NOTA TÉCNICA Nº 001/2021
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NOTA TÉCNICA Nº 001/2021
Assunto: Forma de Contratação de Entidade de Previdência Complementar para a implantação do Regime de Previdência Complementar (RPC) nos Entes Federativos (União, Estados, DF e Municípios)
A ASSOCIAÇÃO DOS MEMBROS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS DO BRASIL – ATRICON, pessoa
jurídica de direito privado, entidade de classe de âmbito nacional, com sede em Brasília-DF, vem, por meio da presente Nota Técnica, apresentar argumentos e conclusões relacionados à forma de contratação de Entidade de Previdência no âmbito do Regime de Previdência Complementar pelos Entes Federativos, tendo em vista as alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019.
I. Da formação do Grupo de Trabalho
1. A ATRICON, por intermédio da Portaria no 11/2020, publicada em 22 de dezembro de 2020, designou os componentes de comissão multisetorial encarregada de elaborar Nota Técnica acerca da forma de contratação de entidades de previdência do Regime de Previdência Complementar, conforme exigido pela Emenda Constitucional n° 103/2019. Foi estabelecido o prazo de 60 dias, contados a partir do dia 11.01.21, para realização dos trabalhos e apresentação da minuta de Nota Técnica. Em sequência, a portaria no 03/2021 estendeu o prazo para o término dos trabalhos por mais 21 dias, período em que o debate foi ampliado por intermédio de consultas direcionadas à especialistas do segmento de previdência pelos membros do GT. O grupo técnico contou com a participação dos Conselheiros Xxxxxxxx Xxxxxxx – TCE-ES (Coordenador); Xxxxxxx Xxxxxxxx – TCE-MT; Xxxxxxxxx Xxxxxxx – TCE-SP; da Auditora de Controle Externo Xxxxxxx Xxxxxxx – TCE-RN, além dos representantes indicados pela Secretaria de Previdência do Ministério da Economia, Xxxxxxxxx Xxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxx.
II. Das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 103/2019
2. Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019, relativa à reforma da previdência, várias disposições atinentes ao Regime de Previdência Complementar sofreram alteração. A principal delas refere-se à obrigatoriedade de instituição do Regime de Previdência Complementar – RPC pelos Entes Federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios).
3. Diferentemente do previsto anteriormente no art. 40 da Constituição Federal, todos os entes federativos que possuam Regimes Próprios de Previdência Social – RPPS deverão instituir, no prazo de 2 anos a partir da data de entrada em vigor da Emenda1, o RPC para seus servidores
1 Nos termos do art. 9º, § 6º da EC nº 103/2019, 13/11/2021.
públicos de cargo efetivo. O que antes era uma possibilidade tornou-se uma obrigatoriedade. Vide quadro abaixo:
Texto da CF/88 ANTES da EC 103/2019 | Texto da CF/88 APÓS a EC 103/2019 |
Art. 40 [...] §14 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo, poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata este artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201. | Art. 40 [...] §14. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, regime de previdência complementar para servidores públicos ocupantes de cargo efetivo, observado o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social para o valor das aposentadorias e das pensões em regime próprio de previdência social, ressalvado o disposto no §16. |
4. Anteriormente à EC nº 103/2019, somente Entidades Fechadas de Previdência Complementar de natureza pública (EFPC-NP) podiam administrar os planos de previdência do RPC patrocinados pelos Entes Federativos. A partir da promulgação da EC nº 103/2019, retirou- se a necessidade de ser uma EFPC-NP, instituída com governança estabelecida pela Lei Complementar nº 108/2001 e sujeitas a determinados princípios e controles aplicados à Administração Pública (concurso público, licitação, dentre outros estabelecidos na lei do Ente Federativo) e incluiu-se a possibilidade de a administração ser realizada por Entidade Aberta de Previdência Complementar (EAPC) e demais EFPC que não possuem a natureza pública com governança estabelecida pela Lei Complementar nº 108/2001. Ou seja, após a EC nº 103/2019, o RPC pode ser instituído por meio de: EFPC; EFPC-NP; e EAPC. Vejamos:
Texto da CF/88 ANTES da EC 103/2019 | Texto da CF/88 APÓS a EC 103/2019 |
Art. 40 [...] § 15. O regime de previdência complementar de que trata o §14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. | Art. 40 [...] §15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 oferecerá plano de benefícios somente na modalidade contribuição definida, observará o disposto no art. 202 e será efetivado por intermédio de entidade fechada de previdência complementar ou de entidade aberta de previdência complementar. |
5. O art. 202, §§ 4º e 5º da CF/88 dispõe que lei complementar disciplinará a relação entre os Entes Federativos, Autarquias e Estatais, enquanto patrocinadores de planos de benefícios previdenciários, e as entidades de previdência complementar.
6. A relação entre as EFPC que contam com patrocínio público está disciplinada na Lei Complementar nº 108, de 2001. Além disso, as Entidades e Planos seguem subsidiariamente o regramento estabelecido na Lei Complementar 109/2001. Conforme art. 33 da EC 103/2019, enquanto não for disciplinada a forma de atuação das EAPC na administração dos planos dos entes federativos, tal atividade permanecerá sendo exercida unicamente pelas EFPC, seja esta de natureza pública ou não.
Art. 33. Até que seja disciplinada a relação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e entidades abertas de previdência complementar na forma do disposto nos §§ 4º e 5º do art. 202 da Constituição Federal, somente entidades fechadas de previdência complementar estão autorizadas a administrar planos de benefícios patrocinados pela União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente (grifo nosso).
7. Cumpre registrar que substitutivo adotado pela Comissão Especial que analisou a Proposta de Emenda à Constituição - PEC nº 287/2016 2 previa no § 15-A do art. 40 que “Somente mediante prévia licitação a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão patrocinar planos de previdência de entidades fechadas de previdência complementar que não tenham sido criadas por esses entes ou planos de previdência de entidades abertas de previdência complementar.” De igual modo, a PEC nº 06/2019, no texto original enviado pelo Executivo previa de forma expressa no § 15 a figura da licitação, nos seguintes termos: “...bem como, por meio de licitação, o patrocínio de plano administrado por entidade fechada de previdência complementar não instituída pelo ente federativo ou por entidade aberta de previdência complementar”. A retirada dessa obrigação de licitação do texto final da Emenda Constitucional nº 103/2019 aprovado pelo Congresso Nacional indica uma reflexão e decisão do constituinte quanto à inadequação desse modelo para a seleção das entidades de previdência complementar.
III. Das características do Regime de Previdência Complementar
8. Importante esclarecer alguns aspectos atinentes ao RPC, sobretudo com relação aos princípios a ele aplicados, os quais são definidos pelo art. 202 da CF/88, a saber: o RPC é privado, contratual, facultativo e autônomo em relação aos demais regimes de previdência social.
9. O objetivo principal do RPC destinado aos entes públicos ou a servidores públicos de cargo efetivo é o pagamento de uma renda mensal de aposentadoria. O método utilizado para o financiamento das aposentadorias é o da capitalização individual, e não o da repartição, como ocorre no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) ou de capitalização coletiva, que tem sido promovida pela regulação dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) para o alcance do equilíbrio financeiro e atuarial previsto no art. 40 da Constituição Federal. Na capitalização do
2xxxxx://xxx.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxXxx/xxxx_xxxxxxxxxxxxxx?xxxxxxxx0000000&xxxxxxxxxXXX-
A+1+PEC28716+%3D%3E+PEC+287/2016
RPC é constituída uma reserva de recursos por meio do somatório das contribuições e dos rendimentos em nome do participante.
10. A relação contratual derivada da adesão a um plano de previdência complementar é de natureza civil, não integrando, em hipótese alguma, o contrato de trabalho do participante, conforme previsto no § 2º do art. 202 da Constituição Federal e já decidido pelo STF (Recurso Extraordinário nº 586.453).
Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
§ 1° A lei complementar de que trata este artigo assegurará ao participante de planos de benefícios de entidades de previdência privada o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos.
§ 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes, nos termos da lei (grifo nosso).
11. Regulado pela Lei Complementar n° 109, de 29 de maio de 2001, o RPC é subdividido em dois segmentos: o dos planos abertos de previdência, operados por EAPC, e seguradoras, que, em regra, têm finalidade lucrativa; e o dos planos fechados de previdência, administrados por EFPC, sem finalidade lucrativa.
12. Em se tratando de EFPC, a LC nº 109, de 2001, define que a condição de patrocinador de um plano será efetivada por intermédio da celebração de um convênio de adesão entre o patrocinador (Ente Federativo) e a EFPC.
13. Observa-se que a relação aqui firmada se enquadra no conceito de convênio específico estabelecido para o universo de previdência complementar, denominado convênio de adesão, no qual existe a convergência de interesses dos partícipes, com o fim comum de ofertar e gerir planos de previdência complementar.
14. Conforme definido pelo órgão regulador das EFPC, o Conselho Nacional de Previdência Complementar – CNPC, por intermédio da Resolução CGPC nº 08, de 19 de fevereiro de 2004, que dispõe sobre normas procedimentais para a formalização de processos de estatutos, regulamentos de plano de benefícios, convênios de adesão, consta que esse último instrumento, dentre outras características, deverá ser celebrado por prazo indeterminado, conforme transcrito abaixo:
“Art. 3º O convênio de adesão deverá conter:
I - qualificação das partes e seus representantes legais;
II - indicação do plano de benefícios a que se refere a adesão;
III - cláusulas referentes aos direitos e às obrigações de patrocinador ou instituidor e da entidade fechada de previdência complementar;
IV - cláusula com indicação do início da vigência do convênio de adesão;
V - cláusula com indicação de que o prazo de vigência será por tempo indeterminado;
VI - condição de retirada de patrocinador ou instituidor;
VII - previsão de solidariedade ou não, entre patrocinadores ou entre instituidores, com relação aos respectivos planos;
VIII - foro para dirimir todo e qualquer questionamento oriundo do convênio de adesão” (grifo nosso).
15. A gestão de entidades e planos de benefícios é complexa, exige equipe técnica qualificada e possui uma série de custos operacionais que, a depender da quantidade de servidores, torna inviável a criação de uma entidade de previdência específica para o Ente Federativo. Nesse contexto, a maior parte das Unidades Federadas não terão escala suficiente para criarem as suas próprias entidades de previdência complementar, hipótese na qual a adesão a Entidades já estabelecidas se apresenta como melhor solução.
16. É importante também destacar que a Resolução CNPC nº 35, de 20 de dezembro de 2019, estabeleceu critérios mínimos de criação de EFPC para patrocinadores públicos. A Resolução exige a adesão de 10 mil participantes para criação de EFPC e para a criação de planos, faz-se necessária a apresentação de estudo de viabilidade que comprove o equilíbrio de receitas e despesas, sob o risco de oneração em demasia do participante do plano e, consequentemente, de redução de sua reserva previdenciária.
17. Desta maneira, para os 2.155 Municípios que possuem RPPS, a situação mais comum será a de adesão a plano de benefícios multipatrocinados em uma entidade já existente.
IV. Sobre o embasamento legal a ser observado para a contratação de Entidade Fechada de Previdência Complementar
18. No tocante à ampliação das possibilidades de escolha provocada pelas as alterações constitucionais, algumas questões surgem sobre o processo de contratação da entidade:
▪ Qual o embasamento legal para a contratação da entidade? A Lei de Licitações deve ser aplicada? Qual a forma de contratação: chamamento, concorrência, dispensa, inexigibilidade, ou está integralmente regida pela LC 109/2001?
▪ Um processo de seleção público deve ser realizado?
▪ Há carência de regulamentação sobre o tema?
19. Com vistas a dar maior segurança jurídica no processo de contratação da entidade e melhor interpretar as questões apresentadas e auxiliar o entendimento das Cortes de Contas, esta seção e as próximas analisarão as questões elencadas.
20. De plano, interessa anotar que o regime estabelecido pela Lei 8.666/93 constitui norma geral de licitações públicas e de contratos administrativos, a ela devendo aderir tanto a forma dos negócios jurídicos da administração pública quanto ao rito de escolha das contrapartes, em regra.
21. Nada inibe, entretanto, a superveniência de norma específica que venha a regular tais temas, seja em virtude do objeto pretendido – tal como serviços de publicidade3 –, seja em virtude da pessoa jurídica interessada – tal como na lei das estatais4, – seja ainda em virtude da circunstância que motiva as contratações – tal como nas compras emergenciais da pandemia5.
22. Tais normas específicas podem, ademais, limitar-se a regular tão somente um dos temas (forma do negócio jurídico ou procedimento de escolha) legando o outro à norma geral. Em tais casos, a Lei 8.666/93 se erige como subsidiária, gozando de eficácia plena na ausência de dispositivos específicos.
23. Após analisarmos o arcabouço normativo, pensamos ser inquestionável a existência de norma específica aplicável ao negócio jurídico em tela6, estipulando expressamente a forma prescrita, qual seja, o convênio de adesão7. Assim, fica afastado o regime do contrato administrativo. Disposições acerca da duração do acordo, sua interrupção, multas, rescisões e sua extinção ou emenda, portanto, devem recorrer a essa regulamentação específica.
24. A investigação do mesmo arcabouço não ofereceu, entretanto, respostas satisfatórias às dúvidas acerca das regras aplicáveis para a forma de escolha da entidade fechada a ser contratada pelo Ente público. De fato, a norma é integralmente silente, por não ter sido sua preocupação. Não é possível – e nem conveniente – inferir intenções desse silêncio. A única disposição que exsurge é a competência do patrocinador para escolher a entidade de previdência fechada e a definição pelo uso do convênio de adesão, conforme redação da Lei Complementar 109/2001:
Art. 13. A formalização da condição de patrocinador ou instituidor de um plano de benefício dar-se-á mediante convênio de adesão a ser celebrado entre o patrocinador ou instituidor e a entidade fechada, em relação a cada plano de benefícios por esta administrado e executado, mediante prévia autorização do órgão regulador e fiscalizador, conforme regulamentação do Poder Executivo.
§ 1º Admitir-se-á solidariedade entre patrocinadores ou entre instituidores, com relação aos respectivos planos, desde que expressamente prevista no convênio de adesão.
§ 2º O órgão regulador e fiscaliza dor, dentre outros requisitos, estabelecerá o número mínimo de participantes admitido para cada modalidade de plano de benefício (grifo nosso).
25. Outros efeitos, não se os reconhecem nas Leis Complementares 108/2001 e 109/2001, uma vez que não cuidaram de afastar a necessidade nem a conveniência da licitação, não abordam procedimentos de escolha ou de habilitação, nem parecem pretender fazê-lo – ainda que tacitamente. As leis não estão aptas, por si mesmas, a assentar a conclusão de que a
3 Lei 12.232/2010 - Dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratação pela administração pública de serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda e dá outras providências. 4 Lei 13.303/2016.
5 Lei 14.065/2020.
6 Referimo-nos à Lei Complementar 109/2001 e a Resolução CGPC 8/2004.
7 Objeto do art. 13 da Lei Complementar 109/2001 e do art. 3º da Resolução CGPC 8/2004.
contratação é – ou que devia ser – direta. O paradigma normativo considerado inicialmente, portanto, é a possibilidade de aplicação da regra geral, mesmo que de forma subsidiária.
26. Tal conclusão se alcança, repise-se, independentemente da forma adotada pelo negócio jurídico ou do custo que o eventual procedimento licitatório teria, mormente nos pequenos municípios brasileiros em que empecilhos de toda sorte atribulam a seleção de um prestador de serviços com quem estabelece-se duradoura relação jurídica de trato sucessivo. A análise se deixará guiar pelos ditames da norma geral, para o descortino paulatino da solução.
27. Em uma investigação lateral sobre procedimentos de escolha, além daqueles constantes na norma geral, consideramos outras normas, nenhuma delas se conformando. O objeto não é comum, o que afasta o pregão, nem se insere na relação daqueles admitidos pelo art. 1º da lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), afastando-o também8.
28. Ademais, é de se concluir pela inaplicabilidade do regime preconizado pela Lei 13.019/2014 (Xxxxx Xxxxxxxxxxx das Organizações da Sociedade Civil), bem como do chamamento público na roupagem por ela estabelecido (art. 23). Assim se conclui por três motivos. Em primeiro, há inadequação subjetiva, posto que as Entidades de Previdência Complementar não preenchem os requisitos exigidos das Organizações da Sociedade Civil. Por segundo, há inadequação objetiva, ou seja, o objeto social das Entidades de Previdência não se insere entre aqueles que a lei reputa como sendo atividade do terceiro setor. Por terceiro, enfim, o rito ali disposto é inadequado, posto que, vocacionado por tema diverso, não guarda nenhuma afinidade com a previdência complementar, lançando exigências tais como prévio plano de trabalho (art. 22) com relação de metas, parâmetros e projetos a executar, necessidade de a organização prestar contas (art. 69), bem como diversas sanções aplicáveis (art. 73). Tal conclusão não significa, entretanto, que o título “chamamento público” não possa ser empregado - desde que genericamente adotado -, nem que pontos de similaridades entre os dois ritos não surjam. Além disso, no Chamamento Público todas as interessadas que se apresentarem teriam a favor de si adjudicado o direito de contratar com a administração pública, o que não é possível na previdência complementar, que preconiza unicidade de Entidade Fechada.
8 Art. 1º É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização:
I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO);
e
II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios;
III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II.
IV - das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
V - das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS.
VI - das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma e administração de estabelecimentos penais e de unidades de atendimento socioeducativo;
VII - das ações no âmbito da segurança pública;
VIII - das obras e serviços de engenharia, relacionadas a melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura logística; e IX - dos contratos a que se refere o art. 47-A.
X - das ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação. [...] Lei 12.462/2012
Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta Lei. Lei 10.520/2002.
29. Essa breve digressão propicia a conclusão de que não restam normas específicas de contratação a ponderar: o parâmetro normativo relevante recai sobre uma avaliação da norma geral. Cabe, no entanto, ainda outra digressão, avaliar se o advento da nova lei de licitações estaria a autorizar nova abordagem acerca do assunto.
A. Avaliação preliminar: da possibilidade de aplicação da Nova Lei de Licitações
30. A nova lei de licitações, Lei 14.133/2021, sancionada em 01 de abril de 2021, não parece alterar o panorama anteriormente traçado. Em primeiro lugar, há uma longa vacatio legis prevista:
Art. 193. Revogam-se:
I - os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei;
II - a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1° a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei (grifo nosso).
31. Tendo em vista que a janela para estruturação das operações de escolha finda, conforme art. 9º, § 6º, da EC nº 103/2019, no prazo máximo de 2 anos da data de sua entrada em vigor, prazo esse peremptório, uma vez que deitado com a definitividade da Emenda Constitucional, há o limite cravado em 13/11/2021. Tal brevidade sugere que se recorra à lei que é conhecida e está em vigor.
32. Em segundo lugar, ainda que se socorra da nova lei de licitações, uma vez que há um regime de aproximação, ao dispositivo 191:
Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.
33. Em primeira análise, colhemos a reiteração dos institutos da inexigibilidade (art. 74) e da dispensa de licitação (art. 75) na nova lei com poucas alterações, de forma que pouco acrescentam em possibilidades9. De fato, são muito similares aos seus equivalentes na Lei 8.666/93, de forma que o estudo aqui articulado não se perde, posto que as considerações acerca da contratação direta da nova legislação se mantêm.
B. Avaliação sobre o enquadramento como dispensa de licitação
34. O art. 24 da Lei de Licitações busca congregar diversas hipóteses subjetivas e objetivas que autorizam a contratação direta sob o nomen juris “dispensa de licitação”. Em análise a todas
9 A íntegra dos artigos 74 e 75 da Nova Lei de Licitações pode ser acessada em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/_xxx0000- 2022/2021/lei/L14133.htm#:~:text=Art.%201%C2%BA%20Esta%20Lei%20estabelece,e%20dos%20Munic%C3%ADpios%2C%20e% 20abrange%3A&text=II%20%2D%20os%20fundos%20especiais%20e,ou%20indiretamente%20pela%20Administra%C3%A7%C3%A 3o%20P%C3%BAblica.
as circunstâncias que autorizam o rito expedito, exsurge o inciso VIII como possível incurso, com a seguinte redação:
Art. 24. É dispensável a licitação:
[...]
VIII - para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado;10
35. Nada obstante, tendo em vista que um dos requisitos a ser preenchido pelo tipo é de que o contratado integre a Administração Pública, entidades privadas não podem participar, restringindo a competitividade. Ademais, o requisito de que a criação tenha se dado para o fim específico, a exclusão de outras entidades ainda que integrantes da Administração Pública11 parece constituir empecilho relevante a considerar. Parece autorizada, a criação de uma entidade local especialmente para funcionar como Entidade Fechada para aquele ente, sendo, então, contratada diretamente sob esse fundamento.
C. Avaliação sobre o enquadramento como inexigibilidade de licitação
36. Os casos de inviabilidade de competição – que se confundem com os casos de inconveniência jurídica da competição – congregam-se ao art. 25 e são intitulados “inexigibilidade de licitação”. Contrariamente ao art. 24, em que se reputa a lista como relação fechada de casos típicos, há apenas a exemplificação de casos. O rol é chamado de “exemplificativo”. Mesmo assim, dentre os casos, desponta o inciso II, que exibe a seguinte redação:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
[...]
II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; Lei 8.666/1993
37. O primeiro requisito é que o serviço técnico esteja enumerado no art. 13 da Lei 8.666/1993. De plano, anotamos que é assente na doutrina a compreensão de que a relação de serviços técnicos constantes dos incisos do dispositivo não é exaustiva12. Assim, ainda que não figure textualmente no art. 13, cabe perguntar: a atividade da EFPC adere ao conceito de serviço
10 Na nova Lei, art. 73. IX – para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integrem a Administração Pública e que tenham sido criados para esse fim específico, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado;
11 Atualmente, 12 entidades de natureza pública oferecem planos para Entes Federativos.
12 Por exemplo, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 17a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, pp. 284/286. Em especial: “Deve reconhecer-se que os incisos do art. 13 comportam interpretação ampliativa para casos assemelhados. As hipóteses ali foram previstas em termos genéricos, de molde a atingir outras situações que delas se aproximem.”
técnico profissional especializado? Quanto a isso, percebe-se certa proximidade ao inciso III (assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias)13, pois este remete à assessoria financeira. Ademais, ainda que não se aproxime tanto do enunciado mencionado, a atividade de EFPC certamente é profissional, especializada e técnica.
38. O segundo requisito é que a contratação sustente natureza singular. Novamente muito se debate na doutrina acerca de como se apreciaria tal adjetivo. Pondera-se, entretanto, que a contratação possivelmente será a única do gênero na expectativa de vida laboral dos segurados. Enquanto unicidade se contrapõe àquilo que é assíduo, reiterado ou usual, parece, já semanticamente, preenchido o mencionado requisito.
39. O terceiro e último requisito para a inexigibilidade em testilha é a notória especialização do contratado. Antes de prosseguir diretamente ao requisito do caso, cumpre observar que os arts. 32 e 71 da Lei Complementar 109/2001 bem esclarecem que as EFPC têm excluída a prestação de quaisquer serviços diversos dos de administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária, o que depõe a favor de uma extraordinária especialização.
Art. 32. As entidades fechadas têm como objeto a administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária.
Parágrafo único. É vedada às entidades fechadas a prestação de quaisquer serviços que não estejam no âmbito de seu objeto, observado o disposto no art. 76.
[...]
Art. 71. É vedado às entidades de previdência complementar realizar quaisquer operações comerciais e financeiras:
I - com seus administradores, membros dos conselhos estatutários e respectivos cônjuges ou companheiros, e com seus parentes até o segundo grau;
II - com empresa de que participem as pessoas a que se refere o inciso anterior, exceto no caso de participação de até cinco por cento como acionista de empresa de capital aberto; e
III - tendo como contraparte, mesmo que indiretamente, pessoas físicas e jurídicas a elas ligadas, na forma definida pelo órgão regulador.
Parágrafo único. A vedação deste artigo não se aplica ao patrocinador, aos participantes e aos assistidos, que, nessa condição, realizarem operações com a entidade de previdência complementar (grifo nosso).
40. Ademais, a nova Lei de Licitações oferece uma definição para notória especialização, que pode, inclusive, servir de guia na busca por uma Entidade Fechada:
Art. 6º. [...] XIX – notória especialização: qualidade de profissional ou de empresa cujo conceito, no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiência, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos relacionados com suas atividades, permite inferir que o seu trabalho é essencial e reconhecidamente adequado à plena satisfação do objeto do contrato (grifo nosso).
13 Equivalentemente, na nova Lei: Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se: [...] XVIII – serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual: aqueles realizados em trabalhos relativos a: [...] c) assessorias e consultorias técnicas e auditorias financeiras e tributárias;
41. Ressalta-se que a avaliação de que uma licitação é inexigível não se incompatibiliza com a conclusão de que é necessário um processo formal de escolha, inclusive com cotejamento de estruturas e custos de operacionalização. Além da necessidade de que a escolhida para o convênio de adesão preencha o requisito de notória especialização, como visto acima, o art. 26 é repleto de outras exigências, tais como motivações, divulgação prévia e justificativa de preços14.
Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.
Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:
I - caracterização da situação emergencial, calamitosa ou de grave e iminente risco à segurança pública que justifique a dispensa, quando for o caso;
II - razão da escolha do fornecedor ou executante; III - justificativa do preço.
IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados. Lei 8.666/1993 (grifo nosso).
42. Em uma análise restrita à “forma de contratar” e partindo-se do pressuposto que se recorrerá à Lei Geral, estão presentes para o caso em análise, qual seja o da contratação de entidade de previdência complementar pelo Ente, os requisitos para o possível enquadramento como contratação direta por inexigibilidade.
43. No entanto, avalia-se que a aplicação desse enquadramento seria apenas uma aproximação em relação à “forma de contratar” uma vez que a Lei Geral foi formulada para contratos administrativos que visam a disciplinar relações contratuais e não de parceria, ou seja, possuem escopo diferente, mas, em especial, porque dele poderia ser extraída equivocadamente a interpretação de que serão aplicadas as normas da Lei de Licitações não só à forma de contratação das entidades, mas, também, à execução, ao acompanhamento e ao controle do convênio de adesão, aspectos já regulados por Lei Específica, quais sejam a LC 108
14 Novamente, não muito diferente dos requisitos da nova Lei, confira, ao art. 71:
Seção I Do Processo de Contratação Direta
Art. 71. O processo de contratação direta, que compreende os casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação, deverá ser instruído com os seguintes documentos:
I – documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;
II – estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei;
III – parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos; IV – demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido; V – comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária; VI – razão da escolha do contratado;
VII – justificativa de preço;
VIII – autorização da autoridade competente.
Parágrafo único. O ato que autoriza a contratação direta ou o extrato decorrente do contrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial.
e a LC 109, ambas de 2001. Acresce-se a isso a opção do legislador constituinte, ao disciplinar a matéria, de retirar do texto da Emenda Constitucional 103/2019 a obrigação de licitação, conforme referido no item 7 desta Nota Técnica.
44. Portanto, conclui-se que o modelo de convênio de adesão do art. 13 da LC 109/2001 é incompatível com qualquer procedimento licitatório estabelecido na legislação vigente. Ainda que se buscasse a Lei Geral, para esse enquadramento, a contratação seria equiparada à inexigibilidade.
45. Nesse caso, na ausência de norma regulamentando de forma explícita a forma da referida contratação a orientação da ATRICON é que o Ente Federado realize processo de seleção público preservando os princípios constitucionais e basilares da Lei Geral como a transparência, a economicidade, a eficiência e a publicidade. Na seção de orientações, a aplicação prática desses princípios será mais bem explorada.
46. A recomendação de um processo público decorre ainda do fato de existir a possibilidade de o Ente Federado poder comparar propostas, principalmente a partir do estabelecimento da Emenda 103/2019, em que passou a ser autorizada a atuação de forma ampla de todas as entidades fechadas que operam neste segmento. No entanto, o segmento detém características muito específicas que trazem dificuldades de estabelecimento de critérios objetivos de escolha sendo nesse caso, indispensável a motivação, a apresentação das razões e fundamentações da escolha de uma proposta em detrimento de outra.
D. Sobre o prazo do convênio de adesão
47. Já concluímos em outras linhas que, por serem normas específicas, são aptas a regular a forma do negócio jurídico de interesse a Lei Complementar 109/2001 e a Resolução CGPC 08, de 19 de fevereiro de 2004. Esses normativos se estruturam em torno da noção de prazo indeterminado para a vigência dos convênios de adesão, sendo, cláusula razoável a se contemplar. Tal se dá a despeito da norma geral, que veda expressamente tal possibilidade (art. 57, § 3º, da Lei 8.666/1993), tolerando-os que a duração se estenda pelo prazo máximo de até 60 meses.
48. Não poderia se aceitar diversamente, uma vez que as características dos planos de previdência complementar envolvem investimentos de longo prazo, custeio administrativo estimado atuarialmente, tornando inadequada a comparação de planos de horizontes tão curtos, como 60 meses. A natureza previdenciária requer previsibilidade e prazo elastecido nos contratos, seja no Regime Geral de Previdência Social, nos Regime Próprios de Previdência Social e no Regime de Previdência Complementar.
49. Impõe-se concluir mais uma vez que predomina a regulamentação estabelecida pela legislação do Regime de Previdência Complementar, e que esta preconiza o prazo indeterminado da relação jurídica entre a EFPC e o patrocinador público.
50. Tal indeterminação de prazo, anote-se, não inviabiliza a rescisão do convênio de adesão com a EFPC, desfazimento este regulamentado na possibilidade de transferência de
gerenciamento do plano para outra EFPC, por prerrogativa do patrocinador a qualquer tempo. Essa operação é disciplinada pela Resolução CNPC 25, de 13 de setembro de 2017.
V. Da Orientação
51. Por todo o exposto, relativamente ao procedimento de escolha de Entidade de Previdência Complementar pelos entes federativos e com base na análise ampla da legislação, a conclusão é a de que a contratação em voga não se enquadra em qualquer rito estabelecido pela legislação em vigor devendo os princípios de uma contratação pública serem preservados e sempre alicerçados no regramento estabelecido pela Lei Complementar 108 e 109, ambas de 2001, que regulam o caráter sui generis do objeto previdenciário.
52. Na ausência de regramento específico, em análise à Lei Geral, avalia-se que o regramento tem analogia à inexigibilidade. No entanto, avalia-se que a aplicação desse enquadramento seria apenas uma aproximação em relação à “forma de contratar” uma vez que a Lei Geral foi formulada para contratos administrativos que visam a disciplinar relações contratuais e não de parcerias e do próprio convênio de adesão.
53. Neste caso, para a contratação de Entidade de Previdência os princípios constitucionais de uma contratação pública devem ser necessariamente observados como o da moralidade, impessoalidade, publicidade, transparência e economicidade, aplicando-se um processo de seleção público com instrução processual diligente e devidamente motivado.
54. Outrossim, havendo diversas entidades aptas a oferecer planos a Entes Federativos, atualmente cerca de 40 entidades15, a forma de justificar a escolha seria a realização de processo de seleção transparente e motivado, com fundamentação pautada por critérios de qualificação técnica e economicidade e contendo as razões de escolha de uma entidade em detrimento de outras alternativas, principalmente levando em consideração que há diferença das condições econômicas nas propostas.
55. Recomenda-se, a fim de garantir o cumprimento dos princípios da impessoalidade e transparência, a constituição de grupo de trabalho com servidores do órgão responsável pela área de pessoal do Ente, por representante do RPPS e de seus colegiados e dos demais Poderes para participarem de todo o processo de implantação, que se inicia com a elaboração do Projeto de Lei e finda com a assinatura do convênio de adesão com a Entidade selecionada.
56. Este grupo iniciaria os trabalhos a partir da realização de um estudo prévio que percorra as características e complexidades do Ente, da sua massa de servidores e do potencial esperado de ingresso no RPC, da remuneração média desses servidores e dos impactos esperados no RPPS decorrentes da implantação.
15 A Secretaria da Previdência publica em seu sítio eletrônico lista de EFPC que demonstraram interesse em administrar planos de Entes Federativos que pode ser acessado em: xxxxx://xxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx/xx-xx/xxxxxxxx/xxxxxxxxxxx-xxxxxxxxxxxx/xxxx- informacoes/arquivos/guiaentidades_listaefpcmultip_20-11.pdf
57. Os princípios da impessoalidade e publicidade serão observados necessariamente pelo acolhimento e recebimento de diferentes propostas.
58. Não há como se estabelecer o formato exato para a seleção, uma vez que a legislação é silente neste aspecto. No entanto, o processo de escolha pode envolver os seguintes expedientes:
a) Publicação de edital/termo para que as EFPC apresentem propostas especificando o objeto a ser contratado e o potencial de participantes a ingressar no plano e contendo a especificação de requisitos técnicos e econômicos mínimos a serem apresentados pelas Entidades;
b) Elaboração de quadro comparativo das condições econômicas das propostas, qualificação técnica e plano apresentados ao Ente;
c) Motivação da escolha de determinada entidade em face das demais propostas apresentadas.
59. A recomendação é que o processo esteja minimamente instruído com aspectos relevantes como:
• avaliação do processo de governança e experiência técnica das entidades;
• a comprovação da qualificação da diretoria e demais responsáveis pela gestão da entidade;
• o histórico de rentabilidade obtido nos planos de benefícios, a política de investimento e o desempenho da EFPC;
• a análise da estrutura de custeio da entidade16;
• os controles internos e processos de gestão de riscos da EFPC;
• análise da economicidade da proposta escolhida, sendo o Ente capaz de comparar e simular as diferentes propostas apresentadas bem como solicitar que a EFPC torne transparentes todos os custos, inclusive o da gestão de ativos17.
60. Sobre este último ponto, destaca-se que, ao final de 2019, foi constituído grupo de trabalho no âmbito do CNPC e coordenado pela Secretaria de Previdência que apresentou, dentre outros temas, o Guia da Previdência Complementar dos Entes Federativos com orientações para a implantação em que se destaca critérios mínimos a serem observados pelos Entes na escolha de uma EFPC. A título de recomendação, seria oportuno que a Secretaria de Previdência realizasse maior detalhamento neste Guia dos critérios a serem observados como forma de melhor orientar os Entes neste processo de escolha, indicando meios de ateste de aspectos relacionados à experiência, qualificação e boas práticas de governança que devem ser observados no processo de escolha da EFPC.
16 O limite anual de recursos prudenciais de atendimento do PGA de entidades fechadas que possuam patrocínio majoritariamente público, de que trata a Lei Complementar nº 108/2001, considerado pelo percentual do patrimônio administrado pela entidade, é determinado pela Resolução CGPC n° 29 de 31 de agosto de 2009, em seu artigo 6º:
“... O limite anual de recursos destinados pelo conjunto dos planos de benefícios executados pela EFPC de que trata a Lei Complementar nº 108, de 2001, para o plano de gestão administrativa, observado o custeio pelo patrocinador, participantes e assistidos, é um entre os seguintes:
I – taxa de administração de até 1% (um por cento); ou
II – taxa de carregamento de até 9% (nove por cento). Parágrafo único. O Conselho Deliberativo da EFPC deve estabelecer o limite de que trata o caput.”
17 Importante esclarecer que qualquer aporte à EFPC pelo patrocinador público pode acontecer tão somente na condição de patrocinador e como adiantamento de contribuições futuras, não podendo Ente alocar recursos fora dessa condição.
61. Recomenda-se que os critérios apresentados pela Secretaria da Previdência, no seu Guia de Orientações, sejam devidamente utilizados pelos Tribunais de Contas no seu processo de fiscalização uma vez que este é o órgão técnico e que tem a missão de formulação de política para o segmento e tendo em vista que não cabe a esta Associação explicitar aspectos técnicos específicos do negócio em análise.
62. Em que pese a motivação da escolha ser privativa de cada Ente, não há qualquer óbice em que o processo de escolha seja realizado em cooperação com outros entes federativos, ou fazendo uso, no que couber, da documentação produzida em processo realizado por outro Ente. Cabe clarificar que esta possibilidade não se trata da formação de consórcio nos termos da Lei 11.107, de 06 de abril de 2005. Trata-se apenas da cooperação para a escolha de entidade de forma coletiva para a adesão a um único plano de benefícios, em que serão firmados convênios de adesão distintos por patrocinador. Dessa forma, vários entes federativos poderão se agrupar para formar um processo singular de adesão a um plano multipatrocinado, podendo obter maior economicidade e ganho de escala.
63. Para os Municípios que não possuem servidores com remuneração superior ao teto do RGPS, importante destacar que o Ente Federativo permanece com a obrigação de aprovar a Lei de Implantação do RPC, para que, caso venha a ter o ingresso de servidores nessa condição, possa prontamente realizar o processo de seleção de Entidade e manter sua regularidade previdenciária.
64. Por fim, é importante que o Ente estabeleça processo formal de acompanhamento da gestão do plano após a contratação, designando formalmente os responsáveis que exercerão esse papel. Avalia-se que o Conselho Deliberativo do RPPS possa contribuir neste processo.
VI. Recomendação de Regulamentação Posterior
65. Conforme observado nas seções anteriores, a avaliação é que seria recomendável uma melhor clarificação dessa modalidade de contração em Lei Complementar. Dessa forma, apresenta-se à Secretaria de Previdência, a título de colaboração, proposta de artigo a constar de alteração da Lei Complementar 108/2001 ou até mesmo da Lei de Responsabilidade Previdenciária de que trata o § 22 do art. 40 da Constituição, que clarifique a forma de contratação da entidade de previdência por seleção, bem como reforce o convênio de adesão como instrumento jurídico da relação entre o patrocinador e a entidade de previdência, além da indeterminação do prazo de sua vigência.
66. Vejamos:
Art. XX A seleção e contratação da entidade responsável pela gestão do regime de previdência complementar observará o disposto nas leis complementares de que trata o art. 202 da Constituição Federal e as seguintes diretrizes:
I – o processo se dará por seleção pública e observará principalmente critérios que considerem a transparência, a qualificação técnica, a impessoalidade e a economicidade;
II - será formalizado convênio de adesão, com vigência por prazo indeterminado.
VII. CONCLUSÃO
67. Não há, no sistema jurídico nacional, uma forma expressa para o Ente Federado realizar a contratação das Entidades Fechadas de Previdência Complementar - EFPC quando da instituição, por lei, do Regime de Previdência Complementar, exigida pela Emenda Constitucional no 103/2019.
68. O objeto contratado não se enquadra na Lei de Licitações, mas guarda proximidade com a forma de contratação direta por inexigibilidade. Neste caso, as Leis Complementares 108 e 109, ambas de 2001, de fato, terão o condão de nortear a contratação, não havendo que se falar em processo licitatório, mas sim em processo de seleção, alicerçado nos princípios constitucionais de uma contratação pública, cujo resultado seja a escolha de entidade que demonstre conhecimento e capacidades para a gestão dos passivos e ativos do regime de previdência complementar.
69. Impõe-se concluir que predomina a regulamentação estabelecida pela legislação do Regime de Previdência Complementar, sendo o convênio de adesão por prazo indeterminado o instrumento devido.
70. A seção V desta Nota Técnica apresenta orientações e recomendações detalhadas sobre a devida instrução processual.
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