INSPER
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LLC – DIREITO EMPRESARIAL
XXXXXX XXXX XXXXX
A MOROSIDADE DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL E O DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO DE CONCESSÃO DE TRANSMISSORAS DE ENERGIA ELÉTRICA.
São Paulo 2017
A MOROSIDADE DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL E O DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO DE CONCESSÃO DE TRANSMISSORAS DE ENERGIA ELÉTRICA.
Trabalho de conclusão do curso de pós-graduação LLC – Direito Empresarial, necessário à obtenção do grau de pós-graduado; Insper; Direito Empresarial.
Orientadora: Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx
São Paulo 2017
XXXXX, Xxxxxx Xxxx
A morosidade do licenciamento ambiental e o desequilíbrio econômico financeiro do contrato de concessão de transmissoras de energia elétrica.
Xxxxxx Xxxx Xxxxx. – São Paulo, 2017. n.f.
Trabalho de Conclusão de Curso em Pós-Graduação Insper, 2017. Orientadora: Profª Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx
1. Contrato de concessão. 2. Transmissão de energia elétrica. 3. Licenciamento ambiental. 4. Reequilíbrio econômico-financeiro. I. Xxxxxx Xxxx Najar. A morosidade do licenciamento ambiental e o desequilíbrio econômico financeiro do contrato de concessão de transmissoras de energia elétrica.
A MOROSIDADE DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL E O DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO DE CONCESSÃO DE TRANSMISSORAS DE ENERGIA ELÉTRICA.
Trabalho de conclusão do curso de pós-graduação LLC – Direito Empresarial, necessário à obtenção do grau de pós-graduado; Insper; Direito Empresarial.
Orientadora: Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx
DATA DE APROVAÇÃO / /
BANCA EXAMINADORA
Nome: Titulação: Instituição:
Nome: Titulação: Instituição:
Nome: Titulação: Instituição:
As empresas de transmissão de energia elétrica recebem através de concessão da União a exploração do serviço, mediante a assinatura de contratos de concessão. Os contratos firmados entre as partes dispõem, entre outros aspectos, sobre a forma de remuneração e reajuste da tarifa a ser recebida pelas concessionárias pelos investimentos que realizarão. Ocorre que há situações, como o atraso do licenciamento ambiental, que impactam na execução dos contratos pelas concessionárias, sendo necessário o seu reequilíbrio econômico-financeiro. Diante de tal contexto, este artigo buscará responder em que medida os contratos de concessão poderão ser revisados quando há impactos decorrentes de atrasos de órgãos ambientais, o que é recorrente no Brasil.
Palavras-chave: Contrato de concessão. Transmissão de energia elétrica. Licenciamento ambiental. Reequilíbrio econômico-financeiro.
ABSTRACT
The electricity transmission companies receive through the concession of the Union the operation of the service, through the signing of concession contracts. The agreements signed between the parties include, among other aspects, the form of remuneration and readjustment of the tariff to be received by the concessionaires for the investments they will make. It occurs that there are situations, such as the delay of the environmental licensing, that impact on the execution of the contracts by the concessionaires, being necessary their economic-financial rebalancing. Given this context, this article will seek to answer the extent to which concession contracts can be revised when there are impacts due to delays by environmental agencies, which is recurrent in Brazil.
Keywords: Concession contract. Transmission of electricity. Environmental licensing. Economic and financial rebalancing
1. INTRODUÇÃO 1
2. DESENVOLVIMENTO 2
3. CONCLUSÃO 9
4. REFERÊNCIAS 10
1. INTRODUÇÃO
As concessionárias transmissoras do setor elétrico enfrentam diariamente problemas relacionados aos atrasos dos órgãos ambientais, em especial, quando da implantação dos empreendimentos, sejam novos ou melhorias/reforços, o que impacta no cumprimento do contrato de concessão e em discussões com a agência reguladora, a ANEEL.
O equilíbrio econômico financeiro1 é importante nos contratos de concessão, considerando os vultuosos investimentos para a construção, manutenção e operação dos empreendimentos.
Este trabalho tem o propósito de demonstrar em que medida os atrasos causados por órgãos ambientais na implantação de tais empreendimentos podem ser considerados motivos para a revisão do contrato de concessão, ou seja, que vão além da álea do negócio.
Sendo assim, inicialmente, será realizada breve exposição sobre a forma de exploração de serviços de energia elétrica, de acordo com o que preconiza a legislação pátria, com foco nas concessões de transmissão de energia elétrica.
Em seguida, serão abordados os reajustes e revisões previstos nos contratos de concessão, bem como o reequilíbrio econômico-financeiro destes contratos quando há atrasos nos licenciamentos ambientais.
Durante a pesquisa e desenvolvimento deste trabalho serão analisados os entendimentos da ANEEL e das transmissoras sobre o tema, que são divergentes, e de que forma este conflito está sendo tratado, com embasamento na doutrina, decisões administrativas e judiciais.
Para tanto, optou-se pelo método dedutivo, partindo-se da análise de conceitos gerais, visando investigar o conceito particular que envolve o assunto em questão.
Por fim, após compilar argumentos de teses doutrinárias e jurisprudências, será apresentada a conclusão do estudo, demonstrando em que medida o atraso do licenciamento ambiental pode gerar o desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão de transmissoras de energia elétrica e a sua consequente revisão.
1 XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 13 ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 748.
2. DESENOLVIMENTO
A exploração dos serviços e instalações de energia elétrica, conforme preconiza a Constituição Federal de 1988 (“CF”) é de competência da União, que pode realizá-la diretamente ou através de autorização, concessão ou permissão, observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, além de outras condições constitucionais, como a forma de contratar.
Ao adentrar na modalidade de exploração indireta dos serviços de transmissão de energia elétrica pela União por meio de outorga de concessão2, se faz necessário considerar que, em regra3, esta deverá ser precedida de licitação, assim como está regulamentada a CF, artigo 37, inciso XII, pela Lei n 8.666/1993 (“Lei de Licitações”).
A transmissão de energia elétrica, um dos seguimentos do mercado de energia4, faz parte de um modelo econômico complexo5, tanto no aspecto físico quanto no aspecto econômico. As licitações, neste caso, são realizadas por leilões promovidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), que possui delegação do Ministério de Minas e Energia (MME)6.
A participação nos leilões de transmissão requer o atendimento de diversos requisitos, técnicos, econômicos, jurídicos, estabelecidos no edital, os quais uma vez atendidos e apresentada proposta com a menor Receita Anual Permitida (RAP) resultará no vencimento do certame e consequente assinatura do contrato de concessão, cujo objeto inclui a construção, montagem, operação e manutenção das instalações de transmissão.
A RAP, remuneração recebida pelas transmissoras pela prestação do serviço público, “é obtida como resultado do próprio leilão de transmissão e é pago às transmissoras a partir da entrada em operação comercial de suas instalações, com
2 XXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx de. Contratos e Tributação. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 17-21.
3 O artigo 24 da Lei n 8.666/1993 traz os casos que dispensam licitações, ou seja, as exceções à regra.
4 O setor de energia elétrico, além da transmissão, é composto pela geração e distribuição, sendo tal divisão decorrente da desverticalização. XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Curso básico de direito de energia elétrica. 1 ed. Rio de Janeiro: Synergia, 2010, p.55.
5 DA XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. Direito e Infraestrutura. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 22.
6 ANEEL. Disponível em xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx0. Acesso em 15 out. 2017.
revisão a cada quatro ou cinco anos, nos termos dos contratos de concessão” 7.
Assim, conforme estabelecido no edital do leilão, os critérios de reajustes e revisões da RAP estarão previstos no contrato de concessão, instrumento pelo qual se formalizam as condições pactuadas entre a União, representada pela ANEEL, e a empresa transmissora de energia elétrica (“transmissora”) 8.
Entretanto, os reajustes e revisões definidos no contrato de concessão por vezes não recompõem os investimentos da transmissora, sendo necessário recorrer às previsões legais de revisão contratual, o que não é simples, conforme será demonstrado a seguir.
A revisão de contratos administrativos está estabelecida na Lei de Licitações, artigo 65, inciso II, alínea “d”, visando restabelecer a relação entre as partes, ou seja, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato na hipóteses de:
sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.
Verifica-se, portanto, que a teoria da imprevisão9 é admitida pelo direito brasileiro, como fundamento para a responsabilidade do Estado, em especial, quando é preciso reequilibrar as condições inicialmente contratadas10.
Sobre o equilíbrio econômico financeiro do contrato administrativo vale destacar que “é a relação de igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe correspondera”11.
O referido equilíbrio é essencial para que haja a legalidade da concessão de serviço público, pois a tarifa decorrente da prestação deste serviço deve remunerar a concessionária para que esta possa custear e ter justa remuneração pelo
7 ANEEL. Disponível em xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx-xxxxxxxxxxx/-
/asset_publisher/6pqBPPJq59Ts/content/receita-anual-permitida- rap/654800?inheritRedirect=false. Acesso em 15 out. 2017.
8 ANEEL. Disponível em xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx0. Acesso em 15 out. 2017.
9 DIAS, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx. Onerosidade excessiva e revisão contratual no direito privado. In: Contratos Empresariais - Fundamentos e Princípios dos Contratos Empresariais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 385 e 386.
10 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. Princípios Contratuais. In: Contratos Empresariais - Fundamentos e Princípios dos Contratos Empresariais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 20-50.
11 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx de. Curso de Direito Administrativo. 33 ed, São Paulo: Malheiros, 2016, p. 393.
investimento, bem como para que seja possível atender às necessidades de expansão e melhoria dos serviços e atração de novos capitais12.
Apesar de tal previsão, há a dificuldade em identificar o que é previsível ou não, visto a capacidade humana limitada de prever o futuro, e a consequente incompletude dos contratos, além de matrizes de riscos pobres, que muitas vezes não são compatíveis com os desafios das situações concretas, e falhas da gestão contratual13.
Ademais, há que se falar em fatos de terceiros, como a atuação de entes estatais, que se distinguem das partes contratantes, mas impactam no adimplemento das obrigações contratuais. Neste aspecto, enquadra-se a atuação dos órgãos ambientais, que é burocrática e conhecidamente demorada no Brasil, sendo que a demora na expedição de licenças ou outros tipos de autorizações impactam na realização das obras, sendo comum, ainda, exigências de condicionantes ambientais não definidas no edital do leilão e no contrato de concessão, que aumentam o custo da obra14.
O atraso ambiental não é propriamente imprevisível, sendo neste sentido o entendimento da jurisprudência, que afirma a notoriedade das dificuldades para a obtenção das licenças ambientais necessárias para a execução de contratos.
Dessa forma, se faz necessário avaliar em que medida este atraso pode ser causa de reequilíbrio econômico-financeiro de contratos de concessão, em especial daqueles celebrados com as concessionárias de serviços públicos de transmissão de energia elétrica15.
A Lei n 8.987/1995 (“Lei de Concessões”), que estabelece as normas para a outorga de concessões, regulamentando o artigo 175 da CF, faz a abordagem das revisões das tarifas, conforme já mencionado acima, bem como do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos com a administração pública, destacando-se:
12 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. Princípios Contratuais. In: Contratos Empresariais - Fundamentos e Princípios dos Contratos Empresariais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 19.
13 XXXXXXX, Xxxxxx Xxxx. Contratos públicos e direito privado: interpretação, princípios e inadimplemento. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000, p. 52.
14 Ibdem, p. 53.
15 Ibdem, p. 53.
Art. 9o [...]
§ 2o Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.
[...]
Art. 10. Sempre que forem atendidas as condições do contrato, considera-se mantido seu equilíbrio econômico-financeiro.
Ultrapassando as normas legais que regulam o tema, ressaltam-se as condições contratuais pactuadas pelas partes quando da assinatura do contrato de concessão.
Entre as obrigações assumidas pela transmissora através do contrato de concessão está a observância da legislação e requisitos ambientais aplicáveis, bem como a adoção das medidas necessárias à obtenção do licenciamento ambiental, por sua conta e risco.
Há também, não obstante as previsões legais, a definição de manutenção do equilíbrio econômico financeiro do contrato de concessão, citando-se como exemplo, o 5º aditivo do contrato de concessão nº 0059/2001, da CTEEP – Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista:
Cláusula 5ª [...]
Décima Subcláusula – A TRANSMISSORA deverá construir, operar e manter as INSTALAÇÕES DE TRANSMISSÃO, observadas a legislação e os requisitos ambientais aplicáveis, adotando todas as providências necessárias junto aos Órgãos responsáveis pelos licenciamentos, por sua conta e risco.
Neste sentido, e baseada no instrumento de concessão, é o entendimento da ANEEL que, em diversos momentos, posiciona-se argumentando que a transmissora submete-se aos riscos do negócio, devendo contingenciar e definir preços, possíveis variações e impactos, realizando a gestão dos recursos financeiros e licenciamento ambiental, que são riscos integrais desta.
A ANEEL afirma, ainda, que “não há previsão legal para afastar as responsabilidades da concessionária sobre o processo de licenciamento ambiental previsto no contrato de concessão” e, então16:
16 XXXXX, Xxxxx Xxxx; XXXXXX, Xxxxx xx Xxxxxxxx. Excludente de responsabilidade por atraso no licenciamento ambiental dos empreendimentos do setor elétrico e o reequilíbrio econômico financeiro da concessão in Temas relevantes no direito de energia elétrica - TOMO V/ Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, coordenador. – Rio de Janeiro: Synergia, p. 571.
[...] tem adotado um entendimento restritivo do contrato de concessão, suscitando o conteúdo clausular de que corre por conta e risco do empreendedor o licenciamento ambiental e que, por essa razão, não há que se falar em inimputabilidade ao concessionário do atraso no licenciamento ambiental, ainda que causado pela demora dos órgãos ambientais.
Entretanto, em regra, consta dos contratos de concessão previsão de que descumprimentos de xxxxxx intermediários do cronograma, motivados no processo de licenciamento ambiental por ocorrências não imputáveis às transmissoras, poderão ocasionar a revisão dos cronogramas de construção.
Desta forma, é possível que a ANEEL prorrogue o prazo de entrada em operação do empreendimento e não aplique as penalidades, descontos normativos, decorrentes de fatos de terceiros, no caso de fato imputável a órgão ambiental, mas não reconhece que tal atraso é causa de revisão financeira.
Considerando o próprio posicionamento da ANEEL, no sentido de reconhecer atrasos não imputáveis às transmissoras, possibilitando a revisão de cronograma e não aplicando desconto na RAP (PVA), atualmente regulado pela REN nº 729/2016 e a penalização prevista na REN nº 63/200417, as transmissoras defendem que deve ser reconhecida a revisão dos valores da RAP.
Ao analisar processos administrativos da ANEEL, cujo objeto é o pedido de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro de contrato de concessão celebrado com transmissoras, é recorrente o posicionamento da agência reguladora negando o mérito, visto que o licenciamento ambiental corre por conta e risco da transmissora.
Ocorre que tal entendimento, de risco ilimitado assumido pelas transmissoras, vai contra a própria finalidade18 da atividade que é delegada ao particular para alcançar o interesse público19.
Contudo, destaca-se o Parecer da AGU nº 003/2015/DECOR/CGU/AGU, pelo qual há o reconhecimento de reequilíbrio econômico-financeiro de contratos de concessão de transmissão quando o órgão ambiental não cumprir os prazos legais para a emissão das respectivas licenças ou ocorrerem fatos extraordinários com
17 Ibdem, p. 565.
18 XXXXXXXX XXXXX, Xxxx xxx Xxxxxx. Manual de direito administrativo – 25 ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587 de 3-1-2012. São Paulo: Atlas, 2012. p 373, e NERY JUNIOR, Nelson. Instituições de direito civil: contratos, volume III / Xxxxxx Xxxx Xxxxxx, Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016 p. 178.
19 ROLIM, op. cit., p. 571.
base na teoria da imprevisão.
Trata-se de entendimento inovador e positivo às transmissoras, que, apesar de não ter efeito vinculante, subsidia a atuação da Procuradoria Geral da ANEEL (PGE/ANEEL).
No mesmo sentido, é possível encontrar posição doutrinária que defende que atrasos decorrentes de atos de órgãos ambientais não poderiam ser imputados ao concessionário20.
Diante das considerações supra, e não vislumbrando solução administrativa, transmissoras recorreram ao Poder Judiciário para discutir a questão em tela, já que a própria ANEEL reconheceu período de atraso não imputável às empresas, mas ao órgão ambiental licenciador, em que houve a revisão do cronograma da obra, contudo, foi indeferido o pagamento da RAP proporcional a tal período.
O referido processo judicial, apesar de indeferido em primeiro grau, teve decisão liminar concedida pelo Tribunal, em sede de agravo de instrumento, a saber:
Tal o contexto, julgo procedente o pedido, em parte, para o fim de que sejam pagos as Agravantes os valores de RAP relativos ao período de atraso de 410 (quatrocentos e dez) dias, o que deverá ser feito no prazo de 02 (dois) anos, proporcionando-se a quantia devida em 2 (duas) parcelas anuais, e estas, em subparcelas mensais, na forma do contrato, que deverão coincidir com o momento regular de pagamento do preço do contrato de concessão pela Contratante à Contratada, medida que deve ser efetivada à partir do mês subsequente ao da publicação deste Acórdão.
É possível afirmar que se trata de decisão inédita para o setor de energia elétrica e apesar de ainda poder ser revertida, trata-se de posição que já vem apresentando movimentações da ANEEL, que publicou pauta de proposta de conciliação para os casos de pleito de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão, abrindo espaço para tentativa de acordo entre as partes, flexibilizando a sua postura inicial.
O cenário de morosidade do licenciamento ambiental é um dos fatores de análise dos empreendedores para a realização dos investimentos, podendo afetar o resultado dos leilões, bem como da disponibilização de energia elétrica21.
20 Ibidem, p. 566.
21 VALOR. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxx/0000000/xxxxxx-xx-xxxxxxx- ambiental-pode-afetar-resultado-de-leilao-da-anp. Acesso em 10 out. 2017. E SENADO. Disponível em: xxxxx://xxx00.xxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx/xxxxxxxxxxxx-xx- presidios/licenciamento-ambiental. Acesso em 10 out. 2017.
Há em debate projetos de lei que visam reduzir burocracias e dar eficiência ao licenciamento, mas que muitas vezes entram em conflito com a proteção do meio ambiente. A discussão está em andamento, mas é possível que mudanças normativas contribuam para a celeridade deste procedimento22.
Outro ponto que vale ser ponderado é que os prazos constantes do contrato de concessão, relacionados ao licenciamento ambiental, são, geralmente, inferiores aos prazos previstos na legislação ambiental. Este fato afeta as transmissoras já no momento de celebração do contrato, pois, além do cenário atual de atrasos na emissão de autorizações ambientais, as empresas assumem prazos difíceis de serem alcançados.
Constata-se, portanto, que apesar de entendimento diverso por parte da ANEEL e das transmissoras, há tendência de que, com o tempo, as partes alcancem um equilíbrio sobre o assunto, o que será de suma importância às empresas investidoras, resultando em segurança jurídica. A situação atual impacta as transmissoras, não sendo proporcional e razoável.
De qualquer maneira, havendo movimento no sentido de realização de revisão financeira dos contratos de concessão quando o atraso decorrer de órgãos ambientais, as transmissoras deverão realizar com eficiência a gestão do contrato de concessão, formalizando os prazos legais atrasados pelos órgãos ambientais, através de uma linha do tempo, que demonstre com clareza à ANEEL os fatos ocorridos. Além da gestão contratual embasar o pleito de reequilíbrio econômico- financeiro do contrato, a identificação da natureza do atraso impactará na aplicação ou não dos descontos/penalidades dispostas nas resoluções da ANEEL.
Os contratos administrativos têm o dever de atender o interesse público, devendo-se considerar como parte disso o reequilíbrio de direitos e obrigações das partes, restabelecendo equivalência inicialmente pactuada.
22 ÉPOCA. Disponível em: xxxx://xxxxx.xxxxx.xxx/xxxxxxx-x-xxxx-xxxxxxxx/xxxx-xx- planeta/noticia/2017/04/o-que-esta-errado-com-o-licenciamento-ambiental-no-brasil.html. Acesso em: 10 out. 2017.
3. CONCLUSÃO
A morosidade do licenciamento ambiental no Brasil impacta o desenvolvimento social e econômico sustentável, o que reflete nos empreendedores, que arcam com gastos/custos adicionais.
O processo de licenciamento ambiental é complexo e há visível conflito entre a viabilização de empreendimentos versus a proteção do meio ambiente.
Apesar de tal mora ser conhecida, quando o órgão ambiental não cumpre os prazos legais para a emissão das licenças ambientais e/ou ocorrem outros fatos extraordinários, há que se falar em fator imprevisível, que justifica a revisão do contrato de concessão.
A revisão do contrato de concessão pauta-se na álea extraordinária, a qual deve ser demonstrada de modo que se verifique que determinado fato vai além da premissa contratual “por conta e risco do empreendedor’’23.
Apesar da posição supramencionada não ser o entendimento da ANEEL, levando em consideração as posições atuais da AGU e do Poder Judiciário, verifica- se tendência de no futuro a revisão em questão ser reconhecida pelo órgão regulador do setor elétrico. Entretanto, trata-se de um tema ainda não pacífico, o que gera insegurança jurídica.
Para o futuro, há o desafio de atualização das normas ambientais, visando a simplificação do processo de licenciamento ambiental. Enquanto isso não ocorrer, é necessário que as normas do setor elétrico e os editais dos leilões reflitam a complexidade do licenciamento ambiental.
Ademais, se faz necessária a adequação dos prazos de licenciamento ambiental nos contratos de concessão, visto que os prazos previstos são inexequíveis.
Por fim, vale destacar que os contratos administrativos têm o dever de atender o interesse público, mas deve ser reconhecida a necessidade de reequilibrar direitos e obrigações das partes, restabelecendo equivalência inicialmente pactuada.
23 Contrato de Concessão n. 059/2001 – CTEEP e ANEEL. Disponível em: xxxx://xxx0.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxx/xxxxxxxx/xxxxxxxxxx_xxxxxxxxx/xxxxxxxx_xxxxx_00_00_ 01.pdf.
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