COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Memorando nº 4/2016-CVM/SRE/GER-2
Rio de Janeiro, 22 de janeiro de 2016.
PARA: SGE DE: SRE/GER-2
Assunto: Recurso contra exigência da SRE em Processo de Dispensa de Registro de Oferta Pública de Contratos de Investimento Coletivo (CIC) em CondoHotel "Intercity São Leopoldo"
– Processo Eletrônico SEI n.º 19957.004122/201599.
Senhor Superintendente Geral,
1. Trata-se de recurso antecipando a decisão da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (“SRE”) de indeferimento de pedido de dispensa de oferta pública de distribuição de Contratos de Investimento Coletivo no âmbito de projeto imobiliário vinculados à participação em resultados de empreendimento hoteleiro (“CIC” ou “Condo- Hotéis”) pelo não atendimento à exigência de cumprimento ao disposto nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM n.º 400/03 (“Instrução CVM 400”).[1]
2. Os citados artigos da Instrução CVM 400 estabelecem a obrigatoriedade de concessão da possibilidade de desistência do investimento por parte dos investidores que já tenham aderido à Oferta (“Antigos Adquirentes”), em função da suspensão de Oferta e da disponibilização de novos documentos aos investidores.
3. O recurso em questão foi protocolado nesta CVM em 22.12.2015 pela Oliva Construções e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e pela Ich Administração Hoteleira S/A (“Ofertantes” ou “Recorrentes”), em referência à exigência 6 do Ofício nº 346/2015/CVM/SRE/GER-2, de 26.10.2015, relativo ao pedido de dispensa de registro de distribuição de contratos de investimento coletivo referentes ao empreendimento Intercity São Leopoldo, em análise nesta GER-2 no âmbito do Processo CVM RJ Nº 2015-10143. Transcrevemos abaixo a citada exigência.
“Tendo em vista que nas páginas 13 e 52 do Prospecto Resumido, há respectivamente, as informações: que “serão objeto de oferta pública 37 Contratos de Investimento Coletivos referentes a unidades autônomas hoteleiras do condomínio Business Hotel, o qual possui no total, 135 unidades autônomas hoteleiras” e que “23 unidades autônomas hoteleiras foram permutadas à EF PARTICIPAÇÕES LTDA, na transação envolvendo o terreno do empreendimento”. Depreendemos, portanto, que 75 unidades
teriam sido vendidas pela Incorporadora antes do presente pleito. Desta forma, os Ofertantes devem, sem prejuízo de eventual apuração de responsabilidade em relação à oferta irregular de valores mobiliários, assumir o compromisso de atender plenamente aos requisitos previstos nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400 como condição para a concessão da dispensa de registro ora pleiteada, dando conhecimento aos investidores que já tenham aceitado a oferta (“Primeiros Adquirentes”) de sua suspensão e modificação (com a incorporação dos novos documentos nos termos da Deliberação 734), facultandolhes a possibilidade de revogar a aceitação até o quinto dia útil posterior ao recebimento da respectiva comunicação. Adicionalmente, informar como será conduzido o processo para possibilitar a desistência por parte dos Primeiros Adquirentes, esclarecendo o procedimento a ser adotado e o cronograma previsto. Tais informações devem ser incluídas no Prospecto Resumido da oferta.”
4. Ao longo deste Memorando vamos descrever os motivos que levam esta área técnica a exigir o atendimento a tais artigos da citada Instrução. Inicialmente, cabe um breve histórico acerca das ofertas públicas de Condo-Hotéis.
I. Histórico:
5. Em 12.12.2013, a CVM disponibilizou em seu site um alerta para as ofertas irregulares de investimento em empreendimentos imobiliários, após análise de denúncias de captação irregular de poupança popular por incorporadores e corretores de imóveis (“Ofício de Alerta”).
6. Tal alerta advertiu que, por força do disposto no artigo 2º, inciso IX e artigo 19, ambos da Lei nº 6.385/76[2], as ofertas de investimento que utilizassem a forma e os meios de divulgação ali descritos deveriam ser previamente registrados na CVM e que tais ofertas somente poderiam ser realizadas por sociedades também registradas na Autarquia.
7. A CVM explicitou, em tal divulgação, direcionada aos incorporadores, corretores de imóveis e demais participantes do mercado imobiliário, que somente deveriam realizar tais operações mediante a fiel observância da legislação em vigor, com a necessária obtenção dos prévios registros na CVM.
8. Em 25.07.2014, em função de uma consulta protocolada pela PDG Realty S/A Empreendimentos e Participações, a SRE encaminhou à PFE o MEMO/CVM/SRE/Nº 45/2015 questionando se a venda de futuras unidades autônomas locadas objeto de incorporação imobiliária de um empreendimento hoteleiro configuraria uma oferta pública de valores mobiliários.
9. O referido Memorando apresentou as razões pelas quais esta Superintendência, após análise dos contratos utilizados na oferta, concluiu que a oportunidade de investimento em empreendimento hoteleiro configurava uma oferta pública de valores mobiliários na modalidade contrato de investimento coletivo.
10. Em 14.08.2014, em resposta ao MEMO supracitado, a PFE emitiu o PARECER/Nº 167/2014/PFE-CVM/PGF/AGU, concluindo que o exame das minutas dos contratos e do material publicitário, relativos ao empreendimento hoteleiro, permitiu a identificação de contrato de investimento coletivo por ser inequívoco que: (i) há investimento; (ii) o investimento é formalizado por contratos vinculados entre si; (iii) o investimento é coletivo; (iv) é oferecida remuneração aos investidores; (v) a remuneração tem origem nos esforços do empreendedor ou de terceiros; e (vi) os contratos foram ofertados publicamente.
11. Em 17.03.2015, foi publicada a Deliberação CVM nº 734 (“Deliberação 734”), que delega competência à SRE para conceder dispensas de registro e de requisitos de registro em ofertas públicas de CIC no âmbito de projetos imobiliários vinculados à participação em resultados de empreendimentos hoteleiro, nas hipóteses nela especificadas.
12. A partir de maio de 2015 os processos relativos aos pedidos de dispensa de ofertas públicas de distribuição de Contratos de Investimento Coletivo em Condo-Hotéis passaram a ser analisados pela GER-2, que é a Gerencia da SRE responsável pela análise dos processos de oferta pública de distribuição de valores mobiliários.
13. Desde então, os Ofícios de Exigências encaminhados passaram a orientar os ofertantes quanto à necessidade de atender aos requisitos previstos nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400, dando conhecimento aos investidores, que já tivessem adquirido os CIC antes da submissão do pedido de dispensa para analise da CVM, sobre a suspensão da Oferta, por conta da disponibilização do Ofício de Alerta, e da modificação da Oferta, em função da incorporação dos novos documentos exigidos pela Deliberação 734, facultando-lhes a possibilidade de revogar a aceitação do investimento até o quinto dia útil posterior ao recebimento da respectiva comunicação. Os Ofícios de Exigências elaborados explicitam que o atendimento à exigência em questão é condição para a concessão da dispensa de registro pleiteada.
II. Razões dos Recorrentes:
14. Os Recorrentes protocolaram em 25.09.2015 na CVM o pedido de dispensa de registro da oferta pública de distribuição de CIC referentes ao empreendimento Intercity São Leopoldo.
15. Nos dados constantes da minuta de Prospecto Resumido da Oferta foram observadas informações quanto à distribuição pública de 37 Contratos de Investimento Coletivos referentes a unidades autônomas hoteleiras, sendo que o empreendimento conta com um total de 135 unidades autônomas. Além da informação de que 23 unidades autônomas hoteleiras foram permutadas na transação envolvendo o terreno do empreendimento.
16. Diante disso, foi elaborada uma exigência em referência às 75 unidades autônomas que foram vendidas pelos Ofertantes por meio de uma oferta pública irregular, comercializadas no período anterior ao pleito de dispensa de oferta pública de registro. Cabe ressaltar que a exigência elaborada não compreendeu as 23 unidades autônomas que foram objeto de permuta na transação envolvendo o terreno do empreendimento, uma vez que tal operação pode ser considerada uma negociação privada de valor mobiliário, afastando a incidência da Instrução CVM 400.
17. Tal exigência requeria que os Ofertantes assumissem o compromisso de atender plenamente aos requisitos previstos nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400, como condição para a concessão da dispensa de registro pleiteada, dando conhecimento aos investidores que já tivessem aceitado a oferta, os Antigos Adquirentes, de sua suspensão e modificação (com a incorporação dos novos documentos nos termos da Deliberação 734), facultando-lhes a possibilidade de revogar a aceitação até o quinto dia útil posterior ao recebimento da respectiva comunicação, sem prejuízo de eventual apuração de responsabilidade em relação à oferta irregular de valores mobiliários.
18. Em 22.12.2015, em resposta ao Ofício nº 346/2015/CVM/SRE/GER-2, os Ofertantes interpuseram recurso, objetivando o não atendimento à referida exigência, pelos motivos expostos a seguir:
“I. INTRODUÇÃO
(...)
1.3. O Recurso pretende contestar o entendimento manifestado por esta Área Técnica no item 6 do Ofício, acima transcrito, em que se exigiu, como visto, a concessão de direito de retratação aos investidores que haviam adquirido unidades imobiliárias autônomas do Empreendimento em data anterior à do protocolo dos respectivos pedidos de dispensa na CVM.
1.4. Como se verá, os Recorrentes pedirão ao Colegiado que, no lugar daquela medida, se adotem outras, mais coerentes com o quadro que se apresenta.
II. TEMPESTIVIDADE
2.1. O Ofício concedeu o prazo de 22.12.2015 para cumprimento das exigências, em atendimento ao art. 9º, § 1º, da Instrução CVM nº 400/2003.
2.2. O Recurso foi protocolado em 18.12.2015, antes, portanto, do prazo concedido pela Área Técnica.
2.3. De todo modo, é importante observar que embora a Deliberação CVM n¬º 463/2003 estabeleça, em seu item I, combinado com o item X, que cabe recurso ao Colegiado para reexame de uma dada decisão, manifestação de entendimento ou parecer de área técnica da CVM no prazo de 15 (quinze) dias, o Recurso a rigor pretende anteciparse a eventual decisão final de indeferimento que pode sobrevir se mantido o entendimento da Área Técnica aqui apresentado, nos termos dos art. 16, inciso II e § 4º, da Instrução CVM nº 400/2003[3], aplicados por analogia à decisão que indeferir pedidos de dispensa[4].
III. O DIREITO DE RETRATAÇÃO NA REGULAMENTAÇÃO DA CVM
3.1. A regulamentação da CVM confere aos investidores que tenham aceitado uma oferta pública de distribuição de valores mobiliários ainda em curso a possibilidade de revogar sua aceitação em duas distintas situações.
3.2. A primeira dessas situações se dá quando da suspensão ou cancelamento da oferta pela CVM (art. 20 da Instrução CVM nº 400/2003). A suspensão é, ao lado do cancelamento, uma das medidas de cunho excepcional que a CVM pode adotar quando uma oferta (i) se estiver processando em condições diversas daquelas da Instrução CVM nº 400/2003 ou do registro concedido ou (ii) “tenha sido havida por ilegal, contrária à regulamentação da CVM ou fraudulenta” (art. 19 da Instrução CVM nº 400/2003). É bastante claro o motivo pelo qual, uma vez constatadas tais irregularidades e tomada a medida excepcional pela CVM, impõese permitir a retratação para o investidor.
3.3. O outro tipo de situação que justifica a possibilidade de retratação reside no parágrafo único do art. 27 da mesma Instrução, que trata dos efeitos da posterior modificação da oferta. Havendo, na forma do art. 26 daquele diploma, “alteração substancial, posterior e imprevisível nas circunstâncias de fato existentes quando da apresentação do pedido de registro”, a CVM pode autorizar tal modificação e, nesses casos, por se tratar de oferta distinta daquela inicialmente efetuada, se permite a retratação.
3.4. Contudo, a previsão desse direito de retratação – e, a bem da
verdade, a maioria das disposições da Instrução CVM nº 400/2003 – tem como pressuposto a sua aplicação a valores mobiliários que, mesmo quando são contratos de investimento coletivo, conformamse como produtos de investimento financeiro mais próprios.
3.5. No entanto, quando se passa a outros instrumentos, de natureza mais complexa, tendem a surgir, quase que naturalmente, questões desafiadoras para o regulador. Esse tipo de tensão é e será sempre inevitável e ela é que se encontra por trás do fato de, para cada novo produto caracterizado como valor mobiliário sob a égide do inciso IX do art. 2º da Lei nº 6.385/1976, ser necessária a criação de um regime regulamentar próprio.
3.6. É exatamente isso que ocorre no caso dos contratos de investimento coletivo relacionados à exploração e desenvolvimento de empreendimentos hoteleiros. Na realidade, as características únicas desse produto levaram a que a CVM por muito tempo nem sequer reconhecesse sua competência para regulamentar sua oferta pública. O comunicado divulgado pela autarquia em dezembro de 2013 é a primeira manifestação nesse sentido.
3.7. Os motivos dessa particularidade são, a essa altura, já bastante conhecidos e residem sobretudo no fato de que os condohotéis envolvem, ao menos na sua modalidade mais comum, a aquisição de um bem imóvel. Assim, por mais que se trate de valor mobiliário, o investimento está vinculado à propriedade de uma unidade imobiliária, com todas as garantias típicas do regime jurídico de um condomínio edilício. O apelo imobiliário dos condohotéis é o grande diferencial do produto e um fator determinante na decisão de investimento dos seus adquirentes.
3.8. Sensível às especificidades dos condohotéis, a CVM passou, antes mesmo de editar uma norma própria, a conceder dispensas de registro para as ofertas. Tal regime foi aprimorado com a Deliberação CVM nº 734/2015. Como já se viu, na implementação desse modelo (que tem natureza provisória, vale realçar), a Área Técnica vem desenvolvendo o entendimento de que, nos casos de ofertas realizadas parcialmente tanto antes quanto depois do reconhecimento da natureza dos condohotéis, mas sem a apresentação do pedido de dispensa, os adquirentes teriam direito de retratação.
3.9. Como se destacou, é contra esse entendimento em especial que os Recorrentes vêm se insurgir. E tratase de uma preocupação que vai além do caso concreto, refletindo temores de todo o mercado. Com efeito, uma vez que se está diante de um processo de construção do arcabouço regulatório vigente, em um momento de transição, e tendo em vista também os graves efeitos dessa opção, era importante trazer o tema ao Colegiado da autarquia.
3.10. Nesse sentido, gostaríamos de, inicialmente, explorar alguns motivos pelos quais, no entendimento dos Recorrentes, a solução adotada pela Área Técnica seria não apenas indesejada, mas também incorreta. É o que se fará nas próximas seções.
IV. INICIALMENTE, DA IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DOS DISPOSITIVOS UTILIZADOS PARA FUNDAMENTAR A APLICAÇÃO DA MEDIDA
4.1. Como se destacou, a Área Técnica vem fazendo referência não apenas ao art. 20, mas também ao art. 27 da Instrução CVM nº 400/2003 como fundamentos para a aplicação da solução por ela vislumbrada. O primeiro dispositivo diz respeito à possibilidade de retratação em razão da suspensão ou do cancelamento da oferta, enquanto o segundo cuida dos casos em que a oferta é posteriormente modificada.
4.2. Quanto ao primeiro ponto, não há que se falar, com absoluta segurança, em incidência do art. 20 da Instrução porque não ocorreu, na modalidade, uma suspensão da oferta propriamente dita, sob os termos da Instrução.
4.3. Vale lembrar que o instituto da suspensão sempre foi interpretado e aplicado pela CVM com muito cuidado, pelos graves efeitos que ele pode produzir em ofertas de valores mobiliários mais típicos. Em razão dessas construções, entendemos ser possível afirmar que a presente situação talvez exija uma extensão de interpretação que não é aceitável em regras criadas com esse caráter de mecanismo excepcional.
4.5. Quanto ao segundo ponto – o da possibilidade de retratação em caso de modificação da oferta –, também não há como falar em incidência. E isso simplesmente porque não há, a rigor, modificação de oferta, nos termos acima descritos. Tanto na oferta realizada anteriormente ao pedido de dispensa de registro (sem aquele conjunto de informações exigidas pela CVM, na forma por ela exigida) quanto na oferta devidamente submetida ao pedido de dispensa, tratase substancialmente do mesmo produto, ofertado sob as mesmas condições negociais. Na verdade, em razão da incidência, a posteriori, do regime mais rigoroso criado pela CVM, não há nem mesmo como assumir que pode haver uma piora na situação do investidor capaz de justificar a retratação.
4.6. Tanto assim que a retratação de que cuida o art. 27 pressupõe um procedimento (referido no art. 25) que certamente não reflete a situação de que tratam esse e outros casos de venda anterior ao pedido de dispensa.
4.7. Assim, a retratação de que aqui se está tratando não é nem aquela do art. 20 e nem aquela do parágrafo único do art. 27 da Instrução CVM nº 400/2003. É uma novidade, que não dispõe de previsão expressa, imposta no meio de um tipo de procedimento que ainda se está procurando criar. E uma novidade que, como se verá com mais vagar, contradiz a dinâmica de oferta daqueles produtos.
V. AS INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS E O DESCABIMENTO DO DIREITO DE RETRATAÇÃO, CONFORME PREVISTO NA REGULAMENTAÇÃO DA CVM
5.1. A oferta pública de contratos de investimento coletivo no âmbito de empreendimentos hoteleiros envolve a aquisição, pelo investidor, de unidades imobiliárias autônomas ou, pelo menos, de direitos de natureza
imobiliária, consubstanciados em partes ideais de condomínios gerais sobre bens imóveis.
5.2. Não é só isso, porém. O mecanismo foi criado para permitir a incorporação e a construção de empreendimentos, em um setor que, a despeito de tradicional (e de dispor de um arcabouço institucional já há muito consolidado), historicamente se ressente da inexistência de alternativas para a obtenção de recursos. Não se pode, para a regulamentação da oferta do produto, ignorar a dinâmica própria do setor.
5.3. Nessa mesma linha, é preciso reconhecer que a pretensão legítima da CVM de regular os condohotéis naquilo que eles têm de valor mobiliário coexiste com uma série de outras normas, inclusive de cunho legal, que regem, de forma mais específica e por vezes distinta, as incorporações imobiliárias e os direitos e deveres do adquirente e da incorporadora.
5.4. O tema da desistência é bastante relevante justamente porque se está tratando, aqui, da construção de um empreendimento. Assim, a Lei nº 4.591/1964 (“Lei de Incorporações”) tratou do assunto, direta ou indiretamente, em diversos dispositivos que oferecem proteções e garantias tanto aos adquirentes das unidades imobiliárias quanto aos incorporadores.
5.5. Em seu art. 32, § 2º, a Lei de Incorporações afirma expressamente que: “Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis e, uma vez registrados, conferem direito real oponível a terceiros, atribuindo direito a adjudicação compulsória perante o incorporador ou a quem o suceder, inclusive na hipótese de insolvência posterior ao término da obra”.
5.6. Ainda em assunto relacionado, o art. 34 da Lei de Incorporações prevê a possibilidade de o incorporador fixar um prazo de carência dentro do qual lhe será lícito desistir da incorporação. Durante esse período, em que já pode negociar unidades, o incorporador avalia melhor a viabilidade comercial do empreendimento e define se vale a pena prosseguir. Concluindo pela sua inviabilidade, o incorporador deve restituir aos adquirentes as importâncias que eles já houverem pagado (art. 36 da Lei de Incorporações).
5.7. A preocupação minuciosa da lei em regrar aspectos relacionados à desistência e prosseguimento da incorporação está bastante relacionada à tutela das expectativas de incorporadores e adquirentes – que, em comum, nutrem o desejo de levar a cabo a construção do edifício –, mas também à natureza do bem que é objeto da contratação: não há como construir ou entregar meio edifício, meio andar, ou meio condomínio. Ou o todo se mostra viável e os envolvidos devem dispor de meios jurídicos para exigir sua consecução ou não há possibilidade de levar o projeto adiante.
5.8. É justamente por isso que o art. 63 da Lei de Incorporações, reconhecendo o direito do incorporador ao recebimento das parcelas devidas pelo adquirente inadimplente – direito esse que afinal interessa a todos os adquirentes adimplentes – permite estipular no contrato “que a falta de pagamento, por parte do adquirente ou contratante, de 3 prestações do preço da construção [...] implique na rescisão do contrato, conforme nele se fixar, ou que, na falta de pagamento, pelo débito respondem os direitos à respectiva fração ideal de terreno e à parte construída
adicionada”, a ser oportunamente leiloada.
5.9. O que esses dispositivos corroboram é que, pelo menos no que diz respeito à aquisição da unidade imobiliária, a extensão do direito regulamentar de retratação, concebido pela CVM para valores mobiliários tradicionais, não visceralmente integrados naquela dinâmica da construção e incorporação de um bem de natureza imobiliária, pode se mostrar inadequada. Cumulamse regimes distintos, com finalidades distintas, em uma solução disfuncional e estranha à dinâmica do setor.
VI. DOS EFEITOS COLATERAIS DA DECISÃO DA ÁREA TÉCNICA
6.1. Para além dessa questão de ordem lógicojurídica – e que é muito mais complexa do que faz crer a decisão recorrida –, é preciso ter em mente os graves efeitos colaterais que uma medida dessa natureza pode ter.
6.2. Ao contrário do que ocorre numa oferta de títulos ao mercado, neste caso, que envolve empreendimentos financiados com a concomitante venda de unidades, a possibilidade de retratação coloca em risco a integridade e a continuidade do próprio empreendimento. Novamente: pela própria sistemática criada pela Lei de Incorporação, venda de unidades, incorporação e construção estão naturalmente imbricadas.
6.3. É importante notar que, a despeito da intenção e do esforço do setor de cumprir as decisões da autarquia, estamos, aqui, lidando com agentes que não estão acostumados à lógica da regulamentação do mercado de valores mobiliários. Na verdade, eles não estão nem mesmo sujeitos a um regime regulatório claro, promulgado pela CVM. É bastante provável que, na construção desse arcabouço, e por mais bem intencionados que sejam os ofertantes, surjam outras situações que, na interpretação da Área Técnica, devessem levar à incidência do direito de retratação aqui questionado. Elas já vêm, na verdade, surgindo em um grande número de casos.
6.4. E a solução cria, evidentemente, um estímulo perverso para os adquirentes das unidades condominiais, em especial no momento pelo qual passamos. Afinal, essas pessoas investiram em empreendimentos de mais longo prazo, de setor imobiliário, e a situação da economia brasileira faz com que, agora, aqueles adquirentes talvez passem a preferir dispor de liquidez e encontrem, assim, na medida proposta pela Área Técnica a oportunidade para se desvincularem de negócio irrevogável e irretratável sem qualquer ônus ou penalidade.
6.5. Por fim, é importante lembrar que o exercício desse direito, simultaneamente, por uma ampla parcela de adquirentes pode criar uma obrigação insuportável para os incorporadores, que, já tendo entregado ou construído os imóveis, teriam que restituir a esses adquirentes as quantias pagas. Os efeitos, não apenas para os incorporadores, mas também para os próprios empreendimentos, são evidentes.
6.6. Em suma, a possibilidade de retratação, nos termos em que proposta pela Área Técnica no presente caso e em tantos outros, (i) ignora a dinâmica do mercado imobiliário, em que se originam aquelas operações, assumindo que se trata de uma venda de valor mobiliário pura; (ii) ameaça aquilo que a Lei de Incorporação procurou proteger, que é a continuidade dos projetos, em benefício da totalidade dos adquirentes; e (iii) ignora que soluções como estas, ante não apenas as características do mercado
imobiliário, mas sobretudo ante as condições da economia brasileira, podem criar estímulos para desvinculação dos adquirentes aos empreendimentos, em verdadeiro risco moral.
6.7. É evidente, assim, a desproporcionalidade da solução proposta pela Área Técnica. E os efeitos disso, ao lado do desestímulo ao recurso a instrumentos de mercado (ou seja, do desestímulo à busca de investidores) em um setor marcado pela carência de recursos, é também um estímulo à manutenção dos empreendimentos existentes – para os quais já se iniciaram ofertas em um período de evidente zona cinzenta – em uma verdadeira clandestinidade. Para que regularizar as ofertas, se a CVM exige medida tão discrepante?
6.8. A política regulatória da CVM não pode ser insensível a essa realidade. O direito de retratação, pensado para outros contextos e para oferta de outros valores mobiliários, não deve ser entendido nem encarado como a única forma existente e concebível para lidar com situações como a deste caso.
VII. PROPOSTA ALTERNATIVA À CONCESSÃO DO DIREITO DE RETRATAÇÃO
7.1. Feitas estas considerações, vimos, pelo presente Recurso, trazer também uma proposta de medida que nos parece adequada para lidar com as aquisições anteriores ao pedido de dispensa de registro.
7.2. No entanto, antes mesmo de trazer essa proposta, entendemos ser necessário registrar outro ponto. Isso porque há diferentes casos para os quais a CVM pode aplicar a exigência da retratação e entendemos que, para todos eles, deve valer a mesma solução.
7.3. Assim, há casos em que a oferta se iniciou antes mesmo do reconhecimento, pela CVM, de que se tratava de valores mobiliários. Em outros, a oferta se iniciou após aquela decisão da CVM. Ao menos para os fins da presente discussão, não se pode diferenciar essas hipóteses. É bastante problemático – ao menos do ponto de vista prático – estender os efeitos da decisão da CVM para vendas que estavam perfeitas antes do reconhecimento daqueles produtos como valores mobiliários.
7.4. E, mesmo depois da decisão da CVM de dezembro de 2013, não nos parece justo assumir que os agentes de mercado estivessem, de modo geral, agindo de maneira ardilosa, tentando apenas fugir de um regime que era claramente aplicável: primeiro porque os termos daquela decisão não são, para um leitor inexperiente, tão inequívocos assim; segundo porque o setor ao qual a deliberação se destinava não é, de fato, um típico interlocutor da CVM; terceiro, ante a grande dispersão geográfica dos ofertantes; quarto, porque, como se tem notado, os ofertantes, em todos esses casos, cessaram em algum momento as ofertas irregulares, não raro sem provocação da CVM; e quinto, porque não apenas as primeiras decisões da CVM sobre dispensa de registro demoraram a aparecer (o que deixou os agentes sem referência por um período relevante), como também porque, até o presente momento, não há um verdadeiro arcabouço normativo para as ofertas.
7.5. Assim, ofertas iniciadas antes ou depois da decisão de dezembro de 2013, sem pedido de dispensa de registro, deveriam ser igualmente passíveis de beneficiarse da dispensa, quando trazidas à CVM, sem o ônus excessivo e desproporcional da possibilidade de retratação. O
importante é promover a regularização dos projetos, dentro do arcabouço que se está construindo.
7.6. É lógico que, para efeitos de apuração de responsabilidades por descumprimento da regulamentação, esses casos provavelmente devem ser diferenciados. Mas essa é uma outra questão. Aqui, e em prol da criação de soluções adequadas ao mercado, impõese a uniformização.
7.7. Feitos esses esclarecimentos, podemos passar às medidas possíveis. Entendemos que, no lugar da retratação, devese adotar um procedimento que se destine a complementar o conjunto de informações recebidas pelos primeiros adquirentes, fornecendolhes as informações exigidas pela Deliberação CVM nº 734/2015 para a dispensa de registro. Assim, se estes adquiriram, na origem, um empreendimento sujeito àquela dinâmica dos processos de incorporação, eles serão equiparados aos investidores que adquirirão as unidades a partir da dispensa de registro.
7.8. É importante, no entanto, dar alguns passos além. Isso porque, na oferta pública regulamentada pela CVM, os documentos da oferta se revestem de uma certa impessoalidade. Eles são dirigidos ao público em geral, sem maior didatismo nem explicações. Propomos, assim, que a principal forma de equiparar os adquirentes anteriores aos futuros seja a partir de um tratamento presencial.
7.9. Assim, os Recorrentes propõem a adoção do seguinte procedimento, a ser conduzido pela Incorporadora:
(i) envio de carta, personalizada e com aviso de recebimento, a cada um dos adquirentes anteriores, em que se explicará (a) que, em razão de decisão da CVM de dezembro de 2013, a venda de unidades condominiais autônomas sob o regime de incorporação imobiliária com destinação hoteleira passou a ser considerada oferta pública de valor mobiliário; (b) que, em razão dessa decisão, o processo passou a ser objeto de um regime específico, que envolve, dentre outras medidas a apresentação de um conjunto de documentos e informações sobre essa oferta; (c) qual a natureza e o papel de cada um dos documentos da oferta; (d) que outras informações o adquirente passará a receber, relacionadas ao acompanhamento dos resultados do empreendimento (informações financeiras); e (e) quais os outros mecanismos de fiscalização e de acompanhamento de que o adquirente dispõe, nos termos da Lei de Incorporação. Também constarão da carta todas as orientações relacionadas ao pleno acesso a todas essas informações e esclarecimentos também por intermédio da página na rede mundial de computadores que hospedará a oferta;
(ii) convidar o adquirente, também por meio da carta, a participar de uma reunião em que se efetuará uma apresentação daqueles documentos, com a discussão de qualquer ponto que o adquirente entenda necessário. Tal reunião será realizada em um prazo máximo de 180 dias contados da data de concessão da dispensa do registro; e
(iii) submeter a minuta da carta à aprovação da CVM.
7.10. Entendemos que essas medidas suprem a falta de ciência do regime aplicável e eventuais disparidades que possam resultar do esforço original de venda pelos ofertantes, sem gerar efeitos graves como aqueles acima referidos. Vale ressaltar mais uma vez que não estamos, aqui, propondo nenhuma solução diretamente relacionada à apuração de
responsabilidades pelo anteriormente ocorrido.
VIII. CONCLUSÃO
8.1. Em face do exposto, pedem os Recorrentes que o Colegiado dê provimento ao Recurso para, reformando o entendimento da Área Técnica:
(i) desobrigar os Recorrentes de cumprir o item 6 do Ofício; e
(ii) reconhecer a proposta alternativa apresentada pelos Recorrentes na seção VI como válida e suficiente para tratar a situação das unidades imobiliárias adquiridas antes de protocolado o pedido de dispensa.”
III. Casos Precedentes de aplicação do direito de desistência:
19. Conforme mencionado nos parágrafos 12 e 13 deste Memorando, os processos de pedidos de dispensa de ofertas públicas de distribuição de Contratos de Investimento Coletivo em Condo-Hotéis passaram a ser analisados pela GER-2 a partir de maio de 2015 e, desde então, os Ofícios de Exigências passaram a exigir que fosse dado aos Antigos Adquirentes o acesso às novas informações disponibilizadas nos documentos da Oferta, em função de cumprimento aos dispositivos da Deliberação 734, e a possibilidade de revogar a aceitação do investimento até o quinto dia útil posterior ao recebimento da respectiva comunicação, com base no disposto nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400.
20. A mesma exigência foi elaborada para todos os pedidos de dispensa de registro analisados pela GER-2, tendo sido atendida nos seguintes processos cuja dispensa já foi concedida pela SRE: RJ-2015-4326 – Hotel Paiquerê (Blue Tree Tower Valinhos); RJ- 2015-9127 – Condomínio Edifício He Itatiba; RJ-2015-6859 – Park Inn by Xxxxxxxx Xxxxxx; RJ-2015-10328 – Best Western Multi Suítes; RJ-2015-10437 – Dall’Onder Axten Hotel.
21. No processo relativo ao empreendimento imobiliário Hotel Paiquerê (Blue Tree Tower Valinhos), a dispensa de registro foi indeferida pela SRE em função do não atendimento a algumas exigências, incluindo a exigência relativa à possibilidade de os Antigos Adquirentes revogarem a aceitação do investimento.
22. Logo após o indeferimento da Oferta, os ofertantes entraram com pedido de reconsideração da decisão da Superintendência, atendendo as exigências solicitadas.
23. Quanto à exigência referente à possibilidade de revogação da aceitação do investimento, ainda no âmbito do Processo RJ-2015-4326, os ofertantes se comprometeram a comunicar diretamente os Antigos Adquirentes, acerca da modificação, entregando cópias do Prospecto Resumido, do Estudo de Viabilidade e dos demais documentos da Oferta, e possibilitando, no prazo de cinco dias úteis, a manifestação de interesse em manter ou não a aceitação da Oferta. Além disso, os ofertantes informaram que o processo de comunicação aos Antigos Adquirentes seria iniciado tão logo o pedido de dispensa de registro fosse deferido e que os documentos comprobatórios do encerramento de tal procedimento seriam encaminhados à CVM em 30 dias a contar dessa data.
24. No prazo estabelecido os ofertantes encaminharam a documentação à CVM, demonstrando que dos 75 Antigos Adquirentes, 4 investidores decidiram revogar a aceitação do investimento.
IV. Considerações da Área Técnica:
25. O recurso foi interposto em função de exigência encaminhada no primeiro ofício enviado aos Requerentes, nos termos do artigo 8.º, caput da Instrução CVM 400[6], no âmbito de processo em análise de pedido de dispensa de registro, nos termos do artigo 4.º da
mesma Instrução[7].
26. Apesar de não estar expressamente previsto na Instrução CVM 400 a possibilidade de concessão de oportunidade de suprir vícios sanáveis previamente ao indeferimento dos pedidos de dispensa de registro submetidos com base no artigo 4º[8], tendo em vista que o § 2.º do citado artigo estipula como prazos de análise os que estão previstos nos artigos 8.º e 9.º da Instrução[9], sem qualquer menção ao artigo 16[10], esta área técnica tem adotado a sistemática de conceder aos ofertantes a oportunidade para atendimento integral às exigências formuladas. Assim sendo, é encaminhado um ofício de exigências e outro em que são reiteradas as exigências não cumpridas, previamente ao indeferimento do pedido de dispensa formulado.
27. A formulação de uma exigência não é, portanto, uma decisão final da SRE. Mas, como bem colocado pelos Recorrentes, o não atendimento a essa exigência nas duas oportunidades concedidas aos ofertantes (resposta ao ofício de exigências e resposta ao ofício de oportunidade para suprir vícios sanáveis) pode levar ao indeferimento do pedido de dispensa.
28. Por esse motivo, esta área técnica entende que o Recurso deve ser apreciado na atual fase do processo, em que o pedido de dispensa de registro ainda está em análise, de modo a lhe dar o melhor aproveitamento e efetividade, conforme item IV da Deliberação CVM n.º 463/03.
29. Quanto à interpretação da área técnica de que o Ofício de Alerta foi um aviso para suspensão das ofertas irregulares, isso se deu em função da impossibilidade de identificar todas as distribuições de CIC em Condo-Hotéis que estavam em curso de forma indevida. Como mencionado anteriormente, a atuação da CVM naquela ocasião ocorria em virtude de denúncias do mercado, que eram submetidas à análise da PFE e do Colegiado e, em seguida, era encaminhado um Ofício de Stop Order ao ofertante irregular.
30. Contudo, naquele momento, face ao número crescente de denúncias, a Superintendência entendeu que cabia informar ao mercado sobre a ocorrência de ofertas irregulares, com captação de poupança pública, sem previa submissão dos documentos a esta Autarquia.
31. O Ofício de Alerta expressa formalmente que os Incorporadores, corretores de imóveis e demais participantes do mercado imobiliário devem somente realizar tais operações mediante a fiel observância da legislação em vigor, com a necessária obtenção dos prévios registros na CVM.
32. Assim sendo, entendemos que tal Ofício elucidou ao mercado sobre a necessidade de paralisar as ofertas irregulares de CIC em Condo-Hotéis e submeter os documentos ao órgão regulador do mercado de capitais, por força do disposto nos artigos 2º, inciso IX e 19, ambos da Lei nº 6.385/76.
33. Neste ponto, cabe ressaltar que após a identificação de uma distribuição pública de valor mobiliário irregular, a área técnica trata tal contrariedade à legislação com base nos artigos apropriados ao tema constantes da Instrução CVM 400. O artigo 19 da citada Instrução estabelece a possibilidade de suspensão ou cancelamento da oferta, a qualquer tempo, caso esteja se processando em condições diversas da Instrução ou se for contrária à lei ou à regulamentação da CVM, mesmo que tenha sido obtido o registro ou dispensa do registro.
34. De acordo com a irregularidade, quando necessário, é aplicada a possibilidade de revogação da aceitação da Oferta com restituição integral dos valores investidos, conforme estabelecido nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400. Tais dispositivos somente podem ser utilizados se a Oferta envolvida ainda estiver em curso, sem divulgação ao mercado sobre seu encerramento. Tal entendimento foi manifestado pela Diretora Xxxxxxx Xxxx, conforme extrato da Ata dessa Reunião do Colegiado de 4.3.2015, no
âmbito do Processo CVM n.º RJ-2014-11297, “os arts. 20 e 27 da Instrução 400 garantem ao investidor a possibilidade de revogar a aceitação dada no âmbito de uma oferta ainda em andamento, diante de certas condições”. (grifamos)
35. Assim sendo, após a edição da Deliberação CVM 734, quando os processos de pedido de dispensa de registro começaram a ser analisados pela GER-2, Gerência responsável pela análise de ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários, a área técnica entendeu que, uma vez que houve uma oferta pública irregular, contrária à regulamentação da CVM e que os Ofertantes buscam a CVM para dar continuidade a Oferta, agora de acordo com a legislação pertinente, seria correta a aplicação dos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400, tendo em vista que a Oferta ainda se revela em curso.
36. A esse respeito, entendemos que o artigo 20 da Instrução CVM 400 tem por finalidade proteger os investidores não da suspensão da oferta propriamente dita, mas sim da ocorrência de fatores que levaram à suspensão, como a realização de uma oferta contrária à legislação. No caso concreto, a venda de futuras unidades autônomas objeto de incorporação imobiliária de empreendimentos hoteleiros, com a utilização de material de divulgação publicado em jornais e sítios da Internet, caracterizando uma distribuição pública de Contratos de Investimento Coletivo.
37. Além disso, cabe ressaltar que a aplicação do direito de retratação não tem a natureza de punição ou sanção para os Ofertantes. É apenas um instrumento explícito na norma que serve para proteger os direitos dos investidores. Dar a possibilidade de revogação da aceitação do investimento aos investidores que adquiriram o CIC no curso da oferta irregular é praticar o tratamento equitativo para todos os adquirentes, conforme preconiza o artigo 21 da Instrução CVM 400.
38. É patente que todos os investidores devem ter o direito de decidir sobre o investimento com uma base informacional uniforme.
39. Neste ponto, convém citar dois trechos do Parecer/Nº 167/2014/PFE- CVM/PGF/AGU, de 14.08.2014, que orientou esta Superintendência em resposta a uma consulta elaborada pela PDG Realty S/A Empreendimentos e Participações, acerca da venda de Condo-Hotéis.
40. No referido Parecer a PFE destaca que: “A intervenção exercida pela CVM sempre foi pautada, em sua essência, pela garantia do full and fair disclosure, pois o elemento risco integra naturalmente o mercado de valores mobiliários” e ainda, “O sistema de registros desta Autarquia constitui um instrumento regulatório de disclosure, destinado a fornecer aos investidores as informações necessárias e suficientes para uma avaliação consciente da oportunidade de investimento”.
41. Assim sendo, resta claro que apresentar as novas informações aos Antigos Adquirentes, fruto do atendimento das exigências da CVM para enquadramento da oferta ao estabelecido na Deliberação CVM 734, sem possibilitar a revogação de aceitação do investimento não confere tratamento equitativo entre os investidores.
42. Ademais é notório, nos termos do art. 27 da Instrução CVM 400, o direito de o investidor ter conhecimento de que a oferta original foi amplamente alterada, com a inclusão de novos documentos e informações exigidos pela Deliberação CVM 734.
43. Para tornar possível a compreensão adequada acerca dos riscos envolvidos no investimento em análise, a Deliberação CVM 734 condiciona a dispensa de registro à apresentação de: (i) prospecto resumido da oferta, contendo, no mínimo, algumas informações previstas no Anexo II; (ii) estudo de viabilidade econômica do empreendimento hoteleiro, elaborado por profissional ou empresa independente e que contenha, ao menos, determinadas informações explicitadas no Anexo III; (iii) modelo de declaração do investidor elaborado de acordo com o Anexo I; (iv) modelo de todos os instrumentos contratuais que compõem o CIC; (v) declaração de veracidade das informações fornecidas ao público
investidor; e (vi) certidão de ônus reais do imóvel dentro do prazo de validade.
44. Não é possível saber quais foram os documentos apresentados para que os Antigos Adquirentes decidissem pelo investimento, naquela ocasião de Oferta irregular de valores mobiliários. Contudo, é possível afirmar que, nos documentos que são apresentados para CVM no pedido de dispensa de registro, faltam, por muitas vezes, informações relevantes e constam inúmeras informações imprecisas. Podemos constatar tal fato, em função da quantidade de exigências que são feitas e reiteradas pela área técnica nos diversos pedidos de dispensa de registro analisados. Principalmente, no que diz repeito aos prospectos resumidos e aos estudos de viabilidades apresentados. Razão pela qual deve ser aplicado o disposto no parágrafo único do art. 27 da Instrução CVM 400, que estabelece que os investidores que já tiverem aderido a uma oferta deverão ser comunicados diretamente a respeito da modificação efetuada, para que confirmem, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, o interesse em manter a aceitação do investimento.
45. No caso específico do pedido de dispensa de registro da oferta pública do Condo-Hotel Intercity São Leopoldo os documentos que os ofertantes julgavam com qualidade suficiente para protocolo na CVM foram objeto de 50 (cinquenta) exigências para adequação ao estabelecido na norma no primeiro ofício da CVM (Ofício nº 346/2015/CVM/SRE/GER-2), sendo que 3 (três) dessas necessitaram de reiteração na oportunidade para suprir vícios sanáveis (Ofício nº 15/2016/CVM/SRE/GER-2).
46. Assim sendo, independentemente da existência de outras regras a que o mercado imobiliário esteja submetido, cabe à CVM a proteção dos titulares de valores mobiliários e, para isso, é fato que as distribuições públicas de valores mobiliários atraem a incidência de um regime informacional especial, conforme previsto em Lei e em atos normativos editados pela CVM. É notório que a Instrução CVM 400 e, no caso concreto, a Deliberação CVM 734 exigem uma sofisticada relação de informações e documentos com o objetivo de proporcionar ao investidor a adequada avaliação das características fundamentais do investimento, especialmente no que tange aos riscos envolvidos na operação.
47. Não cabe a esta área técnica o questionamento quanto à existência de uma legislação adequada para garantir um sistema de proteção aos adquirentes de imóveis. Porém, cabe a esta Autarquia o zelo para que sejam devidamente resguardados os direitos do investidor, uma vez que não estamos diante de uma simples venda de bem imóvel.
48. Ressalta-se que o procedimento em debate adotado pela área técnica, a elaboração de exigência de dar conhecimento ao investidor de suspensão e também de modificação de ofertas, em função de procedimentos irregulares de distribuição pública e documentos originalmente alterados, faz parte da rotina da Gerência, amplamente utilizado, quando necessário, na análise das oferta públicas de variados valores mobiliários.
49. Por fim, argumentamos também que toda discussão trazida neste Memorando somente faz sentido em virtude da opção dos Ofertantes de não buscarem negociações privadas para a venda das Unidades Autônomas, o que não atrairia o poder regulatório da CVM. Contudo, houve a livre escolha pela comercialização com apelo à poupança pública, com a utilização dos mecanismos elencados no § 3º do artigo 19 da Lei nº 6.385/76.[11]
V. Conclusão:
50. Diante do exposto, entendemos que deve ser mantida a exigência de obrigatoriedade de concessão da possibilidade de desistência do investimento por parte dos Antigos Adquirentes, em função da realização de oferta pública irregular e da disponibilização de novos documentos aos investidores, em cumprimento ao disposto nos artigos 20 e 27 da Instrução CVM 400, sob pena de indeferimento do pedido de dispensa da oferta pública de distribuição de Contratos de Investimento Coletivo no âmbito de projetos imobiliários vinculados à participação em resultados de empreendimento hoteleiro, em
Condo-Hotéis, do Intercity São Leopoldo.
51. Assim, enviamos o presente Recurso ao Superintendente Geral, para que seja posteriormente submetido à superior consideração do Colegiado da CVM, nos termos do item III da Deliberação CVM n.º 463/03, requerendo sorteio de relator.
[1] Art. 20. O ofertante deverá dar conhecimento da suspensão ou do cancelamento aos investidores que já tenham aceitado a oferta, facultandolhes, na hipótese de suspensão, a possibilidade de revogar a aceitação até o quinto dia útil posterior ao recebimento da respectiva comunicação. (grifamos)
Parágrafo único. Terão direito à restituição integral dos valores, bens ou direitos dados em contrapartida aos valores mobiliários ofertados, na forma e condições do Prospecto:
I todos os investidores que já tenham aceitado a oferta, na hipótese de seu cancelamento; e
II os investidores que tenham revogado a sua aceitação, na hipótese de suspensão, conforme previsto no caput.
Art. 27. A modificação deverá ser divulgada imediatamente através de meios ao menos iguais aos utilizados para a divulgação da oferta e as entidades integrantes do consórcio de distribuição deverão se acautelar e se certificar, no momento do recebimento das aceitações da oferta, de que o manifestante está ciente de que a oferta original foi alterada e de que tem conhecimento das novas condições.
Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput, os investidores que já tiverem aderido à oferta deverão ser comunicados diretamente, por correio eletrônico, correspondência física ou qualquer outra forma de comunicação passível de comprovação, a respeito da modificação efetuada, para que confirmem, no prazo de 5 (cinco) dias úteis do recebimento da comunicação, o interesse em manter a declaração de aceitação, presumida a manutenção em caso de silêncio. (grifamos)
[2] . Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:
(...) IX quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.
Art . 19. Nenhuma emissão pública de valores mobiliários será distribuída no mercado sem prévio registro na Comissão.
[3] “Art. 16. O pedido de registro poderá ser indeferido nas seguintes hipóteses: [...] II quando não forem cumpridas as exigências formuladas pela CVM, nos prazos previstos nesta Instrução. [...] §4º Na hipótese de indeferimento, a CVM enviará ofício à instituição líder, com cópia para o ofertante, informando sua decisão, da qual cabe recurso ao Colegiado da CVM, na forma da regulamentação vigente”.
[4] A antecipação do Recurso está relacionada à flexibilidade de que goza o processo administrativo, tradicionalmente reconhecida por esta CVM e acolhida no item IV da já citada Deliberação CVM nº 463/2003, que preconiza “dar ao recurso o melhor aproveitamento e efetividade, preservandolhe a utilidade, a despeito da forma”.
[5] Se o comunicado de dezembro de 2013 tivesse o condão de resultar em uma suspensão automática de todas as ofertas que se estavam realizando à época, a Área Técnica deveria ter determinado o cancelamento das respectivas ofertas no prazo de 30 dias dessa suspensão, em atenção ao art. 19, § 3º, da Instrução CVM nº 400/2003, o que não ocorreu no caso.
[6] Art. 8º A CVM terá 20 (vinte) dias úteis, contados do protocolo, para se manifestar sobre o pedido de registro acompanhado de todos os documentos e informações que devem instruílo, que
será automaticamente obtido se não houver manifestação da CVM neste prazo.
[7] Art. 4º Considerando as características da oferta pública de distribuição de valores mobiliários, a CVM poderá, a seu critério e sempre observados o interesse público, a adequada informação e a proteção ao investidor, dispensar o registro ou alguns dos requisitos, inclusive divulgações, prazos e procedimentos previstos nesta Instrução.
[8] §2º O pedido de dispensa de registro ou de requisitos do registro será formulado pelo ofertante, e pela instituição intermediária, se for o caso, em documento fundamentado, nos termos do Anexo I, que conterá as justificativas identificadas pelos requerentes para a concessão da dispensa, aplicandose na análise os prazos previstos nos arts. 8º e 9º.
[9] Art. 8º A CVM terá 20 (vinte) dias úteis, contados do protocolo, para se manifestar sobre o pedido de registro acompanhado de todos os documentos e informações que devem instruílo, que será automaticamente obtido se não houver manifestação da CVM neste prazo.
Art. 9º O prazo previsto no art. 8º poderá ser interrompido uma única vez se a CVM, por ofício encaminhado ao líder da distribuição e com cópia para o ofertante ou, se for o caso, para os fundadores, solicitar documentos, alterações e informações adicionais relativos ao pedido de registro de distribuição e à atualização de informações relativas ao registro de companhia aberta, solicitação esta que será formulada em ato único e conjunto pelas áreas responsáveis da CVM que devam se manifestar na ocasião.
[10] Art. 16. O pedido de registro poderá ser indeferido nas seguintes hipóteses:
I por inviabilidade ou temeridade do empreendimento ou inidoneidade dos fundadores, quando se tratar de constituição de companhia; ou
II quando não forem cumpridas as exigências formuladas pela CVM, nos prazos previstos nesta Instrução.
§1o Preliminarmente ao indeferimento, a CVM enviará ofício à instituição líder, com cópia para o ofertante, concedendolhe a oportunidade de suprir os vícios sanáveis, se houver, no prazo de 10 (dez) dias úteis do recebimento do ofício ou no restante do prazo que faltar para o término do prazo de análise, o que for maior. (grifamos)
[11] Art . 19. Nenhuma emissão pública de valores mobiliários será distribuída no mercado sem prévio registro na Comissão.
(...) § 3º Caracterizam a emissão pública: I a utilização de listas ou boletins de venda ou subscrição, folhetos, prospectos ou anúncios destinados ao público; II a procura de subscritores ou adquirentes para os títulos por meio de empregados, agentes ou corretores; III a negociação feita em loja, escritório ou estabelecimento aberto ao público, ou com a utilização dos serviços públicos de comunicação.
Atenciosamente,
(assinado eletronicamente por) (assinado eletronicamente por) XXXXX XXXXXXXX XXXXXXXX XXXXXXX XXXX XXXXXX X. SONO
Analista da GER-2 Gerente de Registros 2
De acordo, (assinado eletronicamente por)
XXX XXXXX
Superintendente de Registro de Valores Mobiliários
Documento assinado eletronicamente por Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, Analista, em 22/01/2016, às 20:02, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
Documento assinado eletronicamente por Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx, Gerente, em 22/01/2016, às 20:03, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
Documento assinado eletronicamente por Xxx Xxxxx, Superintendente de Registro, em 22/01/2016, às 20:05, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
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