OS PODERES DO EMPREGADOR NA RELAÇÃO JURÍDICO- LABORAL: EM ESPECIAL O PODER DISCIPLINAR1
OS PODERES DO EMPREGADOR NA RELAÇÃO JURÍDICO- LABORAL: EM ESPECIAL O PODER DISCIPLINAR1
Xxxxxxxxx Xxxxxx TÉBUCA2*
*Jurista e Docente da Faculdade de Direito da Universidade 11 de Novembro
RESUMO
O presente trabalho versa sobre os poderes do empregador na relação jurídico-laboral- em especial o poder disciplinar consubstanciado num contrato de trabalho na actual Lei Geral do Trabalho (LGT), o estatuto do empregador pode sinteticamente definir-se como uma posição de poder ou de autoridade que é, afinal, o reverso da subordinação em que o trabalhador se coloca pelo contrato. É no seio do contrato de trabalho que os poderes do empregador, em especial o seu poder disciplinar, se manifestam. Na actual LGT são identificados autonomamente como poderes do empregador, os poderes de direcção, o poder disciplinar e o poder regulamentar. O recurso ao poder disciplinar aparece, por um lado, como o meio principal e típico do empregador reagir e combater o incumprimento dos deveres que incidem sobre o trabalhador, e que se afasta do regime regra dos contratos ‐ a responsabilidade civil, cuja natureza é essencialmente compensatória; por outro lado, permite ao empregador marcar a sua posição na relação laboral e assegurar a aplicabilidade do seu poder de direcção. O exercício do poder disciplinar pelo empregador materializa-se na possibilidade que o empregador dispõe de aplicar ao trabalhador as sanções previstas no n.º 1 do artigo 46.º da GT. Palavras-chave: Poder Disciplinar; Empregador, Trabalhador, Sanções Disciplinares.
1 Artigo JuLaw n.º 26/2022, publicado em xxxxx://xxxxx.xx.xx/xx-xxxxxxx-xx-xxxxxxxxxx-xx-xxxxxxx-xxxxxxxx- laboral/ , aos 28 de Março de 2022. O conteúdo deste artigo é de exclusiva e inteira responsabilidade do autor, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista da JuLaw. É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas.
2 Conta JuLaw: xxxxx://xxxxx.xx.xx/xxxx/xxxxxxxxxxxxxxx/
591
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
THE EMPLOYER'S POWERS IN THE LEGAL-LABOR RELATIONSHIP: IN PARTICULAR THE DISCIPLINARY POWER
ABSTRACT
The present work deals with the employer's powers in the legal-labor relationship - in particular the disciplinary power embodied in an employment contract in the current General Labor Law (LGT), the employer's statute can be synthetically defined as a position of power or authority which is, after all, the reverse of the subordination in which the worker places himself by the contract. It is within the employment contract that the employer's powers, in particular its disciplinary power, are manifested. In the current LGT are identified autonomously as powers of the employer, the powers of direction, the disciplinary power and the regulatory power. The recourse to disciplinary power appears, on the one hand, as the main and typical means of the employer to react and combat the breach of duties that affect the worker, and which departs from the rule regime of contracts - civil liability, whose nature is essentially compensatory; on the other hand, it allows the employer to mark its position in the employment relationship and ensure the applicability of its management power. The exercise of disciplinary power by the employer is materialized in the possibility that the employer has to apply the sanctions provided for in paragraph 1 of article 46 of the General Labor Law to the worker.
Keywords: Disciplinary Power; Employer, Worker, Disciplinary Sanctions.
592
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
Introdução
Constitui nosso desafio, apresentar de modo interactivo, uma ementa na abordagem sobre os poderes do empregador na relação jurídico-laboral: em especial o poder disciplinar.
Tal resulta que do exercício deste poder punitivo nas situações mais graves permite ao empregador fazer cessar o contrato de trabalho.
A par desta vertente sancionatória, o poder disciplinar também se apresenta com uma finalidade ordenadora das relações laborais, funcionando igualmente com um cunho preventivo de futuras infracções pelos demais trabalhadores dentro da mesma organização.
A escolha do tema nasce do facto de o poder disciplinar do empregador ser um dos mais relevantes e complexos poderes que o legislador atribuiu ao empregador no âmbito de um contrato de trabalho. Trata‐se sem dúvida de um dos traços marcantes do exercício do poder de autoridade e direcção do empregador que lhe permite não só organizar a sua empresa como, especialmente, punir ou sancionar o trabalhador em face de violações contratuais dos seus deveres e obrigações.
1. Os Poderes do Empregador na Relação Jurídico-laboral
É sobejamente sabido que a designação de empregador é actualmente usada pelo legislador para indicar a posição contratual daquela ou daquelas pessoas que recebem a prestação de trabalho e estão obrigados a pagar a retribuição ao trabalhador(3). É Empregador de acordo o n.º 13 do art.º 3.º da Lei Geral do Trabalho (doravante LGT), toda pessoa singular, colectiva, de direito público ou privado, que organiza, dirige e recebe o trabalho de um ou mais trabalhadores.
(3) XXXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito do Trabalho, 13.º Edição, Almedina, pág. 247.
593
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
O Estatuto do empregador pode segundo XXXXXXXX XXXXXXXXX sinteticamente definir-se como uma posição de autoridade que é, afinal, o reverso da subordinação em que o trabalhador se coloca pelo contrato.
É no seio do contrato de trabalho que os poderes do empregador, em especial o seu poder disciplinar, se manifestam.
Teremos, assim, de nos referir à noção de contrato de trabalho para podermos alcançar com clareza o âmbito de aplicação, conteúdo e função do poder disciplinar neste domínio e, ao mesmo tempo, apreender alguns dos principais problemas que comporta a sua execução(4).
Encontramos uma primeira definição de contrato de trabalho no art.º 1152.º do Código Civil, correspondente à noção tradicional de contrato de trabalho.
Ora, haverá contrato de trabalho nos termos do nº3 do art.º 3º da LGT sempre que uma pessoa física se obrigar a colocar a sua actividade profissional à disposição de um empregador(5), dentro do âmbito da organização e sob a direcção e autoridadedeste, tendo como contrapartida uma remuneração.
Trata-se aqui de uma posição de supremacia na nossa visão tal como na de MENEZES LEITÃO(6), que se caracteriza na atribuição de poderes que este exercer em relação ao trabalhador.
A entidade empregadora usufrui de três poderes essenciais, que lhe advêm da sua posição enquanto entidade que contrata o trabalhador nomeadamente: Poder de Direcção, Regulamentar e Disciplinar.
a) Poderes de Direcção
(4) XXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, O poder disciplinar do empregador Em especial o seu exercício com vista ao despedimento do trabalhador, in Trabalho realizado no âmbito de provas públicas Título de Especialista Ramo de conhecimento em Direito, 2014. p. 12.
(5) Utilizando a definição de Xxxxxx Xxxxxx, o contrato será o acordo por que duas ou mais partes ajustam reciprocamente os seus interesses, dando-lhes uma regulamentação que a lei traduz em termos de efeitos jurídicos. TELLES, Xxxxxxxxx Xxxxxx, Direito das Obrigações, 6.ª ed., revista e actualizada, Xxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxx, 0000, pág. 55.
(6) XXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx, Direito do Trabalho de Angola, 2.º Edição, Almedina, 2013, pág. 225.
594
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
O poder de direcção assenta no contrato de trabalho e na subordinação jurídica, que se impõe ao trabalhador como correlativo do dever de obediência que é intrínseco ao próprio contrato. E vem logo referido na alínea a) do art.º 36.º da LGT, onde se mencionam as faculdades de o empregador dirigir a actividade da empresa, organizar o trabalho e definir e atribuir as tarefas aos trabalhadores. Poder este exercido através de emissão de ordens e instruções do empregador, que concretizam o genérico dever de trabalho contratualmente estipulado, dando origem para o trabalhador a deveres específicos de realizar certas tarefas(7).
b) Poder Regulamentar
O Legislador na LGT atribui ao empregador determinados poderes, dada a sua posição na relação jurídico-laboral. O poder regulamentar caracteriza-se por comandos genéricos aplicáveis a todos os trabalhadores ou apenas a um grupo deles.
Sobre o empregador também recai o poder de elaborar o Regulamento Interno da empresa que todos os trabalhadores devem respeitar. Mas é claro que tais regulamentos internos nunca poderão ir contra os direitos de personalidade dos trabalhadores, nem contra os direitos dos mesmos enquanto trabalhadores. Este poder encontra respaldo legal na alínea f) do n.º 1 do art.º 36.º da LGT.
c) Poder Disciplinar
Por último, o mais importante para a nossa análise, o poder disciplinar, este subsistirá, enquanto existir um vínculo entre o trabalhador e o empregador, ou seja, enquanto ambos estiverem ligados por um contrato de trabalho.
O Poder disciplinar corresponde à faculdade de o empregador aplicar internamente sanções ao trabalhador que se encontre ao seu serviço por via de um contrato de trabalho, quando a sua conduta se conflitue com os padrões de comportamento definido na empresa ou se mostre
(7) XXXXXXX, Xxxxx Xx Xxxxxxx Xxxxx entende que o dever de obediência do trabalhador é especialmente vigoroso, tanto pela sua extensão, como pela sua intensidade. Em termos extensivos, este dever envolve o cumprimento das ordens e instruções do empregador-em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho, in Direito do Trabalho, parte II – Situações Laborais Individuais, pág. 350.
595
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
inadequada à correcta efectivação do contrato. Conforme o n.º 1 do art.º 46.º da LGT, o poder disciplinar constitui um corolário do poder de direcção, atribuindo - lhe a característica da coercibilidade, que é exercida pelo empregador.
1.1. Características do Poder Disciplinar
A partir da configuração do poder disciplinar na lei, conforme o disposto no art.º 46.º da LGT e da própria natureza da relação de trabalho, podemos enunciar quatro (4) características mais significativas a saber: (i) A sua qualificação como direito subjectivo; (ii) O seu conteúdo unilateral; (iii) A sua essência punitiva; (iv) A sua natureza jurídica privada.
O poder disciplinar se reconduz a um direito subjectivo do empregador, apesar de a lei o enunciar como um poder, tal como acontece no art.º 46.º da LGT Assim, destaca MOÍSES CAPEÇA que deverá ser reconduzida à categoria de direito potestativo, pois se reconduz a uma alteração na esfera jurídica do trabalhador(8), que se encontra na correspondente posição jurídica de sujeição.
É essencialmente unilateral, por manifestar a oposição de domínio do empregador no contrato e na relação de trabalho, tendo o mesmo um conteúdo social e jurídico.
O poder disciplinar é na sua essência punitiva e não poder com objectivos ressarcitórios ou compensatórios, na medida em que a acção disciplinar tem necessariamente na sua origem uma infracção disciplinar, que é sempre um comportamento culposo do trabalhador, violador de um dever legal, contratual ou convencionalmente estabelecido, como decorre do art.º 206.º da LGT.
Finalmente, é de destacar a natureza privada do poder disciplinar. Ele é um poder que se insere numa relação de direito privado.
(8) XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx, ob.., cit.., p. 78.
596
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
1.2. O Fundamento e titularidade do poder disciplinar
Trata‐se de um poder com atributos predominantemente punitivos, exercido unilateralmente e de forma algo discricionária pelo empregador, em especial quanto à oportunidade de o exercer e à escolha da sanção a aplicar. Na esteira de PALMA RAMALHO, Caracteriza ‐ se ainda por ser um direito subjectivo do empregador, que se reconduz às características de um direito potestativo, porquanto traduz não só a posição de sujeição em que o trabalhador se encontra face ao seu exercício, como provoca alterações de relevo na esfera jurídica do trabalhador, designadamente no que ao despedimento respeita(9).
Sobre o fundamento deste poder é possível encontrar duas respostas diferentes, na doutrina nomeadamente a tese contratualista e a tese institucionalista, que o concebem e perspectivam de diversos pontos de vista, que a nosso ver se complementam entre si.
Segundo a tese contratualista o poder disciplinar assenta na existência do contrato de trabalho e tem como fundamento a subordinação jurídica do trabalhador. De acordo com este entendimento, o empregador mantém o poder ou a faculdade de exercê-lo enquanto o contrato durar, conforme previsto expressamente no art.º 36º da LGT. Para justificar a sua ligação intrínseca e natural ao contrato de trabalho.
Já quanto à tese institucionalista, XXXXXX XXXXXXXX defende que o poder disciplinar é concebido no seio de uma organização, destinando-se a garantir a satisfação e os interesses económicos daquela, da qual os contratos de trabalho fazem parte(10). Invocam ainda que o facto de este poder ser exercido pelo empregador ou pelos superiores hierárquicos do trabalhador conforme o n.º 2 do art.º 46.º da LGT.
Em suma somos de opinião de que o poder disciplinar do empregador, nasce pelo facto de existir um contrato de trabalhado que liga o empregador ao trabalhador, como também só tem razão de ser se for concebido dentro de uma organização empresarial.
(9) XXXXXXX, Xxxxx Xx Xxxxxxx Xxxxx, Os Limites do Poder Disciplinar Laboral, in Estudos de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 200.
(10) XXXXXXXX, Xxxxxx, Direito do Trabalho, cit., p. 604.
597
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
2. Princípios orientadores para a determinação das sanções disciplinares Um dos aspectos mais delicados da utilização do poder punitivo do empregador no nosso entender, consiste na escolha da sanção a aplicar em face da infracção disciplinar do trabalhador. O poder disciplinar, cujos contornos de discricionariedade são evidentes, está
sujeito aos seguintes princípios:
O Princípio da Proporcionalidade: o princípio da proporcionalidade consagrado no n.º 1 do art.º 51.º da LGT impõe que o empregador escolha a sanção adequada à gravidade da infracção e à culpa do trabalhador infractor. Por aplicação do aludido princípio deve a sanção ser menos graves quanto mais reduzidas for à gravidade e a culpa do infractor.
O Princípio da Unicidade: este princípio condiciona a acção do empregador em matéria de escolha da sanção a aplicar ao trabalhador e está plasmado na 2.ª parte do n.º 1 do art.º 61.º da Lei Geral do Trabalho e prevê que o empregador não possa aplicar mais do que uma sanção disciplinar pela mesma infracção.
3. Tipologias de medidas disciplinares
No actual quadro legal em matéria de medidas disciplinares encontramos profundas alterações introduzidas pelo legislador. Dispõe o n.º 1º do art.º 47.º da actual LGT o seguinte: Pelas infracções disciplinares praticados pelos trabalhadores, pode o empregador aplicar as seguintes medidas disciplinares; (i) Admoestação verbal; (ii) Admoestação registada; (iii) Redução temporária do salário; (iv) Despedimento disciplinar.
a) Admoestação verbal
A sanção de admoestação é a mais leve das sanções previstas na LGT. Esta sanção consiste segundo XXX XXXXXX na chamada de atenção(11) ao trabalhador relativamente a um
(11) Consiste em o empregador, advertir o trabalhador, de forma explícita, de que o seu comportamento representa uma violação de um dever ao qual está contratualmente obrigado, sendo avisado, de que não deverá repetir tal comportamento, sob pena de vir a ter outras sanções. Ela é utilizada para infracções leves, uma vez que só é realizada
598
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
comportamento por si adoptado e que merece a censura imediata do empregador, esgotando ‐ se na advertência que o empregador dirige verbalmente ao seu trabalhador, no sentido de que futuramente não deverá adoptar o mesmo tipo de comportamento (12).
b) Admoestação registada
Do ponto de vista do conteúdo, esta sanção é equivalente à admoestação verbal que antes analisamos, mas difere daquela relativamente às consequências ou efeitos. Tratando ‐ se igualmente de uma advertência ou censura do empregador relativamente à acção do trabalhador, à qual o trabalhador há-de poder defender ‐ se, a sua aplicação ficará registada no registo de sanções disciplinares da organização.
c) Redução temporária do salário
Trata-se de uma medida inovadora, porquanto na anterior LGT ela não estava prevista. A aplicação desta sanção consiste no não pagamento ao trabalhador da totalidade da sua retribuição. Apesar de a sanção consistir no não pagamento ao trabalhador de parte da sua retribuição, esse valor não reverte para o empregador, mas deverá ser descontado para o INSS, funcionando como um crédito para o trabalhador infractor, o que nos parece ser contraproducente.
d) Despedimento Disciplinar
O despedimento sem direito a qualquer indemnização ou compensação é a mais grave das sanções disciplinares, tratando ‐ se da única sanção não conservatória e, de resto, a mais grave de todas as que o empregador pode aplicar ao trabalhador.
verbalmente, não traz maiores consequências. XXXXXX, Xxx xx Xxxxx Xxxx, A admissibilidade do despedimento com justa causa devido ao publicado nas redes sociais in Dissertação de Mestrado em Comunicação, Media e Justiça Março de 2014, pág. 37.
(12) Na verdade consiste em o empregador fazer notar ao trabalhador, por forma explícita, de que um seu comportamento concreto representa a violação de um dever a que contratualmente se terá obrigado, Cfr. XXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx, ob.., cit.., pág. 229.
599
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
A aplicação desta sanção, faz cessar o contrato de trabalho, conflitua com o direito à estabilidade de emprego consagrado constitucionalmente e com o direito à retribuição. São essas as razões que levaram o legislador a limitar especialmente a sua aplicação.
3.1. Pressuposto do despedimento disciplinar
Do exposto importa agora centrar a nossa abordagem as causas justificativas do despedimento disciplinar. Seguimos a risca o enunciado da LGT, no seu art.º 206.º.
Entre os comportamentos que podem constituir justa causa de despedimento encontra-se em primeiro lugar a violação dos deveres de assiduidade pontualidade conforme a al. c) do art.º 44.º da LGT; em termos de provocar prejuízos ou riscos graves para a empresa, ou quando o número de faltas injustificadas ultrapasse três (3) dias por mês ou doze (12) por ano conforme dispõe al. a) art.º 206.º ou ainda em caso de violação de horário de trabalho ou quebra de pontualidade, com atrasos superiores a 15 minutos ou mais de 5 vezes por mês al. b) do art.º 206.º da LGT.
4. Princípios Gerais do Procedimento Disciplinar
Importa dizer que o procedimento disciplinar está sujeito a determinados princípios que são de observância obrigatória, dentre os quais passamos a explicar de forma isolada a seguir:
Princípio da iniciativa patronal: o procedimento disciplinar compete a sua instauração ao empregador, a investigação e a decisão de perseguir e sancionar a prática de uma infracção. Estamos perante um sistema fundamentalmente inquisitório nos dizeres de MOISÉS CAPEÇA(13);
Princípio da oportunidade: a abertura e o desenvolvimento do processo está, salva regra em contrário, sujeito à discricionariedade (que não é o mesmo que arbitrariedade) da entidade
(13) Cfr. XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxx, ob.., cit.., p. 70.
600
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
empregadora, pelo que as irregularidades ou invalidades se restringem aos casos de não acatamento de determinações específicas nos termos do art.º 57.º da LGT;
Princípio da acusação: recebido de forma mitigada e constituindo uma importante limitação ao princípio do inquisitório dominante, deve sofrer uma enunciação adaptada. A acusação deduzida pela entidade que procedeu à instrução e que vira posteriormente decidir;
Princípio do Contraditório: entendido como princípio ou direito de audiência, isto é, a oportunidade conferida e influir, através da sua audição(14), no decurso do processo. Está consagrada no art.º 49.º da LGT;
Princípio da suficiência: no procedimento disciplinar, devem em princípio, resolver-se todas as questões cuja solução se revele necessária à decisão a tomar. Nele devem constar todos os elementos de prova que servem de fundamento à decisão fáctica;
Princípio da Celeridade/ economia: o procedimento disciplinar deve representar uma sucessão quanto possível continuada, de todos os termos. Deve-se procurar o máximo de resultados com o mínimo de esforço, o que também implica o mínimo de tempo;
Princípio in dúbio pró reo: recai sobre a entidade empregadora, por lhe caberem por si ou por seu mandatário, as funções de instrutor do processo, a obrigação de proceder a investigação dos factos que materializam infracções ou circunstâncias relevantes;
Princípio do Recurso: o trabalhador tem direito de recorrer da sanção disciplinar aplicada para o escalão hierárquico superior com competência disciplinar; tem a seu dispor recurso gracioso e contencioso.
4.1. Fases do Procedimento Disciplinar
A instauração do procedimento disciplinar depende da existência ou suspeita de uma infracção disciplinar cometida pelo trabalhador, de acordo a LGT é possível detectar cinco (5) fases:
(14) A medida disciplinar não pode ser aplicada sem audiência prévia do trabalhador, a este caberá o direito a apresentar a sua defesa; sob pena de nulidade prevista no art.º 228 da LGT antiga e 208.º da nova LGT.
601
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
O art.º 48.º da LGT nomeadamente: (i) Convocatória; (ii) Entrevista; (iii) Aplicação da medida disciplinar; (iv) Execução da medida disciplinar; (v) Reclamação e recurso.
Convocatória: vem previsto no art.º 48.º da LGT, ao estatuir que excepto se a medida a aplicar for admoestação simples ou admoestação registada. A convocatória deve conter discriminadamente todos os factos imputados ao trabalhador.
Entrevista: Seguidamente na data marcada realiza-se a entrevista, na qual o empregador expõe as razões por que pretende aplicar uma sanção disciplinar, seguindo-se a argumentação do trabalhador. Tudo o que for alegado pelo trabalhador na entrevista deve ser reduzido a escrito conforme o n.º 2 do art.º 49.º da LGT.
Aplicação da Medida Disciplinar: Após o termo da entrevista, o empregador dispõe de trinta (30) dias para aplicar a medida, mas o poderá fazer antes de decorrido três (3) dias sobre a data da entrevista conforme dispõe o n.º1 do art.º 50.º da LGT;
Execução da Medida Disciplinar: A medida aplicada começa a ser executada a partir do momento em que é comunicada por escrito ao trabalhador. A comunicação deve conter não só a medida disciplinar, como também os factos que pesaram contra o trabalhador, suas consequências e o resultado da entrevista (instrução), conforme os n.ºs 1 e 2 dos art.ºs 50.º e 51.º da LGT;
Reclamação e Recurso: de acordo com o art.º 56.º da LGT: O trabalhador pode recorrer contra uma medida disciplinar, se entender que não praticou os factos de que é acusado, quando a sanção é excessiva para os factos praticados ou para o grau de culpa, ou é nula ou abusiva. Para o efeito dispõe de trinta (30) dias para recorrer da decisão final da punição como estatui a alínea c) do nº 1 do artigo 63º da antiga LGT) e 22 dias úteis seguintes ao conhecimento da infracção e do seu responsável ao abrigo da actual LGT alínea c) do n.º1 do art.º 61.º.
Neste ponto há uma ligeira diferente porquanto na nova lei houve uma redução do prazo para a interposição do recurso/reclamação.
Se a sanção for o despedimento imediato, o recurso junto da Sala do Trabalho do Tribunal Provincial será interposto no prazo de cento e oitenta (180) dias (se pretender ser reintegrado)
602
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
ou de um (1) ano (se apenas visar indemnização), como se pode facilmente aferir no nº2 dos artigos 300º, nº2, e 301º, ambos da antiga LGT e 303.º e 304.º da actual LGT.
Há, no entanto, algumas categorias de trabalhadores que beneficiam de uma protecção especial contra o despedimento, tendo assim este que ser sujeito a um regime especial. Entre estes encontram-se, nos termos do n.º 1 do art.º 207.º da LGT.
Trata-se de um prazo de caducidade, que se for ultrapassado implica a extinção do direito de acção disciplinar (a extinção de um direito potestativo pelo seu não exercício prolongado durante lapso período de tempo). Determina que se dê início ao procedimento disciplinar contra o infractor.
A infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que teve lugar. Conforme alínea b) n.º 1.º da LGT e alínea b) do art.º 61.º.
603
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
Conclusão
O empregador detém nas relações de trabalho subordinado uma posição de poder, evidenciada pela autoridade e direcção que exerce sobre o trabalhador. À autoridade e direcção do empregador corresponde o dever de obediência do trabalhador. São estes os aspectos característicos do contrato de trabalho que demonstram a existência da subordinação jurídica típica das relações de trabalho subordinado.
Dos vários poderes que o empregador detém e exerce sobre o trabalhador, o poder disciplinar, pelas suas características e efeitos, assume contornos únicos nesta relação jurídico privada. O poder disciplinar é concebido como um poder autónomo face ao poder de direcção e ao poder regulamentar.
Existe infracção disciplinar quando o trabalhador violar por acção ou por omissão os deveres contratuais principais ou acessórios. A utilização do poder disciplinar pode configurar a aplicação abusiva de sanções pelo empregador, cujo efeito geral resulta na indemnização ao trabalhador e sua reintegração do mesmo no anterior posto de trabalho. A indemnização assume contornos bastante penalizadores para o empregador.
O exercício do poder disciplinar está sujeito a prazos rigorosos, a procedimentos. Cuja não verificação acarreta consigo a nulidade e improcedência da decisão. A sua previsão tem especialmente por finalidade proteger o trabalhador face ao poder do empregador, ao mesmo tempo que garante a manutenção da relação de trabalho e restabelece a relação de confiança entre as partes. Relação que o contrato de trabalho pressupõe.
Críticas
Pesamos que a nova LGT apesar de inovar em algumas matérias, mormente no que as medidas disciplinares, ao introduzir na alínea c) do n.º 1 do art. 47.º a Redução temporária do salário, deveria o legislador manter-se fiel as medidas constantes do n.º1 do art.º 49.º da anterior LGT, são eles: a despromoção temporária de categoria com diminuição de salário; transferência temporária do centro de trabalho; com despromoção e diminuição do salário.
604
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
Outrossim, a redução do tempo para a reclamação e Recurso: de acordo com o art.º 56.º da LGT de (30) dias para recorrer da decisão final da punição como estatui a alínea c) do nº 1 do artigo 63º da antiga LGT) para 22 dias úteis seguintes ao conhecimento da infracção e do seu responsável ao abrigo da actual LGT alínea c) do n.º1 do art.º 61º. Está claramente o legislador a beneficiar em nossa opinião o empregador.
Quando em nossa opinião deveria ser inverso, porquanto o trabalhador ser o elo mais fraco da relação jurídico-laboral.
Cabinda - Angola, 18 de Novembro de 2021
605
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter
Bibliografia
XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxx, Da Ilicitude do Despedimento Disciplinar e suas Consequências, Colecção Teses Mestrados, Casa das Ideias, 2012;
XXXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito do Trabalho, 14ª ed., Almedina, Coimbra; 2009; FERNNADES, Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito do Trabalho, 16.ª Edição, Almedina, Coimbra; 2012; XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx, Direito do Trabalho de Angola, Almedina, Coimbra; 2013;
XXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx, O poder disciplinar do empregador Em especial o seu exercício com vista ao despedimento do trabalhador, in Trabalho realizado no âmbito de provas públicas Título de Especialista Ramo de conhecimento em Direito, 2014;
XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx, Direito do Trabalho, 4ª ed., Xxxxxxxx, Xxxxxxx, 0000;
XXXXX, Xxx Xxxxxxxx, o direito disciplinar da função pública, volume II, in dissertação de doutoramento em ciências jurídico-políticas, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2007.
XXXXXXX, Xxxxx Xx Xxxxxxx Xxxxx, Direito do Trabalho, Parte I-Dogmática Geral, Almedina;
XXXXXXX, Xxxxx Xx Xxxxxxx Xxxxx, Direito de Trabalho-Parte II-Situações Laborais Individuais, 2º Edição, revista e actualizada, Xxxxxxxx, 0000;
XXXXXXX, Xxxxx do Rosário Palma, Do Fundamento do Poder Disciplinar Laboral-Almedina Coimbra, 1993;
TELLES, Xxxxxxxxx Xxxxxx, Direito das Obrigações, 6.ª ed., revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra;
Legislação Consultada
Constituição da República de Angola; Código Civil;
Lei n.º 2/00 de 11 de Fevereiro (Lei Geral do Trabalho); Lei n.º 7/15, de 15 de Junho (Lei Geral do Trabalho).
606
JuLaw–Revista Jurídica Digital | JuLawTV| JuLawAcademy xxxxxxxx@xxxxx.xx.xx| x000000000000(WhatsApp) | xxx.xxxxx.xx.xx
JuLawTV: YouTube| Redessociais(@julawangola) LinkedIn| Instagram| Facebook | Telegram| Twitter