NOTA TÉCNICA
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Alocação Eficiente do Risco de Modulação dos Contratos de Energia
Desenvolvimento
técnico
São Paulo, 29 de março de 2021.
Sumário
3 CONTRATOS DE COMERCIALIZAÇÃO DE ENERGIA 9
4 RISCOS ASSOCIADOS AO PERFIL DE CARGA REMANESCENTE 13
4.1 Carga Cativa da Distribuidora
13
4.2 Mudanças no Portfólio de Contratos
15
19
00
28
6 PROPOSTA ABEEÓLICA PARA A MODULAÇÃO 31
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 32
A Consulta Pública 004/2021, ou simplesmente CP004, tem o objetivo de colher subsídios para o aprimoramento do Edital dos Leilões de Geração nº 6/2021-ANEEL (Leilão A-3, de 2021) e nº 7/2021-ANEEL (Leilão A-4, de 2021). Neste contexto há uma mudança relevante nos CCEARs das usinas eólicas, propondo a Modulação da energia contratada pelo perfil de Carga Remanescente da distribuidora.
Esta mudança, embora impacte economicamente o valor da energia e, portanto, os interesses legítimos dos consumidores e dos geradores, não foi acompanhada de uma Análise de Impacto Regulatório, tal como preconizado na Lei 13.848/2019 e na Resolução Normativa ANEEL 798/2017.
Intuitivamente, conforme as discussões ocorridas na própria sessão pública da Reunião de Diretoria da ANEEL que aprovou esta Consulta Pública, estar-se-ia preservando o interesse dos consumidores. Conforme se demonstra neste documento, está ocorrendo justamente o contrário: a opção de modulação pelo perfil de Carga Remanescente da distribuidora é justamente a que leva ao maior custo para o consumidor.
O primeiro passo para sustentar esta conclusão é entender os riscos associados à modulação, tendo-se em mente que a Carga Remanescente é calculada como a Carga Cativa da distribuidora, subtraída de todos os demais contratos já devidamente modulados: Geração Própria, PROINFA, Itaipu, CCEARs por Disponibilidade, Cotas de Garantia Física, Contratos Bilaterais etc.
Logo, o perfil de Carga Remanescente depende de um grande número de variáveis e, além disso, do nível de contratação da Distribuidora: se em alguma hora a subtração resultar negativa, o perfil de Carga Remanescente é anulado, agregando-se mais energia às demais horas do mês.
Ocorre que grandes mudanças regulatórias estão previstas em todas essas variáveis:
i. Com a expansão do Mercado Livre, a Carga Cativa vai mudando de perfil, assumindo muito mais as características do mercado residencial;
ii. Em 2023 encerra-se o contrato de Xxxxxx, devendo a energia ser alocada de uma forma diferente da atual;
iii. A desestatização da Eletrobrás deve reduzir o volume de contratos de Cota de garantia física;
iv. Vários contratos por Disponibilidade serão finalizados entre 2023 e 2025;
v. As distribuidoras encontram-se sobrecontratadas e esta situação deve se acentuar nos próximos anos.
A cada uma dessas mudanças regulatórias, altera-se o montante subtraído da Carga Cativa para formar a Carga Remanescente e, assim, altera-se o perfil da Carga Remanescente. Como este é o perfil que modula os contratos por Quantidade, as alocações horárias de energia serão impactadas, bem como a valoração da energia ao PLD.
Logo, para avaliar com base em fatos e dados se a mudança proposta na modulação dos CCEARs das eólicas deve ser apoiada, ou se uma solução alternativa deve ser apresentada, desenvolveu-se um simulador da modulação dos contratos e um elevado número de estudos foi realizado com dois parques eólicos típicos, um na Bahia e outro no Ceará, considerando-se os diversos fatores de risco apontados.
Ao todo, foram realizadas 5.760 simulações avaliando-se os efeitos da combinação entre os fatores de risco sobre o custo com a modulação.
Na prática, quando a ANEEL definir a Regra de Modulação, o gerador vai adicionar ao seu preço o Prêmio de Risco. O consumidor, por sua vez, vai pagar pelo contrato de acordo com a oferta realizada pelo gerador, incluindo o Prêmio de Risco, e experimentará ao longo da vida do contrato o custo médio da Regra de Modulação, tal como apresentado na Figura 1.
Figura 1 – Custo total da modulação para o Consumidor.
Assim, entendendo-se o Custo Total da modulação a ser pago pelo consumidor, conclui-se que a melhor Regra de Modulação é aquela que minimiza a soma entre o Prêmio de Risco do gerador e o custo médio de modulação a ser pago pelo consumidor.
Realizando-se esta soma para cada uma das quatro Regras de Modulação1 simuladas, obtêm-se os resultados apresentados na Figura 2.
(a) Parque Eólico na Bahia | (b) Parque Eólico no Ceará |
Figura 2 – Custo Total para o Consumidor em função da Regra de Modulação.
1 RMCR: Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente; RMCRB: Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente com Banda; RMF: Regra de Modulação flat; RMG: Regra de Modulação pelo perfil da Geração.
Avaliando os resultados encontrados, nota-se que as barras alaranjadas dos gráficos, correspondentes ao Custo Total do Consumidor com a Regra de Modulação pelo perfil de Carga Remanescente, são sempre as maiores. Ou seja, a proposta colocada em Consulta Pública é a que apresenta maior custo para os consumidores.
Tal fato ocorre porque a Regra de Modulação pelo perfil de Carga Remanescente aloca muitos riscos ao Gerador, inclusive riscos associados a mudanças regulatórias, para os quais o Gerador possui pouca capacidade de gestão. A única forma de se proteger é precificar e adicionar um Prêmio de Risco ao preço do contrato.
Assim, a ABEEólica conclui que a Regra de Modulação proposta pela ANEEL na abertura desta Consulta Pública apresenta o maior Custo Total para o Consumidor.
Logo, a Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente não deve prosperar.
A ABEEólica propõe que seja adotada a Regra de Modulação que representa o menor Custo Total para o Consumidor, que é justamente a Regra de Modulação pelo perfil de Geração, adotada atualmente.
Subsidiariamente, caso a ANEEL não adote a Regra de Modulação pelo perfil de Geração, a ABEEólica propõe a adoção da Regra de Modulação pelo perfil flat, em que o gerador assumi o risco de produção e o consumidor assume o risco de variação do consumo.
É importante observar que a proposta da ABEEólica está baseada em fatos e dados. As análises dos fatores de risco e as simulações exaustivas apresentadas nesta contribuição demostram que a Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente aloca riscos tão diversos e aleatórios aos agentes de geração que, ao precificar tais riscos, o custo fica maior para os consumidores.
A ANEEL iniciou a Consulta Pública 004/2021 (CP004) no dia 11 de fevereiro de 2021, tendo como objetivo colher subsídios para o aprimoramento do Edital dos Leilões de Geração nº 6/2021-ANEEL (Leilão A-3, de 2021) e nº 7/2021-ANEEL (Leilão A-4, de 2021), e seus anexos, destinados a contratar energia elétrica proveniente de novos empreendimentos de geração a partir das fontes hidrelétrica, eólica, solar fotovoltaica e térmica a biomassa. Trata-se de um procedimento recorrente, exigido por Xxx, de submeter à discussão pública os Editais de licitações2.
A CP004 aparentemente trata de um tema recorrente da Agência, pois editais de leilão são colocados em audiência pública e aprovados pela ANEEL pelo menos 3 ou 4 vezes ao ano desde 2004. Há ampla experiência regulatória e um aprendizado acumulado muito relevante no Setor Elétrico.
Especificamente na CP004, há uma mudança relevante que será objeto desta Nota Técnica: a modulação dos CCEARs para as usinas eólicas. Esta mudança é relevante por três motivos principais:
i. As usinas eólicas têm apresentado crescimento expressivo no Brasil em termos de capacidade instalada e de participação na geração de energia [1];
ii. O Plano Decenal de Energia (PDE) da EPE indica que a fonte eólica será a principal responsável pela expansão do parque gerador nos próximos anos [2];
iii. A regra de modulação define a alocação do risco de descasamento entre energia contratada e produção. Uma mudança nesta regra deve ser feita com base em fatos e dados, resultantes de estudos detalhados.
No que se refere ao crescimento realizado das usinas eólicas, como pode ser observado na Figura 3, a capacidade instalada teve um crescimento expressivo entre 2010 e 2020: de pouco mais de 600MW para mais de 16,5GW, chegando à participação de 10% na capacidade instalada do Sistema Interligado Nacional (SIN).
Figura 3 – Capacidade instalada em usinas eólicas.
2 Art. 9º da Lei 13.848, de 25 de junho de 2019.
De acordo com o PDE, avaliando a competitividade da fonte, a potência instalada em usinas eólica deve crescer a uma taxa de 2.500 a 3.000 MW por ano até 2.030, chegando a uma capacidade superior a 30 GW, tal como ilustrado na Figura 4, extraída do próprio PDE.
Finalmente, a necessidade de estudos sobre os impactos de mudanças em regras não é mero desejo ou curiosidade. Trata-se de necessidade expressa em Lei e em Resolução da própria ANEEL:
• Lei 13.848/2019:
Art. 9º (...)
§ 3º A agência reguladora deverá disponibilizar, na sede e no respectivo sítio na internet, quando do início da consulta pública, o relatório de AIR, os estudos, os dados e o material técnico usados como fundamento para as propostas submetidas a consulta pública, ressalvados aqueles de caráter sigiloso.
(...)
• Resolução Normativa ANEEL 798/2017:
(...)
Art. 5º O Relatório de AIR deverá ser submetido à primeira fase de Audiência Pública específica anteriormente à elaboração de eventual minuta de ato normativo.
(...)
Conforme bem salientado pela Diretora Xxxxx quando da abertura da CP004, não há no processo da ANEEL nenhuma manifestação das áreas técnicas, nomeadamente da SRM e da SRG, sobre os impactos da mudança da regra da modulação [3].
Tal fato se torna ainda mais relevante à medida em que há uma série de mudanças ocorrendo simultaneamente para os CCEARs das usinas eólicas:
i. A sazonalização pelo perfil do consumo foi aprovada recentemente sem estudos robustos e ainda não está em operação;
ii. O PLD Horário teve início em 2021 e ainda não há análise dos impactos sobre as exposições no mercado de curto prazo incorporando os efeitos da modulação;
iii. Os contratos das eólicas têm tido a alteração simultânea de inúmeras regras (disponibilidade, quantidade, perfil de geração etc.) sem que haja uma avaliação global e estruturada do tema.
Logo, a profusão de contratos e de mudanças seria contrária à estabilidade regulatória, se traduzindo em insegurança para os investidores e tornando muito difícil garantir, na ausência de estudos retrospectivos e prospectivos, que os alegados benefícios para os consumidores realmente se verificarão.
Neste contexto, esta contribuição busca justamente realizar estudos sobre o perfil de produção dos parques eólicos e sobre o perfil do consumo das distribuidoras, de modo a caracterizar o que deve ser risco de cada uma das partes do contrato.
O objetivo deve ser a alocação de cada fator de risco a quem pode geri-lo, sobretudo no sentido de realizar a gestão para que o custo associado ao risco seja mínimo, trazendo assim eficiência à comercialização de energia.
Para atingir a este objetivo, esta Nota Técnica ficou então organizada nas seguintes seções:
• Na Seção 3 apresentam-se os Contratos de Comercialização de Energia, as definições de Recurso e Requisito para uma distribuidora e uma geradora eólica, a regra de modulação vigente para os contratos por Quantidade, e as diferenças de perfil entre Carga Cativa e Carga Remanescente;
• Na Seção 4 apresentam-se os diversos fatores de risco associados ao perfil de Carga Remanescente, incluindo mudanças na Carga Cativa da distribuidora, a migração de clientes ao Mercado Livre, bem como mudanças no portfólio de contratos, tais como o término de contratos por Disponibilidade, ou mesmo o fim do regime de Cotas e do contrato de Itaipu. Adicionalmente, apresenta-se o impacto do nível de contratação das distribuidoras no perfil de Carga Remanescente;
• Na Seção 5 apresenta-se o algoritmo desenvolvido para quantificar o risco associado às diferentes Regras de Modulação considerando parques eólicos e distribuidoras típicos, cenários de MRE, de PLD e dos demais fatores de risco. Com o objetivo de minimizar o Custo Total da modulação dos contratos para os consumidores, conclui-se que a melhor Regra de Modulação é a que modula os contratos pelo perfil de geração dos parques;
• Na Seção 6, finalmente, a ABEEólica apresenta sua Proposta para a Modulação.
3 Contratos de Comercialização de Energia
Da forma como está organizado no Brasil, um Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR) possui cinco componentes de custo e de receita para uma distribuidora de energia, que posteriormente são repassados aos consumidores finais até o limite de sobrecontratação permitido:
i. Custo Direto do Contrato: preço homologado do contrato multiplicado pelo volume contratado, ou a receita fixa, se for um contrato por disponibilidade.
ii. Custo de Exposição a PLD da Distribuidora: diferença entre o consumo da distribuidora no centro de gravidade de seu submercado e os contratos totais de compra de energia, multiplicado pelo Preço de Liquidação de Diferenças (PLD)3.
iii. Riscos dos contratos de energia assumidos pelas distribuidoras: referem-se principalmente ao Risco Hidrológico das Cotas, de Itaipu e dos Contratos Repactuados.
iv. Prêmio de Risco: receita em contrapartida ao pagamento do Risco Hidrológico Repactuado.
v. Componentes Financeiros: neutralização das diferenças entre o preço reconhecido na tarifa e o preço efetivamente praticado.
Sob o ponto de vista do vendedor, o contrato possui duas componentes:
i. Receita Contratual: corresponde direto da componente (i) do custo da distribuidora, ou seja, é o preço homologado do contrato multiplicado pelo volume contratado, ou a receita fixa, se for um contrato por disponibilidade.
ii. Custo de Exposição a PLD do Vendedor: diferença entre toda a venda realizada pelo vendedor e os contratos totais de compra de energia, multiplicado pelo Preço de Liquidação de Diferenças (PLD).
Para uma distribuidora, o Requisito corresponde à carga de energia no centro de gravidade 4 , e o Recurso corresponde aos contratos de compra de energia. Para um gerador eólico, o Requisito corresponde aos contratos de venda de energia, e o Recurso é a produção do parque referenciada ao centro de gravidade.
3 Para uma distribuidora, as exposições a PLD são calculadas por submercado e depois há, para os CCEARs, o alívio de diferença de preços entre submercados.
4 Se houver venda de energia no MVE, os contratos correspondentes somam-se ao Requisito.
Figura 5 – Compra e venda de energia a PLD para cada hora do dia.
Para as distribuidoras, cada tipo de contrato possui uma regra específica de modulação, de acordo com o apresentado na Tabela 1 [4]. Assim, cada tipo de contrato da distribuidora vai tendo os seus volumes mensais alocados em base horária a partir do perfil de geração do MRE (Itaipu e Cotas), do perfil de geração do PROINFA e da carga cativa da distribuidora (Nuclear e CCEAR por Disponibilidade). Ao final, faz-se a diferença hora a hora entre a carga cativa da distribuidora e os contratos já modulados, obtendo-se a Carga Remanescente. Com base no Perfil da Carga Remanescente alocam-se os contratos por Quantidade.
Assim, o Perfil da Carga Remanescente passa a depender da geração das usinas do MRE, do PROINFA e da própria Carga Cativa da Distribuidora.
Tabela 1 – Regras de Modulação dos contratos das Distribuidoras.
TIPO DE CONTRATO | REGRA DE MODULAÇÃO |
Itaipu | Perfil de Geração do MRE |
PROINFA | Perfil de Geração das usinas do PROINFA |
Cota de Garantia Física | Perfil de Geração do MRE ou de geração da usina |
Usina Nuclear | Perfil da Carga Cativa da Distribuidora |
Bilateral | Várias opções: flat , carga, MRE, perfil de usina etc. |
CCEAR por Quantidade | Perfil da Carga Remanescente |
CCEAR por Disponibilidade | Perfil da Carga Cativa da Distribuidora |
Leilões de Ajuste | Flat ou proposta pelo comprador e validada pelo vendedor |
Matematicamente, a Carga Remanescente é calculada da seguinte forma:
𝐶𝑅ℎ = 𝑚𝑎𝑥{0; 𝐶𝐶ℎ − 𝐺𝑃ℎ − 𝐶𝐼ℎ − 𝐶𝐺ℎ − 𝐶𝑃ℎ − 𝐶𝑁ℎ − 𝐶𝐵ℎ − 𝐶𝐷ℎ − 𝐶𝐴ℎ}
Sendo:
• h : hora do dia, 0 ≤ h ≤ 23;
• CRh : Carga Remanescente da hora h, em MWh;
• CCh : Carga Cativa da hora h, em MWh;
• GPh : geração própria na hora h, em MWh;
• CIh : energia do contrato de Itaipu alocada na hora h, em MWh;
• CGh : energia do contrato de Cotas de Garantia Física alocada na hora h, em MWh;
• CPh : energia do contrato do PROINFA alocada na hora h, em MWh;
• CNh : energia do contrato das usinas Nucleares alocada na hora h, em MWh;
• CBh : energia dos contratos Bilaterais alocada na hora h, em MWh;
• CDh : energia dos contratos por Disponibilidade alocada na hora h, em MWh;
• CAh : energia dos contratos de Ajuste alocada na hora h, em MWh.
Graficamente, a partir de dados disponíveis publicamente na CCEE e na ANEEL, pode-se realizar simulações e construir a curva de alocação de contratos de uma distribuidora da região Sudeste tal como apresentado na Figura 6 para um dia típico do mês de novembro de 2020 [5].
É interessante observar que os contratos por quantidade, CQ, modulados de acordo com o perfil da Carga Remanescente, apresentam uma alocação pequena durante a madrugada, mas uma alocação relativamente elevada durante o período de pico de consumo, das 18h às 20h. As variações são, inclusive, mais intensas que as variações da Carga Cativa da distribuidora.
Figura 6 – Modulação de contratos de uma distribuidora da região Sudeste.
Para avaliar a diferença entre a carga cativa e a carga remanescente, recorre-se à Figura 7. De fato, o perfil da Carga Remanescente apresenta uma alocação de energia muito menor na madrugada, e muito maior ao longo da tarde. Esta diferença decorre do fato da Carga Remanescente depender da Carga Cativa, mas também depender dos perfis de alocação dos outros contratos, ou seja, depende indiretamente:
i. Do perfil da Carga Cativa, tanto diretamente quanto indiretamente pelos contratos por Disponibilidade e de energia nuclear;
ii. Do perfil de geração do MRE para os contratos de Itaipu e de Cotas;
iii. Do perfil de geração do PROINFA, para os contratos do PROINFA;
iv. Do perfil acordado entre Vendedor e a Distribuidora para os contratos Bilaterais.
Assim, ao modular um contrato de energia pelo perfil de Carga Remanescente, os riscos associados a todos esses fatores são transferidos ao contrato. Para entender melhor o que isso significa, na próxima seção são apresentados os impactos sobre o perfil de carga remanescente de cada um dos principais fatores de risco.
Figura 7 – Perfil da Carga Cativa (CC) e da Carga Remanescente (CR).
4 Riscos Associados ao Perfil de Carga Remanescente
A Carga Remanescente, tal como apresentado na seção anterior, depende de uma série de fatores, dentre os quais se destacam:
i. Carga Cativa da distribuidora, em função do seu próprio perfil, bem como devido à sua utilização na modulação dos contratos de energia nuclear e dos contratos por Disponibilidade;
ii. Mudanças nos portfólios de contratos de compra de energia das distribuidoras, tais como o término de contratos existentes ou mesmo a aquisição de novos contratos, com regras de modulação diferenciadas, alterando, portanto, o perfil da Carga Remanescente;
iii. Nível de contratação da distribuidora, pois quando o volume de contratos supera a Carga Cativa da distribuidora, o perfil de Carga Remanescente sofre descontinuidade;
Assim, ao estabelecer que o contrato por quantidade terá modulação de acordo com o perfil da Carga Remanescente, o empreendedor que vai construir, operar e manter uma usina de geração de energia elétrica – uma eólica no caso deste documento – assume o risco de variação de todos esses fatores.
Aparentemente, como há vários fatores de risco, os impactos no resultado econômico de uma usina eólica devem ser elevados. Como as aparências podem enganar, as próximas seções avaliam cada fator de risco com fatos e dados, bem como com a perspectiva de evolução em função das reformas setoriais que estão em curso.
4.1 Carga Cativa da Distribuidora
A Carga Cativa da distribuidora é a base do cálculo da Carga Remanescente. O primeiro aspecto relativo à Carga Cativa é sua variação em função das características das diferentes áreas de concessão, tal como poder ser observado na Figura 8, em que são apresentados os perfis de Carga Cativa típica para quatro distribuidoras, uma em cada submercado5.
Para as distribuidoras sudeste e sul, a Carga Cativa apresenta seus valores mais elevados no início da noite, entre 18hs e 20hs, e um vale bem acentuado durante a madrugada.
Para a distribuidora nordeste, a Carga Cativa (CC-NE) é praticamente constante durante as 24 horas do dia, com o consumo noturno sendo mantido principalmente pelo uso de aparelhos de ar-condicionado.
Para a distribuidora norte, a Carga Cativa (CC-N) é maior à noite do que durante o dia, refletindo a baixa participação das classes comercial e industrial – que consumiriam energia durante o dia – no mercado local, com a carga térmica da classe residencial determinando o perfil de consumo.
5 Os gráficos apresentados nesta Seção são cargas típicas das distribuidoras, utilizadas para evidenciar as variações da Carga Remanescente em função de fatores de risco completamente ingerenciáveis pelo gerador eólico. Na Seção 5, nos Estudos Quantitativos, as várias possibilidades de perfil de carga, contratos etc. são combinadas em simulações para quantificar os riscos. Os detalhes das simulações são apresentados naquela Seção.
(a) Distribuidora Sudeste | (b) Distribuidora Sul |
(c) Distribuidora Nordeste | (d) Distribuidora Norte |
Figura 8 – Perfil da Carga Cativa (CC) para quatro distribuidoras distintas, uma em cada submercado.
É importante notar que um gerador, ao participar de um Leilão Regulado, não conhece a priori as distribuidoras que vão adquirir energia. Logo, se a modulação depender da carga, a precificação tenderá a ser realizada de forma conservadora, com o perfil de consumo que traz maior risco às exposições a PLD.
A Carga Cativa, além de muito diversa entre cada região, tende a sofrer alterações relevantes nos próximos anos a partir de uma tendência que está se consolidando, que é justamente a expansão do mercado livre, tal como previsto na Portaria MME 465/2019, e no Projeto de Lei do Senado, PLS 232, que agora tramita na Câmara, tratando da modernização do Setor Elétrico.
Conforme mais e mais clientes industriais e comerciais migram para o Mercado Livre, a Carga Cativa vai sendo dominada pelo consumo residencial, passando a ter variações mais relevantes ao longo do dia, tal como indicado na Figura 9 para a Distribuidora Sudeste.
Para construir o perfil da Carga Cativa foi simulada a migração de clientes típicos comerciais e industriais para o Mercado Livre, de modo que os consumidores residenciais passam a ter participação maior na Carga Cativa. Os efeitos considerados são equivalentes a uma migração relativamente moderada, considerando-se o ano de 2025, devendo ser intensificados nos anos seguintes.
Assim, ao participar de um leilão, se a modulação depender da Carga Cativa da distribuidora, o gerador eólico deverá precificar o perfil de carga e sua tendência de evolução com a expansão do Mercado Livre. Essa tendência
deve ser prevista considerando perfis de Carga Cativa com predominância de consumo residencial, ou seja, com variações intensas na modulação, o que deve elevar o prêmio de risco.
Figura 9 – Perfil da Carga Cativa (CC) em função da migração ao Mercado Livre.
4.2 Mudanças no Portfólio de Contratos
Ainda que as variações previstas no perfil de Carga Cativa das distribuidoras sejam relevantes, elas representam somente uma parte pequena do risco associado à modulação dos contratos por Quantidade previstos no Edital submetido à CP004 pois, como já apresentado anteriormente, a proposta da ANEEL foi de utilizar a Carga Remanescente.
Conforme apresentado na Figura 7, o perfil de Carga Remanescente difere de forma relevante do perfil de Carga Cativa para a distribuidora sudeste. Para avaliar as diferenças nos outros submercados, na Figura 10 comparam- se os perfis de Carga Cativa e de Carga Remanescente6 para as quatro distribuidoras.
Conforme pode ser observado, para as distribuidoras do Sudeste e do Sul, o perfil de Carga Remanescente reduz
– em relação à Carga Cativa – o volume de energia a ser alocado durante a madrugada, e eleva o volume de energia a ser alocado nos períodos de maior consumo, notadamente no fim da manhã e no início da noite.
Para as distribuidoras do Nordeste e do Norte, o perfil de Carga Remanescente eleva o volume de energia a ser alocado durante a noite e durante a madrugada, e reduz o volume de energia a ser alocado nos períodos da manhã e da tarde.
6 Para obter o perfil de Carga Remanescente, simulam-se a modulação de todos os contratos, incluindo Geração Própria, PROINFA, Itaipu, Cotas de Garantia Física, Contratos por Disponibilidade, Contratos Bilaterais, Leilões de Ajuste, usinas Nucleares etc. A Carga Remanescente de cada hora é a diferença entre a Carga Cativa e a soma dos demais contratos. Caso o valor seja negativo, faz-se a Carga Remanescente igual a zero.
Para entender os motivos dessas variações é preciso ter em mente que os contratos alocados anteriormente seguiram os perfis do MRE, do PROINFA, da Carga Cativa ou mesmo um perfil flat. Além disso, os portfólios das distribuidoras são diferentes (algumas possuem Itaipu, outras não; algumas possuem muita cota; outras, muitos contratos por disponibilidade; e assim por diante).
(c) Distribuidora Sudeste | (d) Distribuidora Sul |
(e) Distribuidora Nordeste | (f) Distribuidora Norte |
Nos próximos anos, no máximo até 2025, há três eventos com alta probabilidade de ocorrência que devem alterar significativamente o portfólio de contratos de energia das distribuidoras:
vi. Em 2023 encerra-se o contrato de Xxxxxx, devendo a energia ser alocada de uma forma diferente da atual;
vii. A desestatização da Eletrobrás, na forma proposta, deve reduzir sensivelmente o volume de contratos de cota de garantia física;
viii. Vários contratos por disponibilidade serão finalizados entre 2023 e 2025.
Para avaliar como esses eventos alteram a modulação pelo perfil da Carga Remanescente foram realizadas diversas simulações. Dadas as similaridades entre as distribuidoras sudeste e sul, e nordeste e norte, os resultados neste momento serão apresentados apenas para as distribuidoras sudeste e norte.
A primeira das simulações retirou do portfólio das distribuidoras o contrato de Itaipu, modulado de acordo com o perfil do MRE, substituindo-o por um contrato modulado de forma flat. O resultado desta simulação é apresentado na Figura 11.
Para a distribuidora do sudeste, o fim do contrato de Itaipu praticamente torna nulo todo o perfil de Carga Remanescente durante a madrugada, aumentando a alocação dos períodos de carga mais elevada. Já para a distribuidora norte, como não há contrato de Itaipu, a curva verde se sobrepôs à curva azul.
(a) Distribuidora Sudeste | (b) Distribuidora Norte |
A segunda das simulações retirou do portfólio das distribuidoras os contratos por Disponibilidade, modulados de acordo com o perfil da Carga Cativa, substituindo-os por um contrato modulado de forma flat. O resultado desta simulação é apresentado na Figura 12.
Para a distribuidora do sudeste, o fim dos contratos por disponibilidade tem efeito semelhante ao fim do contrato de Itaipu, tornando nulo todo o perfil de Carga Remanescente durante a madrugada e aumentando a alocação dos períodos de carga mais elevada. Já para a distribuidora norte, o fim dos contratos por Disponibilidade aumenta a alocação de energia durante a noite, e reduz a alocação de energia durante o dia.
A terceira das simulações retirou do portfólio das distribuidoras os contratos de Cotas, modulados de acordo com o perfil do MRE, substituindo-os por um contrato modulado de forma flat. O resultado desta simulação é apresentado na Figura 13.
Neste caso, tanto para a distribuidora sudeste quanto para a distribuidora norte, a retirada dos contratos de Cotas possui efeitos muito semelhantes à retirada dos contratos por Disponibilidade:
• Sudeste: praticamente anula-se a alocação da energia durante a madrugada e eleva-se durante a tarde;
• Norte: eleva-se a alocação de energia durante a noite e reduz-se durante o dia.
(a) Distribuidora Sudeste | (b) Distribuidora Norte |
(a) Distribuidora Sudeste | (b) Distribuidora Norte |
Conforme pode-se observar, para a distribuidora sudeste o término dos contratos de Itaipu, Disponibilidade e Cotas vai eliminar a alocação de energia durante a madrugada, e vai elevar substancialmente a alocação de energia durante os horários de consumo mais elevado, em que são esperados PLDs também mais elevados. Logo, as mudanças em curso vão elevar o custo com a modulação para quem vende energia às distribuidoras em contratos modulados de acordo com o perfil de Carga Remanescente.
Para a distribuidora norte, há uma redução na energia alocada durante a madrugada e durante a manhã, e uma elevação da energia alocada no início da tarde e no início da noite. Em termos de exposição a PLD, também devem ocorrer exposições a preços elevados, mas neste caso os impactos não são tão evidentes quanto na distribuidora sudeste. Cálculos mais detalhados serão realizados no capítulo de Estudos Quantitativos.
Resta evidente, mediante as alterações do perfil de Carga Remanescente que foram apresentadas, que um contrato modulado por este perfil apresenta um custo de exposição ao mercado de curto prazo que pode variar muito intensamente em função de mudanças nos contratos de compra de energia das distribuidoras, ou seja, de forma completamente alheia à gestão do agente de geração.
Até este momento foi possível constatar que a alocação da energia de um contrato modulado pelo perfil da Carga Remanescente de uma distribuidora pode variar sensivelmente em função da Carga Cativa, o que era esperado, bem como por alterações no portfólio de contratos da distribuidora, o que não é tão evidente, mas pôde ser demonstrado com simulações.
Um risco elevadíssimo, mas muito pouco evidente, é a sobrecontratação das distribuidoras. Para entender a relação entre sobrecontratação e perfil de Carga Remanescente é preciso lembrar a equação de cálculo da Carga Remanescente:
𝐶𝑅ℎ = 𝑚𝑎𝑥{0; 𝐶𝐶ℎ − 𝐺𝑃ℎ − 𝐶𝐼ℎ − 𝐶𝐺ℎ − 𝐶𝑃ℎ − 𝐶𝑁ℎ − 𝐶𝐵ℎ − 𝐶𝐷ℎ − 𝐶𝐴ℎ}
Conforme pode ser observado, da Carga Cativa (CCh) são subtraídos todos os contratos modulados da distribuidora, exceto os por quantidade que serão modulados posteriormente, justamente pelo perfil da Carga Remanescente.
Ocorre que se a distribuidora estiver muito sobrecontratada, o que tem sido uma realidade e que pode se prolongar dependendo de como for realizada a expansão do Mercado Livre, os contratos já modulados podem ter volume superior à Carga Cativa, determinando um valor nulo para a Carga Remanescente.
Neste caso, nas horas com CRh nulo, não haverá alocação do contrato por quantidade, mas o volume mensal permanecerá o mesmo, devendo-se elevar a alocação do contrato nas demais horas.
Assim, a sobrecontratação pode promover uma mudança muito brusca de perfil de alocação dos contratos por quantidade. Para avaliar as variações de alocação recorre-se novamente a simulações com as distribuidoras sudeste e norte, avaliando uma situação relativamente crítica com nível de contratação de 125% da carga.
Os resultados encontrados são apresentados na Figura 15. A distribuidora sudeste passa a ter alocação nula de energia durante a madrugada e um perfil de alocação ao longo do dia com variações intensas, com muita energia alocada em horários específicos. Para a distribuidora norte, a alocação durante a madrugada aumenta muito, acompanhada de redução da alocação ao longo do dia.
Após avaliar como a modulação com o perfil de Carga Remanescente pode ser arriscada devido às variações que podem ocorrer na Carga Cativa, no portfólio de energia ou mesmo no nível de contratação das distribuidoras, resta calcular qual o impacto desses fatores de risco no preço da energia.
(a) Parque Eólico na Bahia | (b) Parque Eólico no Ceará |
Figura 16 – Perfis de Produção dos 2 Parques Eólicos utilizados nas Simulações.
Para cada um dos parques foi simulada a operacionalização do contrato por quantidade considerando 4 regras de modulação:
• RMCR: regra de modulação pelo perfil de Carga Remanescente da distribuidora, detalhamento explicado e avaliado no capítulo anterior. Este é o perfil proposto pela ANEEL na abertura da CP004;
• RMCRB: regra de modulação pelo perfil de Carga Remanescente da distribuidora, com banda de alocação, ou seja, com limite inferior e superior para cada hora de ±15%;
• RMF: regra de modulação flat, em que o volume de energia mensal é alocado uniformemente entre as horas do mês;
• RMG: regra de modulação pelo perfil da geração do parque eólico.
A relação temporal entre os fatores de risco é apresentada esquematicamente na Figura 18, e algoritmo desenvolvido é apresentado na Figura 19, seguindo 10 passos:
⮚ Passo 1: define-se a Regra de Modulação que vai ser simulada, podendo assumir 4 valores:
o RMCR: Regra de Modulação da Carga Remanescente;
o RMCRB: Regra de Modulação da Carga Remanescente com Bandas de ±15%;
o RMF: Regra de Modulação flat;
o RMG: Regra de Modulação pelo perfil da Geração.
⮚ Passo 2: seleciona-se o Parque Eólico a ser utilizado, considerando seus valores horários de produção ao longo de seis anos. Há duas possibilidades de escolha para o Parque Eólico:
o CE (Ceará): parque eólico com perfil de geração com produção elevada no fim da tarde;
o BA (Bahia): parque eólico com perfil de geração elevada durante o período da noite.
⮚ Passo 3: seleciona-se a distribuidora a ser utilizada na simulação, podendo assumir 4 valores:
o SE: distribuidora típica da região sudeste;
o S: distribuidora típica da região sul;
o NE: distribuidora típica da região nordeste;
o N: distribuidora típica da região norte.
⮚ Passo 4: seleciona-se um perfil de carga horária, podendo assumir 3 valores:
o 2019: considerado um ano regular;
o 2020: incorporou os efeitos da covid-19, com elevação da participação da carga residencial e seus desdobramentos sobre o perfil de Carga Remanescente;
o 2025: perfil de carga construído a partir da hipótese de expansão do Mercado Livre, com a carga cativa possuindo a retomada do consumo comercial (fim da pandemia da covid-19) e assumindo perfil com alta participação da carga residencial, com desdobramentos no perfil de Carga Remanescente;
⮚ Passo 5: seleciona-se o portfólio de contratos, considerando 5 configurações possíveis:
o Atual: as participações dos diferentes contratos são idênticas às verificadas no último processo tarifário de cada uma das 4 distribuidoras;
o Itaipu: o contrato de Itaipu, modulado de acordo com o perfil do MRE, é retirado do portfólio de contratos das distribuidoras (somente SE e S), simulando o fim do contrato previsto em 2023;
o Disp.: os contratos por Disponibilidade, modulados de acordo com o perfil da Carga Cativa, são retirados do portfólio de contratos das distribuidoras. Como o término desses contratos ocorre gradativamente ao longo do tempo, os volumes dos contratos foram reduzidos em 50%;
o Cotas: os contratos por Cotas, modulados de acordo com o perfil do MRE, são retirados do portfólio de contratos, simulando a desestatização da Eletrobrás e o fim do regime de cotas;
o 3 Efeitos: são retirados do portfólio das distribuidoras os contratos de Itaipu, Disponibilidade e Cotas; trata-se de um cenário possível a partir de 2025.
⮚ Passo 6: seleciona-se uma regra para ajustar o portfólio a partir da retirada dos contratos do Passo 5, considerando duas opções:
o Adicional Bilateral: o contrato retirado do portfólio é substituído por um contrato bilateral com modulação flat;
o Reduz Carga Cativa: o nível de contratação é restabelecido reduzindo-se a Carga Cativa, como se a retirada dos contratos tivesse sido acompanhada da migração de clientes ao Mercado Livre.
⮚ Passo 7: seleciona-se o nível de contratação, podendo ser utilizadas 3 opções:
o Atual: refere-se ao nível de contratação verificado no último processo tarifário;
o 95%: ajustam-se os volumes contratuais para simular a distribuidora subcontratada;
o 125%: ajustam-se os volumes contratuais para simular a distribuidora sobrecontratada.
⮚ Passo 8: seleciona-se o perfil de PLD Horário, podendo ser utilizadas 2 opções:
o 2019: perfil de PLD para cada hora do ano de 2019;
o 2020: perfil de PLD para hora do ano de 2020.
Figura 17 – Número de Simulações realizadas a partir da combinação dos fatores de risco.
⮚ Passo 10: as simulações realizadas resultam em valores de modulação horária para os contratos por Quantidade para cada um dos seis anos, para cada uma das 5.760 simulações realizadas. Para efeito de precificação, os resultados são consolidados anualmente para cada uma das 4 Regras de Modulação, e então realizam-se as estatísticas, tal como será apresentado na próxima seção.
Figura 18 – Algoritmo de simulação evidenciando-se a dimensão temporal.
Figura 19 – Algoritmo de simulação.
Os resultados das simulações para o parque eólico da Bahia são apresentados na Figura 20. Para cada regra de modulação são apresentadas as estatísticas dos resultados, englobando o custo médio do gerador com modulação, os percentis 5% e 95%, e os percentis 25% e 75%.
Avaliando a figura, é possível concluir que:
• A modulação não traz ganho ao gerador em nenhum dos cenários analisados (todos os valores são negativos, sendo no máximo nulos no caso da modulação pelo perfil da geração);
• A modulação pelo perfil de geração (RMG) apresenta impacto nulo para o gerador, pois ele não teria exposição a PLD;
• A modulação pela Carga Remanescente (RMCR) traz impacto muito relevante. Considerando que uma planta eólica tem vendido energia a até R$100/MWh nos leilões, o impacto desta regra de modulação pode significar aumento de preço de 7% na energia contratada;
• A modulação pela Carga Remanescente com Banda (RMCRB) de ±15% limita os impactos da Carga Remanescente, mas ainda assim a incerteza é muito relevante;
• A modulação pelo perfil flat apresenta um impacto moderado (RMF).
Figura 20 – Resultados das simulações – Bahia – Visão do Gerador.
Em meio a tantos números, resta a dúvida de qual é a melhor regra de modulação para este parque eólico.
Uma hipótese razoável é que um gerador prudente, uma vez definida a Regra de Remuneração, vai adicionar ao seu preço um Prêmio de Risco correspondente a, no mínimo, o percentil de 5%.
Um gerador avesso a risco, muito provavelmente adicionaria um Prêmio de Risco maior, equivalente à maior perda possível (percentil 0%), ou ainda algum múltiplo do percentil 5%, uma vez que os fatores de risco estão muito associados a mudanças regulatórias, que podem ser mais impactantes do que o valor simulado.
Avaliando a figura, percebe-se uma posição oposta à do gerador para as regras de modulação da Carga Remanescente e do Perfil de Geração:
• A modulação pela Carga Remanescente apresenta o menor custo direto para o consumidor;
• A modulação pelo perfil de geração apresenta o maior custo direto para o consumidor;
• Os demais casos são intermediários entre esses dois.
Na prática, no entanto, o custo com modulação que o consumidor efetivamente vai observar ao longo da vida do contrato refere-se ao valor médio, ou seja, pode variar de R$0,00/MWh a R$2,95/MWh.
Figura 21 – Resultados das simulações – Bahia – Visão do Consumidor.
Em meio a tantos números e a posições aparentemente opostas entre gerador e consumidor, o desafio é estabelecer uma metodologia que represente o menor custo da energia que será paga pelo consumidor.
Figura 22 – Custo total da modulação para o Consumidor.
Tabela 2 – Custo Total da modulação para o Consumidor - Bahia.
(A) Prêmio de Risco Adicionado ao Preço (R$/MWh) | (B) Custo Esperado para o Consumidor (R$/MWh) | Custo Total para o Consumidor (A) + (B) (R$/MWh) | |
RMCR | 6,89 | - | 6,89 |
RMCRB | 2,72 | 1,30 | 4,03 |
RMF | 1,91 | 1,86 | 3,77 |
RMG | 0,00 | 2,95 | 2,95 |
Avaliando a Tabela, conclui-se:
• A solução mais cara para o consumidor é o perfil de Carga Remanescente, justamente a proposta pela ANEEL na CP004. Esta opção é a mais cara porque aloca muito risco ao gerador que, ao precificá-lo, conclui que o Prêmio de Risco Adicionado ao Preço deve ser elevado;
• A segunda opção mais cara é o perfil de Carga Remanescente com Banda de ±15%. Neste caso, o Prêmio de Risco do gerador se reduz sensivelmente, de R$6,89/MWh para R$2,72/MWh, mas há uma elevação de custos para o consumidor, de R$1,30/MWh;
• A terceira opção mais cara é a Regra de Modulação flat. Neste caso, o consumidor paga um Prêmio de Risco moderado, de R$1,91/MWh, e possui um custo de modulação da mesma ordem de grandeza, de R$1.86/MWh, resultando em um Custo Total de R$3,77/MWh.
• Finalmente, a Regra de Modulação pelo perfil de Geração é a solução que apresenta o menor Custo Total para o consumidor, de R$2,95/MWh. Neste caso não há Prêmio de Risco adicionado pelo gerador, restando ao consumidor o pagamento do Custo Esperado com a modulação.
Poder-se-ia afirmar que o gerador pode ter um apetite ao risco maior, adotando Prêmio de Risco inferior ao percentil de 5%. Para simular este tipo de Gerador, recorre-se à Tabela 3, em que o Prêmio de Risco foi calculado considerando-se o percentil 25%.
Conforme pode-se observar, o Prêmio de Risco diminui, bem como o Custo Total para o Consumidor. No entanto, mantém-se intacta a conclusão de que a pior Regra de Modulação para o consumidor é a RMCR, ou seja, a Regra de Modulação pelo perfil de Carga Remanescente, que é justamente a proposta pela ANEEL na abertura da CP004.
A melhor regra de modulação para o consumidor continua sendo a Regra de Modulação pelo perfil de Geração, mas suas diferenças com a Modulação flat são muito pequenas.
Tabela 3 – Custo Total da modulação para o Consumidor – Bahia (gerador com apetite a risco).
(A) Prêmio de Risco Adicionado ao Preço (R$/MWh) | (B) Custo Esperado para o Consumidor (R$/MWh) | Custo Total para o Consumidor (A) + (B) (R$/MWh) | |
RMCR | 3,68 | - | 3,68 |
RMCRB | 2,10 | 1,30 | 3,41 |
RMF | 1,34 | 1,86 | 3,20 |
RMG | - | 2,95 | 2,95 |
Os resultados das simulações para o parque eólico no Ceará são apresentados na Figura 23. Para cada regra de modulação são apresentadas as estatísticas dos resultados, englobando o custo médio com modulação, os percentis 5% e 95%, e os percentis 25% e 75%.
Avaliando a Figura, é possível concluir que:
• A modulação pela Carga Remanescente traz impacto muito relevante, apresentando a capacidade inclusive de inverter o benefício da produção do parque nos momentos de maior consumo de energia;
• A modulação pela Carga Remanescente com banda de ±15% limita os impactos da Carga Remanescente, mas ainda assim a incerteza é muito relevante;
• A modulação pelo perfil flat apresenta um impacto moderado;
• A modulação pelo perfil de geração apresenta impacto nulo para a modulação.
Avaliando a figura, percebe-se que neste caso não uma oposição forte entre as visões do gerador e do consumidor, principalmente porque o perfil de produção é correlacionado positivamente com a carga:
• A modulação pela Carga Remanescente apresenta impacto nulo para o consumidor;
• A modulação pelo perfil de geração pode apresentar ganho direto para o consumidor;
• Os demais casos representam custos para o consumidor.
Avaliando a Tabela, conclui-se:
• A solução mais cara para o consumidor é o perfil de Carga Remanescente, justamente a proposta pela ANEEL na CP004. Esta opção é a mais cara porque aloca muito risco ao gerador que, ao precificá-lo, conclui que o Prêmio de Risco Adicionado ao Preço deve ser elevado;
• As regras de Modulação flat e pelo perfil de Carga Remanescente com Banda de ±15% são equivalentes, com resultados muito parecidos;
• Finalmente, a Regra de Modulação pelo perfil de Geração é a solução que apresenta o menor Custo Total para o consumidor, representando um ganho de R$0,21/MWh. Neste caso não há Prêmio de Risco adicionado pelo gerador, restando ao consumidor uma receita com a modulação.
Repete-se, portanto, a conclusão de que a Regra de maior custo para o consumidor é a proposta pela ANEEL na CP004, que realiza a modulação pelo perfil de Carga Remanescente. Por outro lado, a Regra de Modulação de menor custo para o consumidor é a Modulação pelo perfil da geração.
Finamente, supõe-se um gerador com mais apetite ao risco, cobrando como Prêmio de Risco o percentil 25%. Os resultados são apresentados na Tabela 5, a partir da qual reforça-se a conclusão anterior: o pior perfil de modulação a ser adotado é o perfil de modulação pela Carga Remanescente, justamente o proposto pela ANEEL na CP004. As demais opções mostram-se relativamente equivalentes.
Figura 23 – Resultados das simulações – Ceará – Visão do Gerador.
Figura 24 – Resultados das simulações – Ceará – Visão do Consumidor.
Tabela 4 – Custo Total da modulação para o Consumidor - Ceará.
(A) Prêmio de Risco Adicionado ao Preço (R$/MWh) | (B) Custo Esperado para o Consumidor (R$/MWh) | Custo Total para o Consumidor (A) + (B) (R$/MWh) | |||
RMCR | 2,00 | - | 2,00 | ||
RMCRB | - | 0,47 | 0,97 | 0,50 | |
RMF | - | 0,90 | 1,41 | 0,52 | |
RMG | 0,00 | - | 0,21 | - | 0,21 |
Tabela 5 – Custo Total da modulação para o Consumidor – Ceará (gerador com apetite a risco).
(A) Prêmio de Risco Adicionado ao Preço (R$/MWh) | (B) Custo Esperado para o Consumidor (R$/MWh) | Custo Total para o Consumidor (A) + (B) (R$/MWh) | |||
RMCR | 0,37 | - | 0,37 | ||
RMCRB | - | 0,78 | 0,97 | 0,19 | |
RMF | - | 1,28 | 1,41 | 0,14 | |
RMG | 0,00 | - | 0,21 | - | 0,21 |
6 Proposta ABEEólica para a Modulação
Esta Nota Técnica avaliou com profundidade a Regra de Comercialização associada aos Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEARs), particularmente para a Modulação dos contratos na Modalidade por Quantidade, ou simplesmente, contratos por Quantidade.
Para os contratos por Quantidade, a modulação é realizada de acordo com o perfil de Carga Remanescente. Ao detalhar o algoritmo de cálculo desse perfil, notou-se sua dependência de uma série de variáveis que tendem a apresentar mudanças relevantes ao longo do tempo, impactando a alocação do contrato e, consequentemente, o custo ou a receita com a modulação.
Para mapear o impacto dessas mudanças no valor do perfil de Carga Remanescente e, consequentemente, no resultado econômico da modulação de um contrato por Quantidade, desenvolveu-se um modelo de simulação detalhado, que foi aplicado a dois parques eólicos típicos: um no Ceará e outro na Bahia. Ao todo, foram realizadas 5.760 simulações combinando os diferentes fatores de risco.
O modelo de simulação foi então executado supondo-se diferentes Regras de Modulação, com diferentes séries de PLD, para um conjunto de quatro distribuidoras típicas, uma para cada submercado.
Com base nos resultados encontrados, a ABEEólica conclui:
⮚ A Regra de Modulação que apresenta o maior Custo Total para o Consumidor é Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente, que é justamente a proposta na abertura desta Consulta Pública;
⮚ A ABEEólica propõe que seja adotada a Regra de Modulação que representa o menor Custo Total para o Consumidor, que é justamente a Regra de Modulação pelo perfil de Geração, adotada atualmente;
⮚ Subsidiariamente, caso a ANEEL não adote a Regra de Modulação pelo perfil de Geração, que seja adotada a Regra de Modulação pelo perfil flat, em que o gerador assume os riscos de variação da geração, e o consumidor assume os riscos de variação do consumo.
É importante observar que intuitivamente a própria Diretoria da ANEEL já mencionou que a Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente seria a mais correta e mais apropriada para um contrato por Quantidade. Estar- se-ia, com base na intuição, defendendo-se os interesses do consumidor.
Na ausência de estudos detalhados na Consulta Pública, as análises dos fatores de risco e as simulações exaustivas apresentadas nesta contribuição mostram exatamente o oposto: a Regra de Modulação pelo perfil da Carga Remanescente aloca riscos tão diversos e aleatórios aos agentes de geração que, ao precificar tais riscos, o custo fica maior para os consumidores.
Assim, após a realização das análises apresentadas nesta contribuição, amparadas em fatos e dados, conclui-se que a modulação com Carga Remanescente é aquela que traz maiores custos aos consumidores. No caso da escolha da modulação pela Carga Remanescente, estar-se-ia prejudicando os consumidores justamente na tentativa de defendê-los.
1. ONS. Operador Nacional do Sistema Elétrico. 2021; Available from: xxx.xxx.xxx.xx.
2. EPE, Plano Decenal de Expansão de Energia 2030. 2021, Empresa de Pesquisa Energética / MME: Brasília
- DF. p. 453.
3. ANEEL. [Canal da ANEEL no Youtube]. 2021 09/02/2021.
4. CCEE, Módulo de Contratos das Regras de Comercialização, in 2021.1.0, C.d.C.d.E. Elétrica, Editor. 2021, CCEE: xxx.xxxx.xxx.xx. p. 184.
5. CCEE. Câmara de Comercialiação de Energia Elétrica. 2021; Available from: xxx.xxxx.xxx.xx.
6. Xxxxxx, X., Value at risk : the new benchmark for managing financial risk. 3rd ed. 2007, New York: McGraw- Hill. xvii, 602 p.