ALEX BASTOS COSTA HADASSAH LAÍS S. SANTANA WILSON B. ALMEIDA
O não cumprimento dos contratos de licença e uso de software e sua distribuição indevida por não detentor de direito autoral
XXXX XXXXXX XXXXX HADASSAH LAÍS S. XXXXXXX XXXXXX X. ALMEIDA
Sumário
1. Introdução. 2. Conceitos e especificações dos contratos de software. 3. Legislação brasileira. 4. A distribuição indevida do software e a efetividade do contrato de licença e uso. 5. Análise do Recurso Especial no 913.008
– RJ. 6. Conclusão.
1. Introdução
Xxxx Xxxxxx Xxxxx é bacharelando pelo Centro Universitário Euro-Americano (DF).
Xxxxxxxx Xxxx Xxxxxxx é mestranda pela Universidade Católica de Brasília e professora.
Xxxxxx Xxxxxxx é pós- doutor pela University of Wisconsin-Madison/ Georgetown University, diretor da Escola de Direito da Universidade Católica de Brasília e professor da mesma universidade.
O grande avanço tecnológico tem proporcionado mudanças em diversas áreas da sociedade, como a rede de telefonia, o comércio de eletrônicos, cinema, arte, cultura. Boa parte dos estabelecimentos em que estamos inseridos hoje possuem tecnologia ligada às suas atividades, como os smartphones que se tornaram gerenciadores de vidas, as televi- sões que ocupam espaço nas salas de espera de consultórios ou o uso de computadores que movimentam grandes companhias.
A interação da sociedade com o mundo cibernético é muito maior do que há 15 anos. Hoje já é possível realizar compras de qualquer lugar do mundo sem precisar sair de casa, bastando apenas ter acesso à internet e um cartão de crédito. A rede mundial de computadores permite que seus usuários possam comunicar-se de maneira mais rápida e cômoda, encurtando distâncias que antes eram barreiras.
Com o crescimento da internet e das aplicações de smartphone, cada vez mais os usuários realizam ações e gerenciam suas vidas com o clique
num mouse ou um toque na tela de um celular. A evolução permitiu que os computadores se tornassem algo indispensável na sociedade.
Nesse universo fascinante que é o mundo cibernético, surge a necessi- dade de o ordenamento jurídico tutelar, de forma eficaz, os direitos, seja daqueles que utilizam as ferramentas disponibilizadas, seja daqueles que as criam, como os desenvolvedores de software.
A Lei de Direitos Autorais (BRASIL, 1998a) e a Lei do Software (BRASIL, 1998a) tutelam direitos e dão providências àqueles que não cumprirem o que elas regulam; porém, a pirataria no Brasil já faz parte do mercado e tem crescido de forma exorbitante com o passar dos anos, sendo os criadores de software aqueles que mais tiveram seus direitos violados.
Neste artigo, apresenta-se a dificuldade do ordenamento jurídico brasileiro em tutelar, de fato, os direitos do autor de software, de acordo com as legislações atualmente em vigor. Destaca-se também a eficácia do cumprimento das legislações na punibilidade dos agentes causadores da pirataria.
A grande maioria dos usuários de software não se preocupa com os termos de licença do programa. No ambiente domiciliar e corporativo, a cada dia são realizadas ações ilegais para adquirir licenças de uso. Esse comportamento decorre da ideia de que, uma vez que paga pelo programa de computador, o usuário passa a deter sua propriedade, o que não é ver- dade, já que o software, em sua maioria, não é vendido, apenas licenciado. Cada vez mais os contratos de licença e uso passam despercebidos pelos usuários, que não se preocupam com os termos aos quais estão vinculados. Há 20 anos, essa situação seria completamente reprovável; afinal, como se poderia concordar com algo que não se sabe do que se trata? Aceitar um termo de uso sem ler é o mesmo que assinar um contrato
sem saber o que está estipulado.
No primeiro item, abordam-se os conceitos técnicos, indicando quais os tipos de software e os contratos que o têm como objeto jurídico, destacando ainda, os princípios que fazem parte das relações contratuais. No segundo item, trata-se dos conceitos que envolvem o direito auto-
ral e a pirataria, juntamente com a natureza jurídica do software, dando espaço também para a apresentação da sua titularidade e como se dá a violação da propriedade jurídica.
O terceiro item apresenta as formas de distribuição indevida do sof- tware, indicando como estas acontecem em seus meios e destacando a efetividade dos contratos de licença e uso de software que estão inseridos dentro dos programas.
O quarto e o último itens, apresentam um julgado do STJ que trata de uma situação de suposto não cumprimento do contrato de licença
e uso, em que se deve verificar, por meio de provas, se houve ou não o descumprimento do contrato.
2. Conceitos e especificações dos contratos de software
O software é caracterizado como um “conjunto de programas e pro- cedimentos que permitem o processamento de dados no computador e comandam para o seu funcionamento, segundo os objetivos do usuário” (WALD, 1985, p. 407).
A Lei no 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei do Software), conceitua os programas de computador, em seu art. 1o, como:
“a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.”
A legislação em vigor no Brasil não diferencia a expressão “programa de computador” e software. As palavras revelam conceitos diferentes; porém, no dia a dia, tornaram-se semelhantes entre si, já que comumente são utilizadas de forma errônea em contextos diferentes.
O “International Bureau of the World Intelectual Property Organization divide o software em três categorias: [...] o programa de computador, [...] a descrição do programa [...] e o material de apoio ou suporte” (WALD, 1985, p. 408). Dessa forma, é possível observar que o software apresenta uma conceituação muito mais abrangente do que a expressão “programa de computador”, já que abarca outros dois itens.
Xxxxxxx Xxxx (1985, p. 407) destaca que:
“O programa de computador, tal como legalmente definido no direito norte-americano, constitui um conjunto de afirmações e instruções para serem utilizadas, direta ou indiretamente [...]. O software é constituído por um conjunto de instruções, expressando idéias, as quais são veicu- ladas mediante a gravação num bem tangível, como, por exemplo, um disquete ou uma fita magnética ou uma pastilha semicondutora. Assim, a substância do software é intangível, embora sua expressão e veiculação sejam processadas em bens tangíveis.”
A confusão no entendimento dos conceitos é comum, seja porque não há o conhecimento dos termos técnicos da área específica, seja porque o avanço tecnológico entrou de forma brusca na vida das pessoas, que ainda não se adaptaram a tantas e novas terminologias. Todos os softwares que utilizamos em notebooks e desktops, como Word, Excel, Photoshop, são
programas de computador, que acompanham uma documentação necessária, instruções e uma licença de uso. De forma conceitual e técnica, o programa de computador não é um software, mas sim parte deste.
De acordo com Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (CER- QUEIRA, 2000, p. 67-69), os softwares se divi- dem em três tipos: software sob encomenda, o de prateleira e o de mercado de nicho. O software sob encomenda é aquele desenvolvido de acordo com as necessidades, requisitos e especificações indicadas pelo contratante, ou seja, é o software criado da maneira que o cliente exige, com todas as qualidades, padrões, tamanhos e dados con- tidos no contrato. Os contratos de licença e uso são redigidos cuidadosamente, pois, dependen- do da maneira como as cláusulas forem escritas, e também, como, onde e com quais ferramentas o software for criado, quem deterá os direitos sob este será o contratante, e não quem realmente escreveu os comandos do programa, como preceitua o art. 4o da Lei 9.609/1998:
“Art. 4o Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de compu- tador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatu- tário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servi- dor seja prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos” (BRASIL, 1998a).
Os casos mais comuns na fabricação desse tipo de software são aqueles criados especial- mente para determinadas empresas. Exemplos: uma rede bancária que utilize um programa de computador próprio para o gerenciamento de contas de clientes; companhias de carros que se utilizem da ferramenta para controlar as vendas; ou até mesmo tribunais que utilizem sistemas
próprios de gerenciamento de processos judi- ciais eletrônicos.
O software de prateleira é aquele que pode ser adquirido em qualquer loja especializada, e cuja licença permite apenas o seu uso. É defini- do como “programa de computador produzido em larga escala de maneira uniforme e colocado no mercado para aquisição por qualquer inte- ressado sob a forma de cópias múltiplas” (MI- CHETTI, 2006). O nome é devido aos softwares que ficam expostos nas prateleiras das lojas de informática, onde o cliente apenas escolhe o produto e adquire-o. Com a atual tecnologia e o crescimento do comércio eletrônico, a compra de software não precisa necessariamente ser realizada em lojas físicas. Ela pode ser efetuada na rede mundial de computadores e diretamente dos sites das empresas; em vez de se receber um CD físico em casa ou retirá-lo em lojas, o adquirente efetua o download do software por meio de um site, após realizar o pagamento. Como exemplo, temos os famosos produtores e editores de texto do pacote Microsoft Office e os editores de imagens e vídeos da Adobe, que ocupam boa parte das vitrines de lojas por todo o País.
O software de mercado de nicho é o software criado para um determinado grupo de pessoas, faculdades, companhias. Na maioria das vezes, já se encontra pronto ou pré-pronto, precisando apenas de alguns upgrades, ajustes e que seja instalado nas máquinas. É o caso do software criado para gerenciar as vendas de um deter- minado estabelecimento, como uma pizzaria. A empresa contratante paga pela licença de uso. Os criadores, por sua vez, já possuem um programa de computador que atenderá as ne- cessidades de venda da pizzaria, mas que não foi criado exatamente para aquele estabelecimento. Caso outra empresa entre em contato com os criadores, apenas se farão atualizações ou ajustes para que o novo software seja utilizado
pelo novo cliente. Com a atual tecnologia que os criadores de programas detêm, esse tipo de software vem ganhando grande visibilidade. Por ter um público alvo mais amplo, mais empresas têm desenvolvido esse tipo de software.
O escritor Xxxxxxxx Xxxx (2004, p. 230- 232), indica quais são os contratos que têm o software como objeto do negócio jurídico:
Os contratos de distribuição, revenda ou re- presentação de software são contratos realizados entre a empresa que cria os software (softhouse) e um representante. Normalmente, nesse con- trato constam cláusulas que não permitem que o representante nomeie outros representantes ou revendedores.
Os contratos de desenvolvimento de sistema por encomenda são os estipulados por deter- minada empresa que contrata uma companhia de fabricação de software para produzir um programa de computador que atenda a todas as especificações do contratante. São os contratos-
-alvo do tipo de software sob medida, já citado. O contrato de edição consiste em realizar um serviço em que determinada empresa (dis- tribuidora) se dispõe a assumir a responsabili- dade pela estrutura comercial dos programas de computador criados por outras empresas. Essa responsabilização vai desde a criação das em- balagens dos programas de computador e dos banners de divulgação, até o levantamento de stands e lojas alvo para a divulgação do produto. Os contratos de manutenção de computador são os celebrados entre os técnicos e contra- tantes, e nos quais geralmente são estipuladas visitas periódicas para a atualização e manu- tenção do software, de forma a evitar futuros erros ou travamento durante a utilização pelos
funcionários.
O contrato de licença é o contrato pelo qual “o titular de um direito sobre uma coisa incorpórea (licenciante) proporciona a outrem (licenciado) o uso desse direito ou de uma fa-
culdade desse direito. Na maioria dos casos, o direito de uso é temporário e remunerado” (AL- MEIDA, 2007, p. 220). Nesse tipo de contrato, o usuário não se torna proprietário da obra, mas tem apenas uma licença (permissão) para o uso da obra, de forma não exclusiva. O usuário não pode transferir, comercializar, doar, arrendar, alienar ou sublicenciar o produto a outra pessoa. O licenciado não é dono do produto, ele apenas usufrui das funções que a obra oferece, sem direitos de transferência de qualquer tipo, seja por mídias físicas (CDs, HDs, pendrives), seja por meio eletrônico (compartilhamento pela rede mundial de computadores).
3. Legislação brasileira
Há um ramo jurídico destinado a proteger os direitos dos criadores de obras, tanto as tan- gíveis quanto as intangíveis. Tudo o que pode ser inventado é disciplinado e regulado pela propriedade intelectual e pela lei de direitos autorais.
Os programas de computador são definidos pela Lei no 9.610/1998, em seu artigo 7o, como “obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro [...]”. Ainda de acordo com essa lei, as obras são “objeto de legislação específica, observadas as disposições desta lei que lhes sejam aplicáveis” (BRASIL, 1998b).
A Lei no 9.609/1998 (Lei do Software) foi criada para regular as atividades que envolvam software, desde seus conceitos e prazos, até as cominações legais para aqueles que não cum- prirem com o que foi acordado. O contrato de licença está disposto no Capítulo IV – Dos Contratos de Licença de Uso, de Comerciali- zação e de Transferência de Tecnologia, do seu artigo 9o ao 14:
“Art. 9o O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença. Parágrafo único. Na hipótese de eventual ine- xistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisi- ção ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso.
Art. 10. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respecti- vos pagamentos e estabelecerão a remune- ração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior.
§ 1o Serão nulas as cláusulas que:
I – limitem a produção, a distribuição ou a comercialização, em violação às disposições normativas em vigor;
II – eximam qualquer dos contratantes das responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos de autor.
§ 2o O remetente do correspondente valor em moeda estrangeira, em pagamento da remuneração de que se trata, conservará em seu poder, pelo prazo de cinco anos, todos os documentos necessários à comprovação de licitude das remessas e da sua conformidade ao caput deste artigo.
Art. 11. Nos casos de transferência de tecno- logia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros. Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial des- critivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados téc- nicos necessários à absorção da tecnologia” (BRASIL, 1998a).
A partir deste artigo, é possível identificar a importância dos contratos que regulam os
softwares e neles estão estipuladas todas as permissões e restrições do usuário a respeito do programa adquirido.
Quanto à proteção dos direitos do autor, a lei disciplina em seu art. 2o, § 5o, do Capítulo II – Da Proteção dos Direitos do Autor e do Registro:
“Inclui-se dentre os direitos assegurados por esta Lei e pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País aquele direito exclusivo de autorizar ou proibir o aluguel comercial, não sendo esse direito exaurível pela venda, licença ou outra forma de trans- ferência da cópia do programa” (BRASIL, 1998a).
Portanto, apenas o autor do software pode dispor da obra da maneira que desejar. Somente ele pode vender, comercializar, transferir ou au- torizar que qualquer outra pessoa o faça, sendo que seu direito de autor não se acaba quando ocorre a venda, licença ou a transferência do programa.
De acordo com o que dispõe o art. 7o, in- ciso XII, da Lei no 9.610/1998 (Lei de Direitos Autorais), os programas de computador têm natureza jurídica de direito autoral dessa forma, não há como se falar em compra e venda de software, pois o que é adquirido é apenas uma licença de uso e não o direito exclusivo sobre o software.
“O software é tutelado internacionalmente como obra literária, sendo, portanto, admissí- vel a aplicação das normas de proteção à obra intelectual, da qual a obra literária é uma das suas espécies” (XXXXXXXXX, 2011, p. 164).
Os direitos autorais são regulados pela Lei no 9.610/1998. A Constituição, no art. 5o, inci- so XXVII, dispõe que “aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras [...]”. A lei “abrange todas as relações que envolvam negócios entre
autores e aqueles que comercializam, por qual- quer meio ou forma, obras de engenho e arte” (XXXXXX, 2009, p. 49).
De acordo com Xxxxxxxxx Xxxxxxx, o direito de autor é o “conjunto de prerrogativas que a lei reconhece a todo criador intelectual sobre suas produções literárias, artísticas ou científicas [...]”. Xxxxxxx (2003, p. 28) destaca ainda que:
“[...] predomina na doutrina o entendimen- to de que o direito de autor é um direito sui generis, uma vez que a sua natureza é moral – classificado como direito da perso- nalidade – podendo, no entanto, produzir efeitos patrimoniais – que se aproximam do direito real – distintos entre si. [...] a partir do momento em que o autor decide publicar sua obra, um direito patrimonial aparece e irá viver de uma maneira própria, porque o próprio fato da publicação confere ao escritor e ao artista a possibilidade de se dedicar a uma exploração pecuniária da obra, através da reprodução ou execução, conforme o caso. [...] essas prerrogativas pecuniárias e morais se desenvolvem separadamente, mas de tal forma que as segundas possam, às vezes, se opor ao curso das primeiras, para que seja assegurada a salvaguarda dos interesses espirituais do autor.”
Xxxxxxxxx (2011, p. 321) aduz que o “sis- tema de proteção dos direitos autorais se baseia ainda na tutela do autor e na não utilização de sua obra, exceto mediante expressa autoriza- ção legal ou com seu consentimento”. Xxxxxxx (2003, p. 24) completa: “Os autores das criações intelectuais, seja no âmbito da técnica, ou no puramente estético, adquirem direitos exclusi- vos sobre suas produções, independentemente do valor técnico ou artístico que apresentem”.
A titularidade do software diz respeito àquele que detém a propriedade intelectual do programa de computador e que pode comer- cializar sua obra. O titular do direito de autor do software é o seu criador, exceto quando
objeto de contrato de trabalho ou de prestação de serviços. Os programas de computador de- senvolvidos durante a vigência de contrato de trabalho ou de prestação de serviços, pertencem exclusivamente ao empregador ou contratante de serviços, exceto se o criador houver firmado contrato que estipule o contrário. Portanto, os programas que dentro do ambiente de trabalho, com as ferramentas da empresa e/ou para a empresa, pertencem ao empregador do esta- belecimento, como preceitua o art. 4o da Lei no 9.609/1998:
“Art. 4o Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de compu- tador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatu- tário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servi- dor seja prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos” (BRASIL, 1998a).
Caso queira, o criador pode registrar o pro- grama de computador, nos termos do decreto no 2.556/1998 e normas do INPI (Instituto Na- cional de Propriedade Intelectual). Esse registro serve para comprovar quem é o criador do programa de computador. “O titular de direito é o criador, que concebe e materializa a obra, qualquer que seja sua idade, estado ou condição mentais, inclusive, pois, os incapazes, de todos os níveis” (XXXXXXXXX, 2004, p. 30).
O direito de exclusividade dos direitos autorais de software é de 50 (cinquenta) anos contados a partir de 1o de janeiro do ano seguin- te ao da sua publicação. Durante esse período, apenas o criador do software pode autorizar a sua utilização por meio do Contrato de Licença e Uso, e, na ausência deste, do “documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia
[...] para comprovação da regularidade de seu uso”, de acordo com a Lei no 9.609/1998.
O criador do software pode, também, au- torizar a comercialização e a transferência da tecnologia. Para esse ato, é necessário o registro dos contratos de transferência de tecnologia junto ao INPI, para que produza efeitos em relação a terceiros. Ressalte-se que ter contrato de licença não autoriza o licenciado a utilizar o software para comércio ou distribuição, a não ser que o criador autorize tal prática.
A violação da propriedade intelectual do software dá-se quando alguém expõe à venda, se apropria, reproduz, vende, introduz no País, adquire, oculta ou possui guardado, cópia ou software original sem a expressa autorização do autor ou do representante do mesmo.
Com o grande avanço tecnológico, os pro- gramas de computador podem ser facilmente copiados ou transmitidos de uma máquina para a outra, por meio de CDs e discos removíveis (pendrives ou HDs externos) e remetidos a outras pessoas, sem o devido pagamento pelo uso do programa e sem a preocupação pelos prejuízos que esse ato pode causar ao patrimô- nio do criador do software e também para a economia do País.
Parte dos usuários de software pensa que, se o programa foi adquirido de forma legal, seja em loja especializada, seja pela internet, o adquirente detém o direito de sua distribuição. Com esse pensamento, o usuário salva apenas uma cópia do programa em um pendrive e envia-o para seu amigo. No momento em que este decide salvar uma cópia daquele programa para enviar a outras pessoas (com a intenção de auferir lucro ou não), está violando a proprie- dade intelectual do autor, já que não tem per- missão para efetuar essas transações. A licença, em regra, é apenas para um computador, exceto quando o contrato de licença e uso de software estipular o contrário.
Porém, como os usuários saberão as cláusu- las dos contratos às quais estão se vinculando, se nem mesmo leem o que está escrito antes de clicar no botão “aceitar”? Pouquíssimas pessoas importam-se com adquirir licenças de software e estar dentro da lei; afinal, com a pirataria, é muito mais fácil e cômodo procurar por versões que podem ser baixadas da internet, de graça, e que apresentarão as mesmas funções da versão paga. Não há conscientização dos usuários de computador quanto à importância das cláusu- las dos contratos dos software às quais estão se vinculando, muito menos quanto a preocupar-
-se com o saber se o criador está obtendo ou não lucro pelo programa criado. A facilidade da ilegalidade é muito mais efetiva quando se trata de adquirir programas de forma rápida.
Após todas essas etapas e atos, é perceptível que não há o cumprimento do contrato de li- cença e uso de software por parte daqueles que utilizam programas de computador. Muitos até desconhecem que esse contrato existe e que, ao clicar nos botões de “avançar” e/ou “aceitar”, estão vinculando-se às cláusulas completamente desconhecidas. Criou-se um comportamento de que estes contratos e termos não são importan- tes. No geral, os contratos são grandes, já que regulam todas as atividades referentes àquele programa de computador, desde os direitos do criador até os direitos do licenciado. Pelo fato de os contratos serem grandes, 95% dos usuários leem apenas o primeiro parágrafo e descem a barra de rolagem do mouse ou da página para avançarem com os procedimentos.
Essa atividade não é exclusiva de pessoas físicas que instalam programas de forma inde- vida em suas casas. No meio corporativo não é diferente: é grande a quantidade de empresas que se utilizam de meios não legais para burlar as taxas de impostos e custos altos gerados a partir da compra de um software original. Por vezes, isso acontece porque as empresas não se
sentem coagidas por um poder maior ou por um órgão especializado, a cumprirem o que determina a lei:
“O uso ilegal de programas de computador (software) para uso empresa- rial é uma das práticas mais comuns de pirataria corporativa. Para quem não sabe, a compra, aquisição e/ou utilização de software pirata sem as licenças de uso do programa é considerada crime, com punição de seis meses a dois anos de detenção. O uso de software ilegal, além de sujeitar as empresas a irremediáveis prejuízos quanto à imagem perante o mercado, ainda pode ser objeto de condenações penais e vultosas indenizações materiais. No dia a dia, quem pratica pirataria não tem direito a suporte do produto, nem a garantias ou atualizações, ficando sempre na chamada ‘clandestinidade’” (MANARA, 2008).
As leis de direito autoral e de software têm sido pouco eficazes na coerção de usuários mal intencionados na internet. Com tamanho avanço tecnológico, é quase impossível criar um meio de restringir downloads, acessos a sites ou impedir o compartilhamento de arquivos: caso aconte- cesse, contradiria o propósito com o qual a internet foi criada: o aumento ao acesso a informação.
Um problema grave que tem tomado grandes proporções é a quan- tidade de informações disponibilizadas por dia na rede mundial de computadores. O combate à pirataria não pode violar o direito dos usuários de possuírem a informação ao seu favor. O compartilhamento de programas de computador na internet raramente é visto como não ético pelos usuários, já que quem pirateia pouco se importa com o que o criador deixou de ganhar com ou com o que perdeu.
De acordo com um estudo realizado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), de 10,6 milhões de “baixadores” pesquisados, 81% (8,62 milhões) foram considerados piratas, o que corresponde a um total de 41% do total de pessoas que usam a internet no Brasil (IPEA, 2012, p. 15). Ou seja, quase metade de toda a população brasileira está envolvida com a pirataria no mundo digital, o que inclui softwares, músicas, filmes e séries de TV.
Para que haja maior proteção ao criador do software e o cumprimento eficaz das propostas elencadas nos contratos de licença e uso, é neces- sário frear o avanço da pirataria no mundo cibernético, que já tomou proporções tão grandes que hoje é quase impossível criar obras que não serão alvo de pirataria.
A legislação brasileira é completamente falha em relação à proteção dos direitos morais e autorais das obras, não somente dos softwares, mas também de músicas, filmes e séries de TV. A lei do software e de direitos autorais foi criada com a função de regular os direitos dos criadores e de punir aqueles que os descumprirem, o que de fato, não acontece.
Pouco se escuta falar a respeito de punições ou indenizações que dizem respeito à pirataria de obras digitais.
Em regra, os contratos de licença e uso de software acompanham cláusulas que proíbem que sejam utilizados outros programas de computador para efetuar engenharia reversa1. Quando ela é utilizada, há quebra no sigilo de informações confidenciais do programa.
Xxxxxx Xxxxxxxxx (2002, p. 43) afirma que:
“Concebido um programa e colocado no mercado, é possível que o concorrente não se contente em, simplesmente, adotar a idéia e trabalhar na concepção do seu próprio programa, e venha a destrinchar o programa, efetivamente copiando diversas de suas linhas de instruções principais ou acessórias, efetuando algumas ou várias mo- dificações justamente para descaracterizar a reprodução ilegal. Neste caso é que se torna fundamental a boa atuação do advogado desde o início da demanda, de modo que as conclusões dos peritos somadas ao poder de apreciação das provas pelo Juiz é que irão ditar o ruma da procedência ou não da ação.”
O uso da engenharia reversa na fabricação de novos programas é legalmente aceita quando aplicada a programas de computador não mais utilizados ou abandonados pelos seus desen- volvedores.
Ao longo dos anos, mais e mais usuários criam programas de engenharia reversa para estudar e/ou copiar códigos de outras aplicações e, dessa forma, fabricar um novo programa a partir do software copiado. A prática é legal no Brasil com a ideia de que a engenharia reversa é importante na fabricação de novos produtos
1 É o ato obter acesso não autorizado aos recursos do software, destrinchando o programa de maneira a entrar na sua base de dados e verificar suas linhas de comando, podendo, assim, alterá-las ou copiá-las da maneira como desejar, seja para gerar um novo programa seja para me- lhorar o atual.
e que ajuda o desenvolvimento tecnológico, o que não é mentira, mas também instiga cada vez mais os usuários mal intencionados a des- truírem o sigilo de informações dos criadores dos programas, rompendo mais uma vez com os direitos de autor.
Os contratos de licença e uso de software contêm claras e específicas restrições para impe- dir a divulgação das informações confidenciais do software; afinal, não haveria finalidade em proteger o direito de autor se qualquer outra pessoa pudesse copiar o que ele criou. No Brasil, os usuários de software não se sentem suficien- temente intimidados para não realizarem atos ilegais contra a propriedade intelectual do autor. O ordenamento jurídico brasileiro, junta- mente com as leis de direito autoral e de software não conseguem bloquear ou conter esses atos de violação, que já se tornaram práticas abusivas e infelizmente comuns em todo o território
nacional.
A pirataria na internet é algo que infelizmen- te tornou-se comum na sociedade moderna. A propagação de programas de computador sem licença ou em cópias ilegais, se dissemina como um vírus, já que, uma vez na internet, a cópia se multiplica de forma viral por todo o mundo, fazendo com que a indústria de software e seus criadores percam rios de dinheiro. Isso atrapa- lha o desenvolvimento de novos programas, já que os patrocinadores não se sentem seguros de investir seu dinheiro em algo que não terá lucro.
A pirataria é uma prática ilícita onde ocorre a reprodução ilegal de uma obra, sem a auto- rização expressa do titular da mesma. No caso dos softwares, a pirataria acontece quando são efetuadas cópias de um programa de compu- tador ou quando o usuário mantém cópias de forma ilegal e sem as licenças de uso.
É importante frisar que, quando o consu- midor adquire um programa, ele de fato não compra o programa exclusivamente para si.
Na verdade o que ele adquire é uma licença para o uso do programa e esta licença dá direito apenas a instalação em uma máquina, ou o que o contrato de licença estipular. Mesmo que o usuário tenha adquirido uma cópia original do programa, ele não possui direito nenhum de explorar economicamente o software (fazer cópias para venda, revenda, aluguel ou empréstimo) a não ser que o titular da obra tenha apresentado a de- claração expressa de que o consumidor pode realizar tal ato.
A legislação vigente permite que o usuário que adquire um software, possa realizar uma cópia de backup apenas por segurança e para o seu próprio uso, como destaca Xxxxxxxx Xxxxxxxxx (2001, p. 138):
“Não se considera, no entanto, pirata - de acordo com a legislação vigente
- a cópia única, realizada em casa, para uso exclusivamente pessoal. Se esta cópia, porém, sair de casa para ser produzida, alugada, trocada, exi- bida publicamente, ou de outra qualquer forma utilizada sem a expressa autorização dos respectivos titulares, aí sim, ela se torna pirata.”
Com a variedade de programas existentes, é quase impossível que uma empresa de software possa verificar todos os clientes que possuem cópias ilegais ou que já reproduziram ilegalmente o programa. A maioria dos usuários acaba não somente copiando o programa, mas também distribuindo-o de forma indevida para outras pessoas, e em maior escala, compartilhando com toda a rede mundial de computadores.
A cópia de segurança deve ser feita e instalada no mesmo computador do que a original, pois, caso seja instalada em outra máquina, também será constatada a pirataria.
Muitos contratos de licença e uso de software contêm cláusulas que permitem a seus usuários realizar cópias, desde que possam ser seguidas as normas estabelecidas nos contratos.
Com a atual tecnologia, é muito fácil realizar cópias fiéis de progra- mas de computador. O grande compartilhamento de dados e arquivos na internet surge como um grande rival da proteção de direitos autorais, pois, por meio da internet, pode-se distribuir qualquer arquivo por todo o mundo, sem precisar de qualquer meio físico, como embalagens, encartes ou suporte técnico.
No Brasil, não há suficiente investimento em pesquisa e tecnologia, e os poucos que se formam em engenharia de software não permanecem no País, já que, como a pirataria se apoderou do mercado de venda de software, o valor que é recebido em vendas é quase ínfimo. O preço alto de um produto original ou a sua não disponibilidade no mercado estimula o consumo de produtos piratas. Se a pirataria é grande, os softwares neces- sitam ser vendidos a preços altíssimos, o que provoca a revolta do consu- midores, que preferem baixar os programas de forma ilegal na internet.
De certa forma, a alta tributação brasileira é uma grande vilã no au- mento da pirataria dos programas de computador. Se os softwares sofrem alta tributação, o público alvo destes diminui bastante, já que poucas pessoas teriam condições financeiras de adquirir o software aos preços altíssimos em que são disponibilizados no país. Assim, estes se tornam bens de preços incompatíveis para os usuários aos quais são destinados, por este motivo, é mais fácil, conveniente e cômodo, quebrar os contratos de licença de uso de software e disponibilizar, distribuir e compartilhar o programa de forma indevida na internet.
4. A distribuição indevida do software e a efetividade do contrato de licença e uso
A instalação de programas de computador de forma indevida em computadores é um fato comum na sociedade moderna. Algumas pessoas ainda adquirem licenças de uso originais. A maneira como o software é distribuído – indevidamente no meio tecnológico (por cópias em CDs, por armazenamento em pendrives ou por compartilhamento na rede mundial de computadores) – gera muitos problemas para o seu criador, para o usuário do programa pirata e para o País.
Com a globalização e o atual avanço tecnológico, é difícil encontrar alguém que não tenha um computador em seu domicílio ou que não o uti- lize para diversão, simples navegação ou trabalho. Entre os mais variados usuários, é quase impossível encontrar alguém que não tenha instalado um programa de computador de maneira indevida (não pagando pela licença de uso e nem pelo suporte técnico do programa).
A distribuição indevida dá-se quando o usuário que adquire o software (baixado de forma ilegal na internet ou comprado legalmente em lojas virtuais ou físicas) se vê no direito de distribuir o programa de compu- tador para outras pessoas, com a intenção ou não de auferir lucro. Essa distribuição pode ocorrer por meio de CDs piratas, gravações em discos rígidos externos ou pendrives. Em momento algum o usuário é detentor do direito autoral do software para distribuí-lo da maneira que desejar. Porém, essa prática é normal no mundo cibernético.
São poucas as pessoas que se dispõem a investir em programas de computador originais e pagos. Alguns sistemas operacionais já conseguem gerar um novo comportamento no usuário, como o da empresa Apple, o OS Mavericks, que disponibiliza, em seu aplicativo iTunes, programas razoavelmente baratos, que desempenham funções espetaculares e acom- panhados de suporte técnico online e contrato de licença (APPLE, s.d.). No mundo corporativo, a situação que envolve a distribuição indevida não é muito diferente. É impossível abrir uma empresa sem computadores
e sem programas para realizar as atividades. É de se esperar que as empresas, por serem pessoas jurídicas e possuírem grande quantia de bens e valores a zelar, agissem de forma justa e dentro da lei, adquirindo licenças dos programas de computador que utilizam den- tro do seu estabelecimento. Porém, a história repete-se da mesma maneira com as pessoas físicas. Os donos ou funcionários instalam os programas de computador sem licenças reais, visando, dessa forma, a não pagar por impostos referentes ao software original e a economizar nas despesas da empresa. O pensamento dos donos é que não há necessidade de pagar tão caro por um programa de computador, se há a opção de baixá-lo de graça na internet e utilizar as mesmas funções do programa pago.
Em algumas companhias, os softwares são instalados por meio de uma rede local. O con- trato de licença é claro ao estipular em quantos computadores o programa poderá ser instalado. Acontece que, dentro do ambiente empresarial, são instaladas muito mais cópias do que as real- mente disponibilizadas de forma legal.
Essa distribuição indevida no meio em- presarial dá-se pelas centrais de tecnologia das empresas, que são subdivisões especializadas na área de tecnologia da informação e prestam suporte para os funcionários. Quando algum deles tem a necessidade de utilizar determinado programa, o empregado liga para a central e um dos técnicos instala o programa diretamente em sua máquina, sem ressalva nenhuma. Ocorre que não há como saber se o programa instalado é fruto de mais uma licença utilizada de forma legal ou se é fruto de mais uma cópia pirata corporativa.
Por vezes, os donos nem sabem que essas atividades acontecem dentro de seus estabe- lecimentos; porém, caso haja denúncia, todos aqueles que fizeram parte do ato ilícito poderão ser processados. Não importa a função que
exercem ou o status que têm, todos serão penali- zados, como preceituam os artigos 932 e 933 do Código Civil, que estabelece que o empregador responderá pelos atos dos empregados, ainda que não haja culpa de sua parte.
A maioria dos chefes ou responsáveis por essas seções acredita que podem não ser flagra- dos por denúncias e, muitas vezes, obrigam seus funcionários a trabalharem com o software não licenciado. Os funcionários, por sua vez, com medo de serem demitidos, acabam por aceitar a situação e continuam trabalhando. As ferra- mentas de análise, desenvolvidas pelos criadores dos software para receber informações de forma automática, também são utilizadas para rastrear o uso do programa sem autorização. Portanto, é ilusório pensar que ninguém descobrirá a utilização de programa de computador de forma ilegal. Hoje é quase impossível criar um software sem ferramentas de rastreio e de contagem de cópias ilegais.
O impacto dessa distribuição indevida, por pessoas físicas ou por pessoas jurídicas, não afeta somente o mundo tecnológico, mas a so- ciedade e todo o País. Além dos prejuízos com softwares deficientes, sem suporte, sem garantia e repletos de vírus, há os efeitos a longo prazo, como a oferta de emprego que diminui (já que o setor da informática fica comprometido), o Estado que não arrecada impostos com as ven- das dos softwares originais e a imagem do País que é manchada no âmbito comércio exterior. O mercado pirata e a comercialização de produtos falsos prejudicam de forma exorbi- tante a economia brasileira, contribuindo para o retrocesso do Brasil no desenvolvimento
tecnológico.
Como visto, o software pode ser distribuído ilegalmente por vários meios: internet, mídias de armazenamento, CDs. Todos esses meios de distribuição estão hoje disponíveis para qualquer pessoa que possua um computador
em sua casa e são completamente prejudiciais aos criadores dos software
e para aqueles que o adquirem.
Os tipos básicos de pirataria são baseados nas três formas de distri- buição: a corporativa, a individual e a comercial.
A distribuição corporativa ocorre dentro de organizações, empre- sas e similares. As cópias não autorizadas são disponibilizadas para os empregados utilizarem dentro de seus escritórios. Porém, nem sempre são adquiridas novas licenças legais. O que o responsável pelo setor de tecnologia da informação faz é apenas criar cópias dos programas, instalando-as posteriormente nas máquinas quando os funcionários assim requererem. Mesmo que isso ocorra em pequenas quantidades, o dono do estabelecimento corre o risco de pagar multas absurdamente altas pela sua negligência, como preceituam o artigo 12 da Lei do Software e o 103 da Lei de Direitos Autorais:
“Art. 12. Violar direitos de autor de programa de computador: Pena - Detenção de seis meses a dois anos ou multa.
§ 1o Se a violação consistir na reprodução, por qualquer meio, de pro- grama de computador, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente:
Pena - Reclusão de um a quatro anos e multa” (BRASIL, 1998a).
“Art. 103. Quem editar obra literária, artística ou científica, sem auto- rização do titular, perderá para este os exemplares que se apreenderem e pagar-lhe-á o preço dos que tiver vendido. Parágrafo único. Não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudu- lenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos” (BRASIL, 1998b).
A distribuição individual ocorre diariamente em vários domicílios por todo o País. O usuário instala o programa de computador em seu notebook, transfere-o para uma mídia removível (como um pendrive ou CD) e entrega-o para um amigo. Esta é a distribuição individual, em que há o compartilhamento do programa de computador com outras pessoas físicas.
A distribuição comercial ocorre quando são efetuadas cópias para comercialização, sem a autorização do titular do programa. É o que acontece com a venda de programas de computador que custam em média US$ 5,055 (dólares americanos) em sua forma original, como o Creative Suite 6 Master Collection, da Adobe (ADOBE, s.d.), sendo ven- dido a R$ 5,00 nas feiras das cidades. Os usuários efetuam cópias ilegais em seus computadores e armazenam-nas em seus discos rígidos, para depois dá-las como “brinde” na compra de peças ou até mesmo de novos
computadores. Esta é uma estratégia muito utilizada pelas empresas de venda de artigos de informática, que incentiva os clientes a comprarem novos computadores.
Os contratos de licença e uso impõem obrigações que consistem em o licenciado não transferir, vender, sublicenciar ou ceder a sua licença para outras pessoas, sob pena de entrar em inadimplemento contratual. Porém, como já foi demonstrado, poucas pessoas realmente se importam com o que o contrato diz, já que poucas são as que o leem. É pequena a quantidade de usuários que realmente se dispõem a entender, estudar, ler e compreender o que se diz no contrato. Outras preferem clicar no botão de “Aceito” sem perder muito tempo, já que, se clicarem no botão de “Não Aceito”, seu programa não vai ser instalado e as suas atividades não poderão ser realizadas. A maior parte das pessoas, diante da tela do computador, passa apenas o tempo necessário para colocar a mão no mouse e clicar no botão “Aceito”. Esse comportamento já foi comprovado, como indica Xxxx Xxxxx (2011), criador da empresa Measuring Usability, que realiza pesquisas e estatísticas relacionadas ao uso do software. Ele analisou por quanto tempo as pessoas paravam diante da tela do contrato de licença:
“[...] tive a oportunidade de examinar os dados de registros de milhares de usuários em alguns softwares de consumo. Os dados vieram de usuários que concordaram em participar no fornecimento de um feedback para uma grande empresa de software. Como parte do processo de instalação, lhes foi apresentado um contrato de licença e uso. Quantos o leram antes de aceitar? Como não estamos realmente vendo se os usuários leem o contrato, a melhor opção é usar o proxy para saber o tempo gasto na tela do contrato de licença. De forma não surpreendente, a maioria dos 2.500 usuários passou rapidamente por esta página. Os usuários de tempo médio gastaram na página do contrato de licença apenas 6 segundos. [...] Podemos ter 95% de certeza de que pelo menos 70% dos usuários gastam menos de 12 segundos na página de contrato de licença. [...] Além do fato de que os contratos de licença e uso são longos e chatos, há um outro bom motivo para que eles não sejam lidos. Por que passar tanto tempo lendo algo que você não tem escolha? ‘Aceito’ e ‘Não Aceito’ não contam como verdadeiras escolhas: se você quer usar o software, você TEM que aceitar o contrato. Clique em ‘Não Aceito’ e o software não carrega. Embora os autores não tenham estimado o número de pessoas que leram o contrato, o tempo médio na tela do contrato foi similar a minha pesquisa e a conclusão deles foi a mesma: usuários não leem os contratos de licença.” (SAURO, 2011, tradução nossa)2
2 Leia-se no original: “I had the opportunity to examine the log data of a couple thousand users across a few consumer software products. The data came from users who agreed to participate in providing feedback to a large software company. As part of the installation process, as expected, users were presented with an EULA. How many read it before accepting? Since we’re not actually watching whether users read the agreement,
Os contratos de licença e uso que são exibidos nas telas de instalação dos programas são longos e visualmente chatos de serem lidos, motivo por que muitas pessoas passam pela tela de forma rápida, já que a pressa para utilizar as funções desempenhadas pelo programa é sempre grande. O contrato foi criado para que seja lido, para que o licenciado possa, antes de utilizar determinado programa, saber quais são as permissões e restrições referentes ao software adquirido. Porém, o contrato caiu em desuso por conta da pressa dos usuários e se tornou não efetivo a partir do momento em que as pessoas não se dispuseram a lê-lo.
5. Análise do Recurso Especial no 913.008 – RJ
Recurso Especial no 913.008 – RJ (2007/0005127-7), relatado pelo Ministro Xxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx, julgado em 25/08/2009, cuja lide versou sobre a proteção do direito autoral do software.
As recorrentes MICROSOFT CORPORATION, ADOBE SYSTEMS INCORPORATED, AUTODESK INC. e SYMANTEC CORPORATION
ajuizaram ação denominada de “ação de procedimento ordinário com preceito cominatório e perdas e danos”, em desfavor de SERGEN SERVI- ÇOS GERAIS DE ENGENHARIA S.A., alegando a utilização indevida de programas de computador de propriedade das empresas, sem a necessária licença de uso. As autoras destacaram que “todo usuário final que neces- sitar de uma cópia desses programas é obrigado a adquiri-la diretamente das autoras ou de seus distribuidores autorizados”. Alegaram ainda que “a aquisição de uma cópia legítima não confere ao usuário final o direito de produzir novas cópias, mesmo que seja para o seu uso interno em outro equipamento para o qual a cópia legítima não foi licenciada”. Em suas peças, as autoras requereram:
“a interrupção do uso e destruição dos programas de computador re- produzidos ilicitamente; a incidência de multa cominatória no caso de descumprimento da obrigação e o pagamento de indenização por perdas e danos, em quantia equivalente a 3.000 (três mil vezes) o preço dos programas de computador fraudados” (BRASIL, 2009).
the best proxy to use is the time spent on the EULA screen. Not surprisingly, most of the 2500 users flew past this page. The median time users spent on the license page was only 6 seconds. [...] We can be 95% sure at least 70% of users spend less than 12 seconds on the license page. [...] Other than the obvious fact that EULAs are long and boring, there’s another good reason they aren’t read. Why spend a lot of time reading something you have no choice about. “Accept” and “Don’t Accept” don’t count as real choices: if you want to use the software, you HAVE to accept the agreement. Click “Don’t accept,”and the software doesn’t load. While the authors didn’t estimate the number that read the agreement, their median time on the agreement page was similar to my data and their conclusion was the same: Users don’t read the license agreements” (SAURO, 2011).
As autoras propuseram uma medida cautelar preparatória de busca e apreensão e vistoria, para produzir provas necessárias para propor a ação principal. A tutela de urgência teve sua liminar deferida, sendo realizada perícia nos computadores da empresa, que serviu de embasamento para a ação de indenização por perdas e danos. Depois de uma grande discussão processual em primeira instância, com a realização de duas perícias e complementação ao último laudo pericial, a controvérsia foi apreciada pelo juízo monocrático, que proferiu a sentença nos seguintes termos:
“a) julgou improcedente o incidente de falsidade suscitado pelos autores quanto aos recibos fiscais de aquisição dos software juntados pela ré ao processo;
b) julgou procedente a ação cautelar de busca e apreensão e de vistoria dos computadores da ré, confirmando a liminar anteriormente concedida e homologando a perícia realizada;
c) julgou parcialmente procedente a ação principal, para:
condenar ‘a ré a pagar a primeira autora (MICROSOFT) o valor atualizado de mercado multiplicado por 400 (quatrocentos) dos seguintes programas sem licenciamento segundo o laudo: 01 (um) Microsoft Front Page Ex- plore 3.02.926 e 53 (cinquenta e três) Windows 95, devendo os valores da indenização serem fixados em liquidação de sentença por arbitramento’.
condenar ‘a ré a pagar a segunda autora (ADOBE) o valor atual de mercado multiplicado por 400 (quatrocentos) dos seguintes programas sem licen- ciamento segundo laudo: 01 (um) Audus Pagemaker 5.0a; 04 (quatro) Ado- be Pagemaker 6.5 (upgrade); 02 (dois) Acrobat Destiler 3.0 e Adobe Acrobat Catalog/ Exchange / Reader 3.0 e 03 (três) Adobe Photoshop LE, devendo os valores serem fixados em liquidação de sentença por arbitramento’.
condenar ‘a ré a pagar a terceira autora (AUTODESK) o valor atual de mercado multiplicado por 400 (quatrocentos) dos seguintes programas sem licenciamento segundo o laudo: 02 (dois) Autocad; 02 (dois) Autocad MAP / Autocad versão 14 (release 2), devendo os valores serem fixados em liquidação de sentença por arbitramento’.
determinar o rateio das despesas processuais entre as três primeiras autoras e a ré, na proporção de cada uma, arcando cada qual com os honorários de seu advogado.
condenar a autora SYMANTEC CORPORATION ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor dado à ação principal, em decorrência de sua sucumbência” (BRASIL, 2009).
A ré opôs embargos de declaração (que não foram acolhidos), pre- tendendo que os honorários advocatícios incidissem sobre o valor da condenação e não sobre o valor da causa, como foi decidido em primeira instância. As autoras também interpuseram embargos de declaração, indicando omissões e erros de fato no acórdão recorrido. Esse recurso
também não foi acolhido. Inconformadas com a situação, as duas partes opuseram recursos especiais, nos seguintes termos:
“O recurso de Sergen Serviços Gerais de Engenharia S.A. objetiva, com amparo nas alíneas ‘a’ e ‘c’ do permissivo constitucional, a alteração, de ofício, do valor atribuído à causa, porquanto não reflete o benefício econômico pretendido pelas autoras.
O apelo nobre de Microsoft Corporation, Adobe Systems Incorporated, Autodesk Inc. e Symantec Corporation, manejado com fundamento no art. 105, III, ‘a’ e ‘c’, da Constitução Federal, está adstrito aos seguintes pontos:
1) Alega que o acórdão recorrido violou o art. 9o da Lei 9.609/98 ao afirmar que a apresentação de discos de instalação prestaria à comprovação da licença de uso dos programas de computador supostamente adquiridos pelo réu.
2) Assevera a obrigação de o magistrado, no julgamento da lide, aplicar a legislação vigente, conforme determina o art. 126 do CPC.
3) Reclama que o colegiado de origem não valorou adequadamente a prova, em ofensa ao art. 131 do CPC, porquanto apenas seguiu o laudo pericial, adotando conclusão contrária ao ordenamento jurídico e inci- dindo em erro de fato.
4) Aponta equívoco na afirmação da Corte local de que a reciprocidade de tratamento, perante o ordenamento jurídico norte-americano, não teria sido demonstrada, porquanto restou comprovado, nos autos do agravo de instrumento n. 7.497/00 (recurso em que se discutiu tal questão), que Brasil e Estados Unidos são signatários da Convenção de Berna. Nesse sentido, alega que a prova documental produzida por si não foi apreciada. Reclama que competia à parte contrária comprovar a inexistência de reciprocidade, conforme exige o art. 14 do CPC. Procura demonstrar a existência de dissídio jurisprudencial.
5) Por fim, argumenta a ocorrência de negativa de prestação jurisdicio- nal, visto que a Turma julgadora se recusou a corrigir os erros de fato apontados em embargos de declaração, mantendo a omissão apontada. Indica ofensa ao art. 535, II, do CPC, bem como a existência de dissenso pretoriano” (BRASIL, 2009).
Os dois recursos tiveram seu seguimento negado em juízo prévio de admissibilidade. As autoras interpuseram o agravo, que foi provido pelo Ministro Xxxxx Xxxxx Xxxxx, determinando a subida do recurso especial. O feito foi distribuído ao Ministro Xxxx Xxxxxx xx Xxxxxxx, que proferiu voto nos seguintes termos:
“a) não conheceu do recurso especial quanto à alegada violação dos arts. 126 e 131 do CPC, por ausência que prequestionamento;
b) negou provimento ao recurso no tocante à suposta negativa de prestação jurisdicional, visto que o colegiado de origem manifestou-se de maneira fundamentada acerca da controvérsia;
c) com relação à ausência de reciprocidade, o Relator reconheceu a configuração do dissídio, adotando o entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, de que a reciprocidade das leis não precisa ser demonstrada, visto que o país ratificou a Convenção de Berna, que estabelece regime de proteção ao direitos autorais;
d) deu provimento ao recurso especial para reestabelecer os termos da sentença, sob o fundamento de que o acórdão recorrido amparou-se em premissa fática expressamente contrária à legislação aplicável à espécie, ferindo frontalmente o art. 9o da Lei 9.609/98. [...]” (BRASIL, 2009).
O Ministro Relator votou no sentido de dar provimento ao recurso especial das autoras, considerando que a apresentação, pelo réu, dos discos originais de instalação dos programas de computador utilizados pela ré não seriam suficientes à comprovação da licença de uso dos softwares, exigindo a apresentação do contrato de licença ou, na sua ausência, da nota fiscal de aquisição do produto, empregando literal aplicação ao dispositivo legal.
A questão central desse caso é saber se a regularidade de utilização do programa de computador só pode ser provada por exibição do contrato de licença ou documento fiscal, ou se, como no caso em tela, a existência de perícia que ateste originais os programas utilizados pela empresa é capaz de suprir os documentos mencionados.
A ré constituiu prova da regularidade dos software encontrados em seus computadores, por meio da apresentação dos discos originais de instalação dos programas apontados como ilegais, como comprova os laudos periciais disponibilizados em primeira instância:
“como a matéria em questão envolve interpretação jurídica, iremos deixar a critério do Juízo se a apresentação das Notas Fiscais acima é necessária para validar a compra do programa Pagemaker 4.0 (Full)_ou se é sufi- ciente a apresentação dos referidos discos de instalação do programa, para comprovar a sua legalidade.
Se V. Exa. considerar que o programa Pagemaker 4.0 está legalizado, conseqüentemente, os programas Audus Pagemaker 5.0 (3 cópias), Adobe Pagemaker 6.5 (3 cópias), Acrobat Distiller 3.0 e Adobe Acrobat Catalog/ Exchange/ Reader 3.0 (2 cópias) e Adobe Photoshop LE (3 cópias) também estarão legalizados; caso contrário não” (BRASIL, 2009).
O Tribunal de origem aceitou a prova produzida por meio dos discos de instalação, julgando improcedente a demanda. Nesse sentido, observa-
-se que a Corte formou sua convicção com base nos elementos de prova dos autos, entendendo que a apresentação das mídias originais serviu para a comprovação da regularidade dos softwares. O cerne da discussão está em analisar se a determinação do art. 9o da Lei no 9.609/1998, de que
“a licença de uso será comprovada mediante contrato ou notas fiscais” é restritiva, ou se é possível comprovar a regularidade dos softwares por outros meios:
“Art. 9o O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licen- ça. Parágrafo único: Na hipótese de eventual inexistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso” (BRASIL, 1998a).
O artigo faz referência expressa ao contrato de licença e ao documento fiscal como meios para provar a regularidade do programa de computador, mas o dispositivo não excluiu outros elementos de prova que possam ser apresentados para a comprovação da verdade dos fatos. Como não existe na lei, instrumento expresso que negue a utilização de outros meios, impõe-se, igualmente, que o dispositivo seja interpretado de forma lógica, dando espaço para outros tipos de provas.
O art. 332 do Código de Processo Civil, destaca que “todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não espe- cificados neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa” (BRASIL, 1973). Assim, o entendimento de que o art. 9o da Lei de Software estabelece os únicos meios de comprovação do negócio jurídico – seja firmado entre as partes, seja envolvendo terceiros – não se adapta com princípios de nosso ordenamento jurídico, esta- belecendo hipótese não prevista em lei de prova legal, em que a comprovação de determinado fato só pode ser realizada na forma prescrita, sendo vedado ao magistrado considerar outros meios de prova.
O contrato de licença e o documento fiscal devem ser preferencialmente considerados na
comprovação da regularidade do programa de computador; nada impede que o magistrado forme sua convicção com base em outras pro- vas apresentadas pelas partes, como os discos originais de instalação dos softwares. Portanto, a regularidade dos programas de computador ficou comprovada no caso em discussão, me- diante a apresentação dos discos originais de instalação dos programas.
Com a análise desse caso, é possível ver que é necessária a reformulação da atual legislação; afinal, o que foi regulado pelo legislador no período de criação da lei de direito autoral e de software não mais atende ao que se precisa, o que obriga os magistrados a se utilizarem de analogias para solucionar divergências e conflitos gerados dentro do mundo cibernético.
O avanço da tecnologia e da informática faz com que os operadores do Direito precisem adaptar-se ao novo mundo, aplicando, na me- dida do possível, as punições para as práticas cometidas por meio da internet. É mais do que necessário o desenvolvimento de uma nova lei ou o efetivo cumprimento da que já existe, intensificando as punições para aqueles que afrontam a legislação, de forma a regular de maneira efetiva e com segurança, os direitos dos criadores de programas e dos usuários que realizam transações na rede mundial de computadores.
6. Conclusão
Levando em consideração todos esses aspec- tos, entende-se que a distribuição indevida do software no Brasil gera problemas não somente para aqueles que o pirateiam, mas para aqueles que adquirem o programa de forma ilegal e também para a economia do País.
É necessário que os agentes causadores da distribuição indevida, saibam da necessidade e da importância em visualizar e ler os contra-
tos de licença e uso que são disponibilizados pelos desenvolvedores de software, de modo a identificar quais suas permissões e restrições em relação ao programa adquirido. Além disso, é importante que os usuários saibam das desvantagens da pirataria, como o risco de prisão, pagamento de indenizações altas, ausência total de suporte técnico, prejuízos incal- culáveis, presença de vírus espiões e a consequente perda de arquivos.
No cenário de hoje, o software desempenha um papel único no desenvolvimento das atividades da sociedade, em diversos âmbitos: econômico, político, social, jurídico e acadêmico. Afinal, grande parte das atividades realizadas hoje passa antes por um programa de computador: fabricação de carros, sistemas de bancos, segurança em transações, jogos online, processos judiciais eletrônicos, viagens. Considerando o grande avanço tecnológico dos últimos 10 anos, representado principalmente pela utilização da internet, surge a necessidade de uma reestruturação das legislações de direito autoral e de software, no que dizem respeito à intensidade e à efetividade das punições.
Percebe-se que o ordenamento jurídico brasileiro não é eficaz na punição dos que cometem o crime de pirataria. Não adianta criar uma lei que prevê penas de reclusão e multas para aqueles que reproduzem software de maneira indevida e sem autorização, se esta legislação não é aplicada. No que diz respeito à proteção de direitos de autor, a lei bra- sileira é considerada uma das mais avançadas no mundo; porém, o que realmente falta é a sua efetiva aplicação.
A tecnologia tem-se aprimorado de maneira veloz e tem levado os países a desfrutarem das vantagens desse incremento. Todavia, como a legislação brasileira não pune corretamente os agentes da pirataria, as empresas não se sentem seguras para se inserirem no mercado tecnológico do País, gerando um retrocesso tecnológico.
É imprescindível que cada um dos envolvidos nas relações cibernéticas possa fazer a sua parte: o criador do software que denuncia o uso indevido de seus programas; e o usuário, que precisa entender que utilizar software original é mais vantajoso em termos de segurança, apesar de ser mais caro. No Brasil, infelizmente a pirataria já está inserida em vários estabe- lecimentos e na vida de várias pessoas, seja por aquisição de licenças de software de maneira ilegal, seja pela realização de downloads de filmes, séries e músicas, já que é muito mais cômodo e barato do que ter que
locomover-se para outro lugar para adquirir o bem desejado.
Faz-se necessário que o ordenamento jurídico se movimente na mesma velocidade com que a tecnologia chega até nós, para que possa acompanhar o desenvolvimento e tutelar o direito dos envolvidos. As Lei do Software e de Direito Autoral foram criadas há 15 anos, período em que não se imaginava alcançar a tecnologia de que desfrutamos hoje. O
que era utilizado naquela época não representava nem mesmo 30% do que temos hoje em termos de comunicação, telefonia, jogos e computação. É urgente a criação de uma lei que possa tutelar de forma eficaz e segura a relação entre os fabricantes de software e seus usuários, pois a tecnologia tornou-se um grande mecanismo de comunicação, diversão, trabalho e de geração de riquezas – e estas relações precisam ser reguladas e protegidas de forma eficaz, para garantir a segurança daqueles que se
utilizam da rede mundial de computadores.
Referências
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