Contract
Xxxxx Xxxxxxx Neves Bases do Contrato Psicológico de Profissionais Atuantes em Empresas de Alta Performance |
Dissertação de Mestrado Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós- Graduação em Administração de Empresas da PUC- Rio. Orientadora: Profª. Xxx Xxxxxxx xx Xxxxx Lemos |
Rio de Janeiro Março de 2013 |
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Bases do Contrato Psicológico de Profissionais Atuantes em Empresas de Alta Performance Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre pelo Programa de Pós- Graduação em Administração de Empresas da PUC-Rio. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada. |
Profa. Xxx Xxxxxxx da Costa Lemos Orientadora Departamento de Administração – PUC-Rio Profa. Xxxxxxxxxx xx Xx Xxxxx da Costa Departamento de Administração – PUC-Rio Prof. Xxxxxx Xxxx Xxxx xx Xxxxxxx Sobral FGV Profa. Xxxxxx Xxxx Vice-Decana de Pós-Graduação do CCS – PUC-Rio Rio de Janeiro, 27 de Março de 2013 |
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, da autora e da orientadora. |
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx-se em Administração de Empresas pela PUC-Rio em 2007. Trabalhou nas áreas de Logística, Planejamento Estratégico e Comercial nas empresas TIM Brasil S/A, Souza Cruz – British American Tobacco, Bradesco Seguros, Claro S/A e Telefônica – Vivo S/A, desde o início de sua carreira profissional, em 2005, até Julho de 2012. Atualmente, dedica-se à vida acadêmica. Ficha Catalográfica |
Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxx
Bases do contrato psicológico de profissionais atuantes em empresas de alta performance / Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx ; orientadora: Xxx Xxxxxxx da Costa Lemos. – 2013.
83 f. ; 30 cm
Dissertação (mestrado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Administração, 2013.
Inclui bibliografia
1. Administração – Teses. 2. Contrato psicológico.
3. Sistemas de trabalho de alta performance. 4. Relações de trabalho. I. Lemos, Xxx Xxxxxxx xx Xxxxx.
II. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Administração. III. Título.
CDD:
658
CDD: 658
A Deus, e todas as forças superiores que me deram inspiração, força de vontade, disciplina e paciência para chegar ao final deste trabalho.
À minha orientadora, Xxx Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxx, por toda a ajuda e disponibilidade oferecida, não só durante a realização desta dissertação, mas também pelo apoio recebido ao longo dos últimos meses, nessa batalha que é o início da vida acadêmica.
E, principalmente, à minha mãe, que é a metade de minha alma, e minha maior incentivadora.
Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxx; Xxxxx, Xxx Xxxxxxx xx Xxxxx. Bases do Contrato Psicológico de Profissionais Atuantes em Empresas de Alta Performance. Rio de Janeiro, 2013. 83p. Dissertação de Mestrado – Departamento de Administração, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Este trabalho tem como objetivo entender as bases do contrato psicológico estabelecidas entre trabalhadores e empresas de alta performance, no atual cenário em que as relações de trabalho estão cada vez mais pautadas em uma dedicação intensa à organização e ao aumento da jornada de trabalho, para muito além das oito horas contratuais. Buscou-se entender o que atrai esses profissionais às empresas consideradas de alta performance; o que essas empresas oferecem aos funcionários, de forma explícita e, principalmente, implícita, que as tornam atraentes para os mesmos. Para fundamentar teoricamente o trabalho foi realizada uma revisão da literatura acerca de temas como o contrato psicológico, sistemas e práticas de trabalho relacionados à alta performance, bem como sobre os impactos positivos e negativos gerados pela alta performance (como, por exemplo, a intensificação do trabalho). Para alcançar os objetivos do trabalho realizou-se uma pesquisa qualitativa, com entrevistas semi-estruturadas com doze funcionários de empresas privadas cujo modelo de gestão fosse fortemente pautado em valores de alta performance. Os resultados das entrevistas foram analisados à luz da literatura consultada, buscando-se entender quais as bases das relações de troca entre os entrevistados e as empresas nas quais atuam. Os resultados da análise indicam que, embora boa parte dos profissionais aprecie as atividades realizadas em seu trabalho, os custos atrelados à alta performance são consideráveis, impactando na vida pessoal destas pessoas e prejudicando muitas vezes a relação familiar.
Palavras-chave
Contrato psicológico; sistemas de trabalho de alta performance; relações de trabalho.
Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxx; Xxxxx, Xxx Xxxxxxx xx Xxxxx (Advisor). Basis of Psychological Contract of High Performance Companies’ Professionals. Rio de Janeiro, 2013. 83p. MSc. Dissertation – Departamento de Administração, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
This study aims at understanding the basis of the psychological contract between employees and high performance organizations in the current scenario where labor relations are increasingly linked to an intense dedication to the organization and to an increase of the workload far beyond eight o'clock contract. We sought to understand what attracts these professionals to companies considered to be high performance ones, what these companies offer to employees, explicitly and, primarily, implicit, that make these organizations attractive to them. The theoretic basis of the work lies on a literature review on topics such as the psychological contract, systems and work practices related to high performance, as well as the positive and negative impacts generated by high performance (eg, intensification of work). To achieve the objectives of the work we carried out a qualitative study with semi-structured interviews with twelve employees of private companies whose management style was strongly based on values of high performance. The results of the interviews were analyzed according to the literature, seeking to understand what the basis of exchange relations between the respondents and the companies in which they operate. The results of the analysis indicate that although most of the professionals enjoy the activities they carry out in their work, the costs linked to high performance are significant, impacting their personal lives and many times affecting the family relationship.
Keywords
Psychological contract; high performance work systems; working relationships.
Sumário
1.5. Delimitações do Estudo 15
1.6. Estrutura da Dissertação 15
2.1. O Contrato Psicológico 17
2.1.1. Características do Contrato Psicológico 19
2.1.2. Tipos de Contrato Psicológico 21
2.1.3. A Alteração do Contrato Psicológico 23
2.1.4. Violação do Contrato Psicológico 25
2.2. Sistemas de Trabalho de Alta Performance 27
2.2.1. As Práticas de Trabalho Relacionadas à Alta Performance 32
2.2.2. Os Impactos Positivos da Alta Performance
2.2.3. Os Impactos Negativos da Alta Performance
3.1. Tipo de Pesquisa Realizada 49
3.3. Procedimentos de Coleta e Registro de Dados 52
4.1. As Bases do Contrato Psicológico em Empresas
4.1.1. Rápido Crescimento Profissional 57
4.1.2. Realização Profissional e Satisfação Pessoal 59
4.1.3. Prestígio Profissional e Imagem da Empresa 61
4.1.4. Reconhecimento com Base no Desempenho 62
4.2. Os Custos do Trabalho em Empresas de Alta Performance 65
4.2.1. Extensão da Jornada de Trabalho 65
4.2.2. Sacrifício da Vida Pessoal e Familiar 69
6 Referências Bibliográficas 80
Figura 1 Gestão de Alta Performance e o Impacto sobre os Funcionários 29
Tabela 1 Perfil dos entrevistados 52
Tabela 2 Roteiro da entrevista 54
1
Introdução
Em um cenário marcado pela competição intensa entre as empresas a importância de contar com uma mão de obra comprometida e disposta a dedicar grande parte de seu tempo à organização torna-se cada vez maior (GREEN, 2001). Entende-se que esta maior dedicação envolve aspectos que vão desde as horas de trabalho destinadas à empresa, passando pela forma de pensar na organização, vista como uma extensão de sua própria vida, até a opção pelo trabalho, em detrimento da vida pessoal e familiar. A competição observada entre as organizações também se faz presente entre os funcionários, já que tanto a permanência do empregado na empresa, quanto o seu crescimento profissional dependem de uma melhor performance em comparação ao resto da equipe. Em matéria recente publicada pela Revista Exame, Onaga (2012) destaca o fato de que uma das explicações para o excesso de trabalho de nossa era está ligada ao fenômeno da globalização, que se intensificou na última década e empurrou a competitividade entre as empresas para um patamar inédito. Quem quer se manter no “jogo” tem de aprender a produzir mais, melhor e por menos, em função desta competição intensa.
Nesse contexto, as organizações de trabalho tradicionais vêm cedendo lugar às chamadas organizações de alta performance, em que os trabalhadores vivenciam situações como o aumento da autonomia e do controle sobre os processos de trabalho, equipes de trabalho com maior autoridade para lidar com questões de qualidade e maiores responsabilidades para resolver problemas do que grupos tradicionais de trabalhadores. Como resultado, indivíduos nesses sistemas acham seu trabalho mais desafiador, se obrigam a serem mais criativos e fazem maior utilização de suas habilidades, o que os leva a reportarem maiores níveis de recompensas intrínsecas com seu trabalho do que outros trabalhadores (APPELBAUM, 2002).
Desta forma, acredita-se que essas mudanças tendam a afetar também os contratos psicológicos estabelecidos entre os funcionários e suas empresas contratantes. Entende-se que as expectativas dos trabalhadores inseridos na realidade de alta performance está relacionada com o maior esforço dispendido, já que esperam ser recompensados de acordo com a dedicação intensa e as horas trabalhadas a mais, seja em termos financeiros, de reconhecimento ou crescimento profissional. Portanto, o contrato psicológico estabelecido por esse grupo de profissionais tende a ser diferente daquele estabelecido por quem trabalha nas chamadas organizações tradicionais.
A constatação de tensões inevitáveis, quando se trata do trabalho nesses tipos de organizações, por um lado, e a atratividade que essas parecem ter para uma parcela expressiva de profissionais bem qualificados, que supostamente teriam maiores possibilidades de escolher onde trabalhar, motivaram a realização deste trabalho. Após ampla análise das bases do contrato psicológico, do cenário dos sistemas de trabalho de alta performance e das práticas de trabalho relacionadas ao mesmo, bem como suas implicações positivas e negativas, este estudo buscou compreender quais as bases do contrato psicológico entre trabalhadores de alta performance e as organizações em que os mesmos atuam. Em outros termos, buscou-se entender o que estes trabalhadores esperam das empresas em troca de uma dedicação intensa.
Apesar de existirem muitos estudos recentes que abordam essa nova dinâmica na forma de trabalho (XXXXX 2004; XXXXXX et al,. 2004; XXXXXX, 2004; XXXXXX, 2008; XXXXX e XXXXXX, 2007; XXXX e XXXXXXX, 2011)
estes, em sua maioria, tendem a se concentrar na explicação das características dos sistemas de trabalho de alta performance, bem como nas práticas de trabalho relacionadas ao mesmo. Todavia, há poucos estudos como o de Hewlett e Xxxx (2006), que se dedicam a entender as motivações individuais que levam as pessoas a trabalhar em ritmo intensificado e por longas horas, de forma aparentemente voluntária. Em que pese os condicionantes estruturais que acabam por forçar os trabalhadores a se dedicarem mais intensiva e extensivamente ao trabalho, pode-se ponderar que, em muitos casos, trabalhar mais seja uma escolha voluntária, capaz de trazer satisfação ao indivíduo. Entender os motivos por trás da decisão do trabalhador em fazer parte de uma empresa conhecida como de alta
performance (XXXXX, 2004), que os leva a trabalhar de forma mais intensiva, torna-se, portanto, um tema que requer estudos aprofundados.
Desta forma, a presente dissertação tem como objetivo entender o que motiva os trabalhadores a se engajarem em empresas ditas de alta performance, nas quais o ritmo e a duração do trabalho tendem a ser intensos, demandando maior dedicação do trabalhador. Busca-se compreender quais as bases do contrato psicológico que se estabelece entre estes funcionários e as empresas em que atuam, mostrando o que é esperado por eles. O contrato psicológico é geralmente entendido como um modelo mental que constitui os termos e acordos de troca entre o empregado e sua organização empregadora (Xxxxxxxx, 1995). Assim como os funcionários se identificam quando percebem que existe similaridade entre os seus valores e os das suas organizações, também se distanciam e deixam de se identificar quando percebem que existem diferenças fundamentais entre as organizações e eles, quando percebem que a organização tem valores diferentes dos seus, quando acreditam que a reputação da organização é desfavorável, ou quando percebem que essa identidade ameaça a sua própria (CONYWAY e XXXXXX, 2006; XXXXXXXX et al., 1962; XXXXXXXX e XXXXXXXX, 1997; XXXXXXXX, 1998).
Funcionários que passam mais de dez horas diárias dentro de uma organização podem ter diferentes motivações. Uma delas é a busca pelo rápido crescimento profissional e a crença de que, ao dedicarem mais horas ao trabalho, serão recompensados por isso. A vida pessoal também pode ter influência nessa questão, pois pessoas solteiras e com vínculos familiares mais distantes poderiam ser identificadas como mais dispostas a dedicar seu tempo à organização, comportamento esse que pode não ser observado em pessoas casadas e/ou com filhos. Muitas horas no trabalho acabam afastando o executivo da família e é comum nessas situações ver as relações pessoais se deteriorarem. Inicia-se então um ciclo vicioso – a dedicação à carreira prejudica a vida familiar e, para fugir de um ambiente ruim em casa, o executivo passa ainda mais horas no trabalho (ONAGA, 2012).
É nesse contexto que se coloca a questão de pesquisa que orientou a presente dissertação: quais as bases do contrato psicológico estabelecido entre trabalhadores e as empresas de alta performance nas quais trabalham?
O presente estudo teve como objetivo entender as bases do contrato psicológico estabelecidas entre trabalhadores e empresas de alta performance. O contrato psicológico foi investigado sobre a ótica do empregado. Procurou-se entender o que atrai esses profissionais às empresas consideradas de alta performance; o que esses esperam das empresas nas quais estão inseridos, o que eles entendem que lhes é oferecido, de forma explícita e, principalmente, implícita, que as tornam tão atraentes.
A questão central desta pesquisa é:
Quais as bases do contrato psicológico estabelecido entre trabalhadores e as empresas de alta performance nas quais trabalham?
O conceito de contrato psicológico não é novo e tem sido largamente utilizado nas pesquisas que visam o entendimento das relações de trabalho atuais. Já o conceito de alta performance tem conseguido uma crescente proeminência ao longo das duas últimas décadas, tanto como uma preocupação acadêmica quanto como uma demanda prática, e envolve uma série de mudanças importantes dentro do ambiente de trabalho contemporâneo (XXXXXX, 2008). Ainda assim é um tema que carece de estudos capazes de compreender a vivência dos funcionários que estão inseridos nessa realidade.
A importância deste estudo para a área acadêmica está justamente em fazer uma ligação entre um tema já muito discutido, e que encontra amplo referencial teórico – o contrato psicológico – com outro ainda recente: o ponto de vista do empregado que trabalha em empresas de alta performance. Acredita-se, portanto, que o presente estudo pode trazer contribuições também para as organizações de alta performance e os trabalhadores que nelas atuam, no sentido de esclarecer a
relação existente entre eles, quais as bases do contrato psicológico que mantêm o vínculo empregatício e, em última análise, o que os funcionários esperam em troca de tamanha dedicação.
Este trabalho buscou analisar a relação existente entre trabalhadores de alta performance e as empresas em que trabalham. Buscou-se entender o que eles esperam das mesmas e por que aceitam passar grande parte do seu tempo dentro delas, muitas vezes deixando a vida pessoal em segundo plano. Não fez parte do escopo deste estudo entender qual o perfil de funcionário desejado pelas empresas de alta performance, nem analisar qual a visão da organização em relação aos mesmos, mas apenas focar nas expectativas dos funcionários em relação à empresa em que trabalham, analisando o que lhes é oferecido em troca de uma dedicação extrema.
Este trabalho está estruturado da seguinte forma:
O capítulo 1 trata da motivação do estudo, do problema de pesquisa, dos objetivos e questões de pesquisa, além de descrever a relevância do estudo para a Academia e para o mercado, sobretudo para as organizações privadas, e as delimitações do estudo.
O capítulo 2 apresenta o referencial teórico utilizado para a análise, incluindo literatura sobre contrato psicológico – definição do conceito, características, tipos de contrato, alteração e violação do mesmo – além da definição dos conceitos de sistema de trabalho de alta performance e das práticas de trabalho relacionadas à mesma, finalizando com os impactos positivos e negativos da alta performance na vida dos trabalhadores e sua relação com o conceito de intensificação do trabalho.
No capítulo 3 é descrita a metodologia de pesquisa utilizada neste trabalho, detalhando-se o tipo de pesquisa realizada, a seleção dos participantes para a
pesquisa, os procedimentos de coleta e registro de dados e as limitações do método utilizado.
No capítulo 4 é realizada a análise e a discussão dos resultados da pesquisa à luz do referencial teórico apresentado no capítulo 2. O capítulo foi dividido em dois tópicos: no primeiro, procurou-se analisar as bases do contrato psicológico entre os entrevistados e as empresas em que trabalham. Foram consideradas questões como o rápido crescimento profissional, a realização profissional e a satisfação pessoal, o prestígio profissional e a imagem da empresa, bem como o reconhecimento com base no desempenho (meritocracia). No segundo tópico, foram abordados os custos atrelados ao trabalho em empresas consideradas de alta performance, com destaque para as questões referentes à extensão da jornada de trabalho e o sacrifício da vida pessoal e familiar.
O capítulo 5 apresenta as conclusões do trabalho.
Por fim, no capítulo 6 são apresentadas as referências bibliográficas utilizadas ao longo de todo o trabalho.
2
Referencial Teórico
Este item apresenta uma revisão da literatura que serviu de base para a análise realizada no estudo. Inicialmente a teoria que discute os contratos psicológicos é explorada desde a sua concepção, passando pelas modificações ocorridas ao longo dos anos, face às transformações ocorridas no contexto das relações de trabalho. Em seguida, o conceito de sistemas de trabalho de alta performance e as práticas relacionadas ao mesmo serão analisados, bem como suas implicações positivas e negativas. Essa literatura auxiliará a entender os motivos que levam os trabalhadores a aceitar a condição de dedicar boa parte do seu tempo e energia à empresa em que trabalham.
Argyris (1960) foi o primeiro autor a utilizar o termo contrato psicológico. Ele acreditava que empregados e organizações criavam contratos psicológicos que permitiam a expressão e gratificação das necessidades de cada um. Em outras palavras, se os empregados sentem que seus gestores estão respeitando seu direito de se desenvolver, crescer e usar sua própria iniciativa, então, em troca, os funcionários também irão respeitar o direito de evoluir da organização. Para o autor, se os empregadores não interferem demais nos empregados, respeitam sua cultura ou normas do grupo e deixam que eles façam o seu trabalho, a tendência é que tenham um desempenho melhor. Portanto, contanto que os empregadores mantenham sua parte do acordo, os empregados estão preparados para trabalhar produtivamente.
Xxxxxxxx et al. (1962) descrevem o contrato psicológico como o contrato não escrito, como a soma das expectativas mútuas entre a organização e o empregado. O conceito é utilizado para destacar expectativas implícitas e não ditas que são anteriores à relação entre empregador e empregado. Algumas expectativas são mais conscientes do que outras como, por exemplo, as
expectativas com relação ao salário. Outras são mais inconscientes e só são reveladas indiretamente, como as perspectivas de promoção de longo prazo.
Xxxxxx (1965) enxerga o contrato psicológico como um caminho chave para analisar o relacionamento de empregados e empregadores. Para o autor o caminho principal em que empregados avaliam o contrato psicológico é através da extensão em que existe alguma correspondência entre as suas expectativas e as das organizações
Xxxxxxxx (1995) define o contrato psicológico como as crenças dos indivíduos sobre os termos do acordo de troca que estabelecem com suas organizações. A autora também se refere ao contrato psicológico como modelos mentais que os indivíduos utilizam para organizar eventos como promessas, auto- afirmação e confiança. Estes modelos teriam como função principal orientar os indivíduos sobre quais eventos devem esperar que ocorram na organização e como interpretá-los. As crenças do indivíduo passam a fazer parte do contrato psicológico quando ele percebe que deve à organização certa contribuição (como dedicação, lealdade e sacrifícios) em troca de certos benefícios (salário, segurança no trabalho etc).
Segundo Xxxxxxxx (1995) um contrato é um modelo mental que as pessoas usam para organizar eventos como promessas, aceitação e confiança. As promessas que compõem os contratos não têm significados objetivos. Promessas são, em última análise, percepções do que foi enviado e do que foi recebido. Percepções não são simples interpretações pacíficas da realidade; as pessoas criam seus significados através de vários eventos. Acordos entre as pessoas ajudam a promover a visão de que uma promessa é real e pode ser invocada. Tal acordo ajuda a criar contratos normativos.
Ainda de acordo com Xxxxxxxx (1995) modelos mentais sinalizam as pessoas para quais eventos elas devem esperar e como devem interpretá-los. Esses modelos desempenham um papel nas três formas de contrato: psicológico, normativo e implícito. As diferenças nos modelos refletem as diferentes informações disponíveis para o intérprete.
Para Xxxxxxxx (1995) os contratos psicológicos diferem do conceito geral de expectativas, pois são promissórios e recíprocos, já que as promessas de comportamento futuro, por parte da organização, são dependentes de uma ação recíproca do empregado. A autora destaca alguns pontos importantes a respeito do
tema, a saber: contratos são inevitáveis e fundamentais para produzir relacionamentos; refletem múltiplas realidades e interpretações, dentro dos indivíduos e entre grupos (nenhuma visão unilateral é suficiente); princípios gerais operam entre os contratos, mas as previsões sobre comportamentos individuais e resultados organizacionais precisam ser levadas em conta para determinados fatores específicos em cada situação (dimensões organizacional, social e pessoal são importantes para entender qualquer contrato particular); frequentemente ocorrem ambiguidades na construção dos arranjos dos contratos, criando tanto flexibilidade quanto inevitáveis conflitos.
A teoria de contratos psicológicos (XXXXXXXX, 1995) sugere que as promessas não-escritas que os empregados percebem que o empregador faz com relação ao treinamento, promoções ou outros fatores não explicitamente reconhecidos em contratos formais, são fundamentais para o desenvolvimento das relações de troca favoráveis. Essas promessas, que se desenvolvem durante o recrutamento, a interação, a socialização com colegas de trabalho e supervisores, são inerentemente subjetivas (XXXXXXXX, 2001).
Características do Contrato Psicológico
A maioria das definições dos contratos psicológicos enfatiza que eles são mantidos no nível individual e existem nos “olhos de quem vê” (Xxxxxxxx e XxXxxx Xxxxx, 1993, apud Xxxxxx e Xxxxxx, 2006). Eles são inerentemente subjetivos já que existem limites de processamento cognitivo ou informações em que uma parte pode entender o psicológico da outra. Em outras palavras, um empregado não consegue entender completamente as intenções e significados do comportamento da organização, nem a organização entende por completo o trabalhador, e por esse motivo estas interpretações serão incompletas e subjetivas. Além disso, as múltiplas e às vezes contraditórias fontes de informações que influenciam o desenvolvimento e modificação do contrato psicológico também significam que eles permanecem subjetivos (Shore e Tetrick 1994, apud Xxxxxx e Xxxxxx, 2006). Em contraste, um contrato psicológico mais objetivo ocorre quando os termos do contrato são entendidos da mesma forma pelas partes do
contrato e por qualquer terceira parte que esteja fora do relacionamento (XXXXXX e XXXXXX, 2006).
No que diz respeito às características do contrato psicológico, Xxxxxxxx (1995) afirma que, na essência, é uma percepção subjetiva que difere entre os indivíduos. Além disso, ele é dinâmico, o que significa que muda ao longo tempo, com base em promessas feitas, em que ambas as partes investem em seu relacionamento com a expectativa de um resultado positivo para eles. Finalmente, os contratos psicológicos estão ligados ao contexto da relação: indivíduos ou organizações não podem criar separadamente os contratos psicológicos (Schalk e Xxxxxx, 1993, apud Xxxxxxxx e Schalk, 1998), mas eles são desenvolvidos como um resultado inevitável da interação entre as partes. Outro ponto a salientar é que há um consenso implícito entre os pesquisadores de que, embora o contrato psicológico raramente seja explicitamente discutido, ele é um importante determinante do comportamento e atitudes dos funcionários. Isto não significa, entretanto, que quando o contrato psicológico é discutido e explicitado, ele deixa de existir.
Segundo Xxxxxx e Xxxxxx (2006) contratos psicológicos são geralmente considerados como tendo tanto promessas implícitas quanto explícitas. Promessas explícitas surgem de acordos verbais ou escritos feitos pela organização ou por um agente da organização. Promessas implícitas, por outro lado, surgem de interpretações de padrões de trocas passadas, aprendizagem vicária (por exemplo, testemunhar experiências de outros funcionários), assim como através de vários fatores que cada parte pode tomar para si – por exemplo, boa fé ou justiça. (Xxxxxxxx e Xxxxxxxx, 1994, apud Xxxxxx e Xxxxxx, 2006). Xxxxxx e Xxxxxx, (2006) argumentam que os termos do contrato psicológico são implícitos pelo comportamento das partes do contrato e também pelas inferências feitas pelas promessas verbais e escritas já existentes. Interações repetidas entre as duas partes em que uma observa o comportamento da outra criam o que o empregado percebe como um contrato psicológico implícito que estruturam seus relacionamentos (Xxxxxxxx, 1990, apud Xxxxxx e Xxxxxx, 2006).
Xxxxxxxx (1995) explica que quando duas pessoas trabalham de forma interdependente, como um analista e seu supervisor, e concordam quanto aos termos do contrato, o desempenho deve ser satisfatório para as perspectivas das duas partes. Como os indivíduos trabalham através dos entendimentos dos
compromissos de cada um ao longo do tempo, um grau de previsibilidade mútua torna-se possível: eu sei o que você quer de mim e você sabe o que eu quero de você. Entendimentos dos compromissos nos dois lados podem ser baseados em comunicação, costumes e práticas do passado. Independentemente de como isso é atingido, previsibilidade mútua é um fator poderoso para coordenar esforços e planejamento.
Sobre esse tema, Xxxxxx e Xxxxxx (2006) explicam que contratos psicológicos referem-se a um acordo de troca percebida entre as duas partes. Em outras palavras, aquilo que é oferecido pela organização, ou pelos empregados, está condicionado a algo que a outra parte faz em troca. A questão da reciprocidade é importante porque, se a suposição a respeito de reciprocidade não é válida, torna-se difícil continuar a considerar o contrato psicológico como um contrato. Essencialmente contratos são sobre negócios – algo que é trocado por outra coisa.
Segundo Xxxxxxxx (1996) o contrato psicológico é baseado na troca de benefícios e recompensas mútuas. De fato, a questão da mutualidade é o ponto principal, segundo a autora, para a entrega dos produtos esperados, isto é, apenas quando ambas as partes percebem que possuem algo a ganhar com a relação é que se empenham em trabalhar para assegurar a entrega do trabalho previamente acordado. Ainda segundo Xxxxxxxx (1998), a percepção de reciprocidade é o coração do contrato psicológico.
Xxxxxxxx (1995) caracteriza dois tipos de contratos: os transacionais e os relacionais. Eles se formam através da diversidade da natureza das trocas percebidas pelos empregados e pelo tempo de contratação (finito ou indeterminado) estabelecido pela organização. Os dois tipos seriam extremidades de um contínuo que permite acomodar as mais diversas naturezas de contratos. O contrato transacional costuma ser estabelecido com um término específico, de curto prazo, a base de troca é monetária e o envolvimento entre as partes é limitado. Já o contrato relacional foca em uma relação sem prazo de término estabelecido, envolve obrigações de longo prazo e é baseado não apenas em trocas
monetárias, mas também sócio-emocionais, requerendo investimentos de ambas as partes que costumam ser percebidos como barreiras à saída. A autora diz ainda que dimensões relacionais do contrato psicológico pressupõem que as organizações proporcionem formação e desenvolvimento profissional, tratamento justo e segurança no trabalho em troca de funcionários comprometidos e dispostos a realizar tarefas que estão fora de seu escopo de trabalho.
Por outro lado, a dimensão transacional do contrato psicológico captura a disposição da organização de oferecer uma compensação adequada, condições de trabalho e garantias razoáveis de emprego, no curto prazo, em troca do cumprimento por parte do empregado de suas obrigações contratuais de trabalho (Xxxxxxxx, 1995). Restubog et al. (2008) ofereceram uma distinção útil entre os tipos de contrato relacional e transacional: os contratos psicológicos relacionais representam o lado sócio-emocional, enquanto os contratos transacionais representam os interesses materiais dos trabalhadores.
Outra forma de analisar os tipos de contratos é de acordo com as suas dimensões. Isso porque existem dimensões individuais e coletivas no contrato psicológico. De acordo com Xxxxxxxx (1995), considerando estas dimensões, os contratos podem ser classificados em normativos, implícitos e sociais. O aspecto coletivo é retratado nos contratos normativos, os quais são impregnados da cultura da organização ou através dos contratos sociais que são influenciados de forma mais ampla pelo contexto em que o indivíduo está situado. Os contratos normativos envolvem um grupo de indivíduos que possuem objetivos, expectativas em comum. Já os contratos implícitos são as atribuições que as pessoas que não participam do contrato fazem sobre os seus termos, aceitação e mutualidade. Eles formam parte da reputação da organização e imagem pública. Por sua vez, os contratos sociais, são culturais, baseados na participação, crenças coletivas sobre comportamentos apropriados pela sociedade. Derivam dos valores da sociedade como um todo, valores que afetam a forma como outros contratos operam (XXXXXXXX, 1995).
Em relação ao aspecto individual, Xxxxxxxx (1996) destaca o contrato psicológico propriamente dito como sendo uma relação um a um (one to one) com ênfase nas expectativas e percepções individuais. Além deste, existe o contrato implícito, que, de acordo com Xxxxxxxx (1996), é a base do contrato psicológico, por ser totalmente construído a partir de percepções formadas pelos potenciais
empregados quando ainda estão fora da empresa, seja através de propagandas ou opiniões de empregados da organização. Sendo assim, pode-se afirmar que este tipo de contrato é a própria base da relação de emprego.
A Alteração do Contrato Psicológico
Xxxxxxxx (1995) afirma que as alterações no contrato variam de mudanças sutis e imperceptíveis nos entendimentos até as mais traumáticas, e afetam tanto as experiências individuais dos indivíduos como o dinamismo dos grupos de trabalho. Formas de contratos emergentes introduziram novos padrões de aferição de práticas de negócio enquanto alteraram como o público pensa a respeito das carreiras, segurança do trabalho e lealdade.
Ainda segundo a autora as alterações no contrato ocorrem de diversas maneiras. Desenvolvimentos externos que afetam o trabalho das pessoas, a maneira como elas trabalham ou o ambiente como um todo, também podem interferir no contrato, levando a alterações que variam de pequenas adições, modificações e ajustes nos termos do contrato até a reformulação radical de todo o contrato. Essas mudanças externas assumem duas formas: acomodação evolutiva ou transformações revolucionárias. Com exceção das transações de prazo muito curto, todos os contratos estão sujeitos a mudanças.
Xxxxxxxx (1995) explica que a acomodação faz ajustes no contrato já existente. Ela modifica, torna mais claro, substitui ou expande termos já existentes no contrato. Ocorre quando os mesmos esquemas permanecem, apesar das mudanças nas condições de trabalho reconhecidas. Ainda segundo a autora quando há um bom relacionamento entre as partes do contrato, as mudanças são mais suscetíveis de serem interpretadas como existente no âmbito do contrato. O bom relacionamento leva à mudança por acomodação por dois fatores: as partes não estão procurando ativamente por violações do contrato e um bom relacionamento inclui algumas relações de termos do contrato que aumentam a zona de aceitação. Relacionamentos com um histórico positivo manifestam uma boa vontade em ser flexível, o que torna mais fácil para ambas as partes solicitar mudanças.
Em relação às mudanças por transformação, Xxxxxxxx (1995) explica que as mesmas marcam uma alteração fundamental na natureza da relação entre as partes, redefinindo tanto as relações quanto o contrato em que a mesma se baseia. A autora diz ainda que são formas de mudanças radicais. Nas organizações contemporâneas, existe pouco consenso sobre a natureza da mudança, mas existe um acordo de que as organizações estão mudando a taxas sem precedentes. As mudanças notadas pelos comentaristas contemporâneos são transformações radicais no contrato psicológico entre empregados e empregadores. Nesta transformação, um contrato já existente, às vezes por violação, outras vezes por realização, deixa de existir e um novo é criado. As perdas são reais e os custos são altos, mas os ganhos também podem ser. Violação por definição é uma violação voluntária do contrato que custam a violação da pessoa. Existe uma linha fina entre violação e transformação.
A autora diz que o propósito da transformação do contrato é a criação de um novo no lugar do já existente, em que o novo contrato engendra compromisso e eficácia para todos os interessados. O processo da transformação determina se a mudança degenera em uma violação ou transforma as bases do relacionamento.
Um ponto importante para o entendimento deste trabalho é analisado por Xxxxxxxx (1995), quando a autora explica que a passagem do tempo traz substanciais mudanças psicológicas e sociais. As necessidades dos trabalhadores e das organizações podem mudar com a idade e os novos papeis e responsabilidades da vida adulta. O tempo pode transformar uma atividade que antes era normal em algo quase impossível de se realizar. Trabalhadores com mais de trinta anos, com responsabilidades familiares, podem achar que as condições de trabalho que eram bem vindas aos vinte anos (como viajar ou recepcionar clientes) tornam-se difíceis de serem cumpridas. Uma pessoa dedicada e motivada pode acabar comprometendo sua dedicação ao trabalho em função do aumento da responsabilidade familiar. Essas mudanças podem ocorrer de forma mais fácil quando as pessoas fazem parte de um grupo de trabalho que compartilha das mesmas experiências.
A autora diz ainda que, para muitas pessoas mudanças em suas vidas pessoais modificam a maneira como enxergam o trabalho como um todo. Essas mudanças podem ser alterações sutis na alocação do tempo ou ajustes mais intensos nas atividades. Não obstante, as mudanças podem criar uma nova
definição nas próprias responsabilidades do trabalho. Maturidade e desenvolvimento pessoal conduzem a mudanças na interpretação e valor dos termos do contrato como os benefícios previstos pelo empregador. O ciclo de vida pode mudar o significado dos termos do contrato.
Violação do Contrato Psicológico
Segundo Xxxxxxxx (1995) a violação é uma falha em obedecer aos termos de um contrato. Mas, dada a natureza subjetiva dos contratos psicológicos, como as pessoas interpretam as circunstâncias dessa falha determina a maneira como elas vivenciam a violação. McFarlane, Xxxxx e Tetrick (1994) complementam o conceito destacando que uma violação do contrato psicológico ocorre quando o empregado experimenta uma discrepância entre o real cumprimento das obrigações pela organização e as promessas anteriormente feitas sobre as mesmas. O grau de violação experimentado depende do tipo, do grau de divergência e do fato de a organização ser ou não responsável pela mesma.
Xxxxxxxx (1995) destaca que as violações assumem três formas: a inadvertida ocorre quando as duas partes são capazes e dispostas a manter o negócio, mas interpretações divergentes levam uma das partes a agir de uma forma em desacordo com o entendimento e interesses do outro. Rompimento do contrato ocorre quando circunstâncias tornam impossível para uma ou as duas partes cumprirem o contrato até o fim, apesar do fato delas estarem dispostas a tal. Renegação ou violação de contrato ocorre quando um lado, apesar de capaz de desempenhar o contrato, se recusa a fazê-lo. A forma como a vítima compreende e a fonte de violação como sendo falta de vontade ou incapacidade de cumprir tem um enorme impacto sobre como a violação é experimentada e o que fazem as vítimas em resposta (Bies e Moag, 1986, apud Xxxxxxxx, 1995).
Xxxxxxxx (1995) diz ainda que a falha em manter compromissos pode ser baseada em oportunismo, negligência ou falta de cooperação. Oportunismo é ativo, o comportamento de auto-serviço por uma parte em detrimento de outra. Negligência é mais passiva que o oportunismo, envolve a falha em desempenhar responsabilidades específicas. Em situações em que a natureza de longo prazo do relacionamento entre as partes sai caro, as violações surgem não somente por
causa de termos específicos, mas por causa de violação da boa-fé que põem em risco o próprio relacionamento. Essas violações da boa fé são a falta de cooperação. Baseadas em normas sobre boa fé e tratamento justo, a falta de cooperação envolve comportamentos que minam a habilidade das partes que mantêm o relacionamento. Oportunismo, negligência e falta de cooperação são as bases da violação do contrato.
Xxxxxxxx (1995) lista situações em que as violações ocorrem com maior probabilidade, a saber: quando existe um histórico de conflito e baixa confiança no relacionamento; quando existem distâncias sociais entre as partes, fazendo com que uma não entenda a perspectiva da outra; quando existe um padrão externo de violação; os incentivos para violar o contrato são muito altos, os trabalhadores percebem que não têm alternativas ou quando uma das partes dá pouco valor ao relacionamento.
Xxxxxx e Xxxxxx (2006) também destacam possíveis causas para a violação de um contrato psicológico, a saber: práticas inadequadas de gestão de recursos humanos; quando os empregados não sentem suporte por parte da organização ou de seus supervisores; quando ocorrem eventos fora da organização, ou antes do empregado se tornar um membro da mesma ou, ainda, quando os empregados se comparam a outros funcionários e percebem que existe uma desigualdade.
Em contrapartida, Xxxxxxxx (1995) destaca alguns fatores que reduzem as experiências de violação, como: relacionamentos fortes; interações frequentes; sacrifícios e outros investimentos anteriores, que servem para ligar as partes umas as outras.
Sobre o tema, Xxxxxxxx e Xxxxxxxx (2000) destacam que a reestruturação, downsizing e terceirização que ocorreram como resultados da concorrência internacional e dos avanços na tecnologia tornam cada vez mais difíceis para as organizações cumprir os contratos psicológicos, mesmo quando estas têm a melhor intenção em fazê-lo. Quando as organizações não cumprem as suas promessas espera-se que os funcionários reduzam suas contribuições e tenham atitudes negativas com as organizações.
Como os contratos psicológicos são formados com base na confiança, a violação pode levar a fortes reações emocionais e sentimentos de traição (Xxxxxxxx e Xxxxxxxx, 1994). Mas até violações menos graves podem ter
consequências: maior turnover (Xxxxxxxx e Xxxxxxxx, 1994; Schalk et al., 1995, apud Xxxxxxxx e Schalk, 1998), menor confiança e satisfação no trabalho (Xxxxxxxx e Xxxxxxxx, 1994), menor comprometimento com a organização, retorno antecipado de expatriados (Xxxxx et al., 1994, apud Xxxxxxxx e Schalk, 1998), menor comportamento organizacional de cidadania (Xxxxxxxx e Xxxxxxxx, 1995), entre outros.
Xxxxxxxx et al. (1994) e Xxxxxxx e Xxxxxxxxx (1996) afirmam que os contratos psicológicos tornam-se mais transacionais após uma violação. Os funcionários se retiram da relação e vão prestar mais atenção a recursos financeiros e outros aspectos econômicos. No caso de violações de contrato relacional, as emoções desempenham um papel importante. A decepção e a desconfiança podem se desenvolver e, por causa disso, o contrato pode tornar-se mais transacional, mas o cerne da mudança pode ser a reavaliação por parte do empregado do que deve à organização em relação ao que a mesma deve a eles.
Por outro lado, Xxxxxxxx et al. (1962) não utilizam a terminologia violação para descrever o que ocorre quando um contrato psicológico dá errado, embora a ideia de que tal situação resulta em raiva, afastamento e hostilidade seja discutida, mas preferem considerar que tais situações em que empregados e organizações estão em conflito ocorrem por falhas na reciprocidade.
Xxxxxxxx e Xxxxxxxx (1997) fizeram uma distinção chave entre quebra e violação de contrato que hoje é aceita pela maioria dos pesquisadores do tema. Os autores descrevem a quebra como uma comparação cognitiva do que foi recebido e do que foi prometido e violação como as reações extremas, afetivas ou emocionais, que podem acompanhar as quebras. Em outras palavras, quebras são as discrepâncias percebidas entre o que foi prometido e o que foi entregue, enquanto violação é a reação emocional que também pode ser experimentada quando estas discrepâncias são percebidas (CONYWAY e BRINER, 2006).
Sistemas de Trabalho de Alta Performance
O conceito de alta performance tem influência japonesa, refletindo tanto o papel exercido pelo Japão como um poderoso concorrente econômico, quanto a importação direta do estilo japonês de produção e práticas de trabalho da
organização. Xxxxxx (2008) afirma que o paradigma de alta performance pode ser considerado como derivado de inovações práticas importadas do estilo japonês, incluindo just-in-time, kaizen (melhoria contínua), métodos de produção enxutos e gestão da qualidade total; iniciativas de negócios de engenharia de processo, e o movimento em direção ao conceito de uma organização que aprende. No entanto, o mais importante é destacar que, através da ênfase no desenvolvimento de altos níveis de comprometimento e envolvimento do empregado, o paradigma mantém o ideal pós-fordista de que as novas formas de organização do trabalho devem envolver ganhos tanto para os trabalhadores quanto para os empregadores.
Ainda segundo Xxxxxx (2008) o surgimento do paradigma de alta performance pode ser entendido como o produto de um determinado momento histórico: o culminar de uma série de experiências sucessivas com novas abordagens para a produção, a organização e a gestão do trabalho, e, finalmente, como respostas às limitações da produção em massa fordista. O paradigma envolve a continuação da tese pós-fordista, em que o empregado comprometido é visto como o ponto focal para as novas formas de organização do trabalho. Assim, fundamentalmente, o caráter distintivo da abordagem de alta performance é visto como residindo não tanto na novidade das práticas individuais que invoca, mas na maneira em que estas são combinadas pelos praticantes: a multiplicidade de práticas agregadas em sistemas destinados a produzir ganhos de desempenho e, finalmente, na filosofia subjacente informando tais combinações.
Xxxxxx et al. (2004) argumentam que assim como na gestão de qualidade, a gestão de alta performance continua a ser um conceito essencialmente controverso. Por um lado, os defensores da gestão de alta performance apontam os benefícios que proporcionam aos empregados em termos de capacitação e aumento das recompensas intrínsecas. A partir de uma tradição intelectual muito diferente, a tese de intensificação do trabalho conceitua a gestão de alta performance como um ardil gerencial que pretende extrair maior esforço dos funcionários. Em contrapartida, existe o argumento de que as técnicas de gestão de alta performance são suscetíveis de contribuir para uma melhor performance organizacional, mediada por melhores resultados dos próprios trabalhadores, com um desempenho superior. Baseando-se em Ramsay et al. (2000) é possível sintetizar as correntes dominantes deste debate teórico esquematicamente da seguinte forma:
(a) O Modelo Otimista – benefícios para a empresa e os funcionários
Satisfação com o trabalho Relações de gestão
Práticas de Comprometimento Performance
trabalho de alta Organizacional
performance
Envolvimento voluntário na tomada de decisão
(b) O Modelo de Exploração – benefícios apenas para a empresa
Intensificação do trabalho
Insegurança
Práticas de Esforço excessivo Performance
trabalho de alta Organizacional
performance
Esforço voluntário na tomada de decisão
Figura 1 Gestão de Alta Performance e o Impacto sobre os Funcionários Adaptado de Xxxxxx et al. (2000)
Xxxxxx et al. (2004) entendem que, sob o modelo otimista, o impacto da gestão de alta performance é totalmente benigno. As experiências de trabalho dos funcionários são intensificadas e os resultados são, portanto, benéficos para o capital e o trabalho. O maior esforço voluntário nas tarefas aumenta a autonomia, que acaba por produzir um estado psicológico que aumenta o comprometimento, que, por sua vez, gera ganhos de desempenho. O modelo de exploração também assume uma associação positiva entre a gestão de alta performance e os ganhos de desempenho. Entretanto, a distinção se encontra no fato de que qualquer benefício assume a forma de ganhos menores no esforço voluntário dos trabalhadores,
concedido como um meio de garantir o cumprimento das metas gerenciais. Esses avanços são compensados pela insegurança no trabalho, intensificação e estresse (Xxxxxx et al., 2000). O estresse surge em função da responsabilidade adicional associada com o novo modo de produção, aliado a um aumento da pressão no interior do ambiente de trabalho, devido à ausência de folgas dentro dos formatos de produção enxuta.
Appelbaum (2002) entende que a característica central dos sistemas de trabalho de alta performance é organizar o processo de trabalho para que empregados que não tenham cargo gerencial tenham a oportunidade de contribuir com um esforço voluntário. Esses sistemas descentralizam o recolhimento e o processamento de informação para os trabalhadores sem cargo gerencial, que então usam estas informações para resolver problemas e tomar decisões operacionais. Para contribuir com o desempenho operacional, trabalhadores da linha de frente precisam ter a autoridade para resolver problemas e influenciar mudanças nas rotinas organizacionais. Os locais em que os trabalhadores da linha de frente recolhem, processam e agem sobre as informações variam entre as diferentes organizações. Isso pode explicar o fato de que nenhuma combinação dominante de práticas características de um sistema de trabalho de alta performance emergiu, e explica também o aparecimento de diferentes modelos destes sistemas. Para serem eficazes na melhoria do desempenho, entretanto, os trabalhadores precisam ter a responsabilidade, autoridade e oportunidade de resolver problemas e tomar decisões que afetem os processos de trabalho.
Para Xxxxxx et al. (2003, apud Xxxxxx et al., 2004) o modo de expressão dos sistemas de trabalho de alta performance é sensível à dimensão da organização do trabalho, captando a necessidade de que haja mais oportunidades para os funcionários tomarem decisões, terem maior esforço voluntário em suas atividades e mobilizarem o conhecimento tácito.
Para Xxxxxxxxx (2002), nos sistemas de trabalho de alta performance trabalhadores com responsabilidades de resolver problemas e tomar decisões devem ser capazes de solicitar a experiência de profissionais e outros especialistas para endereçarem os problemas identificados e devem também comunicar soluções propostas para outros trabalhadores e gerentes. Esse tipo de comunicação é uma importante dimensão dos sistemas de trabalho de alta performance. Coordenação e comunicação entre trabalhadores nestes sistemas, incluindo os
trabalhadores de linha de frente, substituem muitas das interações hierárquicas que ocorrem numa organização de trabalho tradicional.
Assim, uma organização de trabalho mais participativa, nas quais os trabalhadores tenham a oportunidade de participar em decisões substanciais, é tipicamente caracterizada por quatro dimensões que a distinguem da forma mais tradicional. As dimensões identificadas são: (1) o grau de autonomia do trabalhador e controle sobre as decisões que afetam as tarefas de trabalho; (2) o grau de comunicação que os trabalhadores da linha de frente têm com outros trabalhadores e gerentes em seus grupos de trabalho e também gerentes e especialistas em outras partes da organização; (3) o grau em que os funcionários trabalham em equipes auto-dirigidas; e (4) o grau em que os funcionários participam das resoluções dos problemas ou melhoria da qualidade das equipes (APPELBAUM, 2002).
Ainda para Xxxxxxxxx (2002), mesmo que os trabalhadores tenham a oportunidade de usar sua iniciativa, criatividade e conhecimento para os interesses da organização, seus esforços só serão eficazes se eles tiverem as habilidades e conhecimentos apropriados. Trabalhadores que tenham somente um conhecimento concreto de seus trabalhos, dos quais se espera apenas que exerçam suas atividades rotineiras e que sabem pouco sobre os objetivos mais amplos da organização, não estão em uma boa posição para darem uma contribuição além do desempenho padrão de suas tarefas. Trabalhadores em um sistema de trabalho de alta performance precisam de habilidades melhores e conhecimento através de uma ampla frente – incluindo habilidades básicas, técnicas e operacionais, e habilidades sociais e de liderança – para serem tomadores de decisões eficazes.
O autor explica, ainda, que as demandas sobre os sistemas de trabalho de alta performance vão muito além da realização de suas tarefas e podem abranger a responsabilidade pelo desempenho operacional da organização. Os trabalhadores podem experimentar isso como um aumento do estresse ou como uma recompensa intrínseca maior do trabalho. O resultado para os trabalhadores depende de uma variedade de fatores. Isso inclui a natureza da tecnologia e o processo produtivo, o nível de confiança e comprometimento mútuo entre funcionários e gerentes no local de trabalho, se os trabalhadores têm o treinamento para serem eficazes em suas novas funções, se o pagamento cresce proporcionalmente com suas responsabilidades adicionais, se os trabalhos são
seguros, e assim por diante. Além disso, os resultados para os trabalhadores podem ser mistos. Existe geralmente uma complementaridade entre as práticas adotadas pelas empresas, no sentido econômico do termo. Ou seja, duas práticas são complementares quando fazer mais de uma delas reduz o custo ou aumenta o retorno para fazer mais da outra. A existência dessa complementaridade implica que as empresas deveriam implementar limites nas práticas de trabalho simultaneamente. Pode ocorrer também que algumas dessas práticas tenham efeitos contraditórios nos resultados, como estresse ou satisfação no trabalho, que são importantes para os trabalhadores (APPELBAUM, 2002).
Appelbaum (2002) entende que o potencial de efeitos contraditórios nos trabalhadores ocorre por duas fontes. Primeiro, os sistemas de trabalho de alta performance são adotados hoje para atender as necessidades gerenciais sem muita preocupação com as necessidades dos trabalhadores. Portanto, é possível que as necessidades dos trabalhadores não estejam sendo atendidas. Além disso, na visão de alguns observadores, os efeitos dos sistemas de trabalho de alta performance nos trabalhadores são, na verdade, perniciosos – uma forma de manipular os trabalhadores a colaborar com a intensificação do trabalho e aceitar um aumento no estresse. Segundo, a tendência das empresas de introduzir práticas complementares sem especificar a relação nos efeitos das mesmas para os trabalhadores pode fazer com que tenham efeitos contraditórios nos trabalhadores.
As Práticas de Trabalho Relacionadas à Alta Performance
Xxxxx (2004) destaca que, na última década, um número crescente de empresas mudaram de organização do trabalho para os chamados sistemas de trabalho de alta performance. Estes sistemas são caracterizados por estruturas de hierarquia plana, rotação de tarefas, equipes auto-responsáveis, multi-tarefas, um maior envolvimento dos empregados de nível inferior na tomada de decisões, a substituição de canais de comunicação vertical por horizontal e práticas de gestão de recursos humanos complementares que dão aos funcionários os incentivos adequados para participar da tomada de decisão através do uso de sistemas alternativos de pagamento e o aumento de treinamento oferecido pelo empregador.
Para Xxxxxxxxx (2002) os sistemas de trabalho de alta performance são caracterizados por três componentes: (1) uma organização do trabalho que fornece ao trabalhador a oportunidade de participar das decisões; (2) práticas de recursos humanos que aumentam as habilidades da força de trabalho e (3) criam incentivos aos trabalhadores para que participem efetivamente. As empresas adotam essas práticas de trabalho para melhorar o desempenho operacional no local de trabalho. Ao contrário das tentativas do passado de humanizar o trabalho ou melhorar a qualidade de vida do trabalhador, essas práticas não foram criadas com o objetivo de aumentar o controle do trabalhador, a autonomia ou a satisfação com o trabalho.
De acordo com Xxxxxx (2004) o paradigma de alta performance tem sido promovido como as "melhores práticas" para os empregadores, alegando que as práticas associadas a ele rendem níveis de desempenho superiores aos associados a locais de trabalho mais tradicionais. Segundo os defensores, essas práticas funcionam em grande parte pela ativação e motivação dos trabalhadores a desenvolver, compartilhar e aplicar seus conhecimentos e habilidades mais plenamente do que as práticas tradicionais, com implicações positivas para a qualidade do trabalho, bem como para o desempenho.
Sobre o tema, Xxxxxxx (1995) explica que um corpo crescente de trabalho contém o argumento de que o uso de práticas de alta performance podem melhorar os conhecimentos, competências e habilidades dos funcionários de uma empresa, aumentar a sua motivação, reduzir 'fugas' das atividades e aumentar a retenção de funcionários de qualidade, incentivando os trabalhadores com baixo desempenho a deixarem a empresa.
Segundo Xxxxxx (2004), o paradigma de alta performance pode ser definido de acordo com duas práticas: práticas de trabalho alternativas e práticas de trabalho de alto comprometimento. As práticas de trabalho alternativas incluem: (1) práticas de trabalho alternativas em sua concepção, incluindo trabalho em equipe (autônomo ou não-autônomos), enriquecimento do trabalho, rotação de trabalho e reformas relacionadas; e (2) práticas formais de participação, incluindo círculos de qualidade ou grupos de resolução de problemas, salas de reunião, reuniões de equipe e comitês conjuntos. Destas práticas, trabalho em equipe e círculos de qualidade podem ser considerados como os centrais para o paradigma de alta performance. Sobre os princípios centrais do envolvimento e
participação dos funcionários, Xxxxxx (2008) entende que, em termos de práticas concretas, estas podem incluir, além da já mencionada adoção de círculos de qualidade, a utilização de sistema de trabalho que permitam aos colaboradores altos níveis de participação na tarefa. Em geral, eles podem incluir práticas que envolvam os funcionários nos processos decisórios através, por exemplo, do aumento do compartilhamento de informações, canais de comunicação mais eficientes e melhores oportunidades para os funcionários fornecerem suas opiniões.
As práticas de trabalho de alto comprometimento identificadas incluem:
(1) seleção e treinamento sofisticados, enfatizando valores e habilidades de relações humanas, assim como habilidades de conhecimento; (2) comportamento baseado em critérios de avaliação e promoção; (3) políticas de estado únicas (4) sistemas de remuneração contingentes, especialmente pagando pelo conhecimento, bônus de grupo e participação nos lucros; (5) segurança no trabalho; (6) salários e benefícios acima do mercado; (7) sistema de reclamações, e outros. Embora as quatro primeiras categorias possam ser em grande parte específicas do paradigma de alta performance, as restantes em grande parte representam práticas tradicionais (GODARD, 2004).
Para Macky e Boxall (2007) essas práticas também podem ajudar na retenção dos funcionários através da construção do compromisso com suas organizações empregadoras, mantendo o capital humano e melhorando a produtividade através da redução da rotatividade disfuncional. Outros exemplos dessas práticas de alto comprometimento incluem a utilização de recrutamento interno, promoções baseadas na meritocracia, proporcionar a progressão da carreira, desenvolver oportunidades para o trabalhador e oferecer segurança do trabalho.
Xxxxxx (2008) entende que não há um consenso definitivo sobre quais práticas constituem os sistemas de trabalho de alta performance. No entanto, as práticas identificadas por Xxxxxxx (1995) muitas vezes são incluídas (e diretamente citadas) em listas fornecidas por muitos autores subsequentes. Estas práticas são: procedimentos abrangentes de recrutamento e seleção de empregados, sistemas de gestão de incentivo e compensação atrelados ao desempenho, envolvimento extensivo do empregado e treinamento.
Segundo Xxxxxx (2004) existem poucos motivos para duvidar que as práticas de alta performance sejam altamente eficazes em alguns trabalhos, e a adoção de pelo menos algumas delas podem provavelmente contribuir para o desempenho. No entanto, também é provável que os proponentes não só superestimem os efeitos positivos de altos níveis de adoção dessas práticas, mas também subestimem os custos – custos que muitas vezes não são refletidos nas medidas de desempenho utilizadas pelos pesquisadores. Ainda que a adoção de altos níveis de práticas de alta performance possam produzir ganhos, estes podem ser compensados pelos custos em um grande número de locais de trabalho. Como resultado, para muitos empregadores, a adoção completa do paradigma de alta performance geralmente produzem pouca ou nenhuma vantagem com relação às práticas tradicionais de pessoal. A adoção completa pode até mesmo trazer efeitos negativos para o desempenho de alguns ou muitos empregadores.
Xxxxxx e Xxxxxxx (1998) destacam que termos atuais como capital intelectual, conhecimento do trabalho e dos trabalhadores e sistemas de trabalho de alta performance refletem um novo interesse nas pessoas como uma fonte de vantagem competitiva, ao invés de um custo que deve ser minimizado. Por extensão, os ativos intelectuais e de sistemas organizacionais que os atraem, desenvolvem e retêm, estão surgindo como elementos significativos na tomada de decisão estratégica. Esta evolução no papel de recursos humanos segue diretamente as demandas dos mercados de produtos de mudança rápida e o correspondente declínio de comando e controle das estruturas organizacionais. Uma força de trabalho qualificada e motivada que oferece a velocidade e a flexibilidade exigidas por novos imperativos do mercado aumentou a importância estratégica das questões de gestão de recursos humanos em um tempo em que tradicionais fontes de vantagem competitiva (qualidade, tecnologia, economias de escala, etc.) estão mais fáceis de serem copiadas. Com efeito, enquanto os mercados de outras fontes de vantagem competitiva se tornam mais eficientes, as sutilezas que cercam o desenvolvimento de uma força de trabalho de alta performance continuam a ser uma importante oportunidade não realizada para muitas organizações.
Xxxxxx et al. (2004) afirmam que embora haja uma crescente literatura sociológica avaliando o impacto da reforma organizacional nas experiências diárias de trabalho dos colaboradores, apenas recentemente os pesquisadores
voltaram sua atenção para a área mais objetiva de remuneração. O princípio central da teoria do capital humano, por exemplo, é que os trabalhadores com qualificações mais elevadas devem receber uma compensação maior. Se um resultado da gestão de alta performance é a maior discrição do trabalho, a resultante polivalência exige que os funcionários possuam uma ampla gama de competências que permitam salários maiores. Da mesma forma, a eficiência do argumento de salário sugere que os salários mais altos serão concomitantes à introdução da gestão de alta performance, como seria de se esperar prêmios salariais a serem introduzidos como uma forma de compensar o maior volume de negócios, recrutamento e treinamento. Por outro lado, é possível desenvolver um argumento coerente de que a introdução da gestão de alta performance está associada a um impacto negativo ou neutro nos níveis salariais. Sob as diferenças salariais de compensação, os funcionários aceitam pagamento reduzido em troca de maiores recompensas intrínsecas oferecidas pela gestão de alta performance. Da mesma forma, os impactos da alta performance sobre os salários podem ser neutros se aumentos de produtividade são compensados pelo aumento dos custos, por exemplo, aqueles relativos ao desenvolvimento pessoal e técnicas de recursos humanos mais sofisticadas.
Appelbaum (2002) entende que práticas de pessoal e procedimentos de recrutamento de seleção mais rigorosos podem permitir que uma empresa obtenha funcionários com os conhecimentos e habilidades apropriados para funcionar efetivamente em um sistema de trabalho de alta performance. Espera-se que a seleção de pessoal leve a uma força de trabalho mais educada ou mais competente. Também é provável que o treinamento exerça um papel importante em um sistema de trabalho de alta performance. As empresas podem melhorar as habilidades da força de trabalho aumentando a quantidade de treinamentos formais ou treinamentos estruturais das habilidades técnicas, habilidades para resolver problemas e equipes de construção de habilidades.
Appelbaum (2002) destaca que recrutamento, seleção e treinamento são geralmente práticas complementares, já que o treinamento adicional é menos oneroso e mais eficaz quando os funcionários já estão bem preparados. Tipicamente, empresas de alta performance são mais seletivas na contratação e fornecem mais treinamento para os funcionários. Treinamento e seleção podem ser substitutos, no entanto, se um empregador está disposto a pagar salários altos o
suficiente para recrutar trabalhadores com as habilidades requeridas ou para atrair funcionários experientes de outras empresas.
Para Xxxxxxxxx (2002) o propósito da reforma do trabalho e participação é eliciar o esforço dos trabalhadores que não podem ser facilmente monitorados. Como uma organização pode fornecer incentivos para motivar os funcionários a usarem sua imaginação, criatividade, entusiasmo e conhecimento íntimo de seus trabalhos em particular para benefício da mesma? As empresas podem fornecer três tipos principais de incentivos para encorajar os trabalhadores a despender um esforço discricionário – financeiro ou recompensas extrínsecas, recompensas intrínsecas e uma segurança de longo prazo na empresa.
Appelbaum (2002) entende que incentivos são geralmente interpretados como práticas de pagamento adotadas pelos gerentes para alinhar os interesses dos trabalhadores com os da empresa. Em um sistema de trabalho de alta performance, isso é geralmente procurado através do pagamento contingente do grupo de trabalho ou da performance da empresa. De fato, ao longo das últimas décadas, as empresas vêm tentando uma variedade de estratégias, como participação nos lucros, pagamento por mérito e outras políticas de compensação que de uma forma ou de outra dão aos trabalhadores uma segurança financeira no sucesso da empresa. O problema com esses esquemas é que eles estão sujeitos a externalidades – alguns trabalhadores não têm incentivos para mudar seus comportamentos se suas contribuições individuais não têm nenhum efeito discernível nos lucros globais. Isto mina os efeitos motivacionais desses esquemas de pagamento. Além disso, os lucros dependem de uma série de fatores além da produtividade e do esforço dos trabalhadores. Empresas com uma produtividade exemplar podem fracassar se elas não vendem a produção, e trabalhadores dedicados e que trabalham muito não serão produtivos se eles trabalham com equipamentos antiquados.
Appelbaum (2002) destaca que os incentivos em sistemas de trabalho de alta performance não são necessariamente limitados a recompensas financeiras. Além disso, uma busca por recompensas intrínsecas nos trabalhos que são significativos e desafiadores foi o alicerce da maioria dos esforços das reformas de trabalho de 1930 a 1970. A noção de que os trabalhadores seriam mais produtivos se fossem desafiados em seus trabalhos exerceram uma força poderosa nesse campo. Sistemas de trabalho de alta performance geralmente aumentam as
recompensas intrínsecas do trabalho, aumentando também a satisfação e o compromisso do trabalhador.
Os Impactos Positivos da Alta Performance para os Trabalhadores
Pesquisas realizadas sobre trabalhos de alta performance sugerem que os resultados positivos do trabalho podem ser aproveitados através de efeitos cumulativos e sinérgicos entre o reforço dos pacotes de práticas (HUSELID, XXXXXX e XXXXXXX, 1998). Segundo Xxxx e Menezes (2011) os sistemas de trabalho de alta performance são uma invenção chave da gestão moderna e são reivindicados por terem fortes efeitos benéficos sobre o desempenho individual e organizacional.
Xxxxx (2004) destaca que a premissa principal dos sistemas de trabalho de alta performance é que as empresas podem obter maior flexibilidade, maior qualidade do produto e melhor desempenho, enquanto o custo se mantém competitivo, induzindo os trabalhadores a trabalharem mais e usando as habilidades e informações de seus funcionários de forma mais eficaz. Existe ainda a hipótese de que são sistemas “ganha-ganha”, que beneficiam não só os empregadores, mas também seus funcionários, através de salários mais altos e maior satisfação no trabalho. Para Xxxxxx (2004) as práticas de alta performance de fato podem ter implicações positivas para os trabalhadores. Na teoria, elas dão origem tanto a uma qualidade de vida melhor no trabalho, com implicações sociais e psicológicas positivas, salários mais elevados e segurança do trabalho.
Para Xxxxx e Boxall (2007) parece razoável a posição de que sistemas de trabalho de alta performance podem servir para melhorar o desempenho organizacional, melhorando tanto a satisfação com o trabalho quanto o comprometimento organizacional do trabalhador. A consequência é, portanto, um turnover e/ou absenteísmo reduzido, maior flexibilidade da força de trabalho, maiores níveis de retenção de habilidades, desenvolvimento de competências e habilidades de utilização entre a força de trabalho (SPARHAM e SUNG, 2007).
Macky e Boxall (2007) entendem que dadas as relações observadas entre satisfação no trabalho e satisfação do cliente, entre turnover voluntário e não voluntário, entre satisfação e comprometimento e entre a performance individual e
organizacional, os resultados encontrados em seus estudos dão suporte para a noção de que as atitudes dos funcionários desempenham um papel importante na medição do impacto dos sistemas de trabalho de alta performance nos resultados das organizações. As empresas que buscam maior satisfação e compromisso em seu contexto particular devem, portanto, enxergar como um benefício para os negócios a adoção de práticas de trabalho de alta performance.
Wood e Menezes (2011) destacam que os sistemas de trabalho de alta performance são geralmente associados com os empregadores fornecendo (a) oportunidades para o envolvimento e participação dos empregados; (b) treinamento e desenvolvimento intensivos e (c) incentivos. Especialistas de recursos humanos geralmente defendem uma abordagem integrada, na qual a tríade de alto envolvimento, desenvolvimento das habilidades, e os incentivos são usados em concerto. Consequentemente, na maioria dos estudos que testam os efeitos do desempenho nos sistemas de trabalho de alta performance, práticas associadas a cada elemento dessa tríade são tratadas em conjunto como se eles formassem uma unidade, geralmente com pouca investigação se elas coexistem ou não. É, no entanto, claro que esses três elementos serão adotados em conjunto em uma escala generalizada.
Para Xxxxxx (2008) existem duas posições concorrentes relativas à ligação entre a adoção de práticas de trabalho de alta performance e os resultados de desempenho. A primeira envolve, em certos aspectos, uma continuação da tese pós-fordista. A ideia central é que, através da centralização da gestão e da organização do trabalho em torno de funcionários altamente qualificados, engajados, envolvidos e habilitados, é possível desenvolver uma situação "ganha- ganha" para os empregadores e empregados, em que o maior desempenho é alcançado principalmente através do desenvolvimento de uma força de trabalho mais motivada (Macky e Boxall, 2007). Tais ganhos mútuos são possíveis porque, de um lado, os funcionários se beneficiam com maior entrada em seu trabalho, tanto em termos de terem um maior arbítrio nas tarefas e mais voz, desfrutando de trabalhos mais variados e significativos, sentindo-se valorizados por terem oportunidades para expressar suas opiniões, quanto por meio de investimentos de desenvolvimento feito pelos empregadores. Por outro lado, os empregadores se beneficiam por terem funcionários mais motivados, comprometidos e leais, que usam a iniciativa sem necessariamente precisarem de instruções; que inovam em
relação ao seu próprio trabalho e aos processos produtivos mais amplos; que têm o poder de agir, e que querem agir; que se envolvem mais com a qualidade do seu trabalho e dos outros (Xxxxxxxxx et al., 2000); que estão menos propensos a deixar a empresa, menos inclinado a se abster das tarefas, ou a faltar ao trabalho (Huselid 1995), e assim por diante.
Xxxx e Xxxxxxx (2011) acreditam que os trabalhadores cujos gestores são receptivos à voz dos mesmos conseguem níveis maiores de bem-estar da força de trabalho. A voz afeta largamente o bem-estar através da sua oferta de salários mais elevados, melhor projeto de trabalho e a melhoria das condições insatisfatórias. No entanto, se estes itens são incluídos na análise, a voz do empregado pode não ter um impacto forte e independente sobre o bem-estar. Mas, a voz pode aumentar a justiça processual, e a sensação nos colaboradores de que suas reclamações estão sendo ouvidas e que suas opiniões são valorizadas. Aliada a voz do empregado, uma gestão que é percebida como sendo informativa, particularmente sobre a mudança, pode contribuir para a satisfação no trabalho e o bem-estar através da melhora no sentido de valor, daquilo que vale a pena e da segurança dos indivíduos.
No entanto, Xxxxxx (2008) destaca que, de acordo com esta posição, em conjunto com estes ganhos mútuos vêm certos custos correspondentes de cada lado: o empregador deve ceder certos controles aos empregados; deve arcar com os altos custos financeiros para a formação e desenvolvimento, reestruturação do trabalho, etc., e irá tornar-se mais dependente em função de uma equipe mais difícil de ser substituída. Da mesma forma, os funcionários devem aceitar maiores níveis de responsabilidade; exercer maior esforço discricionário e devem se identificar mais facilmente com as metas de desempenho da organização.
Xxxx e Xxxxxxx (2011) atentam para o fato de que estudos recentes sobre sistemas de trabalho de alta performance e bem-estar têm utilizado uma medida global que abrange vários elementos, que focam explicitamente em gestão de alto envolvimento. A ênfase tem sido em como os sistemas de trabalho de alta performance aumentam a satisfação no trabalho através da melhora de aspectos geralmente associados aos trabalhos qualificados, como autonomia, utilização das habilidades e desenvolvimento. Para os autores, as várias dimensões de envolvimento podem estar relacionadas com o bem-estar de forma diferente e até
o impacto dos trabalhos qualificados não podem ser confinados ao aumento da autonomia ou das demandas.
Para Xxxx e Menezes (2011) os trabalhos qualificados podem ter um efeito positivo no bem-estar, pois aumentam a autonomia pessoal; igualmente, a falta de critério e variedade limitada terá efeitos negativos. Trabalhos qualificados também podem aumentar as oportunidades para utilização das habilidades e desenvolvimento, variedade do trabalho e a sensação de ser valorizado ou desempenhar um papel importante na organização ou sociedade, aumentando assim o impacto potencial sobre o bem-estar.
Para entender a relação entre a gestão de alto envolvimento e o bem-estar, Xxxx e Menezes (2011) destacam alguns pontos, como por exemplo: (1) o compartilhamento de informações e um melhor entendimento por parte dos trabalhadores dos objetivos da empresa e o seu papel para atingi-los podem tornar
o envolvimento dos mesmos menos incerto; (2) na medida em que a gestão de alto envolvimento gera resultados bem sucedidos ou as percepções de uma organização de sucesso adaptativo, os trabalhadores podem perceber os seus empregos como sendo mais seguros ou boas perspectivas de carreira; (3) a aquisição das competências e informações que a gestão de alto envolvimento acarretam podem aumentar a satisfação e contentamento através do seu impacto sobre a variedade individual de trabalho, auto-estima e da capacidade de aprender e de ser proativo; (4) o convite para ser mais envolvido com a organização, implícito na gestão de alto envolvimento, pode sinalizar para o empregado que eles são respeitados e que a sua contribuição é valorizada. Além disso, estar diretamente envolvido e informado sobre os objetivos da organização e seu progresso em direção a eles também podem aumentar o significado do trabalho e da participação organizacional. Os indivíduos tendem a ver seu trabalho menos como simplesmente um trabalho e mais como uma carreira e há evidências de que pessoas para quem o trabalho é uma carreira ou vocação estão mais satisfeitas.
Em geral, esses efeitos podem aumentar o orgulho dos trabalhadores com seu trabalho e a contribuição para o sucesso da sua organização, reforçando sentimentos de contentamento e entusiasmo. Os indivíduos também podem usar as oportunidades para a criatividade e para reduzir a irritação, problemas, ou estresse, que fazem com que seu trabalho seja mais difícil de executar (WOOD e MENEZES, 2011).
Xxxx e Xxxxxxx (2011) argumentam que suportes motivacionais também podem ter efeitos independentes, especialmente quando os incentivos são de toda a organização, pois eles podem aumentar o sentimento de ser valorizado, de estar seguro e apoiado. Além disso, se os suportes motivacionais são aplicados de forma consistente, eles podem adicionar uma percepção de igualdade, portanto, potencialmente aumento da coesão social e da justiça distributiva e processual. Para os autores, garantias de segurança de trabalho são suscetíveis de ter um impacto positivo no bem-estar porque a segurança pessoal é valorizada pela maioria das pessoas.
Apesar do exposto até o momento, conforme abordado por Xxxxx (2004), estudos teóricos e empíricos em ergonomia, psicologia, sociologia e medicina do trabalho sugerem que diversas características dos sistemas de trabalho de alta performance podem ter efeitos prejudiciais sobre os trabalhadores, aumentando os problemas de saúde relacionados com o trabalho e os riscos dos perigos ocupacionais. Para Xxxxxx (2004), ainda que muitos estudos relatem implicações sociais e psicológicas positivas, muitos também estabelecem que as práticas de alta performance, particularmente práticas de trabalho alternativas, estão associadas a altos níveis de intensificação de trabalho e estresse.
Os Impactos Negativos da Alta Performance para os Trabalhadores
Para entender melhor como os sistemas de trabalho de alta performance podem impactar na realidade atual das organizações é necessário definir os conceitos de trabalho, intensificação do trabalho e como estes fenômenos influenciam a forma como o mesmo é realizado. Segundo Dal Rosso (2008) quando um projeto mental se atualiza na prática, os sujeitos que o realizam gastam um volume variável de suas energias físicas ou psíquicas. A ideia de que todo o ato de trabalho envolve gasto de energia e, portanto, exige esforço do trabalhador, está na raiz da noção de intensidade. O trabalhador pode gastar mais ou menos de suas energias, mas sempre gasta alguma coisa. A intensidade do trabalho tem a ver com a maneira como é realizado o ato de trabalhar. Esse é o primeiro elemento a destacar sobre a intensidade: ela se refere ao grau de dispêndio de energias realizado pelos trabalhadores na atividade concreta. Sobre o tema, Green
(2001) define esforço de trabalho como a taxa de entrada física e/ou mental para realizar tarefas durante um dia de trabalho. As unidades do esforço de trabalho dependem de taxas específicas, mas até a medição dos esforços físicos (separadamente dos resultados) não podem ser feitas a não ser em circunstâncias restritas; esforços mentais são ainda mais difíceis de serem mensurados. Em parte, o esforço é inversamente ligado a 'porosidade' do dia de trabalho, significando os gaps entre as tarefas durante as quais o corpo ou a mente repousam.
Para Dal Rosso (2008), sempre que falamos em intensidade do trabalho, partimos da análise de quem trabalha, isto é, do trabalhador. Dele é exigido algo a mais, um empenho maior, seja física, intelectual, psiquicamente ou alguma combinação desses três elementos. A atenção está centrada sobre quem trabalha para examinar qual o dispêndio qualitativo ou quantitativo de energias. Xxxxxxx-se o processo de trabalho, considerando em suas dimensões físicas, intelectuais e psíquicas. A intensidade tem a ver tão-somente com o sujeito do trabalho, com o trabalhador individualizado ou com o coletivo dos trabalhadores. O autor chama de intensificação os processos de quaisquer naturezas que resultam em um maior dispêndio das capacidades físicas, cognitivas e emotivas do trabalhador com o objetivo de elevar quantitativamente ou melhorar qualitativamente os resultados.
Estudos recentes têm atribuído a intensificação do trabalho tanto ao aumento da pressão competitiva que acaba sendo repassada para os trabalhadores (Xxxxxxxx et al., 1999), quanto ao crescente poder dos chefes em relação ao declínio dos sindicatos. De acordo com Xxxxx (2000), a intensificação do esforço pode vir do lado da oferta, com os trabalhadores optando por trabalhar mais conforme aumenta sua necessidade por uma renda maior, ou conforme o aumento da satisfação com o trabalho.
Xxxxx (2000) entende que uma explicação importante para a intensificação do trabalho reside no desenvolvimento do lado da demanda do mercado de trabalho. Por um lado ocorreram desenvolvimentos difundidos nas estratégias de gestão que afetaram a forma como o trabalho é organizado. Por outro, o surgimento de novas tecnologias de informação revolucionou o controle do fluxo de trabalho. Mudanças complementares em políticas de recursos humanos e habilidades da força de trabalho têm reforçado o impacto da mudança organizacional e técnica.
Green (2000) propõe possíveis explanações para o fenômeno da intensificação do trabalho e chama de multi-qualificação uma das inovações das empresas, desencadeada, a seu ver, por mudanças nas políticas de comunicação interna das empresas e pelo declínio do movimento sindical, entre outros fatores, como as técnicas de mudança de gerenciamento e tecnológicas. Com o objetivo de desenvolver as múltiplas habilidades requeridas da força de trabalho para desempenhar um número maior de cargos são utilizadas ferramentas como treinamentos generalistas e programas de rotações de cargo. De fato, as organizações vêm buscando capacitar a mobilidade para permitir que seus funcionários assumam as atividades que forem mais necessárias em cada momento. A multi-qualificação e o maior conhecimento acerca das operações globais da empresa estão associados a uma força de trabalho com mais educação. O maior nível de motivação e a presença de atitudes favoráveis para com a empresa estão também associados à maior qualificação. A noção de qualificação pode ser interpretada como conceito que engloba atributos pessoais e atitudes como entusiasmo.
Xxxxx (2001) destaca o fato de que muitas vezes o termo intensidade do trabalho é confundido com o conceito de performance – ou com eficiência, ou ainda habilidade. Portanto, fornece uma explicação importante sobre essa relação. Performance constitui-se da extensão em que um indivíduo realiza tarefas contratuais (é o sinônimo de produção individual). A performance de um indivíduo é afetada tanto pela habilidade quanto pela intensidade do trabalho, com algum escopo para o trade-off entre as duas. A performance é eficiente se ela não pode ser melhorada sem que se aumente a intensidade, a habilidade ou as duas. Da mesma forma, a performance é ineficiente se ela pode ser aumentada sem que se trabalhe mais ou com maiores habilidades – por exemplo, através do ordenamento diferente de tarefas de trabalho. No entanto, um aumento na performance que é provocado pelo aumento da intensidade do trabalho não necessariamente representa um aumento na eficiência; pelo contrário, é simplesmente uma questão de levantar uma entrada para aumentar a saída. Estendendo a análise para além do indivíduo, a performance de cada trabalhador está relacionada com os resultados da empresa, mas essa relação é mediada pela eficiência organizacional. Assim, a organização é ineficiente se os seus resultados podem ser aumentados sem um aumento na performance de cada trabalhador. Em suma, o resultado de uma
empresa pode ser aumentado tanto por melhorias na eficiência organizacional, ou pelo aumento da performance de alguns ou todos os trabalhadores.
Dal Rosso (2008) entende que uma das maneiras de intensificar o trabalho consiste em alongar a jornada. Quando os trabalhadores são conduzidos a trabalhar por mais tempo, acumulam-se tarefas sobre os seus ombros, exigindo mais esforço. Acúmulo de tarefas e outros mecanismos, tais como o domínio de tecnologias recentes que aumentam os ritmos ou exigem atividades suplementares, implicam em intensificação do trabalho.
Para o autor, outro indicador usado para levantar o processo de intensificação do trabalho é representado pelo acúmulo em uma mesma pessoa de atividades que antes eram exercidas por mais pessoas. O processo interno de redistribuição de tarefas e cargas de trabalho realizado anteriormente por mais pessoas recaindo sobre os ombros de uma mesma pessoa é um indicador inequívoco de intensificação das condições de serviço, por requerer que o trabalhador desempenhe mais tarefas nos mesmos horários de trabalho. Tal mecanismo pode ser implementado em diversas circunstâncias, seja quando o montante global das tarefas aumenta sem o aumento do número de empregados, seja quando o número de empregados foi reduzido por políticas de contenção de gastos, seja ainda quando ocorre a saída de pessoal ou por morte ou por aposentadoria e não ocorre sua reposição.
Por fim, Dal Rosso (2008) diz que a cobrança de resultados pode ser entendida como forma de intensificação num sentido mais subjetivo. Cobrar resultados é expressão corrente na administração das empresas e dos serviços públicos. Cobrar resultados impõe uma pressão interior ou exterior sobre o trabalhador. Aparece, assim, igualmente como meio ou forma de intensificação e não apenas como fim ou objetivo almejado. Xxxxx (2001) também escreve sobre o aumento da pressão sobre o trabalhador e acredita que a sensação de aumento na pressão do trabalho em horas limitadas no dia pode ser suportada não por um aumento na quantidade de horas trabalhadas, mas pelas mudanças na distribuição dessas horas. Enquanto existe uma maior proporção de homens e mulheres que vêm trabalhando por mais horas, existe, paralelamente, uma proporção crescente de pessoas que vêm trabalhando menos horas.
Dal Rosso (2008) afirma que os impactos do trabalho sobre a saúde e as relações entre ambos sempre foram temas privilegiados da pesquisa científica na
medicina, na psicologia, na ergonomia, na sociologia e em outros tantos campos do conhecimento, que, de uma forma ou de outra, lidam com esses problemas. O autor explica que a civilização industrial produziu e continua a causar determinados tipos de acidentes, doenças e problemas nos corpos e nas mentes daqueles que realizam o trabalho. Por prevalecer na sociedade industrial o trabalho material, as condições de saúde, de adoecimento e de outros problemas sociais carregam as marcas próprias das determinações que as geram, isto é, da materialidade do fazer. Duas condições contemporâneas alteram esse padrão industrial da relação trabalho-saúde: a primeira é o deslocamento da maioria da força de trabalho empregada das condições de inserção em atividades industriais para atividades subsidiárias à indústria ou para fazeres inteiramente de serviços ou imateriais. A segunda condição é a onda de intensificação do labor, em quaisquer condições que ele se realize, sejam atividades agropecuárias ou de exploração mineral, sejam atividades industriais ou de serviços. Quaisquer que sejam as condições de sua realização, o trabalho está sendo transformado pela exigência de mais resultados materiais ou imateriais, o que implica que o agente deva empenhar mais suas energias físicas, mentais ou sociais na obtenção de mais resultados, de mais elevados objetivos, em suma, de mais trabalho. Não acontece necessariamente um alongamento da jornada. O trabalho em si começa a ficar mais denso, mais intenso, mais produtivo, aumenta a geração de mais trabalho e de valores.
O tempo excessivo no trabalho é normalmente ligado ao estresse e burnout. Estimativas atuais sobre os custos organizacionais de estresse do empregado incluem seguro de saúde, absenteísmo e substituição de custos que chegam a valores tão altos quanto 180 bilhões de dólares por ano (Xxxxxx e Smye, 1996). Embora existam muitas empresas mantendo o que têm sido chamado de políticas abusivas em suas expectativas para o tempo e energia do empregado, outras optam por investir em benefícios para compensar o potencial de despesas relacionadas ao estresse. No entanto, Xxxxxx (2001) destaca que as políticas mais recentes estão sob suspeita, pois não se sabe se elas estão contribuindo para a qualidade de vida dos funcionários ou simplesmente abrindo o caminho para que dediquem ainda mais tempo para o trabalho. Embora pareça razoável pedir que os empregadores não pressionem as pessoas a trabalharem mais do que o padrão
definido, é possível pedir-lhes para determinar um equilíbrio entre trabalho e não trabalho para cada funcionário?
Hulst e Xxxxxxx (2006) apontam que as consequências negativas para a saúde e para o bem-estar dependem das possibilidades internas que as pessoas têm de se recuperarem durante o dia e após o trabalho. O problema se torna maior se o tempo de recuperação é pequeno, assim como quando a qualidade da recuperação se torna pobre por causa dos efeitos do excesso de trabalho para a vida pessoal, o que ocorre em situações de alta demanda. Existem algumas características psicológicas do trabalho que podem moderar o efeito entre ele e o bem-estar das pessoas. Segundo esta premissa, duas características psicossociais do trabalho são determinantes para a saúde e o bem-estar: o primeiro determinante foi chamado pelos autores de demandas do trabalho e significa o ritmo, a quantidade e a complexidade do trabalho. O segundo determinante seria o controle, que representa a autonomia decisória de cada funcionário e a quantidade de habilidades utilizadas.
De acordo com Xxxxxx, Repetti e Seeman (1997), os trabalhadores que se sentem obrigados a trabalhar por muito tempo e com muitas tarefas são mais estressados, têm hábitos de saúde mais pobres e reportam mais queixas de saúde do que os trabalhadores que não sofrem sobrecarga. Para as organizações, a sobrecarga de trabalho traz um impacto negativo sobre o comprometimento com o trabalho entre os gestores do setor público (Xxxxxxx, Xxxxx e Trice, 1978), sobre a satisfação no trabalho (Xxxxxxx e Xxxxxxx, 2000), e sobre as percepções dos funcionários de uma cultura de inovação organizacional. Sobrecarga de trabalho tem um efeito positivo significativo no turnover voluntário (Xxxxxxx et al., 1994).
Dal Rosso (2008) explica que a elevação da carga de trabalho que é observada nos dias de hoje e que se expande como uma onda com características diferenciadas por ramos de atividade produz efeitos sobre os corpos dos trabalhadores. Seja por meio da explosão tecnológica da informática, seja por meio da reorganização social, o trabalho é transformado, redesenhado, precarizado, intensificado. Das especificidades próprias do trabalho contemporâneo parece resultar um conjunto de problemas de saúde de natureza diversa. Em decorrência das crescentes exigências emocionais e mentais do trabalho supõe-se que seria possível encontrar sinais de um volume maior de problemas dessa ordem sobre a saúde dos empregados, a despeito do fato de o
trabalho material continuar produzindo seus efeitos sobre os corpos em termos de acidentes, lesões físicas e doenças permanentes.
3
Metodologia
Para a realização deste estudo optou-se pela pesquisa qualitativa. Segundo Xxxxxxxx (2010) a investigação qualitativa emprega diferentes concepções filosóficas; estratégias de investigação; métodos de coleta, análise e interpretação dos dados. Creswell (2010) destaca algumas características importantes da pesquisa qualitativa, a saber:
• Ambiente natural – os dados tendem a ser coletados no campo e no local em que os participantes vivenciam a questão ou problema que está sendo estudado. Os pesquisadores têm interações face a face no decorrer do tempo.
• Pesquisador como um instrumento fundamental – coletam pessoalmente os dados por meio de exame de documentos, de observação do comportamento ou de entrevistas com os participantes. Não tendem a usar ou a se basear em questionários ou instrumentos de outros pesquisadores.
• Múltiplas fontes de dados – os pesquisadores coletam múltiplas formas de dados, como entrevistas, observações e documentos, em vez de confiarem em uma única fonte.
• Análise de dados indutiva – pesquisadores criam seus próprios padrões, categorias e temas de baixo para cima, organizando os dados em unidades de informação cada vez mais abstratas.
• Significados dos participantes – foco na aprendizagem do significado que os participantes dão ao problema ou questão.
• Projeto emergente – o plano inicial para a pesquisa não pode ser rigidamente prescrito e todas as fases do processo podem mudar ou se deslocar depois que o pesquisador entrar no campo e começar a coletar dados.
• Lente teórica – os pesquisadores usam lentes para enxergar seus estudos. Às vezes o estudo pode ser organizado em torno da identificação do contexto social, político ou histórico do problema estudado.
• Interpretativo – os pesquisadores fazem uma interpretação do que enxergam, ouvem e entendem, que não pode ser separada de suas origens, história, contextos e entendimentos anteriores.
• Relato holístico – os pesquisadores tentam desenvolver um quadro complexo do problema ou questão estudada. Isso envolve o relato de múltiplas perspectivas, a identificação dos muitos fatores envolvidos em uma situação e, em geral, o esboço do quadro mais amplo que emerge.
Flick (2009) destaca que a questão do acesso ao campo em estudo é mais crucial na pesquisa qualitativa, em que o contato buscado pelos pesquisadores é o mais próximo ou mais intenso. Por exemplo, a realização de entrevistas abertas exige um maior envolvimento entre o entrevistado e o pesquisador do que aquele necessário na simples entrega de um questionário. Na gravação de conversas cotidianas, espera-se dos participantes certo grau de revelação de suas próprias vidas que eles não consigam controlar antecipadamente.
Ainda segundo Flick (2009), na pesquisa qualitativa, o pesquisador e seu entrevistado têm uma importância peculiar. Pesquisadores e entrevistados, bem como suas competências comunicativas, constituem o principal “instrumento” de coleta de dados e de reconhecimento. Por este motivo, pesquisadores não podem adotar um papel neutro no campo e em seus contatos com as pessoas a serem entrevistadas ou observadas.
O objetivo desta dissertação é entender as bases do contrato psicológico estabelecidas entre trabalhadores e empresas de alta performance. A escolha da pesquisa qualitativa se deu justamente pela natureza subjetiva do trabalho, já que busca-se compreender quais as motivações e expectativas dos funcionários que vivenciam a realidade de alta performance. Sobre esse tema, Flick (2009) destaca que a pesquisa qualitativa não se baseia em um conceito teórico e metodológico unificado. Diversas abordagens teóricas e seus métodos caracterizam as discussões e a prática da pesquisa. Os pontos de vista subjetivos constituem um primeiro ponto de partida.
Segundo Xxxxxxxx (2010), a pesquisa qualitativa pressupõe a seleção intencional dos participantes ou dos locais que melhor ajudarão o pesquisador a entender o problema e a questão de pesquisa. Isso não sugere, portanto, uma amostragem ou seleção aleatória de um grande número de participantes e locais, como ocorre tipicamente na pesquisa quantitativa.
Por este motivo, antes de iniciar as entrevistas, a pesquisadora identificou uma série de participantes com o perfil desejado pela pesquisa, ou seja, profissionais que estavam inseridos na realidade de trabalho de alta performance. Através do envio de um e-mail explicando o objetivo da realização das entrevistas e destacando que as mesmas deveriam ser presenciais e gravadas, os possíveis participantes sinalizaram sua disponibilidade. Os sujeitos entrevistados foram identificados a partir da rede de relacionamentos da pesquisadora e de indicações de pessoas que trabalhavam em organizações que possuem valores e práticas relacionados à alta performance e ao trabalho excessivo. Foram selecionados 12 participantes de acordo com os seguintes critérios: experiência de trabalho em empresas privadas, formação universitária obrigatoriamente requerida, modelo de gestão da organização na qual trabalham fortemente pautado em valores e práticas de alta performance, e, por fim, indivíduos cuja carga horária superasse as oito horas estabelecidas pelo contrato formal (sem que isso tenha sido imposto formalmente).
Uma das dificuldades enfrentadas foi a necessidade da entrevista ser presencial. Algumas pessoas não puderam participar em função do ritmo de trabalho no momento em que foram abordadas: não encontraram tempo em sua rotina para se dedicar a uma atividade fora do escopo do trabalho. A questão da distância também foi um limitador e algumas pessoas ficaram de fora da pesquisa pela dificuldade de definir um local de encontro acessível a todos. As pessoas que não conseguiram participar das entrevistas indicaram outras com o mesmo perfil e, dessa forma, chegou-se ao número final de 12 participantes.
Os entrevistados eram provenientes de seis empresas diferentes, localizadas no Rio de Janeiro, ocupavam cargos de níveis variados, desde analistas até sócios-gestores e trabalhavam em áreas de atuação diversas como
financeira, telecomunicações, indústria de cosméticos e setor imobiliário. Todos os entrevistados possuíam curso superior, sendo que sete deles também eram pós- graduados (MBA ou Mestrado), e suas idades variavam entre 22 e 34 anos. O tempo em que cada participante trabalha em sua respectiva empresa variou entre três meses e seis anos e a experiência total de trabalho, entre três e 15 anos. O quadro a seguir ilustra o perfil dos entrevistados.
Gênero | Idade | Estado Civil | Filhos | Formação/ Faculdade | Cargo/ Função | Ramo da Empresa | Tempo de Empresa | Experiência de Trabalho | |
1 | M | 34 | Solteiro | Não | ADM PUC-Rio | Gerente de Operações | Telecomu- nicações | 3 meses | 15 anos |
2 | M | 34 | Casado | Sim | Gestão de Negócios UCAM | Analista Sênior | Telecomu- nicações | 2 anos | 13 anos |
3 | M | 22 | Solteiro | Não | Publicidade PUC-Rio | Analista de Marketing | Cosméticos | 2 anos | 3 anos |
4 | F | 28 | Casada | Não | Eng. de Produção PUC-Rio | Relação com Investidores | Financeiro | 4 meses | 8 anos |
5 | M | 28 | Casado | Não | ADM IBMEC | Consultor | Telecomu- nicações | 3 anos | 8 anos |
6 | F | 25 | Solteira | Não | Direito PUC-Rio | Coord. Jurídico | Imobiliário | 3 anos | 6 anos |
7 | M | 32 | Casado | Não | Economia UCAM | Sócio- Gestor | Financeiro | 3 anos | 12 anos |
8 | F | 31 | Casada | Não | Eng. de Produção PUC-Rio | Gerente de Seção | Telecomu- nicações | 6 anos | 13 anos |
9 | F | 31 | Solteira | Não | Publicidade UFRJ | Gerente de Produto | Cosméticos | 1 ano | 12 anos |
10 | F | 24 | Solteira | Não | Economia PUC-Rio | Coord. Novos Negócios | Imobiliário | 4 anos | 4 anos |
11 | F | 28 | Solteira | Não | Eng. de Produção PUC-Rio | Analista de Xxxxx Xxxxxxxx | Financeiro | 1 ano e 2 meses | 8 anos |
12 | F | 28 | Solteira | Não | ADM FGV | Coord. | Financeiro | 3 anos | 5 anos |
Tabela 1 Perfil dos entrevistados
Procedimentos de Coleta e Registro de Dados
Neste estudo o método utilizado para a coleta de dados na pesquisa de campo foi a entrevista. Para Xxx (2007), a entrevista é uma das técnicas mais
usadas na coleta de dados no domínio das ciências sociais, sendo uma forma de interação social em que uma das partes se apresenta como fonte de informação e a outra busca coletar dados. Ainda de acordo com este autor, dada a sua flexibilidade, a entrevista é adotada como técnica fundamental de investigação em diversos campos e parte relevante do desenvolvimento das ciências sociais das últimas décadas se obteve graças a sua aplicação.
Creswell (2010) ressalta que as entrevistas podem ser conduzidas mediante interações face a face com os participantes, contato telefônico ou realização de grupos focais, com seis a oito entrevistados em cada grupo. Essas entrevistas envolvem questões não estruturadas e em geral abertas, que são em pequeno número e se destinam a suscitar concepções e opiniões dos participantes.
Na presente dissertação, todas as entrevistas foram realizadas em encontros pessoais entre a pesquisadora e seus entrevistados, pois se considerou fundamental essa interação. A duração das mesmas variou de 15 a 30 minutos e todas foram gravadas com o consentimento dos entrevistados. Com exceção de dois participantes, que responderam as perguntas em casa, após o trabalho, todos os demais foram entrevistados em seu local de trabalho. Dois deles utilizaram o horário de almoço para responder às perguntas.
Após cada entrevista, a própria pesquisadora realizou sua transcrição, o que permitiu uma primeira leitura mais atenta do seu conteúdo. Foram feitas outras leituras posteriores das entrevistas, com o objetivo de identificar pontos em comum na fala dos participantes e esboçar as categorias que iriam organizar a análise. Assim, foram criadas as duas grandes categorias, definidas a posteriori, que estruturaram a análise dos resultados. Nela, optou-se por não revelar a identidade dos entrevistados nem o nome da empresa em que os mesmos trabalham. Eles foram identificados como E1, E2 etc. e as empresas, quando citadas pelos entrevistados, foram definidas como Empresa X, Y, Z.
Segundo Xxxxx (2009), o uso de equipamentos para gravação torna a documentação de dados independentes das perspectivas – do pesquisador e dos sujeitos em estudo. Argumenta-se que, por meio desse sistema, obtém-se um registro naturalista dos eventos ou um “plano natural”: as entrevistas, a fala cotidiana ou as conversas de aconselhamento são gravadas. Após informar aos participantes sobre a finalidade da gravação, a expectativa do pesquisador é de
que eles simplesmente esqueçam a presença do gravador e que a conversa ocorra naturalmente – mesmo em pontos delicados.
O roteiro da entrevista foi elaborado com a intenção de não influenciar os entrevistados com conotações positivas ou negativas nas perguntas e deixá-los livres, para que suas respostas fossem formuladas de forma espontânea. Os temas das perguntas foram escolhidos seguindo alguns critérios sobre a alta performance para que não deixassem de ser abordados. Estes critérios incluem o número de horas trabalhadas, o ritmo de trabalho na empresa como um todo e o ritmo individual, a opinião pessoal sobre o ritmo de trabalho, o que atraiu o participante para iniciar o trabalho naquela empresa, assim como o que o motiva a continuar trabalhando na mesma, o que ele espera da empresa e como imagina seu futuro no longo prazo. O quadro a seguir apresenta o roteiro que orientou as entrevistas.
1. Como é o ritmo de trabalho na sua empresa? |
2. Quantas horas, em média, você trabalha por dia? |
3. O que você acha desse ritmo? |
4. Você gosta de trabalhar nesse ritmo? |
5. O que te atraiu para trabalhar nessa empresa? |
6. O que te motiva a seguir trabalhando nessa empresa? |
7. O que você espera dessa empresa? |
8. Em que tipo de empresa e posição você se trabalhando daqui a cinco anos? |
Tabela 2 Roteiro da entrevista
Segundo Xxxxxxxx (2010), a pesquisa qualitativa é fundamentalmente interpretativa, ou seja, depende da interpretação dos dados coletados pelo pesquisador. Dessa forma, não é possível evitar as interpretações pessoais na análise de dados qualitativos.
A pesquisa qualitativa também possui limitações quanto à veracidade e precisão das respostas fornecidas pelos entrevistados (inclusive quanto à sua adequação aos critérios de seleção dos mesmos). Isso porque, segundo Flick (2009), as entrevistas proporcionam informações indiretas, filtradas pelos pontos de vista dos entrevistados. Além disso, a presença do pesquisador pode influenciar as respostas. O autor destaca também que nem todas as pessoas são igualmente articuladas e perceptivas.
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Análise dos Resultados
Neste capítulo, os depoimentos dos entrevistados foram analisados com o objetivo de entender as expectativas de profissionais que atuam em empresas com sistemas de trabalho considerados de alta performance. Através da análise dos relatos dos participantes foi possível identificar categorias que ajudaram a entender melhor o universo de trabalho de alta performance, bem como o que esses trabalhadores esperam das empresas em troca de uma dedicação intensa. Buscou-se, dessa forma, compreender os fatores que contribuem para que o trabalhador sinta-se atraído pelo trabalho nesse tipo de organização, aceitando dedicar mais horas e mais energia a seus empregos. Para apresentar os resultados, estruturou-se o presente capítulo em dois tópicos. O primeiro buscou analisar as bases do contrato psicológico em empresas de alta performance, ou seja, quais são os fatores, identificados no discurso dos participantes, que os levam a trabalhar por mais horas e com uma maior dedicação. Nele, foram exploradas questões como o rápido crescimento profissional como forte motivador para o aumento das horas trabalhadas; a realização profissional e a satisfação pessoal decorrente do prazer em realizar o trabalho; o prestígio profissional e a imagem da empresa, além do reconhecimento com base no desempenho. O segundo tópico abordou os custos, apontados pelos entrevistados, de se trabalhar em empresas inseridas na realidade denominada de alta performance, ou seja, quais os aspectos negativos enfrentados pelas pessoas que aceitaram trabalhar por mais horas e com maior dispêndio de energia. Nesse tópico são analisadas questões referentes à extensão da jornada de trabalho e ao impacto exercido por esse aumento na vida dos entrevistados. Alguns dos motivos citados pelos participantes como justificativa para trabalhar por mais horas foram a sobrecarga de trabalho, a necessidade constante de retrabalho em função de problemas de processo e a alta rotatividade existente em algumas empresas. Outra questão amplamente citada foi o sacrifício da vida pessoal e familiar, como consequência direta do aumento das horas trabalhadas. A seguir, esses aspectos são detalhados e analisados.
As Bases do Contrato Psicológico em Empresas de Alta Performance
Este tópico procurou entender as motivações dos trabalhadores que vivenciam a realidade da alta performance, mais precisamente, buscou-se entender quais as bases do contrato psicológico estabelecido entre os funcionários entrevistados e as empresas nas quais atuam, ou seja, o que sustenta a relação existente entre os mesmos.
Contratos psicológicos podem ser entendidos como crenças dos indivíduos sobre os termos do acordo de troca que estabelecem com suas organizações (XXXXXXXX, 1995). As crenças do indivíduo passam a fazer parte do contrato psicológico quando ele percebe que deve à organização certa contribuição (como dedicação, lealdade e sacrifícios) em troca de certos benefícios (salário, segurança no trabalho, etc). Este tópico busca justamente entender essa relação entre os entrevistados e suas empresas, ou seja, o que os profissionais esperam dela ao se dedicarem tão intensamente, a ponto de deixarem muitas vezes a vida pessoal em segundo plano. Para estruturar a análise, as seguintes categorias foram definidas, a partir dos temas que emergiram nos relatos: o rápido crescimento profissional, a realização profissional, a satisfação pessoal, o prestígio profissional associado à imagem da empresa, além da meritocracia. Entende-se que estas seriam, em linhas gerais, as principais bases do contrato psicológico estabelecido entre os entrevistados e suas respectivas organizações.
Rápido Crescimento Profissional
Muitos entrevistados destacaram o rápido crescimento profissional proporcionado pelas empresas de alta performance como um importante motivador para a maior dedicação ao trabalho. Boa parte dos participantes acredita que as chances de uma ascensão acelerada na carreira são maiores nestas empresas, em que as horas trabalhadas a mais são vistas de maneira positiva e onde uma forma de recompensar o esforço é promover o funcionário. Essa percepção está em linha com as considerações de Xxxxx e Xxxxxxxxxx (2009) que afirmam que o trabalho por longas horas está associado tanto a riscos quanto à
recompensas. Para os autores, alguns indivíduos trabalham por mais horas porque gostam de seu trabalho e pelo prazer de ter sucesso no mesmo, gostam dos benefícios associados ou querem um trabalho mais qualificado. As recompensas incluem satisfação no trabalho, mobilidade ascendente e rendimentos mais elevados (BUNTING, 2004). Os relatos seguintes confirmam as expectativas de rápido crescimento profissional:
“Aceitei vir pra cá por causa do crescimento profissional, oportunidade profissional, porque foi um crescimento quando eu saí da empresa Y e vim pra cá. (...) Foram essas duas coisas: o crescimento profissional imediato e o projeto com a perspectiva num futuro de crescimento também”. (E1)
“Eu gosto do que eu faço e eu estou crescendo na empresa por causa desse ritmo. Não me incomoda o ritmo porque está me dando crescimento”. (E12)
“Por ser um mercado novo, e aí acho que vale pra toda Telecom, mas na empresa Y eu consegui perceber isso um pouco mais, a oportunidade de você estar crescendo é muito rápida. É um mercado que é novo, e com ele evoluindo e você estando numa onda recente, é mais rápido pra você crescer em termos de cargo mesmo”. (E5)
Para Xxxxxx (2004) funcionários que atingem alto nível de desempenho serão os primeiros a serem lembrados pela empresa nas promoções e nos aumentos salariais e essa percepção é reforçada pelos entrevistados:
“Eu sinto como seu eu estivesse conquistando coisas aqui dentro por todo o meu esforço nesse período. E isso é legal porque eu estou agora num momento que eu faço a parte que eu mais gosto do trabalho, eu tenho uma autonomia aqui dentro pra fazer esse trabalho, e acho que ainda assim é a possibilidade de crescer mais. Acho que no momento em que eu vir que não tem mais pra onde crescer aqui dentro deixa de fazer sentido”. (E6)
“Aqui eu sabia que só dependeria de mim. Se eu corresse atrás, se eu trouxesse os resultados que a empresa quer, eu conseguiria ter mais chances de conseguir virar gerente, ser promovida”. (E8)
“O que eu espero é crescimento rápido, porque o esforço que hoje a gente faz a gente sempre tem uma expectativa de reconhecimento, não só financeiro, mas profissional. Espero que muitas coisas em termos de pessoas se estruturem pra dar mais suporte pra gente nos próximos anos”. (E10)
Em linha com as constatações de Xxxxxxxx (1998) de que reciprocidade é o coração do contrato psicológico, boa parte dos entrevistados espera da empresa
uma forma de recompensa por sua maior dedicação ao trabalho. Para eles, o crescimento profissional é uma maneira de a organização mostrar ao trabalhador que valoriza as longas horas que permanecem nas empresas e, em última análise, o maior dispêndio de energia. Ainda segundo Xxxxxxxx (1996), a mutualidade é o ponto principal para a entrega dos produtos esperados, isto é, apenas quando ambas as partes percebem que possuem algo a ganhar com a relação é que se empenham em trabalhar para assegurar a entrega do trabalho previamente acordado. Esse ponto é claramente percebido no discurso dos entrevistados, que entregam o 'produto' esperado – maior dedicação ao trabalho – em troca da perspectiva de um rápido crescimento profissional; “eu sei o que você quer de mim e você sabe o que eu quero de você” (XXXXXXXX, 1995).
Realização Profissional e Satisfação Pessoal
Muitos entrevistados destacaram a satisfação pessoal, a realização profissional e a autonomia como aspectos que os motivam a se dedicar mais ao trabalho, o que indica que alguns participantes não se incomodam em trabalhar mais horas quando o trabalho representa uma forma de estímulo pessoal, quando se sentem felizes desempenhando as atividades realizadas. Essa percepção está em linha com as considerações de Xxxxxx (2004) ao afirmar que o trabalho que é excessivo para alguns, porque interfere em seu bem estar, pode não ser excessivo para outros. Para essas pessoas, o fato de gostarem de suas atividades e acreditarem que o ritmo intenso faz parte da realidade atual justifica essa dedicação, ainda que outras áreas de suas vidas possam ficar prejudicadas:
“Acho que eu tive uma situação na minha outra empresa que era: eu tinha um bom salário, eu estava numa ótima empresa, mas eu não estava feliz. Isso só não é suficiente. (…) Então hoje eu tenho as três coisas: tenho a possibilidade de em algum momento virar sócia, tenho um bom salário e eu estou feliz com que eu estou fazendo, eu tenho um desafio pessoal que é instigante, por isso eu pretendo ficar”. (E4)
“Enquanto o que eu estiver fazendo for estimulante não me incomoda, porque o dia passa rápido e você está lendo uma coisa interessante. (…) Fazer a diferença numa empresa. Acho que o que eu não fazia de diferença na outra empresa posso fazer nessa, tenho espaço, aí depende de mim. O que a empresa me oferece é mais
um misto de oportunidade de crescimento, oportunidade de sociedade, capital intelectual e satisfação pessoal”. (E4)
“O que hoje mais me motiva é a autonomia que eu tenho em relação ao que eu faço. Apesar de eu ser muito júnior eu toco muita coisa aqui dentro, até por ser muito enxuto. (…) A gente tem muita liberdade, muita autonomia, muita informalidade pra dizer o que acha, o que quer, o que vê de certo e errado. (…) Mas o que me motiva realmente é essa independência, é o processo ser meu, estar na minha mão, e a responsabilidade ser minha, e eu não me sentir uma engrenagem só do processo e sim a pessoa que está tocando as coisas no dia a dia”. (E10)
Esses relatos confirmam as considerações de Hewlett e Luce (2006) e Xxxxx e Stroh (2003), de que todos os trabalhadores extremos têm as suas próprias razões para justificar o esforço. Muitos adoram o desafio intelectual e a emoção de conseguir alcançar alguma coisa grande. Outros são atraídos pelos pacotes de recompensa, colegas brilhantes e pelo reconhecimento e respeito que vêm com o aumento de trabalho. Xxxxx e Xxxxxxxxxx (2009), por sua vez, afirmam que a maioria das pessoas que exercem trabalhos extremos acham o seu trabalho estimulante e recompensador, aspecto este corroborado pelos entrevistados, ao destacarem o quanto gostam do que fazem:
“Eu gosto muito do que eu faço e o que eu faço demanda, então, eu não gosto do ritmo, eu gosto do trabalho e por conta do trabalho, se eu precisar ter esse ritmo, não me incomoda”. (E6)
“Eu acho que toda e qualquer profissão que a pessoa gosta do que faz, se sente bem e acha que o caminho é aquele de que você está fazendo um bom trabalho, um bom serviço, que você está entregando e etc., e quer ser bem sucedido eu acho que é muito difícil você não se envolver com um horário maior”. (E7)
“Eu queria estar num lugar que todo mundo acorda e fala: hoje vai ser um dia bom pra caramba, vamos produzir pra caramba. Eu queria estar num lugar que estivesse todo mundo focado. (…) Acho que eu estava precisando ir pra um lugar em que as pessoas estivessem apaixonadas pelo que eu também estava. Isso faz toda a diferença, você estar comprometida e pessoas do seu lado também”. (E11)
Para alguns entrevistados a possibilidade de trocar experiências com pessoas igualmente comprometidas e envolvidas com o trabalho, exercer atividades estimulantes e obter satisfação pessoal representam pontos cruciais na sua escolha profissional de trabalhar em empresas de alta performance, o que está em linha com as considerações de Xxxxxxxx (1995), que considera que os contratos normativos envolvem um grupo de indivíduos com objetivos e
expectativas comuns. Nesse sentido, pode-se considerar que o contrato estabelecido entre esses profissionais e as empresas é tipicamente normativo, já que envolvem um grupo de trabalhadores com uma mesma visão e um mesmo objetivo, estando igualmente comprometidos com a empresa e o trabalho desempenhado.
Prestígio Profissional e Imagem da Empresa
Ao justificarem sua maior dedicação ao trabalho, alguns participantes ressaltaram a imagem positiva no mercado ou a posição de liderança da empresa em que atuam como fatores que os motivaram a ingressar nas mesmas, mesmo sabendo que elas se encaixavam no padrão de alta performance e exigiam excesso de dedicação ao trabalho:
“É uma empresa líder, eu na verdade conversei com pessoas que eu conhecia que vieram da empresa Z pra cá e elas me deram um feedback muito positivo”. (E2)
“É uma empresa muito bem vista no mercado, que cresceu muito rápido, acho que é um exemplo de sucesso. E acho que todo mundo quer trabalhar num lugar que está indo pra um caminho crescente, que você pode crescer junto”. (E6)
“Eu sabia que era um mercado dinâmico, que eu ia aprender muito, que eu ia ter oportunidades, a empresa Y como líder me chamou muita atenção, porque como eu já tinha trabalhado em duas líderes, sabia que ser líder é muito diferente. São empresas que alcançaram a liderança por algum motivo, que de alguma forma se diferenciam das demais. E para o profissional que está trabalhando é um diferencial; o mercado te enxerga de outra maneira”. (E8)
“Era o meu sonho, porque eu sempre quis trabalhar com beleza e aqui, por isso que eu vim, mesmo sabendo que era essa loucura. Eu sabia que trabalhava-se muito. (…) Eu imaginava que era pesado, mas não imaginava que fosse ser tanto”. (E9)
“O que me atraiu foi o nome da empresa: você entra numa empresa, vê o status, trabalhar no internacional, aquilo cresce os olhos. Então foi mais ou menos isso que me atraiu”. (E12)
Os entrevistados acreditam que, ao se inserirem nessas empresas, adquirem maior prestígio profissional. Desta forma, entendem que a dedicação extrema requerida pelas mesmas compensa, pois a passagem por estas aumenta
sua empregabilidade. Nesse sentido, ser ou ter sido funcionário de determinadas empresas é uma espécie de selo de qualidade que estampam em seus currículos profissionais. Ademais, conforme será abordado mais adiante, entendem essa dedicação como uma fase, como uma etapa na construção de uma carreira bem sucedida. Portanto, ao analisar-se essa expectativa, a dimensão transacional do contrato se destaca, pois a relação de troca entre trabalhador e organização possui um término específico, geralmente de curto prazo. Nesse caso, o envolvimento entre as partes é limitado (XXXXXXXX, 1995).
Reconhecimento com Base no Desempenho
Reconhecimento profissional e remuneração baseadas no mérito, a chamada meritocracia, apareceram nos relatos de alguns entrevistados como aspectos valorizados nas empresas ditas de alta performance e que justificam sua dedicação extrema ao trabalho. Esta necessidade de maior dedicação é destacada por Xxx Xxxxx (2008) ao afirmar que o trabalhador contemporâneo é cada vez mais cobrado por resultados e por um maior envolvimento. A lógica de gestão baseada em metas e resultados é pautada na ideologia de que o progresso e o fracasso dos trabalhadores são diretamente proporcionais aos seus talentos, habilidades e esforços, independentemente de outras variáveis do contexto. Assim, o indivíduo é visto como o único responsável pelos seus méritos e pelo seu destino profissional. Apesar desses aspectos críticos, os participantes parecem encarar de forma positiva o fato de serem recompensados por um trabalho bem feito e por uma maior dedicação à empresa. As horas trabalhadas a mais e o maior dispêndio de energia seriam reconhecidas tanto simbolicamente quanto por meio de recompensa financeira, indicando também, a possibilidade de serem promovidos. Neste sentido, os entrevistados entendem que:
“Acho que o que eles pregam aqui é meritocracia, então se eu fizer o meu trabalho bem feito e mostrar dedicação, que eu seja recompensada, tanto em termos financeiros, quanto em termos de crescimento. (…) Obviamente quando você tem um sistema de metas a tendência é que as pessoas queiram trabalhar mais para atingir as metas. (…) A meritocracia é uma coisa importante”. (E10)
“Eu acho que a meritocracia aqui acontece, então eu fico feliz porque pessoas que trabalham bastante e tem foco no negócio acabam sendo remuneradas conforme o feito”. (E11)
Nesse sentido, pode-se reafirmar que os contratos estabelecidos entre estes indivíduos e as organizações nas quais estão inseridos é tipicamente transacional, pois a base de troca é objetiva, ou seja, existe a disposição da organização de oferecer uma compensação adequada, por meio de promoções, condições de trabalho e remuneração variável, no curto prazo, em troca do cumprimento por parte do empregado de suas obrigações contratuais de trabalho (XXXXXXXX, 1995).
Todavia, também foi mencionado por um entrevistado o fato de que a remuneração variável, associada ao desempenho, típica das organizações de alta performance, pode ser questionável, já que empresas que não se enquadram neste perfil muitas vezes oferecem um salário fixo mais atrativo. Desta forma, como destacou um dos entrevistados, muitas vezes funcionários de empresas de alta performance trabalham mais horas e mais intensamente e recebem menos do que aqueles que não estão inseridos nesta realidade:
“O que é frustrante em termos de horas trabalhadas é que nessas empresas normalmente você tem um salário que é bastante aquém dos salários de outras empresas, porque ao mesmo tempo que você trabalha muito, a sua remuneração é totalmente atrelada à sua performance. Você tem um fixo baixo e uma possibilidade de um bônus mais elevado. (…) Isso é um pouco frustrante quando você olha pro mercado e vê que tem muita gente que bate ponto no relógio, levanta e sai às 18h e ganha mais do que você, sem tanto risco”. (E10)
Esse tipo de situação poderia levar a sensação de violação do contrato psicológico, já que, de acordo com Xxxxxxxx e Xxxxxxxx (2000), quando as organizações não cumprem as suas promessas, é comum que os funcionários reduzam suas contribuições e tenham atitudes negativas com as mesmas. Em linha com as constatações de Xxxxxxxx et al. (1994) e Xxxxxxx e Xxxxxxxxx (1996) os contratos psicológicos tornam-se mais transacionais após uma violação; os funcionários se retiram da relação e vão prestar mais atenção a recursos financeiros e outros aspectos econômicos. Isso pode ser observado na realidade vivenciada pelos entrevistados, pois, uma vez que um funcionário não recebe o retorno financeiro esperado por trabalhar longas horas, ele prefere romper o contrato e procurar novas oportunidades:
“A pessoa sai por não estar sendo reconhecida financeiramente. Quando a pessoa vê que está há 1, 2, 3 anos e aquele ritmo não diminui e o salário não aumenta, ele vai embora”. (E10)
Cabe destacar, portanto, que por sua natureza transacional, os contratos que os entrevistados estabeleceram com suas empresas estão sob o risco constante de serem rompidos, caso as expectativas referentes ao crescimento, à realização profissional e ao reconhecimento baseado no mérito não sejam atendidas.
Os Custos do Trabalho em Empresas de Alta Performance
Nos relatos dos entrevistados foi possível perceber que, por mais que esses profissionais afirmassem estar satisfeitos com suas atividades, trabalhar em sistemas de trabalho de alta performance implica sempre em jornadas de trabalho mais extensas e maior pressão no dia a dia, o que traz consequências negativas para a vida dos trabalhadores. Pessoas que passam mais do que as oito horas contratuais na empresa acabam tendo outras áreas da vida impactadas e, muitas vezes, negligenciadas. Para melhor analisar esses impactos negativos, os relatos foram organizados com base em duas categorias que sintetizam os principais problemas apontados pelos entrevistados: extensão da jornada (incluindo a sobrecarga de trabalho, o retrabalho e a alta rotatividade) e o sacrifício da vida pessoal e familiar.
Extensão da Jornada de Trabalho
Existem diversas razões que explicam por que as pessoas trabalham mais e cada razão pode ter tanto consequências desejáveis quanto indesejáveis para os indivíduos e para as organizações. Algumas pessoas se sentem obrigadas a trabalhar excessivamente mesmo quando não há imposição de demandas externas. Golden (1998, apud Xxxxx e Xxxxxxxxxx, 2009) sugere que as horas efetivamente trabalhadas ocorrem em função de três fatores: horas desejadas pelo trabalhador, horas demandadas pelo empregador e o ambiente institucional em que as decisões de horas trabalhadas são tomadas (limitações legais, normas do local de trabalho e ambiente macroeconômico). Existem razões positivas para se trabalhar muitas horas (remuneração elevada, autorrealização, um senso de comprometimento com os colegas de trabalho e clientes, gostar do trabalho), mas há, também, razões negativas (evitar sanções, lidar com a insegurança no trabalho).
Apesar dos entrevistados alegarem que trabalham em organizações ditas de alta performance por escolha pessoal, por vislumbrarem ganhos decorrentes da inserção nessas organizações, em seus relatos aparece a insatisfação com as longas horas trabalhadas e com a dedicação extrema ao trabalho. Observou-se que
alguns entrevistados enxergam esse problema, ainda que afirmem gostar das atividades realizadas:
“É mais do que eu gostaria. Eu gostaria de trabalhar 8 horas. Chegar aqui às 9h e sair às 18h, poder ter uma vida pessoal (…) Não gosto do ritmo, mas também não é algo que me desmotive. Se eu ficar trabalhando nesse ritmo eu vou me desmotivar, eu sei que é uma coisa passageira”. (E1)
“É difícil dizer que você gosta de trabalhar assim o dia inteiro. Eu gosto muito do meu trabalho, e eu gosto muito de trabalhar aqui, acho que qualquer pessoa preferiria ter aquele trabalho de entrar às 9h e sair às 18h todo dia. Então eu gosto de estar aqui, eu gosto muito do meu trabalho. Se eu gosto de trabalhar vários horas extras... Talvez não, mas eu sei que é necessário”. (E3)
“Não gosto do ritmo. Eu gosto de trabalhar aqui, mas não gosto de trabalhar nesse ritmo. Eu gosto do meu trabalho, gosto da empresa, gosto dos produtos com os quais eu trabalho, eu gosto do mercado, do métier, mas eu não gosto de trabalhar dessa forma, eu acho que está sendo muito forte”. (E9)
Nesse sentido pode-se postular que, para essas pessoas, embora exista uma compensação pelas horas a mais trabalhadas, elas se ressentem desse excesso. Todavia, os entrevistados lidam com essa insatisfação reforçando que gostam de seus trabalhos, vislumbrando a perspectiva de rápido crescimento profissional ou entendendo esse excesso como algo circunscrito a uma etapa da vida profissional, como o preço que precisam “pagar” para terem o sucesso almejado. Ainda assim, afirmam que não gostam de permanecer por muito tempo em seus trabalhos, porque percebem que a vida pessoal acaba prejudicada.
Uma questão citada por alguns participantes foi a sensação de que precisam se adaptar ao ritmo imposto pela empresa e pela cultura de trabalhar mais, que vivenciam no interior das organizações. Nesse sentido, confirmam as considerações de Xxxxxx (2004), que alega que a cultura de algumas empresas valoriza os funcionários que nela permanecem constantemente após o expediente de trabalho, sem cobrar horas extras e, na maioria das vezes, sem uma real necessidade de atuar em período extraordinário. Essa consideração é corroborada pelos seguintes relatos:
“Uma coisa que tem muito em mercado em geral é que você dita um pouco o ritmo, e naturalmente o seu retorno financeiro e de crescimento na empresa é um
pouco ditado em como você leva esse ritmo. Você pode ficar oito horas lá? Pode. É uma boa sinalização? Não. Se eu chegar lá 9h da manhã e for embora 18h da tarde, o entendimento das pessoas sobre mim é: não está interessado o suficiente”. (E4)
“Eu já trabalhei 16 horas aqui na empresa X, então é um ritmo enlouquecido. E a empresa tem uma cultura muito forte de que trabalhar 8 horas não é o necessário, então quase ninguém trabalha 8 horas. A maioria das pessoas trabalha no mínimo 10 horas por dia”. (E9)
“Acho que têm áreas que são mais sazonais, e que de fato tem dias que você precisa sair 22h, mas têm semanas que está tranquilo e você conseguiria sair às 18h. Hoje em dia sair às 18h não é tranquilo, não existe. Você sair 20h, OK. 18h, não”. (E10)
Dessa forma, o que se percebe é uma tendência de permanecer mais tempo na empresa como forma de demonstrar interesse e de mostrar para os gestores uma constante disponibilidade. Embora sejam empresas de alta performance, em que o trabalho é supostamente intenso, exigindo um esforço maior, muitas vezes o funcionário alega não ter necessidade de permanecer na empresa por mais tempo, pois não há uma demanda extra. Ainda assim, em função de uma cultura de se trabalhar mais, que tende a caracterizar essas empresas, os trabalhadores acabam ficando até tarde, para causar boa impressão. A fala seguinte ilustra bem esse aspecto:
“Acho que o ritmo é um pouco da cultura do gestor e da cultura de cada área. Acho que a gente é cobrado não só por entrega, mas por disponibilidade. A gente tem que estar disponível, o cara tem uma demanda às 18h e quer que esteja pronto às 8h da manhã do dia seguinte, então você tem que estar disponível. (…) Não necessariamente você está aqui fazendo alguma coisa. Ele não quer olhar 19h e não ter ninguém”. (E2)
Portanto, percebe-se que as pessoas passam a ser avaliadas não somente pela competência e eficiência com que realizam seu trabalho, mas também pelo tempo que permanecem dentro de suas organizações, pela possibilidade de estarem 24 horas disponíveis para realizar, ou não, novas demandas.
Ainda que este não fosse o objetivo inicial da análise, das falas dos entrevistados emergiram outros motivos que explicam porque os entrevistados estendem a jornada de trabalho para muito além das oito horas contratuais. Observou-se que, além da questão cultural exercer influência na maior permanência dos trabalhadores em suas empresas, alguns entrevistados relataram
problemas de processos mal desenhados nas organizações, como um dos motivos que levam a extensão da jornada. A falta de processos eficientes muitas vezes gera o retrabalho, logo, atividades que poderiam ser realizadas rapidamente acabam demandando do trabalhador mais horas de trabalho. As falas seguintes ilustram essa percepção:
“É frustrante quando você trabalha longas horas sem necessidade. Por exemplo, aqui a gente ainda tem muita coisa que tem que consertar. Tem muita coisa que tem que ficar apertando parafuso aqui ali, que o processo ainda não está tão redondo, então você acaba trabalhando longas horas pra consertar coisas que você já fez. (…) Isso é mais frustrante do que você trabalhar longas hora pra entregar um objetivo”. (E10)
“No mercado de Telecom está tudo sempre em mudança, às vezes um trabalho que você perde uma semana, um mês, dois meses fazendo, vai pro lixo. Isso faz com que seja em alguns momentos necessário, mas não justifica. Teoricamente as empresas deviam ter pessoas suficiente pra atender à essa necessidade”. (E8)
Nesse sentido, pode-se questionar o uso do termo “alta performance”, para justificar o excesso de horas trabalhadas, posto que parecem haver problemas de planejamento e gestão, por trás do alongamento de algumas jornadas.
Outra questão citada para explicar o excesso de horas de trabalho foi a alta rotatividade da mão de obra nas organizações. Como muitos funcionários não aguentam o ritmo intenso de trabalho e deixam as empresas, as atividades se acumulam e um trabalhador que já vivenciava uma realidade de trabalho intenso, acaba precisando realizar também atividades que não faziam parte do escopo inicial de suas funções, aumentando ainda mais as horas trabalhadas. Esta realidade é apontada por Dal Rosso (2008) ao destacar que um indicador usado para levantar o processo de intensificação do trabalho é representado pelo acúmulo, em uma mesma pessoa, de atividades que antes eram exercidas por mais pessoas. A redistribuição de tarefas realizadas, anteriormente, por mais pessoas, para uma mesma pessoa é um indicador inequívoco de intensificação das condições de trabalho, por requerer que o trabalhador desempenhe mais tarefas, nos mesmos horários de trabalho. Tal mecanismo pode ser implementado em diversas circunstâncias, seja quando o montante global das atividades aumenta sem o aumento do número de empregados, seja quando o número de empregados foi reduzido por políticas de contenção de gastos, seja ainda quando ocorre a saída
de pessoal, por desligamento voluntário ou aposentadoria, e não ocorre sua reposição:
“O nível de rotatividade que a gente tem hoje é totalmente fora da realidade, é insustentável em termos de longo prazo. (…) Quando sai uma pessoa, não tem quem cubra. Então, todo mundo que já trabalha muito, só vai trabalhar mais ainda. (…) A maioria das pessoas que saem, na minha opinião, é porque essas expectativas que elas tinham em relação ao trade off de horas trabalhadas versus o quanto ela está ganhando, ou horas trabalhadas versus reconhecimento profissional, faz com que a pessoa saia”. (E10)
“Teve uma época que eu fiquei durante 3 meses seguidos entrando às 7h e saindo meia noite, todo dia, porque a gente perdeu duas pessoas, então ficou um ritmo muito frenético. (…) Eu trabalho muito, mas sou reconhecida por isso. Tem muita gente que trabalha muito e não é reconhecida, então a pessoa vai embora”. (E12)
Essa percepção também reitera o caráter transacional do contrato, já que os funcionários que não se sentem reconhecidos pelo trabalho desempenhado deixam a organização. É um envolvimento limitado, pois, quando os trabalhadores não recebem uma compensação que julgam adequada ao trabalho exercido – que é mais intenso e demanda mais horas trabalhadas – procuram novas empresas que ofereçam melhores garantias.
Sacrifício da Vida Pessoal e Familiar
Boa parte dos entrevistados relatou que a vida pessoal acaba sendo prejudicada em função do trabalho intenso, aspecto esse destacado por Xxxxx e Xxxxxxxxxx (2009) quando afirmam que os riscos de se trabalhar longas horas incluem uma menor satisfação familiar, padrões de sono interrompidos e sofrimento psicológico. Alguns participantes sentem falta de tempo para praticar esportes, dedicar-se ao estudo ou qualquer outra atividade fora da empresa:
“Óbvio que eu gostaria de ter mais tempo pra me dedicar a um esporte, ou um hobby, alguma coisa assim. Hoje eu até consigo praticar esporte, mas não todo dia. Consigo uma vez por semana, você dá aquela saidinha um pouco mais cedo e consegue”. (E1)
“A vida pessoal fica muito em segundo plano. Se você não der um basta na empresa, se você não colocar os seus limites, você não tem vida. (…) Acho o ritmo insano, eu estou revendo muito isso. Por exemplo, quando eu entrei aqui na
empresa X eu parei de ter aula no Mestrado, tranquei, porque eu não conseguia chegar nunca”. (E9)
A questão familiar também foi mencionada e todos os participantes casados admitiram ter pouco tempo para se dedicarem ao parceiro. O único entrevistado com filho relatou a dificuldade de criar uma rotina com a criança em função dos horários que costuma chegar do trabalho. Ele acredita que existe uma incompatibilidade entre o aumento da jornada para muito além das oito horas contratuais e a convivência com os filhos. Para essas pessoas o excesso de horas trabalhadas reflete negativamente na vida pessoal, já que o convívio familiar acaba sendo deixado para segundo plano:
“Eu ficava esgotado, chegava em casa e chorava, meu filho meia noite me esperando pra me ver, tenho um filho de 3 anos, xxxxxx pra mim e ia dormir, porque já estava morto de cansaço. Eu não consigo criar uma rotina com meu filho de dormir cedo, porque eu não tenho hora pra chegar em casa e ele sempre me espera. Então eu não posso cobrar que ele vá dormir 20h, eu nunca chego 20h em casa”. (E2)
“Quando você pensa num plano de família, isso é uma coisa pesada. (…) É complicado porque a sua vida pessoal e social fica um pouco prejudicada, meio que a maior parte do seu dia você passa dentro do escritório, fechado, lendo”. (E4)
“Lógico que é complicado, eu não tenho filhos, mas já sou casado e lógico que gostaria de estar mais tempo em casa não só para estar com a minha esposa, mas para fazer outras coisas”. (E5)
Por esse motivo, alguns entrevistados, apesar de aceitarem o ritmo intenso de trabalho, revelam a intenção de diminuí-lo, em algum momento, para poderem ter mais espaço para a vida pessoal, mesmo que seja em detrimento da ascensão profissional:
“Eu quero uma coisa mais tranquila, quero uma coisa que eu possa conciliar melhor com a minha vida pessoal. (…) Queria pegar um cargo que eu consiga sair 18h, 19h no máximo, por mais que não tenha expectativa nenhuma de crescimento. Não quero crescer pra sempre, quero chegar num lugar que me dê um pouco de conforto e ficar”. (E2)
No caso das mulheres, a conciliação da vida familiar com o ritmo de trabalho típico das empresas de alta performance é considerada quase uma impossibilidade:
“Eu acho que não dá pra ter filho aqui dentro, muito sinceramente. Acho que hoje em dia todo mundo quer trabalhar, a vida profissional da mulher é muito importante e eu quero ter uma vida profissional e ser realizada profissionalmente. Só que ao mesmo tempo acho que quando tem também o lado da família tem que ter um meio termo. (...). Então acho um pouco complicado daqui a 10 anos continuar tendo 100% só trabalho”. (E6)
“Eu questiono muito como vai ser daqui pra frente, porque eu tenho 31 anos, quero casar, quero ter filhos, quero ter uma família, e não dá pra viver assim, nessas condições. Tanto que uma coisa muito interessante aqui é que as equipes são muito juniores. (…) A galera mais velha acaba não conseguindo ficar, acaba tomando outros rumos porque é uma vida que não te permite ter uma vida familiar, ter uma vida social”. (E9)
“Eu trabalharia numa empresa maior talvez, daqui a 10 anos, para ter um pouco mais de estabilidade. Porque o ritmo atual de trabalho não dá pra ter família, não dá pra ser chefe de família, é impossível. Você tem que ser o pai que pega uma vez na escola por mês, é um trabalho bem masculino, eu estou numa mesa com nove homens. (…) Eu espero que consiga sobreviver, mas eu acho que vai ter um momento que vou pesar a família”. (E11)
Analisando-se os relatos dos entrevistados verificou-se, também, que boa parte encara o trabalho intenso como um momento particular da vida profissional. Muitos acreditam que, por serem jovens e ainda não terem filhos, a grande quantidade de horas trabalhadas é justificável como uma etapa pela qual precisam passar para que alcancem o crescimento e o reconhecimento profissional. Para eles, essa dedicação intensa tem um prazo de validade, que deve durar até o momento de constituir uma família, pois não enxergam a possibilidade de conciliar a forma atual de trabalho com e as demandas da vida em família. Nesse sentido, reforça-se a ideia de que a relação que esses indivíduos desenvolvem com as organizações baseia-se em uma forma de contrato transacional, ou seja, um contrato que costuma ser estabelecido por curto prazo e em que o envolvimento entre as partes é limitado. A dimensão transacional do contrato psicológico captura a disposição da organização de oferecer uma compensação adequada, condições de trabalho e garantias razoáveis de emprego, a curto prazo, em troca do cumprimento por parte do empregado de suas obrigações contratuais de trabalho (XXXXXXXX, 1995):
“Acho que pelo menos até os 38, no máximo 40 anos, ainda estarei dentro do mercado corporativo. (...) Quando eu quiser ter filhos, dar uma atenção maior pra minha família, vou ter que botar muito na balança o que eu vou querer primeiro”. (E5)
“Eu sou mulher, então a minha opinião acho que é diferente dos meninos. Eu acho que é uma fase da vida. (…) Mas acho que chega uma época que vai ter filho, não vai dar. Então eu sei que pra mim esse ritmo intenso tem data de validade, porque não dá pra fazer tudo ao mesmo tempo. Não sei se eu vou conseguir trabalhar 12 horas por dia no longo prazo, acho difícil. (…) Gosto do ritmo, mas sabendo que é uma época só, que é um pé de meia, é uma fase”. (E11)
Esses relatos encontram ressonância nas considerações de Xxxxxxxx (1995) quando afirma que a passagem do tempo traz substanciais mudanças psicológicas e sociais para as pessoas. As necessidades dos trabalhadores e das organizações podem mudar com a idade e os novos papéis e responsabilidades da vida adulta. O tempo pode transformar uma atividade que antes era normal em algo quase impossível de se realizar. Trabalhadores com mais de trinta anos, com responsabilidades familiares, podem achar que as condições de trabalho que eram bem vindas aos vinte anos tornam-se difíceis de serem cumpridas. Uma pessoa dedicada e motivada pode acabar comprometendo sua dedicação ao trabalho em função do aumento da responsabilidade familiar:
“No nível pessoal é horrível, você se desgasta muito, problemas de família, tempo pra filho pra esposa, é bastante complicado. E acho que dependendo da idade que você tem isso tem um peso diferente, na minha idade já está pesando mais”. (E2)
“Desde que tenha um prazo que pode ser de, sei lá, um ano, é aturável, mas a vida inteira trabalhando assim, não. (…) Acho que lá na frente eu vou ter uma família. O ritmo de empresa em geral não é um ritmo fácil. Então pra conciliar um pouco mais a vida pessoal com a profissional eu imagino que um negócio próprio te dê mais oportunidade de ser mais flexível nos horários e no ritmo de trabalho”. (E1)
“Só que eu tenho na minha cabeça prazos, e eu não acho que vou ficar nesse ritmo a minha vida toda. (…) Se a coisa que eu estou procurando não acontecer eu vou correr atrás de outra coisa, não dá pra ficar nesse ritmo sem que a empresa me dê o que eu estou buscando”. (E2)
“Eu acho que é um ritmo muito pesado, mas no momento que eu estou da minha carreira é válido, pelo menos eu não tenho expectativa de ficar pra sempre com esse ritmo, acho que é uma coisa meio insustentável a partir do momento que você fica mais velho, passa a ter casa, enfim, outras demandas”. (E6)
De forma conclusiva, pode-se afirmar que trabalhar por muitas horas, demanda típica das empresas de alta performance, é uma realidade que os entrevistados aceitam enfrentar, apesar dos efeitos negativos que exercem na vida pessoal. São muitos os motivos citados como justificativa para o excesso de horas trabalhadas, que vão desde o prazer em desempenhar suas funções, até a recompensa material, o reconhecimento e o rápido crescimento profissional. Ainda assim, o custo atrelado a esta relação é alto, e envolve a impossibilidade de realizar outras atividades, como exercícios físicos e estudo, uma vida pessoal e social prejudicada, sobretudo com relação à família (parceiros e filhos) e até mesmo problemas de saúde, geralmente associados ao estresse.
5
Conclusões
Este trabalho teve como objetivo principal analisar as bases do contrato psicológico estabelecidas entre trabalhadores e empresas de alta performance. Procurou-se entender quais os acordos existentes entre pessoas inseridas na realidade de alta performance e as empresas em que as mesmas trabalham. Para alcançar este propósito foi realizada uma pesquisa qualitativa, na qual foram entrevistados doze trabalhadores de empresas que podem ser consideradas de alta performance.
A seleção dos participantes se deu através de critérios como experiência de trabalho em empresas privadas, formação universitária obrigatoriamente requerida, modelo de gestão da organização na qual trabalham fortemente pautado em valores de alta performance, e, por fim, indivíduos cuja carga horária superasse as oito horas estabelecidas pelo contrato formal. Nenhuma exigência com relação a idade foi feita, mas, o que se pôde observar foi que somente pessoas jovens encaixavam-se no perfil requerido: o participante mais velho tinha
34 anos, enquanto do mais novo, 22 anos. Ainda que a faixa etária dos entrevistados não tenha sido pré-determinada pela pesquisadora, o que se concluiu, após a pesquisa, é que são predominantemente jovens as pessoas que vivenciam a realidade de trabalho dita de alta performance, isto é, tendem a ser jovens, aqueles que se dispõem a enfrentar longas horas de trabalho, sob intensa pressão.
Na primeira parte da análise procurou-se identificar as bases do contrato psicológico, ou seja, quais as relações de troca que os entrevistados esperam de suas empresas, ao desempenharem trabalhos ditos de alta performance. Com base nos relatos obtidos, o interesse dos participantes pelo rápido crescimento profissional destacou-se como aspecto central nessa relação contratual. Conforme abordado por Xxxxx (2012) colocar o trabalho acima de tudo tornou-se uma necessidade para quem pretende atingir o topo da carreira. Na atual dinâmica do mundo do trabalho, trabalhar menos do que os demais passa a ser entendido como
fraqueza ou desmotivação. Esta interpretação foi claramente observada no discurso dos entrevistados, que percebem na empresa onde trabalham a oportunidade de ascender mais rapidamente em suas carreiras, através de uma dedicação intensa. Esse é um dos motivos que parecem impelir os trabalhadores a vivenciarem a realidade de alta performance.
A satisfação pessoal, reconhecimento e realização profissional também foram questões amplamente citadas pelos participantes, mostrando que motivações intrínsecas são de grande importância para pessoas cuja dedicação ao trabalho é mais intensa do que o usual. De fato, segundo Xxxxxxxxx (2002), sistemas de trabalho de alta performance geralmente aumentam as recompensas intrínsecas do trabalho, aumentando também a satisfação e o compromisso do trabalhador. Além disso, o desafio intelectual, a oportunidade de trabalhar com pessoas altamente qualificadas e o reconhecimento da dedicação intensa, por meio de promoções e remuneração variável, são questões consideradas cruciais para o trabalho de alta performance, que apareceram, com mais ou menos intensidade, nos relatos dos entrevistados.
A imagem positiva da empresa no mercado, muitas vezes atrelada à uma posição de liderança, também foi destacada como um dos motivos que levam os participantes a uma maior dedicação. Parte deles acredita que serão bem vistos no mercado, tornando seu currículo mais atrativo, após a passagem por empresas com qualificação positiva, por isso aceitam trabalhar por mais horas e de forma mais intensa.
A meritocracia também foi citada por alguns entrevistados como parte do acordo de troca com as empresas. De fato, conforme exposto por Xxxxx (2012), há um atraente prêmio em disputa entre os melhores profissionais. Nunca os executivos trabalharam tanto, mas também nunca foram tão bem remunerados. A realidade é de salários potencialmente elevados para quem alcança os melhores postos de trabalho. Como há mais gente do que cargos – pelo menos os cargos realmente atraentes – a briga se torna extremamente acirrada. Só “chega lá” quem está disposto a trabalhar mais do que os concorrentes. Portanto, alguns participantes têm a questão financeira como motivadora para trabalhar por mais horas e com maior dedicação: sabem que dessa forma terão salários mais atrativos, seja na forma de bônus, participação nos lucros, remuneração variável ou uma promoção com aumento do salário fixo. A motivação financeira
caracteriza o acordo de troca entre boa parte dos entrevistados e suas organizações como um contrato transacional, que representam os interesses materiais dos trabalhadores.
Embora o objetivo inicial do trabalho tenha sido examinar as relações de trabalho de alta performance à luz da literatura de contrato psicológico, verificou- se, nas entrevistas, que haviam custos atrelados a esse tipo de trabalho, que foram citados pelos participantes. A intensificação do trabalho e suas consequências foram, portanto, aspectos que emergiram das falas dos entrevistados, merecendo atenção na análise dos resultados, pois revelam as contradições e dilemas vivenciados por aqueles que optam por trabalhar em empresas ditas de alta performance. Observou-se que, embora aleguem ter prazer na realização de suas atividades, a extensão da jornada de trabalho para muito além das oito horas diárias é considerada um custo, prejudicando a vida pessoal desses trabalhadores.
Identificou-se, ainda, os motivos que levam à extensão da jornada de trabalho, concluindo-se que, embora muitos participantes gostem das atividades realizadas em seus empregos, a maioria não gosta de trabalhar por longas horas e, se pudessem optar, escolheriam trabalhar menos horas por dia. Conforme exposto por Xxxxx (2012), não apenas presidentes e diretores realmente atarefados ficam na empresa além do expediente normal, mas também gerentes e aspirantes a cargos mais altos que querem copiar as atitudes de seus chefes. Parece, portanto, estar surgindo uma cultura nessas empresas em que trabalhar, no mínimo, doze horas por dia tornou-se um padrão a ser seguido pelos funcionários que desejam não só ascender em suas carreiras, mas até mesmo permanecer dentro das organizações.
A consequência imediata dessa realidade é a interferência direta na vida pessoal dos trabalhadores. Atividades simples, como a prática de exercícios ou o estudo, ficam prejudicadas e acabam sendo jogadas para segundo plano. A vida familiar também é afetada, já que o tempo destinado ao parceiro e aos filhos torna-se cada vez mais escasso, dada a quantidade de horas que as pessoas permanecem nas organizações. Sobre o tema, Hulst e Xxxxxxx (2006) apontam que as consequências negativas para a saúde e para o bem-estar dependem das possibilidades internas que as pessoas têm de se recuperarem durante o dia e após o trabalho. O problema se torna maior quando o tempo de recuperação é pequeno, assim como quando a qualidade da recuperação se torna pobre por causa dos
efeitos do excesso de trabalho para a vida pessoal, o que ocorre em situações de alta demanda.
Uma questão levantada por boa parte dos entrevistados foi o fato de encararem a extensão da jornada de trabalho como um momento da vida profissional. Para essas pessoas, o fato de trabalharem por longas horas é encarado como uma fase da carreira em que precisam se dedicar mais para obterem o crescimento e sucesso profissional a que aspiram. Dessa forma, acreditam que, com o passar dos anos e com a formação de uma família irão diminuir o ritmo e vivenciar uma realidade de trabalho menos intensa, permanecendo menos horas nas organizações e dedicando-se mais à vida pessoal do que a profissional.
Essa percepção dos entrevistados abre caminho para uma discussão relevante e, aparentemente, sem resposta. Espera-se dos trabalhadores que atingem cargos gerenciais altos, de diretoria ou até mesmo presidência, que aumentem ainda mais sua dedicação à empresa, justamente pela posição que ocupam o que, em última análise, significa uma maior responsabilidade, atrelada à mais horas trabalhadas e um dispêndio de energia ainda maior. Portanto, fica difícil imaginar de que maneira os entrevistados, e os trabalhadores em geral, poderão desacelerar o ritmo de trabalho, uma vez que o caminho que buscam trilhar os conduz a assumirem cargos cada vez mais altos nas empresas em que trabalham.
No caso das mulheres entrevistadas essa questão faz-se ainda mais relevante, já que a conciliação da vida familiar com o ritmo de trabalho típico das empresas de alta performance é considerada, pelas entrevistadas, quase uma impossibilidade. Para elas, encarar a extensão da jornada de trabalho como uma fase da vida profissional é uma questão crucial, já que não enxergam a possibilidade de conciliar a maternidade com os trabalhos tipicamente vivenciados em empresas de alta performance.
Como conclusão final, o que se observou com este estudo foi que o trabalho considerado de alta performance é uma realidade vivenciada hoje no Brasil, e uma tendência crescente nos últimos anos. Esse trabalho mostrou, através da análise dos relatos dos entrevistados, quais são os motivos que levam os trabalhadores a aceitarem trabalhar em empresas de alta performance, bem como quais as relações de troca existente entre funcionários e suas organizações. Embora não fosse o objetivo inicial deste estudo, o que se observou durante a
análise dos resultados foi um custo atrelado à esse tipo de relação, decorrente do aumento da jornada de trabalho para muito além das oito horas contratuais, resultando em um tempo reduzido para a vida pessoal – incluindo à dedicação aos parceiros e família – e a dificuldade de realizar atividades fora do trabalho, como atividades física ou estudos. Nesse sentido, trabalhar em empresas de alta performance, embora aparentemente seja uma opção feita pelos entrevistados, abre caminho para uma nova discussão acerca dos custos existentes nesse tipo de relação. Até que ponto esses custos devem ser aceitos pelos trabalhadores? Será que não existe uma maneira de minimizar os efeitos prejudiciais causados pelo excesso de horas trabalhadas? Pode-se indagar, ainda, se não seria necessária uma mudança por parte dessas empresas ditas de alta performance na sua maneira de se relacionar com seus funcionários, o que poderia implicar, em última análise, na alteração da cultura organizacional. Permanecer por mais tempo dentro da organização não melhora necessariamente o desempenho dos funcionários, nem significa trabalhar mais. Ao contrário, pode muitas vezes gerar condições de trabalho insatisfatórias, uma vez que os trabalhadores sentem outras áreas de suas vidas prejudicadas, o que lhes provoca frustração e desmotivação. Nesse sentido, as empresas ditas de “alta performance” podem correr o risco de sofrerem queda justamente no desempenho de seus funcionários, em função tanto da exaustão dos mesmos quanto da retaliação motivada pela pouca chance que estes tem de se dedicarem à vida pessoal.
Sugestões para Estudos Futuros
Como sugestões para pesquisas futuras correlatas ao tema deste estudo, seria interessante abordar a visão das empresas de alta performance que empregam funcionários interessados nesse tipo de trabalho. Analisar, do ponto de vista das empresas, quais são as características necessárias e valorizadas nos funcionários, para que possam ingressar nestas organizações.
Um tema relevante que surgiu durante a realização das entrevistas deste estudo foi a questão de que o aumento da jornada de trabalho, com maior dispêndio de energia, faz parte de uma fase da carreira profissional das pessoas, para que atinjam o crescimento profissional desejado. Dessa forma, seria interessante pesquisar, em um estudo futuro, de que maneira os trabalhadores
conseguem diminuir o ritmo acelerado de trabalho, após a formação de uma família. Este estudo poderia ser direcionado ao público feminino, já que a inserção das mulheres no mercado de trabalho é definitiva, e a maioria delas já compete pelos cargos que em um passado recente eram exclusivos aos homens. Xxxxxxxx, portanto, como as mulheres conseguem conciliar uma vida doméstica, incluindo a formação de uma família, com o mercado de trabalho que exige uma dedicação cada vez maior, em termos de horas e energia, é uma sugestão para estudos futuros.
Para aprofundar o alcance deste trabalho, é possível ampliar as análises feitas através da realização de novas entrevistas e da inclusão de perguntas nas mesmas, o que poderia levar a descoberta de novos aspectos relacionados aos motivos que levam os trabalhadores a aceitarem trabalhar em empresas definidas como de alta performance, e novas questões referentes às relações de troca existentes entre estas empresas e seus funcionários. A pesquisa atual, realizada apenas no Brasil, poderia ainda ser replicada para outros países, possibilitando uma comparação entre as realidades de diferentes culturas.
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