TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA | CÍVEL
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA | CÍVEL
Acórdão
Processo
2242/10.1YXLSB.L1-6
Data do documento
2 de maio de 2013
Relator
Anabela Calafate
DESCRITORES
Contrato de adesão > Cláusula penal
SUMÁRIO
Tendo o contrato de locação por objecto equipamento informático e não decorrendo do clausulado contratual que a locadora possa vir a comercializar novamente esses bens e que não sofra prejuízo por ter investido o seu capital na sua aquisição para os entregar ao locatário, não é manifestamente desproporcionada a cláusula penal que atribui à locadora a faculdade de, ao resolver o contrato, exigir o pagamento imediato do valor correspondente a todos os alugueres que seriam devidos até ao final do prazo previsto no contrato apesar de o locatário ser obrigado a devolver o equipamento.
TEXTO INTEGRAL
N | | Texto Parcial: | S | | | | | Meio Processual: | APELAÇÃO | | Decisão: | IMPROCEDENTE | | | | | Sumário: | Tendo o contrato de locação por objecto equipamento informático e não decorrendo do clausulado contratual que a locadora possa vir a comercializar novamente esses bens e que não sofra prejuízo por ter investido o seu capital na sua aquisição para os entregar ao
locatário, não é manifestamente desproporcionada a cláusula penal que atribui à locadora a faculdade de, ao resolver o contrato, exigir o pagamento imediato do valor correspondente a todos os alugueres que seriam devidos até ao final do prazo previsto no contrato apesar de o locatário ser obrigado a devolver o equipamento. | | Decisão Texto Parcial: | Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa
I – Relatório
G Renting, Sa instaurou acção declarativa sob a forma de processo sumário contra M – Acessórios para Móveis e Estofos S A, pedindo:
1º) seja julgada válida a resolução do Contrato de Locação nº 094-001680, celebrado entre Autora e Ré, por incumprimento definitivo e culposo imputado à Locatária, ora Ré, comunicada extrajudicialmente por carta registada com aviso de recepção, recebida em 21/12/2009; ou se assim não for entendido, declarada a resolução do contrato;
2º) seja a Ré condenada a pagar à Autora as quantias devidas nos termos do Contrato de Locação, respeitantes aos alugueres, IVA, prémio de seguro, taxa de serviço, despesas, indemnização/cláusula penal e juros de mora vencidos, liquidados nos seguintes montantes:
2.1) 668,67 €, resultante da soma dos alugueres vencidos e não pagos, de 26/06/2009 a 31/12/2009, constantes das Facturas nºs 7961/2009,7962/2009 e 12280/2009;
2.2) 183,25 €, relativos ao prémio de seguro e à taxa de serviço, constante das Facturas nº 7959/2009 e 7960/2009;
2.3) 83,50 €, correspondente às despesas com os custos dos Avisos da Locadora, os custos de retorno das entradas de débito directo e os honorários pela interpelação do advogado, de 25/09/2009;
2.4) 4.554,20 €, correspondente à indemnização pelos prejuízos causados pelo incumprimento do contrato de locação (cláusula penal), equivalente ao valor dos alugueres vincendos após a resolução do contrato;
2.5) 844,50 €, respeitantes aos juros de mora vencidos, liquidados nos termos convencionados, até 26/11/2010;
2.6) subsidiariamente ao pedido 2.4), caso o mesmo não seja julgado totalmente procedente, deverá a indemnização peticionada no pedido 2.4) ser recalculada, nos termos do art. 1045º nº 2 do Código Civil, e a ré condenada a indemnizar a Autora pela mora na restituição, em montante correspondente ao dobro do valor do aluguer mensal, ou seja, 222,23 € por mês, ou o respectivo proporcional diário de 7,41 € (222,23 € : 30 dias), após a data da cessação do contrato de locação, desde 01/01/2010 até à restituição em 20/10/2010, na quantia de 2.148,22 €, correspondente a: (9 meses x 222,23 € = 2.000,07 €) + 20 dias x 7,41 € = 148,15) (cfr ampliação do pedido requerida em 07/03/2012 e admitida por despacho de 08/03/2012 de fls. 205)
3º) seja a Ré condenada a pagar à Autora as quantias que se vierem e liquidar a final, no acto de pagamento voluntário, em execução de sentença, a título de juros de mora vincendos, desde 27/11/2010, até integral pagamento, a liquidar às taxas convencionadas – taxa legal de juros comerciais acrescida de 8% sobre os montantes devidos a título de alugueres vencidos e vincendos (indemnização), ou seja, sobre as quantias dos pedidos 2.1) e 2.4); e à taxa legal de juros comerciais acrescida de 5% em relação a dívidas de outra natureza, nomeadamente a quantia do pedido 2.2) e 2.3).
Alegou, em síntese:
- celebrou com a Ré um contrato de locação com a duração de 48 meses referente a três unidades de localização de viaturas por GPS, que para esse efeito comprou e que foram entregues à Ré;
- a Ré não procedeu ao pagamento de diversas facturas relativas aos alugueres e outras importâncias devidas, pelo que a Autora resolveu o contrato por carta de 17/12/2009;
- o equipamento só foi devolvido à Autora em 20/10/2010 e nada foi pago pela Ré.
A Ré contestou, pugnando pela improcedência da acção e invocando, em resumo:
- não leu nem analisou os documentos que assinou, não tendo tomado consciência de que estava a celebrar um contrato com a Autora;
- comunicou a resolução do contrato ao fornecedor dos bens;
- trata-se de um contrato de adesão, que é nulo por violação dos deveres de comunicação e de informação, nos termos do art. 8º al a) e b) do DL 446/85;
- também é nulo por conter cláusulas prevendo prazos excessivos para a vigência do contrato ou para a sua denúncia, ou por estabelecerem garantias demasiado elevadas ou excessivamente onerosas em face do valor a assegurar, em violação do disposto no art. 22º nº 1 al a) e m) do DL 446/95.
A Autora respondeu à contestação sustentando a validade do contrato e que não recebeu qualquer comunicação de resolução do contrato e nem a mesma tinha qualquer fundamento legal ou convencionado.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e em consequência:
1. julgou válida a resolução do contrato de locação número 094-001680, celebrado entre a Autora G Renting, S.A. e a Ré M– Acessórios para Móveis e Estofos, S.A., por incumprimento definitivo culposo imputado à locatária, ora Ré, comunicada extrajudicialmente, por carta registada com aviso de recepção recebida em 21 de Dezembro de 2009;
2. condenou a Ré a pagar à Autora as quantias devidas nos termos do contrato de locação, respeitantes a alugueres, IVA, prémio de seguro, taxa de serviço, despesas, indemnização/cláusula penal e juros de mora vencidos, liquidadas nos montantes seguintes:
2.1. € 668,67, resultante da soma dos alugueres vencidos e não pagos, de 26
de Junho de 2009 a 31 de Dezembro de 2009, constantes das facturas números 7961/2009, 7962/2009 e 12280/2009;
2.2. € 183,25, relativos ao prémio de seguro e à taxa de serviço, constante das facturas números 7959/2009 e 7960/2009;
2.3. € 83,50, correspondente às despesas com os custos dos avisos da locadora, os custos de retorno das entradas de débito directo e os honorários pela interpelação do Advogado, de 25 de Setembro de 2009;
2.4. € 4.554,20, correspondente à indemnização pelos prejuízos causados pelo incumprimento do contrato de locação (cláusula penal), equivalente ao valor dos alugueres vincendos após a resolução do contrato;
2.5. € 844,45, respeitantes a juros de mora vencidos e liquidados nos termos convencionados, até 26 de Novembro de 2010;
3. condenou a Ré a pagar à Autora as quantias que se vierem a liquidar a final, no acto de pagamento voluntário, em execução de sentença, a título de juros de mora vincendos desde o dia 27 de Novembro de 2010 até integral pagamento, a liquidar às taxas convencionadas – à taxa legal de juros comerciais acrescida de 8 % sobre os montantes devidos a título de alugueres vencidos e vincendos (indemnização), ou seja, sobre as quantias dos pedidos 2.1. e 2.4.; e à taxa legal de juros comerciais acrescida de 5 %, em relação a dívidas de outra natureza, nomeadamente, as quantias dos pedidos 2.2. e 2.3..
Inconformada, apelou a Ré, e tendo alegado, formulou as seguintes conclusões:
1. O MM Xxxx a quo não considerou, na apreciação que realizou da prova produzida, a repartição do ónus da sua concretização, seja por não considerar a inversão que o artigo 5.º do Dec. Lei 446/85 (aplicável por o contrato dos autos ser de adesão), seja por não considerar a inversão inerente à prova de factos negativos, seja por total ausência de prova. Assim:
2. Não deveria o MM Juiz a quo ter considerado provados os seguintes factos: “6. A Ré poderia adquirir esses equipamentos por compra a efetuar diretamente
à referida fornecedora, mediante o pagamento do respetivo preço, num total de
€ 4 320,00; ou, em alternativa, utilizar esses equipamentos, se os mesmos lhe fossem disponibilizados através de locação, pelo pagamento de alugueres mensais e evitando a despesa inicial;”
“7. A Ré optou pela locação desses equipamentos, tendo, então, tido conhecimento da existência da ora Autora como sendo uma empresa vocacionada para o aluguer de equipamentos informáticos e outros como aqueles que a Ré pretendia utilizar;”
“8. No referido circunstancialismo, no âmbito da sua atividade, a Autora recebeu uma “proposta de locação”, na qual estava interessada a ora Ré como proponente locatária;”
“9. A “proposta de locação” constava de uma minuta de contrato, disponibilizada junto da empresa fornecedora que, depois de preenchida, a proponente Xx xxxxxxxx, aceitou, assinou e carimbou, tendo sido remetida à ora Autora, que a analisou e aceitou;”
“10. Autora e Ré subscreveram o documento de fls. 160 a 163 dos autos, intitulado “Locação Clássica – Contrato de Locação para Clientes Empresariais – Corporate Clients”;”
“11. (…) Ao qual foi atribuído o número 094-001680 e de que fazem parte integrante as Condições Gerais de Locação e os Termos e Condições Gerais Relativas ao Seguro de Propriedade (cujo original se encontra a fls. 160 a 163 e confirmação de aceitação a fls. 164);”
“15. A Ré ficou de indicar o número de identificação da conta bancária (NIB), através do qual o débito direto poderia ser efetuado, o que veio a suceder;” “16. Ficou, igualmente, acordado no contrato de locação que “caso o Locatário escolha uma forma de pagamento diferente do débito direto, o montante do aluguer será acrescido de EUR 10,00, mais IVA, confrontar Secção 6, n.º 2”;” “17. Do mesmo contrato constam, ainda, as declarações da Ré de aceitação, de informação e de esclarecimento das condições constantes das Condições Gerais
de Locação anexas ao contrato, bem com os termos constantes do contrato de compra e venda dos bens locados celebrado entre a Autora e a fornecedora, relativamente às regras relativas a defeitos nos bens locados e condições de garantias dos mesmos;”
“18. Encontra-se subscrito pela Ré o documento de fls. 164 dos autos, relativo ao contrato acima identificado – “Confirmação de Aceitação” – datado de 26 de junho de 2009 (…)”:
“41. O montante dos alugueres teve em consideração o custo de aquisição dos bens escolhidos pela Ré, as despesas normais de execução do contrato, o lucro estimado e a duração do contrato;”
3. Deveria o MM Juiz a quo ter considerados provados os seguintes factos: Artigo 49.º da Contestação: “R. nunca teve contacto directo com a A.”;
Artigo 50.º da Contestação: “o contrato celebrado entre a R. e a A. foi apresentado à R. pelo fornecedor e nunca pela própria contraente A.”;
Artigo 51.º da Contestação: “pois, da actuação da fornecedora, decorre a existência de um acordo comercial entre esta e a A., nos termos dos quais, aquela apresenta a proposta de locação e recolhe as assinaturas e mais elementos necessários.”;
Artigo 52º da Contestação: “a fornecedora tem portanto na sua posse os contratos de locação que lhe são entregues pela A.”;
Artigo 53º da Contestação: “em nenhum momento a A., através dos seus representantes, aparece na celebração dos seus contratos de locação.”;
Artigo 54º da Contestação: “Não tendo assim oportunidade para informar, explicar, esclarecer o conteúdo do contrato que celebra.”
Artigo 55.º da Contestação: “a fornecedora sendo representante da A., limita- se, contudo, única e exclusivamente a apresentar os contratos e recolher assinaturas.”
Artigo 56.º da Contestação: “Não tem esta qualquer habilitação para proceder ao esclarecimento do conteúdo do contrato de locação”.
4. Isto posto, por violação do dever de comunicação, deverão ser consideradas excluídas todas as cláusulas do contrato de locação dos autos, nos termos do artigo 8.º alíneas a) e b) do mencionado Dec. Lei n.º 446/85.
5. Não sendo possível a aplicação das normas supletivas subsumíveis, por decorrer inequívoco dos documentos de fls … que, se tivesse e Recorrente previsto todas as circunstâncias do contrato, conjeturalmente não manifestaria a sua vontade de o celebrar.
6. É assim o contrato celebrado nulo, nada havendo a pagar pela Recorrente, face a entrega dos bens que tinha em seu poder, os quais nunca cumpriram a função para a qual haviam sido entregues, não tendo a Recorrente retirado da sua posse qualquer benefício.
7. Quando assim se não entenda, e sem prescindir, e se considere que o contrato produziu e cessou os seus efeitos, sempre, ainda assim, se deverá considerar as cláusulas penais, insertas nos números 12 e 15 do contrato, abusivas, por terem carácter compulsório, sendo, por isso, e atendendo ao quadro negocial padronizado, proibidas e, por consequência, nulas, nos termos dos artigos 16º, al. c) e 12 do Dec. 446/85, nulidade que se invocou.
8. Nesta circunstância só será exigível o pagamento das rendas vencidas peticionadas, acrescidas de juros moratórios à taxa legal.
A Autora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.
Colhidos os vistos, cumpre decidir II – Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art.º 684º nº 3 e 685º-A nº 1 e 660º nº 2 do CPC), pelo que as questões a decidir são estas:
- se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto
- se o contrato é nulo por violação dos deveres de comunicação e de informação
- se as cláusulas penais contidas nas cláusulas 12 e 15 do contrato são nulas
III – Fundamentação
A) Na sentença recorrida vem dado como provado:
1. A Autora é uma sociedade comercial que iniciou a sua actividade em Portugal, no segundo trimestre de 2008, tendo o objecto social seguinte: “aluguer de equipamento de escritório, de máquinas e de equipamento informático, incluindo software e hardware, actividades relacionadas e revenda de equipamentos usados. Aquisição de equipamentos informáticos, software e outros bens para aluguer e aluguer dos mesmos, prestação de consultoria de serviços relativos a manutenção e reparação de equipamentos informáticos, software e outros bens, tanto novos como usados. Aquisição e venda de imóveis” (certidão permanente com o código 4172-2532-2376);
2. A Ré é uma sociedade comercial que, no âmbito da sua actividade, além do mais, transporta móveis, tendo veículos ao seu serviço, que procurou dotar com sistemas de localização por GPS para poder controlar onde se encontram, coordenar e organizar o serviço, velar pela segurança e gerir de forma mais eficiente os percursos dos veículos;
3. Para o exercício da sua actividade, a Ré escolheu três unidades de localização de viaturas por GPS, com os números de série 02-039-20615-4010, 02-048-20810-8008 e 02-048-20810-9010, identificadas na factura número 1035, de 29 de Junho de 2009;
4. Em Junho de 2009, a Ré contactou/foi contactada pela sociedade R, Localização por Satélite, Unipessoal, Lda., tendo tomado conhecimento dos preços dos equipamentos que pretendia utilizar na sua actividade e das especificações técnicas;
5. Em Junho de 2009, a Ré escolheu as três unidades de localização de viaturas por GPS acima identificadas, que tinham o valor comercial de € 4.320,00;
6. A Ré poderia adquirir esses equipamentos por compra a efectuar
directamente à referida fornecedora, mediante o pagamento do respectivo preço, num total de € 4 320,00; ou, em alternativa, utilizar esses equipamentos, se os mesmos lhe fossem disponibilizados através de locação, pelo pagamento de alugueres mensais e evitando a despesa inicial;
7. A Ré optou pela locação desses equipamentos, tendo, então, tido conhecimento da existência da ora Autora como sendo uma empresa vocacionada para o aluguer de equipamentos informáticos e outros como aqueles que a Ré pretendia utilizar;
8. No referido circunstancialismo, no âmbito da sua actividade, a Autora recebeu uma “proposta de locação”, na qual estava interessada a ora Ré como proponente locatária;
9. A “proposta de locação” constava de uma minuta de contrato, disponibilizada junto da empresa fornecedora que, depois de preenchida, a proponente Xx xxxxxxxx, aceitou, assinou e carimbou, tendo sido remetida à ora Autora, que a analisou e aceitou;
10. Autora e Ré subscreveram o documento de fls. 160 a 163 dos autos, intitulado “Locação Clássica – Contrato de Locação para Clientes Empresariais – Corporate Clients”;
11. (…) Ao qual foi atribuído o número 094-001680 e de que fazem parte integrante as Condições Gerais de Locação e os Termos e Condições Gerais Relativas ao Seguro de Propriedade (cujo original se encontra a fls. 160 a 163 e confirmação de aceitação a fls. 164);
12. No contrato prevê-se a identificação da locatária como sendo a ora Ré e a da locadora como sendo a ora Autora; a identificação da fornecedora do equipamento como sendo a sociedade R, Localização por Satélite, Unipessoal, Lda.; a identificação dos bens locados como “Localização de Viaturas GPS”; a duração do contrato como sendo por 48 meses (“Termo inicial base 48 meses”); o aluguer mensal líquido no montante de € 90,36, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, no montante total ilíquido de € 108,43;
13. O pagamento dos alugueres seria efectuado trimestralmente por débito directo;
14. Consta, igualmente, referida a existência de uma “Taxa de serviço (prestação única) EUR 75,00 acrescido de IVA”;
15. A Ré ficou de indicar o número de identificação da conta bancária (NIB), através do qual o débito directo poderia ser efectuado, o que veio a suceder;
16. Ficou, igualmente, acordado no contrato de locação que “caso o Locatário escolha uma forma de pagamento diferente do débito directo, o montante do aluguer será acrescido de EUR 10,00, mais IVA, confrontar Secção 6, n.º 2”;
17. Do mesmo contrato constam, ainda, as declarações da Ré de aceitação, de informação e de esclarecimento das condições constantes das Condições Gerais de Locação anexas ao contrato, bem como os termos constantes do contrato de compra e venda dos bens locados celebrado entre a Autora e a fornecedora, relativamente às regras relativas a defeitos nos bens locados e condições de garantias dos mesmos;
18. Encontra-se subscrito pela Ré o documento de fls. 164 dos autos, relativo ao contrato acima identificado – “Confirmação de Aceitação” – datado de 26 de Junho de 2009, do qual consta, designadamente, o seguinte:
“Atenção: O Locador irá pagar o preço de aquisição do bem locado ao fornecedor após assinatura da confirmação de aceitação. No caso do Locatário não testar o funcionamento do bem e/ou no caso de assinar este documento antes de receber os bens completos em perfeitas condições, o Locatário indemnizará o Locador relativamente a quaisquer reclamações, bem como pelos danos em que o Locador tenha incorrido”. (…)
1. Eu/Nós recebemos o bem locado identificado supra na data da aceitação.
2. O bem locado encontra-se em condições perfeitas e de funcionamento.
3. O bem locado foi entregue na totalidade. Eu/Nós verificámos que estava completo e que funcionava.
4. O bem locado corresponde à sua descrição constante na proposta/contrato
de locação, bem como aos acordos concluídos com o fabricante e/ou fornecedor (nomeadamente de natureza técnica, relativamente à qualidade e performance asseguradas). O bem locado tem as características asseguradas pelo fornecedor.
5. O bem locado está nas condições garantidas pelo fornecedor e/ou terceiros.
6. Entre o Locatário e a G Renting, S.A. apenas terão validade os acordos confirmados por escrito pelo Locatário à G Renting, S.A.. Isto aplica-se igualmente a um desvio de uma condição constante do presente documento.
7. O minha/nossa proposta de locação será submetida novamente, excepto no caso de já ter sido aceite. Eu/Nós permanecemos vinculados a esta proposta pelo prazo de 3 semanas após receber a confirmação de aceitação pelo Locador.
Eu/Nós recebemos uma cópia (duplicado) da confirmação de aceitação hoje”;
19. O referido contrato foi assinado pelos legais representantes da Ré e da Autora e colocados os carimbos identificativos das sociedades (Ré e Autora);
20. Os equipamentos acima identificados foram entregues à Ré, directamente pela fornecedora, em 26 de Junho de 2009, conforme “Confirmação de Aceitação” já mencionada e também assinada pela empresa fornecedora;
21. Os equipamentos e respectiva fornecedora foram escolhidos pela Ré, tendo a mesma recebido as três unidades de localização de viaturas por GPS, em 26 de Junho de 2009, no estado de novas;
22. Após a entrega dos bens à Ré e a recepção pela Autora do documento de “Confirmação de Aceitação” assinado, em 1 de Julho de 2009 esta procedeu ao pagamento dos bens pelo preço total de € 4.320,00, com a única finalidade de serem alugados à Ré;
23. Em 2 de Julho de 2009, a Autora emitiu e enviou à Ré quatro facturas e um exemplar do contrato em apreço, concretamente:
a) Factura n.º 7959/2009, relativa ao prémio de seguro pro rata, para o período de 26/06/2009 a 31/12/2009, no montante de € 83,25, vencida em 13/08/2009;
b) Factura n.º 7960/2009, relativa à taxa de serviço referida no identificado contrato n.º 094-001680, no valor de € 90,00, vencida em 30/07/2009;
c) Factura n.º 7961/2009, referente ao proporcional dos alugueres no período de 26/06/2009 a 30/06/2009, no montante de € 18,07, vencida em 16/07/2009; e
d) Factura n.º 7962/2009, referente aos alugueres de Julho, Agosto e Setembro de 2009, no montante de € 325,30, vencida em 16/07/2009;
24. As quantias constantes das referidas facturas foram apresentadas a pagamento por débito directo, após as datas dos respectivos vencimentos, tendo as entradas de débito directo sido devolvidas com a informação de “reclamação de débito directo”;
25. A Ré foi contactada para regularizar os pagamentos, não o tendo feito;
26. Quando o sistema informático da Autora detectou a falta de pagamento das facturas números 7959/2009 e 7960/2009, emitiu e enviou à Ré um aviso a reclamar o pagamento de € 173,25, acrescido de € 5,00 de custos do aviso, num total de € 178,25; não obstante, as demais facturas emitidas e enviadas à Ré não tinham sido pagas;
27. Pese embora o aviso de 2 de Setembro de 2009, a Ré não pagou, ficando por liquidar os alugueres vencidos desde 26 de Junho de 2009, o prémio de seguro, a taxa de serviço e os custos do aviso;
28. Em 25 de Setembro de 2009, o Mandatário da Autora enviou à Ré uma carta a instá-la ao pagamento das facturas vencidas, das despesas com o custo do aviso e dos honorários correspondentes, tudo no montante global de € 256,75;
29. A carta foi recebida, mas a Ré não deu resposta nem efectuou o pagamento, sendo o montante realmente em falta superior ao reclamado, uma vez que nenhuma das facturas emitidas foi paga;
30. Em 26 de Setembro de 2009, a Autora emitiu e enviou à Ré a factura n.º 12280/ /2009, relativa aos alugueres de Outubro a Dezembro de 2009, no montante de € 325,30, vencida em 4 de Outubro de 2009;
31. Tal factura foi apresentada a pagamento por débito directo, tendo a respectiva entrada sido devolvida com a informação de “ADC cancelado”;
32. Em 27 de Outubro de 2009 foi enviada à Ré uma carta, identificada no assunto como “último aviso antes da resolução do contrato por falta de pagamento de alugueres - Incumprimento do Contrato de Locação n.º 094001680”, processada automaticamente, não tendo na mesma sido incluídas todas as facturas por pagar;
33. Na dita carta, foram liquidados os juros de mora vencidos e reclamado o pagamento das despesas no montante de € 83,50, respeitantes aos custos dos avisos da Autora, aos custos de retorno de entradas de débito directo e aos honorários pela interpelação do Advogado, de 25 de Setembro de 2009, reclamando-se o pagamento da quantia total de € 590,59, por parte da Ré;
34. A carta foi recebida pela Ré, mas o pagamento das referidas quantias continuou por realizar, com a ausência de uma justificação para o facto;
35. Em consequência do acima exposto, em 17 de Dezembro de 2009, a Autora, nos termos previstos na “Secção 15, n.º 2, das Condições Gerais de Locação”, enviou à Ré, por correio registado com aviso de recepção, a “comunicação de resolução do contrato por falta de pagamento de alugueres – Incumprimento Definitivo do Contrato de Locação n.º 094001680” (cuja cópia se encontra de fls. 73 a 76 dos autos), onde se invocaram os factos que levaram a que o contrato fosse considerado definitivamente incumprido, por motivos só imputados à Ré;
36. (…) Comunicação que esta recebeu em 21 de Dezembro de 2009;
37. Nessa mesma comunicação foi solicitado que os equipamentos em apreço fossem devolvidos e entregues à Autora, nos termos ajustados (por conta e risco da Ré), até dia 5 de Janeiro de 2010, indicando-se a sede da Autora, em Lisboa, como sendo o local da sua restituição;
38. Na dita comunicação foi, ainda, reclamado o pagamento da indemnização correspondente ao valor dos alugueres que se venceram antecipadamente, na
data da resolução, identificados na conta corrente anexa, cujo montante total ascendia, à data da comunicação, a € 4 554,20 (“Valor Pecuniário das rendas futuras”);
39. A aludida comunicação foi acompanhada por dois anexos, a saber:
- Anexo 1: extracto de conta corrente com montantes em falta (embora com a omissão das demais facturas que também se encontram por pagar, rectificada na petição);
- Anexo 2: minuta de formulário de acompanhamento para a devolução/
/restituição de bens, a fim de ser preenchido, assinado, remetido por fax e junto a acompanhar a devolução dos equipamentos em apreço;
40. Os equipamentos em causa, depois de utilizados, não são comercializados, não existindo procura (para aluguer ou aquisição) dos mesmos, no estado de usados;
41. O montante dos alugueres teve em consideração o custo de aquisição dos bens escolhidos pela Ré, as despesas normais de execução do contrato, o lucro estimado e a duração do contrato;
42. Na sequência de um fax enviado à Ré em 13 de Outubro de 2010, a reclamar não só a restituição dos equipamentos como o pagamento em falta, em 20 de Outubro de 2010 a Ré permitiu que a Autora levantasse os referidos bens, mas nada lhe pagou;
43. No dia 21 de Julho de 2009, a Ré enviou um e-mail a Xxxxx, cuja cópia se encontra a fls. 111 e 112 dos autos, após algumas tentativas de contacto com o mesmo;
44. No dia 23 de Junho de 2010, o referido Xxxxx enviou um fax à Ré, cuja cópia se encontra a fls. 113 dos autos (em resposta a uma carta de 9 de Junho de 2010);
45. Por e-mail datado de 25 de Novembro de 2009 (com natureza “não confidencial”), enviado à então Mandatária da Ré - cuja cópia se encontra a fls.
143 e 144 dos autos - o Mandatário da Autora comunicou a posição da sua
cliente, em face da devolução das facturas remetidas à Ré.
B) Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
B.1 – Sobre os factos alegados na petição inicial (…)
B.2. Sobre os factos alegados na contestação (…)
Por quanto se disse, improcede integralmente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
C) O Direito
Pretende a apelante que sejam excluídas todas as cláusulas do contrato de locação nos termos do art. 8º al a) e b) do DL 446/85, alegando que não foi produzida prova do cumprimento do dever, que recai sobre a apelada, de se assegurar que a apelante apreendeu e compreendeu todo o clausulado contratual.
Como se refere na sentença recorrida, e nisso estão as partes de acordo, estamos perante um contrato de adesão. Daí que seja aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais estabelecido pelo DL 446/85 de 25/10.
O art. 5º desse diploma prevê:
«1 – As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.
2 – A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.
3 – O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante determinado que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.».
O art. 8º al a) determina que se consideram excluídas dos contratos singulares
as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º.
Da análise do documento de fls. 160 a 163, verificamos que os legais representantes da apelante, Xxxxxx e Xxxxx, apuseram as suas assinaturas a fls. 160, 162 e 163, o primeiro em 26/6/09 e o segundo em 01/07/09. Além disso, está provado que «A “proposta de locação” constava de uma minuta de contrato, disponibilizada junto da empresa fornecedora que, depois de preenchida, a proponente Ré analisou, aceitou, assinou e carimbou» (cfr facto 9) e que «A Ré ficou de indicar o número de identificação da conta bancária (NIB), através do qual o débito directo poderia ser efectuado, o que veio a suceder» (facto 15).
Perante tal factualidade conclui-se que foram comunicadas à apelante na íntegra e com antecedência necessária todas as cláusulas do contrato de locação e o escrito contendo os «Termos e Condições Gerais Relativas ao Seguro de Propriedade da G» para que à apelante se tornasse possível o seu conhecimento completo e efectivo usando de comum diligência.
Mostra-se assim cumprido o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva.
Quanto à alegada violação do dever de informação, também não assiste razão à apelante.
Dispõe o art. 6º do DL 446/85:
«1 – O contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
2 – Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados». O art. 8º al b) determina que se consideram excluídas dos contratos singulares as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde a que não seja a esperar o seu conhecimento efectivo.
Lendo as cláusulas insertas no documento de fls. 160 a 163 verifica-se que não se revestem de complexidade, pelo que não se vislumbra que algum dos seus
aspectos justificasse alguma aclaração. Xxxxx, nem a apelante identifica qualquer aspecto que, no seu entender, seja de difícil compreensão. Acresce que não alegou a apelante que lhe tenha sido recusado qualquer esclarecimento por si solicitado.
Assim, não se mostra preenchida a previsão do art. 8º al b) do DL 446/85. Concluindo, não existe fundamento para considerar excluídas todas as cláusulas do contrato por violação dos deveres de comunicação e de informação.
Apreciemos agora a questão da alegada nulidade das cláusulas 15 e 17 das
«Condições Gerais de locação».
Segundo a apelante, ainda que se considere que o contrato produziu efeitos jurídicos e que a resolução foi validamente operada, apenas será exigível o pagamento das rendas vencidas acrescidas dos juros moratórios à taxa legal, porque as cláusulas penais insertas nos números 12 e 15 do contrato são abusivas e em consequência nulas, atendendo ao quadro negocial padronizado, nos termos do art. 00x xx x) x xx xxx. 00x xx XX 446/85.
Lê-se na sua alegação:
«Ora, estabelece a cláusula 17 do contrato dos autos uma dupla penalização pelo não cumprimento do contrato, equivalente à totalidade das rendas vincendas à data da cessação da produção dos seus efeitos; como estabelece a cláusula 15 do contrato em questão, uma sobretaxa de juros moratórios de 8%, a acrescer à taxa legal;
Tais valores são verdadeiras cláusulas penais compulsórias, ostensivamente superiores ao montante dos prejuízos que a Recorrida suporta pela cessação prematura do contrato, pelas razões já aduzidas, tanto mais que, a operarem, poriam a recorrida na situação de cessar o contrato, cessando necessariamente a prestação da sua obrigação de disponibilização do uso do bem até ao final do prazo convencionado e exigindo o cumprimento, por parte da Recorrente, do pagamento antecipado da totalidade do preço de uma prestação que,
evidentemente, não receberá.
Pelo pagamento das mencionadas cláusulas penais, ficaria a Recorrida duplamente beneficiada, pela antecipação da totalidade dos valores que iria receber até ao final do prazo do aluguer, pela disponibilidade imediata, e também antecipada, do bem locado, podendo, caso pretenda e tenha oportunidade, alugá-lo ou vendendo.».
O teor das mencionadas cláusulas é este:
«15. Consequências de atrasos, cessação sem aviso prévio:
1. Caso o Locatário esteja em mora com o pagamento de quaisquer pagamentos devidos de acordo com o contrato, serão devidos juros à taxa legal acrescidos de 8% pelos alugueres em dívida e juros à taxa legal acrescidos de 5% por quaisquer outros montantes em dívida.
2. No caso de cessação pelo Locador, a Secção 17 será aplicável. O Locador terá o direito de fazer cessar o contrato de locação sem aviso prévio, caso o Locatário esteja em mora com o pagamento dos alugueres.
3. O Locatário poderá evitar a cessação do contrato através do pagamento dos alugueres em mora acrescidos de uma penalização de 50% do valor dos alugueres em mora.».
«17. Consequências da cessação prematura extraordinária:
1. Tendo em atenção que o Locador adquiriu o bem locado para benefício do Locatário, caso o Locador exerça o seu direito de cessação sem aviso prévio ou caso o Locatário cesse o contrato de acordo com a Secção 13, o Locador poderá exigir o pagamento de todos os alugueres até ao fim do contrato. A compensação com a poupança de custos ou a obtenção de benefícios relacionada com a cessação antecipada – incluindo indemnizações pagas pelo seguro e outras indemnizações, se existirem (confrontar Secção 12 nº 2 e Secção 14 números 7 e 8) recebidas pelo Locatário estarão sujeitas às disposições legais. Os direitos do Locador tornam-se exigíveis com a recepção da notificação da cessação. O Locatário deverá ser considerado em
incumprimento caso não realize o pagamento devido nos 30 dias subsequentes à recepção da notificação da cessação e dos danos enumerados.
2. Mais, o Locatário perderá o seu direito de posse. O Locatário tem a obrigação de devolver o bem locado ao Locador por sua conta e risco. (…)
4. Caso o Locatário não tenha devolvido o bem locado violando as suas obrigações de acordo com o nº 2, apesar da solicitação do Locador, deverá pagar a partir da data do termo total da locação e adicionalmente à taxa normal de locação, 1/30 do valor de cada aluguer mensal da locação acordada para a duração do contrato por cada dia adicional de retenção.
(…)».
Decorre do disposto nos art. 432º nº 1 e 436º nº 1 do Código Civil que é admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção, podendo ser feita mediante declaração à outra parte.
Assim, tendo a apelante recebido os equipamentos e não tendo procedido ao pagamento dos alugueres, tinha a apelada fundamento para proceder à resolução do contrato ao abrigo do nº 2 da cláusula 15. Portanto, em face dos factos provados em 23 a 36, conclui-se que a apelada procedeu validamente à resolução do contrato.
Em consequência da resolução do contrato de locação, constituiu-se a apelante na obrigação de restituir à locadora os equipamentos, subsistindo a obrigação de pagar os alugueres vencidos até à data da resolução (cfr art. 433º e 434º nº 2 do Código Civil).
Dispõe o art. 801º nº 2 do Código Civil:
«Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro».
A respeito desta norma, explicam Xxxxx xx Xxxx e Xxxxxxx Xxxxxx: «(…) o credor pode ter tido prejuízos. Em relação a eles há direito à respectiva indemnização. O devedor pode, por ex., não estar em condições de restituir no todo ou em
parte, a contraprestação recebida, ou, mesmo que a restitua, pode o credor ter um prejuízo derivado da não realização do contrato. (…) O direito à resolução e à restituição da contraprestação existe, na verdade, independentemente do direito à indemnização.
(…) A indemnização a que o credor tem direito, quando opte pela resolução do contrato, refere-se obviamente ao dano de confiança, ou seja, ao interesse contratual negativo, nomeadamente ao lucro que o credor teria tido, se não fora a celebração do contrato resolvido.» (in Código Civil anotado, vol II, 4ª ed. pág. 58).
O art. 810º nº 1 do Código Civil prevê:
«As partes podem, porém, fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é o que se chama cláusula penal».
O art. 811º determina:
«1. O credor não pode exigir cumulativamente, com base no contrato, o cumprimento da obrigação principal e o pagamento da cláusula penal, salvo se esta tiver sido estabelecida para o atraso da prestação; é nula qualquer estipulação em contrário.
2. O estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente, salvo se outra for a convenção das partes.
3. O credor não pode em caso algum exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do incumprimento da obrigação principal.».
O art. 812º nº 1 dispõe:
«A cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário».
Importa agora ponderar, na parte que ora releva, o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais instituído pelo DL 446/85 de 25/10.
Estabelece o seu art. 12º:
«As cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição deste diploma são
nulas nos termos nele previstos».
O art. 15º consagra, como princípio geral:
«São proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé». O art 16º determina:
«Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais gerais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado».
Como se pondera no Ac do STJ de 19/10/2010 (Proc. 10552/06.6TBOER.S1 – in xxx.xxxx.xx), o diploma em apreço criou normas de controlo do conteúdo das cláusulas contratuais gerais, estabelecendo desde logo, um princípio geral de controlo, declarando serem proibidas as cláusulas contrárias à xxx xx (xxx. 00x x 00x) x, xx xxxxxxx, xxxxxxxxxxxxx, enumera, a título exemplificativo, quatro listas de situações de abuso mais flagrantes, sendo tal proibição absoluta em duas delas (art. 18º e 21º) e relativa em relação às outras duas (art.º 19º e 22º).
Nas palavras de Xxxxxx xx Xx «(…) as proibições especificadas nos diversos catálogos consagrados na lei não representam senão particulares projecções da intencionalidade normativa que atravessa a cláusula geral de fiscalização. Esta aparece construída sobre o princípio normativo da boa-fé, que assim se constitui como a verdadeira regra fundante de todas as proibições e cuja “desenvolução” é mediatizada pelo recurso a critérios instrumentais, como a confiança e o objectivo negocial típico visado pelas partes» (in “Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva Sobre Cláusulas Abusivas”, 2ª ed, pág. 258).
Ora, o art. 19º («Cláusulas relativamente proibidas») prescreve:
«São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as
cláusulas contratuais gerais que:
(…)
c) Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir; (…)»
No que respeita às cláusulas relativamente proibidas o intérprete tem de analisar a cláusula no seio de todo o conjunto contratual genericamente predisposto, não sendo de considerar as vicissitudes particulares do negócio individual realizado (neste sentido Ac do STJ de 12/6/2007 – Proc. 07A1701 e Ac do STJ de 20/1/2012 – Proc. 3062/05.0TMS NT.L1.S1 – in xxx.xxxx.xx).
Com efeito, e citando Xxxxxx xx Xx, «O ponto de partida do juízo valorativo é constituído, como vimos, pelos conceitos indeterminados que formam a previsão das proibições singulares em causa. Quanto ao concreto horizonte de referência, remete-nos a lei para “o quadro negocial padronizado”, a significar que a valoração haverá de fazer-se tendo como referente, não o contrato singular ou as circunstâncias do caso, mas o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam, no interior do todo do regulamento contratual genericamente predisposto.
Deste modo, na ponderação aqui pressuposta, não são os interesses individuais dos intervenientes que directamente ganham relevo, mas os interesses típicos do círculo de pessoas normalmente implicadas em negócios da espécie considerada. Torna-se, por isso, essencial a consideração da situação de interesses contratual-típica e não meramente as vicissitudes particulares do negócio individual realizado» (in ob cit, pág. 259/260).
Por outro lado, na valoração de uma cláusula relativamente proibida, é imprescindível «contrapor o interesse da contraparte tipicamente afectado por tal cláusula àquele que por ela é assegurado ao utilizador. Nesta ponderação, haverá de concluir-se por uma violação do escopo da norma singular de proibição, se a composição de direitos e deveres resultantes da conformação do contrato, considerado no seu todo, e tendo em conta o quadro negocial
padronizado, não corresponder a “medida” do equilíbrio pressuposto pela ordem jurídica, verificando-se, ao invés, uma desrazoável perturbação desse equilíbrio, em detrimento da contraparte do utilizador.
(…)
Torna-se manifesto que, nesta contraposição de interesses igualmente legítimos, está naturalmente reservado um lugar de destaque para o princípio da proporcionalidade, numa incessante sopesagem e comparação de vantagens, custos, compensação e riscos. Directiva básica será aqui a preocupação de determinar se o utilizador, através da cláusula ou cláusulas consideradas, procura levar a cabo, exclusivamente interesses próprios, sem tomar em consideração, de forma minimamente ajustada e razoável, os interesses da contraparte ou sem, no mínimo, lhe facultar uma adequada compensação» (Almeno de Sá in ob cit, pág. 262).
Apreciemos então o contrato de locação dos autos. A cláusula 1 das «Condições Gerais» prevê:
«1. Bem e Obrigação de amortização total do Locatário, devolução do bem locado:
1. O bem locado é adquirido pelo Locador no interesse do Locatário, após indicação prévia do Locatário do bem a ser locado e da identidade do fornecedor do bem. Após ter adquirido o bem, o Locador entregará o bem ao Locatário, sujeito ao Contrato de Locação incluindo estas Condições Gerais de Locação, a Confirmação de Aceitação e os Termos e Condições Gerais Relativos ao Seguro de Propriedade.
2. O locatário (Locatário) tem a obrigação de amortização total dos custos do locador (Locador) incorrido em conexão com a aquisição do bem locado e com a execução do contrato, bem como do lucro estimado. Após a cessação do Contrato de Locação, o Locatário deverá entregar o bem locado ao Locador (confrontar Secção 19)».
Decorre desta cláusula que os equipamentos são propositadamente adquiridos
pela locadora para os locar à locatária, o que significa que não teria tido a despesa com a aquisição se não tivesse celebrado o contrato, e que os montantes dos alugueres se destinam a amortizar o custo dessa aquisição e as despesas normais de execução do contrato, além de incluírem o lucro estimado. Por sua vez, a cláusula 17 das Condições Gerais contém uma cláusula penal que atribui à locadora a faculdade de, ao resolver o contrato, exigir o pagamento imediato do valor correspondente a todos os alugueres que seriam devidos até ao final do prazo previsto no contrato apesar de o locatário ser obrigado a devolver o equipamento. Portanto, do exercício dessa faculdade por parte da locadora, resultará para o locatário a obrigação de pagamento antecipado de todos os valores.
A cláusula 15 contém também uma cláusula penal ao prever um acréscimo de 8% sobre a taxa legal de juros.
Vejamos então se estas cláusulas integram a previsão do art. 00x xx c) do DL 446/85, tendo em atenção que a desproporção aí referida tem de ser manifesta (nesse sentido cfr o Ac do STJ de 12/6/2007 - Proc. 07A1701 in xxx.xxxx.xx).
Considerando o quadro negocial padronizado, é razoável admitir que o dano a ressarcir corresponda ao custo da aquisição do bem pela locadora na parte não amortizada pelo valor dos alugueres vencidos até à data da resolução. Na verdade, não decorre do clausulado contratual que a locadora possa vir a comercializar novamente os bens e que não sofra prejuízo por ter investido o seu capital naquela aquisição. Repare-se que está em causa equipamento informático e que até se provou que «Os equipamentos em causa, depois de utilizados, não são comercializados, não existindo procura (para aluguer ou aquisição) dos mesmos, no estado de usados».
Além disso, o clausulado contratual não revela que o recebimento do valor correspondente aos «alugueres vincendos» se traduza em benefício desproporcionado para a locadora excedendo largamente o preço que pagou para a aquisição dos bens.
Aliás, no caso concreto decorre dos factos provados que o «lucro estimado» possivelmente nem chega a 884,64 €, pois a locadora adquiriu os bens pelo preço de 4.320 € (IVA incluído) e os 48 alugueres perfazem 5.204,64 € (IVA incluído).
Por outro lado, não decorre do clausulado que a locadora não paga de uma só vez o preço dos bens que adquire para dar em locação, ou seja, não decorre do clausulado que a locadora não fica de imediato desembolsada do capital investido na aquisição dos bens.
Por quanto se disse, não se mostra manifestamente desproporcionada aos danos a ressarcir a exigência antecipada do valor correspondente a todos os
«alugueres vincendos» (neste sentido v. Ac da RL de 15/12/2011 – Proc. 680/10.9YXLSB.L1 e Ac da RL de 15/5/2012 – Proc. 80/10.0YXLSB.L1 – in
xxx.xxxx.xx).
Quanto ao acréscimo de 8% sobre a taxa legal de juros, trata-se de uma cláusula penal estabelecida para o atraso no pagamento dos alugueres vencidos e da indemnização, não excedendo o que é permitido pelos art. 102º § 2º do Código Comercial e 1146º do Código Civil. Por isso, inexiste fundamento para que seja declarada nula a cláusula 15.
Concluindo, improcede a apelação.
IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida.
Custas pela apelante. Lisboa, 2 de Maio de 2013 Xxxxxxx Xxxxxxxx
Xxx xx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxxx