TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO | CÍVEL
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO | CÍVEL
Acórdão
Processo
17368/19.8T8PRT.P2
Data do documento
9 de março de 2021
Relator
Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx
DESCRITORES
Procedimento cautelar > Contrato de franquia > Cláusula de não concorrência > Validade da cláusula
SUMÁRIO
I – Colocado perante qualquer prática restritiva da concorrência, o tribunal deve avaliar se se impõe aplicar apenas o direito nacional ou também o direito da União Europeia.
II – O Regime Jurídico da Concorrência, aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 9 de maio, aplica-se a práticas restritivas da concorrência que ocorram em território nacional ou que neste tenham ou possam ter efeitos.
III – Os artigos 101.º e 102.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia TFUE) aplicam-se às práticas restritivas da concorrência que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados-Membros.
IV – O Regulamento (EU) n.º 330/2010, constituindo um mero regulamento de isenção por categoria, não impõe qualquer tipo de conduta às empresas, podendo apenas permitir-lhes beneficiar de uma isenção (automática) da proibição contida no cit. art. 101.º, n.º 1, por aplicação do disposto no n.º 3 do mesmo artigo.
V – Não se demonstrando que uma cláusula de proibição de concorrência, inserida num contrato de franquia, é suscetível de afetar o comércio entre os Estados-Membros, a mesma não enferma de vício de nulidade, se for convencionada a sua vigência pelo período de dois anos após a cessação do contrato e se for necessária à proteção e salvaguarda do saber transferido do franqueador para o franqueado.
TEXTO INTEGRAL
PROCESSO N.º 17368/19.8T8PRT.P2
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Central Cível do Porto - Juiz 4
Relator: Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx: Xxxxxx x Xxxxx Xxxxxxx: Xxxxx Xxxx
SUMÁRIO:
.......................................
.......................................
.......................................
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto
I. RELATÓRIO
1.
B…, LDA. instaurou o presente procedimento cautelar não especificado contra C…, LDA., D…, E…, F…, G… e H…, alegando, no essencial, que:
. A Requerente e a primeira Requerida celebraram um contrato de franchising, mediante o qual a primeira concedeu à segunda uma sublicença de utilização do sistema de negócio que opera no sector da mediação imobiliária e da marca “I…”, pelo prazo de cinco anos, mas que esta, tendo resolvido sem fundamento o contrato, manteve a mesma atividade, agora desenvolvida no âmbito do grupo “T…”, na mesma zona geográfica, copiando o modelo de negócio quanto à organização, à forma de remuneração e à promoção da formação e uso dos mesmos manuais, bem como fazendo uso do mesmo sistema informático e das bases de dados dos colaboradores (consultores) que integram a rede de franqueados da requerente;
. A atuação da primeira Requerida, promovida pelos demais Requeridos que atuam em representação desta e que se vincularam a título pessoal, é violadora das obrigações de não concorrência e de confidencialidade, contratualmente estipuladas, o que lhe tem vindo a causar prejuízos que se podem agravar se não for impedida a continuação daquela atuação.
Concluiu, pedindo a condenação dos Requeridos a:
A) Não contactar e/ou a estabelecer qualquer relação comercial no âmbito da mediação imobiliária com qualquer pessoa identificada nas bases de dados disponíveis no sistema informático S… à data da resolução do Contrato, designadamente clientes e potenciais clientes (prospects ou leads) ali identificados;
B) Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio de mediação imobiliária (incluindo a publicitação de quaisquer imóveis) na zona geográfica atribuída à 1.ª Requerida nos termos do Contrato ou num raio de 15 Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do Contrato;
C) Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio que tenha uma forma de administração por P… (como descrito no Ponto I.C.2 do requerimento inicial, em especial no artigo 43.º), ou Programa de Q… ou Plano de Participação de Lucros (como descrito no Ponto I.C.3 do requerimento inicial, em especial no artigo 47.º), ou outros programas substancialmente similares a estes, na zona geográfica atribuída à 1.ª Requerida nos termos do Contrato ou num raio de 15 Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do Contrato;
D) Não utilizar, disponibilizar, replicar ou permitir o acesso, na sua atividade ou em qualquer outra atividade que venha a desenvolver, o conhecimento, know-how e técnicas utilizadas no sistema de negócio, ou relacionadas com o sistema de negócio, da Requerente e que esta deu a conhecer aos Requeridos;
E) Não utilizar, copiar e/ou facultar os (ou permitir o acesso a quaisquer pessoas ou entidades aos) manuais que lhe foram disponibilizados pela Requerente no âmbito do Contrato, bem como os conteúdos e qualquer informação constante das drives disponibilizadas pela Requerente;
F) Não utilizar, copiar e/ou facultar os (ou permitir o acesso a quaisquer pessoas ou entidades aos) conteúdos das formações identificadas no Ponto I.C.4 do requerimento inicial, em especial nos artigos 52.º e 53.º;
G) Não utilizar, copiar e/ou facultar a (ou permitir o acesso a quaisquer pessoas ou entidades à) base de dados dos Consultores e franqueados que integram a rede da Requerente, sobretudo no que se refere a qualquer informação relativa às respetivas carteiras de clientes;
H) Não utilizar copiar, facultar (ou permitir o acesso a quaisquer pessoas ou entidades) a plataforma informática S… ou qualquer outra que consubstancie uma cópia desta (designadamente o “T1…”);
I) Ao abrigo do disposto no artigo 829.º-A do Código Civil, no pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento da decisão judicial ou por cada infração cometida após essa decisão, nos seguintes termos:
a) €500,00 (quinhentos euros) por cada contacto e/ou ato praticado no âmbito de relação comercial de mediação imobiliária estabelecida com qualquer pessoa identificada ou identificável nas bases de dados disponibilizadas à rede de franqueados da Requerente à data da resolução do Contrato, designadamente com clientes;
b) €5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia em que operem, estejam envolvidos ou participem em qualquer negócio de mediação imobiliária na zona geográfica atribuída à 1.ª Requerida nos termos do Contrato ou num raio de 15 Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do Contrato;
c) €100,00 (cem euros) por cada imóvel, e por cada dia que o mesmo seja divulgado/publicitado (na internet e/ou fisicamente no local), que se encontre localizado na zona geográfica atribuída à 1.ª Requerida nos termos do Contrato ou num raio de 15 Km de
qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do Contrato;
d) €5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia em que operem, estejam envolvidos ou participem em qualquer negócio que tenha uma forma de administração por P… (como descrito no Ponto I.C.2 do requerimento inicial, em especial no artigo 43.º), ou um Programa de Q… ou Plano de Participação de Lucros (como descrito no Ponto I.C.3 do requerimento inicial, em especial no artigo 47.º), ou outros programas substancialmente similares a estes, na zona geográfica atribuída à 1.ª Requerida nos termos do Contrato ou num raio de 15 Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do Contrato;
e ) €2.000,00 (dois mil euros) por cada cópia e/ou disponibilização a qualquer pessoa ou entidade dos manuais, dos conteúdos/informação constante das drives disponibilizadas pela Requerente no âmbito do Contrato e/ou dos conteúdos das formações identificadas no Ponto I.C.4 do requerimento inicial, em especial nos artigos 52.º e 53.º;
f) €5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia em que operem a plataforma informática S… ou qualquer outra que consubstancie uma cópia desta (designadamente o “T1…”)”.
2.
No seguimento de despacho que não dispensou a pretensão de dispensa do contraditório prévio, os Requeridos deduziram
oposição, os cinco primeiros em articulado conjunto, e a última separadamente.
Invocaram os cinco primeiros Requeridos, em síntese, que não estão preenchidos os pressupostos do deferimento da providência peticionada pela Requerente, desde logo porque a primeira Requerida não replicou o modelo de negócios da Requerente, que é deficitário e não é único nem diferenciador; no fundo, que não se verifica o pressuposto da aparência do direito porque a primeira Requerida procedeu à resolução do contrato de forma lícita.
Por sua vez, a última Requerida excecionou a sua ilegitimidade processual e, para o caso de não atendibilidade de tal exceção, manifestou adesão sem qualquer reserva à oposição apresentada pelos restantes Requeridos.
3.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, que julgou parcialmente procedente o procedimento cautelar e decidiu condenar os Requeridos a:
I) Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio que tenha uma forma de administração por P… (conforme descrito na alínea 5) dos factos provados) ou utilize o programa de Q… ou Plano de Participação de Lucros (conforme descrito na alínea 6) dos factos provados), ou outros programas similares a estes, na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato.
Fixa-se a quantia de 5.000,00€ por cada dia de violação do imposto em I);
II) Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio de mediação imobiliária (incluindo a publicitação de quaisquer imóveis) na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato. Fixa-se a quantia de 5.000,00€ por cada dia que violem o imposto em II). Fixa-se a quantia de 100,00€ por cada imóvel e por cada dia que o mesmo seja divulgado/publicitado (na internet e/ou fisicamente no local) localizado na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato.
III) Não utilizar, disponibilizar, replicar ou permitir o acesso, na sua actividade ou em qualquer outra actividade que venha a desenvolver, o conhecimento, know-how e técnicas utilizadas no sistema de negócio, ou relacionadas com o sistema de negócio, da requerente e que esta deu a conhecer aos requeridos.
IV) Não utilizar, copiar e/ou facultar (ou permitir o acesso a quaisquer pessoas ou entidades aos) os manuais que lhe foram disponibilizados pela requerente no âmbito do contrato, bem como os conteúdos e qualquer informação constante das drives disponibilizadas pela requerente e ainda dos conteúdos das formações que esta desenvolve para os consultores e outros elementos que integram a estrutura dos Market Centers.
Fixa-se a quantia de 2.000,00€ por cada cópia e/ou disponibilização em violação do imposto em IV).
V) Absolver os requeridos do demais peticionado pela requerente.
4.
Inconformados com tal decisão, os Requeridos interpuseram o presente recurso de apelação, com subida nos próprios autos e efeito
devolutivo, versando matéria de facto e de direito.
5.
Com o requerimento de interposição do recurso, os Recorrentes apresentaram alegações, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
1.ª - A decisão de que se recorre é nula por omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal a quo decidiu, e mal, ignorar determinadas matérias alegadas pelos Recorrentes na oposição,
2.ª - Em especial a matéria relacionada com a validade da cláusula de não-concorrência do contrato dos autos;
3.ª - Assim, estamos perante a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, fazendo com que a decisão sob recurso deva ser substituída por outra que determine a improcedência total destes autos;
4.ª - Para além disso, os Recorrentes entendem que foi incorretamente julgada a matéria de facto vertida nos artigos 3.º, 5.º, 10.º e 19.º dos factos dados como indiciariamente provados, devendo, ao invés, ter sido considerados como não provados;
5.ª - Assim, e no tocante às exigências do artigo 640º do CPC, quanto ao facto vertido no artigo 3.º dos factos considerados como indiciariamente provados, não pode o mesmo ser dado por provado em face do teor da certidão permanente da Recorrente sociedade,
6.ª - Sendo um facto que só por documento se demonstra;
7.ª - No que concerne ao facto vertido no artigo 5º, o mesmo deveria ter sido julgado como não provado em virtude dos seguintes meios de prova:
a) Depoimento do legal representante da Recorrida, J…, nas sessões da audiência de julgamento de 29.07.2020 (passagem 02:09:00) e de 30.07.2020 (passagem 00:06:00);
b) Depoimento da Recorrente H… nas sessões da audiência de julgamento de 30.07.2020 (passagens 00:47:00, 00:51:00 e 01:01:00) e de 31.07.20 (passagens 01:09:00, 00:53:00 e 00:01:00);
c) Depoimento da testemunha K… na sessão da audiência de julgamento de 15.09.2020 (passagens 00:10:00, 00:17:00);
d) Depoimento da testemunha L… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagens 00:04:00 e 00:09:00);
e) Depoimento da testemunha M… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagens 00:36:00 e 00:04:00);
8.ª - Por sua vez, o facto vertido no artigo 10.º deve ser dado como não provado porque contraria:
a) Depoimento da testemunha M… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagens 00:08:00, 00:16:00, 00:33:00, 00:51:00, 00:01:01, 00:11:00 e 00:25:00);
b) Depoimento da Recorrente H… na sessão de audiência de julgamento de 30.07.2020 (passagens 00:01:00, 00:21:00, 00:30:00 e 00:28:00 e 00:05:00);
c) Depoimento da testemunha K… na sessão da audiência de julgamento de 15.09.2020 (passagem 00:01:00);
9.ª - Pelo que se referiu a propósito do facto vertido no artigo 5.º, não pode ser dado por indiciariamente provado o constante do artigo 20.º [1] em virtude de:
a) Depoimento da testemunha N… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagens 00:04:00, 00:21:00 e 00:43:00);
b) Depoimento da testemunha L… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagem 00:01:00);
c) Depoimento da testemunha O… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagem 00:07:00);
d) Depoimento da testemunha M… na sessão da audiência de julgamento de 02.10.2020 (passagens 00:28:00, 00:37:00, 00:09:00);
e) Depoimento da Recorrente H… na sessão de audiência de julgamento de 30.07.2020 (passagem 00:18:00);
10.ª - Tendo procedido a uma errada apreciação dos factos, o Tribunal a quo, consequentemente, acabou por não aplicar corretamente o direito;
11.ª - Mais, se o Tribunal a quo tivesse interpretado e aplicado corretamente o direito, veríamos que, o mesmo, teria que se ter pronunciado sobre a validade da cláusula de não-concorrência de que a Recorrida se pretende prevalecer;
12.ª - Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, a inclusão de uma cláusula de não concorrência no contrato de franquia apenas se justifica quando indispensável para impedir que os concorrentes se aproveitem do património de conhecimentos, da técnica e da assistência do franqueado e desde que limitada no tempo respeitando limites e fins da indispensabilidade da proteção e salvaguarda do saber transmitido pelo franqueador;
13.ª - Não havendo transmissão de know-how (como resulta demonstrado nos autos) a cláusula de concorrência é nula;
14.ª - Ademais, a cláusula de “não-concorrência” pós-contratual constante do contrato de franquia dos autos viola o artigo 5º, n.º 3, do Regulamento (EU) nº 330/2010, não beneficiando da isenção de aplicação do artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
15.ª - Já que a mesma sujeita os Recorrentes a não exercer atividade imobiliária ou atividade empresarial através de empresa que adote a mesma “forma de governação” da Recorrida durante o período consecutivo de 2 (dois) anos após a cessação, por qualquer motivo, do contrato;
16.ª - Tal obrigação, sob o ponto de vista territorial, não se limita ao local onde os Recorrentes exerceram a sua atividade nos termos do mencionado contrato de franquia, estendendo-se a qualquer local do território nacional que, num raio de 15 Km, tenha já instalado um outro franqueado da mesma rede de franquias ou que, porventura, possa vir a ter;
17.ª - E ainda que não fosse aqui aplicável o Regulamento de Isenção por Categoria, não se vê que fosse possível essa cláusula beneficiar, porventura, nos termos em que foi consagrada, de um “juízo de balanço económico” positivo ou favorável, à luz do artigo 101º, nº 3 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia;
18.ª - Caso tal não se entenda, a cláusula de não-concorrência do contrato dos autos só seria válida, em abstrato, se tivesse uma aplicação temporal pós-contrato de um ano,
19.ª - Aliás como se defende em abundante jurisprudência;
20.ª - Em consequência, tendo já decorrido mais de um ano desde que o contrato dos autos cessou (abril de 2019), verifica-se, neste momento, estarmos na presença de uma efetiva inutilidade superveniente da lide ainda que circunscrita à invocada violação da obrigação de não concorrência,
21.ª - Que terá de culminar na extinção da instância, ao abrigo do artigo 277.º, alínea e), do CPC;
22.ª - Para além disso, a providência decretada vai para além do necessário para proteção do know-how da Recorrida porque abrange também a proibição dos Recorrentes operarem, envolverem-se ou participarem em qualquer negócio de mediação imobiliária (incluindo a publicitação de quaisquer imóveis) na zona geográfica atribuída à mesma ou num raio de 15km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato, independentemente da forma de gestão ou do modelo de negócio aplicado pelos Recorrentes;
23.ª - Nenhum dos pressupostos legais de decretamento da presente providência cautelar se encontra preenchido.
*
Pedem os Recorrentes que se revogue a sentença e se substitua por outra que extinga a presente instância por inutilidade superveniente da lide ou, caso assim não se considere, improceda o presente procedimento cautelar.
6.
Contra-alegaram os recorridos, pugnando pela negação da apelação.
II
OBJETO DO RECURSO
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de questões nelas não incluídas, salvo se forem de conhecimento oficioso (cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1.ª parte, e 639.º, nºs 1 e 2, todos do CPCivil).
Assim, considerando as conclusões das alegações apresentadas pelos Apelantes, as questões essenciais a decidir no presente recurso, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica, são as seguintes:
1 – Se se verifica nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia;
2 – Se se verifica erro de julgamento no que concerne aos factos vertidos nos pontos 3.º), 5.º), 10.º) e 20.º) do elenco dos factos julgados indiciariamente provados, em termos que justifiquem antes julgá-los indiciariamente não provados; e
3 – Se as providências decretadas respeitam os pressupostos previstos nos artigos 362.º, n.º 1 e 368.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil[2].
III FUNDAMENTAÇÃO
1.
Da invocada nulidade da decisão recorrida
Sustentam os Recorrentes que a sentença não se pronunciou, como devia, sobre determinadas matérias alegadas na oposição, em especial a relacionada com a validade da cláusula de não concorrência inserta no contrato em causa, sendo por isso nula, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPCivil.
A Xxxxxxxxx defendeu a improcedência da arguida nulidade, invocando que o tribunal a quo, ao pronunciar-se na decisão recorrida, acerca do pressuposto da séria possibilidade de existência do direito que se pretende acautelar, conheceu da questão essencial na exata medida em que é exigido por lei.
A Sra. Juíza de Direito, em despacho proferido ao abrigo do preceituado no art. 617.º, n.º 1 do CPCivil, sustentou não se verificar a invocada nulidade, porquanto a decisão recorrida tratou de toda a matéria apontada nos autos relevante para a decisão da causa.
Vejamos.
Segundo dispõe o art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPCivil, “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.
Tal cominação decorre do dever imposto ao juiz de “resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras” (art. 608.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPCivil).
Nesta matéria, importa apenas lembrar o que é pacífico na doutrina e na jurisprudência: as “questões” previstas nos normativos em apreço “reportam-se aos pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição das partes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções, não se reconduzindo à argumentação utilizada pelas partes em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos, mas sim às concretas controvérsias centrais a dirimir”[3].
Ora, no caso dos autos, bastará ler atentamente a sentença para concluir que o tribunal de que vem o recurso apreciou todas as questões essenciais à formulação de um juízo jurídico acerca da verificação da totalidade dos pressupostos legais do decretamento da providência requerida.
Na verdade, após caracterizar o contrato em causa, a propósito do pressuposto “probabilidade séria da existência do direito”, a decisão debruçou-se expressamente sobre o estipulado pelas partes no que respeita às obrigações de não concorrência e de confidencialidade, acabando por afirmar “que não se vislumbram argumentos para concluir pela nulidade da referida cláusula de não concorrência com o fundamento invocado pelos requeridos”.
É certo que a decisão recorrida não se refere expressamente a certos argumentos esgrimidos pelos Recorrentes, nomeadamente a afirmada nulidade ou nulidade parcial da cláusula em questão à luz de certas normas do direito da União Europeia.
Mas, argumentos jurídicos não se confundem com questões jurídicas estruturais controvertidas, e estas últimas foram abordadas pela sentença em termos que se coadunam suficientemente com as exigências da lei processual, que no caso, como é sabido, não vão além da summaria cognitio.
Conclui-se, pois, pela improcedência da arguida nulidade da decisão recorrida fundada em omissão de pronúncia.
2.
OS FACTOS 2.1.
Factos indiciariamente provados
O tribunal de 1.ª instância julgou indiciariamente provados os seguintes factos:
1) A requerente desenvolve a atividade em regime de franchising, dedicando-se à gestão de uma rede de franqueados que opera no sector da mediação imobiliária.
2) A primeira requerida, constituída em 11.08.2017, dedica-se à atividade de mediação imobiliária.
……………………
……………………
……………………
(NOTA: Em virtude do decidido infra, sob o ponto 2.3.1), a redação deste ponto da matéria de facto passa a ser a seguinte:
Os 2.º, 3.º, 4.º e 5.º Requeridos são sócios da 1.ª Requerida, assumindo todos eles funções de gerência, com exceção da 5.ª requerida).
4) A requerente desenvolve a sua atividade sob um sistema de negócio e uma marca comuns (I…) detidos pela I… Realty Internacional, que concedeu à requerente uma licença exclusiva de utilização para o território português, com a faculdade de sublicenciar.
5) Aquele sistema de negócio assenta num modelo de organização e de administração concebido para o exercício da atividade de mediação imobiliária, com base no qual os franqueadores exploram as suas unidades de negócio (Market Centers) e que apresenta os seguintes traços distintivos:
A- Uma organização das unidades de negócio (Market Centers), centrada na figura do consultor e que assume uma estrutura orgânica definida, com cargos e funções concretas e específicas previamente determinadas (tais como de “operating principal”, “team leader”, “administrador de market center”, “Director of first impressions”… ), consubstanciando órgão diferenciado o “P…”, que é um órgão onde os Consultores tomam assento e participam nas decisões de gestão do Market Center.
B- Quanto ao sistema de remuneração, na estruturação das comissões pagas aos consultores e segundo o programa “Q…” que consiste num esquema de redistribuição de uma percentagem da faturação que permite compensar os Consultores pelo recrutamento de novos Consultores em sete níveis de distribuição.
C- Na promoção de formações dos Consultores, complementadas com a disponibilização de manuais e de vídeos orientados para a aprendizagem do sistema de negócio da requerida.
6) Em 20 de Dezembro de 2017, a requerente e a primeira requerida celebraram um acordo, mediante o qual a primeira concedeu à segunda uma sublicença de utilização do sistema de negócio identificado em 4), pelo prazo de cinco anos com inicio em 2 de Janeiro de 2018, mediante a obrigação desta remunerar a primeira.
7) Ficou estipulado o seguinte:
- Como contrapartida da formação, segredos comerciais, informações confidenciais e vantagens a fornecer pela requerente à primeira requerida acordaram: “(2) No que respeita ao Sublicenciado, por um período contínuo ininterrupto iniciado no momento da resolução, cancelamento [revogação], vencimento [caducidade] ou transmissão da participação [cessão da posição contratual] do Sublicenciado no presente Acordo (ou no que respeita a cada um dos elementos do Grupo de Controlo e Responsáveis do Sublicenciado, começando no que ocorrer primeiro de: (i) a resolução, cancelamento [revogação], vencimento [caducidade] ou transmissão da participação [cessão da posição contratual] do Sublicenciado no presente Acordo (…) e prolongando-se por mais dois anos, nem o Sublicenciado nem qualquer elemento do Grupo de Controlo ou qualquer Responsável do Sublicenciado deverão, direta ou indiretamente, por si ou através ou em nome de ou em conjunto com qualquer membro do Grupo do Sublicenciado ou qualquer outra Pessoa:
(A) Desviar ou tentar desviar qualquer negócio ou cliente do Market Center para qualquer concorrente (…).
(C) Deter, manter, operar, empenhar-se [envolver-se ou participar] em ou ter alguma participação [qualquer interesse] em qualquer empresa [negócio] de mediação imobiliária ou na Área Concedida que tenha uma forma de governação [administração] por P…, um programa de “Q…” ou [Plano de] Participação de Lucros ou outros programas substancialmente similares ao P…, “Q…” e Plano de Participação de Lucros descrito nos Manuais e que se encontre localizado na Área Concedida ou num raio de 15 km de qualquer outro Market Center existente ou Em construção [constituição], a contar do que ocorrer primeiro: (i) resolução, cancelamento [revogação], vencimento [caducidade] ou transmissão da participação [cessão da posição contratual] do Sublicenciado no presente Acordo (…).” (cláusula 17.02 do contrato).
- “(b) O Grupo do Sublicenciado deverá, a qualquer momento, tratar os conteúdos dos Manuais como confidenciais e deverá envidar esforços para manter esta informação como secreta e confidencial. O Grupo do Sublicenciado não deverá nunca copiar, duplicar, publicar eletronicamente, gravar ou reproduzir os Manuais, em todo ou em parte, nem disponibilizar os mesmos a qualquer Pessoa não autorizada.
(c) Os manuais deverão permanecer sempre propriedade única da Empresa. Cópias impressas dos Manuais atuais deverão ser guardadas em local seguro nas instalações do Market Center (se aplicável); e as versões eletrónicas dos Manuais deverão ser salvaguardadas com proteções físicas e eletrónicas apropriadas normalmente disponíveis ou de outra forma conforme expresso por escrito pela Empresa." (cláusula 8.01).
- “(a) nenhum membro do Grupo do Sublicenciado poderá comunicar, divulgar ou utilizar, para benefício de qualquer outra Pessoa, qualquer informação confidencial, conhecimentos ou know-how relativamente aos métodos de operação de um Market Center. O Sublicenciado, cada elemento do Grupo de Controlo e cada Responsável do Sublicenciado deverá apenas divulgar essa informação confidencial aos membros do Grupo do Sublicenciado e Associados que devam ter acesso à mesma para conduzir a atividade do
Market Center. Toda a informação, conhecimento, know-how e técnicas utilizadas no Sistema ou relacionadas com o Sistema que a Empresa comunique aos membros do Grupo do Sublicenciado por escrito ou que de qualquer forma inclua, mas não se limitando a [rectius], aos Manuais, seus conceitos de formação, materiais e técnicas, a estrutura e operação dos P… e o Plano de “Q…” e qualquer outro tipo de informação que a Empresa designe como confidencial, deverá ser mantida confidencial para os efeitos do presente Acordo. Nenhum membro do Grupo do Sublicenciado deverá em circunstância alguma copiar, duplicar, gravar ou reproduzir tais materiais ou informação, em todo ou em parte, nem tornar essa informação disponível a qualquer pessoa não autorizada. As cláusulas nesta Secção 8.02 deverão ser perpetuamente vinculativas pelos membros do Grupo do Sublicenciado, e deverão subsistir à rescisão, cancelamento, cessação ou transmissão do presente Acordo” (cláusula 8.02).
8) Os segundo, terceiro, quarto e quinto requeridos assumiram a título pessoal perante a requerente as obrigações de confidencialidade e não concorrência estipuladas nas cláusulas vertidas em 7).
9) Pela celebração do referido contrato foi atribuída à primeira requerida como zona geográfica exclusiva para o desenvolvimento da atividade a correspondente à freguesia de …, no concelho do Porto.
10) Para efeitos de implementação e utilização do sistema de negócio, a requerente transmitiu ao segundo, terceiro, quarto, quinto e sexto requeridos, informação relativa aos modelos de organização e administração.
11) E disponibilizou-lhes o acesso ao arquivo disponibilizado on line (drive) de formação e de formação local, onde estão disponíveis os conteúdos de formação e respetivos manuais.
12) Na vigência do contrato e perante o reconhecimento, inclusive da requerente, do sistema informático que disponibilizava, por iniciativa de duas das franchisadas, entre as quais a primeira requerente, e em parceria com a requerida, foi promovida a criação do sistema informático “S…” (…) desenvolvido em exclusivo para ser utilizado na rede de franqueados da requerente.
13) Este sistema informático é disponibilizado aos consultores da rede da requerente que, designadamente, o utilizam para registar e manter os dados da sua carteira de clientes dos consultores e dos franchisados.
14) A requerente assumiu perante os seus franchisados a obrigação de garantir a confidencialidade e inviolabilidade daquelas bases de dados.
15) A Primeira requerida remeteu à requerente a carta datada de 8 de abril de 2019, mediante a qual declarou resolver o contrato com os seguintes fundamentos:
- Falta de apoio, formação e consultoria por parte da requerente, o que teria "desorientado e desamparado sobremaneira a condução do negócio" desenvolvido pela requerida;
- Disponibilização de deficitárias soluções tecnológicas, por referência a patologias identificadas nos sistemas informáticos denominados "Sales Force" e "i-list";
- Decisão de introdução de um novo software de apoio à rede de franqueados, apresentado a 4 de abril de 2019.
16) A requerente remeteu à primeira requerida a carta datada de 30 de abril de 2019, mediante a qual rebateu os fundamentos da resolução avançados por esta e, sustentando redundar no incumprimento definitivo do contrato pela primeira requerida, resolveu por sua vez o contrato.
17) No dia 9 de Abril de 2019, a primeira requerida deu início a um novo projeto no âmbito da atividade de mediação imobiliária, integrando o projeto T…, que se trata de uma rede de franqueadores que opera sob a marca T…, encabeçada pela franchisadora “U…, Lda.”.
18) A “U…, Lda.” foi registada em 18 de abril de 2018, tendo como objeto a mediação imobiliária, tem como sócios V… e W…, e como gerentes este segundo sócio e E… (o terceiro requerido), este desde 21 de agosto de 2019.
19) A sexta requerida apresenta-se publicamente como CEO da T….
20) No novo projeto que a primeira requerida integrou:
- Mantém uma estrutura orgânica das unidades de negócio decalcada da utilizada pela requerente, apenas com diferente nomenclatura (“Hub”, “general manager”, “hub manager”, “welcome manager” em vez de “Market Center”, “team leader”, “administrador de market center”, “director of first impressions”…) e manteve um órgão com as funções do “P…” que passou a designar de “Comité do Crescimento”.
- Continuou a utilizar e a facultar aos seus Consultores os manuais disponibilizados pela I…, continuando a manter referências à nomenclatura desta e à própria marca.
21) A primeira requerida continua a desenvolver a atividade na zona geográfica da freguesia de….
22) E explora uma unidade de negócio na Rua …, situada a 5,3km da “X… Porto”, unidade de negócio integrada na rede de
franqueados da requerente.
23) A primeira requerida passou a utilizar um sistema informático designado de “T1…” que foi construído a partir do sistema informático “S….
24) E tem exercido a atividade com recurso à base de dados dos consultores que integraram a rede da requerente.
25) Essas bases de dados dos Consultores que acompanharam a primeira requerida foram transferidas para estes a elas terem acesso pelo “T1…”.
26) A primeira requerida mantém ao serviço funcionários com contrato de trabalho e consultores com contrato de prestação de serviço, em regime de exclusividade.
27) A requerente abriu mais dois Market Centers no Porto, em 2019.
28) Os 2.º, 3.º e 5.º requeridos estão no mercado da mediação imobiliária desde 2007, com a sua empresa “AB…”;
29) Numa primeira fase a requerida integrou a rede Y…, através do contrato de franquia celebrado em 2012 com a Z…, Lda.”;
30) Os sócios da primeira requerida foram contemporâneos dos sócios da requerente no exercício da atividade de mediação imobiliária.
2.2.
Factos indiciariamente não provados
O tribunal de 1.ª instância julgou indiciariamente não provados os seguintes factos:
a) O programa informático “S… identificado no ponto 2.1.12) foi criado apenas pela primeira requerente.
b) A primeira requerida assume a posição de franchisador no projeto T….
c) Os manuais de formação disponibilizados pela requerida são divulgados publicamente pelo sócio fundador da X… Internacional;
d) As ideias, filosofias e citações constantes dos power points são correntes na internet.
2.3.
……………………………………
……………………………………
…………………………………… 3.
OS FACTOS E O DIREITO 3.1.
O recurso ao procedimento cautelar comum, como é o caso, é legitimado “sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável do seu direito” (art. 362.º, n.º 1, do CPCivil).
Nos termos do art. 368.º, n.º 1, do CPCivil, “a providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão”; ainda assim, a providência pode ser recusada pelo tribunal quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar” (n.º 2 do mesmo artigo).
Assim, para que a providência possa ser decretada basta que sumariamente (summaria cognitio) se conclua pela probabilidade séria da existência do direito (fumus boni iuris) e pelo receio justificado de que a demora cause prejuízo irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora).
3.2.
No caso dos autos, como se deixou referido na sentença sob recurso, não discutem as partes a relação obrigacional que as uniu e a respetiva qualificação jurídica: um contrato de franquia (franchising).
Em Portugal, à semelhança do que sucede em muitos outros países, designadamente no espaço europeu, o contrato de franquia apresenta-se como um contrato atípico, por não beneficiar de disciplina legal própria.
Sendo legalmente atípico, é no entanto socialmente típico, no sentido de que se trata de uma prática social reiterada e praticamente homogénea, no comércio jurídico[4].
O Código de Deontologia Europeu do Franchising, elaborado pelos presidentes das associações de franchising de vários Estados-
Membros e aprovado em 1972, do qual é aderente Portugal desde 1991, por ser membro da Federação Europeia do Franchising, embora sem força legal obrigatória, apresenta-nos a seguinte noção:
“O franchising é um sistema de comercialização de produtos e/ou serviços e/ou tecnologias, baseado numa estreita e contínua colaboração entre empresas jurídicas e financeiramente distintas e independentes, o franchisador e os seus franchisados, através do qual o franchisador concede aos seus franchisados o direito, e impõe a obrigação, de explorar uma empresa de acordo com o seu Conceito.
O direito concedido confere ao franchisado o poder e o dever de, mediante uma contrapartida financeira direta ou indireta, usar a insígnia e/ou marca de produtos e/ou marca de serviços, o saber-fazer, os métodos comerciais e técnicos, o sistema de procedimentos e outros direitos de propriedade industrial e intelectual, apoiados por uma prestação contínua de assistência comercial e/ou técnica, no âmbito e durante a vigência dum contrato de franchising escrito, para tal fim, celebrado entre as partes”[5].
Como se deixou expresso na sentença, “dada a natureza de contrato atípico ou inominado, o contrato de franquia rege-se pelas disposições reguladoras (não excecionais) dos contratos nominados, com os quais apresente maior afinidade, sendo entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência que a analogia estabelece-se com o contrato de agência, regulado no DL 178/86 de 3.7, sobretudo, no regime de cessação do contrato, avultando a estabilidade e a duração da relação como características estruturarias do convénio, sem prejuízo de esta aplicação não poder colidir com o regime daquele, clausulado nos termos do artigo 405º do CCivil, existindo, outrossim, normas que só ao contrato de agência se aplicam[6]”.
Dentre as modalidades tradicionalmente atribuídas ao contrato de franquia - distribuição, produção e serviços –, é patente que o contrato em causa, visando a atividade comercial de mediação imobiliária, se reconhece como contrato de franquia de serviços.
É incontroverso que o contrato sub judice, com início de vigência em 2 de janeiro de 2018, atingiu o seu termo em abril de 2019, em virtude de declarações mútuas de resolução.
Assentando o invocado direito da Requerente em alegada violação de obrigações pós-contratuais, clausuladas no próprio contrato, mais concretamente obrigações de não concorrência e de confidencialidade por parte dos requeridos, nos termos que constam do ponto 7) dos factos indiciariamente provados, a sentença ora impugnada, após afirmar a validade de tais cláusulas, concluiu pela probabilidade séria da existência do direito.
3.3.
Neste recurso, os Requeridos/Apelantes manifestam-se contra o juízo de validade legal de uma das ditas cláusulas contratuais, concretamente a que impõe uma obrigação de não concorrência, feito pelo tribunal a quo, sustentando que se justifica antes um juízo de invalidade (totalmente inválida ou, no limite, parcialmente inválida, sujeitando-se ao instituto da redução).
Argumentam os Apelantes:
- Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, a inclusão de uma cláusula de não concorrência no contrato de franquia apenas se justifica quando indispensável para impedir que os concorrentes se aproveitem do património de conhecimentos, da técnica e da assistência do franqueado e desde que limitada no tempo respeitando limites e fins da indispensabilidade da proteção e salvaguarda do saber transmitido pelo franqueador (12.ª conclusão das alegações, supra);
- Não havendo transmissão de know-how (como resulta demonstrado nos autos) a cláusula de concorrência é nula (13.ª conclusão das alegações, supra).
Tal entendimento supunha, como é claro, a modificação da pertinente matéria de facto nos temos pugnados pelos Recorrentes, o que não sucede, conforme decisão supra.
Assim, tendo presente a factualidade julgada indiciariamente provada e descrita sob os pontos 5) e 10), sem necessidade de outras considerações, é manifesto que a argumentação dos Recorrentes, na parte em apreço, se mostra prejudicada, não podendo, como tal, ser acolhida por este tribunal.
Sustentam ainda os Recorrentes:
- Ademais, a cláusula de “não-concorrência” pós-contratual constante do contrato de franquia dos autos viola o artigo 5º, n.º 3, do Regulamento (EU) nº 330/2010, não beneficiando da isenção de aplicação do artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (14.ª conclusão das alegações, supra);
- Já que a mesma sujeita os Recorrentes a não exercer atividade imobiliária ou atividade empresarial através de empresa que adote a mesma “forma de governação” da Recorrida durante o período consecutivo de 2 (dois) anos após a cessação, por qualquer
motivo, do contrato (15.ª conclusão das alegações, supra);
- Tal obrigação, sob o ponto de vista territorial, não se limita ao local onde os Recorrentes exerceram a sua atividade nos termos do mencionado contrato de franquia, estendendo-se a qualquer local do território nacional que, num raio de 15 Km, tenha já instalado um outro franqueado da mesma rede de franquias ou que, porventura, possa vir a ter (16.ª conclusão das alegações, supra);
- E ainda que não fosse aqui aplicável o Regulamento de Isenção por Categoria, não se vê que fosse possível essa cláusula beneficiar, porventura, nos termos em que foi consagrada, de um “juízo de balanço económico” positivo ou favorável, à luz do artigo 101º, nº 3 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia; (17.ª conclusão das alegações, supra);
- Caso tal não se entenda, a cláusula de não-concorrência do contrato dos autos só seria válida, em abstrato, se tivesse uma aplicação temporal pós-contrato de um ano, (18.ª conclusão das alegações, supra);
- Aliás como se defende em abundante jurisprudência; (19.ª conclusão das alegações, supra);
- Em consequência, tendo já decorrido mais de um ano desde que o contrato dos autos cessou (abril de 2019), verifica-se, neste momento, estarmos na presença de uma efetiva inutilidade superveniente da lide ainda que circunscrita à invocada violação da obrigação de não concorrência, (20.ª conclusão das alegações, supra);
- Que terá de culminar na extinção da instância, ao abrigo do artigo 277.º, alínea e), do CPC (21.ª conclusão das alegações, supra). Em abono do seu entendimento, os Recorrentes invocam parecer jurídico, subscrito pelos Professores Xxxxx Xxxxxx, Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx e Xxxxxxxxxx Xxxxxxxx, junto a estes autos, que tem por objeto um caso idêntico ao aqui em apreço, cujas conclusões se apresentam nos seguintes termos:
1 - A cláusula de “não-concorrência”, consagrando obrigações pós- contratuais que impendem sobre a AC… (e o universo de pessoas envolvido na AC…), é uma cláusula constante de um contrato de franquia de serviços de mediação imobiliária.
2 - Tal obrigação sujeita o ex-franquiado a não exercer atividade imobiliária ou atividade empresarial através de empresa que adote a mesma “forma de governação” do franquiador (“B…, Lda”), durante um período consecutivo de 2 (dois) anos após a cessação, por qualquer motivo, do contrato.
3 - Tal obrigação de non faccere, sob o ponto de vista territorial, não se limita ao local onde a AC… (ex-franqueada) exerceu a sua atividade, nos termos da mencionada franquia de serviços de mediação imobiliária celebrada com a “B…, Lda”. Na realidade, tal obrigação, nos termos contratualizados, estende-se a qualquer local do território nacional que, num raio de 15 Km, tenha já instalado um outro franquiado da mesma rede de franquias ou que, porventura, possa vir a ter (esteja previsto ou em construção / instalação um outro “market center” da rede de franquias “I…”)
4 - É aplicável, num prisma jusconcorrencial, a este contrato de franquia, o artigo 101º do TFUE e o Regulamento de “Isenção por categoria” de acordos que se dirige aos acordos verticais, a saber, o Regulamento (UE) nº 330/2010 de 10 de abril, “relativo à aplicação do artigo 101ª, nº 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de acordos verticais e práticas concertadas”. Na realidade, este acordo é “suscetível de afetar o comércio entre os Estados-Membros”, tal como esta expressão/terminologia normativa é entendida, recorrente e solidamente, pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e pelas Autoridades da Concorrência (incluindo a Comissão Europeia), integrantes da “Rede Europeia de Autoridades da Concorrência”.
5 - Entendemos que está em causa, neste acordo vertical (contrato de franquia), a aplicação do princípio e dos normativos relativos à proibição de acordos ou ententes violadoras da concorrência e não o princípio da proibição de abusos de posição dominante, na medida em que não há evidências, in casu, indiciadoras da existência de uma posição dominante, nomeadamente da parte da “B…, Lda” e/ou da AC…, Lda, nos respetivos mercados relevantes (situações de oligopólio, quase-monopólio ou mesmo monopólio).
6 - Ora, na realidade, a admissibilidade de cláusulas de concorrência, nos termos do Regulamento (UE) nº 330/2010 (na linha de atos normativos antecedentes), depende de, por um lado, ser necessário proteger-se um “know-how” qualificado, na titularidade legítima do franquiador e que, por xxx xx xxxxx, xx xxxxxx xx xxxxxxxx xxx xxxxxxxxx xx xxxxxxxx, é partilhado com o franquiado; e, por outro lado e particularmente no tipo de situação concreta que nos ocupa, do facto de tal obrigação de “não-concorrência” dizer respeito a) “a bens ou serviços que concorram com os bens ou serviços contratuais”;
b) a “obrigação ser limitada às instalações e terrenos a partir dos quais o comprador” – neste caso, o franquiado – “exerceu as suas atividades durante o período do contrato”;
c) a “obrigação ser indispensável para proteger o «saber–fazer» transferido pelo fornecedor para o comprador”, ou seja, o “know- how” partilhado/transferido do franquiador para o franquiado;
d) a duração dessa obrigação (de “não-concorrência”) “ser limitado ao período de um ano apos a cessação do contrato”.
7 - Importa esclarecer que, nesta situação dos Regulamentos de “isenção por categoria”, com a admissibilidade ou com a
conformidade da ou das cláusulas ao Regulamento, pretende-se desencadear a “não aplicação” dos nº 3 e 2 do artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – considerando, por isso, não lesivas da concorrência ou então, válidas, tais cláusulas (em rigor, não se lhes aplicando a cominação do nº 2, do artigo 101º do Tratado, ou seja, a nulidade).
8 - Como se torna claro, a cláusula de “não-concorrência” que equacionamos não preenche os requisitos do artigo 3º do Regulamento (UE) nº 330/2010, por violar o tempo de duração admissível (excede um ano após a cessação do contrato) e por estender a obrigação de non faccere do ex-franquiado a uma área geográfica, atual e potencial, mais extensa do que aquela que está prevista nesse normativo.
9 - Essa cláusula de “não-concorrência” pós-contratual não beneficia da “isenção de aplicação do artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”.
10 - Não se vê, de resto e mesmo sem considerar a existência e a aplicação, a esta situação, do mencionado Regulamento de “isenção por categoria” (mera hipótese especulativa) que fosse possível essa cláusula beneficiar, porventura, nos termos em que foi consagrada, de um “juízo de balanço económico” positivo ou favorável, à luz do artigo 101º, nº 3 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Desde logo, o requisito da “necessidade” é largamente excedido pelas restrições à concorrência que impõe, quer sob o ponto de vista temporal (duração), quer sob o ponto de vista geográfico.
11 - Mas, atendendo àquilo que poderá justificar, em abstrato, uma cláusula de “não-concorrência”, neste tipo de acordo vertical – a saber, o “know-how” ou “saber-fazer” específico, inovador e da legítima titularidade do franquiador, o facto é que, atendendo às características e à progressiva padronização de métodos de trabalho, de angariação e de fixação de preços pelos serviços de mediação imobiliária, com o recurso às plataformas informáticas que, no essencial, prosseguem as mesmas funções (independentemente de diferenças não essenciais ou não-conceituais), pode, mesmo , com propriedade, entender-se que - no caso concreto - não se justifica sequer uma restrição à concorrência como a que se traduz na cláusula de “não-concorrência” pós- contratual do contrato de franquia, celebrado entre a “B…, Lda” e a AC…, Lda (cláusula 17.02 do contrato).
12 - Entendendo-se a falta de justificação, nos termos antecedentemente assinalados, para tal cláusula de “não-concorrência”, estaríamos, então, perante uma nulidade total dessa mesma cláusula, sem qualquer hipótese de se aproveitar (instituto da redução- artigo 292º do Código Civil), ainda assim, tal cláusula, expurgada dos elementos de ilicitude, a saber, o prazo na parte que excede um ano e o âmbito territorial/geográfico, na parte que ultrapassa o local em que o ex-franquiado exerceu as suas funções, no âmbito do contrato de franquia.
13 - Além disso, tal como está consagrada, tal obrigação de “não- concorrência” pós-contratual, acaba, igualmente, por restringir injustificadamente o direito fundamental à “liberdade de empresa” do ex-franquiado, violando, assim, desde logo e no nosso entendimento, o artigo 16º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia – aplicável a esta situação, na medida em que se convoca, para a regulação deste acordo vertical (e, portanto, desta cláusula), o Direito da União Europeia (desde logo, o Regulamento UE nº 330/2010).
14 - Na verdade, apenas a proteção e o efeito económico útil do “saber fazer”, transferido do ex-franquiador para o ex-franquiado, poderia justificar e validar uma restrição (como a que é, por via de regra, contida numa cláusula de “não-concorrência”, como aquela que analisamos) à referida “liberdade de empresa”.
Ora, na medida em que o próprio Regulamento “baliza” tal restrição ou compressão (ainda) admissível desse direito fundamental, e verificando-se que, em concreto, tais balizas foram desrespeitadas, então, existe uma restrição injustificada de tal direito fundamental (uma violação do artigo 16º da Carta).
15 - Em síntese conclusiva, a cláusula de “não-concorrência” pós-contratual analisada, viola o artigo 5º, nº 3 do Regulamento (UE) nº 330/2010, não beneficiando da “isenção de aplicação do artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e, concomitantemente, restringe, também, injustificadamente, o artigo 16º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
Tal cláusula é nula, podendo, porventura e se se considerar que, ainda assim, existe um substancial (inovador e da legítima titularidade do ex-franquiador) “saber fazer” cuja proteção, em concreto, pode justificar uma cláusula de “não-concorrência” pós contratual, nos termos e dentro dos limites consagrados no nº 3, do artigo 5º do Regulamento mencionado, então, poderá eventualmente aplicar-se o instituto da redução.
Se, porventura, tal redução puder ser considerada, a obrigação pós contratual, nesse caso, restringir-se-ia apenas ao local onde o “Market Center” da AC… existiu e funcionou durante a vigência do contrato de franquia e, ainda, tal obrigação pós-contratual não poderia exceder 1 (um) ano, após a cessação do dito contrato de franquia.
Também invocaram jurisprudência no sentido da posição que defendem, nomeadamente o Ac. do TRL, de 16.06.2020, proferido no
processo n.º 2591/19.3T8CSC.L1, relatado por Xxxxxxxxx Xxxxxxxx, junto a estes autos, com o seguinte Sumário:
I – É lícita a inclusão, num contrato de franquia no âmbito da mediação imobiliária, de uma cláusula proibitiva de concorrência pós contratual, desde que limitada, no tempo e no espaço, e indispensável a proteger o saber-fazer transmitido pelo franquiador ao franqueado;
II – Proibindo uma das cláusulas desse contrato de franquia a concorrência pós contratual extravasando os referidos limites, será a mesma apenas parcialmente nula, sendo admissível a respetiva redução nos termos do art. 292 do C.C.;
III – Concluindo-se que a dita cláusula de proibição de concorrência pós contratual se mantém reduzida temporalmente a um ano e provando-se que já decorreu esse prazo desde a resolução do contrato, é de julgar extinta a instância cautelar por inutilidade superveniente da lide circunscrita à invocada violação do pacto de concorrência;
IV – (…).
Por seu turno, a Xxxxxxx manifesta-se radicalmente contra a posição dos Apelantes, socorrendo-se de fontes de valor formal igual às trazidas à lide pelos Recorrentes.
Assim, fez juntar aos autos documento correspondente ao acórdão do TRP, de 24.09.2020, proferido no processo 17369/19.6T8PRT.P1, relatado por Xxxxxx Xxxxxx, com decisão em sentido divergente ao mencionado acórdão da RL junto pelos Recorrentes, e também um parecer jurídico, subscrito pelo Professor Xxxx Xxxx xx Xxxx Xxxxxx e pelo Doutor Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, versando sobre aquela “contradição de julgados”, cujo Sumário Executivo se passa a transcrever:
I. SUMÁRIO EXECUTIVO
1. O presente parecer foi-nos solicitado a propósito de uma contradição de julgados resultante de apreciações contrastantes feitas em dois arestos, um do Tribunal da Relação de Lisboa e outro do Tribunal da Relação do Porto, quanto à validade, à luz do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (doravante, “TFUE”), de uma cláusula prevista em contratos de franquia celebrados pela empresa B…, Lda.”.
2. O parecer tem o objetivo de responder às seguintes questões:
i. Deve concluir-se, atendendo aos dados factuais, económicos e jurídicos apresentados nos acórdãos da Relação de Lisboa e do Porto que a referida cláusula infringe o artigo 101.º TFUE, nomeadamente por aplicação do disposto no artigo 5.º do Regulamento n.º 330/2010?
ii. (…).
Quanto à primeira questão
3. O artigo 101.º TFUE tem três números, que correspondem a três disposições, cada uma com uma função específica. O n.º 1 do artigo estabelece uma proibição de comportamentos que preencham determinadas condições, isto é, que preencham o tipo legal. O n.º 2 prevê uma consequência jurídica resultante da proibição, a saber, a nulidade. Finalmente, o n.º 3 admite a inaplicabilidade do n.º 1 se se demonstrar o preenchimento cumulativo de um conjunto de requisitos, operando tais requisitos como causas de exclusão da ilicitude que tinha ficado primariamente indiciada no quadro do n.º 1 do artigo 101.º TFUE.
4. Assim, só depois de estar provada a existência de um comportamento proibido pelo artigo 101.º, n.º 1, é que se justifica suscitar a aplicação do artigo 101.º, n.º 3.
5. O n.º 3 do artigo 101.º TFUE, além de ser aplicável casuisticamente, também pode ser aplicado através de um regulamento de isenção por categoria, não sendo exigível, nesse caso, um exame individualizado e concreto do cumprimento dos requisitos previstos nessa disposição, uma vez que o próprio regulamento de isenção por categoria estabelece, de forma abstrata, condições que permitem assegurar a aplicação desse n.º 3.
6. O Regulamento (EU) n.º 330/2010 é um regulamento de isenção por categoria, que define regras para aplicação do artigo 101.º, n.º 3 a certas categorias de acordos e práticas concertadas verticais (rectius, entre empresas situadas em diferentes estádios da cadeia de valor).
7. O Regulamento n.º 330/2010 não estabelece proibições: apenas determina as regras que permitem considerar que determinado acordo vertical beneficia de uma isenção automática, ficando por essa via afastada a aplicação do artigo 101.º, n.º 1.
8. Donde deve concluir-se que o aplicador que pretenda aferir se determinado acordo ou prática não coberta pelo Regulamento n.º 330/2010 viola o artigo 101.º TFUE terá sempre de sindicar se tal acordo ou prática infringe o disposto no artigo 101.º, n.º 1 e de provar essa infração. E mesmo que o tipo legal previsto no artigo 101.º, n.º 1, fique provado, ainda assim a empresa em causa pode demonstrar que os requisitos para a isenção previstos no artigo 101.º, n.º 3 se verificam em concreto.
9. As cláusulas de não concorrência excluídas da isenção pelo artigo 5.º do Regulamento n.º 330/2010 só serão inválidas se for
demonstrado, em concreto, que geram efeitos restritivos da concorrência no mercado.
10. Ora, quando está em causa a necessidade de demonstração de uma restrição vertical da concorrência por efeito que infrinja o artigo 101.º TFUE, a jurisprudência do Tribunal de Justiça é clara e absolutamente consistente quanto à necessidade de se proceder a um exame aprofundado de todos os factos relevantes e do contexto económico e jurídico em que o acordo ou cláusula se insere, incluindo das especificidades do mercado relevante em causa.
11. A aplicação do artigo 101.º, n.º 1 pressupõe, aliás, como questão prévia, que o acordo em causa seja suscetível de afetar o comércio entre Estados-Membros, devendo este requisito normativo ser devidamente considerado na análise da aplicação dessa disposição normativa.
12. Da leitura do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa ressalta que este aresto omite por completo a necessidade de avaliação da verificação dos pressupostos de aplicação do artigo 101.º, n.º 1, TFUE no caso sub iudice.
13. Na realidade, não há quaisquer indícios de que a cláusula controvertida infringe o artigo 101.º, n.º 1, TFUE, já que nenhuma análise jurídico-económica é feita no acórdão, ou resulta da factualidade indiciariamente assente, que permita descortinar a existência dessa infração.
14. Em todo o caso, a B…, a título subsidiário, levou a cabo o exercício de demonstração de que a cláusula controvertida preenche os requisitos previstos no artigo 101.º, n.º 3. Contudo, também esse exercício foi indevidamente ignorado no acórdão da Relação de Lisboa.
15. Importa salientar que, como previsto no artigo 19.º, n.º 1 do Tratado da União Europeia (doravante, “TUE”) “[o] Tribunal de Justiça da União Europeia garante o respeito do direito na interpretação e aplicação dos Tratados”, tendo a missão de assegurar a interpretação uniforme do direito da União Europeia.
16. Ora, atendendo ao dever de cooperação leal entre os Estados-Membros e a União, previsto no artigo 4.º, n.º 3, TUE, parece claro que os Tribunais portugueses (ou de qualquer outro Estado-Membro) não devem desconsiderar a interpretação assente e estabilizada do Tribunal de Justiça no que se refere aos critérios a observar na apreciação de restrições verticais por efeito, no âmbito do artigo 101.º TFUE.
Adiantamos desde já que a posição sustentada pela Recorrida, ancorada no citado parecer jurídico, é a que, em nosso juízo, melhor se coaduna com a boa aplicação do direito aos factos julgados indiciariamente provados nestes autos.
A questão controvertida prende-se em primeira linha com o âmbito de aplicação do direito nacional e do direito europeu.
Com efeito, colocado perante qualquer prática restritiva da concorrência, o tribunal nacional deve determinar se deverá aplicar apenas o direito nacional ou também o direito europeu.
No que respeita à legislação nacional, importa considerar sobretudo a Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprovou o Novo Regime Jurídico da Concorrência (NRJC), que se aplica a práticas restritivas da concorrência “que ocorram em território nacional ou que neste tenham ou possam ter efeitos” (art. 2.º, n.º 2).
Quanto às pertinentes normas da legislação da União Europeia, desde logo os arts. 101.º e 102.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), que se aplicam às práticas que sejam “suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados-Membros”.
Dispõe assim o cit. art. 101.º:
“1. São incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno, designadamente as que consistam em:
a) Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transação;
b) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos;
c) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;
d) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
e) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objeto desses contratos.
2. São nulos os acordos ou decisões proibidos pelo presente artigo.
3. As disposições no n.º 1 podem, todavia, ser declaradas inaplicáveis:
- a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre empresas,
- a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de associações de empresas, e
- a qualquer prática concertada, ou categoria de práticas concertadas, que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico, contanto que aos utilizadores se reserve uma parte equitativa do lucro daí resultante, e que:
a) Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses objetivos;
b) Nem deem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma parte substancial dos produtos em causa.”
Considerando a importância crucial do conceito “afetação do comércio entre os Estados-Membros”, a Comissão adotou uma Comunicação que lhe é exclusivamente dedicada[7].
A aplicação deste critério implica o preenchimento cumulativo de três requisitos[8]:
(i) Deve estar em causa uma atividade económica.
(ii) “deve ser possível determinar com um grau suficiente de probabilidade, baseando-se num conjunto de elementos de direito e de facto, se [a prática em questão] pode vir a exercer uma influência direta ou indireta, atual ou potencial, nas correntes de trocas entre os Estados-Membros, de uma forma suscetível de prejudicar a realização dos objetivos de um mercado único entre os Estados- Membros[9].
(iii) A afetação deve ser “sensível”[10]: Trata-se de um teste que segue uma lógica de minimis. Esta aferição é, em princípio, precedida pela delimitação do mercado relevante, exceto quando o efeito sensível é evidente.
Assim, sempre que o critério da afetação do comércio entre Estados-Membros esteja preenchido, os tribunais nacionais são obrigados a aplicar o direito europeu da concorrência, em paralelo com o direito nacional, por força do efeito direto dos arts. 101.º e 102.º TFUE[11] e do art. 3.º, n.º 1 do Regulamento (CE) n.º 1/2003, sendo que a aplicação do direito nacional não pode conduzir a um resultado diferente do imposto pelas normas europeias, com a exceção de normas nacionais mais exigentes relativas a práticas unilaterais[12].
Como deixou exemplarmente enunciado a Recorrida nas suas alegações, o Regulamento (UE) n.º 330/2010 insere-se no contexto das disposições do TFUE relativas ao direito comunitário da concorrência e, em particular, no âmbito do seu art.101.º, e, constituindo um mero regulamento de isenção por categoria, apenas determina, para o tipo de acordos em questão, que certas disposições dos acordos ou contratos sob a sua égide (ou mesmo a totalidade de determinados acordos) poderão ou não beneficiar de uma isenção (automática) da aplicação do n.º 1 do art. 101.º do TFUE, por aplicação do disposto no seu n.º 3, consoante contenham, ou não, determinado tipo de cláusulas.
Assim sendo, dúvidas não há de que, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, o Regulamento (UE) n.º 330/2010 não impõe qualquer tipo de conduta às empresas, podendo apenas e simplesmente permitir-lhes beneficiar de uma isenção (automática) por categoria da proibição contida no cit. art. 101.º, n.º 1, do TFUE, por aplicação do disposto no n.º 3 do mesmo artigo.
No caso que nos ocupa, percorrendo o elenco dos factos julgados indiciariamente provados, ressalta à evidência que dos mesmos não se retiram elementos relevantes, hipoteticamente adequados a configurar a cláusula contratual controvertida de não concorrência como suscetível de preencher o aludido conceito de “afetação do comércio entre Estados-Membros.
O ónus de alegação e prova de tal factualidade incumbia aos Recorrentes, nos termos do preceituado no artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 1/2003.
Neste domínio, os factos julgados indiciariamente provados indicam-nos tão só que estamos perante uma cláusula de não concorrência inserida num contrato de franquia entre duas empresas de um Estado-Membro, para produzir efeitos em parcelas muito limitadas desse mesmo Estado, o que nos leva a presumir a sua total irrelevância ou, ao menos, a falta de relevância mínima, no domínio das relações comerciais entre os Estados-Membros da União Europeia.
Sendo inaplicáveis ao caso em apreço as normas do direito europeu invocadas pelos Recorrentes, tendo por base o que deixamos exposto, fica naturalmente prejudicada a possibilidade de afirmar a nulidade total ou sequer parcial da causa de não concorrência controvertida, assim como de reduzir o respetivo prazo de validade a um ano após a cessação do contrato e, consequentemente, a possibilidade de declarar a inutilidade superveniente da lide, nos termos preconizados pelos Apelantes.
Mas, também à luz do direito nacional não se vislumbram normas ou princípios jurídicos com virtualidade para fundamentar um juízo de invalidade da cláusula de não concorrência em discussão: nomeadamente no âmbito do Regime Jurídico da Concorrência, aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 8 de maio; ou mesmo no Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de julho, que dispõe sobre o Contrato de Agência, e cujo art. 9.º, n.º 2, prevê a possibilidade de ser estipulada uma obrigação de não concorrência, nos contratos de agência, por um período máximo de dois anos.
A cláusula proibitiva de concorrência sub judice, acordada pelas partes ao abrigo da sua liberdade contratual (art. 405.º do CCivil), no âmbito de um contrato de franquia, porque limitada a sua vigência temporal em termos razoáveis – em igual medida à permitida pelo legislador no domínio do contrato de agência –, e porque necessária à proteção e salvaguarda do saber transferido pela franquiadora, não enferma de vício de nulidade, total ou parcial.
Termos em que deverá o recurso, também neste segmento, improceder.
3.4.
E prosseguem os Apelantes:
- Para além disso, a providência decretada vai para além do necessário para proteção do know-how da Recorrida porque abrange também a proibição dos Recorrentes operarem, envolverem-se ou participarem em qualquer negócio de mediação imobiliária (incluindo a publicitação de quaisquer imóveis) na zona geográfica atribuída à mesma ou num raio de 15km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato, independentemente da forma de gestão ou do modelo de negócio aplicado pelos Recorrentes (conclusão 22.ª, supra).
Reforçam os Apelantes:
- Se bem esgrimida tal proibição, a mesma determinaria que os Recorrentes deixassem de exercer atividade de mediação independentemente de estes usarem ou não o modelo de negócio alegadamente implementado pela Recorrida!
Para facilitar a compreensão desta questão, passamos a transcrever os pontos I) e II) do dispositivo da sentença sob recurso:
I) “Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio que tenha uma forma de administração por P… (conforme descrito na alínea 5) dos factos provados) ou utilize o programa de Q… ou Plano de Participação de Lucros (conforme descrito na alínea 6) dos factos provados), ou outros programas similares a estes, na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato.
Fixa-se a quantia de 5.000,00€ por cada dia de violação do imposto em I);
II) Não operar, envolver-se ou participar em qualquer negócio de mediação imobiliária (incluindo a publicitação de quaisquer imóveis) na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato. Fixa-se a quantia de 5.000,00€ por cada dia que violem o imposto em II). Fixa-se a quantia de 100,00€ por cada imóvel e por cada dia que o mesmo seja divulgado/publicitado (na internet e/ou fisicamente no local) localizado na zona geográfica atribuída à primeira requerida ou num raio de 15Km de qualquer outro Market Center I… existente ou em constituição à data da resolução do contrato.
Ora, se bem avaliamos, a providência decretada sob o ponto I) acautela de forma plena o direito da Apelada, fundado na obrigação de não concorrência pós-contratual acordada pelas partes e dada como indiciariamente provada sob o respetivo ponto 7), pelo que não se entende, neste domínio, a razão de ser da providência decretada sob o mencionado ponto II).
Tal leitura vai de resto ao encontro da própria fundamentação da sentença, na parte em que nela se deixou afirmado:
“A obrigação de não concorrência estipulada não abrange toda e qualquer forma de desenvolvimento da actividade imobiliária, mas apenas a de “(C) Deter, manter, operar, empenhar-se [envolver-se ou participar] em ou ter alguma participação [qualquer interesse] em qualquer empresa [negócio] de mediação imobiliária ou na Área Concedida que tenha uma forma de governação [administração] por P… um programa de “Q…” ou [Plano de] Participação de Lucros ou outros programas substancialmente similares ao P…, “Q…” e Plano de Participação de Lucros descrito nos Manuais e que se encontre localizado na Área Concedida ou num raio de 15 km de qualquer outro Market Center existente ou em construção [constituição], a contar do que ocorrer primeiro: (i) resolução, cancelamento [revogação], vencimento [caducidade] ou transmissão da participação [cessão da posição contratual] do Sublicenciado no presente Acordo (…).” (cláusula 17.02 do contrato).
Ou seja, a estipulação não impede que o franqueado mantenha no termo do contrato a sua unidade de negócio inclusive na área concedida, conquanto que não decalque (ou continue a nela desenvolver) no desenvolvimento da actividade a mesma forma de governação por P… (ou similar) ou o mesmo programa de repartição de retribuições (ou similar), traços estes que são os afirmados como distintivos da requerente (do franqueador).”
Se é assim, nada há que justifique a expressão autónoma do ponto II) do dispositivo da sentença, prestando-se apenas a possibilitar interpretações de sentido equívoco, em termos suscetíveis de extravasar o direito da Apelada, tal como invocado pelos Recorrentes. Impõe-se, pois, a procedência do recurso, nesta parte.
3.5.
No que concerne ao requisito periculum in mora, sustentam os Recorrentes que aquilo que motiva a Recorrida é, afinal, “convertível” em compensação pecuniária. E é entendido pela jurisprudência que “Não se verifica esse fundado receio se os danos assumem natureza meramente pecuniária” (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.06.2009, Processo n.º 9653/2008-4, publicado em xxx.xxxx.xx). A isso acrescendo o facto de a Recorrida não ter sequer quantificado tais danos (vide Xxxxxxx acabado de citar).
Não podemos acolher semelhante entendimento dos Apelantes.
Na verdade, a circunstância de os prejuízos da Apelada poderem ser eventualmente passíveis de indemnização, não afasta, por si só, a verificação do pressuposto periculum in mora.
Defender o contrário significaria sustentar a impossibilidade de decretamento de providências cautelares comuns sempre que os prejuízos invocados fossem indemnizáveis, o que limitaria o escopo destas providências à proteção de direitos não patrimoniais, sendo que não foi seguramente essa a intenção do legislador.
No caso em apreço, a possibilidade de decorrência de um período de tempo longo entre a lesão dos correspondentes direitos – de não concorrência e de confidencialidade – e o respetivo ressarcimento, é suscetível, tal como sustenta a Recorrida, de gerar danos de dimensão irreversível, na medida em que poderão extravasar a lesão económica previsível, e que poderão passar pela perda de competitividade, perda de posição de mercado e perda de clientela, entre outros.
É de concluir, pois, que ocorre perigo de lesão grave e dificilmente reparável do direito, dado que a lesão se situa ao nível das relações que implicam com a estabilidade e até mesmo com a sobrevivência económica da sociedade Recorrida, e existe dificuldade na avaliação e prova dos prejuízos futuros[13].
Justifica-se, também nesta parte, a improcedência do recurso.
3.6.
Diga-se ainda, quanto às providências elencadas sob os pontos III) e IV) do dispositivo da sentença, que não restam dúvidas de que se encontram suficientemente firmadas nos factos julgados indiciariamente provados, mais concretamente sob os respetivos pontos 10), 11), 20), segunda parte, 21) e 22).
Tal factualidade aponta inequivocamente no sentido da transmissão de conhecimentos técnicos em suportes diversos, da Recorrida para os Recorrentes, que as partes convencionaram sujeitos a dever de confidencialidade pelos Recorrentes, sendo que a sociedade Recorrente violou já pelo menos o dever de não utilizar ou facultar o acesso a quaisquer pessoas dos manuais facultados pela Recorrida; e relativamente aos demais conteúdos sujeitos ao dever de confidencialidade, mencionados nas concretas providências decretadas, o receio de violação mostra-se suficientemente fundado, atendendo à atividade que os Recorrentes continuam a desenvolver no âmbito da mediação imobiliária.
3.7.
Impõe-se, pois, concluir no sentido de que as providências decretadas pela 1.ª instância, com exceção da elencada sob o ponto II) do dispositivo da sentença, não são merecedoras de censura por via deste recurso, dado que se mostram plenamente preenchidos os pressupostos previstos nos artigos 362.º, n.º 1 e 368.º, n.º 1, ambos do CPCivil.
IV DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar a apelação parcialmente procedente
e, em consequência, decidem:
a) Revogar a sentença da 1.ª instância, na parte respeitante à providência decretada sob o ponto II) do dispositivo, absolvendo, consequentemente, os Requeridos/Apelantes do respetivo pedido;
b) Confirmar a sentença quanto ao mais, mantendo, consequentemente, as providências decretadas sob os pontos I), III) e IV) do dispositivo;
c) Condenar Apelantes e Apelada nas custas do recurso, na proporção de 4/5 para os primeiros e 1/5 para a segunda (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPCivil).
**
Nos termos do art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade dos Exmos. Senhores Juízes Desembargadores, Xxxxxx e Xxxxx e Xxxxx Xxxx, que compõem este Coletivo.
***
Tribunal da Relação do Porto, 9 de março de 2021 Xxxx Xxxxxxxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx,