Parecer n° 296/2022
Parecer n° 296/2022
Assunto: Shows Artísticos – Contratação por Inexigibilidade de Licitação – Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx.
Vem, à esta Assessoria Jurídica do Município, memorando da Comissão Permanente de Licitação, requerendo parecer jurídico acerca da possibilidade de contratação da Cantora Xxxxxxx Xxxxxxx.
Como é notório, a contratação de qualquer profissional do setor artístico pode ser obtida através de inexigibilidade de licitação. Basicamente, a inexigibilidade de licitação se dá quando a concorrência é inexistente e, por exemplo, por qual motivo a Administração faria um processo licitatório para contratação de um show de Xxxxx Xxxxxxx se apenas ele pode fazê-lo?
Guardadas as devidas proporções, a contratação de profissionais do setor artístico deve ser precedida, em verdade, dos seguintes requisitos:
a) Que o serviço seja de um artista profissional;
b) Que a contratação seja realizada diretamente ou mediante empresário exclusivo;
c) Que o artista seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.
Inicialmente, o artista deve ser profissional. Portanto, a Administração não pode contratar serviços artísticos de amadores. Mas qual seria o padrão para se diferir o artista profissional do amador? O Emérito professor Xxxxxx Xxxxxxxxx, em sua Obra “Contratação Direta sem Licitação” nos ensina:
“Artista, nos termos da lei, é o profissional que cria, interpreta ou executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, para efeito de exibição ou divulgação pública, por meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública. O profissional artista deve estar inscrito na Delegacia Regional do Trabalho, o mesmo ocorrendo com os agenciadores dessa mão-de-obra, constituindo esse registro elemento indispensável à regularidade da contratação”
.
Assim, a comprovação acerca da condição de artista profissional pode se dar, entre outros requisitos, pelo registro do profissional na Delegacia Regional do Trabalho ou, ainda, na Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), que é a instituição que regula a profissão de músico.
Quanto ao requisito de contratação direta ou mediante empresário exclusivo, o Tribunal de Contas da União já sedimentou o seguinte entendimento:
Na contratação direta de artistas consagrados, com base no inciso III do art. 25 da Lei 8.666/93, por meio de intermediários ou representantes, deve ser apresentada cópia do contrato, registrado em cartório, de exclusividade dos artistas com o empresário contratado. O contrato de exclusividade difere da autorização que dá exclusividade apenas para os dias correspondentes à apresentação dos artistas e é restrita à localidade do evento, a qual não se presta para fundamentar a inexigibilidade.
Em Representação relativa a contratações diretas de bandas para realização de shows, promovidas mediante inexigibilidade de licitação, com recursos de convênio firmado entre município e o Ministério do Turismo, a unidade técnica constatara que “as cartas de exclusividade, apresentadas como exigência para ratificação do processo de inexigibilidade de licitação, conferem exclusividade apenas para as datas especificadas e para a localidade do evento”, ou seja, não se prestam a atestar a exclusividade de representação dos artistas contratados. Em juízo de mérito, o relator registrou que, de fato, “as cartas de exclusividade apresentadas, com especificação de dias e local dos shows, não cumprem a orientação deste Tribunal, expedida diretamente ao Ministério do Turismo, por meio do Acórdão nº 96/2008 – Plenário, no sentido de que ‘o contrato de exclusividade difere da autorização que confere exclusividade apenas para os dias correspondentes à apresentação dos artistas e que é restrita à localidade do evento’”. Ainda sobre o tema, o relator destacou o Acórdão 3826/2013 - 1ª Câmara, que determinara, também ao Ministério do Turismo, a instauração de Tomada de Contas Especial quando no exame da prestação de contas de convênio fosse constatada especialmente a seguinte irregularidade: “contratação de bandas de música, por meio de inexigibilidade de licitação, sob o fundamento da
exclusividade de representação, com base na apresentação de ‘cartas’ e de ‘declarações’ que supostamente atestariam a dita exclusividade, mas na verdade não se prestam para tanto, o que só pode ser feito por meio de contrato firmado entre artistas e empresários, devendo ainda constar registro em cartório, além de regular publicação”. No caso concreto, considerando que a prestação de contas do convênio em questão ainda não teria sido apresentada, o relator propôs expedir determinação ao Ministério do Turismo para que “adote as providências expressamente previstas na cláusula (...) do Convênio nº (...), com vistas à apresentação e análise da prestação de contas referente ao mencionado ajuste, levando em consideração as irregularidades ora levantadas e as orientações expedidas por meio dos Acórdãos nºs 96/2008 – Plenário e 3826/2013 – 1ª Câmara”. O Tribunal julgou procedente a Representação, expedindo a determinação proposta pela relatoria. Acórdão 642/2014-Primeira Câmara, TC 016.329/2012-0, relator Ministro Xxxxxx Xxxxxxx, 18.2.2014.
Portanto, o próprio item é bastante explicativo: A contratação apenas pode ser realizada através do próprio artista ou de empresário exclusivo deste, que esteja munido de contrato, com registro em cartório – microfilmado, não confundir com a simples autenticação de assinaturas dos contratantes –.
No que concerne ao terceiro item, a consagração do artista pela crítica especializada ou pela opinião é item absolutamente subjetivo, apesar do dever de licitar ser objetivo. Assim, deve-se levar em consideração para tanto a discografia do artista, eventuais premiações, participações em eventos importantes, convites para apresentação de locais de destaque, entre outros elementos que possam comprovar a notoriedade, mesmo que local, do referido artista.
Quanto à questão relacionada à justificativa para o preço do cachê cobrado, deve-se levar em consideração que a contratação através de procedimento de inexigibilidade de licitação se dá pela inexistência de concorrência e, também, pela singularidade do objeto pretendido.
É singular um objeto que apenas possa ser realizado por um determinado grupo ou, ainda, apenas por uma determinada pessoa. Assessoria Jurídica, por
exemplo, é um serviço de natureza singular por apenas poder ser prestado por advogados, nos termos do Estatuto da Advocacia. Um show artístico de Xxxxxxx Xxxxxx é um serviço que apenas pode ser prestado pelo próprio, assim como de artistas profissionais locais como Xxxxxxx.
Desta forma, a singularidade do objeto impossibilita à Administração quantificar um preço médio para o serviço, já que o serviço consubstanciado no show de Xxxxxxx Xxxxxx é absolutamente diverso do Pinduca, portanto não há que se falar em comparação de preços para serviços que são de natureza singular e, portanto, não possuem critérios comparativos.
O Tribunal de Contas da União já manifestou o seguinte entendimento acerca de pesquisa de preços em casos de contratação por inexigibilidade:
A justificativa do preço em contratações diretas (art. 26, parágrafo único, inciso III, da Lei 8.666/93) deve ser realizada, preferencialmente, mediante: (i) no caso de dispensa, apresentação de, no mínimo, três cotações válidas de empresas do ramo, ou justificativa circunstanciada se não for possível obter essa quantidade mínima; (ii) no caso de inexigibilidade, comparação com os preços praticados pelo fornecedor junto a outras instituições públicas ou privadas.
Pedidos de Reexame interpostos por gestores do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) questionaram deliberação pela qual o TCU aplicara multas aos recorrentes em razão, dentre outras irregularidades, da “aquisição de equipamentos, por dispensa de licitação (art. 24, XXI, da Lei 8.666/93), por preços unitários superiores ao menor preço obtido na cotação/pesquisa de mercado, sem justificativa para a escolha do fornecedor e do preço praticado”. Ao analisar as razões recursais, o relator entendeu que a escolha dos fornecedores para as aquisições “foi tecnicamente motivada pela entidade”. Quanto ao preço, destacou que, “mesmo nos casos de contratações diretas, deve ser justificado, a teor do art. 26, III, da Lei 8.666/93”, ressaltando ainda que “o Tribunal tem entendido que a apresentação de cotações junto ao mercado é a forma preferencial de se justificar o preço em contratações sem licitação (dispensa de licitação), devendo ser cotadas, no mínimo, 3 propostas válidas de empresas do ramo; ou, caso não seja viável obter esse número de cotações, deve-se apresentar justificativa circunstanciada (...). E, nos casos de inviabilidade de licitação, este Plenário se manifestou, conforme ...o Acórdão 819/2005, no sentido de que, para
atender o disposto no inciso III do art. 26 da Lei de Licitações, poder-se-ia fazer uma comparação entre os preços praticados pelo fornecedor exclusivo junto a outras instituições públicas ou privadas”. Nesse sentido, concluiu o relator que, no caso concreto, a prática adotada pelo Inmetro para os casos de dispensa de licitação estaria de acordo com o entendimento do TCU. Quanto aos casos de inviabilidade de licitação, observou que não fora comprovado “que a entidade tenha promovido alguma medida tendente a verificar outros preços praticados pelo fornecedor exclusivo do microscópio”. Xxxxxxxx, contudo, que “essa medida, ainda que desejável, é, ainda, uma orientação singular feita por esta Casa”. Considerando que a manutenção da multa aplicada aos gestores seria medida de extremo rigor, “especialmente frente à ausência de dano ao erário”, o Tribunal, pelos motivos expostos pelo relator, deu provimento aos pedidos de reexame, afastando a sanção imposta aos responsáveis. Xxxxxxx 1565/2015-Plenário, TC 031.478/2011-5, relator Ministro Vital do Rêgo, 24.6.2015.
Em acórdão recente, o Tribunal de Contas da União sedimentou o entendimento de que, nos casos de contratação por inexigibilidade de licitação, a Administração deve comparar os preços praticados pelo mesmo fornecedor dos serviços com outros órgãos da Administração ou, ainda, com a iniciativa privada, inexistindo a possibilidade de se tabelar preços de serviços singulares.
Afora isso, não se deve esquecer da obrigatoriedade de cumprimento do art. 195, §5º, da Constituição Federal1. Desta forma, cumprindo-se os requisitos acima elencados, a contratação do referido artista é possível e pode ser realizada pela Administração Pública através de procedimento de inexigibilidade de licitação.
É o parecer, S.M.J.
Soure (PA), 29 de julho de 2022.
Xxx Xxxxxxxxx xx Xxxxx Xxxx Assessor Jurídico – OAB/PA 12.502
1 § 3º A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.