O CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA MENOR THE MINOR ATHLETE EMPLOYMENT CONTRACT EL CONTRATO DE EMPLEO DE ATLETA MENOR
O CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA MENOR THE MINOR ATHLETE EMPLOYMENT CONTRACT EL CONTRATO DE EMPLEO DE ATLETA MENOR
Carolyne Ferreira de Souza1
Resumo: A presente pesquisa tem por objetivo analisar o contrato do atleta em formação a partir dos quatorze anos de idade até os vinte anos, apontando as lacunas da lei quando se trata da definição e previsão adequada desse tipo contratual, diferenciando-o dos demais contratos previstos pela CLT ou leis especiais quando se trata do menor, como o contrato de estágio e de aprendizagem. Além disso, questionar o tratamento evidentemente limitado da lei considerando a absoluta incapacidade do atleta em formação, bem como sua adequada formação a ser especificada dentro desse tipo contratual sua falta de atenção ao considerá-lo um ser humano em formação além de um profissional, tendo em vista todas as especificidades de sua atividade desempenhada. Analisando na forma da abordagem hipotético-dedutiva e buscando resultados através da análise qualitativa por entrevistas, questionários, pesquisa de opiniões e documentos, tem-se o objetivo de concluir a melhor forma contratual para o atleta em formação desportiva, com atenção adequada às suas necessidades como atleta e como menor.
Palavras-chave: Direito do Trabalho Desportivo; Trabalho do menor; Atleta em formação; Formação Desportiva; Vulnerabilidade do atleta menor.
Abstract: This research aims to analyze the contract of the athlete in training from fourteen years of age to twenty years old of age, pointing out the gaps in the law when it comes to the proper definition and provision of this type of contract differentiating it from other contracts provided for by the CLT or special laws when it comes to the minor, such as the internship and apprenticeship contract. In addition, questioning the evidently limited treatment of the law considering the absolute incapacity of the athlete in training, as well as his adequate to be specified within this contractual type, his lack of attention when considering him a human being in training as well as a professional, having in view of all the specifics of their activity. Analyzing in the form of the hypothetical-deductive approach and seeking results through qualitative analysis through interviews, questionnaires, surveys and documents, the objective is to conclude the best contractual form for the athlete in sports training, with adequate attention to their needs as an athlete and
1 Advogada, graduada e Direito pela Universidade de Caxias do Sul, especialista em Gestão do Esporte e Direto Desportivo e Direito e Processo do Trabalho; Vice-coordenadora do Núcleo de Direito Desportivo da ABA Niterói e Confraria dos Advogados, pesquisadora do Grupo de Estudos Direito e Desporto (GEDD) - São Judas.
as a minor.
Keywords: Sports Work Law; Minor's Work; Athlete in training; Sports Training; Vulnerability of the minor athlete.
Resumem: Esta investigación tiene como objetivo analizar el contrato del deportista en entrenamiento desde los catorce años hasta los veinte años, señalando los vacíos en la ley a la hora de la adecuada definición y prestación de este tipo de contrato, diferenciándolo de otros contratos previstos por la CLT o leyes especiales en lo que respecta al menor, como el contrato de prácticas y aprendizaje. Además, cuestionando el tratamiento evidentemente limitado de la ley considerando la absoluta incapacidad del deportista en entrenamiento, así como su adecuada formación para concretarse dentro de este tipo contractual, su falta de atención para considerarlo un ser humano en entrenamiento así como un profesional, teniendo en cuenta todas las particularidades de su actividad. Analizando en forma de enfoque hipotético- deductivo y buscando resultados a través del análisis cualitativo a través de entrevistas, cuestionarios, encuestas y documentos, el objetivo es concluir la mejor forma contractual para el deportista en el entrenamiento deportivo, con adecuada atención a sus necesidades como deportista. y como menor.
Palabras clave: Derecho Laboral Deportivo; Trabajo de Menores; Atleta en formación; Entrenamiento desportivo; Menor vulnerabilidad del deportista.
1 Introdução
A Consolidação de Leis Trabalhistas define contrato de trabalho como “acordo tácito ou expresso correspondente à relação de emprego” (CLT art. 442). De regra, o contrato de trabalho sempre foi aplicável a pessoas maiores de idade que firmam o compromisso do exercício de atividade remunerada com empregador. Entretanto, nos últimos anos passou a ser cabível o ingresso de menores no ato de prestação de atividade remunerada a empregador, sem que, no entanto, caracterizasse propriamente vínculo empregatício.
Desse modo surgiram contratos especiais para aprendizes, estagiários e atletas em formação, que tem como fim a remuneração, por vezes chamada de bolsa auxílio, para o exercício de atividade vinculada ao aprendizado de alguma profissão ou outra área do conhecimento.
No caso dos menores introduzidos no esporte para fim de aprendizado profissional, assunto que será enfatizado a seguir, no Brasil começou a ocorrer na década de 60, mais especificamente em 1966, quando surgiram as primeiras categorias de base para formação de atletas profissionais do futebol. Esse início ocorreu na época devido à crise no esporte brasileiro instalada na Copa do Mundo de 1966, surgindo assim para o ramo desportivo a necessidade de não apenas contratar, mas de formar atletas. Até hoje o futebol, seguido do judô é o esporte que mais forma jovens atletas no Brasil, iniciando sua formação aos quatorze anos de idade.
Com esse precoce ingresso a seu futuro mercado de trabalho, o atleta menor, que se
encontra em posição diferenciada de outros aprendizes de outras profissões, necessita de amparo legal especial, pelas evidentes particularidades de seu exercício, já que está sujeito a questões que o diferenciam, sendo, portanto necessário um tipo contratual adequado às atividades que exerce e às consequências que se sujeita ao se colocar na formação desportiva. Formação essa, que exige a disciplina mais acentuada, esforço físico, sujeição à distância familiar e risco de não alcance ao objetivo almejado, que é o contrato especial de trabalho desportivo, tornando-se, de fato, um atleta profissional.
Desse modo, é importante analisar o contrato especial de trabalho desportivo em geral para que se possa sugerir a criação de um tipo especial de trabalho que seja adequado às necessidades do atleta em formação, bem como, ver isso como algo necessário, visto que desde a década de 60 já se passaram anos, sem que, contudo, houvesse esse progresso, e ainda, compreender que a ausência de amparo legal específico unida à fase de adolescência desse menor gera consequências que não podem ser ignoradas.
Diante dessa situação de vulnerabilidade em que se encontra o atleta menor, envolvendo a complexidade de suas necessidades, bem como, a ausência de um contrato de formação adequado, que o regre e o proteja, podemos, nesse contexto, analisar essa proposta de trabalho que visa demonstrar a necessidade de atenção a esta lacuna existente na lei no tocante ao contrato do atleta menor, apresentando conceitos, definições e levantamentos de dados com informações práticas acerca do assunto, baseando-se em argumentos de doutrinadores e especialmente em profissionais da área desportiva, tanto do Direito Desportivo, quanto do exercício do esporte.
Para o desenvolvimento do presente trabalho foram utilizadas pesquisas bibliográficas e de campo, além de estudo de caso. A pesquisa bibliográfica baseou-se em sua maioria em artigos e livros abordando as particularidades do contrato de trabalho, e as análises de áreas relacionadas, como a psicologia e a sociologia do desporto. O estudo de caso foi desenvolvido em sua totalidade através de pesquisa de campo, envolvendo relatos de profissionais do esporte em exercício sobre as mudanças ocorridas legalmente, quanto à posição do atleta menor e consequências acerca do assunto.
2 O Contrato Especial de Trabalho Desportivo e o vínculo do atleta em formação
De acordo com a Consolidação de Leis Trabalhistas, o contrato de trabalho corresponde a um acordo tácito ou expresso correspondente a uma relação de emprego, que pode ser aplicável a pessoas maiores de idade que firmam o compromisso do exercício de atividade remunerada com empregador. Ou seja, para firmar contrato de trabalho é necessário, via de regra que o empregado seja maior de idade. No entanto, como exceção a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente preveem exceções, afirmando que “é proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz” (ECA, art. 60). Logo, é
possível que o menor exerça atividade laboral, desde que em circunstâncias específicas e com propósito específico.
Desse modo, surgiram contratos especiais para aprendizes, o que não necessariamente enquadra os atletas em formação, que tem como fim a atividade vinculada ao aprendizado de alguma profissão ou outra área do conhecimento, de modo a formar um profissional que está aprendendo uma profissão.
No caso dos menores introduzidos no esporte para fim de formação desportiva vislumbrando o aprendizado profissional, se deu início no Brasil em 1966, quando surgiram as primeiras categorias de base para formação de atletas profissionais do futebol. Esse início ocorreu na época devido à crise no esporte brasileiro instalada na Copa do Mundo do mesmo ano, surgindo assim para o ramo desportivo a necessidade de não apenas contratar, mas de formar atletas. Até hoje o futebol, seguido do judô é o esporte que mais forma jovens atletas no Brasil, iniciando sua formação aos quatorze anos de idade.
Apesar de as categorias de base terem iniciado em 1966 como anteriormente mencionado, a primeira lei brasileira a mencionar o atleta em formação foi justamente a Xxx Xxxx, apenas em 1998.
Em razão da existência dessa lacuna na lei, a Resolução n. I de 17 de outubro de 1996, editada pelo INDESP, regulamentou o trabalho do atleta menor.
Art.1º - O atleta de futebol, maior de dezesseis anos, será considerado profissional, quando sua atividade estiver caracterizada por subordinação e remuneração pactuada em contrato de trabalho próprio, com empregador pessoa jurídica de direito privado, e, devidamente registrado na entidade de administração do desporto.
1º O atleta de futebol maior de dezesseis anos e menor de vinte anos será considerado semi-profissional sempre que sua atividade estiver caracterizada por subordinação e contrato específico de condicionamento físico e formação técnica e atlética, com incentivos materiais, firmando com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, e devidamente registrado na entidade federal de administração do desporto.
2º O atleta de futebol, menor de dezesseis anos é amador nos termos do parágrafo único, II, b do art. 3º da Lei 8.672/93, sendo livre para se transferir para outra entidade de prática desportiva do mesmo gênero, observado o término da validade de sua inscrição no último torneio ou campeonato.
3º O atleta de futebol maior de dezesseis anos, que não mantiver vínculo contratual como semi-profissional ou profissional é livre para se transferir para outra entidade de prática desportiva no mesmo gênero, observando o término da validade de sua inscrição no último torneio ou campeonato.
Nas palavras de Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, “a redação original trazida pela Lei 9.615/98 caracterizava o atleta “menor” como sendo semiprofissional, determinando a assinatura de um “Contrato de Estágio Desportivo”, que deveria seguir o modelo “padrão” do Contrato Especial de Trabalho Desportivo” (ZAINAGHI, 2021, p. 66).
Entretanto, a atual Lei 11.788/2008, prevê estágio como:
Ato educativo supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa a preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de ensino superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial, e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de jovens e adultos.
Nesse sentido, atleta em formação não se enquadra na categoria estagiário, que possui lei especial que o define, além disso, a formalização do estágio deve ocorrer mediante a celebração de compromisso entre a instituição de ensino e as partes cedentes de estágios em quaisquer hipóteses. E podem recorrer a serviços de agentes de integração públicos e privados, que auxiliarão no processo de aperfeiçoamento do estágio. Logo, o estágio está vinculado a um recurso de aprendizagem, sendo considerada a forma prática da teoria que o aprendiz tem estudado.
Sendo assim, apesar das semelhanças, o atleta em formação não se enquadraria nesse perfil, visto que apesar de ele estar integrado a um clube onde aprende um esporte em sua prática, ele não tem como pré-requisito a matrícula em uma instituição vinculada ao esporte, o que forneceria base teórica para isso. De mesmo modo não se enquadra no contrato de aprendizagem, uma vez que, conforme a previsão do artigo 428 da CLT, é definido da seguinte forma:
Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.
Logo, o aprendiz tem como base o salário mínimo, sendo obrigatoriamente remunerado de forma proporcional às horas trabalhadas, deve haver registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social do aprendiz, além de gerar vínculo empregatício. E ainda, ele deve estar matriculado em cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem ou Escolas Técnicas de Educação. Diferenciando-o imediatamente do atleta em formação,
que não possui vínculo empregatício, e não recai sobre seu formador a obrigatoriedade de pagamento salarial, sendo facultativo o pagamento de bolsa-auxílio, conforme previsão do artigo 29, §4º da Lei 9.615/98:
O atleta não profissional em formação, maior de quatorze e menor de vinte anos de idade, poderá receber auxílio financeiro da entidade de prática desportiva formadora, sob a forma de bolsa de aprendizagem livremente pactuada mediante contrato formal, sem que seja gerado vínculo empregatício entre as partes.
Além disso, o Ministério do Trabalho e Emprego, através do §2º do artigo 1 da Instrução Normativa 26, prevê que “o contrato deverá indicar expressamente o curso, objetivo da aprendizagem, a jornada semanal, a remuneração mensal, o termo inicial e final do contrato.
E a CLT prevê que o descumprimento de tais disposições legais e regulamentares importará a nulidade do contrato de aprendizagem, estabelecendo-se vínculo empregatício diretamente com o empregador responsável pelo cumprimento da cota de aprendizagem (CLT, art. 433).
Aos dezesseis anos, apesar das restrições causadas pela menoridade, o atleta tem o direito de assinar seu primeiro contrato profissional com a mesma entidade de prática desportiva onde se encontra em aprendizado esportivo, não podendo, no entanto, esse primeiro contrato ter duração superior a cinco anos. No caso de renovação desse contrato, essa entidade de prática desportiva tem a preferência de contratação, podendo estender o contrato por prazo não superior a dois anos, sendo, portanto, um contrato por prazo determinado, conforme previsão do artigo 29 da Lei 9.615/98.
O objetivo do legislador nesse caso foi o de garantir a completa formação do atleta e também impedir que as entidades perdessem seus atletas após anos de investimento nas categorias de base, justamente no momento em que esse jovem atleta poderia ser aproveitado nas competições profissionais.
Entretanto, se o atleta completar dezesseis anos e mesmo assim permanecer como atleta em formação, sem contrato profissional formado com o clube, ele não pode ser escalado para competições profissionais, uma vez que é vedada a participação de um atleta maior de vinte anos não profissionalizado em uma competição. Para que essa participação seja possível, ele deverá ser devidamente profissionalizado, nos termos do artigo 43 da Lei 9.615/98, que prevê que “é vedada a participação em competições desportivas profissionais de atletas não profissionais com idade superior a vinte anos”.
Uma exceção para isso é o atleta autônomo de dezesseis anos, ou seja, aquele que não possui vínculo contratual com nenhuma entidade de prática desportiva e produz
rendimento por contra própria, as transitoriamente e de forma autônoma compete com uma espécie de “empréstimo”.
Esse atleta não possui vínculo empregatício gerado no momento em que se encontra inscrito em uma competição. No entanto, vale ressaltar que esta exceção cabe apenas para atletas que não pratiquem esportes com caráter coletivo, apenas para atividades de exercício individual, como a ginástica e a natação, por exemplo.
Esse tipo de contrato de formação, é, portanto, um primeiro passo para o ingresso de uma futura carreira profissional, e apesar de a formação ainda existir, já participam de competições, como ocorre no futebol por exemplo.
O atleta em formação tem sua atividade prevista pela Lei 9.615/98, a “Lei Pelé”, também chamada de Lei Geral do Desporto, que desde 1998 já teve inúmeros artigos revogados e trata do menor de forma sucinta e superficial, basicamente através do artigo 29 desde 2011, focando nos benefícios da entidade de prática desportiva que formou o menor sobre seu atleta formado, sendo, portanto, necessária previsão legal adequada às atividades que exerce e às consequências que se sujeita ao se colocar na formação desportiva. Formação essa, que exige a disciplina mais acentuada, esforço físico, sujeição à distância familiar e risco de não alcance do objetivo almejado, que é o Contrato Especial de Trabalho Desportivo, tornando-se, de fato, um atleta profissional.
Considerando que o Contrato de formação desportiva não se enquadra na modalidade Contrato de Aprendizagem e nem estágio, é evidente a necessidade de legislação própria para prever de forma mais completa o contrato de formação tendo como objeto atender as necessidades dele, bem como, protegê-lo, tendo em vista a absoluta incapacidade no início da formação, de forma diferente de aprendizes de outras profissões.
2.3 Irregularidades Práticas
Apesar de o contrato desses atletas menores possuir semelhanças por ter como princípio a aprendizagem, regulada pelo artigo 428 da CLT e pela Lei 10.097/00, é um contrato especial, sem vínculo empregatício, mas que gera responsabilidades relevantes ao empregador, que se compromete a assegurar a esse atleta em formação técnico-profissional metódica adequada para o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, além das obrigações em formar as condições materiais de trabalho necessárias e adequadas.
Entre as necessidades do atleta menor, sua realidade e o cumprimento de obrigações do empregador, existe uma ponte extensa de informações a serem analisadas, supervisionadas e
criticadas, buscando, apesar da ausência de vínculo empregatício direto, o melhor para esse “trabalhador indireto”.
Em relação a essa “lacuna” de definição do contrato do atleta, temos como exemplo, o artigo 45 da Lei 9.615/98, que diz que:
Art. 45. As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, para os atletas profissionais, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos. (Grifo meu)
Ou seja, essa garantia alcança apenas quem é profissional, não atingindo quem é atleta em formação, e normalmente essa ressalva é devidamente expressa em cláusula no contrato de aprendiz.
Como podemos observar, há uma desproteção. Apesar de o menor possuir asseguradas garantias, nessa situação podemos notar que ele está exposto a riscos naturais da prática esportiva, do exercício em alto rendimento, talvez até mais que um atleta mais velho, pela pouca idade e por estar ainda fisicamente em formação, no entanto, não possui assegurada nenhuma garantia nesse sentido.
O Estatuto da Criança e do Adolescente está em pleno acordo em relação à possibilidade de exercício de trabalho na posição de aprendiz do atleta menor (como dispõe o art. 60), resguardando, inclusive, os direitos do atleta, e menciona, portanto, em seu artigo 65:
“Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários”.
No entanto, no caso do atleta menor, os direitos estão longe de ser equiparados, sendo a proteção vinda basicamente do ECA.
Nesse caso, seria importante haver algum tipo de segurança ao atleta aprendiz, já que o tempo de formação desportiva pode de algum modo comprometer sua saúde física, já que ele se encontra constantemente exposto ao risco de lesões.
E indo além disso, no caso de atletas em formação que se encontram em local diverso ao de origem, restam ainda os riscos da ausência do contato direto e cuidado familiar, estando esse menor sob a responsabilidade de terceiros, o que pode ocasionar ainda outros tipos de problemas a esse menor, que novamente estará sem qualquer segurança legal resguardada.
Podemos ver que o apoio legal ao menor e essencial, afinal, ele está sujeito a riscos como qualquer outra pessoa, e mais ainda pela tão pouca idade e pelas particularidades, que são muitas, de sua formação.
Outro exemplo foi o que ocorreu em 22 de junho de 2016, quando um atleta em formação de quatorze anos morreu após passar mal em um treino de futebol no clube onde se encontrava em aprendizagem há quatro meses na cidade de Londrina no Paraná.
E ainda, o caso que foi mundialmente comentado, do Ninho do Urubu, no Rio de Janeiro, onde ocorreu a morte de dez adolescentes no dia 08 de fevereiro de 2019, que ligou o alarme quanto às exigências inexistentes acerca dos alojamentos onde vivem os atletas em formação, já que grande parte deles reside em alojamento do clube formador.
O artigo 29 da Lei 9.615/98 estabelece superficialmente no §2º, inciso II, alínea ‘d” que a entidade de prática desportiva formadora deve “manter alojamento e instalações desportivas adequados, sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e salubridade”, sem, contudo, haver maior detalhamento sobre os requisitos de segurança, deixando uma lacuna sobre o que é necessariamente adequado e até que ponto esse cuidado deve existir, havendo uma exigência muito superficial, além da falta de especificação quanto à segurança nas condições de trabalho.
A lei é omissa em muitos aspectos, tornando ainda mais vulnerável quem já é legalmente incapaz.
3 A formação do atleta cidadão frente à sua expectativa profissional
Como foi tratado anteriormente, a ausência de contrato específico e previsão legal para o tipo de contrato referente ao exercício do esporte pelo atleta menor já é um grande problema, e como consequências decorrentes da ausência de assistência legal como base, surgem questões prejudiciais ao jovem atleta, a curto e a longo prazo.
Durante esse período de atleta em formação, na prática podemos ver claramente as diferenças do exercício do menor no esporte e da absoluta necessidade de apoio legal, pois são muitas as particularidades no exercício da atividade e em questão de seu crescimento como pessoa, afinal, trata-se de um menor no início de sua adolescência ingressando no esporte, por vezes assumindo uma posição e responsabilidade que exigem uma maturidade muito além da que ele naturalmente teria com tão pouca idade.
Em muitas áreas de ingresso profissional o futuro da profissão pode iniciar no aprendizado cedo, mas quando se trata do ingresso no esporte, as particularidades são excepcionais, sendo marcadas principalmente pelo fato de que na maioria das vezes esse atleta iniciante deixa o ambiente familiar, a casa da família para estar permanentemente no clube, além de em casos mais complexos, mas não menos comuns, são deslocados para outros locais para continuidade do exercício do aprendizado.
De acordo com os ensinamentos de Xxxx Xxxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxx acerca da
adolescência, chamada por eles de “primeira idade”, eles dizem que:
Na área psicológica se dá a estruturação da personalidade. São os alicerces do que a pessoa poderá representar no futuro, mormente na vida adulta. Estruturação da personalidade se faz nos primeiros anos de vida e, embora não se considere isto fatal, é um forte condicionamento para outras idades e comportamentos. Grande parte do que somos radica no passado, embora este não seja necessariamente um presente.
Na área social parece que o sujeito humano está em um estado de espera e preparação. Espera para poder ingressar na sociedade adulta. Os próprios adultos preveem que a entrada deverá ser realizada a partir de um preparo que justifique a espera (MOQUERA e STOBANS, 1984, p. 99).
Acerca do desenvolvimento da personalidade do atleta na adolescência, período em que o jovem ingressa no esporte, Xxxx Xxxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxx dizem que as tarefas evolutivas se configuram do seguinte modo:
- aceitar as mudanças físicas;
- alcançar um caráter social estável para se relacionar com ambos os sexos;
- chegar a ser emocional e economicamente independente;
- preparar-se para o matrimônio ou a convivência;
- iniciar-se nas responsabilidades cívicas e sociais;
- estabelecer uma identidade como base de uma filosofia de vida (XXXXXXXX e STOBANS, 1984, p. 112).
Esse seria o tipo de desenvolvimento normal quando se fala em um adolescente com uma “vida normal”. Quando se trata do adolescente que ingressa no esporte aos quatorze anos, o percurso desse desenvolvimento é automaticamente alterado, na maioria das vezes acelerado e pulando etapas.
Quanto a alcançar um caráter social estável para se relacionar com ambos os sexos, apesar de ser algo comum entre os adolescentes, de surgir nessa fase, para o atleta em formação essa necessidade surge acompanhada da questão de querer apresentar resultados para que possa progredir profissionalmente.
Acerca da aceitação sobre mudanças físicas, ao ingressar no esporte o adolescente já passa em alguns casos por avaliação de maturação, exame realizado para “prever” o tamanho, proporções físicas, funções esqueléticas e desenvolvimento, requisitos necessários para seu “investimento” profissional. Desse modo, podemos ver que o adolescente naturalmente precisa lidar com mudanças físicas maiores, ele necessita que seu corpo se desenvolva favoravelmente para seus planos profissionais futuros (XXXXXXX, XXXXXXXXX e XXXXXX, 2014, p. 187- 191).
Em casos de adolescentes que treinam para alcançar a função de goleiros, por exemplo, em entrevista com um goleiro profissional, ele ressaltou essa preocupação que tinha quando adolescente de crescer o suficiente e conseguir alcançar uma estatura física adequada para a função que almejava, e disse ser uma preocupação praticamente unânime entre adolescentes que desejam essa função, já que seu crescimento, que ainda vai acontecer pode gerar alguma surpresa. Quanto a ser emocional e financeiramente independente, este requisito é comum,
especialmente no Brasil, onde os jovens, especialmente de classes mais baixas, começam a trabalhar cedo, geralmente revezando-se entre estudo e trabalho. Quanto aos atletas menores, em alguns esportes, como o futebol, por exemplo, a maioria dos adolescentes que ingressam no esporte são oriundos de classes sociais mais baixas, portanto, passam a ter como residência os alojamentos do próprio clube onde se encontram em formação. O interessante é que muitos desses adolescentes, ao sair da casa de sua família, saem com a responsabilidade (dada pelos pais) de conseguir uma carreira promissora para alcançar estabilidade financeira e prover melhorias para a família que o sustentou até ali. Além de se ver quase impossibilitado de voltar para casa, porque ao sair com esse sonho, se vê na necessidade de voltar apenas para apresentar os resultados (conforme o esperado pela família, claro).
A questão é que, muitas vezes esse adolescente estaria melhor em casa, em melhores condições de cuidado.
Foi realizada para essa pesquisa, entrevistas de doze atletas profissionais de futebol, sendo feitas perguntas acerca de sua formação desportiva. Nove deles moraram em alojamentos de clubes, e ao serem perguntados sore o tratamento dos atletas menores em geral e em diferentes regiões do Brasil, quatro mencionaram falta de condições básicas de sobrevivência para o adolescente, inclusive, falta de alimentação, e citaram regiões Norte, Nordeste e Sudeste do Brasil como mais precárias nesse sentido.
Sendo assim, mesmo sob circunstâncias de precariedade, muitos adolescentes permanecem porque prometeram a responsabilidade de um futuro melhor às suas famílias. E claro, a grande maioria não pode ir para casa diariamente porque se encontra muito distante de sua casa, e são raríssimos os casos em que a família pode se dispor a mudar de lugar e fixar residência na cidade onde o filho menor se encontra em formação. Desses doze, apenas um teve esse privilégio.
Em relação à ideia de preparar-se para o matrimônio ou a convivência, essa preparação normalmente acontece durante a adolescência, mas, quando se trata de um adolescente que ingressa no esporte aos quatorze anos, essa é uma tendência evidentemente precoce.
Como o adolescente, como já foi mencionado, sai do seio familiar muito cedo, precisando viver uma independência ‘antes do tempo”, em algum momento esse ambiente familiar lhe faz falta, desse modo, o adolescente que passa por essa situação tem uma tendência muito maior a querer construir uma família cedo, na necessidade de suprir essa falta de ter sempre uma família por perto.
Entre os doze entrevistados, dez constituíram uma família cedo (com idades entre 18 e 21 anos), e disseram sempre ter tido essa vontade, alguns sob o argumento de que gostariam de construir uma família que os acompanhasse mesmo com as constantes mudanças de lugar.
Sendo assim, eles almejam o matrimônio ou a convivência de forma precoce em comparação a jovens que não se encontram na situação de atletas em formação, devido a essa
particularidade de ausência de convívio familiar diário.
Sobre iniciar-se nas responsabilidades cívicas e sociais, mais uma vez o adolescente em formação desportiva são exceções, já que necessariamente aprendem a ter responsabilidades de forma precoce em muitos aspectos, como cumprimento de horários, prática de exercícios de alto rendimento, disciplina pessoal nas atividades com o grupo (no caso de esportes coletivos), etc.
Esses doze atletas foram perguntados sobre as consequências emocionais por terem ingressado tão cedo no esporte, e as respostas foram quase unânimes, todos mencionaram amadurecimento precoce e aprenderam a ter responsabilidades cedo. Além disso, mencionaram a experiência profissional desde novos, o desenvolvimento e crescimento de caráter pessoal, a maturidade para lidar com cobranças. Disseram ter aprendido logo cedo a ter disciplina e respeitar pontos de vista diferentes. No entanto, também mencionaram como ponto negativo a ausência de base familiar.
A maioria deles acredita que esse ingresso no esporte no início da adolescência foi muito positivo, a minoria acredita que os pontos negativos têm um peso maior.
Quanto a estabelecer uma atividade como base, essa costuma ser uma dificuldade na maioria dos adolescentes, que buscam referência de inúmeros locais, mas o natural é que, ainda que inconscientemente a tendência seja que a principal referência para a formação de personalidade sejam os próprios pais ou pessoas responsáveis pela educação do adolescente. E mais uma vez, o adolescente atleta em formação não se encaixa totalmente nesse requisito, já que não convive tão diretamente com a própria família quanto outros adolescentes, logo, a associação como referência não consegue ser tão direta.
Os autores completam ainda dizendo que:
As necessidades de segurança são basicamente importantes. Principalmente no início da vida, quando a criança pequena tem urgência de ser atendidas pelos adultos a ponto de que, não existindo essa proteção, pode morrer. A necessidade de segurança torna-se nos adultos sentimentos de segurança e este pressupõe confiança, continuidade e apoio. Grande parte das doenças psicológicas emana de um sentimento de segurança e inadequação. Neste sentido, é importante, no campo desportivo, chamar a atenção desta necessidade, muitas vezes deixada de lado por causa da competição excessiva. O sentimento de segurança é básico e desempenha papel predominante na afirmação do adulto em sua cultura, e, ao mesmo tempo, leva à saúde e desempenho melhor sucedidos (MOSQUERA e STOBANS, 1984, p. 119).
O Estatuto da Criança e do Adolescente está em pleno acordo em relação à possibilidade do exercício de trabalho na posição de aprendiz, mas não fala nada a respeito do atleta em formação, gerando mais uma situação em que o atleta menor se encontra vulnerável pela questão de falta de legislação que o defenda e proteja.
Como trata-se de uma lacuna da lei, a Lei de Introdução ao Código Civil “resolve” o problema das lacunas em seu artigo 4º, definindo e dispondo como “Silêncio da lei no que se refere a determinado caso; costuma-se apelar, se necessário, para os costumes, os princípios gerais
do direito, à analogia e à equidade”.
4.1 Além da desproteção trabalhista
Neste caso, entraria em tese a previsão legal do ECA, que dispõe no artigo 60 sobre o menor aprendiz, um contrato que apesar de grosseiramente comparável ao contrato de formação, não é a mesma coisa, e por causa dessa ausência de previsão legal para esse segundo tipo, analogicamente seria aplicável esse artigo 60 que dispõe “Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários”.
Desse modo, pudemos ver (de forma mais detalhada anteriormente) que já resta esse descaso, falta de previsibilidade e segurança e necessidade de equiparação ao tratar do que tange à parte do futuro profissional desse adolescente, restam ainda os problemas que decorrem disso.
Além do exercício do trabalho em si, essa questão envolve o adequado desenvolvimento do atleta adolescente, que por vezes encontra-se distante de sua família em razão do ingresso no esporte, já que o atleta menor está sujeito a se formar em uma base esportiva distante de sua família, por ser necessário que ele encontre um local que forneça esse tipo de preparo, não havendo na maioria das vezes a supervisão próxima de seus pais ou responsáveis legais, sendo, portanto transferida essa responsabilidade para o clube em questão.
Diante dessa transferência de responsabilidade, o menor não pode perder a devida educação. Apoio moral e social, devendo ter os elementos de cuidado necessários para sua formação como cidadão, o que de certa forma se expõe a certo risco pelo fato que esse menor, ainda adolescente, como se estivesse pagando o preço de um sonho, se expõe à uma independência prematura, além da maturidade precoce.
No momento em que esses jovens saem dos cuidados do poder familiar passam a ter como responsáveis os próprios clubes que o contratam, além dos empresários, quem em tese, cuidam de seus atletas, orientando-os e supervisionando suas necessidades. Nesse momento passam a residir em “repúblicas” ou alojamentos, onde passam a comover com outros adolescentes na mesma faixa etária de idade.
Esses alojamentos devem ser devidamente regularizados nos moldes dos artigos 90, 91 e 92 da Lei 8.069/90, pois, na prática, tratam-se de verdadeiras entidades de abrigo que , como tal, precisam ser legalmente construídas (ainda que vinculadas a algum clube de futebol, judô ou outro esporte), elaborar e executar um programa de atendimento e submeterem-se a registro junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, estando sujeitas à fiscalização do Conselho Tutelar, do Ministério Público e do Poder Judiciário (conforme art. 95 da Lei 8.069/90).
O artigo 91 da Lei 8.069/90 dispõe que:
Art. 91. As entidades não-governamentais somente poderão funcionar depois de registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente, o qual comunicará o registro ao Conselho Tutelar e à autoridade judiciária da respectiva localidade.
§ 1o Será negado o registro à entidade que
a) não ofereça instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança;
b) não apresente plano de trabalho compatível com os princípios desta Lei;
c) esteja irregularmente constituída;
d) tenha em seus quadros pessoas inidôneas.
e) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e deliberações relativas à modalidade de atendimento prestado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, em todos os níveis
§ 2o O registro terá validade máxima de 4 (quatro) anos, cabendo ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, periodicamente, reavaliar o cabimento de sua renovação, observado o disposto no § 1o deste artigo.
E o artigo 92 em continuidade dispõe sobre os princípios essenciais a serem cumpridos pelo local:
Art. 92. As entidades que desenvolvam programas de acolhimento familiar ou institucional deverão adotar os seguintes princípios:
I - preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar
II - integração em família substituta, quando esgotados os recursos de manutenção na família natural ou extensa
III - atendimento personalizado e em pequenos grupos;
IV - desenvolvimento de atividades em regime de coeducação; V - não desmembramento de grupos de irmãos;
VI - evitar, sempre que possível, a transferência para outras entidades de crianças e adolescentes abrigados;
VII - participação na vida da comunidade local; VIII - preparação gradativa para o desligamento;
IX - participação de pessoas da comunidade no processo educativo.
Além de sua demonstrada responsabilidade quanto ao cumprimento de devidos cuidados com o menor:
§ 1o O dirigente de entidade que desenvolve programa de acolhimento institucional é equiparado ao guardião, para todos os efeitos de direito.
§ 2o Os dirigentes de entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional remeterão à autoridade judiciária, no máximo a cada 6 (seis) meses, relatório circunstanciado acerca da situação de cada criança ou adolescente acolhido e sua família, para fins da reavaliação prevista no § 1o do art. 19 desta Lei.
§ 3o Os entes federados, por intermédio dos Poderes Executivo e Judiciário, promoverão conjuntamente a permanente qualificação dos profissionais que atuam direta ou indiretamente em programas de acolhimento institucional e destinados à colocação familiar de crianças e adolescentes, incluindo membros do Poder Judiciário, Ministério Público e Conselho Tutelar.
§ 4o Salvo determinação em contrário da autoridade judiciária competente, as entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional, se necessário com o auxílio do Conselho Tutelar e dos órgãos de assistência social, estimularão o contato da criança ou adolescente com seus pais e parentes, em cumprimento ao disposto nos incisos I e VIII do caput deste artigo.
§ 5o As entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional somente poderão receber recursos públicos se comprovado o atendimento dos princípios, exigências e finalidades desta Lei.
§ 6o O descumprimento das disposições desta Lei pelo dirigente de entidade que desenvolva programas de acolhimento familiar ou institucional é causa de sua destituição, sem prejuízo da apuração de sua responsabilidade administrativa, civil e criminal.
A alínea “a” do §1º do artigo 91 da Lei 8060/90 diz que será negado o registro à entidade que não ofereça instalações físicas em condições adequadas. No entanto, a lei não define o que é adequado, tornando-se um requisito vago, sem especificação, um conceito subjetivo. No caso dos alojamentos, menores saem de seu convívio familiar para obter uma formação esportiva sem nem mesmo ter uma definição do que é um ambiente adequado para sua vivência, sem uma garantia absoluta de que estará seguro e que terá seu bem-estar.
Não existe na Lei 9.615/98 e em nenhuma legislação desportiva especificação ou exigência de laudos para alojamentos das categorias de base, seja de Bombeiros, Ministério Público, etc. O artigo 29 (§2º, inciso II, ‘a”) da Lei Pelé diz que é obrigação da entidade de prática desportiva “manter alojamento e instalações desportivas adequados, sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e salubridade”. Mais uma vez sendo omissa, sem definir o que é adequado, sem fazer exigências. Além disso, exige a contratação de seguro para acidentes pessoais, mas trata especificamente da segurança nas condições de trabalho. Não há sequer especificação sobre quem é competente para realizar tais exigências, quem é responsável por estipular exigências, que seria da CBF, Ministério Público, Bombeiros, mas não exigência alguma no âmbito federal que determine isso.
Os clubes não estão debaixo de normas nesse sentido, logo, não se pode dizer se a maneira como abrigam os adolescentes é adequada ou não, por não existir um conceito de adequado. Não existem requisitos mínimos a serem cumpridos pelos clubes.
Mais uma vez aparece o exemplo do incêndio no Ninho do Urubu no Rio de Janeiro em fevereiro de 2019, causando a morte de 10 atletas, todos menores e em formação desportiva. É evidente que erros impediram que esses menores sobrevivessem ao incêndio, porém, não existem parâmetros para fiscalização de instalações nos alojamentos. Não existe nada em âmbito federal nesse sentido. Mais uma vez o atleta menor está desprotegido.
Sobre a ideia de um menor passar a viver longe do convívio familiar, estando de forma coletiva sob a responsabilidade de um clube, por vezes pode trazer consequências negativas, já que se trata de um alojamento ou vários alojamentos abrigando vários atletas menores sendo cuidados por pessoas que eles não possuem nenhum vínculo afetivo ou, por vezes, afinidade. É praticamente impossível que cada um deles consiga receber a devida atenção para seu desenvolvimento como cidadão.
Ao mesmo tempo que essa independência precoce gera amadurecimento e responsabilidade precoces, esse efeito positivo não alcança todos eles, porque pode comprometer
a formação desse futuro, tendo como causa a ausência de devido cuidado e a ausência familiar.
Além disso, resta também o problema da adequada supervisão educacional. Certamente não são todos os clubes com categorias de base que acompanham de perto a educação de seus tutelados, certificando-se de sua devida ocorrência.
Os pontos positivos aqui mencionados alcançam a maioria dos atletas já na fase adulta, mas não pode se dizer que esses números são uma totalidade, porque até mesmo na mídia podemos ver comportamentos e atitudes social e moralmente inadequadas vindas de atletas, e diante dessa análise, e considerando que todos passam por esse período de formação, podemos ver que esse comportamento é consequência daqueles que não foram alcançados de forma positiva por essa formação tão atípica.
4.2 A expectativa sobre o contrato profissional
Quando o adolescente começa a praticar o esporte, treinando com a possibilidade de se tornar um profissional a partir dos quatorze anos, sua maior expectativa se concentra em conquistar esse objetivo, em alcançar de fato um contrato profissional no futuro, tendo assim, uma carreira profissional firmada.
Entretanto, dos quatorze aos vinte e um anos de idade muitas coisas podem acontecer, são anos de investimento de tempo, dedicação e renúncias, que nem sempre levam ao alcance do objetivo tão esperado. É natural que suas expectativas se voltem a esse sonho, bem como, o emprenho em fazê-lo acontecer.
Para a grande maioria, a intensa expectativa faz com que eles nem pensem que não alcançarão esse objetivo futuramente, para outros, a insegurança é tanta, que acabam abandonando esse sonho sem nem chegar perto de alcança-lo.
Na entrevista com os doze atletas profissionais em exercício, quando perguntados se quando eles eram menores em algum momento pensaram que não conseguiriam alcançar o tão sonhado contrato profissional, metade deles disse que sim, e a outra metade disse sequer pensou nisso porque já estava a caminho de seu objetivo.
Além disso, esses que responderam que nunca pensaram que não conseguiriam disseram que em todo o tempo ouviram palavras de estímulo e incentivo para treinarem e se prepararem, pois “eram bons” e “tinham talento”. O que chama a atenção nisso é que todos ouviam essas palavras de incentivo e elas afetavam a autoestima de segurança de metade desses jovens, no entanto, de todos aqueles que se encontravam em formação, treinando e alimentando o sonho do contrato profissional, nem metade deles alcançou de fato, o que gerou uma provável frustração, já que muitos desses jovens estavam certos de que conseguiriam um contrato profissional e no fim, não alcançaram esse sonho tão almejado.
É evidente que treinadores e clubes tem conhecimento de que o percentual de atletas em
formação que chega de fato a ser profissional é baixo2. E também, que o adolescente, tão intenso e inconstante necessita de incentivo, estímulo e apoio para que apresente rendimentos no esporte em que se encontra treinando, porém, existindo esse percentual tão alto de adolescentes deslumbrados e certos de que alcançarão um contrato tão incerto, seria importante haver essa consciência de que apesar do treinamento e dedicação, todos eles passarão por um mercado de trabalho seletivo até alcançar o contrato profissional, e que enfrentarão de fato essa possibilidade de não alcançarem aquilo que almejam.
Não se trata de desmotivação, mas do entendimento de realidade e construção de um pensamento maduro, sem o risco de formar jovens adultos deslumbrados, aplicando essa ideia até mesmo a aqueles que de fato alcançarão o objetivo profissional.
Além da questão de passar pelo mercado de trabalho competitivo, o atleta, em qualquer área de atuação corre o risco de sofrer lesões, e isso pode acontecer em qualquer idade, mas uma vez que ocorre quando o atleta é menor e a lesão é irrecuperável, o sonho profissional termina ali. Vale ressaltar também que o adolescente é uma pessoa em formação, em desenvolvimento, logo, mais frágil em alguns aspectos. A adolescência é um período fundamental para a aquisição de massa óssea, e o estímulo a essas atividades físicas constantes e repetidas traz mais pontos positivos a esportes como corridas e saltos, não favorecendo, por outro lado quem
pratica esportes como a natação, por não necessitar do suporte de peso. Conforme o Dr. Xxxxxx Xxxxx, ortopedista e traumatologista:
No período da puberdade, o exercício físico intenso nem sempre traz benefícios para os adolescentes, particularmente com relação ao crescimento esquelético. Alguns autores mostram que o treinamento de força intenso em adolescentes parece acarretar decréscimo nos níveis de fatores de crescimento, podendo comprometer a estatura final. Além disso, o excesso de atividade física também está relacionado a fraturas de estresse geradas por sobrecargas repetidas (XXXXX, 2010).
Acerca dos jovens atletas que iniciam no esporte, apesar de a regra ser que o contrato de formação inicie aos quatorze anos, conforme a art. 29 da Lei 9.615/98, a ginástica funciona como exceção, pois apesar de o contrato de formação ocorrer aos quatorze anos, é necessário que o atleta em treinamento desde muito antes para que tenha a expectativa de se tornar um atleta profissional. Atletas do sexo feminino devem ingressar na ginástica entre os cinco e os sete anos de idade, devendo praticar atividades de desenvolvimento entre os seis e sete anos. E atletas do sexo masculino, entre cinco e sete anos para início dos treinos ao aos sete anos o início para atividades de desenvolvimento.
Ou seja, a exposição física a riscos é ainda maior, e a expectativa, por vezes pressionada,
2 Conforme dados fornecidos em pesquisa de campo e publicados em artigo com resultados finais do Cruzeiro Esporte Clube de Minas Gerais, por Portal da Base Brasil. Captação, transição e dispensa de atletas de base no futebol brasileiro. Disponível em <xxxxx://xxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxx-xxxxxxxxx-x-xxxxxxxx-xx-xxxxxxx-xx-xxxx-xx- futebol-brasileiro/>
da possibilidade de alcance a campeonatos ainda maior e mais precoce.
4.3 A ausência de estímulo além do esporte e suas consequências
Como já foi dito anteriormente, esse início do atleta é uma espécie de “corda bamba”, já que boa parte dos adolescentes que ingressam no esporte não conseguem chegar à profissão definitiva de atleta profissional, e sendo assim, se não estudaram anteriormente, tornam-se adultos frustrados, sem expectativas e iniciando a vida adulta sem nenhum preparo para pôr em prática um “plano B” de vida.
O Estatuto da Xxxxxxx e do adolescente (artigo 63 e incisos) e a Xxx Xxxx (artigo 29) preveem a garantia do adolescente ao estudo, bem como, sua obrigação em manter o adequado desenvolvimento. Exemplo exposto no artigo 63 do ECA:
Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos seguintes princípios:
I - garantia de acesso e frequência obrigatória ao ensino regular; II - atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente; III - horário especial para o exercício das atividades.
No entanto, essa exigência não é uma realidade na prática, tornando-se evidente a ausência de devida fiscalização nas várias regiões do Brasil e do necessário incentivo, já que, um clube oferece instrução esportiva a um adolescente e alimenta nele a expectativa de alcance da carreira profissional, no entanto, essa é uma pequena possibilidade diante da grande demanda de atletas em competição por esse alcance, além dos riscos físicos que aparecem durante esse percurso de anos até o alcance dos vinte anos, quando um atleta deixa as categorias de base, tornando-se enfim um profissional.
São muitos os casos práticos de atletas de futebol, por exemplo, que chegaram à categoria sub-20 sem chegar sequer ao ensino médio escolar, e diante dessa “corda bamba”, se não alcança um contrato profissional, vê-se na necessidade de exercer outra atividade, mas não estudou o suficiente, limitando intensamente suas possibilidades profissionais.
É necessário que haja regularização adequada sobre isso, sendo, se possível, punidos os clubes que permitem que permitem que o atleta em formação simplesmente não produza rendimentos escolares satisfatórios, ou que, em casos mais graves, abandone a escola, já que ele não pode garantir um futuro profissional a esse adolescente e tem a obrigação de cuidá-lo por estar sob seu resguardo como aprendiz, por vezes, tendo como moradia o próprio clube.
Conforme os resultados da entrevista realizada com doze atletas profissionais em exercício, ao serem perguntados se possuíam um “plano B” de carreira caso os resultados no esporte não fossem alcançados, dos doze, nove responderam que não, nunca tiveram outros planos, os outros três que responderam que sim, deixaram claro que havia outra opção por exigência da família, que impôs como condição para que os apoiasse na decisão de tentar a
carreira desportiva.
Esses atletas alcançaram seu objetivo profissional, mas muitos outros, com o mesmo pensamento não alcançaram.
A região Sul do Brasil, em especial o Rio Grande do Sul foi mencionado pelos atletas como mais adequadamente supervisionada quanto à questão de educação do menor, ainda que não absolutamente perfeita, mas havendo cobranças ao adolescente para que frequente às aulas e apresente resultados satisfatórios.
Todavia, essa não é uma realidade de todo o país, já que em outros estados e regiões essa cobrança é inexistente.
No entanto, não é em todos os casos que o atleta menor vive em alojamentos de seu clube formador, alguns vivem em repúblicas, ou com parentes, amigos, ou em alguns casos a família já reside na cidade onde está localizado o clube formador do atleta. Neste caso, o atleta não passa por fiscalização, já que a cobrança de resultados é proveniente daqueles que se encontram tutelados pelo clube, que garante os cuidados do menor. Os que ali não residem, na prática não sofrem essa cobrança.
A cobrança de resultados escolares deveria ser aplicada a todos que ali se encontram em formação. Isso diminuiria esse risco de adolescentes sem recursos na possibilidade de não alcance da carreira profissional. Por mais que estudar seja um assunto também de responsabilidade e interesse do menor, deve ser levada em consideração a imaturidade, ausência de orientação e cobrança familiar, pensando, portanto, no bem-estar do adolescente e de certo modo, protegendo seu futuro.
Em concordância acerca desse assunto, Xxxx Xxxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxx dizem que:
O mesmo pode ser dito a respeito do desenvolvimento emocional ou espiritual. Provavelmente estes dois últimos são, infelizmente deixados de lado no preparo de atletas e desportistas profissionais. É relevante, num sentido geral do comportamento, analisar que o desporto, bem como outras maneiras de manifestação física, deveria ter em mente programas de desenvolvimento total da personalidade, ou pelo mínimo, que levasse em conta de forma educativa o conteúdo de suporte físico, para melhor compreender as características desenvolvimentais de cada faixa de idade (MOSQUERA e STOBANS, 1984 , p. 119).
O natural é que os programas de apoio surjam através de bases legais, pois, havendo obrigatoriedade, surge a prática, mas nesse caso, já existe previamente uma lacuna, como tratamos nos capítulos anteriores, e essa falta de apoio, estímulo a pensar “além da carreira”, em ter como evoluir se nada sair como o esperado, e especialmente, essa ausência de obrigatoriedade ao estudo e formação escolar são consequências diretas dessa lacuna da lei.
Seria necessário, essencial o estímulo e obrigatoriedade na obtenção de rendimentos satisfatórios em todos os casos, sendo tutelados ou não pelo clube, e além do limite de dezesseis anos.
Xxxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx realizaram uma pesquisa e transformaram em artigo na qual falaram a respeito de atletas jovens que exerceram o esporte no estado do Rio Grande do Sul, passando pela fase de formação, sem, contudo, chegar ao contrato profissional. Isso porque abandonaram a carreira antes disso por inúmeros motivos, como instabilidade financeira para manter-se em formação desportiva, falta de convívio familiar, constantes atrasos de pagamentos e vencimentos, não cumprimento adequado de contratos e constituição familiar precoce.
Os autores mencionam no artigo que:
Abandonar a profissão tem impacto na organização social e pessoal dos sujeitos. No caso dos ex-atletas entrevistados na pesquisa, foi possível observar que a saída da vida esportiva exigiu justes em diferentes dimensões de suas vidas, sendo uma mais subjetiva e outra mais objetiva. A dimensão subjetiva combina certo sentimento de fracasso pelo sonho não alcançado e uma sensação de estar abandonando uma condição socioprofissional de destaque. A dimensão objetiva, constitui-se na dificuldade concreta de inserir-se no universo do trabalho extra futebolístico.
Quanto às consequências relacionadas à saída do adolescente do esporte, além de mencionarem a sensação de fracasso com a qual ele precisa lidar, por não ter conseguido alcançar um sonho, os autores concluem ainda que:
A pesquisa permitiu, também, constatar as consequências subjetivas e objetivas do abandono da carreira esportiva. Entendemos que se destacam dois, entre os diversos problemas: a) a necessidade de reconstruir uma nova identidade, a de um não atleta. Pois, para o jogador de futebol, não é fácil deixar o sonho pelo qual viveu durante um período importante de sua existência, tendo a relação com o torcedor, os meios de comunicação, enfim, o reconhecimento e a “badalação” que lhe são dispensados por não mais fazer parte do futebol passando a ser um “simples mortal”; b) o fato de que a maioria dos atletas não está preparada para inserir-se noutros espaços laborais, basicamente por ter acreditado (em demasia) na possibilidade de lograr sucesso no futebol, deixando de lado a preparação pessoal/profissional para o momento em que não mais pudessem jogar (XXXXXXX, XXXXXXXX e XXXXXX, 2015).
O psicólogo americano Xxxxxxx Xxxxxx, ao referir-se ao atleta apontou como grande característica e necessidade a autoatualização, que em alguns casos é chamada também de autorrealização ou individualização. É para este autor a mais importante das necessidades (MASLOW, 2008).
Essa tendência, segundo Xxxxxx é universal, provavelmente é a que leva alguém a ser um verdadeiro campeão. O campeão é aquele que está em contínua luta com sua própria pessoa no sentido de aperfeiçoar-se e conhecer-se.
Esse tipo de pensamento, acompanhado primordialmente do amparo legal completo e adequado precisa ser estimulado, o atleta menor precisa ser fiscalizado, seja ele tutelado ou não pelo clube formador. E se for tutelado, ele precisa de segurança adequada.
Consequências negativas e uma demanda de desemprego no país por pessoas jovens pode
ser evitada desde que sejam tratados os problemas, para que as consequências possam sequer existir.
5 Conclusão
Após analisar conceitos e particularidades de tipos de contratos de trabalho que alcançam menores de idade, e ainda, um modelo específico para atletas profissionais, podemos observar a ausência de um tipo que possa abranger adequadamente a situação trabalhista do atleta em formação de uma forma ampla.
A atual Lei Geral do Desporto, a Lei 9.615/98 é omissa quanto à forma contratual do atleta em formação entre quatorze e dezesseis anos, e além disso, omissa sobre todos os menores no tocante às suas condições de trabalho, moradia, formação desportiva, não especificando o que é adequado, o que é necessário e que regras as entidades de prática desportiva devem seguir quanto à proteção e cuidado dos menores e formação onde é considerado seu ambiente de trabalho e permanência.
Fazendo uma breve leitura da Xxx Xxxx, é fácil observar que se trata de uma lei com muitos artigos revogados, uma lei de 1995, e vale lembrar que nas últimas décadas muitos atletas passaram por formação e esse silêncio persiste por gerações. É necessário que haja uma lei específica, em âmbito federal, que aborde as necessidades do menor quanto à sua contratação, proteção, que o retire da situação de vulnerabilidade legal que vive atualmente, e ainda, que trate da sua proteção no ambiente de trabalho e convivência, afinal, um alto número de atletas reside em seu clube formador.
Além da necessidade de preenchimento desta lacuna da lei, verificamos ainda os problemas decorrentes da ausência de um contrato especial de trabalho desportivo, afinal, muitos menores iniciam formação desportiva, mas a minoria deles alcança de fato um contrato profissional, e nesse sentido, seria importante a criação de programas direcionados a esses menores para qualificação além do esporte, prevenindo consequências no sentido de que ele terá meios a seguir caso o esporte não seja de fato sua futura carreira profissional. Além da fiscalização acerca da frequência escolar dos menores.
Como vimos nos resultados da pesquisa de campo, que caso a carreira da maioria dos atletas profissionais não desse certo, ele não tivesse alcançado um contrato profissional como aconteceu, não haveria planos além da possível carreira e nem havia estímulo a esse pensamento, reforçando a ideia de necessidade de estímulo nesses casos, afinal, a minoria conseguirá ser profissional e eles chegarão a esta conclusão perto dos vinte anos de idade.
Considerando que a lei é uma regra tornada obrigatória por força coercitiva de autoridade competente, e, à medida que algo se torna obrigatório, seu cumprimento, de regra, é executado, não havendo lei que preveja determinado assunto, naturalmente não há cumprimento. Sendo assim, diante da ausência de lei que assegure os direitos e proteja o atleta em formação, não há
cumprimento desses requisitos, tendo em vista a ausência de obrigatoriedade prevista. Mesmo havendo leis que foram mencionadas, como a Lei 9.615/98, o Estatuto de Criança e do adolescente que de alguma forma visam proteger o menor no tocante ao trabalho, tratando-se do atleta menor, resta a evidência de insuficiência.
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ZAINAGHI, Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx. A formação desportiva e o direito do trabalho. 1.ed.
Pesquisa de Campo
A pesquisa de campo foi realizada em 2016 no Rio Grande do Sul através de entrevistas com doze atletas profissionais de futebol brasileiros em exercício, naturais de diversos estados do Brasil, sendo atualmente três deles treinadores com idades entre 20 e 46 anos. Eles receberam as seguintes perguntas e foram obtidos os seguintes resultados:
I- Qual é a sua opinião a respeito da retirada do passe e início da representação por intermediário?
Embora nem todos tenham chegado a viver de fato a carreira profissional na época do instituto do passe, todos demonstraram conhecimento acerca do assunto, sendo assim, 10 consideram a representação por intermediário algo positivo. 2 são indiferentes à mudança, argumentando que o empresário seria um “mal necessário” e que o ideal seria ao atleta representar a si mesmo.
II- Para o atleta menor de idade seria melhor conviver com a realidade do passe ou da representação intermediária?
Já em relação ao atleta menor, 8 deles acreditam que a representação por intermediário é melhor para o menor pelo fato de haver quem o “defenda”, considerando sua vulnerabilidade devido à pouca idade. 1 deles disse ser indiferente à mudança e os outros 3 não souberam responder à pergunta.
III- Quando você ainda não era atleta profissional, você tinha um “plano B” de carreira?
Nesse quesito 10 responderam que não e 2 responderam que sim.
IV- Que consequências emocionais você acha que sofreu por ingressar tão cedo no esporte?
Em unanimidade responderam amadurecimento precoce, responsabilidade, crescimento pessoal, maturidade para lidar com cobranças, disciplina, independência e desenvolvimento de caráter e pessoal. Além da formação familiar precoce. Todos consideram esses pontos positivos, e mencionaram como ponto negativo a ausência de base familiar.
V- Que diferenças você vê comparando o tratamento aos atletas menores em relação a regiões do Brasil?
Quanto a essas diferenças, 9 responderam que os clubes maiores apresentam melhores condições de habitação para o menor; 3 mencionaram ausência de condições básicas de sobrevivência como alimentação, higiene adequada e acompanhamento psicológico especialmente nas regiões Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste (considerando atletas que completaram categorias de base em mais de um clube); 6 mencionaram maior fiscalização nos alojamentos do Rio Grande do Sul, bem como, melhores condições e cuidados com os menores.
Artigo recebido em: 20/10/2021
Artigo aceito para publicação em: 16/12/2021