Introdução
DA POLÍTICA SOCIAL PARA UM CONTRATO SOCIAL DE ECONOMIA ABERTA
NA AMÉRICA LATINA
Xxxxx Xxxxxxxx*
Introdução
Após uma década de reformas econômicas que alteraram drastica- mente a estrutura das economias da América Latina, tornando-as mais abertas e mais competitivas, e um decênio de aumentos substanciais nos gastos públicos com a educação, a saúde e outros programas sociais, em praticamente todos os países, a pobreza e a extrema desigualdade conti- nuam profundamente enraizadas. Nos anos noventa, a maioria dos paí- ses da região adotou, sob alguma forma, a receita que pareceu produzir índices excepcionais de crescimento e de redução da pobreza no Leste Asiático: uma ênfase no crescimento baseado no mercado e o compro- misso de um investimento substancial das verbas públicas nos recursos humanos.1 Mas a proporção dos pobres, correspondente a 40% ou mais na maioria dos países, teve um declínio reduzido ou nulo. O Chile, com uma redução da estimativa de 32% para 16% entre 1990 e 1998, e o Uruguai, baixando do valor estimado de 23% para 13%, foram as úni-
* Presidente, Center for Global Development, Washington, D.C. (xxxxxxxxx@xxxxx.xxx). Agradeço a Xxxxx Xxxxxx (Universidade de Campinas) e Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx (reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro) por seus comentários como debatedores, a Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxxx, assim como aos demais participantes do seminário do BNDES, e ainda a Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx Xxxx e Xxxxxx Xxxxxx por sua ajuda no trabalho de pesquisa e documentação.
1 É claro que, comparando a América Latina dos anos noventa com o Leste Asiático nas décadas de 1970 e 1980, houve muitas diferenças na política econômica e social. Alguns diriam que as economias latino-americanas foram até mais abertas, na década de 1990, do que os tigres asiáticos na época em que viveram um rápido crescimento baseado nas exportações Não há dúvida de que, nos anos noventa, os gastos com programas sociais, como percentagem do PIB, foram tão grandes na América Latina quanto tinham sido e continuaram a ser nos tigres do Leste Asiático, embora, é claro, tenham sido muito inferiores por habitante em termos absolutos. Ver Xxxxxxxx, Xxxx e Xxxxx (1997) para uma discussão das diferenças entre o Leste Asiático e a América Latina na política social.
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cas exceções. Como não é de admirar, a proporção dos pobres aumen- tou, na verdade, em países que tiveram baixas taxas de crescimento, como a Venezuela. Mas a proporção aumentou também em países como o México e o Peru, onde houve um crescimento de aproximadamente 2% per capita anualmente. Em nenhum país houve uma melhora evi- dente naquilo que constitui, de modo geral, taxas altíssimas de desi- gualdade de renda.2
Que há de errado e que é possível fazer para modificar esse quadro sombrio? É óbvio que taxas de crescimento mais altas ajudariam. Mas estas continuam a escapar à maioria dos países – até ao Chile, nos últi- mos anos – e, na última década, mesmo os pequenos efeitos positivos do crescimento na redução da pobreza foram solapados por ligeiros au- mentos da desigualdade.3 Os ingredientes da boa política social – ênfa- se contínua nos investimentos no ensino fundamental e concentração dos programas de saúde, nutrição e treinamento nas famílias pobres – têm melhorado a vida das pessoas e podem vir a aumentar a renda. Mas, sem crescimento, parece improvável que eles possam causar uma redu- ção de fato dos altos índices de pobreza, agora ou mais adiante; nem mesmo nos anos de algum crescimento nos anos noventa ele parecem haver conseguido resolver as desigualdades profundas e estruturais que inibem a redução da pobreza. Além disso, não é fácil manter investi- mentos sociais adequados quando o crescimento é pequeno, a dívida pública é grande e não há expansão dos orçamentos governamentais.
Neste artigo, enfatizo a necessidade de ir além dos componentes tradicionais da boa política social na região, remontando à velha idéia de um contrato social mais amplo, porém numa forma atualizada: um contrato social explicitamente concebido para as economias competiti- vas, abertas, globalizadas e, portanto, vulneráveis. Tal contrato social pós-moderno ampliaria de duas maneiras a atual política social: primei- ro, seria explicitamente calcado no crescimento baseado no emprego. Não dependeria unicamente do crescimento, mas seria projetado para ajudar a promovê-lo. Segundo, em termos políticos e econômicos, vol- tar-se-ia não apenas para os pobres, mas também para a camada de ren- da média, cada vez mais infeliz e insegura (e que, na verdade, corre o
2 Os dados sobre pobreza e desigualdade a que nos referimos encontram-se em Behrman, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001a.) Eles provêm de levantamentos familiares feitos no fim da década de 1980 e na de 1990.
3 Attanasio e Xxxxxxx (2001). Ver Apêndice 1.
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risco constante de empobrecer). Ele partiria da observação de que a integração na economia global, atualmente, só vem ajudando uma pe- quena minoria de famílias, e de que a dependência maciça da poupança externa, bem como a conseqüente vulnerabilidade às crises financeiras e de outra ordem, tem criado uma instabilidade que prejudica particular- mente não apenas os pobres, mas também uma faixa muito maior de fa- mílias não ricas.4 O contrato social de uma economia aberta se basearia em políticas e programas voltados para a criação de empregos para a grande maioria dos não ricos, inclusive muitos dos que concluíram o curso pri- xxxxx e até o secundário, porém não foram mais além, e o faria, necessa- riamente, de um modo que respaldasse o crescimento contínuo impulsio- nado pelo setor privado, necessário para a criação desses empregos e para financiar internamente os investimentos públicos requeridos para prepa- rar de maneira adequada um número maior de pessoas para eles.
Na Parte 1, examino a evolução da política social na região durante o período pós-guerra, baseando-me sobretudo num artigo anterior, escrito em co-autoria com Xxxxxx Xxxxxxx.5 Na Parte 2, discuto três pontos que pretendem respaldar minha defesa de um novo contrato social baseado no emprego e voltado para as necessidades da maioria de renda média. Na Parte 3, resumo as implicações desse contrato social reformulado para as políticas macroeconômicas e setoriais específicas. Enfatizo a lógica difí- cil mas inevitável de um contrato social esteado em alguns alicerces fundamentais do tenebroso Consenso de Washington.
Parte 1. O contrato social na América Latina do pós-guerra
Hoje em dia, a política social da região é uma combinação sadia de gastos razoáveis em investimentos básicos na saúde e na educação, uma ênfase em chegar até os pobres – a qual, apesar de estar longe de ser implementada à perfeição, constitui uma melhora substancial em rela- ção a períodos anteriores – e um conjunto impressionante de reformas administrativas, inclusive a descentralização para governos locais mais responsáveis e inovações institucionais como subsídios em espécie para
4 Na América Latina, talvez a melhor maneira de traçar essa distinção entre a pequena minoria e a grande maioria de famílias seja situá-la entre os cerca de 10% que têm alguma instrução além do curso secundário e os 90% que não a têm – tema a que voltarei mais adiante.
5 Birdsall e Székely, a ser publicado.
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as famílias pobres que mantiverem seus filhos na escola. Mas essa combi- nação sadia não representa, em nenhum sentido, um contrato social signi- ficativo que proteja a vasta maioria das pessoas da região e no qual a vasta maioria de eleitores das democracias latino-americanas esteja engajada.
A política social de hoje evoluiu ao longo do que poderíamos consi- derar quatro fases ou períodos. O primeiro abrange o intervalo entre a Segunda Guerra Mundial e o fim da década de 1970, os “anos doura- dos” da América Latina em termos de crescimento econômico. Na mai- oria dos países, o setor industrial cresceu vigorosamente, impulsionado pela estratégia desenvolvimentista de substituição de importações que prevaleceu nessas décadas. O grupo urbano de renda média estava em expansão.6 Durante esse período, a política social foi uma parte funda- mental da estratégia global de desenvolvimento. A política social con- sistia principalmente na ampla oferta de subsídios aos bens e serviços, da qual quem mais se beneficiou foram os crescentes grupos urbanos de renda média. Alguns desses subsídios – como os destinados ao consu- mo de combustíveis – eram justificados como algo que sustentava salá- rios reais mais altos no setor industrial. As áreas rurais desempenhavam o papel de fornecer produtos primários e recursos naturais a preços bai- xos para a produção industrial, assim como produtos de baixo custo para o consumo dos consumidores urbanos. Em muitos casos, isso im- plicou subsidiar a produção rural e, em alguns, implicou a redistribuição da terra, a fim de minimizar os recursos ociosos e a subutilização do solo. Na maioria dos países, contudo, as necessidades dos estrutural- mente pobres foram negligenciadas, embora, é claro, muitas famílias que haviam iniciado essa fase na pobreza tenham-se beneficiado do cres- cimento geral da renda. Nessa época, aliás, houve um declínio saudável da pobreza e da desigualdade.7 Mas a estratégia de crescimento indus- trial e os subsídios dependiam maciçamente de empréstimos públicos e acabaram sendo insustentáveis. Isso terminou, no início dos anos oiten- ta, na crise da dívida.8
6 Ver, por exemplo, Xxxxxxx (1998), para uma descrição do caso do México.
7 Ver Londoño and Xxxxxxx (2000) para dados sobre as tendências da pobreza e da desigualdade na América Latina durante a década de 1970.
8 Os subsídios públicos, inclusive os fornecidos à indústria através do protecionismo nas importações, dependiam maciçamente de empréstimos públicos internos e externos, e não da poupança pública interna, e não puderam ser mantidos quando o acesso aos empréstimos tornou-se mais difícil e seu custo se elevou.
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No segundo período, ante as novas restrições macroeconômicas do início dos anos oitenta, a política social efetivamente desmoronou. Com a escalada das taxas de inflação, a desvalorização e as quedas do PIB, a prioridade política passou a ser a estabilização da economia a qualquer preço. Os amplos subsídios e transferências sociais foram vistos como um obstáculo ao crescimento, e não como um motor potente do desen- volvimento, como no passado. As pressões fiscais e o ônus da dívida, combinados com o baixo índice de crescimento, restringiram severa- mente os novos investimentos na saúde e na educação. Na maioria dos países, os gastos não se reduziram proporcionalmente ao orçamento, uma vez que era considerável a pressão política para preservar os em- pregos e salários do funcionalismo público, que consumiam a maior parte do gasto social. Entretanto, em termos absolutos, por criança e por cliente dos serviços de saúde, o gasto reduziu-se, uma vez que houve um declínio dos gastos gerais do governo. Além disso, as incertezas e a falta de novos investimentos contribuíram para uma deterioração geral das instituições – os sistemas de saúde e de ensino –, já que os professo- res e os profissionais de saúde tiveram que enfrentar o acesso restrito a insumos complementares, como livros, medicamentos etc. Esses siste- mas sem dúvida perderam parte de seu pessoal mais qualificado, pas- sando a sofrer com as mudanças constantes na direção. O que restava do contrato social ofereceu uma garantia de emprego limitada, além de incerta, à parcela do grupo de renda média que tinha a sorte de trabalhar no serviço público ou numa empresa estatal, mas prestou pouco ou ne- nhum serviço aos pobres das regiões rurais e urbanas. No fim da década de 1980, havia indícios crescentes de uma desigualdade cada vez maior e, o que era mais preocupante, de um aumento substancial da pobreza.9
O terceiro período teve início na segunda metade dos anos oitenta, com o reconhecimento de que os programas de ajuste estrutural e refor- ma econômica não estavam atendendo às necessidades do grande nú- mero de pobres – 30% a 40% da população da maioria dos países.10 A política social passou a se concentrar na proteção aos pobres, num meio macroeconômico desfavorável e diante da competição global cada vez maior. Reconheceu-se que, de modo geral, os pobres têm menos meios de proteger sua renda de choques inesperados e do desgaste dos ativos
9 Ver Xxxxxx (1995). A tese de que os programas de ajuste solaparam a política social foi defendida de maneira convincente em Cornia, Xxxxx and Xxxxxxx (1987).
10 Usando como referência o valor de 2 dólares/dia em termos de paridade do poder aquisitivo.
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líquidos trazido pela inflação elevada. Os pobres também foram vistos como os mais desfavorecidos, em termos de sua probabilidade de engajamento nos setores de alta produtividade, com melhores chances de sobreviver à concorrência externa. A solução política foi a introdu- ção de medidas compensatórias, através da implementação de progra- mas que compunham uma rede de segurança, inclusive fundos de emer- gência social e de investimentos sociais (que se tornaram os programas preferencialmente apoiados pelos bancos multilaterais). Diante das pres- sões fiscais contínuas, passou-se a usar a abordagem de direcionar os recursos para os pobres, ou seja, de alocar os recursos orçamentários limitados de modo a obter a maior redução possível da pobreza por cada centavo gasto. Levantaram-se mapas e perfis da pobreza, a fim de iden- tificar a população com os mais altos índices de pobreza. Os programas resultantes foram concebidos como programas pequenos, específicos e rigorosamente direcionados.11 Nesse sentido, a política social abando- nou por completo a idéia de um contrato social maior entre o Estado e a sociedade como um todo. A política social e as estratégias globais de desenvolvimento e crescimento dos países da região ficaram inteira- mente desvinculadas. Tal como no segundo período, a ênfase continuou a recair no equilíbrio fiscal entre as políticas macroeconômicas e os programas sociais, sendo estes vistos como uma ameaça potencial ao déficit público e à estabilidade macroeconômica.
Em meados da década de 1990, com a recuperação do crescimento econômico positivo na maioria dos países latino-americanos, emergiu uma quarta fase da política social. Embora o crescimento regional ainda fosse modesto, com exceção do Chile e talvez do Uruguai, ele foi sufi- ciente para estimular os governos e a comunidade política a implementarem aumentos reais dos gastos públicos em amplos progra- mas sociais – de um modo visto como tributariamente responsável. Os gastos públicos com a educação e a saúde, na maioria dos países da região, tiveram um aumento de no mínimo 20% entre 1990 e 1996.12 A abertura das economias da América Latina para os mercados mundiais, que se iniciara em meados dos anos oitenta na maioria dos países, criou um interesse maior em garantir que as economias pudessem competir
11 A política social passou a se concentrar no problema de encontrar o ponto de equilíbrio entre os custos administrativos (e políticos) de identificar os pobres e evitar o escoamento dos benefícios para os não-pobres, por um lado, e o atendimento insuficiente dos pobres, por outro.
12 Birdsall e Londoño (1997).
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com eficiência na economia global e, portanto, em garantir que uma parcela maior da força de trabalho pudesse ser mais produtiva. Dispor de um exército de trabalhadores não qualificados e de baixos salários deixou de ser visto como uma base para a competitividade global. A ênfase em atender às necessidades dos pobres continuou, porém com uma atenção muito maior para o aumento de sua capacidade produtiva, compatível com a visão de que a competitividade nas economias aber- tas exigia um investimento muito maior no capital humano. Em muitos países, o aumento dos gastos com a saúde e a educação favoreceu o ensino primário e secundário, comparado aos gastos com a universida- de (a exemplo do Brasil e do México; no Chile, essa mudança e outras reformas começaram na década de 1980 e foram reforçadas na de 1990).13 Alguns novos projetos, como o Progresa mexicano, que recentemente teve seu nome trocado por Oportunidades, o Bolsa Escola, em Brasília, capital do Brasil, e o Chile Joven, no Chile,14 apesar de voltados para os pobres, foram concebidos não só como redes de segurança para prote- ger a capacidade de consumo, mas também como investimentos no ca-
13 É provável que esses esforços tenham levado, nos anos noventa, a uma redução da defasagem na escolarização das crianças de famílias ricas e pobres, tomando por base, na maioria dos países, a menor defasagem entre os jovens de 15 anos do que entre os de 21 anos – embora as provas disso ainda não sejam claras nem convincentes, uma vez que há uma tendência natural para o aumento da defasagem conforme a idade (dados de Filmer e Xxxxxxxxx, 1999). Em muitos países, todavia, a defasagem continuou dramaticamente alta – o que se harmoniza com outros indícios de que, na maioria dos casos, as diferenças no nível de instrução dos pais conforme o grupo de renda, na América Latina, reproduzem-se nas diferenças de escolarização dos filhos na geração seguinte (Xxxxxxx, Xxxxxxxx e Xxxxxxx, 2000; e Xxxxxxxx, 2001).
14 Progresa é a sigla em espanhol de Programa de Educación, Salud y Alimentación. Esse programa oferece subsídios em dinheiro e um complemento alimentar às famílias em situação de extrema pobreza nas áreas rurais. O auxílio em dinheiro é condicionado a índices de pelo menos 85% de freqüência escolar dos filhos e ao comparecimento regular a clínicas de saúde para exames de rotina e acompanhamento médico. O auxílio em dinheiro é entregue à mãe, que também tem de assistir a uma série de palestras e cursos sobre práticas sanitárias. O Bolsa Escola é um programa similar, que oferece bolsas de estudo a crianças desfavorecidas. Parte do pagamento em dinheiro é mantida numa conta especial, à qual o beneficiário poderá ter acesso ao concluir um ciclo escolar. O Chile Joven também é um programa de ajuda em dinheiro, mas, nesse caso, este é oferecido a adultos jovens para incentivar sua formação. É possível obter uma descrição e avaliação detalhadas do programa Progresa no endereço xxx.xxxxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx.xxx. A descrição do programa Bolsa Escola pode ser obtida em xxxx://xxx.xxx.xxx.xx/xxxx/ bolsaesc/default.shtm. Ver De Janvry e Xxxxxxxx (2002) para uma discussão sobre os alvos do Progresa.
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pital humano dos pobres. Os aumentos dos gastos sociais foram acom- panhados, em alguns países, por novos grandes esforços de lidar com reformas estruturais nos sistemas de saúde e educação, particularmente através da ênfase na descentralização e num controle maior das escolas por parte dos pais e da comunidade (por exemplo, em Minas Gerais, no Brasil, e em El Salvador e na Bolívia).
Essa quarta geração da política social (e, para todos os fins práticos, ainda em vigor), portanto, concentra-se essencialmente em programas voltados para atender às necessidades e aumentar o capital humano dos pobres de hoje. Isso faz sentido numa região em que pelo menos 30% da população encontram-se na pobreza e em que a redução desta e o crescimento futuro dependem maciçamente da captação do potencial de aumento do engajamento produtivo dos pobres na economia. Além disso, com sua ênfase na melhoria do capital humano dos pobres, essa abordagem da política social faz parte, de um modo mais visível, de uma estratégia global de desenvolvimento.
Mas ela tem seus inconvenientes. Primeiro, é sumamente vulnerável no plano político; os programas sociais têm que entrar numa competição feroz pelos recursos públicos e, até hoje, ainda não foram institucionalizados em nenhum país. São primordialmente vistos como investimentos de longo prazo num crescimento futuro incerto, dadas as demandas do mercado global. Mas, à medida que o crescimento vacila e a sensação de extrema vulnerabilidade aos mercados externos aumenta, essa abor- dagem da política social, por mais sensata que seja, corre o risco de se desfazer – ameaçada por mais uma rodada necessária de austeridade fiscal, ou por um retorno a programas e subsídios amplos e tributaria- mente irresponsáveis, de estilo populista.
Em termos mais fundamentais, essa abordagem da política social não lida com eficácia com as causas subjacentes da pobreza contínua e elevada e da obstinada desigualdade. Por exemplo, o aumento dos gas- tos com a educação fez subir o nível de escolaridade entre as crianças pobres, mas (como mostrarei mais adiante) não elevou muito suas ex- pectativas de renda futura, porque o baixo crescimento e as altas taxas reais de juros continuam a restringir a criação de empregos, porque o retorno médio do ensino primário e secundário continua baixo, e por- que, em alguns países, a persistente discriminação étnica, racial e sexu- al, assim como seus efeitos históricos, mantêm baixo o nível salarial de alguns pobres. Os investimentos sociais tampouco elevarão a renda, se os pobres não puderem acumular capital físico e financeiro, ou se as
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fases recorrentes de declínio da economia obrigarem a uma desacumulação periódica de seus recursos limitados. A política social por si só, tal como atualmente concebida, não consegue modificar o meio econômico nem os elementos subjacentes da estrutura da economia que contribuem para a pobreza e tornam lento o crescimento global.
Parte 2. Três fatos destacados
1. O aumento do emprego na região foi ainda menor nos anos no- venta do que o crescimento econômico; os salários elevaram-se muito mais depressa para as pessoas com instrução acima do se- cundário do que para a maioria dos menos instruídos.
O índice de aumento do emprego na região durante a década de 1990 foi menor que a taxa de crescimento (elasticidade estimada de 0,79, se- gundo informações da CEPAL). Examinando os vários setores, o empre- go aumentou num índice maior do que o crescimento global no setor do “comércio”, que tem baixos salários, e subiu com uma taxa próxima à do crescimento nos “serviços básicos”, porém teve um aumento muito infe- rior à taxa de crescimento na “indústria” (elasticidade de aproximada- mente 0,3; ver Tabela 1A).15 Os dados por tipo de trabalho contam uma história similar; a taxa média de crescimento do emprego na região foi maior nos serviços domésticos, de baixa remuneração, e nas categorias de trabalhadores autônomos do que na dos assalariados (Tabela 1B).16 Esses dados agregados sobre o crescimento do emprego nos vários seto- res e tipos de atividade são compatíveis com ganhos de produtividade em alguns setores, mas com um aumento limitado de empregos nesses seto- res para os trabalhadores sem instrução universitária. Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2000) mostraram que, em toda a região, os trabalhadores com instrução secundária e nada mais têm maior probabilidade de ficar desempregados do que os que contam apenas com a instrução primária, e uma probabili- dade muito maior de ficar desempregados do que aqueles que têm pelo menos alguma instrução superior.17 Tais dados também são compatíveis
15 Tabelas da CEPAL baseadas em Stallings e Weller (CEPAL, 2001).
16 Esse resultado predomina no sul; no México e em boa parte da América Central, o crescimento do emprego entre os assalariados foi relativamente mais rápido.
17 Eles informam que a diferença da proporção de graduados do secundário na população geral (22,3%) e entre os desempregados (24,7%) é maior do que em outros grupos e é estatisticamente significativa.
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com outros indícios de que muitos dos ganhos de produtividade do setor manufatureiro durante a década de 1990 tanto se deveram aos cortes de pessoal praticados pelas firmas (bem como pelo setor público e por anti- gas empresas estatais) quanto aos aumentos de produtividade por insumo.18
Tabela 1A: Crescimento do emprego por setor na
América Latina durante a década de 1990 (média nos vários países)
Fonte: CEPAL (2001).
Os dados provenientes dos levantamentos domiciliares também su- gerem aumentos limitados de salário para quem tinha no máximo ins- trução secundária. Xxxxxxx, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001b), usando dados sobre salários e instrução provenientes de dezoito países latino-ameri- canos ao longo da década de 1990, mostraram que o retorno marginal para o ensino primário e secundário caiu durante os anos noventa, ao passo que aumentou para o ensino superior (Figura 1A). Esses dados são compatíveis com os drásticos aumentos salariais dos detentores de instrução superior, comparados aos de escolaridade primária e secundá- ria, o que resulta de uma mudança tecnológica favorecedora das qualifi- cações que é conhecida no mundo inteiro, mas que é incomumente dra- mática na América Latina (Figura 1B). Mais preocupante foi o declínio dos salários relativos dos que têm instrução secundária, comparados aos que concluíram o curso primário. Uma vez que os índices de con- clusão do secundário ainda são relativamente baixos, esse resultado é surpreendente e preocupante, pois sugere que a demanda de mão-de-
18 Stallings e Peres (2000).
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obra de diplomados no segundo grau é limitada, dada a posição da América Latina na economia global.19 O declínio relativo dos formados no secundário sugere que apenas um número restrito de integrantes da força de trabalho – os que tinham instrução pós-secundária – se benefi- ciou (especialmente em termos relativos) do crescimento apresentado pela maioria dos países nos anos noventa.
Tabela 1B: Crescimento do emprego por tipo de trabalho na América Latina durante a década de 1990 (média nos vários países)
Fonte: CEPAL (2001).
2. As famílias de renda média não têm nada de “classe média”; na verdade, são bem pobres.
Isso se deve a que a desigualdade na região é não apenas grande, como favorece inusitadamente os que estão no topo, pois o decil superi- or das famílias em matéria de renda percebe 50% ou mais da renda total. Os altos níveis de desigualdade da América Latina refletem, pri- mordialmente, a tremenda concentração da renda na camada superior. Se ignorarmos o decil superior, o coeficiente de Gini (e outras medidas de desigualdade da renda) será praticamente idêntico nos Estados Uni- dos e na maioria dos países da América Latina.20 Há dois corolários dessa distribuição de renda concentrada no topo. O primeiro é a renda extraordinariamente baixa em relação à renda “média” das famílias si- tuadas na faixa intermediária da distribuição. A Figura 2 mostra a dife-
19 Xxxxxxx (2002) oferece alguns esclarecimentos sobre esse problema, com base em pesquisas feitas com empregadores no nordeste do Brasil.
20 Inter-American Development Bank (1999), p. 16.
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rença entre uma estimativa da renda da família mediana21 (medida em termos de renda familiar per capita) e a renda média ou mediana calcu- lada a partir do mesmo levantamento domiciliar em vários países da região, durante os anos noventa. No Brasil, a mediana equivale a cerca de 1/3 dos ganhos médios. Em Honduras, equivale a cerca de metade da renda média. Nos Estados Unidos, por outro lado, a renda nacional mediana equivale a cerca de 90% da renda nacional média.22
Em Birdsall, Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2000), definimos uma “camada intermediária” de famílias como sendo aquelas cuja renda per capita fica dentro da faixa de 25% da família de renda média. Isso nos permi- tiu avaliar o “tamanho” da camada intermediária e sua parcela da renda total. Essa parcela, na América Latina, situa-se na faixa de 9% (Brasil, 1996) a 18% (Costa Rica, 1997), comparada a cerca de 35% nas econo- mias em transição e a uma faixa de 18% (EUA, 1999) a 42% (Bélgica e Dinamarca, 1992) nas economias avançadas.23 No Brasil, a renda per capita das famílias mais ricas da camada intermediária ficou em cerca de 2.200 dólares (em 1996, pela conversão da paridade do poder aquisi- tivo); isso equivaleu a menos da metade da renda familiar média per capita de 4.500 dólares.
O outro corolário é que, em termos absolutos, as famílias de renda média na América Latina, mesmo nas economias de renda média, en- contram-se no limiar da linha de pobreza, usando o padrão de dois dóla- res/dia (ou 730 dólares/ano) adotado pelo Banco Mundial. Nossa esti- mativa (Apêndice II) da renda familiar mediana per capita no México, em 1992, ficou em 1.148 dólares. A renda da camada intermediária no México situa-se entre 1.000 e 1.700 dólares per capita; nos Estados Unidos, nação parceira dos mexicanos no NAFTA, ela varia de 13.000 a 21.000 dólares. A Figura 2 mostra, no caso do Brasil, que a renda mediana ficou abaixo da linha de pobreza (60 dólares por mês em PPP) entre 1986 e 1989, mantendo-se próxima dos níveis da pobreza entre 1989 e 1996. Em Honduras, a renda mediana per capita ficou abaixo da
21 Nossa estimativa foi derivada usando as estimativas disponíveis dos coeficientes de Gini e presumindo uma distribuição logarítmica normal da renda global, a fim de chegar a uma média estimativa. Ver Apêndice II.
22 A renda mediana dos Estados Unidos foi calculada usando dados dos Indicadores do Desenvolvimento Mundial (Banco Mundial, 2002).
23 Tabela 1 de Xxxxxxxx, Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2000). Os dados ali apresentados abrangem apenas seis países da América Latina.
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linha de pobreza entre 1989 e 1996. Na Venezuela, vem decrescendo quase continuamente, aproximando-se dos níveis da linha de pobreza.
A quase-pobreza das famílias de renda média reflete-se em seus bai- xos níveis de saúde e instrução. A Figura 3 mostra os indicadores de saúde de vários países latino-americanos nos quintis superior, médio e inferior da distribuição estimativa da riqueza.24 Os indicadores do quintil intermediário ilustram a que ponto esse grupo está mais perto de ser pobre, pela maioria dos padrões, do que de pertencer à “classe média”. Na Bolívia, o índice médio de mortalidade infantil é de 99,1 por 1.000. A mortalidade infantil nas famílias de renda intermediária ultrapassa 146 por 1.000 (ver Figura 3). Isso é mais do que a taxa média de morta- lidade infantil registrada em Gana (132,8 por 1.000) e na Tanzânia (139,4 por 1.000). No Peru, durante 1990, quase 20% das crianças abaixo de cinco anos nas famílias de renda média tiveram prejuízos no crescimen- to. Na Guatemala, as crianças da camada intermediária tinham mais probabilidade de ser subnutridas do que os filhos do quintil mais pobre das famílias ganenses. No Peru e na Bolívia, as crianças do quintil mais pobre tinham mais probabilidade de ser subnutridas que as das famílias ganenses do quintil mais pobre.
O nível de instrução dos adultos da camada intermediária também fica bem abaixo do que se esperaria da “classe média” no sentido oci- dental. Entre os adultos brasileiros em idade de trabalhar, a média da escolaridade fica em cerca de 4,5 anos; na Costa Rica, que tem uma longa história de investimentos na educação, ela ainda está em apenas cerca de seis anos. Nos Estados Unidos, equivale a treze anos.25 A ins- trução média dos adultos em idade de trabalhar, na maioria dos países da América Latina, subiu de aproximadamente três para cerca de cinco anos a partir de 1960. Essa cifra baixa é citada com freqüência em com- parações pesarosas com o aumento havido, no mesmo período, nas eco- nomias em rápido crescimento no Leste Asiático, onde houve uma ele- vação de quatro para nove anos de escolaridade, aproximadamente. Ain- da assim, apesar de baixas, essas médias são enganosas como medida do grau de instrução das famílias de nossa camada intermediária. A Figura 4 mostra que o nível médio de instrução entre os adultos da Bo-
24 Esses quintis baseiam-se em estimativas da riqueza familiar per capita, derivadas de um conjunto de indicadores que incluem informações como tipo de piso, posse de rádio, bicicleta, automóvel etc. Ver as fontes indicadas na figura.
25 Cálculos da autora, baseados em dados de Barro e Lee (Estatísticas do Banco Mundial, 2002).
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lívia e do Brasil ainda é inferior a dois anos; na Argentina, ultrapassa em pouco os cinco anos – ou seja, primeiro grau incompleto.26
Essas estimativas do nível médio de escolaridade dos adultos tor- nam particularmente inquietantes as indicações de que, durante a déca- da de 1990, houve um aumento da defasagem salarial entre os que têm maior ou menor instrução posterior ao curso secundário. A grande mai- oria das famílias da região continua muito aquém da instrução necessá- ria para desfrutar de qualquer ganho salarial “médio” (por mais limita- do que este tenha sido).
Há duas implicações do fato de a camada intermediária estar, na verdade, muito próxima da definição de “pobre”, usando-se os indica- dores de educação e saúde e a linha de pobreza de dois dólares/dia adota- da no âmbito internacional. A primeira é que o próprio processo de cres- cimento é restringido pelos bens limitados (instrução e outros ativos sóli- dos) de uma grande proporção das famílias.27 A ênfase da atual política social em desenvolver os ativos produtivos dos pobres, inclusive através da educação, também tende a ser benéfica para a camada intermediária. Isso fica muito claro num país como o Brasil, onde o número de matrícu- las no ensino secundário aumentou rapidamente na última década, graças a um esforço político concertado, principalmente por parte do governo central. Mas esse não é um processo rápido. Na conclusão, voltarei a falar brevemente do desafio de melhorar a distribuição dos ativos, em grande parte porque esse desafio já vem sendo enfrentado.
A segunda implicação é que até os períodos curtos de declínio da economia podem facilmente empurrar as famílias de renda média para a pobreza.28 Essas famílias são sumamente vulneráveis ao empobrecimento
26 É claro que esses números são melhores entre os integrantes mais jovens do grupo em idade de trabalho, o que reflete o progresso das duas últimas décadas. Mas entre as famílias da camada intermediária incluem-se aquelas em que muitos adultos têm mais de 40 anos.
27 Xxxxxx et al. (1999) oferecem um modelo em que o retorno médio sobre os investimentos é mais baixo nas economias em que um número limitado de integrantes tem possibilidade de investir (só os que têm bens a oferecer como garantia, dadas as implicações do mercado de crédito).
28 Cline (2001) examinou o impacto que exercem sobre a pobreza as crises financeiras nos mercados emergentes, havendo concluído que pelo menos 40 milhões de pessoas foram levadas à pobreza durante as crises ocorridas no México (1995), na Tailândia e na Indonésia (1997), na Coréia e na Rússia (1998), no Brasil (1999) e na Argentina e na Turquia (2001). A pobreza teve um aumento significativamente maior nos países que administraram as crises com extremo insucesso (Indonésia, Rússia e Argentina).
Desenvolvimento em Debate — 226
através da perda temporária de renda e, o que é pior, da perda de seus ativos limitados, em decorrência da instabilidade econômica. Dado que inúmeras famílias da camada intermediária estão próximas da linha de pobreza, as fases de declínio da atividade econômica que elevam os preços e reduzem o emprego, ainda que por períodos relativamente cur- tos, são particularmente dolorosas para elas. Durante a década de 1980, a percentagem de pobres duplicou na Grande Buenos Aires (de 10% para mais de 20%) e subiu de aproximadamente 32% para 50% nas regiões urbanas do Peru (Lustig, 2000). A situação atual da Argentina é reconhecidamente extrema, porém o aumento registrado do número de pobres, que chega a atingir 53% nas áreas urbanas (INDEC, 2002) dei- xa muito clara essa questão.29
Mesmo nos casos em que o aumento da percentagem de pobres é pequeno, é provável que as famílias de renda mediana reduzam sua renda permanente, desfazendo-se de parte de seus ativos financeiros e de outros ativos fixos para manter o nível de consumo. O valor dos ativos financeiros, inclusive de pequenas empresas e contas bancári- as, pode ser rapidamente corroído nas fases de declínio da atividade econômica, ou, no caso das contas bancárias, pela inflação, o que im- plica uma mobilidade social descendente para as famílias de recursos limitados, mesmo que não signifique um mergulho na pobreza. Com- parando dados sobre a mobilidade da renda de famílias do Peru e dos Estados Unidos (em relação a outros quintis), Xxxxxxxx et al. (2000) constataram uma probabilidade muito maior de mobilidade descen- dente nos quintis médios das famílias peruanas (48% desceram) do que nos das norte-americanas (34% desceram), ao longo de um prazo mais curto (6 anos versus 10 anos). É provável que o agudo sentimen- to de insegurança daí resultante, para inúmeras famílias de renda mé- dia, esteja por trás do ceticismo crescente a respeito dos benefícios
29 Em termos mais gerais, ocorre que muito mais famílias são “pobres” na maioria dos países, numa ou noutra época, do que implicam os índices do número de pobres. Xxxxxxxxx et al. (2000) constataram que, na Indonésia, presumindo-se que 20% das famílias sejam pobres, é provável que outros 30% tenham sido ou venham a ser pobres num prazo de três anos. Por exemplo, Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2000) informam que a proporção de pobres na China foi de 0,2% no período de 1985-1990, mas que até 48% da população estiveram na pobreza em algum momento desse período. Os números correspondentes foram 3% e 55,3% com respeito ao Paquistão e 10,6% e 59,6% em relação ao Zimbábue entre 1993 e 1996.
Agenda Social e Combate à Pobreza — 227
das reformas econômicas dos últimos 10-15 anos (as reformas do cha- mado Consenso de Washington).30
3. As reformas econômicas da década de 1990 (as chamadas reformas do Consenso de Washington) não prejudicaram os pobres. Mas tam- bém não os ajudaram, nem foram benéficas para a camada interme- diária. Seus benefícios foram basicamente colhidos pelos ricos.
Para começar, o copo está pela metade. A análise econométrica, usan- do dados de levantamentos domiciliares sobre a maioria dos países da região em vários anos das três últimas décadas, combinados com índi- ces de reformas econômicas nos diferentes países, sugere que a liberalização do comércio e, como grupo, outras reformas econômicas estruturais, como a privatização, as reformas trabalhistas e as reformas fiscais, não prejudicaram os pobres (e a redução drástica da inflação os ajudou). A única exceção foi a liberalização do setor financeiro, que prejudicou os pobres pelo menos em termos relativos.31
Por outro lado, as reformas tampouco ajudaram os pobres (na maio- ria dos países, os 30% das famílias do patamar econômico inferior) e, com base na análise de seus efeitos sobre a desigualdade, é improvável que tenham ajudado a camada intermediária. Xxxxxxx, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001b) mostraram que, de modo geral, as reformas (liberalização do comércio, privatização, reforma fiscal e reforma do mercado de traba-
30 Ver Xxxxxx (2002) para indícios de que as atitudes frente às reformas econômicas dos anos noventa são cada vez mais negativas, conforme dados de pesquisa do Latinobarometro. Xxxxxxxx, Xxxxxx e Xxxxxxxxx (2000) usaram dados anteriores de levantamentos do Latinobarometro sobre as atitudes relativas às reformas, a fim de avaliar até que ponto elas diferem entre os pobres, os da camada intermediária e os ricos. Os resultados de análises de regressão apresentados indicam que os respondentes de renda média dão mais apoio às reformas nos países que se encontram no início do processo e lhes dão menos respaldo naqueles em que o processo está mais avançado – ou seja, exibem uma atitude geral cada vez mais negativa. Ver a Tabela 8 deste último livro citado.
31 Behrman, Birdsall e Xxxxxxx (2001a) usaram dados de levantamentos domiciliares cobrindo a maioria dos países da região ao longo de vários anos, nas décadas de 1980 e 1990, combinados com índices de seis reformas econômicas por país e por ano, desenvolvidos por Xxxxxx e atualizados por Xxxx. As estimativas são reproduzidas no Apêndice III. A Tabela 2 do Apêndice III sugere que a liberalização do setor financeiro aumentou a defasagem entre o grupo intermediário e os pobres e aumentou a defasagem da pobreza, isto é, a diferença total de renda entre todos os que são considerados pobres e a linha de pobreza. Sobre essa mesma abordagem para avaliar os efeitos das reformas sobre a desigualdade salarial, ver Xxxxxxx, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001b).
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lho, liberalização do setor financeiro e abertura da conta de capitais) ampliaram a desigualdade salarial, levando efetivamente, em média, a um declínio dos salários reais dos que não tinham pelo menos alguma instrução além do segundo grau, bem como a um declínio relativo dos salários dos que tinham alguma instrução acima desse nível. Isso impli- ca que nossa camada intermediária, a maioria de cujos membros adultos não chega a ter o curso secundário completo, obteve pouco ou nenhum benefício das reformas, em termos absolutos, e com certeza saiu per- dendo em relação aos ricos (e mais instruídos). As “vilãs” das reformas não foram a liberação do comércio nem as privatizações, mas a reforma do setor financeiro e a abertura da conta de capitais.32
Xxxxxxx et al. (2001a) também mostraram que os pobres e a cama- da intermediária quase pobre foram auxiliados pela redução da inflação e da volatilidade macroeconômica (Apêndice III, Tabela 2). Os declínios nos termos de comércio não tiveram muita importância e, em si mesma, a valorização da taxa de câmbio pareceu ajudar. Examinando os efeitos que as reformas econômicas e as mudanças do meio macroeconômico ocorridas nesse período exerceram sobre a renda dos 10% de famílias mais ricas, comparados aos 30% mais pobres, constata-se que, em ter- mos relativos, os mais pobres saíram perdendo com a inflação, com a volatilidade macroeconômica e com a liberalização do setor financeiro. No caso da liberalização do setor financeiro, é possível que o menor custo do capital ou o melhor acesso a empréstimos privilegie o trabalho qualificado em relação ao não qualificado, possivelmente porque o in- vestimento maior de capital (em tecnologias mais novas, por exemplo) requer um uso maior de mão-de-obra especializada. Os mais pobres saíram ganhando com a valorização da taxa de câmbio e (embora esse resultado seja estatisticamente menos significativo) com a melhoria nos termos de comércio.
Qual é o panorama global que emerge dessas análises? Os pobres e a camada de renda intermediária não estão em condições particular- mente piores em decorrência das reformas econômicas, e certamente não o estão por causa da abertura da economia, estritamente definida
32 Xxxxxxx et al. (2001b) afirmaram que o efeito das reformas no aumento da defasagem salarial não persiste ao longo do tempo, mas vai desaparecendo, em consonância com a probabilidade de ajustes do mercado. Assim, as reformas não necessariamente prejudicaram os pobres nem a camada intermediária em caráter permanente, mas também não ajudaram esses grupos.
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em termos de liberalização do comércio. Mas estão pior em decorrência da instabilidade contínua; aliás, talvez não seja por acaso que a reforma que pode ter surtido efeitos claramente negativos nos pobres – a liberalização do setor financeiro – e as duas reformas que aumentaram a desigualdade salarial – a liberalização do setor financeiro e a abertura da conta de capitais – tenderam a desempenhar um papel central na instabi- lidade econômica a curto prazo.33
Parte 3. Os ingredientes de um contrato social baseado no emprego e no crescimento
Quais são as implicações, em termos de medidas políticas, que cons- tituiriam um contrato social mais amplo numa economia aberta? Consi- dero quatro delas. Três têm a ver com a política tributária interna e uma com as políticas das economias avançadas.34
Primeiro, uma política tributária brilhante é o ingrediente central do contrato social numa economia aberta. É difícil evitar essa conclusão, a despeito de sua aparente banalidade. Emprego a palavra “brilhante” porque, ironicamente, o padrão das economias de mercado emergentes na América Latina é mais alto que o dos Estados Unidos e das economi- as européias. É que essas economias latino-americanas emergentes têm dois problemas: mercados financeiros internos menos sólidos e menos resistentes aos revezes econômicos e um histórico ruim. Os mercados financeiros de pouco lastro dificultam a administração da instabilidade por parte do governo.35 O histórico ruim (de tomada de empréstimos mal administrada, com as crises resultantes de inflação e monetárias) significa que os credores internos e externos continuam céticos quanto à capacidade política de os governos administrarem seus orçamentos, sem recorrerem, nas situações de crise, à emissão de moeda ou a novas rodadas de empréstimos excessivos e dispendiosos.
33 Xxxxx e Xxxxxxxx (1996) documentaram as fontes da volatilidade na América Latina. Kose, Prasad e Terrones (2002) mostraram o impacto da liberalização financeira na volatilidade do consumo em alguns países de baixa renda.
34 Esta seção baseia-se, em parte, nas idéias políticas expostas em Birdsall e de la Torre (2001), onde a ênfase recai sobre as medidas que abordam diretamente a equidade, sem sacrificar o crescimento. Ver também de la Torre (2002).
35 Banco de Desenvolvimento Interamericano (1995).
Desenvolvimento em Debate — 230
A brilhante administração fiscal implica, entre outras coisas, a dis- posição e a capacidade política de reduzir a dívida pública. A menos que ela já esteja em declínio, os déficits fiscais têm que ser vistos como má política social, violadora do contrato social, a não ser que o governo que já tenha apresentado superávits durante vários anos seguidos e que o gasto com a dívida seja claramente contracíclico e temporário. Com a única exceção do Chile, todos os países latino-americanos tiveram um déficit fiscal global em todos os anos, desde 1993.36 Quando o déficit global é negativo em relação à perspectiva de crescimento, nem mesmo o superávit primário é sustentável (nos bons tempos) com um déficit global. É tentador contrair empréstimos para bons investimentos (inclu- sive saúde e educação) nas épocas de fartura. Mas só os países que já conseguiram evitar a instabilidade na última década (o Chile, talvez El Salvador e a Costa Rica) podem escapar ao ônus de manter o superávit durante os anos de crescimento, ainda por muitos anos.
Para a maioria dos países latino-americanos, os superávits são cruciais para o contrato social, pelo menos por duas razões. Primeiro, são a cha- ve para manter as taxas reais de juros num patamar baixo. As taxas reais de juros foram muito altas na América Latina durante os anos noventa, atingindo, em média, mais de 10% na maioria dos países, enquanto, de modo geral, ficaram abaixo de 10% nos outros países em desenvolvi- mento e em cerca de 5,6% nos Estados Unidos (ver Tabela 2). Reduzir as taxas de juros é fundamental para a geração de empregos para a vasta maioria da força de trabalho, com seu nível de instrução limitado.37
36 Fundo Monetário Internacional (2001).
37 Na OCDE, verificou-se que as taxas reais de juros mais altas contribuíram para o aumento do desemprego (Xxxxxxxxx e Wolfers, 1999). As estimativas dessa relação não mostram um efeito estatisticamente robusto na América Latina; todavia, os dados são muito mais “ruidosos” quanto à taxa real de juros (em vista da própria volatilidade não captada da inflação), os mercados de crédito são muito mais segmentados e os dados sobre o emprego e o desemprego são menos fidedignos.
Agenda Social e Combate à Pobreza — 231
Tabela 2: Comparação das Taxas Médias Reais de Juros (década de 1990): América Latina, outros países em desenvolvimento
e Estados Unidos
Segundo, a poupança pública (isto é, o superávit fiscal) é fundamen- tal para a capacidade governamental de usar a política fiscal e monetá- ria contracíclica para proteger a grande camada intermediária, assim como os pobres, nas fases de declínio da atividade econômica. Durante as recessões dos países desenvolvidos, os governos podem contrair dí- vidas para financiar o seguro-desemprego, aumentar os gatos com cu- pons de alimentos, com a merenda escolar e com a saúde pública, e para tomar outras providências que constituam uma rede de segurança social para seus cidadãos. Seus mercados financeiros internos e a confiança em suas moedas lhes permite financiar os déficits contracíclicos nas fases de declínio econômico. Para todos os fins práticos, num futuro previsível, poucos governos latino-americanos – com a possível exce- ção do Chile – têm setores financeiros locais capazes de absorver mais dívidas, a não ser a um custo elevado, e poucos despertam confiança suficiente nos mercados externos para tomar empréstimos nas fases ru- ins. Ironicamente, o fato de eles serem mercados “emergentes”, e não emersos, com sua história de inflação e má administração da dívida, exige uma disciplina fiscal mais contínua e rigorosa do que os credores internos e externos esperam dos governos dos países desenvolvidos.
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Não há como evitar essa assimetria, se esses países quiserem participar dos benefícios da integração global.
Em suma, a capacidade de reduzir as taxas reais de juros e implementar uma política contracíclica está no cerne do contrato social de uma econo- mia aberta. Essa capacidade depende de uma política tributária brilhante.
Os eleitores da América Latina demonstraram, durante a última dé- cada, sua desconfiança do populismo e seu apoio a candidatos vistos como capazes de garantir a estabilidade macroeconômica; isso não é de admirar, dada a comprovação de que os custos da instabilidade são altos para a maioria das famílias. Mas a lembrança coletiva da hiperinflação, como um ônus imposto pelo Estado aos cidadãos, pode estar desapare- cendo, e a instabilidade vem-se associando mais às crises financeiras desencadeadas no exterior. Com os indícios crescentes de desânimo em relação às reformas,38 mais uma vez parece haver uma permuta entre a boa política social e a boa política fiscal. Esse efeito nocivo só pode ser evitado se for estabelecido um vínculo entre a boa administração fiscal e um contrato social baseado no emprego.
Segundo, uma política tributária brilhante implica reformas difíceis pelo lado dos gastos e dos impostos. Na questão dos gastos, a maioria dos países consegue fazer deles uma distribuição muito mais progressi- va do que é a distribuição da renda, especialmente no tocante aos inves- timentos sociais.39 Mas em certos países, como o Brasil, por exemplo, algumas áreas importantes de gastos, como a das pensões e aposentado- rias dos servidores públicos e dos militares, são ineficientes e injustas. (Por outro lado, no Brasil, a eliminação do déficit fiscal e quase fiscal dos gastos no nível estatal foi um enorme passo na direção certa – um passo que não foi dado na Argentina.40) Os credores continuarão des- confiados da capacidade a longo prazo de administração do orçamento,
38 Ver em Graham (2002) os indícios de mudança da postura política em relação às reformas econômicas da década de 1990, bem como do sentimento crescente de insegurança econômica na região. A autora afirma (com base em pesquisas do Latinobarometro) que, na América Latina, apenas 16% dos respondentes das pesquisas acreditam estar vivendo melhor do que seus pais, em comparação com 64% nos Estados Unidos. Ela informa também que o nível de riqueza das pessoas tem uma correlação positiva com o apoio à “produtividade” versus a “redistribuição” na região.
39 Birdsall e de la Torre (2000).
40 No Brasil, as pensões dos servidores públicos e dos militares consomem pelo menos 25% da receita pública anual. Os aposentados recebem 100% de seu salário mais alto, acrescido do ajuste pleno da inflação e de ajustes calculados com base nos aumentos do salário mínimo.
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enquanto não forem eliminadas essas barreiras estruturais contra a re- dução dos gastos. A melhor das providências “emergenciais” para redu- zir os gastos tributários, mesmo quando é convincente,41 fica demasia- damente sujeita à liderança individual, a qual, para os credores, por sua vez, é por demais incerta em termos políticos (como indica a reação do mercado à candidatura Lula no Brasil). Dado o efeito que a desconfian- ça dos credores exerce sobre as taxas de juros na tomada de emprésti- mos públicos, a reforma dos gastos é fundamental para reduzir a taxa de juros para o setor privado, bem como para o crescimento do emprego e, portanto, para o contrato social de uma economia aberta.
Pelo lado dos impostos, há pelo menos dois problemas. Um deles é que, na maioria dos países, os 10% mais ricos pagam poucos impostos. O uso de brechas para fugir da tributação e a sonegação fiscal constitu- em a norma.42 Na Argentina, as famílias mais ricas arcam com uma taxa média de impostos de 8%.43 São evidentes os limites da obtenção global de receita, quando as famílias que controlam mais de 50% da renda pagam poucos impostos.44 Segundo, a região depende maciçamente do imposto sobre o valor adicionado, o qual, junto com outros impostos diretos, gera 90% do total da receita, comparados aos 60% gerados na Europa. Como imposto que incide no consumo, o imposto sobre o valor adicionado não é progressivo em si mesmo (embora possa ser e seja administrado no sentido de limitar seu impacto regressivo). Além disso, à semelhança dos impostos que incidem na folha de pagamentos (dada a maneira como costumam ser administrados), ele é um imposto invisí- vel; os cidadãos não têm conhecimento do ônus que representa. Para estes, ele não tem como encarnar o reverso do contrato social entre o Estado e os cidadãos, que consiste em que os cidadãos assumem a res-
41 Refiro-me aos benefícios de melhor gestão emergencial que são irreverentemente chamados “benefícios Xxxxx Xxxxx”, aludindo ao ministro da Fazenda brasileiro do período de 1995-2002. Mas até esses benefícios são limitados.
42 Birdsall e de la Torre (2001) citam algumas provas disso.
43 O Banco Interamericano de Desenvolvimento (1999) mostra a incidência da taxação por decil em vários países latino-americanos. Com referência à incidência de impostos na Argentina, a fonte é o Centro de Estudios Bonaerense (1997).
44 Nos anos de crescimento explosivo nos Estados Unidos, no fim da década de 1990, estima-se que 60% do total da receita do imposto de renda tenham vindo das famílias situadas nos 5% superiores (verificar) da renda per capita. (V) Xxx: continuou a indicação “check” entre parênteses no original; que fazer?
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ponsabilidade por financiar o Estado e esperam que os representantes estatais respondam por um governo receptivo e responsável.45
Para encarnar melhor o contrato social, a reforma dos sistemas tributári- os da região precisaria implementar uma política tributária mais visível e mais progressiva. Isso não precisa implicar a elevação das taxas de impos- tos marginais. Em alguns países, implicaria aumentar a receita global atra- vés da eliminação das brechas para a evasão e mediante a redução da sone- gação (e o aumento da receita permitiria gastos maiores, os quais, como já foi assinalado, têm uma distribuição mais progressiva do que a renda). Po- deria implicar um aumento do imposto sobre as vendas de artigos de luxo ou o restabelecimento de um imposto modesto sobre as importações – incidindo sobre todas elas, para fins de obtenção de receita, e não de prote- cionismo –, que se elevaria nas fases de crescimento e cairia nos períodos de recessão. Na maioria dos países, essas reformas reduziriam a dependên- cia maciça do consumo invisível e dos impostos sobre a folha de pagamen- tos, que impõem um ônus pesado à camada intermediária.
Terceiro, um contrato social implica uma nova ênfase numa questão tradicional: a proteção aos direitos dos trabalhadores. Um contrato so- cial baseado no emprego não pode ignorar a insegurança e o desamparo da vasta maioria dos trabalhadores da região nas fases de declínio da economia. Como ilustra a Figura 5, a reforma do mercado de trabalho é a menos avançada da América Latina, comparada a outras reformas eco- nômicas ligadas ao Consenso de Washington, presumivelmente porque a ênfase na “flexibilidade” do mercado de trabalho tem sido muito ame- açadora, em termos políticos, para os remanescentes do contrato social anterior aos anos oitenta, baseado na proteção do emprego no setor in- dustrial. Um contrato social baseado no emprego, numa economia aber- ta, implica valorizar maciçamente a proteção da renda dos trabalhado- res. Esse objetivo pode ser alcançado de duas maneiras: garantindo os direitos de negociação coletiva, paralelamente a programas de regula- mentação que assegurem a democracia dos sindicatos, e garantindo uma mobilidade muito maior e mais fácil no emprego, em contraste com a garantia da estabilidade individual em determinados empregos.
A proteção à mobilidade no emprego não precisa depender de um seguro-desemprego do tipo que é comum nas economias mais ricas, que
45 Essa questão é discutida em Birdsall e de la Torre (2001) e convincentemente elaborada em de la Torre (2002).
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requer uma capacidade maior de financiamento contra-cíclico do que tem atualmente a maioria dos governos latino-americanos. Ela pode basear-se num programa parcialmente autofinanciado de contribuições obrigatórias de empregadores e empregados para contas individuais, que podem ser transferidas para fundos de aposentadoria. O Chile criou um sistema financiado e portátil desse tipo, com contas individualiza- das dos trabalhadores, as quais podem ser usadas para o seguro-desem- prego e das quais o trabalhador também pode fazer um conjunto restrito de outras retiradas, como para a compra da casa própria.46
Por último, o acesso aos mercados dos países ricos deve ser visto como central para o contrato social da economia aberta. O contrato social baseado no emprego e no crescimento, numa economia aberta, não depende apenas da abertura das economias da América Latina, mas de seus mercados externos. Pelo menos parte da instabilidade que tanto tem custado à camada intermediária e aos pobres se reduziria na região, se houvesse uma melhora em seu acesso ao mercado norte-americano e aos europeus; o maior crescimento das exportações e a diminuição da necessidade de empréstimos externos afastariam mais as economias da instabilidade financeira. Além disso, é provável que os empregos cria- dos em setores como a agricultura (no Brasil, a soja), a indústria de calçados e a indústria têxtil ampliasse a demanda de mão-de-obra me- nos qualificada. Nesse caso, os benefícios da ligação com a economia global aumentariam para a vasta maioria de famílias em que os adultos ainda têm níveis relativamente baixos de instrução. Sem esse acesso, pode não ser impossível, mas com certeza será difícil imaginar que a região possa implantar o tipo de contrato social que esbocei.
Observações finais
Xxxxx apenas indiretamente ao problema subjacente da má distribui- ção dos ativos produtivos na região, que se reflete na distribuição suma- mente desigual da renda e que a reforça. A razão disso é que alguns esboços gerais da política social já vêm abordando esse problema, atra- vés da maior atenção dedicada à educação (o ativo do povo47), dos es- forços crescentes para ampliar os projetos de microfinanciamento (a
46 Xxxxxxx (2000) e Cortazar (1995).
47 Enfatizo essa questão em Birdsall (2000). Ver também Birdsall e Londoño (1997).
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fim de oferecer crédito e aumentar a acumulação de bens dos pobres) e da reforma agrária (especialmente no Brasil e na Colômbia, onde ino- vações sensatas têm provado que a reforma agrária baseada no mercado é sumamente viável). Tudo isso é não apenas central para a boa política social, mas é também crucial para ampliar o nível sustentável de cresci- mento a longo prazo da região, através do aumento da produtividade da vasta maioria de seus cidadãos. Há bons indícios de que, nas economias em que o mercado de capitais e outros são relativamente fracos, nas quais as próprias medidas reguladoras para compensar as imperfeições intrínsecas dos mercados nem sempre são satisfatórias, a própria desi- gualdade de acesso solapa o crescimento.48 (O exemplo clássico é a impossibilidade de os pobres contraírem empréstimos, o que não só li- mita sua renda como restringe o crescimento econômico global.) O con- trato social de qualquer dos países latino-americanos também não pode desconhecer o custo permanente da discriminação étnica e racial.
Optei, ao contrário, por enfatizar um problema que tem recebido menos atenção, qual seja, o de que não apenas os pobres, mas a vasta maioria dos trabalhadores e famílias da região, ainda não se estão bene- ficiando – ou, certamente, não se estão beneficiando muito – da abertu- ra das economias e das outras reformas da última década, comparados a seus vizinhos altamente instruídos. Na verdade, é possível que a ênfase tradicional e sensata no atendimento às necessidades dos pobres tenha criado alguns pontos cegos (especialmente na comunidade internacio- nal voltada para o desenvolvimento) na percepção da realidade de que as famílias situadas na faixa intermediária da distribuição da renda na América Latina estão longe dos níveis de renda e segurança associados à “classe média” nas economias avançadas. Elas podem não ser consi- deradas pobres hoje, mas talvez tenham sido pobres há pouco tempo e é bem possível que venham a empobrecer amanhã. Em termos de sua
48 A literatura sobre os efeitos da desigualdade no crescimento é muito mais clara a esse respeito do que se costuma pensar. A melhor avaliação isolada (Barro, 2000) é aquela que faz uma distinção criteriosa entre as economias desenvolvidas e as que estão em desenvolvimento. Nas primeiras, a desigualdade anterior pode, na verdade, fomentar o crescimento; nas últimas, tem um efeito negativo. Birdsall e Londoño (1997) mostraram que a desigualdade na instrução e na terra, medida no nível amplo da economia, reduz o aumento da renda do quintil mais pobre duas vezes mais do que reduz o aumento da renda da família média, e que, levando em conta a desigualdade desses dois tipos de ativos, a América Latina nada tem de “especial”; é sua desigualdade nos ativos que responde por seu distanciamento das economias avançadas na distribuição da renda.
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capacidade de acumular bens e da probabilidade de receberem um re- torno adequado sobre esses bens, mais vale considerá-las como quase pobres do que como a “classe média” que constitui o baluarte do siste- ma democrático nas economias abertas. É provável que, ironicamente, a ênfase num contrato social que atenda às necessidades dessa maioria oculta das populações, e não apenas dos atualmente pobres, também beneficie mais os pobres, pois é sabido que estes retiram um enorme proveito do crescimento em si, e sobretudo do crescimento estável, ba- seado no emprego.49
A América Latina implementou um conjunto de mudanças em dire- ção às economias de mercado mais abertas e competitivas. Agora, é preciso complementar e reforçar os benefícios de crescimento desse primeiro grande passo com um segundo passo: um contrato social que se concentre maciçamente no emprego e no crescimento e, por conse- guinte, numa administração tributária brilhante, na proteção aos direi- tos dos trabalhadores e na pressão sobre os Estados Unidos e as demais economias avançadas para que eles ampliem o acesso a seus mercados.
49 Xxxxxx (2000) discute a política desse tipo de aliança. Ravallion (2002) mostra que, na Argentina, assim como em Bangladesh e na Índia, o desempenho concentrado dos programas de redes de segurança se deteriora quando os programas se contraem. Isso sugere “uma tendência subjacente da economia política a proteger os gastos dos não- pobres” (p. 18). Ironicamente, o corolário é que ampliar os gastos, a fim de que eles atinjam um número maior de pessoas, tende a ajudar imensamente os pobres.
Desenvolvimento em Debate — 238
Figura 1A:
Taxa marginal de retorno sobre a educação na América Latina na década de 1990, conforme a conclusão dos ciclos de estudos
Fonte: Birdsall, Behrman e Xxxxxxx (2001).
Figura 1B:
Diferenciais de salário na América Latina
Fonte: Birdsall, Behrman e Xxxxxxx (2001).
Agenda Social e Combate à Pobreza — 239
Figura 2:
Grupos de renda média na América Latina.
Renda familiar média e renda familiar mediana, década de 1990
Fonte: Estimativas da autora a partir de estatísticas do Banco Mundial (2002).
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Fonte: Estimativas da autora a partir de estatísticas do Banco Mundial (2002).
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Figura 3:
Indicadores de saúde de vários países latino-americanos conforme o grupo de renda, década de 1990
Fontes: Serviço de Assessoria sobre Saúde e População, Banco Mundial. Levantamentos demográficos e de saúde: Peru (1996), Brasil (1996), Bolívia (1998), Guatemala (1995), Colômbia (1995), Nicarágua (1997),
Paraguai (1990), Gana (1993). xxxx://xxx.xxxxxxxxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx/xxxx/xxxxx.xxx
Desenvolvimento em Debate — 242
Figura 4:
Níveis médios de instrução e níveis medianos de instrução na América Latina
Figure 4: Average Levels of Education and Median Levels of Education in Latin America
Fonte: Estimativas da autora com base nos dados de Barro e Xxx (estatísticas do Banco Mundial, 2002).
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Figura 5:
Evolução das reformas na América Latina.
Indicadores médios da política adotada, período de 1970-1995
Fonte: Birdsall, Behrman e Xxxxxxx (2001).
Apêndice I:
Efeitos do crescimento e da desigualdade sobre a pobreza na América Latina
Appendix I: Effects of Growth and Inequality on Poverty in Latin America
Fonte: Attanasio e Székely (2001).
Desenvolvimento em Debate — 244
Apêndice II: Estimativa da renda mediana
A estimativa seguiu Cline (2002) e Xxxxxxxxxxx (2002). A mediana é o valor m de uma variável X tal que:
onde Prob = função probabilística.
Assim, a renda mediana é o valor da renda do indivíduo ou família que se situa bem no meio de todas as faixas da distribuição de renda. Quase todos os dados sobre a renda por país incluem uma renda média e algum índice da desigualdade (dispersão), mas não a mediana. Para cal- cular a mediana, tal como definida na equação (1), usando a média e a dispersão, é necessário usar uma função probabilística. Presumindo-se que a renda (y) tenha uma distribuição probabilística logarítmica normal, sua distribuição probabilística pode expressar-se da seguinte maneira:
onde = média de ln y
= desvio padrão de ln y
A distribuição logarítmica normal pode expressar-se como uma dis- tribuição padrão normal, depois de se normalizar y:
onde é a Distribuição Normal Padrão e X = y normalizado. A função de distribuição cumulativa de X é:
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onde II = Distribuição Normal Cumulativa Padrão.
Numa distribuição logarítmica normal, o parâmetro ó pode ser obti- do a partir do coeficiente de Gini:
onde II-1 é a função inversa da distribuição normal cumulativa pa- drão e G é o coeficiente de Gini.
Usamos um banco de dados do Banco Mundial (2002), montado a partir de levantamentos domiciliares. Os dados incluem a renda média e os coeficientes de Gini nos países da América Latina durante a década de 1990. Inicialmente, calculamos ó usando os coeficientes de Gini, e depois usamos a função indicada em (4) para calcular a mediana.
Desenvolvimento em Debate — 246
Apêndice III:
Liberalização do comércio, contexto macroeconômico, desigualdade e pobreza na América Latina
Tabela 1:
Liberalização do comércio, contexto macroeconômico e desigualdade na América Latina
Fonte: Behrman, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001a).
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Tabela 2:
Liberalização do comércio, contexto macroeconômico e pobreza na América Latina
Fonte: Behrman, Xxxxxxxx e Xxxxxxx (2001a).
Desenvolvimento em Debate — 248
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