GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL
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AGÊNCIA REGULADORA DE ÁGUAS, ENERGIA E SANEAMENTO BÁSICO DO DISTRITO FEDERAL
Coordenação de Licitações e Contratos da
Superintendência de Administração e Finanças
Pregoeiros e Equipe de Apoio da Coordenação de Licitações e Contratos da Superintendência de Administração e Finanças
JULGAMENTO DE RECURSO ADMINISTRATIVO
Processo: 00197-00000349/2021-15
Pregão Eletrônico no 05/2021
Objeto: Contratação de empresa especializada, em regime de empreitada por preços unitários, para a prestação dos serviços de Agente de Integração Empresa-Escola a fim de auxiliar na operacionalização do Programa de Estágio da Adasa, destinado à concessão de vagas de estágio não obrigatório remunerado a estudantes de nível médio e superior, pelo prazo inicial de 30 (trinta) meses.
Recorrente: CIDE – CAPACITAÇÃO, INSERÇÃO E DESENVOLVIMENTO
Recorrida: OZIEL LUCIANO BRAZ ASSESSORIA E CONSULTORIA ME
1. DOS FATOS
1.1. No dia 28 de abril do corrente ano foi realizada a sessão pública virtual do Pregão Eletrônico 05/2021 (Ata da Sessão em 60815615).
1.2. Ainda na etapa de lances, sagrou-se vencedora a licitante CIDE, uma sociedade civil sem fins lucrativos (estatuto social em 60873183), na espécie associação civil.
1.3. O edital da licitação (59579928) prevê no seu item 3.4 que, no caso de vitória de uma entidade sem fins lucrativos, a licitante deverá comprovar que seus fins estatutários são adequados ao serviço licitado e que existe, ainda, um elemento finalístico especial que justifique a contratação de uma sociedade civil não empresária. O subitem 3.4.2 ainda esclarece que o Pregoeiro deverá seguir a orientação externada no Acórdão 7.459/2010-TCU, que exige verificação da existência ou não de desvio de finalidade no estatuto social da entidade, o que só pode ser aferido no caso concreto.
1.4. Diante da situação narrada, o Pregoeiro, com fundamento no subitem 3.4.1 do edital, solicitou da CIDE prova documental sobre o atendimento das exigências editalícias, sob pena de inabilitação e desclassificação da sociedade.
1.5. Não foram apresentados pela CIDE documentos comprobatórios, o que ensejou sua exclusão do certame e continuidade do pregão, com convocação da licitante seguinte na ordem de classificação. Ao final, a licitante habilitada e declarada vencedora foi a micro-empresa OZIEL LUCIANO BRAZ ASSESSORIA E CONSULTORIA ME.
1.6. Contra a decisão do Pregoeiro, a CIDE apresentou o recurso administrativo 61270158.
1.7. Intimada, a empresa XXXXX apresentou contrarrazões em 61651212.
2. DA COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DOS RECURSOS
2.1. É do Pregoeiro a competência para receber, examinar e decidir os recursos administrativos, conforme disciplinado no art. 17, VII do Decreto no 10.024/2019 (recepcionado no Distrito Federal pelo
Decreto Distrital nº 40.205/2019).
2.2. No caso de o Pregoeiro não dar provimento aos recursos, mantendo, portanto, sua decisão inicial, a matéria deve ser submetida à Diretoria Colegiada (art. 13, IV do Decreto no 10.024/2019).
3.1. Em sede recursal, a sociedade civil CIDE – CAPACITAÇÃO, INSERÇÃO E DESENVOLVIMENTO alega que a decisão do Pregoeiro foi de encontro à regra do item 3.4 do edital, que permitia a participação no pregão de entidades sem fins lucrativos.
3.2. Para tanto, argumenta que seu estatuto social elege, expressamente dentre suas finalidades institucionais, a atuação na intermediação de estágios, na qualidade de agente integrador.
3.3. Por fim, aduz que a denegação do recurso importará em violação aos princípios de Direito Administrativo e, de forma um tanto surpreendente, ameaça levar o caso ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas dos Municípios.
4.1. A empresa declarada vencedora, OZIEL LUCIANO BRAZ ASSESSORIA E CONSULTORIA ME, por ter interesse direto no deslinde do recurso, foi intimada para contra-arrazoar o recurso da CIDE. Em breves linhas, a XXXXX refuta os argumentos despendidos no recurso e pugna pela manutenção da decisão prolatada na sessão pública do pregão. Ao final, alude à suposta inexequibilidade da proposta comercial da CIDE.
5. DA ANÁLISE
5.1. O edital do pregão eletrônico 05/2021 permite a participação no certame de entidades sem fins lucrativos, desde que tais licitantes comprovem atender a dois requisitos cumulativos previstos no item 3.4, quais sejam:
3.4 Será permitida a participação de entidades sem fins lucrativos e/ou sem fins econômicos que comprove documentalmente o atendimento de dois requisitos cumulativos: (a) adequação entre o objeto do certame e os fins estatutários da entidade e (b) comprovação de que os fins estatutários da entidade apresentam elemento especial, vinculado às finalidades precípuas de atuação de entidades sem fins lucrativos, que distinguam sua forma de execução do serviço da forma como atuaria uma sociedade empresária.
(59579928, destaque nosso)
5.2. Em suma, a participação no certame da associação civil sem fins lucrativos, como é a CIDE, depende de: (a) prova de que o estatuto social da associação civil erige a intermediação de estagiários dentre suas finalidades institucionais, e (b) comprovação de existir um elemento especial que distingua sua prestação do serviço da forma pela qual qualquer sociedade empresária prestaria o mesmo serviço.
5.3. A recorrente logrou comprovar o atendimento ao primeiro requisito. Seu Estatuto Social, efetivamente, indica que a intermediação de estagiários é uma das suas áreas de atuação, havendo previsão estatutária do exercício, pela associação, da atividade como agente de integração de estágios. Tudo isso consta dentre os documentos de habilitação (60873183). O segundo requisito, entretanto, não ficou demonstrado.
5.4. O segundo requisito é um complemento do primeiro. Trata-se da comprovação pelo licitante de que sua execução do serviço é dotada de um elemento especial que a diferencia da forma comum pela qual qualquer agente empresarial executaria o serviço. Esse "elemento especial" deve,
necessariamente, estar dentro do espectro de atuação de uma associação civil. É necessário avaliar, então, se os objetivos sociais previstos no estatuto abarcam um elemento diferenciador capaz de justificar que o contrato seja firmado com uma entidade sem fins lucrativos. O próprio edital do pregão eletrônico 05/2021 exige que o Pregoeiro faça essa aferição:
3.4.2 Em todo caso, o Pregoeiro deverá realizar a verificação sobre eventual desvio de finalidade da entidade sem fins lucrativos que pretenda exercer atividade comercial em condições semelhantes às sociedades empresárias (conforme orientação do Acórdão 7.459/2010-TCU)
(59579928, destaque nosso)
5.5. Em resumo, a regra do subitem 3.4.2 obriga que o Pregoeiro realize uma avaliação acerca das finalidades institucionais elencadas no estatuto social (requisito 'a'), a fim de perquirir se tais finalidades são ínsitas à entidades sem fins econômicos ou se, ao contrário, tratam-se de objetivos meramente empresariais e, portanto, estranhos à zona de atuação da atividade associada. Tal regra encontra respaldo na norma do art. 53 do Código Civil que é peremptório em proibir que associações civis sem fins lucrativos exerçam atividades com fins econômicos:
Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.
5.6. O regramento civilista, como se vê, proíbe que entidades sem fins lucrativos realizem atividades com finalidade econômica mas não identifica quais as áreas de sua atuação. O esclarecimento fica por conta da doutrina e da jurisprudência.
5.7. O Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), o Exmo. Sr. Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, no artigo "Da associação no novo Código Civil", publicado na Revista da EMERJ, v. 7, n. 27, 2004, defende que "os associados se unem para alcançar fins culturais, religiosos, piedosos, científicos ou literários, esportivos, religiosos, recreativos...". Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, citado por Xxxx xxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, explica que "há distinção entre sociedades e associações. As sociedades seriam as pessoas jurídicas compostas de número mais reduzido de pessoas e alvejariam fim econômico. As associações, ao contrário, se constituiriam de maior número de pessoas e teriam em mira fins de caráter não econômico ou ideais, como os fins morais, literários, pios e artísticos, dentre outros da mesma natureza." (in XXXXXXXX XXXXX, Xxxx xxx Xxxxxx. Ação Civil Pública Comentários por Artigo Lei 7.347, de 24.07.85. 2ª ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 1999). Da mesma forma, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx ensina que associação "é uma pessoa jurídica de direito privado voltada à realização de finalidades culturais, sociais, pias, religiosas, recreativas etc., cuja existência legal surge com a inscrição do estatuto social, que a disciplina, no registro competente." (in XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Coordenação FIUZA, Xxxxxxx. Novo Código Civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 67.)
5.8. Percebe-se daí que, para a doutrina, normalmente essa prestação diferenciada tem fins recreativos, de inclusão social, desportivos, científicos, culturais, morais etc. A atuação da CIDE em realizar a seleção e recrutamento de estagiários parece, todavia, se afastar das finalidades próprias das associações sem fins lucrativos para aproximar-se de uma atividade empresarial corriqueira, porquanto sua atuação dar-se-ia de forma idêntica a qualquer agente empresarial deste ramo de mercado.
5.9. Naturalmente, o posicionamento defendido pela CIDE no recurso administrativo é contrário ao nosso. Para a licitante recorrente, o fato de seus estatutos preverem a atuação da associação no recrutamento de estagiários seria suficiente para permitir sua contratação pela Adasa. Mas a questão não é tão simples.
5.10. O recente Acórdão 2.847/2019-TCU Plenário (publicado no Boletim Informativo 382/2019) tratou de forma bastante sistematizada sobre a impossibilidade de contratação de associações civis para objeto comum do mercado empresarial, mormente quando a atividade listada no estatuto da
associação será prestada sem nenhum elemento que diferencie sua prestação daquela que poderia ser executada por qualquer agente empresarial. Vejamos:
"É com base no art. 4º, inciso XXI, do estatuto da Abradecont, que a 1ª CJM e a entidade civil sem fins lucrativos buscam demonstrar que os fins colimados pela instituição se amoldam ao objeto da licitação em questão. Após analisar detidamente os autos, opino no sentido de que os termos contidos nos dispositivos retro citados [ou seja, no estatuto da Abradecont] são demasiado genéricos e serviriam para justificar a contratação da Abradecont em todo e qualquer tipo de ajuste que tenha como objetivo o fornecimento de mão de obra. A meu ver, ao inserir os termos “fomentação do setor terceirizado” e “busca do pleno emprego”, a entidade buscou dar ares de legalidade a uma situação que, na realidade, consiste na mera intermediação de mão de obra, serviço que pode ser prestado por qualquer empresa constituída para esse fim.
Nesse sentido, observo que, assim como as demais entidades empresárias que atuam nesse setor, a Abradecont, ao firmar contrato com a Administração Pública, iria buscar no mercado de trabalho pessoas estranhas à própria associação, contratando-os exclusivamente e unicamente para preencher as vagas previstas no edital, motivo pelo qual não vislumbro haver o alegado caráter de assistência social na atuação da entidade civil. (...)
Retornando ao caso concreto sob análise, reputo que a Abradencont, atual detentora de diversos contratos de fornecimento de mão de obra para a Administração Pública, os quais, somados, perfazem valor superior a R$ 20 milhões (vide tabela resumo à peça 67, p. 12-13), parece atuar como qualquer entidade empresária do ramo. Ainda que os termos “terceirização” e “emprego” estejam dispostos em seu estatuto, a atividade de mera locação de mão de obra para o Poder Público não se coaduna com o espírito estatutário da entidade de “empreender a assistência social”, “promover a defesa de direitos sociais” ou “defender direitos do consumidor e do trabalhador”.
Por conseguinte, assim como concluiu a unidade técnica, opino no sentido de que não poderia a Abradecont habilitar-se para participar do Pregão Eletrônico nº 4/2019, ante o claro desvio de finalidade havido na atuação da entidade. Veja-se que admitir a participação dessa associação em competição com entidades empresárias acaba por frustrar o caráter competitivo da atividade econômica, haja vista os benefícios fiscais a que fazem jus as pessoas jurídicas sem fins lucrativos. (...)
De um lado, é certo que não se deve conferir uma interpretação literal e restritiva ao termo “para fins não econômicos” contido no art. 53 do Código Civil, a ponto de vedar a contratação de associações civis sem fins lucrativos pela Administração Pública (...)
Entretanto, se as normas de regência e a jurisprudência deste Tribunal exigem que o objeto do contrato administrativo, nesses casos, não implique desvio de finalidade da associação sem fins lucrativos, é logicamente certo que o estatuto da contratada deva ter objetivos específicos, que lhe confiram uma identidade institucional, uma singularidade de propósitos, condição sine qua non para que se estabeleça, com razoável precisão, o nexo que se exige entre objetivos institucionais e objeto contratual.
Pois bem, no caso vertente, conforme demonstrado, as disposições estatutárias da Abradecont, notadamente aquelas descritas no art. 4º, inciso XXI, embora invocadas pelo órgão fiscalizado e pela referida associação como fundamento para a contratação questionada, possuem conteúdo demasiadamente aberto, o que, em tese, permitiria adequar sua finalidade
institucional a praticamente qualquer objeto de terceirização de serviços pretendidos pela Administração. Isso tornaria inócua a exigência de nexo específico entre o objetivo institucional da associação civil e o objeto do contrato administrativo.
Convém recordar que esse requisito – de nexo específico entre objetivos estatutários e objeto contratual – é necessário para estabelecer um discrimen mínimo entre as associações sem fins lucrativos e as sociedades empresariais, em relação às possibilidades de contratação com a Administração Pública. Do contrário, estar-se-iam criando condições não isonômicas entre ambas as espécies de licitantes, pois os primeiros, com menor carga tributária, ingressariam em uma ampla gama de certames em condições privilegiadas em relação aos últimos.
Também merece destaque o argumento do Parquet especializado no sentido de que, apesar de o estatuto da Abradecont mencionar, de forma genérica, os termos terceirização e emprego, “a atividade de mera locação de mão de obra para o Poder Público não se coaduna com o espírito estatutário da entidade de “empreender a assistência social”, “promover a defesa de direitos sociais” ou “defender direitos do consumidor e do trabalhador”, o que configura “claro desvio de finalidade”.
Dessa forma, a representação é parcialmente procedente, tendo em vista que os objetivos genéricos consignados no estatuto da Abradecont não permitem estabelecer o necessário e preciso vínculo com o objeto da contratação, sob pena de desvio de finalidade da referida associação civil sem fins lucrativos."
(destaques nossos)
5.11. Antes de passarmos à análise do Acórdão, é pertinente citar excerto do Parecer jurídico 0342/2019 prolatado pela Advocacia Geral da União junto ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que coaduna com a tese do Tribunal de Contas da União. Ainda que a AGU e Adasa estejam em esferas distintas, entendemos que o posicionamento do órgão jurídico Federal, bastante didático, merece ser citado:
"O raciocínio da 2ª Câmara do TCU reviu o Acórdão nº 5.555/2009, da mesma Câmara, para, por meio do Acórdão nº 7.459/2010-2ª Câmara, admitir que entidades sem fins lucrativos participassem de licitação, condicionando a participação à existência de nexo entre os serviços a serem prestados e os fins estatutários da entidade. Nesse diapasão, o que vedaria a participação de entidade sem fins lucrativos, seria a incompatibilidade entre suas finalidades/objeto e o objeto do certame, o que deve ser avaliado detidamente pelo Pregoeiro do certame. (...)
Então, no que concerne à participação de instituições sem fins lucrativos em certames licitatórios, com base na linha de raciocínio sedimentada pelo TCU, e pela jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, é de que não há vedação genérica à participação de entidades sem fins lucrativos em licitações, o que se exigirá, contudo, é que a Administração comprove, no caso concreto, na fase de habilitação, se a licitante, na qualidade de associação sem fins lucrativos, preenche as condições de atendimento do objeto da licitação. Em outros termos, se há compatibilidade entre o objeto da licitação e a finalidade meritória (atividade principal) de atuação da associação ou entidade, ou se apenas se trata de simples relação comercial entre o Poder Público e a pretensa contratada, em que se pode vislumbrar nitidamente o exercício de atividade empresarial, acobertada sob o manto e os benefícios de uma associação.
Portanto, em conclusão, orienta-se à Unidade responsável a proceder conforme orientação do TCU, consignada no Acórdão nº 1.633/2014 - Plenário, aferindo com cautela o objeto do certame e a finalidade precípua das licitantes realizando inabilitações caso o objeto do contrato e a forma de sua execução não possuírem, em caráter principal, qualquer finalidade meritória além da simples relação comercial entre o Poder Público e a contratada, mesmo que os serviços a serem prestados estejam previstos nos estatutos e objetivos sociais da entidade. Em outras palavras, firmado está o entendimento de que, nos certames licitatórios para a contratação de serviços de terceirização ou assemelhados, as entidades sem fins lucrativos, em especial aquelas constituídas sob a forma de Associação, não podem ser habilitadas pelo órgão contratante quando o objeto do contrato e a forma de sua execução não possuírem, em caráter principal, qualquer finalidade meritória além da simples relação comercial entre o Poder Público e a contratada, mesmo que os serviços a serem prestados estejam previstos nos estatutos e objetivos sociais da entidade, por caracterizar abuso de personalidade jurídica." (grifos nossos)
5.12. Pois bem. Os excertos citados acima dizem que a contratação de entidades sem fins lucrativos pelo Poder Público exige não apenas que a atividade esteja prevista no Estatuto Social da entidade, mas, principalmente, que essa previsão estatutária compreenda uma elemento diferenciador que, ligado a fins morais, religiosos, sociais, desportivos etc, explicite um modelo diferenciado de prestação de serviços que justifique a execução do objeto por uma entidade associativa. Noutras palavras: se a associação pretende executar o serviço de forma idêntica a qualquer empresa do setor, então sua contratação encerra mera relação empresarial, ilegal, portanto, por haver na espécie desvio de finalidade.
5.13. A título de exemplo, poderíamos observar haver um caractere distintivo nos contratos firmados pelo Poder Público junto à entidades de promoção do trabalho de egressos do sistema prisional, quando a relação com a Administração Pública não é meramente comercial, denotando também um claro intuito social de reintegração desses trabalhadores ao mercado. Outro exemplo: no ano de 2009 o Superior Tribunal de Justiça contratou serviços de terceirização junto à entidade que tinha como objetivo a integração de deficientes auditivos no mercado de trabalho (processo STJ 9185/2009, DOU de 26/10/2009, Seção 3, pág. 73). Haveria uma justificativa plausível, outrossim, na contratação de uma associação cuja finalidade fosse recrutar estagiários dentre estudantes de famílias comprovadamente carentes, como forma de promoção social, ou dentre estudantes deficientes físicos; mas não é o caso. No nosso Pregão 05/2021, não há esse critério diferenciador. A CIDE não se propõe a nada diferente do que um fornecimento comum de estagiários, recrutados de forma ampla e geral. A rigor, o serviço pode (e deve) ser contratado com qualquer sociedade empresária, mas não com a associação recorrente.
5.14. Então, podemos concluir que não basta que o estatuto social da associação empregue na descrição de seus objetivos finalísticos expressões genéricas como:
"Promover atividades culturais e educacionais que visem o desenvolvimento cultural e profissional"
"Atuar na qualidade de agente de integração de estágio, intermediando a relação entre partes concedentes e estudantes do Ensino Fundamental (nos últimos anos), Médio, Técnico, Profissional e Superior, contribuindo para a efetividade e aproveitamento do estágio, atendendo aos requisitos e direitos assegurados pela legislação específica;"
(Estatuto da CIDE, 60873183, págs. 18 e ss.)
5.15. Nos termos da orientação da Corte de Contas, é necessário avaliar se os objetivos sociais previstos no estatuto abarcam um elemento diferenciador, um caractere especial, capaz de justificar que o contrato seja firmado com uma entidade sem fins lucrativos. É justamente esse algo
"diferenciado" o discrimen entre o serviço prestado pela associação e o serviço que poderia ser executado por qualquer sociedade empresarial. E essa característica própria deve estar dentro da gama de atuação que é considerada legítima a uma entidade sem fins econômicos. A previsão genérica no estatuto da CIDE pode até ser suficiente para atender ao primeiro requisito do item 3.4 mas, de certo, não há elementos que nos permitam entender ter havido cumprimento do segundo requisito.
5.16. Durante a sessão pública virtual o Pregoeiro informou à CIDE sobre a necessidade de comprovação do tal "elemento diferenciador" e abriu prazo para que fossem juntados documentos. No entanto, a CIDE não apresentou a prova requisitada (tudo isso está registrado na Ata 60815615).
5.17. A mera inserção dos termos genéricos no estatuto social não transparece qual seria o elemento diferenciador do seu serviço. Esses objetivos, tal qual consta no estatuto, servem para justificar qualquer tipo de contratação, sem deixar claro o motivo pelo qual uma entidade sem fins lucrativos devesse executar o serviço. Nada impede, nesse caso, que CIDE simplesmente recrute quaisquer estudantes nas instituições de ensino e os aloque na Adasa, ou seja, a associação estaria agindo exatamente como um agente empresarial. Dito em outras palavras: a simples atividade de recrutamento de estagiários, de forma ampla, não tem relação com finalidades normalmente praticadas por associações civis. O mero recrutamento, sem nenhuma característica especial, encampa nada mais que uma relação estritamente comercial entre a associação e a Adasa. Esse tipo de relação é própria da atividade empresária e, portanto, incompatível com a atuação de associação civil sem fins econômicos, como é a CIDE.
5.18. Ademais, a CIDE apresentou com seus documentos de habilitação uma série de atestados de capacidade técnica emitidos por órgãos e entidades da Administração Pública (doc. 60873183, a partir da pág. 26) que de forma alguma corroboram sua pretensão recursal mas, muito pelo contrário, apenas reafirmam que a CIDE tem se aproveitado da sua condição de associação para vencer licitações - em desigualdade de condições em relação às sociedades empresárias vencidas nos certames - e firmar contratos vultuosos com o Poder Público, exercendo, ilegalmente, atividade empresarial.
5.19. Enfim, permitir que uma associação civil sem fins lucrativos seja contratada para a execução de um objeto eminentemente empresarial, seria, salvo melhor juízo, chancelar o abuso da natureza jurídica adotada pela CIDE, em detrimento da isonomia, princípio fundamental das licitações. Isto porquê, as empresas que participaram do pregão 05/2021 não gozam dos benefícios fiscais concedidos às associações civis sem fins lucrativos e, naturalmente, não podem competir com elas em pé de igualdade. Nos parece patente o desvio de finalidade perpetrado pela CIDE. A natureza jurídica associativa escolhida pela licitante para exercer atividade estritamente empresarial encerra expediente de elusão fiscal que prejudica não apenas as empresas que participaram do certame, como também toda a sociedade, privada do recolhimento tributário adequado.
5.20. A Adasa, frise-se, já enfrentou essa matéria anteriormente, quando do julgamento de recursos no Pregão Eletrônico 09/2020 (processo SEI 00197-00004957/2019-84), oportunidade na qual esse mesmo entendimento foi adotado pelo Pregoeiro e confirmado pela Diretoria Colegiada que, xxxxx, tinha outra composição à época. A legislação, doutrina e jurisprudência, no entanto, permanecem inalteradas, motivo pelo qual o Pregoeiro mantém seu entendimento acerca do tema.
5.21. Antes de encerrarmos, cumpre ressaltar que a CIDE, no último parágrafo da sua peça recursal, ameaça levar este caso ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas. Nos permitimos acrescentar que, além dos órgãos citados pela CIDE, recomendamos que o caso seja levado também à Receita Federal e à Secretaria de Fazenda do Município de Salvador (sede da CIDE) já que, a se confirmar o desvio de finalidade da associação, as autoridades tributárias deverão ter conhecimento dos fatos.
5.22. Diante de todo o exposto, sem razão à recorrente.
6. DA CONCLUSÃO E DO ENCAMINHAMENTO
6.1. Com fundamento no art. 17, VII do Decreto no 10.024/2019 (recepcionado no Distrito Federal pelo Decreto Distrital nº 40.205/2019), o Pregoeiro conhece do recurso apresentado por CIDE – CAPACITAÇÃO, INSERÇÃO E DESENVOLVIMENTO e, no mérito, julga-o improcedente, mantendo a
decisão prolatada na sessão pública virtual, que inabilitou a recorrente, recusou sua proposta e a desclassificou do Pregão Eletrônico 05/2021.
6.2. Nos termos do art. 13, IV do Decreto nº 10.024/2019 c/c arts. 82 e 85 do Regimento Interno da Xxxxx, a presente decisão deve ser remetida à Diretoria Colegiada para exame e prolação de decisão final, em última instância recursal.
6.3. Em face do iminente vencimento do atual contrato de agenciamento de estagiários, sugerimos que, por questão de celeridade, a Diretoria proceda à adjudicação e à homologação do certame no caso de que a decisão do Pregoeiro seja mantida. Caso contrário, solicitamos a devolução dos autos à COLC/PREGOEIROS.
6.4. De todo modo, lembramos ao Sr. Diretor Presidente e necessidade de que a decisão final seja registrada no sistema Comprasnet.
Brasília, 12 de maio de 2021.
XXXXXXX XXXXXX XXXXXXX
Pregoeiro
Documento assinado eletronicamente por XXXXXXX XXXXXX XXXXXXX - Matr.0185049-0, Pregoeiro(a), em 12/05/2021, às 13:30, conforme art. 6º do Decreto n° 36.756, de 16 de setembro de 2015, publicado no Diário Oficial do Distrito Federal nº 180, quinta-feira, 17 de setembro de 2015.
A autenticidade do documento pode ser conferida no site: xxxx://xxx.xx.xxx.xx/xxx/xxxxxxxxxxx_xxxxxxx.xxx? acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0 verificador= 61651968 código CRC= 212CAA39.
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00197-00000349/2021-15 Doc. SEI/GDF 61651968