SESSÃO DE JULGAMENTO
SESSÃO DE JULGAMENTO
DO PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR CVM Nº RJ2006/4776
Acusado: Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Ementa: Não divulgação de Fato Relevante sobre a contratação de dois empréstimos concedidos pela Caemi Mineração e Metalurgia S.A. – CAEMI ("Caemi") à sua acionista controladora, Companhia Vale do Rio Doce ("CVRD"), em infração ao §4˚ do art. 157 da Lei n˚ 6.404/76, combinado com o art. 3˚ da Instrução CVM n˚ 358/02. Multa.
Decisão: Vistos, relatados e discutidos os autos, o Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários, com base na prova dos autos e no disposto no art. 11, II e §1º da Lei 6.385/76, decidiu, por unanimidade de votos, aplicar a pena de multa pecuniária no valor máximo de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) ao acusado, por violação ao §4˚ do art. 157 da Lei 6.404/76, combinado com o art. 3˚ da Instrução CVM nº 358/02.
O acusado punido terá um prazo de 30 dias, a contar do recebimento de comunicação da CVM, para interpor recurso, com efeito suspensivo, ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, nos termos do parágrafo único do artigo 14 da Resolução CMN nº 454/77.
Proferiu defesa oral o advogado dr. Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx, representante legal do acusado.
Presente à sessão de julgamento o procurador-federal Xxxxx Xxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx, representante da Procuradoria Federal Especializada da CVM.
Presentes os diretores Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, relator, Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx e o presidente da CVM, Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, que presidiu a sessão.
Rio de Janeiro, 17 de janeiro de 2007.
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx Diretor Relator
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Trindade Presidente da Sessão de Julgamento Relatório
Introdução.
01. O Termo de Acusação RJ2006/4776 (fls. 234/252) (" Termo de Acusação") trata da divulgação de dois empréstimos concedidos pela Caemi Mineração e Metalurgia S.A. – CAEMI ("Caemi") à sua acionista controladora Companhia Vale do Rio Doce ("CVRD") ("Empréstimos"). O órgão acusador é a Superintendência de Relações com Empresas ("SEP"). O indiciado é Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Junior (" Indiciado").
02. O Termo de Acusação decorre de fatos apurados no âmbito do Processo RJ2005/9748, que analisa todos os aspectos relacionados à concessão dos Empréstimos, inclusive com relação à observância pelos administradores da Caemi de seus deveres de diligência e lealdade (arts. 153 à 156 e 245 da Lei 6.404/76), dos deveres da CVRD como acionista controladora (arts. 116, 117 e 246 da Lei 6.404/76) e dos deveres de divulgação dos administradores da Caemi e da CVRD (art. 157 da Lei 6.404/76 e Instrução 358/02). Este processo trata de apenas um desses assuntos (deveres do Indiciado, administrador da Caemi, de divulgar informações relativas aos Empréstimos).
03. Este relatório será um pouco diferente dos que faço usualmente, uma vez que os fatos foram apurados a partir de uma série de comunicações de Caemi e CVRD. Começarei por precisar as funções do Indiciado, seguido dos nomes e cargos dos administradores da Xxxxx que são administradores ou funcionários da CVRD e que participaram da concessão dos Empréstimos, passando pela apresentação das provas. Após essa primeira fase, narro os fatos importantes para a análise do Termo de Acusação. Por fim, apresento as imputações e os argumentos de defesa.
Indiciado.
04. O Indiciado era o Diretor-Presidente e de Relações com Investidores da Xxxxx, à época dos fatos. Ele "foi eleito Diretor Executivo da CVRD para assuntos corporativos em abril de 2006. O Sr. Xxxxxxx ingressou na CVRD em 1985 e possui ampla experiência em assuntos de finanças corporativas. Foi diretor do departamento de Finanças Corporativas da CVRD e também diretor financeiro da FCA entre agosto de 1999 e setembro de 2003. O Sr. Xxxxxxx trabalhou em diversas posições em empresas filiadas à CVRD, como a FCA, Samarco, Ferroban, Açominas, Gulf Industrial Investment Corporation, Itabrasco e Hispanobrás. Desde outubro de 2003, o Sr. Xxxxxxx é diretor presidente da Xxxxx e da MBR" (cf. tradução do mais recente Formulário 20F da CVRD, pg. 85, disponível no site da CVRD).
Administradores da Caemi que são administradores ou funcionários da CVRD .
05. Os administradores da Caemi que são administradores ou funcionários da CVRD e que participaram da concessão dos Empréstimos são os seguintes:
Nome | Cargo Caemi | Cargo CVRD |
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx | presidente do conselho de administração | Diretor1 de finanças e de relações com investidores |
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx | conselheiro de administração | diretor da área de ferrosos |
Xxxxxxx Xxxxxxx | conselheiro de administração | diretor da área de planejamento e gestão |
Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx | conselheiro de administração | consultor geral2 |
Provas.
06. Elencarei as provas em grupos. No primeiro, uma lista de ofícios da CVM para a Caemi e as respectivas respostas. Depois, a lista para a CVRD. Em seguida, a lista de atos societários relativos aos Empréstimos. No quarto grupo, elenco as comunicações da Xxxxx e CVRD ao mercado, com relação aos Empréstimos. Por fim, outros documentos que constam do processo e que foram juntados pela SEP, pelo Indiciado, pela Caemi ou pela CVRD.
07. Começando pelo primeiro grupo, abaixo encontra-se a lista de ofícios enviados pela SEP à Caemi e de respostas da Caemi:
(i) ofício CVM/SEP/GEA-2/561/05, de 17.11.05 (fls. 02) (" Primeiro Ofício para a Caemi ");
(ii) carta da Xxxxx, de 23.11.05, assinada pelo Indiciado, em resposta ao Primeiro Ofício para a Caemi (fls. 04/05) ("Primeira Carta da Caemi");
(iii) ofício CVM/SEP/GEA-2/587/05, de 01.12.05 (fls. 12) (" Segundo Ofício para a Caemi ");
(iv) carta da Xxxxx, de 09.12.05, assinada pelo Indiciado, em resposta ao Segundo Ofício para a Caemi (fls. 14) ("Segunda Carta da Caemi ");
(v) ofício CVM/SEP/GEA-4/048/06, de 02.02.06 (fls. 20) (" Terceiro Ofício para a Caemi ");
(vi) carta da Xxxxx, de 10.02.06, assinada pelo Indiciado, em resposta ao Terceiro Ofício para a Caemi (fls. 22/24) ("Terceira Carta da Caemi ");
(vii) ofício CVM/SEP/GEA-4/181/06, de 13.03.06 (fls. 63/64) (" Quarto Ofício para a Caemi");
(viii) carta da Xxxxx, de 23.03.06, assinada pelo Indiciado, em resposta ao Quarto Ofício para a Caemi (fls. 66/68) ("Quarta Carta da Caemi ");
(ix) ofício CVM/SEP/GEA-4/252/06, de 23.05.06 (fls. 124/125) (" Quinto Ofício para a Caemi"); e
(x) carta da Xxxxx datada de 09.06.06, assinada por seu advogado, em resposta ao
Quinto Ofício para a Caemi (fls. 127/131) ("Quinta Carta da Caemi ").
08. Na lista abaixo, encontram-se os ofícios enviados pela SEP à CVRD e as respostas da CVRD:
(i) Ofício CVM/SEP/GEA-4/030/06, de 16.01.06 (fls. 16) (" Primeiro Ofício para a CVRD");
(ii) Carta da CVRD de 19.01.06, assinada por Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, , em resposta ao Primeiro Ofício para a CVRD (fls. 18/19) ("Primeira Carta da CVRD");
(iii) Ofício CVM/SEP/GEA-4/049/06, de 02.02.06 (fls. 42) (" Segundo Ofício para a CVRD "); e
(iv) Carta da CVRD, de 04.02.06, assinada por Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, em resposta ao Segundo Ofício para a CVRD (fls. 44/45) ("Segunda Carta da CVRD").
09. Outro grupo importante de documentos para a comprovação dos fatos objeto do Termo de Acusação são os atos societários produzidos ou existentes. É de se notar que a CVM solicitou à Caemi "cópia de todas a atas de reunião de Conselho de Administração, Diretoria, Conselho Fiscal e Assembléias que tenham tratado do assunto em questão" (cf. Terceiro Ofício para a Caemi, fls. 20). Mesma solicitação foi feita à CVRD (cf. Segundo Ofício para a CVRD, fls. 42). Nas respectivas respostas, foram encaminhados os seguintes documentos:
(i) certidão da ata da reunião da diretoria da CVRD, de 05.09.05, mencionando a aprovação de "celebração de operação de mútuo com a MBR, no valor de até US$500 milhões" (fls. 49) (" Certidão da Ata da RD CVRD");
(ii) extrato da ata da reunião do conselho fiscal da CVRD, de 25.11.05, na qual foram prestados esclarecimentos sobre o Primeiro Empréstimo (fls. 51) ("Ata da RCF CVRD");
i. certidão da ata da reunião do conselho de administração da Xxxxx, de 18.08.05, mencionando a aprovação de concessão de mútuo pela Minerações Brasileiras Reunidas S/A – MBR à CVRD de até R$300 milhões (fls. 37) ("Certidão da Ata RCA Caemi – Autorização do Primeiro Empréstimo ");
(iv) ata da reunião do conselho de administração da Xxxxx, de 18.08.05, aprovando a concessão de mútuo pela Minerações Brasileiras Reunidas S/A – MBR à CVRD de até US$300 milhões (fls. 140/141) ("Ata RCA Caemi – Autorização do Primeiro Empréstimo");
(v) ata da reunião do conselho fiscal da Xxxxx, de 07.11.05, na qual foi emitido parecer favorável às demonstrações financeiras do terceiro trimestre de 2005 (fls. 41) ("Ata RCF Caemi – Aprovação 3º ITR");
i. certidão da ata da reunião do conselho de administração da Xxxxx, de 07.10.05, mencionando a aprovação de aumento da autorização para concessão de mútuo pela Minerações Brasileiras Reunidas S/A – MBR à CVRD para até US$500 milhões (fls. 142) (" Certidão da Ata de RCA Caemi – Autorização do Segundo Empréstimo"); e
(vii) estatuto social da Caemi, em vigor em 31.12.04 (fls. 189/197) (" Estatuto Social Caemi").
10. Um outro grupo de provas importantes são os documentos que contém a divulgação pela CVRD e Caemi das informações sobre os Empréstimos (na verdade, divulgou-se ao mercado apenas o Primeiro Empréstimo). Esses documentos são os seguintes:
(i) Formulário ITR do 3º trimestre de 2005 da Caemi, divulgado em 08.11.05 (fls. 199/221) ("ITR 3º trimestre");
i. comunicado ao mercado de 09.11.05 prestando esclarecimentos sobre o Primeiro Empréstimo (fls. 186) ("Comunicado ao Mercado"); e
(iii) transcrição da teleconferência da CVRD realizada em 11.11.05 comentando os resultados do terceiro trimestre de 2005 (fls. 153/168) ("Teleconferência").
11. Na lista abaixo, encontram-se os demais documentos relevantes para a comprovação dos fatos narrados no Termo de Acusação3:
(i) contrato de mútuo entre a MBR Overseas Limited (" MBR Overseas") e a Itabira Doce Company Limited ("Itaco"), datado de 06.09.05, no valor de US$230 milhões (fls. 116/117) ("Primeiro Empréstimo");
(ii) contrato de mútuo entre a MBR Overseas e Itaco, datado de 28.10.05, no valor de US$170 milhões (fls. 118/120) ("Segundo Empréstimo");
(iii) resumo preparado pela Caemi, a pedido da CVM, dos mútuos entre partes relacionadas de que sejam parte Caemi ou suas controladas (fls. 121) ("Resumo dos Empréstimos");
(iv) norma geral de controle de risco e concessão de crédito aplicável à Caemi (fls. 26/35) ("Norma de Empréstimos");
(v) comprovante de pagamento do Primeiro Empréstimo pela Itaco para a MBR Overseas, no valor de US$233.511.975,16, em 26.01.06, entregue pela CVRD na Segunda Carta da CVRD (fls. 47) ("Comprovante de Transferência");
(vi) relatório de análise da Xxxx Xxxxxxxxx, de 09.11.05, preparado por Xxxxx xx Xxxx (fls. 143/146) ("Análise Itaú");
(vii) relatório de análise da Deutsche Ixe distribuído pelo Deutsche Bank, de 10.11.05, preparado por Xxxxx Xxxxxxxxx, Xxxxxx Xxx e Xxxxxxxxx Xxxxx (fls. 147) ("Análise Deutsche"); e
(viii) relatório de análise do Banco Pactual, de 10.11.05, preparado por Xxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxx Xxx e Xxxxxxxx Xxxxxxxxx (fls. 148 a 152) ("Análise Pactual").
12. Listadas as provas, passarei a narrar os fatos descritos no Termo de Acusação ou constantes das provas trazidas aos autos, fazendo menção ao final do parágrafo ou em nota de rodapé dos documentos que comprovam cada um desses fatos. Começarei pelos Empréstimos.
Empréstimos.
13. A MBR Overseas, subsidiária integral da Xxxxx, concedeu à Itaco, subsidiária integral da CVRD, os dois Empréstimos. As características comuns desses Empréstimos são:
(i) Remuneração: Libor de 5 meses, acrescida de 0,05% ao ano 4;
(ii) Duração: prazo determinado; e
(iii) Pré-pagamento: não há disposição específica, embora seja aceito o pré-pagamento por decisão do devedor de forma implícita5.
14. As características não comuns desses dois empréstimos são abaixo descritas 6:
Data | Vencimento | Montante | Data de Quitação | |
Primeiro Empréstimo | 06.09.05 | 26.01.06 | US$230 milhões7 | 26.01.06 |
Segundo Empréstimo | 28.10.05 | 27.03.06 | US$170 milhões8 | 21.12.05 |
15. O Primeiro Empréstimo representava 21,7% do patrimônio líquido da Caemi em 31.09.05 (com base no 3˚ ITR/05 consolidado) e o Segundo Empréstimo representa 16,37% do patrimônio líquido da Caemi na mesma data (total de 38,07%) e representariam 81% dos valores da "carteira administrada pela Caemi e controladas" 9 (cf. Xxxxxx Xxxxxx
para a Caemi, fls. 124).
16. A justificativa apresentada pela Caemi para os Empréstimos foi:
"A possibilidade de se evitar intermediação financeira, que, indiscutivelmente, reduz os ganhos
financeiros em operações desta natureza, aliada à disponibilidade de recursos a curto prazo por parte da MBR, motivaram o Conselho de Administração da CAEMI a aprovar a celebração do mútuo em questão, pelo que ratificamos que não havia nenhuma outra razão específica para a efetivação do referido negócio jurídico" (cf. Quarta Carta da Caemi, fls. 67).
17. A Caemi, ao justificar o Primeiro Empréstimo 10, citou "algumas operações financeiras e suas respectivas remunerações, realizadas pela MBR Overseas Ltd., junto ao mercado financeiro internacional à época da realização da transação com a subsidiária da CVRD". Essas operações seriam todas da modalidade time deposit e teriam as seguintes carcterísticas:
Banco | Contrato | Juros | Data Aplicação | Saldo Inicial (US$) |
Bradesco | TDBBD020905 | 3,50% a.a. | 02/09/2005 | 10.100.000,00 |
Bradesco | TDBBD310805 | 3,50% a.a. | 31/08/2005 | 5.250.000,00 |
Fortis Bank | TDFOR060905 | 3,45% a.a. | 06/09/2005 | 20.500.000,00 |
Unibanco | TDUNI020905 | 3,50% a.a. | 02/09/2005 | 15.000.000,00 |
50.850.000,00 |
18. A Caemi também informou que o Primeiro Empréstimo foi realizado "em condições compatíveis com aquelas praticadas pelo mercado internacional para operações do mesmo valor e em linha com a política financeira de aplicação de Caixa da Caemi" (ver Terceira Carta da Caemi, fls. 23).
19. A CVRD fez a seguinte declaração sobre o Primeiro Empréstimo:
"(...) tratou-se de uma operação rentável com previsão de taxa de juros superior à média cotada junto às principais instituições financeiras, conforme evidenciado pela CAEMI, através das cartas encaminhadas à CVM, anexadas ao Ofício em referência" (na Primeira Carta da CVRD, fls. 19).
20. O trecho da correspondência da CVRD, que foi transcrito acima, não permite definir exatamente a qual carta da Caemi ela se refere. Pela data da Primeira Carta da CVRD (19.01.06), mais a menção ao ofício da CVM "em referência" (aparentemente o Primeiro Ofício para a CVRD) e também a citação, em outro trecho da correspondência da CVRD, à Primeira Carta da Caemi (fls. 04/05), presume-se que a CVRD referia-se a essa carta da Caemi. Nela, não foram anexadas consultas a instituições financeiras, mas, em seu item 5, são mencionados alguns depósitos remunerados feitos pela Caemi à época (todas elas transcritas no item 17 deste relatório).
21. A Caemi aprovou a concessão de empréstimo à CVRD, em 18.08.05, em reunião do conselho de administração 11. Nessa reunião, votaram os seguintes administradores da Caemi, que também são administradores ou funcionários da CVRD: Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx. Também participou da votação Xxxxxx Xxxx Xxxxx Xxxxx, que, de acordo com as informações dos autos, não é funcionário da CVRD, embora tenha sido eleito pela CVRD. Constou da ata a seguinte aprovação:
"realização pela sua controlada Minerações Brasileiras Reunidas S.A. – MBR, de operações de mútuo em favor da Companhia Vale do Rio Doce ou empresas por ela controladas, no valor de até US$300 milhões12, às taxas vigentes de mercado" .
22. Uma nova reunião do conselho de administração teria ocorrido, agora sem a presença de Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, mas com a presença de Xxxxxxx Xxxxxxx00. Os demais participantes da reunião foram Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx e Xxxxxx Xxxx Xxxxx Xxxxx. Nessa deliberação, aprovou-se o aumento da autorização anterior para concessão de
empréstimos à CVRD de US$300 milhões para US$500 milhões.
23. Na CVRD 14, a contratação de empréstimos junto à Xxxxx foi autorizada em reunião da diretoria da CVRD, que aprovou contratação de empréstimo junto a Xxxxx. Dentre os diretores da CVRD que participaram dessa decisão, encontram-se os seguintes conselheiros de administração da Xxxxx (também diretores ou funcionários da CVRD): Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx. A deliberação deu-se nos seguintes termos:
"aprovou a celebração de operação de mútuo com a MBR, no valor de até US$500 milhões, em condições de mercado, visando otimizar o gerenciamento".
24. Houve questionamento do conselho fiscal da CVRD sobre o Primeiro Empréstimo. A administração da CVRD prestou esclarecimentos sobre o Primeiro Empréstimo na reunião do conselho fiscal de 25.11.0515. Os administradores da CVRD presentes eram Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx (diretor não estatutário do
departamento de finanças) e Xxxxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx (gerente geral de tesouraria), que realizaram explanações
sobre o tema e "informaram que a operação foi aprovada pelo Conselho de Administração da Caemi e pela Diretoria- Executiva da CVRD e está suportada por contrato" (fls. 51). Os conselheiros fiscais presentes à reunião eram: Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxx, Xxxx Xxxxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx e Xxxxxx Xxxxxxx xxx Xxxxxx.
25. O Primeiro Empréstimo foi divulgado ao mercado, em 08.11.05, no ITR 3˚ Trimestre, na Nota Explicativa 8 "c" das demonstrações financeiras trimestrais ("Nota Explicativa"), da qual constava o saldo e a seguinte nota:
"Empréstimo efetuado a subsidiária da CVRD, com incidência de juros de 3,41% a.a. e vencimento em 26 de janeiro de 2006" (fls. 211).
26. O Primeiro Empréstimo foi objeto de nova comunicação, realizada por meio do Comunicado ao Mercado, encaminhado em 09.11.05:
"Com respeito aos questionamentos sobre a operação mencionada na Nota Explicativa 8(c) Partes Relacionadas, integrante das Demonstrações Financeiras de 30 de setembro de 2005, divulgada ontem ao mercado, cumpre-nos esclarecer:
1) A operação financeira foi realizada entre a subsidiária no exterior da Minerações Brasileiras Reunidas S.A. – MBR, MBR Overseas Ltd., e uma subsidiaria da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) no exterior, Itabira International Ltd.;
2) O contrato celebrado em agosto de 2005 entre as partes é de US$230 milhões correspondentes a R$512,6 milhões, com juros de Libor + 0,05% a.a., correspondente a taxa média de 3,91% a.a., pelo prazo de até 142 dias. O contrato contempla opção de liquidação antecipada, a qualquer tempo, a critério da MBR Overseas Ltd. (liquidez imediata);
3) A operação foi aprovada pelo Conselho de Administração da MBR, estando a mesma em linha com a política financeira de aplicação de recursos de Caixa da Caemi; e
4) As condições da operação são compatíveis com aquelas praticadas no mercado financeiro internacional por mesmo valor e prazo" (fls.186).
27. O Segundo Empréstimo não foi divulgado ao mercado. A notícia sobre a sua existência surgiu apenas na Quarta Carta da Caemi16 após questionamento específico feito pela CVM 17.
28. Ainda sobre a divulgação do Segundo Empréstimo, o diretor de finanças e de relações com investidores da CVRD e presidente do conselho de administração da Xxxxx, Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, já havia negado a existência de um outro mútuo da Xxxxx para a CVRD, por duas vezes:
(i) em 19.01.06, em resposta à CVM: "Ademais, o referido empréstimo, além de ser uma operação singular, não visa alterar ou impactar a atividade principal exercida pela CAEMI, o objetivo foi apenas evitar a intermediação financeira que, conforme já dito pela própria CAEMI, sempre reduz os ganhos financeiros em operações de tal natureza" (fls. 18); e
(ii) em 04.02.06, em resposta à CVM: "Cabe registrar que foi realizada apenas esta vez um empréstimo, trazendo benefícios para o mutuante e para os seus acionistas, como mencionado acima, e também para a mutuária e seus acionista" (fls. 44).
29. Na Teleconferência, ao se referir ao Primeiro Empréstimo, Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, também não mencionou a existência do Segundo Empréstimo:
"Eu gostaria de aproveitar esta oportunidade para esclarecer a operação que nós realizamos com Xxxxx, e suas subsidiárias, e que causou certo impacto no mercado"18.
Reação do Mercado.
30. Constam dos autos três relatórios de análise preparados logo após a divulgação do Primeiro Empréstimo. Os principais pontos desses relatórios com relação aos Empréstimos são transcritos abaixo:
(i) Análise Itaú:
(a) Comentários sobre o Primeiro Empréstimo: "Nós devemos confessar que estamos extremamente surpresos e até mesmo tristes hoje. Depois de analisarmos mais detalhadamente os lucros trimestrais apresentados pela Caemi descobrimos, no balanço patrimonial da MBR, subsidiária da Caemi e produtora de aço, a existência de um intercompany loan (empréstimo entre empresas afiliadas) entre a MBR e a ITACO, uma empresa offshore integralmente controlada pela da CVRD.
Nos termos desse empréstimo, no valor de R$513 milhões, com vencimento em 26 de janeiro de 2006, a MBR está recebendo uma taxa de retorno insignificante igual a 3,41% a.a.
Nós acreditamos que esse empréstimo constitui conflito de interesses entre o acionista controlador da Caemi, a CVRD, e os acionistas minoritários da Caemi, uma vez que esses, sem controle gerencial sobre os recursos da companhia, não podem se beneficiar de empréstimos com taxas tão atraentes, ainda que elas estejam alinhadas com as taxas do mercado para depósitos em mercados internacionais.
A lógica existente por trás desse empréstimo realizado entre as duas companhias está longe de ser clara. A CVRD, companhia que supostamente adota padrões rigorosos de governança corporativa (...)"19;
(b) Recomendação sobre a ação preferencial da Caemi: "Nosso valor justo atribuído à CMET4 de R$4,10 para o fim de 2006 envolve um retorno total do período de aproximadamente 30%, comparado ao retorno total esperado para o Índice Bovespa de 42%. Como conseqüência disso nossa recomendação em relação à CAEMI (CMET4) piorou, passando de BUY para HOLD. (…)
Além disso, a Xxxxx está negociando a 6,4x a previsão P/E’06, um desconto relativamente justo de 12% em relação ao múltiplo RIO-P, de 7,4x, se nós considerarmos as dúvidas agora existentes em relação aos padrões de governança coorporativa adotados pela companhia, o que pode levar os
investidores a olharem com desconfiança para investimentos na Caemi"20; e
(c) Impacto do Primeiro Empréstimo sobre o valor das ações da CVRD: "Essa insatisfação em relação aos padrões de governança corporativa poderão também afetar o rendimento futuro das ações da CVRD"21.
i. Análise Deutsche: "Investidores estão insatisfeitos em relaęão a um intercompany loan (empréstimo entre empresas afiliadas), no valor de R$512,8 milhões (US$230 milhões), concedido pela Caemi à sua controladora CVRD, que vem aumentando suas preocupações relacionadas aos padrões de governança coorporativa. Tal empréstimo foi divulgado pela primeira vez num release do resultado do 3º trimestre emitido em 09 de novembro, porém detalhes só foram revelados no ITR, página 16 (formulário de divulgação obrigatória no Brasil para as empresas listadas em Bolsa). Alguns investidores interpretaram esta conduta de forma negativa por duas razões:
1. Se Caemi transfere seu dinheiro para sua controladora CVRD, isto de alguma forma irá reduzir e/ou impedir a distribuição de dividendos da Caemi; e
2. Um potencial conflito pode existir se as taxas dos juros recebidos pela Caemi forem muito baixas, o que pode ser interpretado como um subsídio para prejudicar os minoritários (40% dos acionistas da companhia).
A Caemi divulgou um comunicado à imprensa esclarecendo : 1) a aprovação da operação pelo conselho foi organizada diretamente entre duas subsidiárias internacionais;
2) o empréstimo foi concedido em agosto de 2005, sendo o vencimento em 142 dias
contados da contratação, com remuneração de Libor + 0,05% a.a. e podendo ser desfeito a qualquer tempo; 3) o empréstimo foi estruturado conforme as condições do Mercado. Para a CVRD o valor do empréstimo é insignificante, representa somente 9% de seu passivo líquido e menos de 0,04% de sua capitalização de mercado.
Nós acreditamos que esse empréstimo não deve afetar a capacidade da Caemi de distribuir dividendos. Conversamos com ambas as companhias e a Caemi não estava planejando um dividendo na segunda metade de 2005. No entanto, a questão de governança coorporativa pode ser mais complicada, pois às vezes a "aparência" é mais importante do que a realidade. A CVRD adere aos altos padrões de governança coorporativa, e isso é capaz de manchar um registro que de outra forma é limpo. Nós acreditamos que ambas as companhias irão procurar desfazer esse empréstimo, mas a notícia provavelmente irá causar um impacto negativo no curto prazo nas ações das duas companhias. Em médio prazo isso poderia ser um incentivo positivo para a criação de políticas claras de fluxo de caixa para Caemi e de limites entre controladora e
subsidiária"22 (grifos constam do original).
(iii) Análise Pactual:
(a) Comentários sobre o Primeiro Empréstimo: "O balanço patrimonial do terceiro trimestre da CAEMI incluiu um intercompany credit (crédito entre empresas afiliadas) no valor de R$513 milhões devido a um empréstimo de curto prazo para CVRD. De acordo com notas explicativas ao balanço patrimonial da CAEMI, o vencimento de tal empréstimo será em 26 de janeiro de 2006. Adicionalmente, foi mencionado que a remuneração pelo empréstimo é de LIBOR + 0,05%, a qual supostamente deveria ser mais elevada do que os juros para posição de caixa em dólar da Xxxxx. Mesmo assim, nós entendemos que tal investimento levanta dúvidas sobre a política de governança coorporativa e de dividendos da Caemi. Nesse sentido, é importante lembrar que a estrutura de capital da Caemi é altamente ineficiente, com uma net cash position (saldo de caixa positivo) equivalente a R$553 milhões. Assim, nós esperávamos que a CAEMI ajustasse tal distorção aumentando a distribuição de dividendos ao invés de emprestar
dinheiro ao seu acionista controlador"23 (grifos inexistentes no original);
(b) Recomendação sobre a ação preferencial da Caemi: "Nossa avaliação para CAEMI piorou, passando de Top Pic para Outperform, considerando (i) o surgimento de uma maior preocupação em relação à política de governança coorporativa depois que o balanço patrimonial da CAEMI revelou um intercompany debt (empréstimo entre empresas afiliadas) no valor de
R$513 milhões para a CVRD (...)"24; e
(c) Impacto do Primeiro Empréstimo sobre o valor das ações da CVRD: "Embora nós esperemos que as ações da CVRD sejam negativamente impactadas pela divulgação do referido intercompany debt (empréstimo entre empresas afiliadas), nós acreditamos que a Caemi deve ter pior performance
que a CVRD no curto prazo"25.
31. Em 11.11.05, na Teleconferência, Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx fez a seguinte declaração sobre o Primeiro Empréstimo:
"Eu gostaria de aproveitar esta oportunidade para esclarecer a operação que nós realizamos com Xxxxx, e suas subsidiárias, e que causou certo impacto no mercado. Sob o nosso ponto de vista, essa operação, que foi primeiramente integralmente divulgada para o Mercado, é uma operação de muito curto prazo; sob o nosso ponto de vista trata-se apenas de um ajuste no fluxo de caixa sem qualquer repercussão ou conseqüência em relação à política de dividendos da Xxxxx, ao programa de
investimentos da Xxxxx ou a qualquer outra decisão que poderia ser tomada pela Caemi. De novo, trata- se de uma operação de muito curto prazo que está remunerando a Caemi da mesma forma que a Caemi seria remunerada em circunstâncias normais no mercado e nós não vemos isso de forma diferente, como uma operação de qualquer... como uma operação que pode ser diferente de qualquer otimização de fluxo de caixa do grupo. No entanto, nós entendemos a mensagem do mercado em termos de operação e nós gostaríamos de reafirmar para aqueles com os quais nós não falamos ainda que esta operação será liquidada, no mais tardar, em janeiro do próximo ano, que é a data de vencimento original da operação. De novo, trata-se de uma operação que é, sob o nosso ponto de vista, favorável para Xxxxx, favorável para a CVRD, mas será liquidada conforme planejado e não depois de janeiro de 2006, sem qualquer conseqüência para os planos de investimentos da Caemi e sem qualquer conseqüência, em termos de pagamento de dividendos, para os acionistas da Caemi. Eu gostaria de esclarecer esse
ponto antes de qualquer coisa"26.
32. Mesmo após essa declaração, na seção de perguntas e respostas da Teleconferência, foram feitas perguntas e comentários sobre o Primeiro Empréstimo. Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx ainda fez o seguinte comentário que complementa as suas considerações iniciais27:
"O que eu mencionei foi que nós soubemos da reação do mercado e essa reação estava ligada à operação, sendo assim nós tomaremos as medidas adequadas nesse sentido (...)"28
Outras Informações Importantes para Definir a Relevância dos Empréstimos .
33. A Norma de Empréstimos (fls. 26/35) foi aprovada em reunião do conselho de administração da Xxxxx, realizada em 06.05.04, com a participação de Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx e mais dois conselheiros de administração da Caemi à época, que não participaram das deliberações sobre os Empréstimos (fls. 39).
34. Pela Norma de Empréstimos, os empréstimos a partes relacionadas 29 são regulados pelo item "6. Definição de Limites de Crédito para a Contratação de Operações Financeiras com Instituições Financeiras" (fls. 29/32), conforme estabelece o item 6.830 da Norma de Empréstimos.
35. Segundo as Normas de Empréstimos, as principais regras aplicáveis a empréstimos a partes relacionadas (categoria na qual se inserem os Empréstimos) são31:
(i) classificação de risco igual a "A", pela Standard and Poor’s, "A3", pela Moody’s, ou "A-", pela Fitch Ratings (item 6.1.1) (fls. 29/30);
(ii) alternativamente ao critério acima, se o crédito da companhia for limitado pela classificação de risco dos países onde estão sediadas, a classificação de risco de longo prazo do país deve ser igual ou melhor do que a do Brasil (item 6.1.2.1) e a instituição deve apresentar classificação de risco local igual ou superior à mencionada em "i" acima (item 6.1.2.2) (fls. 30);
(iii) o Patrimônio Líquido Consolidado 32 deve ser de, no mínimo, US$500 milhões (item 6.1.3) (fls. 30);
(iv) o limite de exposição ao crédito não poderá ser superior a 10% do Patrimônio Líquido Consolidado e compreenderá a totalidade de operações com a companhia (item 6.2) (fls. 30);
(v) a participação de cada companhia no total da carteira administrada pela Caemi ou controladas não poderá ser superior a 20%. Recomenda-se, por motivos operacionais, que seja utilizado, no dia-a-dia da empresa, o parâmetro de 15% (item 6.3) (fls. 30); e
(vi) caberá à diretoria de finanças aprovar as companhias junto às quais poderão ser contratadas operações financeiras e os limites de crédito a elas associados (item 6.6) (fls. 31).
36. Na Segunda Carta da Xxxxx, consta a seguinte informação sobre a adequação do Primeiro Empréstimo à Xxxxx de Empréstimos (fls. 14):
"1. A política financeira de Aplicação de Recursos de Caixa da Caemi Mineração e Metalurgia S.A. (CAEMI), dispõe que a maioria das suas aplicações financeiras deve ser realizada em dólares, em instituições com Patrimônio Liquido Consolidado mínimo de US$500 milhões e com ‘rating’ em moeda local de ‘A’, sendo que na operação financeira em questão, levou-se em consideração os dados da Companhia Vale do Rio Doce, a qual possui grau de investimento e patrimônio bem superior ao piso estipulado na norma.
2. Assim, verificado o preenchimento de todas as cautelas e formalidades necessárias à efetivação de uma operação financeira dessa natureza, e considerando, sobretudo, que se trata de uma operação rentável com a previsão de taxa de juros superior à média cotada junto às principais instituições financeiras, a administração da MBR e da CAEMI autorizaram sua realização".
37. Em outros posicionamentos posteriores, tanto a Caemi 33 quanto a CVRD 34 informaram que o Primeiro Empréstimo foi prestado de acordo com os termos da Norma de Empréstimos.
Acusação.
38. Após elencar todos os fatos e comunicações trocadas durante o processo investigatório, a SEP imputou ao Indiciado, que, à época da concessão dos Empréstimos, era o diretor de relações com investidores da Xxxxx, as seguintes infrações:
"Em função de todo o exposto, concluo que deve ser responsabilizado o [Indiciado], na qualidade de Diretor de Relações com Investidores da [Xxxxx], por ter deixado de divulgar Fato Relevante sobre a contratação dos mútuos mencionados, em infração ao §4˚ do art. 157 da Lei n˚ 6.404/76 combinado com o art. 3˚ da Instrução XXX Xx 000/00" (xxx. 252).
Defesa.
39. Em sua defesa, o Indiciado não contesta os fatos narrados no Termo de Acusação, nem acrescenta fatos novos. Seus principais argumentos jurídicos são os seguintes:
(i) nem todas as informações sobre as atividades e negócios das companhias abertas devem ser divulgadas e "a melhor regra para determinar o que deve ser informado é a do ‘homem prudente’" (citação de Xxxx Xxx Xxxx Xxxxxxx transcrita na defesa, fls. 268) e " [i]nformar bem não é afogar o mercado com um enorme volume de informações, algumas desnecessárias por não terem a menor influência na forma de expectativas por parte dos aplicadores. A filtragem da informação é um processo essencial para o estabelecimento de uma boa política de divulgação de informações. Objetiva fazer divulgar todos os fatos relevantes, mas somente estes" (citação do Manual de Divulgação COPIMEC/ABRASCA, constante da defesa, fls. 269);
(ii) "a avaliação que faz o administrador do que seja um ato ou fato relevante, por envolver um componente de subjetividade, se baseia na percepção que tem o administrador de que o ato ou fato esteja contido em um dos critérios expressos nos incisos I a III do art. 2˚ da Instrução XXX xx 000/00" (xxx. 269);
( i i i ) "[a] aplicação de recursos disponíveis em instrumentos financeiros é ato de administração rotineira da sociedade, não se apresentando como um ato a merecer divulgação ao mercado. As aplicações, assim como os resgates, se repetem com razoável freqüência e não parecem ter a capacidade de influir de modo ponderável na quotação das ações, na decisão do acionista de negociar com as ações ou de exercer direitos dela decorrentes" (fls. 269);
( i v ) "[d]estaque-se que os critérios fixados na Política [de Empréstimos] infundem confiança nos titulares de valores mobiliários de emissão da CAEMI, uma vez que eles visam obter um elevado grau de segurança. Ter os recursos em caixa ou aplicados em instrumentos financeiros seguros, sejam eles contratados com instituições independentes ou partes relacionadas, não altera a percepção dos titulares de valores mobiliários de emissão da CAEMI. O que poderia afetar essa percepção seria o destinatário da aplicação dos recursos entrar em situação de dificuldade financeira que não o permitisse honrar o instrumento por ele contratado. Nessa hipótese, faria todo o sentido o mercado ser imediatamente informado de que algum tipo de risco envolvia a aplicação feita" (fls. 270);
(v) "[o] que pode provocar impacto no mercado de capitais, ou seja, com relação àqueles que já são, pensam em ser, ou querem deixar de ser titulares de valores mobiliários de emissão de companhia aberta, é qualquer ato ou fato que afete direitos políticos ou patrimoniais" (fls. 271);
(vi) "[a] aplicação de recursos financeiros sem dúvida, se inclui nessa última categoria. Direitos patrimoniais se traduzem por (i) remuneração de debêntures e pagamento de principal; (ii) dividendos ou juros sobre capital próprio, pagos ou distribuídos ou (iii) valorização das ações. Tendo presente que a CAEMI não emitiu debêntures, as expectativas a serem resguardadas são as dos acionistas" (fls. 271);
(vii) "[o] que parece preocupar a SEP com os contratos de mútuo celebrados com a subsidiária da CVRD é o fato de que os valores por eles contemplados representavam: (i) percentual elevado do patrimônio líquido da CAEMI; (ii) percentuais significativos do Projeto Itabiritos e (iii) concentração excessiva em um único devedor ligado ao controlador comum, ainda que esse contasse com boa avaliação de risco – rating" (fls. 273);
(viii) o Indiciado discorre então sobre abuso de voto, conflito de interesses e da responsabilidade do acionista controlador, transcrevendo lições de Nelson Eizirik e conclui que "[a] CVRD, como controladora final das partes contratantes nos mútuos, não adotou qualquer decisão que pudesse configurar conflito de interesses" (fls. 276);
(ix) sobre a observância da Norma de Empréstimos explicou que "[o] limite constante da Política [de Empréstimos] é a regra geral a ser observada. As situações especiais, tais como os contratos de mútuo celebrados com a subsidiária da CVRD, eram examinadas caso a caso, competindo ao Conselho de Administração (que aprovou a Política [de Empréstimos]) dar tratamento diferenciado às situações igualmente diferenciadas. Foi o que se verificou com a aprovação à extensão dos limites verificada em reuniões dos dias 18.08.2005 e 07.10.2005, respectivamente" (fls. 276);
(x) sobre o Projeto Itabiritos, defendeu que os Empréstimos não "afetavam as decisões da companhia acerca de investimentos – muito menos prejudicavam-nos" (fls. 276);
(xi) sobre a divulgação do Primeiro Empréstimo informou "que o mútuo contratado em 06.09.2005 foi divulgado ao mercado por meio da Nota Explicativa ao 3˚ ITR/2005 e foi objeto de Comunicação ao Mercado, em virtude de questionamento apresentado à Caemi. Divulgação, sem dúvida alguma, houve" (fls 277);
(xii) "[a] propósito do segundo contrato de mútuo de 28.10.2005, liquidado em 21.12.2005, não foi ele incluído nem no 3˚ ITR/2005 e tampouco nas Demonstrações Financeiras Padronizadas de 31.12.2005, visto que, nessas datas, ele não estava contratado e nem pendente. A inclusão como Evento Subseqüente ao 3˚ ITR/2005, mencionada no Termo de Acusação, não é obrigatória, visto o disposto no artigo 16, §7˚, da Instrução CVM n˚202/93" (fls. 277);
(xiii) para o Indiciado, ainda que se estendesse o conceito do art. 16, §7˚ da Instrução 202/93 aos ITRs, "Evento Subseqüente diz respeito à alteração que venha sofrer alguma informação já prestada" (fls 277);
(xiv) antes de concluir, o Indiciado informa que teria escolhido 4 companhias com ações negociadas no segmento do Novo Mercado, 4 no segmento do Nível 2, 4 no Nível 1 e 4 não pertencentes a esses segmentos especiais. "Nas que foram constatados tais empréstimos com partes relacionadas ou em valores siginificativos, foi feita busca de todos os anúncios de atos relevantes (atos que decorrem da vontade da companhia) por elas publicados desde 2003; em nenhuma deles foi encontrado um só anúncio desse teor " (grifos presentes no original, fls. 278).
40. Em conclusão, disse o Indiciado:
"Tendo presente que: (i) o contrato de mútuo celebrado em 06.09.2005 foi objeto da Nota Explicativa e de Comunicado ao Mercado; (ii) os atos ou fatos a serem divulgados por meio da publicação de anúncios nos jornais habitualmente utilizados pelas companhias são aqueles que causam impacto no
mercado de capitais, notadamente no mercado acionário; (iii) não deve a companhia ‘enxurrar’ o mercado com informações desnecessárias, sob pena de confundi-lo; (iv) deve prevalecer ‘o princípio do homem’ prudente; (v) aplicação financeira de disponibilidades é ato corriqueiro de gestão; (vi) para a realização de aplicações financeiras existia a Política [de Empréstimos] aprovada há mais de 2 anos, portanto, de conhecimento do mercado; (vii) os contratos de mútuo observaram os critérios fixados na Política [de Empréstimos]; (viii) o limite excedente foi objeto de aprovação pelo mesmo órgão da administração que aprovou a Política [de Empréstimos]; (ix) em se tratando de aplicação financeira, o possível impacto nos acionistas seria de natureza patrimonial; (x) o direito patrimonial dos acionistas é a percepção de lucros, quer sob a forma de dividendos ou de juros sobre capital próprio; (xi) dinheiro em caixa não é sinônimo de lucro passível de distribuição; (xii) qualquer contratação com partes relacionadas deve atentar para o conceito de fairness e é protegida em lei pelo tratamento dado ao conflito de interesses; (xiii) não se configurou no caso presente qualquer conflito de interesses; (xiv) o segundo contrato de mútuo não foi abrangido em qualuqer das datas de corte do IAN ou de ITR e não se trata de evento subseqüente e (xv) examinadas, no sistema da CVM, na rede mundial de computadores, 16 (dezesseis) companhias com ações negociadas em todos os segmentos da BOVESPA e verificadas aquelas que continham informações sobre empréstimos com partes relacionadas ou não, não foi encontrado, um só anúncio de ato relevante com esse teor, pode-se concluir que o DEFENDENTE não deixou de cumprir com os deveres que lhe competiam, notadamente aqueles previstos no art. 157 da Lei n˚ 6.404/76 e no artigo 3˚ da Instrução CVM n˚358/02" (fls. 278 e 279).
41. Em 16.10.06, determinei à SEP a juntada de certos documentos produzidos pela Caemi ( press release com os resultados do 3º trimestre e política de divulgação de informações) e, também, o comprovante de pagamento do 2º semestre, apenas com o objetivo de confirmar informações já existentes nos autos, afirmadas pelo Indiciado ou não contestadas por ele.
É o relatório.
Voto
42. A imputação feita neste processo foi de violação ao §4˚ 35 do art. 157 da Lei 6.404/76 combinado com o art. 3˚ 36 da Instrução 358/02. Essas duas regras tratam da divulgação de fatos relevantes. Começarei meu voto por tentar especificar a definição normativa do que seja fato relevante para, em seguida, analisar a caracterização dos Empréstimos como fato relevante, levando em consideração os argumentos apresentados pelo Indiciado em sua defesa.
Definição Normativa de Fato Relevante.
43. A primeira definição do que seja um fato relevante, para fins de divulgação, encontra-se no próprio §4˚ do art. 157 da Lei 6.404/76. Segundo esse dispositivo, relevante é o fato "que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia".
44. Com base nessa definição legal, o art. 2º 37 da Instrução 358/02, em seus incisos I e II 38, especificou duas situações aparentemente distintas. O inciso II tem uma redação quase que igual à do §4˚ do art. 157 da Lei 6.404/76, adicionando, apenas, a possibilidade de o fato poder alterar a decisão de "manter o valor mobiliário". Como a decisão de manter o valor mobiliário reflete a decisão sobre a venda (i.e., se decido vender, decido não manter e se decido não vender, decido manter) é sinal que a definição do inciso II é equivalente à do §4˚ do art. 157 da Lei 6.404/76. O inciso I, por seu turno, trata da possibilidade de o fato alterar a cotação dos valores mobiliários. Como o preço é formado em razão da demanda e da oferta (que decorrem da intenção de comprar e de vender), ele também está implícito no §4˚ do art. 157 da Lei 6.404/76.
45. A Instrução 358/02 ainda complementa o art. 157, §4º, com uma lista exemplificativa de fatos que, usualmente, são relevantes para uma companhia (ver art. 2º, § único). Essa lista, no entanto, nem exaure as possibilidades de fato relevante nem determina um fato relevante, sendo necessário, sempre, analisar os dados concretos do fato e da companhia a que ele se refere.
46. Tanto a Lei 6.404/76 quanto a Instrução 358/02 apresentam conceitos gerais ( standards) a serem utilizados pela administração da companhia aberta para, frente a um fato concreto, definir se está diante de um fato relevante. Sobre esses textos normativos, é importante perceber que eles consideram relevante um fato que "pode" influenciar. Não se exige, portanto, a efetiva influência, basta que tenha "força suficiente" para influenciar.
47. Dado que a decisão de publicar o fato relevante se dá, via de regra, antes que ele seja de conhecimento do
público39, na maioria das vezes, o administrador deve fazer juízo de valor sobre a probabilidade de que ele impacte a decisão de negociar valores mobiliários emitidos pela companhia, sem, no entanto, poder confirmar, antes da divulgação, se o fato realmente influenciará a decisão dos investidores. É, por isso, que a análise é sobre a "potência" de impacto e não sobre o real impacto.
48. Para o administrador, é mais fácil calcular essa probabilidade quando o impacto do "fato" sobre os negócios da companhia é direto. Por exemplo, a parada extraordinária de atividade em uma linha industrial da companhia é relevante se essa parada afetar significativamente as receitas, o resultado ou as demais operações da companhia. Outro exemplo, o trânsito em julgado de uma decisão judicial impondo uma perda ou um ganho para a companhia será
relevante se o montante do ganho ou da perda for significativo em comparação ao patrimônio líquido da companhia40. Para completar esses dois primeiros exemplos, que se referiam, respectivamente, a um fato operacional e a outro patrimonial, podemos lembrar de um fato financeiro: a obtenção de um empréstimo pode ser relevante, embora seja, usualmente, um fato do dia a dia da companhia. Digo isso, pois o empréstimo pode ser a condição suspensiva para a conclusão de uma aquisição relevante já divulgada pela companhia ou uma condição necessária ao início da construção de um projeto industrial substancial também já divulgado pela companhia. Um empréstimo pode, ainda, ser suficiente para o equacionamento da situação de liquidez, que poderia levar a companhia à falência ou a requerer recuperação judicial, e que é de conhecimento dos investidores.
49. Muitas vezes, no entanto, o fato não traz um impacto direto mensurável e a análise de sua relevância é mais difícil. O início de uma demanda judicial contra a companhia ou a concessão de um empréstimo, por exemplo. Ambos podem ser neutros, pois a demanda judicial pode ser julgada improcedente e o empréstimo, concedido em taxa similar ao custo de captação, pode ser pago pelo credor e, em ambos os casos, não há, nesse momento inicial, a certeza sobre o resultado futuro. Ocorre que, em ambos os casos, por mais improvável que possa ser, o resultado pode ser negativo e o impacto na situação patrimonial da companhia, relevante.
50. Com relação a esses tipos de fato, o administrador da companhia aberta deve ponderar o impacto potencial pela sua probabilidade, de modo a definir a relevância. Além dessa primeira análise, o administrador deve, de tempos em tempos, reponderar a magnitude do impacto potencial pela probabilidade de sua ocorrência para decidir se a mudança em qualquer um desses fatores tornou relevante o fato que assim não foi considerado inicialmente.
51. Fatos podem ser relevantes independentemente de sua natureza (operacionais, patrimoniais, financeiros ou societários) e mesmo que não tenham impacto direto ou potencial relevantes sobre a operação, o patrimônio, as finanças da companhia ou os direitos dos acionistas. Isso porque um determinado fato pode fornecer elementos sobre a capacidade dos administradores (e, conseqüentemente, o rumo de longo prazo da companhia e a maneira com que os negócios sociais serão tratados no longo prazo) ou, ainda, pode demonstrar a forma de tratamento pela administração da companhia de cada uma das classes interessadas (acionista controlador, acionistas não controladores, acionistas sem direito a voto, credores, empregados, administradores, comunidade – vide art. 116, § único) e, com isso, alterar o valor relativo entre os tipos e espécies de valores mobiliários (a relação de preços entre as ações e os valores mobiliários de renda fixa, por exemplo, ou entre as ações ordinárias e as preferenciais) ou mesmo quanto ao valor absoluto do valor mobiliário (maior interesse em ajudar a comunidade ou compartilhar lucros com os empregados pode resultar em diminuição dos lucros distribuíveis aos acionistas e, com isso, prejudicar o valor das ações). Por esses motivos, também as características qualitativas do fato, e não apenas as quantitativas, devem ser utilizadas na definição sobre a relevância de um dado fato empresarial.
52. Acho importante ressaltar, com relação ao tratamento diferenciado ante os stakeholders, que chamei de partes interessadas no parágrafo anterior, que a informação pode ser relevante mesmo quando o ato é lícito, legítimo e tomado no melhor interesse da companhia. A relevância da divulgação não está, portanto, condicionada à ilegalidade ou ilegitimidade do ato. Isso porque, durante a vida de uma empresa, por diversas vezes, o administrador deve escolher entre uma ou mais classes interessadas. Assim, é que ao não conferir um aumento aos empregados, o administrador da companhia privilegia, ao menos no curto prazo, o acionista em detrimento do empregado. Assim, também, quando decide fazer um investimento de preservação ambiental maior do que o exigido pela autoridade pública ou pela regulação ambiental. Ou, ainda, quando decide investir em um projeto comum com o acionista controlador.
53. Todas essas decisões podem ser legais, legítimas e tomadas no melhor interesse da companhia e, ainda assim, alterar a cotação dos valores mobiliários, uma vez que os investidores podem achar que uma outra decisão da administração seria mais benéfica para o preço do valor mobiliário por ele detido ou que ele deseje adquirir. Em outras palavras, essa informação pode ser útil para determinar o grau de alinhamento de interesses entre a administração e os titulares de determinados valores mobiliários (hipóteses comuns de desalinhamento se dão, principalmente, com acionistas não controladores ou com acionistas preferenciais).
54. Em certas situações, um fato não é relevante, se olhado isoladamente, ou se forem consideradas, segregadamente, suas características quantitativas e qualitativas. Por isso, a administração deve analisar a relevância de um fato a partir do conjunto de informações de que dispõe e ponderando, de forma agregada, as informações quantitativas e qualitativas. Dessa forma, uma informação não deixará de ser relevante se a companhia dividir a sua implementação, sua divulgação ou sua análise em várias etapas, que, isoladamente, não sejam relevantes.
55. Uma outra questão importante é a divulgação de informações relativas a negócios em andamentos ou não concluídos, isso porque a proteção dos investidores por meio da divulgação de informações não é absoluta, podendo se adequar às necessidades empresariais das companhias. Por esse motivo, a Instrução 358/02, em seu art. 6º, permite que "os atos ou fatos relevantes [excepcionalmente deixem] de ser divulgados se os acionistas controladores ou os administradores entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia".
56. Assim, se a divulgação de uma informação que deveria ser tornada pública, de acordo com as regras de divulgação de informação, pode impedir a conclusão de um negócio, a conquista de um cliente ou o desenvolvimento de um produto ou serviço ou pode prejudicar legítimos interesses negociais da companhia, a companhia poderá, de acordo com a legislação específica, deixar de divulgar a informação.
57. Isso não significa que as companhias podem deixar de prestar informações simplesmente porque acreditam que seus negócios podem ser prejudicados pela divulgação. É preciso que haja um legítimo propósito empresarial na manutenção do sigilo. Assim, por exemplo, um negócio em que se beneficie um acionista específico não pode deixar de ser divulgado porque essa informação impactaria negativamente o preço das ações da companhia, aumentando o seu custo de captação.
58. Mesmo com relação a negócios legítimos e desinteressados, essa exceção à divulgação não é absoluta, pois, de acordo com o parágrafo único do art. 6º da Instrução 358/02, é obrigatório "divulgar imediatamente o ato ou fato relevante, na hipótese da informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados".
59. Em razão desse dispositivo, a companhia não pode recusar-se a confirmar, negar ou complementar uma informação já dispersa pelo mercado (ou que esteja sendo utilizada pelos investidores), mesmo que ela não tenha sido divulgada pela companhia.
60. Um outro aspecto importante sobre a divulgação de fatos relevantes, é que as informações divulgadas ao mercado pelas companhias devem sempre ser prestadas de forma completa (art. 3º, §4º da Instrução 358/02), clara e precisa (§5º do mesmo artigo).
61. Considera-se completa uma informação quando ela contém os fatos, dados, nuances e demais informações necessárias para a avaliação do impacto da informação principal sobre preço dos valores mobiliários ou sobre as decisões de investimento relativas a esses valores mobiliários. Não é considerada informação completa aquela que possa induzir os investidores a erro.
62. Assim, para que se possa considerar que a informação foi divulgada de forma completa, a companhia deverá, também, divulgar informações complementares à informação principal, mesmo que não sejam exigidas de forma expressa pela legislação ou pela eventual ordem de divulgação de informação expedida pela CVM. Ao procurar prestar informações de maneira completa, a companhia deve evitar a inclusão de detalhes que não tenham impacto razoável na decisão de investimento. A definição do que sejam esses detalhes de pouca relevância deve ser feita seguindo-se os mesmos critérios para a análise da relevância de um fato.
63. Deve-se notar que o administrador é o responsável pela divulgação, desde o início, do fato relevante de forma completa. Não obedece a legislação quem anuncia um fato, mas espera uma ordem da CVM para divulgar os aspectos relevantes deste fato que já sejam de seu conhecimento. A iniciativa deve, sempre, partir da administração da companhia. Por isso, se a legislação ou uma decisão concreta da CVM determinar a divulgação de uma dada informação específica e essa informação específica não puder ser considerada completa, em razão de outras informações que sejam de conhecimento da administração, cabe à companhia complementar as informações solicitadas de forma a fazer com que sua divulgação satisfaça a exigência de divulgação completa.
64. Por fim, deve-se notar que, embora a Instrução 358/02 atribua à administração da companhia aberta a definição do que seja informação relevante (ao Diretor de Relações com Investidores, mais precisamente41), esse poder conferido à administração não é absoluto. Caso os investidores alterem seu comportamento (decisão de vender ou comprar
valores mobiliários da companhia ou a expectativa de preço quanto a esses valores mobiliários) em função de
informação relativa à companhia da qual tenham conhecimento parcial (ou total), mas não divulgada pela companhia, essa informação deverá ser considerada relevante e a administração, mesmo que não tenha a mesma opinião que os
investidores quanto à relevância da informação, deverá negá-la ou confirmá-la e, se for o caso, complementá-la. Caso concreto.
65. Com base no que disse acima, para se definir os Empréstimos como fato relevante deve-se responder
afirmativamente a alguma das seguintes perguntas:
(i) Um empréstimo, no valor de US$230 milhões, concedido pela Xxxxx deve ser considerado como informação relevante, a ensejar a publicação de um fato relevante, ao invés de mera divulgação em nota explicativa?
(ii) Um empréstimo, no valor de US$170 milhões, concedido pela Caemi deve ser considerado como informação relevante, a ensejar a publicação de um fato relevante, mesmo que a sua quitação venha a ocorrer antes do encerramento do trimestre em que foi concedido (que coincide com o encerramento do exercício social)?
(iii) O fato de os empréstimos mencionados nas perguntas "i" e "ii" (que são os Empréstimos, da definição feita no Relatório) terem coexistido por um breve período de tempo altera a resposta a qualquer das questões anteriores?
(iv) O fato de os Empréstimos terem sido concedidos ao acionista controlador da Caemi 42 é relevante para a tomada de decisão de comprar ou vender valores mobiliários pelos integrantes do mercado?
(v) O fato de a divulgação do Primeiro Empréstimo em nota explicativa ter causado tantos questionamentos no mercado deveria alterar a percepção do diretor de relações com investidores com relação à divulgação do Segundo Empréstimo?
(vi) Ao explicitar detalhes do Primeiro Empréstimo, em razão de provocação da CVM, fundada no efeito desse empréstimo no mercado, o diretor de relações com investidores tinha obrigação de divulgar o Segundo Empréstimo?
66. As três primeiras perguntas devem ser respondidas olhando questões patrimoniais e financeiras da Caemi. Nesse sentido, o valor de cada um dos Empréstimos já chama a atenção, pois os US$230 milhões do Primeiro Empréstimo e os US$170 milhões do Segundo Empréstimo são valores significativos (US$400 milhões, se somarmos os dois). Como, no entanto, a relevância de uma dada informação varia, a depender do tamanho da Companhia, precisa-se olhar a situação da Caemi em concreto.
67. Como se vê do item 14 do Relatório, o Primeiro Empréstimo representava 21,7% do patrimônio líquido da Caemi em 31.09.05 (com base no 3˚ ITR/05 consolidado) e o Segundo Empréstimo, 16,37% do patrimônio líquido da Caemi na mesma data (total de 38,07%, ou um pouco mais de um terço). Em conjunto, representariam 81% dos valores da "carteira administrada pela Caemi ou controladas" (essa carteira administrada é utilizada como critério pela Norma de Empréstimos para fixar certos limites de concentração de créditos e será chamada neste voto simplesmente de "disponibilidades ajustadas"). Esses percentuais demonstram a relevância da informação, sob o aspecto patrimonial.
68. Ocorre, como disse acima, que se os Empréstimos viessem a ser quitados, como de fato foram, a informação não seria relevante sob o aspecto patrimonial ou financeiro, que é o que se examina agora. Entretanto, o Indiciado não tinha a certeza real de que eles seriam realmente honrados no futuro no momento em que deveria fazer o juízo sobre ser ou não os Empréstimos um fato relevante (embora pudesse acreditar, com forte convicção, que eles seriam).
69. Diz-se isso, mesmo sabendo que, à época dos empréstimos, o rating da CVRD era excelente, como lembra o próprio Indiciado. Esse é um bom argumento, embora não seja suficiente para deixar de considerar a informação como relevante no caso concreto. Isso porque ratings excelentes não significam garantia de solvabilidade, indicam, apenas, que companhias, nessa categoria, tem baixa probabilidade de não pagamento (ou seja, apenas um percentual pequeno – ou mesmo ínfimo – de companhias com características semelhantes não realiza o pagamento).
70. Outro motivo para que o argumento do rating não seja suficiente para descaracterizar os Empréstimos como relevantes é que a excessiva concentração de crédito em uma única instituição, mesmo que essa instituição tenha um excelente rating, aumenta o risco da operação. Dado que os recursos representavam a impressionante soma de 81% das disponibilidades ajustadas da Caemi e controladas, a própria concentração do crédito torna-se relevante, pois, embora o crédito seja de baixo risco, é possível que o pagamento não ocorra. As conseqüências, em caso de não pagamento, seriam gravíssimas para a Caemi e, portanto, a legislação determina que seja dado aos investidores
conhecimento dessa informação, quando da celebração do contrato de mútuo, para que suas decisões de investimento pudessem ser tomadas levando em consideração também essa informação.
71. Um outro aspecto a determinar a relevância dos Empréstimos é a existência da Norma de Empréstimos que, como afirma o próprio Indiciado em sua defesa, a existência dos "critérios fixados na [Norma de Empréstimos] infundem confiança nos titulares de valores mobiliários de emissão da CAEMI, uma vez que eles visam obter um elevado grau de segurança". Ora, no caso dos Empréstimos, a concentração excessiva em um único devedor, mesmo que de baixo risco de crédito, viola a Norma de Empréstimos (ver critérios transcritos no Item 35 (iv) e (v) do Relatório), o que faz com que, segundo critérios prévios, estabelecidos pela própria administração da Xxxxx, os Empréstimos não mais "infundam confiança nos titulares de valores mobiliários de emissão da Caemi". Dessa forma, também por esse motivo, deveria a ser dado conhecimento dos Empréstimos ao mercado via anúncio de fato relevante.
72. Os Empréstimos parecem trazer uma outra informação relevante, de natureza qualitativa. Eles demonstram o tratamento conferido pela Caemi a certo stakeholder. No caso, o acionista controlador – CVRD - teve direito a obter empréstimos da Caemi, abaixo do custo de captação do controlador. Igual direito não foi conferido aos acionistas não controladores. A eles, independentemente do seu risco de crédito ou do seu custo de captação a eles não foi oferecida a possibilidade de realizar empréstimos. Isso é especialmente relevante, dado (i) o valor absoluto dos Empréstimos,
(ii) o valor relativo dos Empréstimos em comparação com o patrimônio líquido da Caemi e com suas disponibilidades ajustadas, e (iii) que, conforme consta do item 05 do Relatório, os Empréstimos foram autorizados por funcionários e administradores da própria controladora – CVRD - que os elegeu para o conselho de administração da Xxxxx.
73. A análise feita pelo Itaú (item 30 (i) (a) do Relatório) comprova a relevância dessa informação. Constou dela:
"Nós acreditamos que esse empréstimo constitui conflito de interesses entre o acionista controlador da Caemi, a CVRD, e os acionistas minoritários da Caemi, uma vez que esses, sem controle gerencial sobre os recursos da companhia, não podem se beneficiar de empréstimos com taxas tão atraentes, ainda que elas estejam alinhadas com as taxas do mercado para depósitos em mercados internacionais" (grifos inexistentes no original).
74. Por esses motivos, seria natural que os investidores não controladores tivessem uma reação negativa, a afetar suas decisões de comprar ou vender as ações da Xxxxx, ao tomarem conhecimento dos Empréstimos. No aspecto qualitativo, a "relevância" da informação não está no risco dos Empréstimos, mas na posição do destinatário como um stakeholder da Caemi. A relevância é ainda maior pois sendo o stakeholder o acionista controlador, que elegeu e é empregador dos administradores que aprovaram os Empréstimos, é natural que os investidores não controladores tenham suas decisões de investimento afetadas pela incerteza quanto ao alinhamento de interesses desses
administradores com os da CAEMI no desempenho futuro de suas funções43.
75. Mesmo que a minha opinião sobre a relevância dos Empréstimos (especialmente com relação ao Primeiro Empréstimo) não prevaleça, não se pode negar a relevância da divulgação da existência do Segundo Empréstimo, após a tomada de conhecimento, pelo mercado, da existência do Primeiro Empréstimo, quando houve um aumento da pressão vendedora das ações preferenciais de Caemi e forte reação negativa pela comunidade de analistas de valores mobiliários.
76. Parece-me especialmente grave e injustificada a conduta do Indiciado quando, após divulgar o Primeiro Empréstimo por meio da nota explicativa no 3º ITR e divulgar um comunicado ao mercado, com os termos do Primeiro Empréstimo, por exigência da CVM, não divulgar a existência do Segundo Empréstimo. Nesse momento, dada a repercussão da divulgação do Primeiro Empréstimo pelos analistas de valores mobiliários, o impacto no preço das ações da Xxxxx e a repercussão entre os investidores, não havia espaço para qualquer dúvida de que o Segundo Empréstimo era, para a Caemi, um fato relevante, que, em conjunto com o Primeiro Empréstimo, poderia ter impacto ainda mais forte na decisão dos investidores comprar ou vender ações, conforme dispõe o §4º do art. 157 da Lei 6.404/76. Não há um só argumento legítimo a autorizar a decisão de não divulgar o Segundo Empréstimo tomada, naquele momento, pelo Indiciado.
77. É por isso que entendo que, mesmo que a decisão de não divulgar o Primeiro Empréstimo por meio de fato relevante tenha sido tomada a partir de uma análise técnica, cuidadosa, diligente e desinteressada (não obstante, equivocada), não havia qualquer motivo para se considerar o Segundo Empréstimo como não relevante. Àquela altura, o Indiciado já conhecia a repercussão no mercado da informação sobre um empréstimo de US$230 milhões à CVRD e, necessariamente, deveria ter concluído pela relevância de um empréstimo total de US$ 400 milhões (soma dos Empréstimos).
78. Adicionalmente, ao tratar do Primeiro Empréstimo sem mencionar o Segundo Empréstimo, o Comunicado ao
Xxxxxxx induz investidores a acreditar que apenas o Primeiro Empréstimo existia, não podendo ser considerado como divulgação completa da informação.
79. Como esta parte final da decisão acabou voltando-se, principalmente, para o Segundo Empréstimo, gostaria de deixar claro que, isoladamente, o Primeiro Empréstimo deveria ser considerado como fato relevante em função (i) da concentração em um único devedor (contrariando a própria Norma de Empréstimos), (ii) de o devedor ser o acionista controlador, e (iii) de os recursos emprestados serem significativos em termos de proporção do patrimônio líquido e das disponibilidades (ver item 15 do Relatório). Essa mesma conclusão tiveram os analistas de valores mobiliários quando tomaram conhecimento da existência do Primeiro Empréstimo (ver item 30 do Relatório), mesmo desconhecendo a existência do Segundo Empréstimo.
80. Com a análise até aqui feita, parece ser possível concluir pela relevância da divulgação da concessão de cada um dos Empréstimos como fato relevante. Também se pode concluir pela impossibilidade, com relação ao Primeiro Empréstimo, de a sua divulgação por meio de nota explicativa ao 3º ITR suprir a publicação de anúncio de fato relevante logo após sua concessão em 06.09.05, uma vez que até a divulgação do 3º ITR, foram transcorridos dois meses a partir da concessão desse Primeiro Empréstimo. Assim, nesse período, os investidores negociaram suas ações sem conhecimento de uma informação relevante, que afetaria a tomada de decisão de investimento. Pode-se concluir, também, que, dada a magnitude dos Empréstimos, eles não podem ser considerados como atos de rotina da administração da Xxxxx, como quis argumentar o Indiciado.
81. Os outros argumentos apresentados pelo Indiciado em sua defesa também não parecem ser relevantes para alterar essa conclusão. Por exemplo, afirmar que selecionou um grupo de 12 companhias abertas que nunca divulgaram fato relevante sobre empréstimos com partes relacionadas. Isso nada prova, especialmente por não ter especificado que companhias seriam essas, nem ter comparado, em termos absolutos e relativos, os empréstimos com partes relacionadas que diz terem sido concedidos por tais companhias, nem as características dessas companhias em comparação com a CAEMI e a relação entre os administradores dessas companhias e o acionista controlador, etc.
82. Também não influenciam no mérito, pois não foram utilizados para as conclusões tomadas neste voto, os argumentos da defesa sobre (i) a não caracterização do Segundo Empréstimo como "evento subseqüente", (ii) a não inclusão do Segundo Empréstimo nas Demonstrações Financeiras Padronizadas de 2005, (iii) a ausência de prejuízo ao Projeto Itabiritos, e (iv) a ausência de prejuízo ao pagamento de dividendos.
83. Pelos motivos acima, voto pela imposição de pena de multa ao Indiciado. Proponho, ainda, a aplicação da multa máxima aplicável, R$500.000,00 (art. 11, II e §1º da Lei 6.385/76), uma vez que (i) a informação era extremamente relevante, (ii) o Indiciado divulgou comunicado ao mercado omitindo a existência do Segundo Empréstimo, induzindo o mercado a acreditar que havia apenas o Primeiro Empréstimo, (iii) houve forte reação do mercado e dos analistas de valores mobiliários quando tomaram conhecimento da existência do Primeiro Empréstimo, o que era suficiente para demonstrar a relevância do Segundo Empréstimo, e, mesmo assim, o Indiciado omitiu a existência do Segundo Empréstimo, e (iv) não há qualquer justificativa legítima para a omissão da divulgação dos Empréstimos, especialmente com relação ao Segundo Empréstimo.
É o voto.
Rio de Janeiro, 17 de janeiro de 2007 Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx-Relator
1 Segundo o estatuto social da CVRD, o cargo de "diretor" previsto na Lei 6.404/76, chama-se "diretor-executivo". O cargo de "diretor" é usado na CVRD para denominar cargos exercidos por membros da alta administração da CVRD que não são "diretores estatutários". Neste relatório e, se necessário, no voto, utilizarei a expressão da Lei 6.404/76 para designar os diretores estatutários da CVRD.
2 Cargo da alta administração da CVRD, mas não estatutário.
3 A defesa apresentada pelo Indiciado não contesta os fatos narrados no Termo de Acusação, nem adiciona novos fatos.
4 Na Nota Explicativa, informa-se que a taxa do Primeiro Empréstimo é 3,41% (fls. 211), já na Terceira Carta da Caemi, informa-se a taxa de 3,91% (fls. 22). Se calcularmos o percentual aplicado com base no valor do Primeiro Empréstimo (US$230.000.000,00) e o valor pago (US$233.511.975,16), o valor do juros equivale a 1,53%. Esse percentual equivale à taxa de 3,91% ao ano, aplicado por 120 dias (duração do Primeiro Empréstimo, calculado com base em 360 dias, que é o padrão utilizado para cálculo da Libor, cf. explicado no site da British Bankers’ Association – frequently asked questions), verificando-se correta, portanto, a taxa de 3,91% apresentada na Terceira Carta da Caemi.
5 A Cláusula Terceira dos contratos dos Empréstimos, que é a única que faz referência a pré-pagamento, tinha a seguinte redaç"ã3o.1: Na hipótese de a MUTUÁRIA não efetuar o pagamento ou o pré-pagamento do Empréstimo, ficará a MUTUÁRIA automaticamente constituída em mora, independentemente de notificação judicial ou extrajudicial, comprometendo-se a pagar à MUTUANTE, além do valor do Empréstimo calculado de acordo com as disposições da Cláusula Segunda, juros de mora de 1% a.m (hum por cento ao mês), calculados pro rata dia, a partir da data em que a importância deveria ser paga até o efetivo pagamento, e multa de natureza não compensatória no valor de 2% (dois por cento) do valor total do débito, bem como reembolsar a MUTUANTE de todas e quaisquer despesas em que houver incorrido para o ressarcimento do seu crédito" (fls. 116 e fls. 119).
6 Dados obtidos com base nos contratos de mútuo referentes ao Primeiro Empréstimo (fls. 116/117) e ao Segundo Empréstimo (fls. 118/120) e no Resumo dos Empréstimos (fls. 121).
7 A Terceira Carta da Caemi (fls. 22/24) informa que esse valor corresponderia a R$512,6 milhões.
8 Convertendo esses valores à média da cotação PTAX Opção 5 de fechamento divulgada pelo Banco Central para o dia do Segundo Empréstimo (28.10.05), esses US$170 milhões corresponderiam a R$387,379 milhões.
9 Essa expressão é utilizada no item 6.3 da Norma de Empréstimos (fls. 26/35). Na Norma de Empréstimos, não há definição das parcelas que a compõem. Por isso, a SEP fez o cálculo da carteira de créditos supondo que ela deveria ser composta pela soma dos saldos das contas Disponibilidades e Empréstimos Intercompanhias. O que confirmaria que a interpretação da SEP incluiria, ao menos, todas as contas que deveriam ser levadas em consideração. A definição da SEP, bem como os outros cálculos por ela feitos, não foram contestados pela Caemi na Quinta Carta da Caemi (fls. 127/131), no qual a SEP aplicou o critério que julgava correto para aplicação da Norma de Empréstimos. Os percentuais também não são contestados, demonstrando que, embora não se refiram à data exata da concessão dos Empréstimos, representam uma posição muito assemelhada a que seria obtida com o cálculo exato.
10 Cf. Primeira Carta da Caemi (fls. 05).
11 Cf. Certidão da Ata RCA Caemi – Autorização do Primeiro Empréstimo (fls. 37) e Ata RCA Caemi – Autorização do Primeiro Empréstimo (fls. 140/141).
12 Da Certidão da Ata RCA Caemi - Aprovação Primeiro Empréstimo, consta R$300 milhões, mas, na Quinta Carta da Caemi (fls. 127/131), é informado que teria havido um erro nessa certidão e, juntando cópia do livro de atas, demonstrou que a aprovação foi de US$300 milhões. Transcrevi o texto retificado para facilitar o entendimento.
13 Cf. Certidão da Ata RCA Caemi – Autorização do Segundo Empréstimo (fls. 142).
14 Cf. Certidão da Ata da RD CVRD (fls. 49). 15 Cf.Ata da RCF CVRD.
16 Constou da Quarta Carta da Ca"eEmmi:resposta ao item (iii) do ofício em apreço, informamos que ocorreu outra operação idêntica ao mútuo de 06.09.2005, cuja cópia do contrato firmado em 28 de outubro de 2005 encontra-se anexa à presente (doc. 05). Vale frisar que ambos contratos de mútuos já foram liquidados, sendo o primeiro de 26/0(f1l/s0.66e8).o segundo de 21/12/05"
17 O Quarto Ofício da Caemi é datado de 13.03.06, tendo a SEP solicitado expressa"meesnctlearec[imento] se houve outras operações de mútuo similares à mencionada e, caso a resposta seja positiva, informar os principais dados dos mútuos celebrados a partir de 01.01.04 entre partes relacionadas (data do empréstimo, prazo, valor, taxa de juros, devedor, data do efet(ivflos. p6a3g).amento)"
35 Verbis: "§4o Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembléia geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia".
36 Verbis: "Art. 3o Cumpre ao Diretor de Relações com Investidores divulgar e comunicar à CVM e, se for o caso, à bolsa de valores e entidade do mercado de balcão organizado em que os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação, qualquer ato ou fato relevante ocorrido ou relacionado aos seus negócios, bem como zelar por sua ampla e imediata disseminação, simultaneamente em todos os mercados em que tais valores mobiliários sejam admitidos à negociação".
37 Verbis: "Art. 2o Considera-se relevante, para os efeitos desta Instrução, qualquer decisão de acionista controlador, deliberação da assembléia geral ou dos órgãos de administração da companhia aberta, ou qualquer outro ato ou fato de caráter político-administrativo, técnico, negocial ou econômico-financeiro ocorrido ou relacionado aos seus negócios que possa influir de modo ponderável:
I - na cotação dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados; II - na decisão dos investidores de comprar, vender ou manter aqueles valores mobiliários;
III - na decisão dos investidores de exercer quaisquer direitos inerentes à condição de titular de valores mobiliários emitidos pela companhia ou a eles referenciados" .
38 O inciso III parece não se fundamentar no art. 157, §4º da Lei 6.404/76, mas no art. 22, §1º, I da Lei 6.385/76, pois, ou a hipótese nele prevista está contida nas do inciso I e II ou se refere a uma outra categoria, que não se relaciona diretamente com a decisão de vender ou comprar valores mobiliários, conforme fala o art. 157, §4º da Lei 6.385/76. A segunda hipótese do inciso I (valores mobiliários referenciados em valores mobiliários de emissão da companhia) também parece ter respaldo legal nesse artigo da Lei 6.385/76
39 Não é incomum que o fato relevante seja precedido de vazamento impróprio da informação, em infração às normas vigentes.
40 Em verdade, a definição da relevância dessa informação pode ser feita não só considerando-se o patrimônio líquido da companhia, mas, também, o total de ativos ou mesmo as disponibilidades. A escolha do critério mais adequado depende do caso concreto.
41 Há obrigação subsidiária de outros administradores e do acionista controlador, conforme se depreende do §2º do art. 3º da Instrução 358/02 ( "§2º. Caso [acionistas controladores, diretores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas, criados por disposição estatutária] tenham conhecimento pessoal de ato ou fato relevante e constatem a omissão do Diretor de Relações com Investidores no cumprimento de seu dever de comunicação e o
divulgação, inclusive na hipótese do parágrafo único do art. 6 desta Instrução, somente se eximirão de responsabilidade caso comuniquem imediatamente o ato ou fato relevante à CVM" ).
42 Deve-se notar que os Empréstimos foram concedidos por subsidiária integral de controlada da Caemi para subsidiária do acionista controlador – CVRD. Isso não altera o raciocínio feito ao longo do voto, pois os Empréstimos foram calculados sobre dados consolidados e as decisões foram tomadas pelas companhias principais (Caemi e CVRD).
43 Os relatórios de análise do Itaú, Deutsche, Pactual apontam preocupações com governança corporativa, em razão do Primeiro Empréstimo, o que demonstra a relevância da informação (ver item 30 do Relatório).
Voto proferido pela diretora Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx na Sessão de Julgamento do dia 17 de janeiro de 2007.
Eu acompanho o voto do Diretor relator, senhor presidente.
Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx Diretora
Declaração de voto do Presidente Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, na sessão de julgamento de 17 de janeiro de 2007.
1. Eu também acompanho o voto do Diretor Relator, e gostaria de fazer algumas observações quanto aos pontos levantados da Tribuna, embora estejam todos, a meu ver, tratados no voto do Relator.
2. Claramente, a meu ver, a divulgação das operações com partes relacionadas por meio do ITR e a divulgação feita por meio de publicação de fato relevante são distintas. A Deliberação 26/86, que aprova pronunciamento do Instituto Brasileiro de Contadores (IBRACON) sobre transações entre partes relacionadas, considera potencialmente que a existência de uma operação com partes relacionadas determina, praticamente como regra, sua divulgação destacada nas demonstrações financeiras, em seu próprio corpo ou em notas explicativas (cf. itens 8 e 9 daquela Deliberação). Assim, as operações entre partes relacionadas recebem um tratamento diferenciado dentre as demais operações, do ponto de vista das demonstrações financeiras.
3. Entretanto, nem toda informação de negócios com partes relacionadas que é divulgada nas demonstrações financeiras será fato relevante — embora, certamente, todo negócio com parte relacionada que constitua fato relevante vá estar também informado nas demonstrações financeiras. Isso pode explicar o fato, destacado pela defesa, de que haveria outras empresas que teriam divulgado a existência de operações com partes relacionadas em ITR ou em DFP, mas não em fato relevante. Embora não saiba de que empresas se trate, pode ser que as operações em questão não fossem relevantes a ponto de justificar a publicação de aviso de fato relevante.
4. No tocante ao impacto no mercado ¾ embora o voto do Relator esclareça que, no caso concreto, as cotações das ações da CAEMI foram afetadas ¾ é sempre bom lembrar (como também foi dito pelo Relator) que o "impacto efetivo" na cotação das ações não se confunde com o impacto potencial de que trata a lei. O impacto efetivo poderá não se verificar na prática e, muitas vezes, por razões externas à própria companhia. O mercado pode estar num momento tão aquecido a ponto de notícias que, em outros cenários, poderiam afetar a cotação das companhias, não a afetem, porque há outras notícias melhores fazendo com que aquelas cotações não sejam afetadas. De todo modo, o juízo que o administrador deve fazer é um juízo considerando a potencialidade de impacto. Claro que esse juízo primário, como a defesa ressaltou da Tribuna, pertence ao administrador, mas ele deve fazê-lo ponderando essa potência de impacto, até porque ninguém tem como saber, antecipadamente, se a decisão vai ou não causar impacto efetivo. Pela concentração, pela grande parcela do caixa da CAEMI que foi destinada a um único devedor ¾ que era a sua controladora ¾ me parece que a potencia de impacto era grande, afinal de contas 80% da disponibilidade estavam sendo aplicados num só devedor.
5. A defesa também destacou que as aplicações de caixa não constituem fato relevante. Realmente, isso não ocorre como regra, quando tais aplicações se fazem de acordo com a rotina da Companhia. Entretanto, suponho que nunca antes, na história da CAEMI, tenha havido um empréstimo de 80% de seu caixa para o
controlador. E, por conta da reação do mercado a esse fato, provavelmente também nunca depois (pelo menos até o fechamento de seu capital). Não é comum na vida de nenhuma companhia destinar 80% de suas disponibilidades de caixa a um único devedor, com a possível ressalva da União Federal ser essa devedora, através de títulos públicos por ela emitidos.
6. Caberia ainda uma última observação, relativa à questão geral da relevância de mútuos feitos entre companhias abertas e seus controladores. Pelo menos desde 2002, depois do julgamento do "Caso Bombril" (PAS 04/99, julgado em 17.04.2002), parece-me que não é legítimo que algum administrador de companhia aberta no Brasil possa, em seu benefício, alegar ignorância quanto à percepção da CVM e do mercado no tocante à possível repercussão para os negócios da companhia de operações de mútuo com o controlador, por melhor que seja o rating do controlador. Não se pode esquecer que controladores que não pagaram muitas vezes tinham ratings muito bons quando receberam os mútuos. Um rating muito bom não é garantia de que o responsável pelo título pagará, mas sim que aquela nota representa um histórico conjunto de devedores que mais paga do que não paga. O histórico de "default" dos títulos cobertos por agências de rating, revela, como era de se esperar, casos de inadimplemento mesmo entre devedores classificados como "triple A", ou equivalente. Quando esse inadimplemento pode atingir devedor que, adicionalmente, seja também o controlador, e ainda nos níveis de concentração de dívida verificados no caso do empréstimo concedido pela Caemi, o desfecho potencial é desastroso. Em um cenário em que essa questão do mútuo da companhia aberta para seu controlador não tivesse sido antes discutida, a não divulgação do fato relevante talvez ainda pudesse ser atenuada, e não vista com mais gravidade, como neste caso, em que tanto a CAEMI quanto a Vale do Rio Doce, sua controladora, conhecem bem e acompanham as decisões da CVM.
7. Por fim, vale anotar que mesmo se todas as premissas da defesa fossem verdadeiras, ainda assim não haveria porque não divulgar os negócios como fato relevante. Não se trata aqui de um investimento que merecesse sigilo por alguma razão; não era um negócio, uma transação que, em defesa dos interesses da companhia, devesse ser conduzida sob sigilo; não era uma aplicação em algo novo no mercado, que trouxesse alguma vantagem competitiva à companhia caso ela fosse uma dos poucas aplicadoras. Do ponto de vista da Vale do Rio Doce, provavelmente, o máximo que a divulgação do fato relevante poderia trazer de efeito seria um benefício ao custo de captação da própria Vale do Rio Doce. Quem sabe os banqueiros a procurassem oferecendo taxas semelhantes ou melhores que as fixadas no empréstimo com sua controlada. E do ponto de vista da XXXXX, não havia qualquer razão de seu interesse para não tornar pública essa informação. Se tudo que se disse é verdade ¾ isto é, se o rating da Vale é muito bom, a operação foi feita "arm’s lenght" e foi boa para os dois lados ¾ por que não divulgar? Por que um acionista, o controlador, tem o direito de saber que isso aconteceu, e pode negociar com essa informação, e os demais acionistas não têm? Parece-me que este é o fator preponderante e que, realmente, está muito bem tratado no voto do Relator. O único risco em divulgar a informação era o de que ela fosse mal vista pelo mercado — o que se revelou verdadeiro — e, se esse era o único risco, ele recomendava a divulgação imediata como fato relevante, e não o silêncio, especialmente reiterado, no segundo empréstimo.
8. Por tais razões, acompanho o voto do Relator e proclamo o resultado do julgamento, com a imposição da pena de 500 mil reais ao acusado, a quem é facultada a interposição de recurso ao Conselho de Recurso do Sistema Financeiro Nacional no prazo e forma regulamentares.
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Presidente