial do indivíduo, a liberdade está definitivamente impossibilitada de ser entregue a quem quer que seja, com ou sem intenção de fazêlo. Assim, mesmo em um pacto social, não se pode abrir mão da autonomia, daí a diferença primordial do contratualismo rousseauniano e o porquê de a autonomia ser tão mais importante em sua versão de contrato social:
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O homem é liberdade; somente através da liberdade se pode ser homem; a liberdade não somente é direito, mas também dever; sem liberdade não há moralidade e sem moral não há humanidade. É nesse contexto que Xxxxxxxx propõe legitimar liberdade, igualdade e soberania. As ideias reaparecem com grande força diante das extensões absolutistas do "direito divino dos reis", e cabe a Xxxxxxxx sintetizar todo o pensamento contratualista com sua própria versão. (DIAS, 2013, p. 72).
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A autonomia é a representação racional da liberdade que os humanos herdaram do estado de natureza. O homem civil em um Estado que preza pelos elementos do Contrato Social é “tão livre quanto antes” (XXXXXXXX, 2006, p. 20). Quando estava em estado de natureza, o ser humano era independente, porém só; passando à “república” do Contrato Social, o soberano que é a união de vários indivíduos em contrato preserva mais eficazmente a liberdade de seus membros do que eles conseguiam fazer individualmente. Portanto, no Contrato Social,propõese que a liberdade seja parte do soberano; por isso, Xxxxxxxx (2006, p. 20) procura: “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindose a todos, só obedeça, contudo, a si mesmo e permaneça tão livre quanto antes.”
Um dos principais objetivos do pacto expresso na obra Contrato Social é legitimar a liberdade e aplicála à sociedade civil sem prejuízo. Essa operação lógica levaria ao uso da autonomia como liberdade de discernimento político e moral dentro de uma nação firmada nos princípios de igualdade. O discernimento, por sua vez, levaria os indivíduos a moverem o soberano de acordo com a vontade geral. A isso podemos chamar autonomia legislativa, que é precisamente criar as leis que se vai obedecer:
Assim, o pacto social não deixa de considerar o autointeresse individual e visa produzir, em todos os seus membros, uma forma de liberdade que é definida como a própria ideia de autonomia, ou seja, obedecer à lei que o sujeito dá a si mesmo. (MOSCATELI, 2019, p. 53).
Assim, Xxxxxxxx valoriza a liberdade ao ponto de colocála em seu contratualismo como a legitimadora do pacto social perfeito. Ou seja, as sociedades civis verdadeiramente legítimas são aquelas em que seus associados não abriram mão da liberdade e a continuam usando como autonomia no exercício da cidadania.
Para concluir, devemos enaltecer que a liberdade é fruto da política, no entanto, o movimento em prol da liberdade é demonstrado na emancipação através do Iluminismo. Seguindo esse raciocínio, o soberano precisa garantir que a educação seja em prol da autonomia. Há uma relação estreita entre a educação e a liberdade na sociedade proposta pelo Contrato Social. Como vimos, vontade geral é o exercício cívico da autonomia, que é legitimada pelo pacto social; mas, como usar tal dispositivo sem uma formação mínima? Por isso, cabe destacar também a educação como uma das implicações pertinentes ao conceito de autonomia, devido a essa estreita relação entre o sucesso da vontade geral e um soberano esclarecido:
Nesse caso, a liberdade política somente pode ser alcançada a partir de uma política governamental que conjugue tanto uma educação pública que aponte para a igualdade dos indivíduos, quanto uma política de diminuição da desigualdade material dos seus cidadãos, isto é, da diferença em relação às posses e às riquezas. Essa política de diminuição da desigualdade de riquezas deve ter dois aspectos, ambos objetivando uma mudança gradual dessa diferença. (KLEIN, 2015, p. 280).
Com isso, a educação como formadora da autonomia tem uma importante função nas relações entre todos os membros do soberano, já que ela é a promotora do esclarecimento dos membros e a reveladora das características naturais que o ser
humano necessita readquirir, sendo a mais importante delas a própria liberdade.
Considerações finais
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Ao propor um estudo do conceito de autonomia dentro da filosofia expressa na obra Contrato Social de JeanJacques Xxxxxxxx, objetivavase a compreensão de como esse conceito poderia ser decisivo para o tratado político do pensador iluminista, bem como a influência desse conceito para sua filosofia. Após pesquisa e análise de parte da bibliografia disponível sobre o tema, foi possível concluir que a autonomia, enquanto auto legislarse, permeia toda a obra Contrato Social e é um dos conceitos que dão base ao fluxo da referida obra.
Ao ler e analisar as obras de Xxxxxxxx, em especial o Contrato Social, foi possível coletar argumentos suficientes para sustentar que a autonomia faz parte do “ser” humano, sendo expressa de várias maneiras e suas implicações podem ser vistas nos seus conceitos de liberdade, igualdade, vontade geral, virtude cívica e até mesmo na lógica que o genebrino usa para legitimar as formas de governo que são consideradas como legítimas. Além disso, é impossível desvencilhar a autonomia do pensamento rousseauniano, mesmo quando este trata o patriotismo, a força e as prerrogativas do Estado de controlar elementos da vida dos indivíduos com o rigor da lei; afinal, o genebrino toma cuidado para que esse suposto cerceamento não leve à supressão da autonomia.
Xxxxxxxx entende ainda que a liberdade é inerente ao ser humano a tal ponto que o identifica como tal: isto é, um sujeito que não é livre sequer é, de fato, um ser humano; assim, nesse sentido, autonomia é imanente a todos, que, no uso de seus engenhos e suas faculdades, lançam mão da razão para guiar sua vivência. Por isso, no artigo, referenciouse que esses elementos têm, em suas bases conceituais, a influência do conceito de autonomia.
Procuramos ver a presença do conceito de autonomia nos elementos mais fundamentais da obra Contrato Social ebuscamos analisar os conceitos de estado de natureza, de vontade geral, de liberdade, de igualdade e de virtude cívica, como elementos que tinham implicações diretas com o conceito de autonomia, sendo todos estes interrelacionais e interdependentes dentro da estrutura de Estado proposta pelo genebrino em sua obra. Afinal, o Estado, que tem como pressuposto a soberania popular, depende da autonomia dos cidadãos para propor os desígnios de um Legislativo e Executivo que leve em conta a vontade geral, expressão máxima da autonomia. Ou seja, sem o alicerce na autonomia, não há contrato social legítimo, o que, por conseguinte, compromete a liberdade e a igualdade, que tornam impossível que os cidadãos gestem a virtude cívica. De tal modo, em resumo, para Xxxxxxxx, sem autonomia os demais elementos aqui sumarizados perdem sua utilidade dentro da proposta do Contrato Social.
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Em suma, constatamos que a autonomia de Xxxxxxxx ainda tem elementos a serem considerados no nosso tempo, pois está dentro de várias discussões vigentes. Além disso, no campo político, constantes debates relacionados à autonomia e suas implicações políticas ocorrem sobretudo quando o assunto é sobre a estrutura dos Estados federativos, o debate para a construção de alternativas democráticas, as demandas referentes ao Estado Democrático de Direito e as garantias de igualdade. Portanto, em maior ou em menor grau, convém argumentos rousseaunianos, xxxxxxx a dedicação desse autor em exemplificar como a liberdade é inerente aos seres humanos e a autonomia é a expressão prática dessa mesma liberdade. Assim sendo, em síntese,
mostrase toda a relevância do conceito de autonomia na obra Contrato Social de Xxxxxxxx, problema sobre o qual procuramos reunir, analisar e interpretar informações.
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Notas
1 O significado do conceito de “alienação” pode divergir dependendo da teoria de Filosofia Política ou Jusfilosofia em que é aplicado. Em Rousseau, esse termo tem similaridade com entrega, com associação, com “garantia”. Assim como se aliena bens em garantia de algum benefício vindouro, Xxxxxxxx apresenta a alienação ao contrato social como o “penhor” da liberdade natural em relação ao Estado, que dará em troca a liberdade civil, sendo esta última mais vantajosa. Portanto, Xxxxxxxx usa esse termo para exemplificar a livre associação dos sujeitos. Assim, dentro do pensamento rousseauniano é possível uma alienação positiva. Conforme Kochem (2017, p. 94): “Antes de poder se dar a um rei, diz Xxxxxxxx, o povo já é povo, no contrato social ao buscar este princípio, ele entende então que a alienação é positiva quando faz parte da fundação de uma sociedade, pois como já dito, é com base nesta alienação positiva que a sociedade se constitui e se mantém de forma justa”.