ASSUNTO: Contrato de aquisição de serviços na modalidade de avença com pessoa coletiva. Parecer n.º: INF_DSAJAL_CG_2238/2020 Data: 27.02.2020
ASSUNTO: | Contrato de aquisição de serviços na modalidade de avença com pessoa coletiva. | |
Parecer n.º: | INF_DSAJAL_CG_2238/2020 | |
Data: | 27.02.2020 |
Pela Divisão Administrativa e Financeira da Câmara Municipal foi solicitado parecer sobre a seguinte situação:
“1- Este município pretende celebrar um contrato de aquisição de serviços com uma sociedade de advogados, cujo objeto é a aquisição de serviços de consultoria, contencioso jurídico e gestão dos recursos humanos do Município, sem regime de subordinação jurídica (trabalho autónomo), sem horário de trabalho, com uma remuneração mensal fixa e pelo prazo de 1 ano.
2- O procedimento a adotar, mediante ajuste direto, é um procedimento similar aos demais procedimentos de aquisição de serviços ou deverá seguir a tramitação conducente a um contrato de avença, nomeadamente sendo- lhe aplicável os artigos 10.º e 32.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Publicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (LTFP)?
3- O preceituado na alínea b) do n.º 2 da do dito artigo 10.º da LTFP é consentâneo com a celebração de um contrato de avença com uma pessoa coletiva, nomeadamente com uma sociedade de advogados, ou apenas abrange os contratos de aquisição de serviços, na modalidade de avença, cujo adjudicatário é uma pessoa singular? 4 - Se for considerado que, malgrado se tratar de uma pessoa coletiva, estamos sob a égide de um contrato de avença, como conciliar o respetivo procedimento com o preceituado na Portaria n.º 189/2016 de 14 de julho e DL 192/2015 de 11 de setembro? Com efeito, de acordo com esta legislação e com o previsto no Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de fevereiro, a despesa relativa a um contrato de aquisição de serviços com uma sociedade de advogados enquadra-se na rubrica 02.02.14 “ Estudos, pareceres, projetos e consultoria” ou na rubrica 01.01.07.01 “Pessoal em regime de tarefa ou avença”?”
Cumpre, pois, informar:
I
RUA RAINHA D. ESTEFÂNIA, 251 ⋅ 4150-304 PORTO ⋅ XXX.XXXX-X.XX TEL.: 000 000 000 ⋅ FAX: 000 000 000 ⋅ E-MAIL: XXXXX@XXXX-X.XX
A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP)1 prevê a possibilidade de o trabalho em funções públicas ser prestado, não apenas mediante vínculo de emprego público, mas também através de contrato de prestação de serviço quando esteja causa o exercício de funções sem sujeição à respetiva disciplina e direção, nem horário de trabalho - de acordo com as disposições conjugadas do n.º 1 do artigo 6.º e do n.º 1 do artigo 10.º da LTFP.
O contrato de prestação de serviço para o exercício de funções públicas pode revestir as seguintes modalidades:
i- Contrato de tarefa, cujo objeto se traduz na “execução de trabalhos específicos, de natureza excecional, não podendo exceder o termo do prazo contratual inicialmente estabelecido” (cf. alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º da LTFP);
ii- Contrato de avença, cujo objeto consiste na “execução de prestações sucessivas no exercício de profissão liberal, com retribuição certa mensal, podendo ser feito cessar, a todo o tempo, por qualquer das partes, mesmo quando celebrado com cláusula de prorrogação tácita, com aviso prévio de 60 dias e sem obrigação de indemnizar” (cf. alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º da LTFP).
O critério basilar do regime do contrato de prestação de serviços para o exercício de funções públicas é a inexistência de subordinação jurídica - caracterizada, essencialmente, pela “sujeição à disciplina e direção e a um horário de trabalho” -, determinando o n.º 3 do artigo 10.º da LTFP a nulidade desses contratos quando se verifique que existe essa subordinação jurídica.2
1 Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho; alterada pela Lei n.º 84/2015, de 7 de agosto, Lei n.º 18/2016, de 20 de junho, Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, pela Lei n.º 25/2017, de 30 de maio, Lei n.º 70/2017, de 14 de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, com a redação introduzida pela Declaração de Retificação n.º 28/2017, de 2 de outubro, pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro.
2 Veja-se também o n.º 4 deste artigo 10.º, sobre as consequências da verificação, em sede de auditoria no âmbito da tutela administrativa de legalidade a que estão sujeitas as autarquias locais, da vigência de contratos de prestação de serviço para execução de trabalho subordinado.
Daí que no artigo 32.º da LTFP se consagrem como condições cumulativas essenciais para a celebração de contratos de tarefa e avença:3
a) Que o respetivo objeto consista na execução de trabalho não subordinado, para a qual se revele inconveniente o recurso a qualquer modalidade de vínculo de emprego público;
b) Que seja observado o regime legal de aquisição de serviços (nomeadamente, as regras previstas no Código dos Contratos Públicos (CCP)4 e na Lei do Orçamento do Estado5, bem como as regras de realização de despesa pública em geral);
c) Que o prestador do serviço comprove ter regularizadas a sua situação fiscal e perante a segurança social.
Para reforçar o cumprimento da condição da “inexistência de subordinação jurídica”6, a Lei n.º 71/2018 estabelece no artigo 63.º que a celebração ou renovação de contratos de avença pelas autarquias locais carece (“independentemente da natureza da contraparte”7) de parecer prévio vinculativo do presidente do respetivo órgão executivo, o qual depende:8
i) Da verificação do caráter não subordinado da prestação de trabalho, para a qual se revele inconveniente o recurso a qualquer modalidade de vínculo de emprego público (cf. alínea a) do n.º 8 do artigo 63.º);
ii) Da emissão de declaração de cabimento orçamental pelo órgão, serviço ou entidade requerente (cf. alínea b) do n.º 8 do artigo 63.º).
III
O que nos ocupa no presente parecer é o contrato de prestação de serviços para o exercício de funções públicas na modalidade de avença o qual apenas é permitido, nos termos da LTFP, “para o exercício de uma profissão liberal e para a prática sucessiva de atos próprios de tal profissão”, como defendem Xxxxx Xxxxx e
3 Conforme alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 32.º da LTFP.
4 Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, na redação atual.
5 Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2019.
6 Fixada na alínea a) do n.º 1 do artigo 32.º da LTFP, a Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro.
7 Sendo este um aspeto fulcral param o caso a dúvida em apreço, conforme adiante explicaremos.
8 Conforme n.ºs 7 e 8 do artigo 63.º da Lei n.º 71/2018.
Moura e Cátia Arrimar9, concluindo que (…) Deste modo, só quando em causa estiver o exercício sucessivo de uma profissão liberal é que poderá ser celebrado um contrato de avença”.
E explicam estes autores que “o conceito de profissão liberal não se confunde com o conceito de trabalho independente, sendo mais restrito do que este último. Na verdade, uma profissão liberal pressupõe a execução de uma «… atividade autónoma e independente ‘por conta própria’, de carácter científico, artístico ou técnico, no âmbito de profissões cujo exercício pressupõe uma habilitação específica» (v., neste sentido, o Ac. do Tribunal de Contas n.º 8/95), devendo ainda acrescentar-se que tal atividade terá necessariamente de ser executada por profissionais integrados numa determinada ordem sócio-profissional (no sentido de que a profissão liberal tem uma regulamentação e controlo próprios, v. Xxxxxxxx xx Xxxxx, Curso de direito Comercial, Vol. I, 1998, pág. 95).”10.
Nesta medida, acrescentam os autores em questão que: “os atos próprios de uma profissão liberal são atos que pela sua própria natureza são praticados com autonomia (mesmo que a profissão seja exercida por conta de outrem), pelo que quer se esteja no domínio de necessidades próprias do serviço ou perante necessidades excecionais e não previsíveis, será sempre admissível o recurso à celebração de um contrato de avença com um profissional liberal para assegurar a prática sucessiva dos atos próprios daquela profissão que sejam adequados à satisfação daquelas mesmas necessidades. (…) Significa isto que, (…) da mesma forma que o serviço público não pode celebrar com o representante da marca dos seus veículos automóveis um contrato de avença para a reparação daqueles veículos – por em causa não estar o exercício de uma profissão liberal -, também temos por certo que nada impede esse mesmo serviço de contratar um advogado ou uma sociedade de advogados para lhe prestar a assessoria jurídica de que necessita para prosseguir as suas atribuições, ainda que disponha no seu mapa de pessoal de vários técnicos superiores juristas.” 11.
Assim, concluem Veiga Moura e Arrimar12 que “Essencial é que é essa contratação não envolva subordinação jurídica, o que é o mesmo que dizer que os atos próprios da concreta profissão liberal que justificam a celebração do contrato de avença têm de ser executados com autonomia por
9 Em “Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – 1.º volume – Artigos 1.º a 240.º”, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, página 120.
10 Op. cit, página 120.
11 Idem, página 121.
12 Idem.
parte do prestador de serviços, o que seguramente fará com que muitas vezes os serviços não possam recorrer à contratação em regime de avença para obter a prática de atos próprios de uma profissão liberal, justamente por a satisfação das suas necessidades nessa matérias reclamar que aqueles atos sejam praticados sob a sua autoridade, direção e disciplina.”
IV
No entanto, a celebração de contratos de prestação de serviço para o exercício de funções públicas na modalidade de avença só pode ter lugar quando o respetivo objeto consista no exercício de uma determinada profissão liberal e na prática de atos próprios da mesma.
Importa, pois, verificar quais são os atos próprios da profissão liberal de advogado.
Nos termos da Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto13, são atos próprios dos advogados os seguintes (cf. disposições conjugadas dos n.ºs 5, 6, 9 e 10 do artigo 1.º):14
a) O exercício do mandato forense;
b) A consulta jurídica.
c) A elaboração de contratos e a prática dos atos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
d) A negociação tendente à cobrança de créditos;
e) O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de atos administrativos ou tributários;
f) Todos aqueles que resultem do exercício do direito dos cidadãos a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade;
13 Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto, que define o sentido e o alcance dos atos próprios dos advogados e dos solicitadores e tipifica o crime de procuradoria ilícita.
14 Quando sejam exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de atividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou atividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei, não se considerando praticados no interesse de terceiros os atos praticados pelos representantes legais, empregados, funcionários ou agentes de pessoas singulares ou coletivas, públicas ou privadas, nessa qualidade, salvo se, no caso da cobrança de dívidas, esta constituir o objeto ou atividade principal destas pessoas – cf. n.ºs 7 e 8 do artigo 1.º da Lei n.º 49/2004.
g) O exercício das funções de defensor do arguido em processo penal.
todos aqueles que resultem do exercício do direito dos cidadãos a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
V
No caso em apreço a entidade consulente pretende celebrar um contrato de aquisição de serviços com o seguinte objeto e características: “aquisição de serviços de consultoria, contencioso jurídico e gestão dos recursos humanos do Município, sem regime de subordinação jurídica (trabalho autónomo), sem horário de trabalho, com uma remuneração mensal fixa e pelo prazo de 1 ano”.
Pela caracterização apresentada, verifica-se que a modalidade de avença é a adequada, quando está em causa a execução de prestações sucessivas de consulta jurídica e de exercício de mandato forense (“contencioso”), no âmbito da profissão liberal de advogado, mediante o pagamento mensal de um preço fixo.
Com efeito, é possível celebrar um contrato de avença para o exercício da consulta jurídica para apoio aos serviços da câmara municipal e do mandato forense para assegurar o contencioso do município.
Mas, já não é permitido que esse contrato tenha como objeto a “gestão de recursos humanos” da entidade consulente.
A atividade de “gestão dos recursos humanos” de um município encontra-se na esfera direta do Presidente da Câmara Municipal, a quem compete “Decidir todos os assuntos relacionados com a gestão e direção dos recursos humanos afetos aos serviços municipais;” (cf. alínea a) do n.º 2 do artigo 35.º do Anexo à Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro15, podendo delegar esta competência num dos vereadores (cf. artigo 36.º/2 do RJAL). Dentro do domínio da gestão e direção de recursos humanos existem algumas competências que podem ser delegadas ou subdelegadas nos titulares de cargo dirigentes - ao abrigo do n.º 2 do artigo 38.º do RJAL -, as quais serão exercidas no quadro dos poderes de direção que lhes cabe nos termos do respetivo estatuto.
15 Regime Jurídico das Autarquias Locais (RJAL), aprovado em anexo à Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro; alterado pela Lei n.º 25/2015, de 30 de março, Lei n.º 69/2015, de 16 de julho, pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, e pela Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto).
Portanto, está vedado a um município contratar uma entidade externa, através de uma prestação de serviços, para exercer uma competência do Presidente da Câmara Municipal16, mesmo que esteja em causa a prática de atividades ou a elaboração de informações instrumentais à prática dos atos preparatórios da gestão dos recursos humanos pela entidade competente.
Aliás, considera-se que não é adequado a contratação de um prestador de serviços com tal objeto, por duas ordens de razão:
i. Por um lado, porque a “gestão de recursos humanos” não se insere no elenco de atos próprios da profissão liberal de advogado;
ii. E, por outro, porque essa matéria, consubstanciando uma competência do Presidente da Câmara Municipal, é uma atividade que se concretiza através da execução de atos que são praticados sob a sua autoridade, direção e disciplina, ou seja com subordinação jurídica.
Assim, o objeto do contrato que a entidade consulente pretende celebrar não é na sua totalidade legítimo, devendo circunscrever-se a “serviços de consultoria e contencioso jurídico do Município”.
VI
Quanto à questão de se saber se é possível a celebração de um contrato de avença com uma pessoa coletiva, à luz do fixado na alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º da LTFP, a resposta é claramente que sim e a história legislativa demonstra-nos isso de forma evidente.
Inicialmente, a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro17 (LVCR), que entretanto foi revogada pela Lei n.º 35/2014, sucedendo-lhe no ordenamento jurídico, a LTFP, estabelecia a regra de que a celebração de contratos de tarefa e de avença apenas podia ter lugar quando o trabalho fosse realizado por uma pessoa coletiva, sendo este um dos requisitos cumulativos estabelecidos para legitimar a contratação de aquisições de serviços para o exercício de funções públicas na modalidade de avença (cf. alínea b) do n.º 2 do artigo 35.º da LVCR).
Só em casos excecionais, em que fundamentadamente se comprovasse ser impossível ou inconveniente que a prestação do serviço fosse assegurada por uma pessoa coletiva é que poderia ser celebrado um
16 Sem prejuízo da possibilidade de delegação nos vereadores e/ou delegação/subdelegação nos dirigentes municipais (cf. n.º 2 do artigo 38.º do RJAL)
17 Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que aprova a Lei de Vínculos Carreiras e Remunerações (LVCR).
contrato de avença com pessoas singulares, carecendo sempre de autorização do membro do Governo responsável (ou do órgão executivo, nas autarquias locais18).
Mas, pouco tempo depois da entrada em vigor da LVCR (em 1/01/2009), o legislador eliminou esta regra, publicando a Lei n.º 31-B/2010, de 28 de abril, que revogou aquela alínea b) do n.º 2 do artigo 35.º da LVCR. Com efeito, “Através da Lei n.º 31-B/2010, de 28 de abril, entendeu-se revogar o regime preferencial até aí reconhecido às pessoas coletivas, passando a permitir-se que os contratos de tarefa e avença sejam indistintamente celebrados com pessoas singulares ou coletivas”19.
E a LTFP mantém no n.º 2 do seu artigo 10.º os mesmos requisitos que constavam da LVCR, sem qualquer restrição quanto à natureza jurídica da contraparte desses contratos de avença.
Logo, nos termos da LTFP é permitida a celebração de contratos de prestação de serviço para o exercício de funções públicas na modalidade de avença quer com pessoas coletivas, quer com pessoas singulares, desde que estejam preenchidos os requisitos cumulativos fixados no n.º 2 do artigo 10.º, sendo determinante a ausência de subordinação jurídica.
Como vimos esta admissibilidade é defendida pela doutrina de forma conclusiva, com os exemplos que acima já indicámos a propósito da apreciação do critério da subordinação jurídica.
Mas, também o legislador nas recentes leis do orçamento do estado tem incluído, na parte relativa à autorização para a celebração de contratos de aquisição de serviços no setor local nas modalidades de tarefa ou avença, a expressão “independentemente da natureza da contraparte” o que reforça o entendimento de que é possível a contratação quer de pessoas coletivas, quer de pessoas singulares – conforme, atualmente, nos n.ºs 7 e 8 do artigo 63.º da Lei n.º 71/2018.20
18 Conforme n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 209/2009, de 3 de setembro.
19 “Os novos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores da Administração Pública – comentário à Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro”, Xxxxx Xxxxx e Moura e Xxxxx Xxxxxxx, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2010, página 108.
20 Bem como clarifica a sujeição das mesmas aos requisitos fixados no n.º 2 do artigo 10.º da LTFP e ao parecer prévio exigido para o efeito da verificação do requisito da alínea a) desse normativo (a “inexistência de subordinação jurídica”.
VII
No que diz respeito à classificação orçamental da despesa a realizar a título de contratos em regime de tarefa e avença à luz do Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de fevereiro21, a Comissão de Normalização Contabilística (CNC) explica22 o seguinte:
“» Pergunta 31: Classificação orçamental e financeira de contratos em regime de tarefa e avença
Qual a classificação orçamental e financeira adequada para o registo da situação dos contratos de tarefa e avença?
Resposta:
De acordo com o Decreto-Lei 26/2002, de 14 de fevereiro, as despesas em questão devem ser classificadas na rubrica 01.01.07 - Pessoal em regime de tarefa ou de avença, onde se «consideram, rigorosa e limitativamente, apenas, os indivíduos que se encontrem abrangidos pelos contratos de tarefa ou pelos contratos de avença, celebrados nos termos da legislação em vigor».
No entanto, apesar de ser classificada orçamentalmente como uma despesa com pessoal, no subsistema da Contabilidade Financeira ela será reconhecida no âmbito da conta 6224 – Honorários (e não como gastos com o pessoal) onde, nos termos da Portaria n.º 189/2016, de 14 de julho, se registam «as remunerações atribuídas aos trabalhadores independentes, que se encontrem abrangidos por contratos de prestação de serviços em regime de tarefa ou avença». (Aprovada pelo CNCP em 13 de março de 2018)” (os negritos são nossos)
Assim sendo, as despesas com contratos de prestação de serviços para exercício em funções públicas na modalidade de avença celebrados ao abrigo da LTFP devem ser classificadas na rubrica “01.01.07 - Pessoal em regime de tarefa ou de avença”, por se tratar da rubrica adequada para a realização de despesa nesta modalidade jurídica.
VIII
Em conclusão
21 Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de fevereiro que estabelece o regime jurídico dos códigos de classificação económica das receitas e das despesas públicas, bem como a estrutura das classificações orgânicas aplicáveis aos organismos que integram a administração central, na redação conferida pela Declaração de Retificação n.º 8-F/2002, de 28 de fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º n.º 69-A/2009, de 24 de março, Decreto-Lei n.º n.º 29-A/2011, de 1 de março, Decreto-Lei n.º 52/2014, de 7 de abril, e pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio.
22 Na resposta à pergunta 31 do conjunto de perguntas frequentes (FAQ’s) sobre o SNC para o setor público, que pode ser consultada no seguinte endereço: xxxx://xxx.xxx.xxx-xxxxxxxx.xx/xxxx_xxxxxxx.xxxx
1. O trabalho em funções públicas pode ser prestado, não apenas mediante vínculo de emprego público, mas também através de contrato de prestação de serviço quando esteja em causa o exercício de funções sem sujeição à respetiva disciplina e direção, nem horário de trabalho (cf. as disposições conjugadas do n.º 1 do artigo 6.º e do n.º 1 do artigo 10.º da LTFP).
2. O contrato de prestação de serviço para o exercício de funções públicas reveste a modalidade de avença quando o seu objeto se traduzir na “execução de trabalhos específicos, de natureza excecional, não podendo exceder o termo do prazo contratual inicialmente estabelecido” (cf. alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º da LTFP).
3. À luz do fixado na alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º da LTFP, é possível a celebração de um contrato de avença com uma pessoa coletiva, não prevendo atualmente a lei qualquer distinção sobre a natureza jurídica da contraparte, como sucedia no início da vigência da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
4. A modalidade de avença é a adequada, quando está em causa a execução de prestações sucessivas de consulta jurídica e de exercício de mandato forense (“contencioso”), no âmbito da profissão liberal de advogado, mediante o pagamento mensal de um preço fixo.
5. Contudo, já se considera como não sendo adequada a contratação de um prestador de serviços para assegurar a gestão de recursos humanos de um município, por duas ordens de razão:
5.1. Por um lado, porque a “gestão de recursos humanos” não se insere no elenco de atos próprios da profissão liberal de advogado;
5.2. E, por outro, porque consubstanciando uma competência exclusiva do Presidente da Câmara Municipal (sem prejuízo da possibilidade de delegação nos vereadores e/ou delegação/subdelegação nos dirigentes municipais) é uma atividade que se concretiza através da execução de atos que são praticados sob a autoridade, direção e disciplina da entidade competente, portanto com subordinação jurídica.
5.3. Assim, o objeto do contrato que a entidade consulente pretende celebrar não é na sua totalidade válido, devendo circunscrever-se a “serviços de consultoria e contencioso jurídico do Município”.
6. A classificação orçamental adequada à realização de despesa com contrato de prestação de serviços para exercício em funções públicas na modalidade de avença celebrado ao abrigo da LTFP é a rubrica “01.01.07 - «Pessoal em regime de tarefa ou de avença»”, nos termos do Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de fevereiro.
Este é, salvo melhor opinião, o meu parecer. À consideração superior.