CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO E CONCESSÃO MERCANTIL
CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO E CONCESSÃO MERCANTIL
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx Sant’Xxx Xxxxxxxxx em Direito Comercial pela PUC/SP. Advogada.
Área do Direito: Civil; Comercial
Resumo: O presente trabalho tem como principal objetivo analisar o contrato de distribuição e concessão mercantil, que não relativo à venda de veículos automotores, por meio do estudo de seus elementos e natureza jurídica. Este artigo buscou também confrontar as obrigações atinentes às partes, pontuando, ao final, as cláusulas que usualmente são objeto de litígio, com a análise da jurisprudência atual sobre cada tema.
Palavras-chave: Contrato de Distribuição – Concessão Mercantil – Fabricante – Distribuidor – Exclusividade – Não concorrência.
Abstract: The present work aims to analyze the distribution and commercial concession contract not regarding to vehicles, through the study of its elements and legal nature. This article also sought to confront the parties’ obligations, registering at the end the clauses that usually are the subject of litigation, with the analysis of current jurisprudence on each topic.
Keywords: Distribution Contract – Commercial concession – Manufacturer – Distributor
- Exclusivity – No competition clause.
Sumário: 1. Considerações Preliminares – 2. Conceito – 3. Elementos do Contrato de Distribuição – 4. Natureza Jurídica – 5. Obrigações do Fabricante – 6. Obrigações do Distribuidor – 7. Tipo Jurídicos Assemelhados – 8. Extinção – 9. Cláusulas Problemáticas: a. Exclusividade; b. Não Concorrência; c. Concessão de Créditos e Garantias; d. Eleição de Foro; e. Extinção – 10. Conclusão - Referências Bibliográficas.
1. Considerações Preliminares.
O contrato de distribuição surgiu com o intuito de aproximar o ponto de venda e facilitar a disponibilização de produtos ao consumidor, caracterizando-se por unir o fabricante e o empresário comercial em contrato duradouro para fornecimento de bens de consumo para revenda ao público em geral, a princípio, com exclusividade.
Nesse sentido, conforme leciona Xxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx, ocorre uma expansão significativa de mercados no final do século XIX e início do século XX em decorrência da massificação da produção e da revolução dos transportes e das comunicações. E, “é nesse momento que surge a figura do distribuidor. Trata-se de um comerciante que, em geral, atuará na chamada fase de difusão, sendo um elo entre o fabricante e o comércio atacadista e varejista.”1
Com efeito, a evolução da economia impõe ao fabricante a preocupação de distribuir seus produtos com maior agilidade, abrangência territorial e eficácia nos serviços prestados, o que seria impossível sem uma rede organizada de distribuidores.
O Código Civil de 2002 destinou um capítulo para regular o contrato que denominou de agência e distribuição (Capítulo XII, artigos 710 a 721).
O artigo 710 do Diploma Civil dispõe que “[p]elo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada.”
Xxxxxxx Xxxxxxxx afirma que “(...) pode-se conceber a distribuição como o contrato pelo qual uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculo de dependência, a obrigação de promover, por sua conta, sem retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, envolvendo bens dos quais ela dispõe.”2
1 JUNIOR, Xxx Xxxxxxx Xxxxxx. Contrato de Distribuição ou Concessão Mercantil. Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p.452.
2 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 753.
Veja-se que a definição dada pelo jurista citado não corresponde exatamente com a descrição legal do instituto, vez que no artigo 710 consta que a agência e distribuição se dão mediante retribuição, diferenciando-se os institutos apenas no que tange à disponibilidade da coisa, enquanto Xxxxxxx Xxxxxxxx exclui a retribuição de sua definição. Isso se dá porque, como veremos mais adiante, a remuneração do distribuidor decorre, na verdade, da diferença entre o preço de compra da mercadoria do fabricante e o preço de revenda ao consumidor, não havendo uma remuneração propriamente dita.
Desde já vale ressaltar que, não obstante muitos juristas não façam uma diferenciação entre os institutos da distribuição e da concessão mercantil3, o mestre Xxxxx Xxxxx Xxxxxx explica que “[n]a categoria dos contratos de colaboração por intermediação, distinguem-se duas espécies: a distribuição-intermediação e a concessão”4 sendo certo que a diferença entre elas “encontra-se no maior grau de ingerência, notável no contrato de concessão, do fornecedor (concedente) na organização da empresa do colaborador (concessionário), quando comparado com a distribuição-intermediação. Essa diferença, contudo, não é significativa em muitos casos, e, salvo na hipótese de comercialização de veículos automotores terrestres (em que a concessão é contrato típico e obrigatório), o nome que as partes atribuem ao instrumento, a rigor, não interessa.”5
No entendimento da Professora Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, o contrato de distribuição seria gênero do qual a concessão mercantil é espécie e a diferença entre os institutos residiria no fato de a distribuição permitir a existência de subdistribuidores, ao passo que o caráter intuitu personae do contrato de concessão vedaria essa prática. Em suas palavras, “[a] distribuição é espécie mais genérica de concessão mercantil. Seria a distribuição a concessão comercial lato sensu, diversa da concessão stricto sensu.”6
Finalmente, para o ilustre jurista Xxxxxxx Xxxxxxxx, “[a] distribuição equivale à concessão comercial não apenas pela idêntica natureza de negócio – aquisição de bens junto ao produtor ou fabricante, para revenda a consumidores finais (consistindo a diferença
3 Xxxxxxx Xxxxx, Xxxxx Xxxxxxxx e Xxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx.
4 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa. 15ª edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 116.
5 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa, 15ª edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 123.
6 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Tratado Teórico e Pratico dos Contratos, 3º volume. 4ª edição, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 451.
unicamente quanto ao tipo de bens) – mas, igualmente, em razão de uma disposição que está no §1º letra ‘a’ do art. 2º da Lei nº 6.729: ‘Intitula-se também o produtor de concedente e o distribuidor de concessionário.’”7
A Lei nº 6.729/79, popularmente conhecida como Lei Ferrari, regula a concessão comercial especificamente entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre, ou seja, entre os fabricantes e as concessionárias de veículos automotores, tendo o ilustre Professor Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx, considerado possível a aplicação analógica da referida lei aos demais contratos de distribuição.8
Tal entendimento, porém, não é partilhado por Xxxx Xxxxxxx Xxxxx e Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, que acreditam ser a aplicação extensiva da Lei Ferrari prejudicial à livre concorrência, destacando que: “[o] art. 3º da Lei nº 6.729/79 não pode ser interpretado extensivamente, de forma a abranger a restrição pretendida pelo fabricante”, pois, “[a] interpretação extensiva do preceito conduziria, inevitavelmente, à violação do princípio da livre iniciativa (e, pois, da livre concorrência).”9
O Superior Tribunal de Justiça já afastou a aplicação da Lei Ferrari por analogia aos contratos de distribuição propriamente ditos10, uma vez que não cabe a aplicação de uma norma especial a casos semelhantes de cunho geral.
Vale notar, apenas para encerrar esse ponto, que a concessão mercantil além dos casos de veículos automotores tem aplicação restrita e, ainda, os elementos e características de
7 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 757.
8 Nesse sentido, afirma o citado professor que: “a aplicação analógica, amplamente justificada e recomendada pela identidade essencial de situações fáticas (art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil), impõe-se, in casu, em nome do princípio de isonomia, que é pedra angular de todo o sistema jurídico, porquanto, afrontaria aos mais rudimentares elementos da equidade aceitar que o legislador pudesse criar desigualdade de tratamento entre iguais, ou pudesse instituir injustificáveis privilégios em favor, apenas, dos distribuidores de veículos automotores” - Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx, Aplicação Analógica da Lei dos Revendedores, Revista de Direito Mercantil, nº 49, p. 38.
9 GRAU, Xxxx Xxxxxxx e FORGIONI, Xxxxx Xxxxxx, Restrição à Concorrência, Autorização Legal e seus Limites
– Lei 8.884, de 1994 e Lei 6.729, de 1979 (“Xxx Xxxxxxx”). Revista de Direito Mercantil, vol. 114, p. 271.
10 “RECURSOS ESPECIAIS. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DA LEI 6.729/79. PRAZO INDETERMINADO. RESCISÃO. AVISO PRÉVIO. NECESSIDADE. INEXISTÊNCIA DE CONSENSO ENTRE AS PARTES. ARBÍTRIO JUDICIAL. CONJUNTO FÁTICO- PROBATÓRIO.
1. Não é possível a aplicação analógica das disposições contidas na Lei 6.729/79 à hipótese de contrato de distribuição de bebidas, dado o grau de particularidade de referida norma, que desce a minúcias na estipulação das obrigações do concedente e das concessionárias de veículos, além de restringir de forma bastante grave a liberdade das partes. Precedentes. (...).” (REsp 654408/RJ, Quarta Turma, Min. Rel. Xxxxxxxx Xxxxxxxxx, julgado 09.02.2010).
ambos os contratos se confundem em sua grande maioria, sendo que a distinção feita pelos doutrinadores, usualmente, se refere (i) ao objeto do contrato, (ii) ao grau de ingerência do fabricante no negócio do distribuidor/concessionário e (iii) na prestação de assistência técnica, característica dos contratos de concessão mercantil.
De qualquer forma, tendo em vista a tipicidade desse contrato de concessão mercantil de veículos automotores e o fato de se tratar de tema próprio, no presente trabalho trataremos especificamente do contrato de distribuição-intermediação, tal como definido por Xxxxx Xxxxx Xxxxxx.
2. CONCEITO.
A par da definição já transcrita acima, dada por Xxxxxxx Xxxxxxxx, importante incluir o conceito de contrato de distribuição de Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, para quem “[a] distribuição- intermediação é o contrato de colaboração empresarial pelo qual um dos empresários contratantes (distribuidor) tem a obrigação de comercializar os produtos do outro (distribuído).”
Já nos dizeres da Professora Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, “[o] contrato de distribuição é o acordo em que o fabricante, oferecendo vantagens especiais, compromete-se a vender, continuamente, seus produtos ao distribuidor, para revenda em zona determinada”11, ou seja, o distribuidor revende em determinada zona, por conta própria, os produtos do fabricante, devendo ter tais produtos à disposição e sendo sua remuneração a diferença entre o preço da compra e o da revenda.
O clássico autor Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, afirma que o contrato de distribuição é aquele “pelo qual uma pessoa se obriga a realizar, mediante retribuição, com caráter de habitualidade, mas sem subordinação hierárquica, operações mercantis por conta de outrem, em zona determinada.”12
11 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 3: Teoria das Obrigações Contratuais e Extraconctratuais. 29ª. edição, São Paulo: Saraiva, 2013, p. 458.
12 XXXXXXX, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx. Instituições de Direito Civil, volume III (contratos), 11ª edição, Rio de Janeiro: Forense, pg. 392.
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx, citando o entendimento de Xxxxx X. Forgioni diz que “o contrato de distribuição compreende operações de compra e venda mercantil, de caráter não eventual. O adquirente compra para revender: (...)” e “‘[o] proveito econômico do distribuidor será o lucro que conseguir apurar em virtude da diferença entre o preço de venda do bem a um terceiro e o que pagou para o fornecedor (margem de comercialização).’”13
Na doutrina italiana, “o contrato de concessão de venda aproxima-se do contrato de fornecimento, já que o produtor concedente se empenha em fornecer ao revendedor concessionário a quantidade de produtos que este lhe requer. O revendedor concessionário se obriga a estocar uma quantidade mínima contratualmente preestabelecida e a executar a venda em uma zona determinada.”14.
Assim, temos que o distribuidor se obriga a realizar a venda das mercadorias adquiridas junto ao fornecedor (proponente), com remuneração decorrente da margem de lucro da revenda, sendo essa operação realizada dentro de um território determinado, com ou sem exclusividade, e de acordo com as diretrizes traçadas pelo proponente.
3. Elementos do Contrato de Distribuição.
Pelas definições acima transcritas, podemos identificar os elementos do contrato de distribuição, sendo eles de ordem subjetiva e objetiva. Quanto aos elementos subjetivos, estes são mais facilmente identificáveis, pois haverá sempre um fabricante/produtor do produto a ser distribuído, e um distribuidor, responsável pela revenda desse produto ao consumidor final.
No que tange aos elementos objetivos, podemos citar: (i) existência de um produto a ser revendido, produzido pelo fabricante; (ii) compra e venda continuada entre as partes com vantagens para o distribuidor; (iii) uso da marca do fabricante; (iv) revenda para consumidor final pelo distribuidor; (v) mantença de estoque pelo distribuidor; (vi) delimitação de área
13 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Aspectos do Contrato de Distribuição. Revista de Direito Empresarial e Recuperacional, Ano I, nº 2, São Paulo: Conceito Editorial: jul/set. 2010, p. 103.
14 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. Diritto Privato, decima edizione, Bologna: CEDAM, 1999, p. 544.
geográfica de atuação do distribuidor; e (vii) liberdade quanto à estipulação do preço da revenda.
Com efeito, o produto a ser comercializado deve ser produzido pelo fabricante/distribuído, que o vende para o distribuidor com vantagens especiais, principalmente de preço e prazo de pagamento. É comum que o fabricante exija uma quota mínima mensal de compra pelo distribuidor e que lhe conceda uma linha de crédito para as aquisições periódicas. São essas vantagens especiais que fazem possível a existência do contrato de distribuição, pois sem isso o distribuidor não teria interesse em fazer a revenda do produto e o fabricante poderia colocá-lo à venda ao consumidor diretamente.
Vale destacar que as vantagens especiais previstas em contrato para essa compra e venda continuada entre fabricante e distribuidores devem ser uniformes para todos os distribuidores que façam parte da rede de distribuição, vale dizer, deve haver isonomia entre distribuidores. Isso significa que pode não existir igualdade absoluta, mas deve existir isonomia de tratamento, respeitando-se, evidentemente, as diferenças decorrentes das áreas de atuação de cada um e de outros pontos de diferenciação eventualmente, sendo vedada a discriminação pura e simples.
O distribuidor, obviamente, tem o direito de usar a marca do fabricante, até porque, na maioria das vezes, é justamente a marca que conquista o mercado em determinada região. É claro que deve haver esforço do distribuidor em difundir essa marca e conquistar mercado, porém, no mais das vezes, é a força da própria marca que consegue angariar clientes.
O distribuidor compra o produto do fabricante no intuito de revendê-lo ao consumidor final, sendo a sua remuneração justamente a diferença entre o preço da compra e o preço da revenda. E, esse preço de revenda é livremente estipulado pelo distribuidor, podendo o fabricante sugerir um preço de revenda estipular um quota mínima mensal de aquisição por parte do distribuidor.
Segundo a mestre Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, “o distribuidor não precisará comprovar a revenda para adquirir o produto do fabricante, pois a mantença de estoque será imprescindível para o exercício de sua atividade mercantil, (...)”15, até porque o artigo 710 do
15 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 3: Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 29ª. edição, São Paulo: Saraiva, 2013, p. 459.
Código Civil exige que o distribuidor tenha o produto à sua disposição para se caracterizar contrato de distribuição.
No mesmo sentido, leciona Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, ao afirmar que “[a] consolidação do mercado, portanto, depende da manutenção, pelo distribuidor, de estoques compatíveis com a demanda na sua área de atuação. Em vista disso, costuma-se prever, no contrato, a obrigação de o distribuidor adquirir, na periodicidade escolhida de comum acordo, determinada quantidade mínima do produto: é a quota de aquisição.”16
Finalmente, outro elemento bastante importante do contrato de distribuição é a delimitação da área geográfica na qual o distribuidor atuará, com ou sem exclusividade. Veja- se que a exclusividade territorial em si não é um elemento obrigatório do contrato de distribuição17, mas deve haver a delimitação do território em que o distribuidor atuará, já que, via de regra, não pode haver mais de um distribuidor na mesma zona com igual incumbência. O artigo 711 do Código Civil é expresso nesse sentido:
“Art. 711. Xxxxx xxxxxx, o proponente não pode constituir, ao mesmo tempo, mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência; nem pode o agente assumir o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes.”
Assim é que o proponente, salvo estipulação expressa em contrário, não pode constituir diversos distribuidores na mesma zona territorial para atuar ao mesmo tempo e com a mesma incumbência. Porém, não há nenhuma vedação expressa à atuação direta do próprio proponente, como bem destaca a Professora Xxxxx X. Forgioni18:
16 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa. 15ª. edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 120.
17 Nesse sentido, lecionam Iso Chaitz Scherkerkewitz: “Entendemos, porém, não ser a exclusividade da
comercialização elemento essencial do contrato de distribuição diante das novas técnicas de comercialização e notadamente do peso cada vez maior que uma marca de renome pode acarretar na decisão de comprar ou não um produto.”, in Contratos de Distribuição e o novo contexto do contrato de representação comercial, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.73; e Xxxxx X. Forgioni: “[a] exclusividade (ou o monopólio de venda, como quer Xxxxxxxx) não é elemento característico do contrato, embora muitos deles apresentem essa particularidade.” in Contrato de Distribuição: função econômica e disciplina jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, pp.59-60.
18 XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Contrato de Distribuição: função econômica e disciplina jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 59.
“Primeiramente, nem sempre é assegurada exclusividade ao distribuidor. Lograr obter essa garantia dependerá, inclusive, do seu poder econômico em face do fornecedor. Este pode decidir (e geralmente o faz) reservar no contrato a possibilidade de incitar a concorrência dentro de sua rede (indicando outro para atuar na área já ocupada por um distribuidor), ou mesmo efetuar vendas diretas.”
Com efeito, a lei civil não afasta a possibilidade de o próprio proponente vender seus produtos de maneira direta aos consumidores finais, salvo exceção prevista na Lei nº 6.729/79 no que tange à concessão de veículos automotores terrestres. E, tendo em vista que na seara do direito privado prevalece o entendimento de que o que não é vedado pela lei é permitido (princípio da legalidade), nada impede que o contrato a ser celebrado entre as partes possibilite ao fabricante vender diretamente seus produtos aos consumidores finais, não obstante não seja essa a praxe do mercado.
Contudo, vale ressaltar que se essa venda direta dos produtos pelo fabricante importar em dano para o distribuidor, por exemplo, com a prática de valores atrativos pelo proponente ao consumidor, haverá abuso de direito e, consequentemente, ato ilícito, nos termos do artigo 187 do Código Civil19. Se o contrato celebrado entre as partes permitir a venda direta dos produtos pelo fabricante, deve se garantir que os preços praticados não ocasionem uma concorrência desleal.
Devemos destacar, ademais, que a exclusividade em um contrato de distribuição pode se referir ao aprovisionamento ou ao território de atuação, ambas ajustáveis livremente entre as partes, pois, como já referido, a exclusividade não é uma característica intrínseca do contrato de distribuição.
A exclusividade de aprovisionamento determina que o distribuidor comercialize apenas e tão somente os produtos de determinado fabricante, o proponente. Ou seja, o distribuidor assume a responsabilidade de não distribuir outros produtos concorrentes ao produto do proponente. Trata-se, nos dizeres do Professor Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, de obrigação de não fazer. Não obstante, esse mesmo doutrinador adverte que:
19 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
“Em outros termos, a exclusividade de distribuição não pode inibir a atuação do distribuidor na comercialização de produtos não concorrentes com os do distribuído. A cláusula de exclusividade de distribuição sem limite material, que impede o colaborador de exercer qualquer outra atividade econômica, é incompatível com a ordem jurídica de perfil liberal ou neoliberal e, portanto, inválida. Por outro lado, a exclusividade deve conter-se em limites temporais ou espaciais (pelo menos um deles).”20
Com relação à exclusividade territorial, ela impede que o fabricante/proponente comercialize o produto objeto do contrato em determinada área que não por meio do distribuidor respectivo. É também uma obrigação de não fazer e visa a prevenir que um distribuidor invada a área de venda do outro, prejudicando seus negócios. Delimita-se a área geográfica de atuação de cada um, de modo a evitar a concorrência na rede de distribuidores de um mesmo produtor.
4. Natureza Jurídica
Até o advento do Código Civil de 2002, o contrato de distribuição era, indubitavelmente, um contrato atípico21, sem regulamentação específica em lei, de sorte que sua formalização seguia a regra geral, caracterizando-se, em princípio, como um negócio não solene, ou seja, poderia assumir qualquer forma não defesa em lei.
Com a inclusão do contrato de distribuição no Capítulo XII do Código Civil de 2002, parte da doutrina brasileira passou a considerá-lo um contrato típico, já que muitos de seus efeitos encontram-se previstos em lei, em que pese haja uma grande margem para negociação entre as partes contratantes no que tange aos seus direitos e obrigações.22
20 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa, 15ª edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 119.
21 A única lei no Brasil a regular relação entre fabricante e distribuidor é a Lei nº 6729/79 que dispõe sobre a concessão comercial de veículos automotores em via terrestre. Trata-se de contrato típico para esse fim.
22 O autor Xxxxx Xxxxx Xxxxxx ainda o considera contrato atípico, sob o fundamento de que “as obrigações dos contratantes não se encontram disciplinadas na lei” – Op. Cit., p. 118.
Não obstante, concordamos com a Professora Xxxxx X. Forgioni no que tange à atipicidade do referido contrato: “quando falamos de contratos de distribuição, estamos diante de um contrato peculiar (atípico)”23, tendo em vista que as partes têm ampla liberdade no momento da contratação, podendo basicamente regular toda a relação da forma que melhor lhes convier.
Além de atípico, podemos dizer que o contrato de distribuição é misto, bilateral, oneroso, comutativo, consensual, de execução continuada, intuitu personae, e, na imensa maioria das vezes, escrito, não obstante o Superior Tribunal de Justiça24 e o Tribunal de Justiça de São Paulo25 já tenham admitido sua existência verbal.
Diz-se contrato misto ou complexo, pois resulta da combinação de mais de um contrato, por exemplo, compra e venda mercantil, uso de marca, seguro, etc. O jurista Xxxxx Xxxx xx Xxxxxxxxxxx assinala que “o que dá aos contratos mistos uma fisionomia própria é o fato de não corresponderem a um único modelo típico, e só a esse modelo típico, que lhes dê um quadro regulativo que permita a contratação por referência e a integração de sua disciplina. Este fato de não correspondência a um modelo típico é, no fundo, o que caracteriza os contratos atípicos.”26
É bilateral na medida em que há estipulação de direitos e deveres para ambas as partes, devendo existir uma correspondência entre encargos e vantagens (comutatividade). Oneroso, pois todas as partes envolvidas sofrem um sacrifício patrimonial com o intuito de obter proveito econômico.
A consensualidade decorre do fato de não haver prescrição legal para sua formalização, ou seja, basta a simples anuência das partes, sem imposição de qualquer forma a ser observada. Como dito acima, o Superior Tribunal de Justiça já, inclusive, admitiu a existência de contrato verbal de distribuição.
Evidentemente, trata-se de contrato de execução continuada, já que a compra e venda entre fabricante e distribuidor se prolonga no tempo, não havendo razão para a estipulação de
23 XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Contrato de Distribuição: função econômica e disciplina jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 86.
24 REsp 1255315 / SP, Terceira Turma, Ministra Relatora Xxxxx Xxxxxxxx, julgado em 13.09.2011.
25 “Não esta prevista em lei a forma solene para o contrato de distribuição comercial, daí a possibilidade de ser realizado verbalmente, apesar da complexidade das relações entre as partes.” (JB, 150:333).
26 VASCONCELOS, Xxxxx Xxxx de. Contratos Atípicos, Coimbra: Almedina, 1995, p. 207.
um contrato de distribuição que preveja uma única prestação. A grande maioria desses contratos vige por anos a fio, possibilitando a consolidação do produto no mercado e o retorno financeiro do investimento eventualmente realizado pelo distribuidor.
Finalmente, nos dizeres do mestre Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, trata-se de “[c]ontrato personalíssimo, pois que se celebra intuitu personae do distribuidor, é intransferível, (...)”27. De fato, é a pessoa do distribuidor elemento determinante para a conclusão do contrato, razão pela qual não se fala em “subdistribuição”.
5. Obrigações do Fabricante
Como dito acima, o contrato de distribuição vem tipificado no Código Civil de 2002. Contudo, tendo em vista que a ausência de regras precisas, as partes podem convencioná-lo livremente, razão pela qual as obrigações de cada uma dependerão do conteúdo do instrumento particular. Ou seja, todos os direitos e obrigações de cada parte deverão constar do contrato a ser celebrado entre fabricante e distribuidor, razão pela qual as obrigações tratadas no presente capítulo apenas terão força de tiverem sido, efetivamente, estipuladas pelas partes.
Até por essa razão, Xxxxxxx Xxxxxxxx afirma que “[a] principal obrigação do concedente, ou fabricante dos bens, é estabelecer todas as condições e discriminar as regras a serem observadas nas vendas pelo concessionário, como regime de preços, datas de entrega, quotas28 mínimas de vendas, (...)”.
Ousamos discordar do ilustre doutrinador, na medida em que entendemos que redigir as estipulações contratuais não constitui obrigação de nenhuma das partes, mas é efeito do próprio interesse de contratar. Ou seja, para que a contratação ocorra, as partes devem estipular seus termos em instrumento próprio, não sendo isso uma obrigação propriamente dita.
27 Op.Cit., p. 392/
28 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 3ª. edição, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 766.
Destarte, a principal obrigação do fabricante do produto a ser distribuído é, efetivamente, entregá-lo ao distribuidor para revenda, na forma e no prazo convencionados, respeitando, quando houver, a quota mínima de fornecimento. Os produtos entregues devem, evidentemente, observar a espécie e qualidade contratadas, bem como deve o fabricante respeitar a quota mínima de fornecimento, se estiver prevista em contrato.
Nesse sentido, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx afirma que “[a]o produtor (ou fabricante) compete fornecer, com a periodicidade própria, as mercadorias para revenda, respeitando a cota e as condições outras definidas em seu relacionamento.”29
Outra obrigação fundamental é respeitar a zona territorial reservada ao distribuidor, principalmente se houver cláusula de exclusividade. O fabricante não pode contratar outro distribuidor na área demarcada e, ainda, tem o dever de coibir qualquer prática tendente a violar a exclusividade do distribuidor, sob pena de responder por sua omissão, já que cabe a ele “zelar pela organização, pelo desempenho e pelo respeito às obrigações contratuais dos integrantes da rede de distribuição.”30
Deve o produtor também promover a publicidade da marca e do produto, podendo repassar essa obrigação ao distribuidor em contrato, com estipulação de reembolso dos gastos incorridos nesse mister.
A Lei nº 6.729/79 proíbe a venda direta dos produtos pelo concedente, salvo nas hipóteses expressamente previstas em lei. No entanto, tendo em vista que jurisprudência pátria não admite a aplicação do referido diploma legal por analogia aos contratos de distribuição que não se refiram a veículos automotores, como visto acima, entendemos que essa vedação não se aplica aos contratos de distribuição puros.
Nesse diapasão, a venda direta pode sim ser afastada por meio do contrato celebrado entre as partes, principalmente quando houver estipulação de exclusividade territorial. No entanto, diante da ausência de vedação expressa em lei, afora o caso de concessão de veículos automotores terrestres, não se trata exatamente de uma obrigação do fabricante, podendo ocorrer se não houver disposição contratual em sentido contrário.
29 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Contratos Comerciais. 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 78.
30 JUNIOR, Xxx Xxxxxxx Xxxxxx. Contrato de Distribuição ou Concessão Mercantil. Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p.461.
Finalmente, cabe ao fabricante efetuar o pagamento das indenizações devidas em caso de rescisão contratual, se cabíveis, questão que será melhor explorada adiante.
6. Obrigações do Distribuidor
A principal obrigação do distribuidor é, obviamente, efetuar a revenda do produto do fabricante dentro de sua área de atuação, submetendo-se à sua fiscalização e às metas e diretrizes traçadas. Há, assim, relativa subordinação do distribuidor para com o fabricante. Xxxxxxx Xxxxxxxx resume de forma brilhante essa subordinação:
“Em princípio, cada pessoa jurídica tem personalidade distinta, sem inter- relacionamento nas respectivas administrações. Mas o próprio contrato de adesão que deve o distribuidor aceitar implica um estado de sujeição, ou uma relação de dependência, que se materializa através da fiscalização permitida à firma concedente, da imposição de múltiplas normas relativas ao preço dos bens, à assistência técnica a ser prestada, aos acessórios que devem ser postos antes da venda, à revisão que precederá a entrega do produto, ao número de bens que necessariamente serão vendidos.
Várias outras obrigações constituem mais propriamente uma submissão ao concedente, as quais são concernentes à organização administrativa e financeira da concessionária, às instalações, ao estoque e às garantias aos adquirentes.”31
Como já dito anteriormente, pode haver previsão de aquisição de quota mínima, bem como de metas de vendas, cabendo ao distribuidor respeitá-las, sob pena de inadimplemento contratual. Além disso, deve o distribuidor manter em estoque os produtos a serem revendidos, o que faz parte da própria essência do contrato como previsto no Código Civil.
É ainda obrigação do distribuidor aparelhar adequadamente suas instalações, de acordo com o modelo proposto pelo fabricante, respeitando também as diretrizes gerais de publicidade estabelecidas.
31 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 3ª. edição, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 767.
Na grande maioria dos casos, caberá ao distribuidor prestar assistência técnica aos consumidores, quando esta se fizer necessária, bem como terá o ônus de prestar garantia do produto, em que pese sejam ambos, fabricante e distribuidor, responsáveis perante do consumidor final, nos termos do Código de Defesa do Consumidor.
Além disso, considerando-se que o distribuidor age por sua conta e risco, o artigo 713 do Código Civil prevê que “[s]alvo estipulação diversa, todas as despesas com a agência ou distribuição correm a cargo do agente ou distribuidor.” Assim, todas as despesas decorrentes da execução do contrato são de responsabilidade do distribuidor, que deve levá-las em consideração quando da estipulação do preço final do produto, de forma que tenha lucro com a revenda.
Finalmente, cabe ao distribuidor efetuar o pagamento das indenizações eventualmente devidas quando der causa à rescisão contratual, questão a ser desenvolvida em tópico específico adiante.
7. Tipos Jurídicos Assemelhados
pós a análise dos elementos e requisitos do contrato de distribuição, bem como das obrigações das partes nele envolvidas, podemos traçar um paralelo com outros tipos jurídicos semelhantes, mas que com ele não se confundem.
Com efeito, o contrato de distribuição, apesar de vir previsto no Código Civil juntamente com o contrato de agência/representação comercial, com ele não se confunde, pois neste há mera intermediação do negócio a ser celebrado diretamente entre o fabricante e o consumidor. Vale dizer, o representante promove a venda direta entre o consumidor e o fabricante, mas não participa diretamente do negócio, recebendo uma comissão pelas aproximações que realizar. Nesse sentido, leciona Xxxxx X. Forgioni:
“A distinção entre as vendas efetuadas por um sujeito enquanto representante e distribuidor é patente: como distribuidor, adquire bens em nome próprio, que são em seu nome faturados. Com a revenda posterior, seu proveito econômico é a diferença entre o preço de aquisição e o preço de venda ao adquirente. O valor
da venda é determinado pelo distribuidor (proprietário do bem alienado), a não ser que haja acordo em sentido contrário.
Na representação, a venda é diretamente realizada pelo fornecedor aos adquirentes. A remuneração consiste na comissão previamente ajustada. O preço do bem é estabelecido pelo proprietário, ou seja, pelo fornecedor representado, cabendo ao representante apenas segui-lo.”32
Já com relação ao contrato de comissão, previsto nos artigos 693 a 709 do Código Civil33, a diferença reside no fato de neste contrato o empresário atuar em nome próprio por conta de terceiro, o comitente, na venda de seus produtos. Ou seja, o comissário, agindo em nome próprio, mas no interesse do comitente, realiza negócio jurídico de compra e venda de bens sem revelar a identidade deste. É o comissário, portanto, que se obriga perante o terceiro com quem contratou.
A distribuição distancia-se do contrato de fornecimento, uma vez que neste não há intuito de revenda do produto pelo fornecedor, que busca satisfazer suas próprias necessidades. Ademais, não se exige que uma das partes seja fabricante, podendo o instrumento ser celebrado entre dois comerciantes.
Com relação ao contrato estimatório ou de consignação, prevê-se a consignação de bem móvel, que será, ao final, vendido ao consumidor final ou restituído ao consignante. Assim, não há revenda, mas sim duas vendas simultâneas, pois no momento em que o bem é vendido ao consumidor final pelo consignatário, este o adquire do consignante.
Finalmente, o contrato de distribuição não se confunde com o contrato de franquia, na medida em que “a franquia se distingue da concessão mercantil, dada não só a sua amplitude, pois abrange produtos e serviços, mas também as suas peculiaridades, pois implica cessão de marca ou nome comercial e assistência técnica”34. No mesmo sentido é a lição de Xxxxx Xxxxxx Comparato:
32 XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Contrato de Distribuição: função econômica e disciplina jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 97.
33 “Art. 693. O contrato de comissão tem por objeto a aquisição ou a venda de bens pelo comissário, em seu próprio nome, à conta do comitente.”
34 BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis, 12ª edição, São Paulo: Atlas, 2000, p. 458.
“A concessão de venda é, exclusivamente, contrato de distribuição de produtos; a licença de uso de marca ou a eventual prestação de serviços do concedente ao concessionário são meros acessórios do pacto principal, que estipula a exclusividade na distribuição de produtos, ou seja, bens fabricados pelo concedente. Na franquia, o essencial é a licença de utilização de marca e a prestação de serviços de organização e métodos de venda pelo franqueador ao franqueado. A finalidade de distribuição da franchise não abrange, pois, apenas produtos, mas também mercadorias (isto é, revenda de comerciante atacadista e retalhista) e serviços, como a hotelaria, por exemplo. Por conseguinte, na concessão de venda, o concessionário é simples intermediário entre o concedente e o público consumidor; enquanto na franquia, o franquiado pode ser, ele próprio, produtor de bens ou prestador de serviços.”35
8. EXTINÇÃO
Como bem observa Iso Chaitz Scherkerkewitz, “a extinção do contrato de distribuição é o tema mais espinhoso a ser tratado”36, pois, no mais das vezes, quando do término das relações contratuais, o espírito de parceria e colaboração não mais existe entre as partes.
A primeira forma de extinção a ser tratada decorre do decurso do prazo determinado previsto no instrumento particular, quando não há intenção das partes em renová-lo. Trata-se de exercício regular de um direito, que não gera indenização para nenhuma das partes. Nesse sentido é o entendimento da jurisprudência pátria:
“Contratos de distribuição e de revenda de produtos. Recusa à renovação pela fabricante após término do prazo pactuado. Alegada perda do negócio de distribuição, do estoque e paralisação da atividade produtiva da distribuidora, com encerramento da atividade. Pedido de ressarcimento dos investimentos
35 COMPARATO, Xxxxx Xxxxxx. Franquia e Concessão de Venda no Brasil: Da Consagração ao Repúdio?
Revista de Direito Mercantil, nº 18, pp. 53/54.
36 Op.Cit., p. 100
realizados, bem como de indenização por perdas e danos. Improcedência bem decretada na origem. Recurso não provido. 1. Indeferido o pedido de gratuidade, (...). 2. Tratando-se de encerramento de contrato de distribuição de bebidas após transcurso integral do prazo pactuado, a falta de interesse na renovação, ainda que amparada exclusivamente no interesse de obtenção de maior lucro, não constitui ato ilícito hábil a gerar dever de indenizar. Ao não renovar o contrato de distribuição e revenda, a ré exerceu regularmente seu direito e, como sabido, quem assim age não pratica ato ilícito.” (TJSP, Apelação nº 0000473-59.2009.8.26.0296, 29ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Xxxxxxxx Xxxxxx, julgado em 30.05.2012 – grifos nossos)
“O simples exercício do direito de resilir o contrato unilateralmente no seu vencimento, desde que cumprida a exigência de notificação prévia do distribuidor com a antecedência estipulada no contrato, não constitui conduta ilícita e, em decorrência, não acarreta a obrigação de indenizar perdas e danos. Tem-se decidido, a propósito, que “o contratante que exercita os atos inerentes à sua liberdade de desvinculação contratual, com notificação prévia de sua intenção, não pratica ilícito capaz de ensejar reparação, com fulcro na responsabilidade civil.” (TAMG, Ap. 225.851, 3ª Câmara Cível, Relator Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx, julgado em 11.12.1996)
Como bem acentua Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, “se o contrato de distribuição-intermediação é celebrado com prazo determinado, o distribuidor deve praticar preço que lhe possa proporcionar a amortização dos investimentos e a margem de lucro desejada no período de duração do vínculo, já que não tem garantia de continuar explorando o mercado daquele produto para além desse tempo.”37
Por outro lado, a denúncia do contrato de distribuição antes de terminado o prazo estipulado, ou seja, a resilição unilateral do contrato, em regra, obriga o pagamento de indenização pela parte denunciante, caso se trate de denúncia imotivada. Nesse sentido é a
37 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa, 15ª edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 122.
previsão do artigo 715 do Código Civil38 e entendimento já esposado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:
“AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO. PLEITO DE DECLARAÇÃO DA OCORRÊNCIA DE CULPA EXCLUSIVA DA RÉ PELO ROMPIMENTO DO CONTRATO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA CONFIGURADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO QUANTO A ESSA PARTE, QUE SE DECLARA DE OFÍCIO. RECURSO DA RÉ PREJUDICADO. (...) AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO. JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA. ALEGAÇÃO DE VÍCIO PELA OCORRÊNCIA DO JULGAMENTO ANTECIPADO. DESACOLHIMENTO.
RECURSO DA AUTORA IMPROVIDO. O contrato de distribuição prevê a possibilidade de resilição mediante aviso prévio com o prazo de trinta dias, mas, admite a possibilidade de rompimento imediato, neste caso com incidência de multa compensatória. Tendo a autora recebido o valor da multa, nos termos da cláusula penal, inexiste possibilidade de buscar nova forma de reparação. E se isso não bastasse, a autora deixou precluir a oportunidade para a produção de prova pericial e não apresentou documentação suficiente para identificar a ocorrência dos alegados danos, omissão que não pode ser suprida por prova oral. Daí a conclusão de que o julgamento antecipado constituiu providência adequada à situação, não se caracterizando qualquer vício processual.” (Apelação nº 0103545- 10.2005.8.26.0100, 31ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Xxxxxxx Xxxxxxx, julgado em 11.03.2014 – grifos nossos)
Se a denúncia for motivada, ou seja, se houve inadimplemento contratual de uma das partes, a parte prejudicada pode alegar a exceção do contrato não cumprido para se desvencilhar de cumprir sua parte da avença. Quanto à inadimplência do distribuidor, temos o seguinte entendimento esposado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:
38 Art. 715. “O agente ou distribuidor tem direito à indenização se o proponente, sem justa causa, cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato.”
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS. RESILIÇÃO MOTIVADA DO CONTRATO. INADIMPLEMENTO DA DISTRIBUIDORA DEMONSTRADO. IMPUTAÇÃO PELA DISTRIBUIDORA DE COMPORTAMENTO ABUSIVO E VIOLADOR DA BOA-FÉ OBJETIVA POR PARTE DA FABRICANTE. MERAS ALEGAÇÕES GENÉRICAS. FATOS NÃO PROVADOS- DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULAS DO CONTRATO POR PARTE DA DISTRIBUIDORA. NÃO COMPROVAÇÃO INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO OU ABUSIVO. INDENIZAÇÕES A ESSE TÍTULO INDEVIDAS. CABIMENTO, NO ENTANTO, DE INDENIZAÇÃO PELA CAPTAÇÃO DA CLIENTELA, DE NATUREZA COMPENSATÓRIA, DESTINADA A EVITAR O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA FABRICANTE SENTENÇA
REFORMADA PARCIALMENTE Inexistente qualquer demonstração de ter a fabricante violado seus deveres contratuais e, suficientemente evidenciado ter sido a distribuidora quem deixou de honrar o pacto, surge para a fabricante o direito à ruptura motivada do contrato, cujo exercício, posto configurar ato lícito, não autoriza nenhuma indenização à contraparte por danos morais ou lucros cessantes. Entretanto, dissolvido o vínculo contratual, ainda que em decorrência de denúncia motivada por inadimplemento culposo da distribuidora, tem ela direito a uma indenização de natureza compensatória, cuja finalidade é evitar o enriquecimento sem causa do fabricante, único a continuar se beneficiando da incorporação do fruto do trabalho de captação da clientela promovido pelo distribuidor. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.” (Apelação nº 9151467-92.2008.8.26.0000, 30ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Xxxxxxx Xxxx, julgado em 06.03.2013 – grifos nossos)
Veja-se que, mesmo tendo havido rescisão contratual em virtude do inadimplemento por parte do distribuidor, essa conduta não afasta seu direito a indenização por eventual “acréscimo patrimonial experimentado pelo fornecedor com o término do contrato.”39
39 SCHERKERKEWITZ, Iso Chaintz. Contratos de Distribuição e o novo contexto do contrato de representação comercial, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 111.
Depois de ultrapassado o prazo contratual, estando o contrato vigendo por prazo indeterminado, o fabricante apenas arcará com indenização se der causa à rescisão ou se não observar a forma de notificação prevista do distribuidor, devendo ser respeitado, ainda, o artigo 473 do Código Civil40. É esse o entendimento esposado por Xxxxx Xxxxx Xxxxxx:
“Se o contrato é firmado por prazo indeterminado, ele pode ser rescindido unilateralmente (isto é, denunciado) a qualquer tempo, mas eventual denúncia do contrato pelo distribuído só produzirá efeitos depois de transcorrido prazo suficiente para o distribuidor recuperar os investimentos que tiver feito na distribuição (CC, art. 473, parágrafo único).”41
Corroboram com esse entendimento Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, ao afirmarem que “[o] que se tem exigido para afastar a abusividade da denúncia unilateral do contrato é a concessão de aviso prévio suficiente ao encerramento dos negócios ou a sua adaptação a uma nova atividade, que seja conforme à natureza do contrato, aos costumes e à boa-fé.”42
Ainda sobre essa questão, Xxxxxx Xxxxxxx é bastante enfático ao afirmar que “a rescisão unilateral desmotivada pode, perfeitamente, ser revista sob as luzes da teoria do abuso de direito, atribuindo à vítima do ato abusivo um direito à indenização.”43 Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
“CIVIL E PROCESSO CIVIL. CONTRATOS. DISTRIBUIÇÃO. CELEBRAÇÃO VERBAL. POSSIBILIDADE. LIMITES. RESCISÃO IMOTIVADA. BOA-FÉ OBJETIVA, FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E RESPONSABILIDADE PÓS-CONTRATUAL. VIOLAÇÃO. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO. DANOS MORAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
40 “Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.
Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos.”
41 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Curso de Direito Comercial, volume 3: direito de empresa, 15ª. edição, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 122.
42 XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxxx e XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx de. Apontamentos sobre a
Responsabilidade Civil na Denúncia dos contratos de Distribuição, Franquia e Concessão Comercial. Revista dos Tribunais nº 790, agosto de 2001, p. 30.
43 REQUIÃO, Xxxxxx. Concessão de Venda com Exclusividade. Aspectos Modernos de Direito Comercial, p. 140.
REVISÃO. POSSIBILIDADE, DESDE QUE FIXADOS EM VALOR IRRISÓRIO OU EXORBITANTE. SUCUMBÊNCIA. DISTRIBUIÇÃO.
CRITÉRIOS. (...) 3. A complexidade da relação de distribuição torna, via de regra, impraticável a sua contratação verbal. Todavia, sendo possível, a partir das provas carreadas aos autos, extrair todos os elementos necessários à análise da relação comercial estabelecida entre as partes, nada impede que se reconheça a existência do contrato verbal de distribuição. 4. A rescisão imotivada do contrato, em especial quando efetivada por meio de conduta desleal e abusiva - violadora dos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da responsabilidade pós-contratual - confere à parte prejudicada o direito à indenização por danos materiais e morais. (...)” (REsp 1255315/SP, 3ª. Turma, Min. Rel. Xxxxx Xxxxxxxx, x. 13.09.2011 – grifos nossos)
O Tribunal de Justiça de São Paulo seguiu na mesma linha:
"AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS. RESCISÃO UNILATERAL. Contrato escrito
de distribuição de bebidas firmado entre as partes em 01/08/2003. Prova documental que demonstra a relação jurídica existente entre as partes desde antes da data da assinatura do contrato escrito. Contrato firmado sem exclusividade e com prazo indeterminado que possibilita a rescisão unilateral sem o dever de indenizar desde que haja prévia notificação. Existência de cláusula contratual que estabelece a necessidade de notificação. Ausência de prova de que a ré tenha notificado a autora da rescisão. Rompimento do pacta sunt servanda. Violação aos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. Existência de nexo causal entre a rescisão unilateral e os prejuízos sofridos pela autora. Indenização por danos materiais devida. Contrato atípico regido pelo Código Civil. Quantum indenizatório que deverá ser apurado em liquidação por arbitramento, para que a perícia possa indicar os prejuízos de ordem material relacionados com o rompimento imotivado do contrato Sentença mantida pelos próprios fundamentos. Art. 252 do Regimento Interno do TJSP. Apelo improvido." (Apelação nº 0139540-45.2009.8.26.0100, 24ª
Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Xxxxx Xxxxxx, julgado em 13.03.2014 – grifos nossos)
“CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO. DISTRIBUIÇÃO (CONCESSÃO COMERCIAL). RESILIÇÃO. EXERCÍCIO ABUSIVO DE DIREITO. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE
DANO. Preliminar. Deserção do recurso interposto pelo sócio. Mérito. Porque a resilição de contratos como o ora em exame se caracteriza pela inativação de estrutura física e técnica adaptada para o desenvolvimento de específica atividade, sobre a qual gravita toda a tecnologia e expertise da contraparte, é curial a concessão de aviso prévio, sob pena de afetar a função social da empresa. Abuso de direito configurado. Indenização. Ausência de dano. A despeito da configuração do abuso de direito, o dever indenizatório pressupõe dano e nexo de causalidade, sendo a viabilidade da concessão de aviso prévio condicionada à demonstração da eficiência dos investimentos serem recuperados no período razoável adequado ao caso. Títulos de crédito. Exigibilidade mantida. Sucumbência. Honorários. Redução. Descabimento (CPC, art. 20). Recurso improvido.” (Apelação nº 0027389- 80.1998.8.26.0114, 31ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Hamid Bdine, julgado em 04.02.2014 – grifos nossos)
Vale lembrar que tanto o artigo 72044 como o artigo 473 do Código Civil preveem a possibilidade de resilição unilateral de contrato que vigore por prazo indeterminado, sem que isso configure ato ilícito, devendo-se apenas observar o decurso de prazo suficiente para que a parte denunciada retome os investimentos realizados.
Como visto, portanto, não há que se falar em indenização, seja por lucros cessantes, seja por danos emergentes, na hipótese de a rescisão contratual unilateral respeitar o prazo expressamente estabelecido para a denunciação do ajuste, porque isso caracteriza o exercício
44 “Art. 720. Se o contrato for por tempo indeterminado, qualquer das partes poderá resolvê-lo, mediante aviso prévio de noventa dias, desde que transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto do investimento exigido do agente.
Parágrafo único. No caso de divergência entre as partes, o juiz decidirá da razoabilidade do prazo e do valor devido.”
de um direito bilateralmente assegurado às partes, uma vez que ninguém é obrigado a permanecer em um contrato contra sua vontade45. No entanto, configura abuso desse direito a ausência de previsão de prazo mínimo para o distribuidor amortizar seus investimentos, bem como a denúncia do contrato antes de decorrido prazo razoável, o qual varia de acordo com a natureza do negócio.
O contrato de distribuição pode se extinguir, ainda, pelo distrato ou rescisão bilateral, que seria uma forma amigável de extinção da avença. Segundo Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, o distrato “é um negócio jurídico que rompe o vínculo contratual, mediante a declaração de vontade de ambos os contratantes de pôr fim ao contrato que firmaram.”46 Sendo uma resilição bilateral, em geral não gerará controvérsia entre as partes, já que além da extinção do vínculo propriamente dita, pode prever já o pagamento de eventual indenização, recompra do estoque do distribuidor, e o que mais as partes, de comum acordo, entenderem cabível.
Finalmente, o contrato pode ser extinto por força maior ou caso fortuito, ou seja, por fatos alheios à vontade das partes, o que, a princípio, elide o dever de indenizar. Será cabível, contudo, o ressarcimento dos investimentos eventualmente realizados pelo distribuidor para cumprimento do contrato. Essa modalidade de extinção contratual pode ocorrer, por exemplo, caso o produto tenha sua comercialização proibida por um órgão governamental, o que, evidentemente, impedirá a continuação do contrato de distribuição.
9. Cláusulas Problemáticas
Dentre as cláusulas mais prováveis de causar litígios entre as partes contratantes, podemos citar as seguintes:
45 “CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS. NÃO-RENOVAÇÃO APÓS O TÉRMINO DO PRAZO PACTUADO, MEDIANTE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. ATO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. INDENIZAÇÃO. NÃO CABIMENTO.
Consoante entendimento perfilhado pela Terceira Turma em casos semelhantes aos destes autos, não constitui ato ilícito, gerador do devedor de indenizar, quando há disposição contratual assegurando às partes interromper o negócio de distribuição de bebidas, após atingido o termo final do contrato, não havendo, pois, que se falar em cláusula abusiva ou potestativa. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ, REsp 493159/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Xxxxxx Xxxxx, julgado em 19.10.2006).
46 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 3: Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 29ª. edição, São Paulo: Saraiva, 2013, p. 186.
a) Exclusividade
Tanto a exclusividade de aprovisionamento quanto a exclusividade territorial causam discussões entre as partes, principalmente quando ocorre seu descumprimento. Como dito acima, a exclusividade de aprovisionamento impõe ao distribuidor comercializar apenas e tão somente os produtos de determinado fabricante, o proponente. Já a exclusividade territorial, geralmente, é uma contrapartida a essa exclusividade de aprovisionamento, permitindo que apenas um determinado distribuidor atue numa área geográfica delimitada. Com isso, o distribuidor revende apenas produtos do proponente, mas atua com exclusividade em determinada zona.
Exatamente nesse sentido é a lição de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx:
“Na questão da exclusividade cumpre enfatizar-se, de um lado, o respeito à marca, não podendo o distribuidor revender produtos de outra e, em contrapartida, o fornecedor negociar com outros comerciantes do ramo na área do distribuidor, que tem assim, quando existente, verdadeiro monopólio de vendas no território delimitado.”47
Como bem destaca Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx, “a cláusula de exclusividade constitui um dos pontos nevrálgicos do contrato de distribuição”48, pois, não é raro ver nos tribunais pátrios discussões que se referem à quebra dessa cláusula, o que pode gerar tanto o direito de rescindir o contrato pela parte lesionada, como seu ressarcimento pelos danos que tiver sofrido em virtude dessa violação. Nesse sentido:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ROMPIMENTO CONTRATUAL. DISTRIBUIÇÃO COMERCIAL. DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULA. PREVISÃO CONTRATUAL DE APLICAÇÃO DA LEI N. 4.886/65 (REPRESENTAÇÃO COMERCIAL). INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS
N. 5 E 7. 1. O acórdão impugnado reconheceu o dever de indenizar não somente pelo rompimento da relação comercial depois da denúncia do
47 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Contratos Comerciais. 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 80.
48 JUNIOR, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Aspectos do Contrato de Distribuição. Revista de Direito Empresarial e Recuperacional, Ano I, nº 2, São Paulo: Conceito Editorial: jul/set. 2010, p. 105.
contrato, mas também pelo descumprimento do avençado, reconhecendo a violação da área de exclusividade destinada à ora recorrida. Assim, estando a solução jurídica apresentada pelo acórdão consentânea com as premissas fáticas por ele reconhecidas, no sentido de que houve descumprimento contratual e que o pacto previa o pagamento de multa pela parte inadimplente, incidem as Súmulas 5 e 7 do STJ.” (STJ, AgRg no AREsp 214880/SP, 4ª. Turma, Min. Rel. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, julgado em 07.02.2013 – grifos nossos)
“CONTRATO. Distribuição. Cláusula contratual de dever de exclusividade pelo distribuidor. Violação confessada. Inexistência, por outro lado, de exclusividade do distribuidor na sua área de atuação. Faculdade contratual de contratar mais de um distribuidor para a mesma região. Inexistência de ilicitude na contratação de terceiro para distribuir produtos de outra linha. Culpa da autora pela rescisão contratual. Hipótese em que autora já dera o contrato por rescindido em notificação extrajudicial recebida pela autora - Declaratória de rescisão contratual improcedente. Apelação improvida Dispositivo: negam provimento.” (TJ/SP, Apelação nº 0067953- 69.2010.8.26.0506, 2ª Câmara de Direito Empresarial, Rel. Des. Xxxxxxx Xxxxxx, julgado em 17.03.2014 – grifos nossos)
Por outro lado, como já dito acima, a cláusula de exclusividade não se presume, já que não é inerente ao contrato de distribuição. Ela deve estar devidamente estipulada no instrumento celebrado entre as partes, sob pena de se reputar inexistente a alegada exclusividade:
“Indenização. Contrato de Distribuição de Sementes. Alegada exclusividade da autora na representação comercial dos produtos da ré e prejuízos materiais e morais oriundos da quebra contratual por culpa da apelada. Ação julgada improcedente. Apelação. Renovação dos argumentos iniciais. Não demonstrada a alegada exclusividade na contratação havida entre as partes. Característica que não se presume. Não configurada conduta culposa da ré no decorrer do contrato, bem como o alegado descumprimento contratual.
Comercialização das sementes da ré havida anteriormente ao início das atividades da autora junto a outras empresas. Não comprovada a alegada concorrência desleal. Possibilidade de rescisão contratual sem que desse ato acarrete prejuízos à apelante. Dificuldades financeiras da própria autora que inviabilizou o cumprimento do contrato. Agravo retido interposto pela ré e reiterado em contrarrazões. Inépcia da inicial não configurada. Sentença mantida. Recursos improvidos.” (TJSP, Apelação 0079897-38.2004.8.26.0002, 32ª Câmara de Direito Privado, Rel. Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx, x. 27.06.2013)
Destarte, em que pese a exclusividade esteja presente na grande maioria dos contratos de distribuição, ela deve constar expressamente do instrumento particular celebrado entre as partes, valendo destacar que não pode haver abuso de direito por nenhuma das partes em sua estipulação. Um contrato que preveja exclusividade de aprovisionamento e distribuição apenas por parte do distribuidor, mas permita que o proponente estabeleça diversos distribuidores na mesma região, pode vir a ser considerado abusivo, pois gera concorrência dentro da própria rede de distribuição, o que descaracterizaria sua faceta de contrato de colaboração.
b) Não Concorrência
O contrato de distribuição pode prever cláusula de não concorrência após o término da avença por determinado período de tempo, de forma que a quebra dessa cláusula, com a continuação do negócio pelo distribuidor, é capaz de gerar sua responsabilização civil:
“Ação promovida pela distribuída e sua antiga parceira contra antiga distribuidora. Prática de atos que evidenciam concorrência desleal: contratação de funcionários da antiga distribuidora, utilização de tecnologia por ela desenvolvida, utilização de seu cadastro de clientes, desvio de clientela, indevida comercialização de produtos travestidos por embalagens com outro nome.” (TJ/RJ, Apelação nº 200600133032, 18ª. Câmara Cível, j. 22.08.2006)
Importante destacar que no caso acima analisado, o antigo distribuidor estava agindo de forma desleal e ilícita, não apenas por continuar no negocio de distribuição desenvolvido, mas principalmente por continuar usando a tecnologia desenvolvida pelo proponente e, ainda, efetuar a venda dos produtos deste em embalagens com outro nome. Não se trata apenas de concorrência, mas de efetiva prática de ato ilícito por parte do antigo distribuidor, que continuou a utilizar a tecnologia e os produtos do proponente após o término contratual.
Não obstante, é possível haver discussão com relação à aplicação da cláusula de não concorrência e o desenvolvimento do mercado pelo distribuidor, já que apesar de realizar esse desenvolvimento, no mais das vezes não pode ele continuar a atuar na mesma área do proponente e tampouco tem direito a indenização se o termino do contrato se der por fim do prazo contratual ou por denúncia vazia, quando o contrato estiver vigendo por prazo indeterminado. O distribuidor então poderia alegar que ele foi o responsável pelo desenvolvimento do mercado em determinada área e que na seria correto impedi-lo de continuar atuando no mesmo segmento de negócio.
Contudo, entendo que o desenvolvimento do mercado faz parte da própria essência do contrato de distribuição e constitui uma obrigação indireta do distribuidor, até para que ele próprio tenha êxito nas revendas e obtenha lucro. E, evidentemente, durante o período em que o contrato viger, ele estará se beneficiando de seus termos, realizando as revendas e percebendo os frutos disso.
Assim, a meu ver, não se pode dizer que a cláusula de não concorrência seria abusiva ou deveria ser afastada, pois foi livremente pactuada entre as partes e deve ser respeitada, devendo o distribuidor ter em mente que o desenvolvimento do mercado por ele constitui obrigação própria do contrato de distribuição do qual ele também se beneficiou no período de sua vigência.
c) Concessão de Crédito e Garantias
Como visto acima, o distribuidor possui algumas vantagens junto ao fabricante quanto ao objeto da distribuição, vantagens essas que fazem o negócio valer a pena para as partes.
Uma dessas vantagens pode ser a concessão de linha de crédito pelo fabricante para que o distribuidor adquira os produtos a serem revendidos.
E, evidentemente, essa cláusula pode causar muitos problemas quando o distribuidor não arca com os pagamentos devidos ou quando o fabricante decide alterar unilateralmente as bases dessa contratação, ainda mais quando existe a cláusula de exclusividade de aprovisionamento.
Nesses casos, o distribuidor não pode adquirir bens de terceiros que não seja o proponente, o qual, ciente desse vínculo de exclusividade, pode tentar alterar as bases da contratação de forma unilateral, prejudicando o distribuidor. Claro que se houver uma cláusula puramente potestativa no contrato, ela será nula de pleno direito49, não podendo nenhuma das partes alterar o contrato celebrado unilateralmente de forma a causar dano a parte contrária.
No entanto, pode ocorrer de o distribuidor realmente passar por dificuldades financeiras em um determinado momento, deixando de arcar com os valores adiantados pelo fabricante como linha de crédito. Essa ocorrência pode ser motivo para rescisão contratual, conforme já reconheceu o Tribunal de Justiça de São Paulo:
“AÇÃO ORDINÁRIA - CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS
ALIMENTÍCIOS - Preliminar por cerceamento de defesa, inocorrência - Não realizada a perícia requerida - Preclusão declarada, ante a falta de depósito dos honorários periciais - Oportunidade de requerer diligências incide até a instrução processual - Inteligência do art. 131 do CPC - Incontroversa a existência do contrato de distribuição - Falta de cumprimento dos compromissos financeiros por parte da autora, motivo ensejador da rescisão contratual - Inaplicável o Código de Defesa do Consumidor diante da relação mercantil travada entre a distribuidora e a fabricante - Alegação de aquisição de veículos para montagem de instalação da Distribuidora - Ausência de documentos relativos à compra - Anúncio em jornal para recrutar vendedores ao empreendimento - Falta de apresentação de escrituração
49 Art. 122. “São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.”
mercantil e contábil para análise pericial de gastos efetuados pela apelante - Ausência de documentos que demonstrassem descontos promocionais - Falta de pagamento das duplicatas sacadas contra a própria apelante - Fundamentos adotados na decisão justificam o concluído, de modo que o julgador não está adstrito a rebater todos os argumentos trazidos pela parte - Não restou comprovada as condições do contrato aduzidas pela apelante, de maneira que deve ser afastada a responsabilidade pelos gastos alegados - Inteligência do art. 333, inc. I do CPC - Sentença mantida - Recurso desprovido.” (TJSP, Apelação nº 9218865-90.2007.8.26.0000, 27ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Xxxxxxx Xxxxxxxx, julgado em 18.09.2012 – grifos nossos)
E, como visto acima, a rescisão contratual motivada, por inadimplemento da distribuidora, poderá gerar direito ao seu ressarcimento se no caso concreto ficar comprovado que o proponente se enriquecerá indevidamente às custas do trabalho já desenvolvido pelo distribuidor, o que não ocorreu no caso da ementa acima transcrita.
d) Eleição de Foro
Outra cláusula bastante usual no contrato de distribuição que se mostra capaz de gerar controvérsia é a cláusula de eleição de foro, haja vista que, muitas vezes, o distribuidor não possui o mesmo poderio econômico que o fabricante, sendo o contrato por adesão. Nesses casos, a cláusula de eleição de foro já vem prevista como melhor convém ao fabricante.
Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que a cláusula de eleição de foro em si é válida, ainda que se trate de contrato por adesão. No entanto, ela será afastada se implicar na inviabilização da defesa dos interesses de uma das partes, diante de sua hipossuficiência frente ao outro contratante:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO. FORO DE ELEIÇÃO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOCORRÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA. RECONHECIMENTO. MATÉRIA
FÁTICA. NOVO EXAME. INVIABILIDADE (SÚMULA Nº 7/STJ). RECURSO NÃO CONHECIDO. (...)
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de ser válida a cláusula de eleição de foro avençada entre pessoas jurídicas, desde que a defesa de uma das partes litigantes não seja inviabilizada pela escolha do foro contratualmente eleito. 3. O fato de se tratar de contrato de xxxxxx não tem o condão, isoladamente, de modificar o foro contratualmente eleito, sendo imprescindível, na linha da jurisprudência firmada por esta Corte, que fique caracterizada a especial dificuldade de acesso ao Poder Judiciário em prejuízo à defesa de uma das partes litigantes. 4. Partindo-se da premissa fática estabelecida no acórdão recorrido, que expressamente reconheceu a existência da hipossuficiência da autora/recorrida em face da recorrente/demandada, (...). 5 - Recurso não conhecido.” (STJ, REsp 804413/SC, 4ª. Turma, Min. Rel. Xxxx Xxxxxx, x. 20.10.2011)
Faz-se importante destacar interessante julgado do Superior Tribunal de Justiça que afastou cláusula que elegia o foro do Reino Unido para dirimir controvérsia oriunda de contrato de distribuição, não com base na eventual dificuldade de defesa da empresa distribuidora brasileira, mas em razão de a obrigação ter sido integralmente cumprida no Brasil:
“PROCESSO CIVIL. COMPETÊNCIA INTERNACIONAL. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO NO BRASIL DE PRODUTOS FABRICADOS POR EMPRESA SEDIADA NO REINO UNIDO. IMPROPRIEDADE DO TERMO “LEIS DO REINO UNIDO”. EXECUÇÃO DE SENTENÇA BRASILEIRA NO EXTERIOR. TEMAS NÃO PREQUESTIONADOS. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. EXECUÇÃO CONTRATUAL ESSENCIALMENTE EM TERRITÓRIO BRASILEIRO. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA JUSTIÇA BRASILEIRA. ART. 88, INC. II, DO CPC. PRECEDENTES.
- As alegações não enfrentadas e decididas pelo Tribunal local não podem ser apreciadas pelo STJ, pela ausência de prequestionamento. Súmulas 282 e 356 do STF.
- A autoridade judiciária brasileira tem competência para apreciar ação proposta por representante brasileira de empresa estrangeira, com o objetivo de manutenção do contrato de representação e indenização por gastos efetuados com a distribuição dos produtos.
- O cumprimento do contrato de representação deu-se, efetivamente, em território brasileiro; a alegação de que a contraprestação (pagamento) sempre foi feita no exterior não afasta a competência da Justiça brasileira.
Recurso especial não conhecido.” (REsp 804306/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, julgado em 19.08.2008 – grifos nossos)
No corpo do referido acórdão, a Ministra Xxxxx Xxxxxxxx destaca que “é certo que o cumprimento do contrato se deu, efetivamente, no Brasil. Com a assinatura do mencionado pacto, tornou-se a recorrida distribuidora e representante da recorrente no país; assim, os produtos fabricados pela recorrente no Reino Unido ou em outros países eram encaminhados ao Brasil, onde a recorrida os distribuía ao mercado, obrigação central do contrato. A alegação da recorrente, de que a contraprestação (pagamento) ‘sempre foi feita no exterior’ não afasta o Brasil como local de cumprimento do pacto, em especial diante da inexistência de prova nos autos de que os pagamentos ocorriam no exterior.” Diante disso, não haveria violação ao dispositivo legal questionado no recurso especial (artigo 88, inciso II, do Código de Processo Civil), uma vez que “[t]al dispositivo, cuidando das hipóteses de competência concorrente, prescreve ser competente o Judiciário brasileiro quando ‘no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação’, que é precisamente o que ocorre na espécie”.
e) Extinção
Finalmente, as várias formas de extinção contratual já foram tratadas no tópico 8 acima, com destaque para as grandes controvérsias existentes e para a posição já adotada pela jurisprudência pátria quanto a este tema, razão pela qual não repetiremos os mesmo argumentos novamente.
Para deixar clara a complexidade da questão, porém, vale transcrever a lição de Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxx, que destacou que “do lado dos distribuidores, as queixas mais
comuns se centram na ruptura abrupta do contrato de distribuição após vários anos de relacionamento, muitas vezes, dezenas deles, em que o distribuidor teria conquistado e consolidado o mercado para o fabricante e, agora, em atitude abusiva, o fornecedor instala distribuidora própria (caso no passado envolvendo a Yashica Co. e a distribuidora Sosecal) ou nomeia outra(s) concorrente(s), valendo-se muitas vezes de práticas comerciais tendentes a constranger ou inviabilizar a comercialização por parte do distribuidor (retenção na entrega dos produtos, aumento injustificado de preços o que não faz para os concorrentes, preterição de verbas para publicidade institucional em alteração de política mercadológica que se contrapõe à praxe antiga, etc.).”50
Destarte, como destacado anteriormente, caso se constate a ocorrência de abuso do direito de resilição do contrato de distribuição, sem observância do necessário aviso prévio quando o contrato estiver vigendo por prazo indeterminado e sem que o distribuidor tenha tido a chance de recuperar os investimentos realizados, fará ele jus a indenização por danos materiais e morais.
10. CONCLUSÃO
O contrato de distribuição constitui um dos meios mais eficientes de ligação de produção ao público consumidor, e de integração entre empresa fabricante e empresa distribuidora, estando parcialmente disciplinado nos artigo 710 e seguintes do Código Civil. Não obstante, trata-se de contrato atípico, bilateral, oneroso, comutativo, escrito, consensual, de execução continuada e intuitu personae.
Constitui um contrato de colaboração empresarial por meio do qual um fabricante vende seus produtos, em caráter não eventual, a outro empresário, o distribuidor, com vantagens especiais, para que este o revenda ao mercado de consumo final em determinada zona, com ou sem exclusividade. Além da colaboração, pode ocorrer, conforme as cláusulas pactuadas no contrato, uma integração empresarial, tendo o fornecedor certo grau de ingerência na atividade do distribuidor, não obstante a autonomia jurídica entre as partes.
50 JUNIOR, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Aspectos do Contrato de Distribuição. Revista de Direito Empresarial e Recuperacional, Ano I, nº 2, São Paulo: Conceito Editorial: jul/set. 2010, pp. 107-108.
Como se trata de contrato atípico, as partes têm ampla liberdade para estipular seus termos, prevendo direitos e obrigações que melhor lhes aprouver, desde que sejam lícitas, evidentemente. Não obstante, os instrumentos de distribuição, em geral, prevêem: (i) a existência de um produto a ser revendido, produzido pelo fabricante; (ii) compra e venda continuada entre as partes, com vantagens para o distribuidor; (iii) uso da marca do fabricante pelo distribuidor; (iv) revenda do produto para o consumidor final pelo distribuidor; (v) mantença de estoque pelo distribuidor; (vi) delimitação de área geográfica de atuação do distribuidor; e (vii) liberdade quanto à estipulação do preço da revenda.
É geralmente com sua extinção que surge a maior parte dos litígios entre as partes, podendo essa extinção se dar por término do prazo contratual, distrato, rescisão unilateral, inadimplemento contratual e casos fortuitos ou de força maior. O exercício do poder de denúncia nos contratos de distribuição está pautado na liberdade contratual das partes, devendo, porém, ser reprimidos eventuais casos de abuso de direito, devendo-se observar os parâmetros impostos pelos princípios da boa-fé objetiva, lealdade contratual e função social do contrato.
REFERÊNCIAS BIOBLIOGRÁFICAS
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