Artigo: Gerenciamento das docagens e reparo - uma visão de negócio
Artigo: Gerenciamento das docagens e reparo - uma visão de negócio
Xxxx Xxxx Xxxxx Xxxxxxx X.Xxxxxxxx, Xxxx Xxxx, MBA
Resumo
A variedade de interesses, complexidade crescente das instalações, quantidade de atividades a serem desenvolvidas durante os períodos de parada das unidades e a pressão comercial para minimizar o tempo fora de contrato, obriga a atividade de reparo naval a se inserir no ambiente do negócio e contemplar, além das demandas técnicas e operacionais, os variados requisitos contratuais e comerciais. O sucesso na realização de reparos programados ou não, nesse contexto mais amplo, vai além do simples atendimento de uma lista de tarefas previamente acordada. O gerenciamento das docagens de forma estruturada passou a ser visto como um diferencial competitivo, e decisivo no desempenho das empresas. As paradas de manutenção apesar de necessárias, representam uma interrupção nas operações e, portanto, devem ser otimizadas. Assim, a implementação de técnicas de gestão nas docagens e reparos se apresenta como opção agregadora de conhecimento assegurando o atendimento das necessidades das partes interessadas na operação da unidade. Este artigo tem como objetivo apresentar a aplicabilidade das práticas de gerenciamento de projetos, na reparação naval em especial nas docagens.
Palavras chave: Reparo naval, docagem, gerenciamento de reparo
Abstract
The variety of interest, increasing complexity of installations, the number of activities to be completed during repair periods and dry-docking, and the pressure to minimize off hire impact on the financial result places an obligation to have a business-oriented approach when organizing repairs. Besides the technical and operational demands, contractual and financial aspects are key factors to complete a successful repair, and demand an understanding beyond the completion of a simple task list. Dry-docking and repair management in a structured way is considered a competitive differential for many companies. Maintenance stops despite considered necessary from the technical point of view, represent an operational stop and a loss of revenue, requiring cost and time optimization. Therefore, the implementation of repair and ship dry-docking management presents the opportunity to aggregate knowledge and ensure that demands from stakeholders are attended. This article has the objective of presenting the applicability of project management common practices to the ship dry-docking and repair activity.
Keywords: ship repair, dry-docking, repair management
1. Contextualização
A reparação naval no Brasil remonta aos tempos coloniais, quando pequenos estaleiros artesanais foram estabelecidos para atender ao transporte de cabotagem de mercadorias e pessoas. Posteriormente, a fundação dos arsenais de marinha propiciou a formação da indústria naval brasileira. Sendo o Arsenal do Pará fundado em 1761, ao sul da cidade de Belém, seguindo-se:
- 1763 fundado o Arsenal do Rio de Janeiro;
- 1770 fundado o Arsenal da Bahia;
- 1789 fundado o Arsenal de Pernambuco;
- 1820 fundado o Arsenal de Santos; e
- 1827 fundado o Arsenal de Mato Grosso, posteriormente transferido para Ladário em 1873.
A atividade de construção de navios de guerra nos arsenais foi o nascedouro da tecnologia de construção naval e a formação de mão de obra especializada, e concentravam a atividade até a vinda da família real e abertura dos portos (1808). A partir daí, as atividades de reparo para atender as necessidades das embarcações comerciais, que tocavam os portos nacionais, experimentaram expressivos aumentos de demanda. A ampliação desse mercado, deu origem a novos estaleiros de reparo e construção.
A indústria naval brasileira viveu ciclos de construção, fortemente influenciados por políticas específicas de fomento, porém, sem um planejamento estratégico global de longo prazo para o setor que garantisse sua sustentabilidade.
Nesse contexto de expansão da frota, as docagens e paradas de manutenção por sua vez, se limitavam a elaboração de uma lista dos serviços necessários para retornar à atividade. Uma vez listados, os serviços eram apresentados aos estaleiros para uma avaliação de disponibilidade e capacidade de execução para a apresentação de uma proposta comercial.
O planejamento, execução, avaliação das interações, sequenciamento e conflitos entre as atividades eram quase sempre uma responsabilidade exclusiva do Superintendente Técnico. O andamento e programação dos serviços era verificado e acordado nas reuniões diárias sem uma previsibilidade confiável. Nesse cenário pode-se imaginar que o Superintendente passava a maior parte do tempo gerindo conflitos e solucionando os problemas trazidos nas reuniões.
O prazo da obra por sua vez, era delimitado pelos reparos nas obras mortas (reparos, soldagem de anodos e pintura), linha de eixo e sistema de governo.
As empresas numa demonstração de maturidade organizacional e pressionadas pelas exigências de mercado, passaram a implementar metodologias de gerenciamento visando não somente a gestão dos serviços em si mas também, o alinhamento com sua estratégia corporativa na busca de minimizar os impactos financeiros decorrentes da imobilidade da unidade e com isso, obter vantagens competitivas em um mercado agressivo e altamente especializado, onde produtividade e otimização fazem a diferença nos resultados. Daí a implementação da gestão de reparos e docagens despertar grande interesse nos profissionais da reparação naval.
2. O gerenciamento de docagens
A gestão de docagens e reparos na área de navegação requer conhecimentos específicos da operação e equipamentos das unidades, muito mais que um departamento de suporte técnico-administrativo, cria e implementa as metodologias de gerenciamento, promovendo uma mudança na forma de gestão da empresa, revisando métodos, documentos e procedimentos.
As docagens, mobilizações, conversões, instalação de equipamentos e/ou sistemas complexos e grandes reparos se identificam com a conceituação de projetos (GUIA PMBOK, 2013). Assim, optamos por usar as metodologias do PMI como guia e referência neste artigo.
As docagens tem um início e fim definidos, sendo conduzidas por um grupo de profissionais que buscam atender requisitos de tempo, custo, prazo, padrões de qualidade, gestão de riscos, de mudanças e ainda envolve uma variedade de interresses internos e externos. Um grande projeto com toda a certeza.
Gerenciamento de docagens
Gerenciar reparos é aplicar conhecimentos, habilidades, ferramentas e técnicas para que ao final os requisitos de todos os interessados sejam atendidos (adaptado do GUIA PMBOK,2013).
A gestão de docagem pode ser entendida nas seguintes fases:
Preparação | Definição do escopo – desenvolvimento das especificações dos serviços, definição da linha de base de custo – preparação da previsão de custos, aprovação do escopo e da linha de base de custo, definição do cronograma e diagrama de atividades (duração e interação). Definição da equipe de docagem (papéis e responsabilidades). Contratação do estaleiro e subcontratadas (cotações). Aquisições de materiais e componentes. Desenvolvimento dos planos de qualidade, segurança e saúde no trabalho (HSEQ) e de proteção e controle de acesso (ISPS). |
Docagem | Execução dos serviços planejados, gerenciamento dos serviços, custo e cronograma, gerenciamento das comunicações, gerenciamento das partes interessadas, gestão de SMS (HSEQ). |
Encerramento | Coletar relatórios finais, registrar históricos e lições aprendidas, preparar um resumo do projeto e assegurar o arquivamento das informações. |
término da docagem anterior
monitoramento e controle
Definição da linha de base
de custos e restrições
especificação
cotação aquisição
contratação
execução
encerramento
Durante operação | Preparação | Docagem | Encerramento |
1,5 anos
1 ano
Fig. 1 : Fases de uma docagem (Guia PMBOK, 2013) adaptado pelo autor.
O gerenciamento de uma docagem requer os seguintes detalhamentos para sua preparação:
- identificação dos requisitos da obra
- adequação das diversas demandas técnico-operacionais
- levantamento das necessidades das partes interessadas não contempladas na lista de serviços
- levantamento das restrições (tempo, técnicas, ambientais, legais, pessoal especializado, material e aquisição, logística, custo)
- escopo da obra
- cronograma
- sequenciamento das tarefas
- padrões de qualidade
- Segurança, saúde e meio ambiente
- avaliação dos riscos
- contingências
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Fig. 2 : Grupos de processo interagindo em uma docagem (GUIA PMBOK, 2013) adaptado pelo autor.
O gerenciamento das docagens como um projeto, aumenta a chance de sucesso e evita surpresas durante a execução da obra, facilita e orienta a gestão de mudança, permite a antecipação de riscos, otimiza a aplicação dos recursos, gera conhecimento e documentação além de agilizar a tomada de decisões (Kerzner 2006). Podemos considerar uma docagem satisfatória se atender os critérios abaixo listados:
- Ser concluída sem acidentes;
- Ser concluída ser danos ao meio ambiente e ao patrimônio;
- A forma de execução dos serviços reafirmar e reforçar os valores da empresa;
- O escopo acordado ter sido completado, aceito e atendendo aos padrões de qualidade aceitáveis;
- Embarcação retornar às operações dentro do prazo acordado e em plena capacidade (sem restrições);
- Custo final do projeto dentro do orçado (incluindo as contingências);;
Grau de Esforço e Recursos necessários para mudanças
- Ausência de disputas com o estaleiro e subcontratadas;
Definição da linha de base
de custos e restrições
Chegada ao estaleiro
saída e testes finais
Preparação | Docagem | Encerramento | |
Iniciação | Organização e Preparação | Execução | Encerramento |
Monitoramento e Controle |
Fig. 3 : Grau de Esforço e Recursos para mudanças no ciclo de uma docagem (GUIA PMBOK, 2013) adaptado pelo autor.
A preparação
Durante a operação da embarcação e com uma antecedência mínima de 12 meses, tem início a preparação da docagem (ou grande reparo/conversão). O Superintendente deve preparar uma estimativa de custos com base em uma lista preliminar de reparos e fazer o provisionamento dos recursos. Para o detalhamento dos serviços devem ser usadas experiências das docagens anteriores, relatórios da Sociedade Classificadora (Condições de Classe e Memos), relatórios de inspeções e informações dos gestores da embarcação (Comandante, Chefe de Máquinas e Offshore Manager). Uma definição importante por parte do Superintendente é a data para o fechamento da lista de serviços e reparos (freezing date) a partir da qual, qualquer inclusão será tratada através de um processo de gestão de mudanças.
Uma contingência deve ser considerada (em torno de +/- 20%) face aos refinamentos que ocorrerão devido ao detalhamento e decomposição do escopo.
A estimativa de prazo e data de realização da docagem deve ser informada para que os demais departamentos possam estar preparados e adequar seus processos.
Em suma, a preparação para a docagem deve contemplar:
- Organograma e matriz de responsabilidades;
- Estimativa preliminar de serviços;
- Estimativa preliminar de custo (CAPEX) - Linha de Base de custos;
- Cronograma (Linha de Base) com principais marcos;
- Plano de Aquisições – listagem dos itens essenciais/críticos e prazos de entrega.
Durante a fase de preparação, reuniões regulares com a equipe de docagem são necessárias visando acompanhar o progresso do planejamento, identificar riscos e propor ações. A periodicidade das reuniões pode ser mensal durante a fase de preparação, mas é recomendável intervalos menores a medida que se aproxima a data de congelamento da lista de serviços e a desmobilização da embarcação para a docagem (reuniões semanais).
Nesta fase o Superintendente deve emitir relatórios de acompanhamento e distribuir para as partes interessadas.
Saúde, Segurança e Meio Ambiente
Uma docagem ou mobilização deve ser executada tendo como meta diuturna a tolerância zero para situações de risco e acidentes além de buscar minimizar os impactos das atividades ao meio ambiente. Toda a equipe de gerenciamento deve, através de suas atitudes, demonstrar total comprometimento com as normas e procedimentos de segurança e de proteção ao meio ambiente. Esse comprometimento deve ser expressado no planejamento dos serviços e nas atitudes e comportamento.
Os subcontratados devem demonstrar sua adequação através de evidências de treinamentos e passar por uma indução com foco nos aspectos da embarcação, das instalações do estaleiro de reparo e procedimentos a serem adotados nas situações de emergência.
As docagens apresentam diversas situações de risco e, portanto, requerem uma abordagem firme e conjunta (estaleiro, contratadas e contratante), como exemplo podemos citar:
- Frentes de trabalho variadas e simultâneas;
- Trabalhos a quente;
- Trabalhos em espaços confinados;
- Trabalhos em altura;
- Operações de içamento de cargas;
- Trabalhos em eletricidade;
- Trabalhos em sistemas hidráulicos;
- Tarefas não rotineiras;
- Aumento de pessoal a bordo (prestadores de serviço, inspetores, subcontratadas;
- Barulho, fumaça, vapores e poeira;
- Barreiras culturais e de linguagem.
O planejamento deve contemplar a adequação dos sistemas de gerenciamento com uma atenção especial ao sistema de permissão de trabalho e isolamentos. Um responsável a nível de coordenação de SMS deve ser nomeado com a responsabilidade de no mínimo:
- Assegurar a compatibilidade entre os sistemas de gestão de SMS;
- Supervisionar o sistema de permissão de trabalho;
- Coordenar as ações de SMS;
- Coletar dados para as estatísticas de SMS;
- Supervisionar a elaboração das Análises Preliminares de Risco;
- Preparar o Plano de Resposta a Emergências;
- Preparar a lista de contatos de emergência e assegurar sua distribuição;
- Suportar o time de docagem durante a obra.
Proteção
Em conformidade com o ISPS Code as docagens devem ser conduzidas seguindo o Plano de Gerenciamento de Segurança da embarcação e as diretrizes da Pessoa Designada – da empresa e do estaleiro. O SSO deve acordar a forma de tratar potenciais situações de risco durante o período de docagem.
Documentação
Um método ou sistema de controle de documentos deve ser acordado tendo em vista a quantidade e diversidade de relatórios, certificados, notas fiscais entre outros, que serão gerados durante a docagem. O uso de plataformas de compartilhamento (“Share Points”) tem se mostrado eficiente e contribuído para garantir a comunicação e acesso a procedimentos, formulários e outros documentos. A hierarquia de acesso deve ser estabelecida pelo Superintendente e o encarregado da docagem (se nomeado). Um profissional deve ser nomeado para gerenciar a coleta, armazenamento e distribuição de documentos.
Especificação Técnica
Aqui se define qual o trabalho a ser realizado durante a docagem e a forma como será feito determina o sucesso da obra. Uma especificação bem elaborada, com a identificação e decomposição de cada serviço, permite ao Superintendente rever o escopo da obra, prever conflitos de atividades e produzir estimativas confiáveis de recursos (tempo e custo) minimizando custos de gestão de mudanças e impactos no cronograma.
Os serviços devem ser identificados usando uma metodologia, a mais usual é o SFI code.
A especificação técnica é a base para a precificação dos serviços e deve ser incluída no contrato entre o estaleiro e o armador. Para cada trabalho deve ser claramente indicada a tarefa de cada envolvido, bem
como o detalhamento técnico e lista de materiais e recursos necessários (material e pessoal). O uso de desenhos, fotos, informações de serviços anteriores e relatórios ajudam a definir a especificação dos serviços. Também deve constar da especificação técnica:
- Requisitos de SMS;
- Permissões;
- Critérios de qualidade;
- Nível de limpeza e proteção;
- Ventilação e iluminação;
- Acesso e andaimes;
- Medição de atmosfera e testes;
- Material, sobressalentes e suprimentos;
- Transporte, movimentação e logística;
- Cálculo e montagem de pontos de ancoragem e içamento;
- Aprovação por parte da Sociedade Classificadora;
- Suporte de especialistas, inspetores e ensaios;
- Alterações de desenhos e planos;
- Outras informações que auxiliem a execução e detalhamento.
A especificação detalhada dos serviços é um esforço compartilhado entre o Comandante, o Chefe de Máquinas, o Gerente Offshore (OIM) e o Superintendente. O Superintendente tem a responsabilidade pela elaboração da especificação técnica da docagem.
A especificação é iniciada pela gerência da embarcação envolvendo os departamentos, com o auxílio e suporte da equipe de docagem, garantindo que todos os aspectos foram contemplados incluindo lições aprendidas em serviços anteriores. Na especificação deve constar o responsável pela aceitação do serviço. O Superintendente deve estabelecer uma data para a entrega das especificações aos estaleiros e subcontratadas – data de corte das especificações “frozen date”. Antes dessa data deve ser agendada uma reunião com a gerência de bordo para rever a especificação técnica da obra. Qualquer inclusão após o envio da especificação deverá ser tratada como uma mudança.
Estimativa de Custo
A estimativa de custos deve conter a cotação do estaleiro e subcontratadas, aquisição de sobressalentes, materiais e equipamentos, custos de gerenciamento e supervisão (custeio, passagens, hospedagem), custos com pessoal adicional de apoio, custos de Classificação, inspeções ensaios, custos de terceirizados e uma reserva de contingência. Dependendo do tipo de contrato o custo de combustível, lubrificantes e fornecimento de energia durante a docagem deve ser incluído.
A responsabilidade pelas estimativas de custo é do Superintendente que deve ter o apoio do departamento financeiro para a elaborar a linha de base de custo da docagem.
Reservas de contingência e provisões podem ser feitas para cobrir incertezas de cada serviço e são gerenciadas pelo Superintendente. A reserva gerencial por sua vez, deve estar em conformidade com o risco da docagem e tal como em um projeto, não é gerenciada pelo Superintendente.
Cronograma
Planejar o cronograma da docagem incluindo todos os serviços detalhados no escopo de trabalho é uma tarefa complexa. O impacto dos prazos de entrega de equipamentos e materiais bem como a interação com o planejamento do estaleiro e contratadas, impõe desafios de integração a serem superados pelo
Superintendente e sua equipe. O sequenciamento das atividades e conflitos permite a identificação do caminho crítico e as necessidades de medidas adicionais de segurança, implementação de treinamentos e apresentações de SMS.
O armador geralmente estabelece sua estimativa para a duração da docagem e a revisa após receber a proposta do estaleiro e contratadas. O cronograma final vai ser o resultado da iteração, adequação e negociação entre as partes e deve incluir o diagrama de marcos e o caminho crítico da docagem.
O cronograma final deve contemplar a realização de testes e provas de mar após a conclusão dos serviços no estaleiro e verificações.
O Superintendente deve divulgar o cronograma e a estimativa de duração da docagem para atualização do planejamento da utilização da embarcação – retorno ao contrato.
Gerenciamento da Qualidade
O planejamento da gestão da qualidade deve ser aprovado pelo Superintendente ou coordenador do reparo (se nomeado), devendo incluir as atividades a serem desenvolvidas pelos coordenadores e inspetores de qualidade no controle de serviços a serem realizados fora do estaleiro e a forma de elaboração e arquivamento de relatórios e registros.
Contratação do estaleiro e terceirizadas
A contratação deve ser conduzida pelo setor de contratos, devendo o Superintendente apontar os estaleiros a serem contatados, com base na proximidade com a área de operação da embarcação uma vez que o deslocamento da unidade para outra localidade ou país pode ser uma restrição. Nessa fase os estaleiros são formalmente convidados a participar da cotação e manifestar seu interesse e disponibilidade. Os estaleiros contatados devem receber informações básicas das datas estimadas para a realização da docagem e as características da embarcação, premissas e restrições iniciais. As informações detalhadas e especificações técnicas dos serviços serão passadas em uma fase posterior.
Durante o processo de contratação, as questões de natureza técnica devem ser conduzidas pelo Superintendente e compartilhadas com os estaleiros e empresas participantes da tomada de preço.
Visitas técnicas podem ser necessárias para definição dos serviços e devem ser organizadas dentro das possibilidades operacionais e conduzidas pelo Superintendente.
A avaliação e comparação das propostas comerciais deve ser feita com a participação do Superintendente, Departamento de Contratação e do Departamento Financeiro para estabelecer as condições e termos da contratação e desembolso de recursos financeiros. Devem atender no mínimo aos seguintes critérios:
- Localização geográfica do estaleiro;
- Necessidade de deslocamento da embarcação (singradura, condições de clima);
- Controle de acesso – procedimentos e sistemas de credenciamento;
- Sistema de Gestão de SMS;
- Registros de SMS;
- Plano de Emergência;
- Instalações e facilidades
. Dimensão e tipo de dique.
. Disponibilidade de guindastes e capacidades;
. Disponibilidade de energia, ar comprimido, remoção de resíduos e efluentes;
. Cais de acabamento – calado e extensão
. Área de armazenagem
. Permissão para contratação de terceirizados
- Horário de trabalho durante a docagem;
- Estimativa de custo:
. Preço fixo para serviços com base em tempo e material
. Preço fixo para serviços com base em valor por área, por unidade ou volume (ex. Pintura por m2, limpeza de tanque por m3, montagem de aço por Kg).
Anteriormente à contratação do estaleiro e contratadas uma reunião deve ser agendada para assegurar que os critérios e restrições foram entendidos e acordar as exclusões, confirmar o atendimento ao sistema de Gestão de SMS e de Garantia da Qualidade. Deve-se negociar e acordar o valor do contrato e registrar os entendimentos em uma ata de reunião.
Uma vez acertados os detalhes e estabelecido um entendimento entre as partes o contrato deve ser encaminhado para aprovação pelo armador face aos valores envolvidos. Pode ser necessário a emissão de uma carta de intenção para garantir a vaga no estaleiro.
O departamento de seguros deve ser avisado dos detalhes da docagem pretendida para que faça as inclusões que achar necessárias no contrato.
Uma vez contratado o estaleiro, uma reunião inicial deve ser programada antes da entrada da embarcação.
Contratação de terceirizados
Grande parte do escopo da docagem é realizado por empresas terceirizadas, contratadas diretamente pelo armador para serviços de propulsão, guindastes, guinchos, sistemas hidráulicos, sistemas elétricos, motores, sistemas de posicionamento e automação entre muitos.
Alguns serviços são contemplados pelo contrato com o estaleiro. No entanto em muitos casos a contratação é feita pelo armador e deve-se ter o cuidado de avaliar os conflitos com outros serviços acordados com o estaleiro. Exemplo:
O estaleiro conduz serviços de jateamento e pintura na região onde uma contratada precisa fazer
uma abertura (“cesariana”) para retirada de um equipamento.
Tais conflitos precisam ser previstos pela equipe de docagem e indicados no sequenciamento das atividades.
Outro aspecto importante é a responsabilidade pela movimentação de equipamentos – estaleiro ou contratada? Além da questão da execução da manobra existe a responsabilidade em caso de danos e avarias em equipamentos críticos que podem resultar no total fracasso do projeto de docagem. O Superintendente deve identificar essas atividades e deixar clara as responsabilidades dos envolvidos além de ter um plano para o tratamento dos riscos.
O trabalho em motores, guindastes, tensionadores, guinchos, controles e sistemas elétricos é normalmente feito pelo fabricante ou seu representante, atendendo a critérios, procedimentos e práticas para inspeção, reparo, desmontagem, comissionamento e teste com o devido acompanhamento do representante do armador.
As contratadas devem fornecer um plano com as estimativas de entrega de materiais e duração dos serviços que irão realizar para revisão do cronograma da docagem.
Devem ser nomeados as pessoas autorizadas a assinar os controles de horas trabalhas e satisfeitos de serviços que servirão de evidência e suporte para o processamento das faturas.
A necessidade de vistos para estrangeiros deve ser prevista e providenciada com a devida antecedência.
Verificações pré-docagem
O período que antecede a chegada ao estaleiro ou a desmobilização da embarcação e sua entrega à equipe de docagem, tem um nível de atividades muito intenso. O Superintendente deve assegurar junto ao RH, que os recursos de pessoal estarão disponíveis nas datas acordadas além de outras verificações técnicas.
A entrada no dique e o encalhe da embarcação no picadeiro requer atenção especial e o estaleiro deve receber um plano de docagem atualizado juntamente com a condição de lastro e estabilidade. O arranjo de picadeiros deve ser revisado e aprovado pelo Superintendente que pode requisitar apoio especializado para avaliar os esforços e riscos estruturais, caso a condição de docagem apresente variações ou condições excepcionais – caso de avarias estruturais ou danos ao chapeamento.
O estaleiro deve ser informado de danos que possam resultar em derramamento de óleo no dique para que tome as providências necessárias à contenção.
O comandante da embarcação deve receber as informações e detalhes da manobra de entrada e encalhe no picadeiro para sua avaliação e preparação para a docagem.
A equipe do estaleiro deverá se reunir a bordo com o Superintendente, Comandante, Chefe de Máquinas, Gerente Offshore e coordenador de SMS para esclarecer regras de segurança e acertar detalhes de comunicação e se preciso organizar o serviço de praticagem, rebocadores, lancha de apoio, conexão de energia, água doce, rede de ar comprimido e rede de incêndio.
A seguradora deve ser mantida informada caso algum reparo envolva questões de seguro.
A Sociedade Classificadora deve ser mantida informada sobre o andamento das manobras e serviços.
O armador deve também manter as empresas terceirizadas a par do andamento da docagem e das formalidades a serem cumpridas para ter acesso à embarcação enquanto docada.
Nesse período também é acordado o procedimento para envio, recebimento, estocagem e transporte de material devendo ser nomeado um almoxarife para coordenar essas atividades.
O Superintendente deve assegurar que a matriz de responsabilidades, o organograma da equipe de docagem o Plano de Contatos de Emergência estejam disponíveis e que não existam dúvidas com relação a esse aspecto tanto por parte do estaleiro e terceirizadas, quanto por parte da equipe e da gerência da embarcação.
A preparação de uma docagem ou grande reparo requer um elevado grau de detalhamento para a segurança da execução dentro do custo, prazo e qualidade desejados. O esforço empreendido nessa fase para refinar as especificações técnicas, desdobrar os pacotes de trabalho e planejar a execução, monitoramento e controle será recompensado com o sucesso do projeto e entrega final.
A Docagem
Esse é o momento esperado. A embarcação chega ao estaleiro e o planejamento entra propriamente na fase de execução dos trabalhos dentro do custo e prazo acordados e ainda, atendendo o grau de qualidade esperado sem acidentes ou danos ao meio ambiente. Essa é meta.
Chegada no estaleiro e docagem
Antes de autorizar a entrada no dique, o Superintendente deve assegurar que o arranjo de picadeiro foi organizado conforme o plano de docagem aprovado.
O contrato de docagem deve definir o ponto a partir do qual a embarcação é transferida para a custódia e cuidados do estaleiro, com a assinatura de um termo de transferência. Muitas docagens são realizadas sem essa formalidade, permanecendo o armador responsável pela embarcação e o estaleiro apenas cede
as instalações para a realização dos serviços. Muitas variações e modalidades de contrato podem ser aplicadas e o Superintendente deve estar a par dos detalhes contratuais e das responsabilidades de cada envolvido.
A partir da entrada no estaleiro, o sistema de Permissão de Trabalho acordado entra em vigor e a coordenação de SMS passa a supervisionar as atividades.
Reunião inicial
Na chegada uma reunião inicial deve ser arranjada envolvendo a equipe do estaleiro, o Superintendente, a gerência da embarcação (Comandante, Chefe de Máquinas e Gerente Offshore), coordenação de SMS, representante das terceirizadas e o Oficial de Segurança da embarcação para esclarecer o organograma, responsabilidades e autoridade, linha de comunicação e pontos de contato, regras de segurança, sistema de permissão de trabalho, resposta a emergências e acordar os horários das reuniões diárias de acompanhamento.
O Superintendente deve deixar claro a todos os envolvidos nessa reunião, que a segurança das atividades é inegociável. Deve identificar as autoridades técnicas na embarcação, responsáveis pela avaliação dos serviços e sua liberação com o apoio da equipe de SMS.
A equipe de SMS deve entregar as induções de segurança (vídeo ou panfleto) bem como o formulário de registro de indução e familiarização, obrigatória para ter acesso a embarcação durante a docagem.
3. Como implementar nas empresas
Os escritórios de projeto ganharam maior espaço nas organizações a partir do ano 2000 conforme Xxxxxxx (2003, p.123, apud Barcaui, 2012 p.13) porém na industria naval somente recentemente se notou uma mudança de abordagem. Gerenciar docagens e reparos navais aplicando as práticas de gerenciamento de escritórios de projeto deve levar em conta a estrutura e maturidade das organizações de acordo com Barcaui (2012). Proporciona benefícios intangíveis como resultado do gradual ganho de maturidade e assimilação das experiências se inserindo a gestão da frota e no contexto estratégico global da organização.
4. Casos de sucesso
Na busca de justificativas que sustentassem a proposta de mudança de paradigma na abordagem da gestão das docagens foi empreendida nas empresas operadoras uma pesquisa de abordagem quantitativa e qualitativa, de caráter exploratório, realizada através de procedimentos técnicos de levantamento através de questionário aberto, pesquisa bibliográfica e documental.
O questionário foi apresentado aos gestores de frota das principais empresas de navegação através de mensagem eletrônica e ainda, através de site de relacionamento profissional (LinkedIn) a comunidades e grupos de profissionais com interesse no assunto, cujo perfil é representado na figura 4 abaixo:
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Fig. 4 : Perfil dos entrevistados no levantamento qualitativo, elaborado pelo autor.
A representatividade da pesquisa qualitativa se faz importante por representar uma frota em torno de 300 navios sob a gestão de empresas líderes do setor. A quantificação de dados a partir do questionário ficou comprometida face à confidencialidade dos dados. Como alternativa foi realizado um levantamento das docagens no período compreendido entre 2006 e 2016.
O levantamento dos dados referentes a docagens no período entre 2006 e 2016 e a indicação do tempo planejado contra o tempo de realização das docagens foi realizado em uma frota da indústria de óleo e gás. Os resultados apresentados no quadro a seguir:
Dry dock | Year | Planned duration | Actual duration | Variance |
1 | 2010 | 75 | 64 | 85% |
2 | 2011 | 32 | 34 | 106% |
3 | 2012 | 60 | 69 | 115% |
4 | 2012 | 30 | 31 | 103% |
5 | 2013 | 90 | 94 | 104% |
6 | 2013 | 60 | 86 | 143% |
7 | 2014 | 60 | 111 | 185% |
8 | 2015 | 85 | 85 | 100% |
9 | 2015 | 30 | 24 | 80% |
10 | 2015 | 52 | 32 | 62% |
11 | 2015 | 45 | 38 | 84% |
12 | 2016 | 60 | 44 | 73% |
Fig. 5: Pesquisa de dados de docagens – quantitativo, elaborado pelo autor.
O tempo de realização contra o planejado é representado abaixo para fins de comparação.
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Fig. 6 : Duração das docagens em dias em ordem cronológica de eventos - adaptado pelo autor.
Os dados na forma apresentada, não evidenciam com a clareza necessária, a importância do planejamento e seu impacto. Os dados foram analisados e comparados. A variação entre o planejado e o realizado é colocada em ordem cronológica de eventos, para melhor visualização, a partir da introdução da metodologia de gerenciamento (linha tracejada vertical).
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Fig.7 : Estudo da variação entre o prazo planejado e o realizado das docagens em ordem cronológica - adaptado pelo autor.
5. Conclusão
A partir do levantamento teórico, dos achados das pesquisas qualitativas e das evidências apresentadas através da pesquisa quantitativa, pode-se concluir que a adoção do modelo de gerenciamento de docagens e reparos navais aplicando as boas práticas apresentadas pelo Project Management Institute (PMI) representa uma opção viável. A introdução do gerenciamento de docagens e mobilizações deve se adequar às variadas estruturas organizacionais e considerar sua maturidade. Os ganhos de padronização, qualidade, melhoria de indicadores de segurança e a consolidação do histórico e experiências são benefícios adicionais aos ganhos financeiros decorrentes do planejamento cuidadoso.
A relutância na adoção de modelos de gerenciamento estruturados por algumas organizações não se justifica por entenderem não ser aplicável a pequenas unidades e frotas, porém, uma análise apurada indica que o planejamento resulta em ganhos tangíveis e intangíveis independente da escala.
Podemos concluir que a proposta de introdução da gestão de docagens utilizando as boas práticas de gerenciamento de projeto, para suportar as decisões, planejar e monitorar docagens e reparos tem sua aplicabilidade confirmada pelo compromisso com objetivos e resultados, em linha com o planejamento macro das organizações.
6. Referências Bibliográficas
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