Statute of limitation in insurance contracts
PRESCRIÇÃO NO CONTRATO DE SEGURO
Statute of limitation in insurance contracts
Revista de Direito do Consumidor | vol. 148/2023 | p. 209 - 231 | Jul - Ago / 2023 DTR\2023\7361
Xxxxx Xxxxxxx
Doutor e Mestre em Direito pela UFRGS. Coordenador do Núcleo de Estudos em Direito e Sistema Financeiro: Atividade bancária, de seguros e mercado de capitais da UFRGS. Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. xxxxxxxx@xxx.xxx.xx
Xxxxx Xxxxxxxx
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora e advogada. xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx@xxxxx.xxx Convite 3
Área do Direito: Civil; Consumidor
Resumo: O presente estudo tem por objetivo analisar a prescrição na relação jurídica de seguro. Nele são analisados os fundamentos da prescrição e os prazos prescricionais na relação jurídica de seguro, o termo inicial do prazo da pretensão contra o segurador em caso de sinistro, assim como as regras gerais sobre prescrição e sua aplicação à relação jurídica de seguro.
Palavras-chave: Contrato de seguro – Prescrição
Abstract: This article aims to analyze the statute of limitation in insurance contracts. It analyzes the fundamentals of the statute of limitation in insurance contracts, its terms, the initial term for the claim against the insurer in case of damage, as well as the general rules of the statute of limitation and their application to the insurance contracts.
Keywords: Insurance contract – Statute of limitation
Para citar este artigo: MIRAGEM, Xxxxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Prescrição no contrato de seguro. Revista de Direito do Consumidor. vol. 148. ano 32. p. 209-231. São Paulo: Ed. RT, jul./ago. 2023. Disponível em: inserir link consultado. Acesso em: DD.MM.AAAA.
Sumário:
1. Introdução - 2. Fundamentos da prescrição na relação jurídica de seguro - 3. Prazos prescricionais
- 4. Termo inicial do prazo prescricional da pretensão contra o segurador em caso de sinistro - 5. Regras gerais sobre prescrição e sua aplicação à relação jurídica de seguro - 6. Referências bibliográficas
1. Introdução
O tempo tem importante papel na estabilização das relações jurídicas de seguro. Nelas, assim como ocorre nas demais relações jurídicas de direito privado, a qualificação jurídica do tempo tanto se estabelece pelos prazos que se concedam a quem tenha direitos ou poderes a exercer, que se condicionem ou limitem no período previsto na lei,1 quanto pode ser fator que mede e qualifica expectativa da parte sobre o comportamento futuro.2 A confiança que é despertada pelo tempo em que se exerce ou se deixa de realizar certo exercício jurídico é passível de tutela, em especial pela boa-fé, por intermédio da figura da supressio.3 A passagem do tempo consolida situações e permite identificar realidades na qual é elemento integrador.4
O tempo é fator determinante tanto para o surgimento de direitos e pretensões quanto para a extinção de direitos e pretensões. Por longa tradição, a disciplina dos efeitos do tempo nas relações jurídicas privadas, inclusive de seguro, se dá por meio da prescrição. Por meio dela, relações jurídicas são estabilizadas e se promove a segurança jurídica. Diz-se prescrição aquisitiva quando o possuidor adquire a propriedade de modo originário em razão da posse mansa e pacífica pelo tempo previsto na lei (a par de outras condições). Diz-se prescrição extintiva a que extingue a pretensão pelo seu não exercício no tempo previsto em lei. Função semelhante é desempenhada pela decadência, que extingue o direito potestativo em razão do seu não exercício em determinado prazo.
No direito privado brasileiro, no que se inclui a disciplina do contrato de seguro e das relações
jurídicas dele decorrentes, a extinção de direitos e pretensões pelo decurso do tempo pela prescrição e pela decadência se estabelece com critérios distintos e não sem alguma confusão durante a vigência do Código Civil de 1916.5 O Código Civil de 2002, por sua vez, sistematiza a distinção a partir de critério conceitual, definindo a prescrição como instituto que visa à extinção da pretensão, e à decadência, como fenômeno extintivo do direito subjetivo (potestativo). Com isso supera a discussão sobre o objeto de extinção pela prescrição – se a ação ou o direito – coordenando tanto a definição dos institutos da prescrição e decadência quanto a sua funcionalidade.
A definição, os prazos e os aspectos operativos da prescrição são previstos na parte geral do Código Civil (LGL\2002\400) (com exceção da prescrição aquisitiva, disciplinada em conjunto com os modos originários de aquisição da propriedade, no direito das coisas). No caso da decadência, disciplinam-se apenas aspectos gerais na parte geral, deixando-se os prazos decadenciais, como regra, acompanhando a previsão específica do direito a que se referem, na parte especial (excepcionam a regra, por exemplo, os artigos 178 e 179 do Código Civil (LGL\2002\400)). Desse modo, pela sistemática do Código Civil (LGL\2002\400), os prazos prescricionais são apenas aqueles previstos nos artigos 205 e 206. Os demais, relacionados na previsão específica do direito, em regra, na parte especial, são decadenciais.6 Trata-se de solução metodológica adotada pelo legislador com a finalidade de tornar a aplicação dos prazos prescricionais e decadenciais o mais operacional possível.
A disciplina da prescrição da parte geral do Código Civil (LGL\2002\400) aplica-se às relações jurídicas de seguro. Dela resultam tanto normas gerais e abstratas, aplicáveis às mais diversas relações jurídicas de direito privado (arts. 189 a 204), quanto prazos prescricionais delineados segundo a natureza da relação jurídica (arts. 205 e 206). Os prazos prescricionais próprios da relação jurídica de seguro se encontram previstos no art. 206, § 1º, II, e § 3º, IX, do Código Civil (LGL\2002\400). Dispõe o art. 206, § 1º, II:
“Art. 206. Prescreve:
§ 1º Em um ano:
II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:
a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão”. De outro lado, estabelece o art. 206, § 3º, IX:
“Art. 206. Prescreve:
[...]
§ 3º Em três anos:
[...]
IX – a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório”.
Podem, também, resultar de previsão em lei especial.
2. Fundamentos da prescrição na relação jurídica de seguro
Os direitos subjetivos que surgem como efeito da relação jurídica de seguro compreendem a prerrogativa para fazer respeitar ou exigir do outro um comportamento determinado. No caso do segurador, a relação de seguro tem como principal efeito o surgimento do seu direito de exigir do segurado ou do tomador do seguro o pagamento do prêmio. No caso do segurado ou do beneficiário, faz surgir o direito à garantia e ao pagamento da indenização securitária ou do capital segurado em caso de sinistro, a par de outros direitos. Este poder de exigir, que é próprio do direito subjetivo, pode ser atendido por aquele a quem se destina de modo espontâneo, tal como ocorre quando o segurado
realiza o pagamento do prêmio antes, ou na data do vencimento, cumprindo com o dever, ou quando o segurador realiza o pagamento da indenização securitária dentro do prazo que dispõe para tanto. Contudo, em outras situações, o titular do direito, embora tenha o poder de exigir, não observa o comportamento voluntário do devedor no sentido de realizá-lo. Ao contrário, este deixa de comprimir com o dever jurídico que lhe caiba. Neste caso, se caracteriza a violação do direito subjetivo e, em decorrência dela, o nascimento de uma pretensão de exigir sua realização, inclusive de modo coercitivo, ou ainda de ter reparados ou compensados os danos sofridos em razão desta violação.
É a pretensão o poder de exigir o respeito ao direito subjetivo por seu titular. Trata-se do poder de perseguir o direito, conforme se revela no festejado conceito alemão de Anspruch,7 que inspira o legislador brasileiro.8 Nasce como efeito da violação do direito e seu exercício não se confunde com ele. O direito subjetivo legitima certo interesse na relação jurídica de seguro, que pode ser, por exemplo, o recebimento de certa quantia ou, mesmo, a garantia. Pretensão é o poder de assegurar que, caso este comportamento do devedor não seja cumprido espontaneamente, o será coercitivamente, com todos os meios previstos em direito para constrangê-lo a realizar o comportamento devido. Daí porque a pretensão do segurado se caracteriza tipicamente com a recusa do segurador em efetuar o pagamento da indenização securitária, e a do segurador, com o inadimplemento do prêmio.9
Registre-se que pretensão e ação não se confundem. Pretensão é o poder do titular do direito violado de exigir o cumprimento ou o ressarcimento dos danos decorrentes da violação. Compreende também o poder de impedir o dano ou fazer cessá-lo. A pretensão se exerce por intermédio da ação, que é meio de postulação em juízo pretendendo uma tutela – ou o direito subjetivo público de provocar o exercício da atividade jurisdicional. Porém, não se confunde com ela, nem a ela se restringe.10
Retomar esta distinção é relevante para a compreensão da prescrição na relação jurídica de seguro. As pretensões devem ser exercidas no tempo que a lei prevê. Em regra, o poder de exigir a realização do direito subjetivo não é indefinido. É célebre a máxima latina dormientibus non sucurrit ius (“O direito não socorre os que dormem”). Para tanto, é prevista a prescrição. A prescrição que resulta do não exercício do direito e que extingue a pretensão pelo não exercício no tempo previsto na lei é a prescrição extintiva. Desta é que se trata quando há referência à extinção do poder de exigir a realização do direito, e que repercute na relação jurídica de seguro.
Nesses termos, prescrição é a extinção da pretensão em razão do seu não exercício pelo titular no tempo previsto em lei. Este tempo é o que se denomina prazo prescricional, cuja fluência se submete a critérios definidos em lei, que determinam em qual instante começa a contar e quais situações podem suspender ou interromper seu curso. Dispõe o art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400): “Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.” A inércia do titular da pretensão em exercê-la no prazo legal, faz com que se extinga, deixando de poder exigir o que ela lhe assegurava.11-12
3. Prazos prescricionais
Os prazos prescricionais são definidos em lei e de ordem pública. Os prazos prescricionais típicos da relação jurídica de seguro constam do art. 206, § 1º, II, e § 3º, IX, do Código Civil (LGL\2002\400), delineados conforme a titularidade da pretensão e a modalidade de seguro. Podem, também, encontrar previsão na legislação especial. Aplica-se o prazo geral de dez anos do art. 205 do Código Civil (LGL\2002\400) às pretensões fundadas no contrato de seguro que não se enquadrem nas hipóteses de que tratam os §§ 1º, II, e 3º, IX, do art. 206, ou cujo prazo menor não esteja previsto na legislação especial. Dispõe o art. 205: “A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.
Como regra geral, é de um ano o prazo prescricional para o exercício das pretensões decorrentes do contrato de seguro, de titularidade do segurado ou do segurador. É o que prevê o art. 206, § 1º, II, do Código Civil (LGL\2002\400):
“Art. 206. Prescreve:
§ 1º Em um ano:
II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:
a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão”.13
O prazo ânuo aplica-se tanto às pretensões do segurado contra o segurador quanto do segurador contra o segurado, abrangendo não apenas aquelas fundadas no inadimplemento de deveres principais (no caso do segurador, do pagamento do prêmio, no caso do segurado, de garantia e pagamento em caso de sinistro), mas também de deveres anexos ou acessórios derivados da relação jurídica de seguros (como o dever do segurador de regulação do sinistro e o dever do segurado de mitigação dos danos decorrentes do sinistro). Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece a abrangência do prazo ânuo, este aplica, inclusive, às pretensões do segurado de restabelecimento da apólice indevidamente extinta, de indenização por danos morais fundada na recusa da renovação da apólice e de ressarcimento do prêmio pago a maior.14 O mesmo se diga em relação às pretensões decorrentes do contrato de resseguro, às quais, conforme já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, se aplica, por equiparação, o prazo ânuo de que trata o art. 206, § 1º, II, do Código Civil (LGL\2002\400).15
O prazo prescricional de um ano previsto no art. 206, § 1º, II, se aplica, ainda, à pretensão do segurado contra o segurador mesmo quando se trate de relação de consumo. O entendimento dominante é de que prevalece o prazo específico, e não o prazo de 5 anos por fato ou vício do serviço previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.16 Observa-se, contudo, que a regra do Código Civil (LGL\2002\400) vem recebendo da jurisprudência uma interpretação de acordo com as disposições do CDC (LGL\1990\40), de modo que são observadas decisões, especialmente do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de interpretar o modo de contagem do prazo de acordo com as circunstâncias do caso e a efetiva possibilidade do consumidor de exercer a pretensão contra o segurador. Este é o caso em que se considera não iniciada a fluência do prazo prescricional quando o segurador ainda não entregou a apólice ao segurado, dever que compete ao fornecedor segundo o art. 46 do CDC (LGL\1990\40), cujo não atendimento foi qualificado como espécie de condição suspensiva.17
A regra geral, que estabelece o prazo de um ano, é excepcionada pela previsão de regras especiais. Neste particular, é de três anos o prazo prescricional da pretensão do terceiro prejudicado ou beneficiário contra o segurador no caso do seguro de responsabilidade civil obrigatório, conforme dispõe o art. 206, § 3º, IX, do Código Civil (LGL\2002\400):
“Art. 206. Prescreve:
[...]
§ 3º Em três anos:
[...]
IX – a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório”.
Em relação ao Seguro DPVAT, espécie de seguro de responsabilidade civil obrigatório, há súmula do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 405 – “A ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) prescreve em três anos”).
Por ocasião da vigência do Código Civil de 1916, aplicava-se, ao Seguro DPVAT, na ausência de prazo menor fixado em lei, o prazo prescricional de 20 anos previsto no art. 177 do Código Civil de 1916, razão pela qual assume relevância a regra de transição prevista no art. 2.028 do atual Código Civil (LGL\2002\400) (“Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”). Daí o entendimento firmado pela jurisprudência, e que deu origem à Sumula 405 do STJ, de que “o prazo prescricional das ações de cobrança fundadas no seguro obrigatório – DPVAT, é de três anos, em consonância com o artigo 206, § 3º, do Código Civil (LGL\2002\400), se, na data da sua entrada em vigor, ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional, que no sistema do Código de 1916 era vintenário”.18
Por um período após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, verificou-se algum debate sobre a aplicação do prazo prescricional de três anos, de que trata o art. 206, § 3º, IX, também à pretensão do beneficiário do seguro, independentemente da modalidade, se obrigatório ou não. A tese que sustentou a extensão do prazo de três anos à figura do beneficiário, independentemente do tipo de seguro, encontrou fundamento na própria literalidade do art. 206, § 3º, IX, cuja redação permitiria a compreensão de que a norma conteria duas regras: a regra geral, de que a pretensão do beneficiário contra o segurador prescreve em três anos; e a regra especial, de que a pretensão do terceiro prejudicado no seguro de responsabilidade civil obrigatório prescreve em três anos. Prevaleceu, na jurisprudência, o entendimento contrário, de que a norma trata apenas da pretensão relativa ao seguro de responsabilidade civil obrigatório, e que a referência à figura do beneficiário, constante do suporte fático, restringe-se ao beneficiário do seguro de responsabilidade civil obrigatório.19
É de dez anos o prazo prescricional da pretensão do beneficiário do seguro, conforme o entendimento firmado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.20 Esta é a regra, que vale para os diferentes tipos de seguro que contemplam a figura do beneficiário, a exemplo do seguro de vida. Neste caso, na falta de prazo específico definido em lei, aplica-se o prazo geral de 10 anos do art. 205 do Código Civil (LGL\2002\400), segundo o entendimento jurisprudencial – que afasta, no caso da pretensão do beneficiário, tanto o prazo de três anos do art. 206, § 3º, IX, quanto o prazo de um ano do art. 206, § 1º, II.
Da mesma forma, conforme o entendimento jurisprudencial, é de dez anos o prazo prescricional da pretensão do segurado de reembolso das despesas médico-hospitalares no caso do seguro saúde.21 Na hipótese, a jurisprudência afasta a prescrição ânua do art. 206, § 1º, II, sob o fundamento da natureza sui generis do seguro saúde, do que resulta a aplicação do prazo previsto no art. 205 do Código Civil (LGL\2002\400).22
Há que se considerar, ainda, a pretensão do segurador contra o causador do dano naqueles casos em que se sub-roga nos direitos do segurado, tendo pago a indenização securitária, conforme autoriza, nos seguros de dano, o art. 786 do Código Civil (LGL\2002\400) (“Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano”). Neste caso, conforme o entendimento firmado na jurisprudência,
23 o prazo prescricional aplicável é o da relação jurídica originária, entre o segurado e o terceiro causador do dano, e não o da relação jurídica de seguro, entre o segurado e o segurador. Ademais, o prazo prescricional tem início na data em que o segurador efetua o pagamento ao segurado, sub-rogando-se nos seus direitos.24
4. Termo inicial do prazo prescricional da pretensão contra o segurador em caso de sinistro
A aplicação dos prazos prescricionais na relação jurídica de seguro pressupõe a correta identificação dos critérios de sua contagem, especialmente do seu termo inicial e das intercorrências que impedem o início da sua fluência ou afetam seu curso (causas suspensivas e interruptivas).
O art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400) é didático: “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição”. A teoria da actio nata (da máxima actioni nondum natae non praescribitur ou “ações que ainda não nasceram não prescrevem”) fundamenta a fixação do termo inicial do prazo prescricional no momento da violação do direito e do nascimento da pretensão. Adotou-a o direito brasileiro,25 inclusive no art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400). Só flui a prescrição quando já há pretensão; e esta nasce apenas quando o direito é violado. Por esta razão, inclusive, é que o art. 199 do Código Civil (LGL\2002\400) prevê que não corre a prescrição: “I – pendendo condição suspensiva; II – não estando vencido o prazo; III – pendendo ação de evicção.” Em tais situações, o direito inexiste ou não é exigível, não havendo violação que faça nascer a pretensão.
A rigor, a pretensão nasce e pode ser exercida desde o momento da violação do direito. Contudo, a caracterização deste momento merece atenção. Nos direitos que resultem de contrato, como os da relação jurídica de seguro, a celebração do contrato pode deixar em suspenso certos efeitos, como é o caso daqueles que estejam submetidos a termo ou condição. Embora as partes tenham ajustado desde logo a prestação (e.g. o que se deve prestar), define-se que seu cumprimento deve ser feito até determinado dia (termo de vencimento, art. 315 do Código Civil (LGL\2002\400)), ou apenas no caso de realizar-se determinado evento futuro e incerto (condição suspensiva). No caso das obrigações subordinadas a termo, já há o direito de o credor receber, porém, não pode ainda exigir,
antes do vencimento. O termo se fixa em favor do devedor, que pode, salvo convenção em contrário, pagar antes do final do prazo, mas não ser constrangido a fazê-lo. Até que ocorra o termo de vencimento, não é exigível o dever de prestação.26 A recusa do cumprimento do dever, que implica a violação do direito e faz nascer a pretensão, não precisa ser expressa. Pressuposto o dever de realizar determinado comportamento no prazo estipulado e tendo o devedor se mantido inerte, há recusa e violação do direito.
Como regra, estão submetidos a termo, na relação jurídica de seguro, o direito do segurador ao prêmio, em relação ao qual as partes convencionam prazo para o pagamento, assim como o direito do segurado ou do beneficiário à indenização securitária ou ao capital segurado em caso de sinistro. Nesta situação, o direito subjetivo do segurado ou beneficiário, até a ocorrência do sinistro subordinado à condição suspensiva, torna-se exigível com o encerramento do prazo de que dispõe o segurador para a regulação do sinistro, em regra, de 30 dias.27 Tem-se, assim, termo para o cumprimento da prestação, cuja violação se dá pela recusa do segurador em indenizar. A recusa do segurador pode ser expressa ou tácita, sendo caracterizada quando o segurador nega o pagamento de qualquer quantia, quando nega o pagamento de parte dos danos, realizando pagamento a menor, ou, ainda, pela sua inércia findo o prazo estipulado para a regulação do sinistro. Nesses termos, é com a recusa do segurador em indenizar que há a violação do direito do segurado ou do beneficiário e o surgimento da sua pretensão. Em relação à pretensão do segurador ao prêmio, esta surge com a falta de pagamento, pelo segurado ou pelo tomador do seguro, no prazo ajustado.
Apenas o surgimento da pretensão, porém, não é suficiente para caracterizar o início da fluência do prazo prescricional na relação jurídica de seguro. Há situações em que a lei ou a jurisprudência estabelecem como termo inicial do prazo não o do nascimento da pretensão, mas aquele em que o titular tenha conhecimento dela ou, mesmo, condições concretas de exercê-la. Contra non valentem agere nulla currit praescriptio é máxima que literalmente significa “contra quem não pode agir, não corre a prescrição”. É o caso da pretensão do segurado contra o segurador e da pretensão do segurador contra o segurado, conforme estabelece o art. 206 § 1º, II, do Código Civil (LGL\2002\400). Neste particular, a norma prevê duas regras: uma geral, aplicável às diferentes modalidades de seguro e às pretensões do segurado e do segurador; a outra, especial, aplicável à pretensão do segurado no caso do seguro de responsabilidade civil facultativo.
Em regra, o prazo, de um ano, para o exercício da pretensão do segurado contra o segurador, ou deste contra aquele, tem início na data da ciência do fato gerador da pretensão. É o que prevê o art. 206, § 1º, II, alínea “b”, do Código Civil (LGL\2002\400):
“Art. 206. Prescreve:
§ 1º Em um ano:
[...]
II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo: [...]
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão”.
A rigor, para o segurado, o início do prazo prescricional da sua pretensão em caso de sinistro se dá quando toma conhecimento da recusa do segurador em indenizar. É a recusa do segurador, que caracteriza a violação do direito do segurado, o fato gerador da sua pretensão, cuja ciência deflagra o início do prazo prescricional. Para o segurador, o termo inicial do prazo é o da ciência do inadimplemento do dever pelo segurado, seja em relação ao pagamento do prêmio ou a outros deveres previstos na lei ou no contrato.
Especificamente no caso do seguro de responsabilidade civil, a norma estabelece que o prazo prescricional da pretensão do segurado contra o segurador tem início na data em que o segurado é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado ou na data em que indeniza o terceiro com a anuência do segurador. É o que prevê o art. 206, § 1º, II, alínea “a”, do Código Civil (LGL\2002\400):
“Art. 206. Prescreve:
§ 1º Em um ano:
[...]
II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:
a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;
[...]”.
A especialidade da regra se justifica pelas particularidades do seguro de responsabilidade civil, cujo implemento da garantia em caso de sinistro, mediante o pagamento de uma indenização ao segurado ou diretamente ao terceiro, pressupõe a reclamação do terceiro e a responsabilidade do segurado pelos danos (art. 787 do Código Civil (LGL\2002\400)), a qual é apurada em juízo ou administrativamente, podendo ser reconhecida pelo segurado desde que com a anuência do segurador (art. 787, § 2º). Nestes casos, o próprio exercício da pretensão pelo terceiro prejudicado é pressuposto do direito do segurado à prestação do segurador, em estado latente desde a violação do direito subjetivo do terceiro.
A compreensão do que seja o fato gerador da pretensão do segurado contra o segurador, cuja ciência deflagra a fluência do prazo prescricional, nos termos do art. 000, § 0x, XX, xxxxxx “x”, é questão que suscita dificuldades no direito brasileiro, o que perturba a estabilidade da relação jurídica de seguro, que é o fundamento da prescrição. A aplicação da norma tem operado de forma assistemática, não observando o critério uniforme previsto no art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400). Ou seja, que a pretensão, que se extingue pela prescrição, nasce com a violação do direito.
Os motivos desta dificuldade resultam da própria experiência jurídica que se consolidou sob a vigência do Código Civil de 1916. Neste diploma legal – que não adotava uma definição clara de prescrição, nos moldes do art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400) atual, a partir do conceito de pretensão (Anspruch), o que dava ensejo à discussão sobre o objeto de extinção pela prescrição (se a ação ou o direito) – o termo inicial do prazo prescricional para o exercício da pretensão do segurado contra o segurador era a data em que o primeiro tinha conhecimento do fato que autorizava a ação contra o segundo. Se o fato se verificasse no país, o prazo era um ano (art. 178, § 6º, II, do Código Civil (LGL\2002\400)/16),28 se ocorresse no exterior, era dois anos (art. 178, § 7º, V, do Código Civil (LGL\2002\400)/16).29
Nesse sentido, por ocasião da vigência do Código Civil de 1916, firmou-se, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça da década de 1990, entendimento de que o termo inicial do prazo prescricional da pretensão do segurado ao pagamento da indenização securitária é a data em que este toma conhecimento do sinistro.30 Em consonância com esse entendimento, o STJ editou a Súmula 229: “O pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão”.31 Nesses termos, o prazo prescricional, que tem início com a ciência do sinistro pelo segurado, é suspenso com o aviso do sinistro ao segurador, assim permanecendo durante todo o procedimento de regulação do sinistro, voltando a correr na data em que o segurado toma conhecimento da decisão do segurador sobre o cabimento ou não da indenização securitária.
Não sem antes observar oscilações,32 esse entendimento seria confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça já na vigência do Código Civil de 2002, o que se percebe pela edição da Súmula 278, segundo qual: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”.33 Da mesma forma, pela manutenção da vigência da Súmula 229, que continuou sendo aplicada pela jurisprudência do tribunal.34
Desse modo, por um período durante a vigência do Código Civil de 2002, até mais recentemente, o entendimento consolidado com a Súmula 229 seria observado, senão pacificamente, pelo menos majoritariamente, no direito brasileiro, não apenas na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, 35 mas também dos tribunais ordinários.
O entendimento é excepcionado, porém, em algumas hipóteses, como é o caso do Seguro DPVAT,
no qual, como regra, se exige o prévio requerimento administrativo e a recusa do segurador em efetuar o pagamento para justificar o interesse de agir do terceiro prejudicado;36 nada obstante, em relação à cobertura de invalidez do seguro DPVAT, haja o entendimento de que o termo inicial da prescrição seja a data da ciência inequívoca da invalidez.37 Da mesma forma, o entendimento de que o termo inicial do prazo prescricional, no caso da pretensão de complementação da indenização do seguro DPVAT, seja a data do pagamento administrativo a menor.38
Mais recentemente, porém, percebe-se uma mudança de compreensão a respeito do tema, em um movimento que tem início na doutrina39 e é recepcionado na jurisprudência. É o que se percebe na jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça, cuja Terceira Turma, em decisão paradigmática recente, alterou o seu entendimento, firmando a compreensão de que o termo inicial do prazo prescricional da pretensão do segurado contra o segurador, de que trata o art. 206, § 1º, II, alínea “b”, do Código Civil (LGL\2002\400), passa a ser, como regra, a data da ciência, pelo segurado, da negativa do segurador em indenizar, e não mais a data em que toma conhecimento do sinistro.40 A mudança de entendimento, porém, ainda não foi apreciada pela Segunda Seção do STJ, pelo que não está uniformizada no tribunal. E a Súmula 229 ainda não foi revogada.
A nova orientação da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça é acertada. O termo inicial da pretensão do segurado contra o segurado, segundo a sistemática do Código Civil de 2002, é a data em que o segurado toma ciência da recusa do segurador em indenizar, e não a data em que toma conhecimento do sinistro.41 O fato gerador da pretensão do segurado, cuja ciência deflagra o início do prazo prescricional, é a recusa do segurador em indenizar, a qual pode ser expressa ou tácita. Apenas neste momento, caracterizado o inadimplemento, há violação do direito do segurado à garantia e o nascimento da sua pretensão à indenização, a qual se extingue pela prescrição, segundo dispõe o art. 189 do Código Civil (LGL\2002\400). Antes, não há fluência do prazo prescricional pelo simples fato de ainda não ter nascido a pretensão que se extingue pelo não exercício.42
Observa-se que a ocorrência do sinistro não tem como efeito a exigibilidade imediata da prestação de pagamento do segurador. Como condição suspensiva que subordina a eficácia do contrato de seguro, o sinistro faz surgir a obrigação do segurador de pagamento da indenização, porém, sua exigibilidade não é imediata. Ao contrário, está submetida a termo, pressupondo o encerramento do prazo de que dispõe o segurador para a regulação do sinistro, em regra, de 30 dias. Neste particular,
“[...] não se deve confundir o nascimento da obrigação por decorrência do implemento da condição (
dies cedit), com o dia do vencimento da obrigação (dies venit). [...]
O credor de obrigação sob condição [como é da obrigação do segurador em caso de sinistro] terá direito à sua imediata execução, se se tratar de obrigação sem prazo. Nas estipulações com prazo, o simples advento da condição não opera a exigibilidade da dívida, que depende do termo que muitas vezes se estende além da data do implemento da condição”.43
Por outro lado, mesmo na hipótese de ausência de prazo para a regulação do sinistro, previsto no contrato, em norma regulamentar ou em lei, não seria possível sustentar o cumprimento imediato da prestação de pagamento do segurador. Como é próprio das obrigações em geral, o caráter imediato do cumprimento e sua exigência se interpretam conforme os usos. Poderão as partes não convencionar prazo, mas ainda assim não ser razoável, segundo as características do negócio, exigir o cumprimento imediato. A própria natureza da obrigação, mesmo sem prazo, pode exigir que se protele a exigência. É o caso do contrato de seguro, cuja regulação do sinistro, voltada à adoção de atos preparatórios ao cumprimento da prestação de pagamento do segurador, realiza-se em prazo razoável, caracterizando obrigação cuja execução exige tempo (art. 134 do CC (LGL\2002\400)), não sendo possível o seu cumprimento de imediato, tão logo do aviso do sinistro.
A regulação do sinistro, como etapa integrante da execução do contrato de seguro, cuja função é determinar se há direito à indenização e o valor a indenizar, não pode ser suprimida sem prejuízo ao próprio adimplemento do contrato. Daí porque não corresponde à melhor técnica a compreensão de que o prazo prescricional da pretensão do segurado tem início na data da ciência do sinistro, a qual admite a fluência do prazo prescricional antes mesmo do encerramento dos atos preparatórios ao adimplemento do contrato. O argumento frequente de que a fluência do referido prazo prescricional a
partir da recusa do segurador permitiria o retardamento voluntário e injustificado do aviso do sinistro pelo segurado, com prejuízos à regulação do sinistro e facilitação da fraude, da mesma forma, não observa a melhor técnica. Isso porque, ocorrendo o sinistro e deixando o segurado de comunicá-lo ao segurador, logo que o saiba, como determina a lei e o contrato, pode vir a perder o direito à garantia, segundo dispõe o art. 771 do Código Civil (LGL\2002\400) (“Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba”).
5. Regras gerais sobre prescrição e sua aplicação à relação jurídica de seguro
Observa-se, também, no Código Civil (LGL\2002\400), ou da própria construção doutrinária e jurisprudencial, outras regras gerais sobre prescrição decisivas à compreensão e aplicação do instituto na relação jurídica de seguro.
A prescrição admite apenas em parte que seus efeitos sejam objeto de disposição pelos interessados. Dispõe o art. 191 do Código Civil (LGL\2002\400) a renúncia à prescrição, de forma expressa ou tácita, que se reconhece a quem ela favorece, ou seja, àquele cujo dever deixaria de poder ser exigido em razão da extinção da pretensão. A renúncia pode se dar de forma expressa ou tácita. De forma expressa, por negócio jurídico unilateral. Tácita, quando resulte da presunção de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição, como é o caso em que aquele que se beneficia da prescrição admite a existência da obrigação e propõe acordo ao titular da pretensão.44 A renúncia pressupõe já existir o direito à prescrição. Logo, só há renúncia quando transcorrido o prazo prescricional.45 Se ocorrer antes de transcorrido o prazo, pode ser tomada como ato que importa o reconhecimento inequívoco do direito do credor, o que configura causa de interrupção do prazo prescricional (art. 202, VI, do Código Civil (LGL\2002\400)).46 Caso prejudique direito de terceiros, não produz efeitos em relação a eles.
Os prazos prescricionais fixados em lei não podem ser alterados por acordo das partes (art. 192 do Código Civil (LGL\2002\400)). Trata-se de normas de ordem pública.47 Nestes termos, serão nulas eventuais disposições neste sentido previstas contratualmente. De outro lado, a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição (art. 193 do Código Civil (LGL\2002\400)). A redação original do Código Civil (LGL\2002\400) impedia que a prescrição fosse reconhecida de ofício, a não ser a que beneficiasse o incapaz absoluto, devendo em outras hipóteses ser objeto de alegação da parte a quem interessava para ser conhecida pelo juiz. Esta vedação, contida no art. 194 do Código Civil (LGL\2002\400), foi revogada,48 e confirmada pelos arts. 332, § 1º e 487, II, do Código de Processo Civil, com a ressalva de que, salvo na hipótese de improcedência liminar do pedido (art. 332, § 1º), a prescrição não será reconhecida “sem que antes seja dada às partes oportunidade de manifestar-se” (art. 487, parágrafo único).
As exceções, por sua vez, prescrevem no mesmo prazo em que a pretensão a que se oponham (art. 190 do Código Civil (LGL\2002\400)). A razão é fácil de perceber, afinal, o que se apresenta como exceção de direito material deve ser objeto de alegação pelo réu, e é a rigor, antes, uma pretensão daquele que é demandado e a opõe como defesa (contradireito).49 No caso dos relativamente incapazes que atuam por intermédio de seus assistentes e da pessoa jurídica, através de seus representantes legais, se estes deixarem de exercer em tempo as pretensões de que sejam titulares seus assistidos ou representados, fazendo com que prescrevam, ou deixarem de alegar em tempo a prescrição que os favoreça, responderão pelos prejuízos que causarem em razão desta falha (art. 195 do Código Civil (LGL\2002\400)). Ademais, refira-se que a prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor (art. 196 do Código Civil (LGL\2002\400)).
A fluência do prazo prescricional pode sofrer intercorrências que, previstas em lei ou pela jurisprudência, assinalam o impedimento de que comece a fluir, ou que, estando em curso, seja suspenso ou interrompido pelo advento de causas que o justifiquem. Causas que impedem a prescrição são aquelas que não permitem que o prazo inicie. Diferentemente, as causas que suspendem a prescrição são eventos que ocorrem já durante a fluência o prazo prescricional e o paralisam, de modo que, quando deixam de existir, fazem com que volte a fluir de onde parou. Já as causas que interrompem a prescrição são eventos que, ao se realizarem, também paralisam a fluência do prazo prescricional em curso, porém, quando deixam de existir, fazem com que este prazo seja renovado, passando a contar todo ele, integralmente, mais uma vez.
Nos termos do art. 198, I, do Código Civil (LGL\2002\400), não corre a prescrição “contra os incapazes de que trata o art. 3º”, ou seja, contra os menores de dezesseis anos, absolutamente
incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Nesse sentido, a jurisprudência reconhece que o prazo prescricional para a cobrança do seguro DPVAT não flui durante a incapacidade absoluta por menoridade,50 assim como durante a incapacidade absoluta para os atos da vida civil até que se proceda a averbação da curatela.51 Também não corre a prescrição, segundo o art. 198, II e III, do Código Civil (LGL\2002\400), “contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios” e “contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra”.
Da mesma forma, não corre a prescrição, nos termos do art. 199 do Código Civil (LGL\2002\400), “I – pendendo condição suspensiva” e “II – não estando vencido o prazo. Nas relações jurídicas de seguro, assumem relevância considerando ser o sinistro condição suspensiva que subordina os efeitos do contrato de seguro, e frequente a previsão de prazo para o cumprimento das obrigações decorrentes do contrato, como o pagamento do prêmio ou a própria regulação do sinistro e o pagamento da indenização securitária, o que afasta a fluência da prescrição antes de findo o termo.
Ainda, de acordo com o art. 200 do Código Civil (LGL\2002\400): “Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”. Para efeito de incidência da norma, contudo, será necessário relação de dependência e prejudicialidade entre a pretensão civil, fundada no contrato de seguro, e a apuração do fato pelo juízo criminal, hipótese, inclusive, que a jurisprudência vem condicionando à instauração de inquérito policial ou a proposição de ação penal.52
A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, pode se dar, nos termos do art. 202 do Código Civil (LGL\2002\400):
“Art. 202. [...].
I – por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
II – por protesto, nas condições do inciso antecedente; III – por protesto cambial;
IV – pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores; V – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor”.
Ademais, “a prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper” (par. único, art. 202).
O aviso do sinistro suspende o prazo prescricional da pretensão do segurado contra o segurador, de acordo com a Súmula 229 do STJ (“O pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão”). Nesses termos, uma vez suspenso com o aviso do sinistro, o prazo prescricional assim permanece durante todo o procedimento de regulação do sinistro, voltando a correr, de onde parou, quando o segurado tenha ciência da decisão do segurador sobre o cabimento da indenização securitária. De acordo com a jurisprudência, contudo, o pedido de reconsideração da decisão do segurador não suspende novamente o prazo prescricional.53 Por outro lado, já foi afirmado pela jurisprudência que a reclamação administrativa formulada pelo segurado perante à SUSEP suspende o prazo prescricional.54
Outra hipótese de suspensão e/ou interrupção do prazo prescricional, que pode repercutir na relação de seguro, é a prevista na Lei 14.010 de 2020 (LGL\2020\7511) (Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado no Período da Pandemia do Coronavírus), cujo art. 3ºestabelece: “Os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos, conforme o caso, a partir da entrada em vigor desta Lei até 30 de outubro de 2020”. O § 1º, do mesmo artigo, todavia, excepciona a incidência da regra nos casos em que “perdurarem as hipóteses específicas de impedimento, suspensão e interrupção dos prazos prescricionais previstas no ordenamento
jurídico nacional.”
6. Referências bibliográficas
XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. A parte geral do projeto de Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro.
2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Critério cientifico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis, Revista dos Tribunais, v. 300. São Paulo: RT, outubro de 1960, p. 7-37.
XXXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Prescrição e decadência. São Paulo: XX, 0000.
XXXXXX XXXX, Xxxxxxx Xxxx xx. Da prescrição e da decadência. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
XXXXXXXX, Xxxxxxxxxx. Le temps et le droit: la reponse de Rome. L’approche du droit prive. Xxxxx, Xx Xxxxxxx, 0000.
XXXXXX, Xxxxxxx. Die Zeitlichkeit des positiven Rechts und die Geschichtlichkeit des Rechtsbewusstseins: Momente der Ideengeschichte und Grundzuge einer systematischen Begrundung, Berlin: Duncker und Humblot, 1998.
XXXXX, Xxxxxxx. Comentários ao art. 191 do Código Civil (LGL\2002\400), In: Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxx (org.) Comentários ao Código Civil: direito privado contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2019.
XXXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Notas sobre a pretensão e prescrição no sistema do novo Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil, v. 11. Rio de Janeiro: Padma, jul.-set./2002.
XXXXXXXX, Xxxxx. A prescrição e a decadência no contrato de seguro. A prescrição da pretensão do segurado contra o segurador e o aviso do sinistro ao segurador. Revista Cila, set.-dez. 3/2015.
XXXXXX XX XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de direito privado. São Paulo: XX, 0000. t. VI.
XXXXXX XX XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de direito privado. Atual. Xxxxxx Xxxx Xx. e Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx. São Paulo: XX, 0000. t. XXIV.
PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. Atual. Otávio Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxxx. São Paulo: XX, 0000. t. VI.
POTHIER. Traite des obligations, tome premier, Paris: Debure, 1761. SAVIGNY. System des heutigen romischen Rechts, Bd V, Berlin, 1841, § 204.
XXXXXXXX XXXXXX; Xxxxxxxx. Contrato de seguro. Ação do segurado contra o segurador. Prescrição. Revista dos Tribunais. v. 924, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 79, out. 2012.
XXXXXXXXX, Xxxxxxx. Ornitorrinco securitário: a prescrição da pretensão indenizatória. Publicado em 2004.
WINDSCHEID, Die Actio des romischen Civilrechts, vom Standpunkte des heutigen Rechts. Dusseldorf: Buddeus, 1856.
XXXX, Xxxxxxx; XXXXXX, Xxxx. Allgemeiner Teil des Burgerlichen Rechts. 10 Auf. Munchen: X.X. Xxxx, 2012.
1 .Para o exame dos fundamentos da prescrição e da decadência no direito privado, cuja aplicação à relação de seguros é aqui desenvolvida, veja-se: MIRAGEM, Xxxxx. Teoria geral do direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 505 e ss.
2 .XXXXXX, Xxxxxxx. XXXXXX, Xxxxxxx. Die Zeitlichkeit des positiven Rechts und die Geschichtlichkeit des Rechtsbewusstseins: Momente der Ideengeschichte und Grundzuge einer systematischen Begrundung, Berlin: Duncker und Humblot, 1998, p. 358; XXXXXX, Xxxxxx. Law as a social system. Oxford: Oxford University Press, 2014. p. 147.
3 .A supressio como efeito da boa-fé objetiva, determinando a ineficácia de determinado direito ou pretensão que o titular não exerça por um tempo tal a gerar a expectativa legítima da outra parte, de estabilização de uma determinada relação jurídica, incide tutelando a repercussão do tempo nas relações jurídicas, com certa proximidade de fins com os institutos gerais da prescrição e da decadência (XXXX, Xxxxxxx; NEUNER, Jorg. Allgemeiner Teil des Burgerlichen Rechts. 10 Auf.
Munchen: X.X. Xxxx, 2012, p. 237-238), complementando-os no tocante a uma aplicação casuística. Destacando este caráter de complementaridade da supressio: STJ, REsp 1643203/RJ, rel. Min.
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, 3ª Turma, j. 17.11.2020, DJe 01.12.2020.
4 .XXXXXXXX, Xxxxxxxxxx. Le temps et le droit: la reponse de Rome. L’approche du droit prive. Xxxxx, Xx Xxxxxxx, 0000. p. 63.
5 .XXXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Prescrição e decadência. São Paulo: XX, 0000. p. 21.
6 .XXXXXXX XXXXX, Xxxx Xxxxxx. A parte geral do projeto de Código Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 86-87.
7 .Na linha de evolução do pensamento pandectista do século XIX, a pretensão e a ação não se confundiam. A ação é o direito subjetivo em “estado de defesa” conforme apontava Savigny (System des heutigen romischen Rechts, Bd V, Berlin, 1841, § 204, p. 2). Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx, de sua vez, compreende a pretensão como elemento do próprio direito subjetivo, identificado com a noção de actio romana: “Actio ist der Ausdruck fur den Anspruch” (WINDSCHEID, Xxxxxxxx. Die Actio des romischen Civilrechts, vom Standpunkte des heutigen Rechts. Dusseldorf: Buddeus, 1856. p. 5).
Dessa origem delineia-se a noção material da pretensão no direito contemporâneo. Na tradição francesa, esta compreensão se dá, especialmente, no exame das obrigações, distinguindo-as entre as perfeitas, dotadas da possibilidade de exigir cumprimento, e as imperfeitas (obrigações naturais) em que não h como o credor exigir o cumprimento. Veja-se: XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx. Traite des obligations, tome premier, Paris: Debure, 1761. p. 193.
8 .XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. A parte geral do projeto de Código Civil brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 157.
9 .Ao lado dos direitos subjetivos propriamente ditos há os direitos potestativos. São espécies de direitos cujo titular, ao exercer, realiza plenamente seus efeitos, independentemente da cooperação ou comportamento do titular do dever. Resulta do simples exercício pelo titular a constituição, alteração ou extinção de uma determinada relação jurídica, de modo que os demais sujeitos que a integram apenas se sujeitam aos efeitos produzidos. Daí dizer-se que ao direito potestativo corresponde um dever de sujeição. Exemplificam a hipótese o direito de postular a anulação do contrato de seguro, de resolvê-lo, extinguindo-o em razão do inadimplemento, ou de denunciá-lo quando haja previsão legal ou contratual.
10 .Às pretensões podem se opor as exceções, compreendidas como as situações jurídicas pelas quais a parte pode recusar o cumprimento de um dever ou de uma pretensão que lhe corresponda. Ou, em outros termos, posições que permitem ao titular impedir a eficácia do direito da contraparte. Assim, por exemplo, é o caso da exceção de incumprimento do contrato, pela qual o segurador, de quem venha a ser exigida a indenização securitária, possa condicionar o cumprimento ao implemento da prestação principal da contraparte de pagamento do prêmio (art. 476 do Código Civil).
11 .Observa-se que o direito protestativo, igualmente, deve ser exercido no prazo fixado em lei ou convencionado pelas partes. Extingue-se no caso de inércia do titular pelo período previsto, decaindo. Decadência é a extinção do direito protestativo em razão do seu não exercício pelo titular no tempo previsto em lei ou convencionado pelas partes.
12 .Dentre os critérios para distinguir a prescrição e a decadência, em especial frente as dificuldades que impunha o caráter assistemático da disciplina do tema no Código Civil de 1916, logrou justo prestígio o proposto por Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx, que influenciou o legislador do Código Civil de 2002. Ainda que marcado pela terminologia pouco clara do Código anterior (e, em especial, na identificação entre pretensão e ação, ora tomada como imprópria), propôs a distinção a partir das ações correspondentes aos direitos subjetivos, todas de natureza condenatória, consistentes na exigência de uma prestação não realizada espontaneamente pelo devedor; e os direitos potestativos, aos quais não corresponde uma prestação, e são insuscetíveis de violação, dos quais se originam ações constitutivas ou desconstituías, cujo prazo previsto em lei ou convencionado, será decadencial. Igualmente, sustenta que as ações declaratórias são imprescritíveis considerando que visam obter uma certeza sobre dada situação jurídica. XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis, Revista dos Tribunais, v. 300. São Paulo: RT, outubro de 1960, p. 7-37. Mais recentemente, veja-se à luz do Código Civil de 2002, o exame já mencionado de XXXXXXX XXXXXXX, Xxxx Xxxxxx. Notas sobre pretensão e prescrição no sistema do novo Código Civil brasileiro. Revista trimestral de direito civil,
v. 11. Rio de Janeiro: Padma, jul.-set./2002, p. 67-77.
13 .No Código Civil de 1916, era de um ano o prazo prescricional da “ação do segurado contra o segurador e vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar no país, contado o prazo do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato” (art. 178, § 6º, II); e de dois anos no caso da “ação do segurado contra o segurador e, vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar fora do Brasil; contado o prazo do dia em que desse fato soube o interessado” (art. 178, § 7º, V).
14 .REsp 1.303.374/ES, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 2ª Seção, j. 30.11.2021, DJe 16.12.2021. Conforme a tese firmada no julgado: “É ânuo o prazo prescricional para exercício de qualquer pretensão do segurado em face do segurador – e vice-versa – baseada em suposto inadimplemento de deveres (principais, secundários ou anexos) derivados do contrato de seguro, ex vi do disposto no artigo 206, § 1º, II, ‘b’, do Código Civil de 2002 (artigo 178, § 6º, II, do Código Civil de 1916)”.
15 .STJ, REsp 1.170.057/MG, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 3ª T., j. 17.12.2013, DJe
13.02.2014.
16 .STJ, REsp 1.084.474/MG, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 04.10.2011, DJe 11.10.2011.
17 .STJ, REsp 1.077.911/SP, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 04.10.2011, DJe 14.10.2011.
18 .STJ, AgRg no Ag 1088420 SP, rel. Min. Xxxxxx Xxxxxx, 3ª T., j. 23.06.2009, DJe 26.06.2009.
19 .STJ, AgInt no AREsp 1.903.831/SP, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 4ª T., j. 28.03.2022, DJe
30.03.2022.
20 .STJ, AgInt no REsp 1.959.286/SP, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 21.02.2022, DJe
23.02.2022.
21 .STJ, AgInt no AgInt no REsp 1.856.896/SP, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 3ª T., j. 13.03.2023, DJe 16.03.2023.
22 .STJ, REsp 1.756.283/SP, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 2ª Seção, j. 11.03.2020, DJe 03.06.2020.
23 .STJ, REsp 1.848.369/MG, rel. Min. Xxxxx Xxxxx, rel. para acórdão Min. Xxxx Xxxxxx, 4ª T.,
j. 13.12.2022, DJe 06.03.2023; STJ, REsp 1842120/RJ, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 20.10.2020,
DJe 26.10.2020.
24 .No Projeto de Lei 29/2017, em tramitação no Senado Federal, segundo estabelece o art. 124: “Prescrevem: I – em um ano, contado o prazo da ciência do respectivo fato gerador: a) a pretensão da seguradora para a cobrança do prêmio ou qualquer outra pretensão contra o segurado e o estipulante do seguro; b) a pretensão do corretor de seguro para a cobrança de suas comissões;
c) as pretensões das cosseguradoras, entre si; d) as pretensões existentes entre seguradoras, resseguradoras e retrocessionárias; e) a pretensão do segurado para exigir indenização, capital, reserva matemática, prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias e restituição de prêmio em seu favor, após a recepção da recusa expressa e motivada da seguradora; II – em três anos a pretensão dos beneficiários ou terceiros prejudicados para exigir da seguradora indenização, capital, reserva matemática, prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias, a contar da ciência do fato gerador da pretensão. Parágrafo único. No seguro de responsabilidade civil, o prazo terá início quando o segurado for citado ou notificado isoladamente para responder ao pedido condenatório formulado pelo terceiro prejudicado”.
25 .“A prescrição inicia-se ao nascer a pretensão; portanto, desde que o titular do direito pode exigir o ato, ou a omissão. A pretensão supõe o direito, que é prius; pode ser posterior a ele, e.g., se há dia para vencimento e exigibilidade” (PONTES DE XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de direito privado. São Paulo: XX, 0000. p. 239. t. VI). No mesmo sentido, CÂMARA LEAL, Xxxxxxx Xxxx xx. Da prescrição e da decadência. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 22.
26 .Todavia, se é dívida que o credor deva interpelar para serem pagas, só havida esta, e mantendo-se inerte o devedor que não realiza o pagamento, verifica-se a violação do direito.
27 .A regulação do sinistro deve ser executada em tempo adequado. Na ausência de previsão legal quanto ao tempo que o segurador dispõe para o cumprimento da obrigação, o prazo costuma ser objeto de disposição contratual e de normas administrativas expedidas pelo órgão regulador. É comum a previsão do prazo de 30 dias para a regulação do sinistro. Contudo, poderá variar conforme o tipo de seguro. Quanto aos seguros de pessoas, a Resolução 117/2004 do CNSP prevê o prazo máximo de 30 dias. Quanto aos seguros de danos, a Circular da Susep 621/2021 estabelece
o prazo máximo de 30 dias. Com relação aos seguros marítimos, o art. 730 do CCom. prevê a obrigação de o segurador efetuar o pagamento da indenização no prazo máximo de 15 dias, salvo convenção em sentido contrário. No tocante ao seguro DPVAT, o art. 5º, § 1º, da Lei 6.194/1974, estabelece o prazo de 30 dias.
28 .Art. 000, § 0x, XX, xx Xxxxxx Xxxxx xx 0000: “Prescreve em um ano a ação do segurado contra o segurador e vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar no país, contado o prazo do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato”.
29 .Art. 000, § 0x, X, xx Xxxxxx Xxxxx xx 0000: “Prescreve em dois anos a ação do segurado contra o segurador e, vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar fora do Brasil; contado o prazo do dia em que desse fato soube o interessado”.
30 .STJ, REsp 70367/SP, rel. Min. Xxxxxxxx Xxxxxxx, 3ª T., j. 24.10.1995, DJ 11.12.1995; STJ,
REsp 23.554/SP, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxxx, 3ª T., j. 31.08.1992, DJ 21.09.1992; STJ, REsp 59689/SP, rel. Min. Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Direito, 3ª T., j. 27.08.1996, DJ 21.10.1996.
31 .Súmula 229, 2ª Seção, j. 08.10.1999. Veja-se, neste sentido, o leading case: REsp 8770/SP, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 4ª T., j. 16.04.1991; DJ 13.05.1991.
32 .STJ, REsp 450290/CE, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxx, 4ª T., j. 16.09.2003, DJ 20.10.2003; REsp 590489/RJ, rel. Min. Xxxxx Xxxxx Xxxxx, 4ª T., j. 09.12.2003, DJ 14.06.2004.
33 .Súmula 278, 2ª Seção, j. 14.05.2003, DJ 16.06.2003.
34 .STJ, AgRg nos EDcl no REsp 976.719/MG, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 06.05.2008, DJe 28.05.2008; STJ, AgRg no Ag 870.682/MG, rel. Min. Xxxxxx Xxxxxx, 3ª T., j. 10.06.2008, DJe 20.06.2008; AgRg no Ag 590.716/MG, rel. Min. Xxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxx, 3ª T., j. 26.10.2006, DJ 18.12.2006.
35 .Especialmente na 4ª T. do STJ, porém, observam-se julgados que reconhecem que o prazo prescricional para a cobrança do seguro somente flui após a recusa do segurador em indenizar. Veja-se: AgRg no Ag 1.156.556/PR, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 4ª T., j. 02.08.2011, DJe 09.08.2011.
36 .STJ, REsp 1.987.853/PB, rel. Min. Xxxxx Xxxxx, 4ª T., j. 14.06.2022, DJe 20.06.2022.
37 .REsp 1.388.030/MG, rel. Min. Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxxxxx, 2ª Seção, j. 11.06.2014, DJe
01.08.2014.
38 .REsp 1.418.347/MG, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 2ª Seção, j. 08.04.2015, DJe
15.04.2015.
39 .XXXXXXXX, Xxxxx. A prescrição e a decadência no contrato de seguro. A prescrição da pretensão do segurado contra o segurador e o aviso do sinistro ao segurador. Revista Cila, set.-dez. 3/2015; XXXXXXXX XXXXXX; Xxxxxxxx. Contrato de seguro. Ação do segurado contra o segurador. Prescrição. Revista dos Tribunais. v. 924, p. 79. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, out. 2012. Pioneiramente: XXXXXXXXX, Xxxxxxx. Ornitorrinco securitário: a prescrição da pretensão indenizatória, publicado em 2004. Disponível em:
40 .“Civil. Recurso especial. Ação de cobrança. Indenização securitária. Seguro de dano. Prescrição. Seguros em geral. Termo inicial do prazo prescricional. Recusa da seguradora.1. Recurso especial interposto em 02.03.2021 e concluso ao gabinete em 28.10.2021 2. O propósito recursal consiste em determinar o termo inicial do prazo prescricional da pretensão do segurado em face da seguradora nos contratos de seguro em geral. 3. A prescrição tem como termo inicial do transcurso do seu prazo o nascimento da pretensão (teoria da actio nata). Somente a partir do instante em que o titular do direito pode exigir a sua satisfação é que se revela lógico imputar-lhe eventual inércia em ver satisfeito o seu interesse. 4. Com relação aos seguros em geral, na vigência do CC/16, a Segunda Seção assentou a tese de que não poderia transcorrer prazo prescricional algum enquanto a seguradora não decidisse o pleito indenizatório endereçado a ela pelo segurado. Editou-se, assim, o enunciado da Súmula 229. Todavia, ainda na vigência desse diploma civilista, passou a jurisprudência do STJ a perfilhar a tese segundo a qual o termo inicial do prazo prescricional seria o momento da recusa de cobertura pela seguradora, ao fundamento de que só então nasceria a pretensão do segurado em face da seguradora. 5. Com o advento do CC/02, alterou-se a redação da alínea “b” do II do § 1º do art. 206, estabelecendo como termo inicial do prazo prescricional a data da ciência do “fato gerador da pretensão”. A interpretação desse dispositivo em conjunto com o estabelecido no art. 771 do mesmo diploma legal conduz à conclusão de que, antes da regulação do sinistro e da recusa de cobertura nada pode exigir o segurado do segurador, motivo pelo qual não se pode considerar iniciado o transcurso do prazo prescricional tão somente com a ciência do sinistro.
Por essa razão, é, em regra, a ciência do segurado acerca da recusa da cobertura securitária pelo segurador que representa o “fato gerador da pretensão”. 6. Na hipótese, o Tribunal de origem considerou como termo inicial da prescrição a data do sinistro. Todavia, o prazo prescricional apenas começa a fluir com a ciência do segurado quanto à negativa da cobertura securitária, de modo que a pretensão do recorrente não está fulminada pela prescrição. 7. Recurso especial conhecido e provido”. (REsp 1.970.111/MG, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 15.03.2022, DJe 30.03.2022).
41 .XXXXXXXX, Xxxxx. A prescrição e a decadência no contrato de seguro. A prescrição da pretensão do segurado contra o segurador e o aviso do sinistro ao segurador, cit.
42 .É o que prevê o art. 124, I, alínea “e”, do Projeto de Lei 29/2017, em tramitação no Senado. Federal: “Prescrevem (...) em um ano, contado o prazo da ciência do respectivo fato gerador (…) a pretensão do segurado para exigir indenização, capital, reserva matemática, prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias e restituição de prêmio em seu favor, após a recepção da recusa expressa e motivada da seguradora”.
43 .XXXXXX XX XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de direito privado. Atual. Xxxxxx Xxxx Xx. e Xxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxx. São Paulo: XX, 0000. p. 202. t. XXIV.
44 .STJ, REsp 1520012/SP, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 3ª T., j. 14.03.2017, DJe
21.03.2017.
45 .STJ, REsp 1520012/SP, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 3ª T., j. 14.03.2017, DJe
21.03.2017.
46 .XXXXX, Xxxxxxx. Comentários ao art. 191 do Código Civil, In: XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx (org.)
Comentários ao Código Civil: direito privado contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 313.
47 .PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. Atual. Otávio Xxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx, Xxxxxx Xxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx Xxxxxx. São Paulo: XX, 0000. p. 233. t. VI.
48 .A revogação da norma se deu pela Lei 11.280/2006, que alterou o art. 219, § 5º, do Código de Processo Civil de 1973 – ora revogado e substituído pelo de 2015 – definindo naquela regra que o juiz deveria pronunciar de ofício a prescrição. Com fundamento nesta alteração, inclusive, passou-se a entender que o reconhecimento da prescrição poderia se estabelecer, de ofício, inclusive na fase de execução da sentença: STJ, REsp 723.210/PR, rel. Min. Xxxxxx Xxxxxxxx, 2ª T., j. 06.02.2007, DJ 19.12.2007.
49 .XXXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Notas sobre a pretensão e prescrição no sistema do novo Código Civil brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil, v. 11. Rio de Janeiro: Padma, jul.-set./2002, p. 75.
50 .STJ, AgInt no REsp 1.363.574/RS, rel. Min. Xxxxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx, 3ª T., j. 11.11.2019, DJe
21.11.2019.
51 .STJ, REsp 1.987.853/PB, rel. Min. Xxxxx Xxxxx, 4ª T., j. 14.06.2022, DJe 20.06.2022.
52 .STJ, REsp 1180237/MT, rel. Min. Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxxxxx, 3ª T., j. 19.06.2012, DJe 22.06.2012; STJ, REsp 1135988/SP, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 4ª T., j. 08.10.2013, DJe 17.10.2013; STJ, REsp 1704525/AP, rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, 3ª T., j. 12.12.2017, DJe 18.12.2017;
STJ, AgInt no REsp 1831298/CE, rel. Min. Xxxx Xxxxxx, 4ª T., j. 10.12.2019, DJe 19.12.2019.
53 .STJ, AgInt no AREsp 338.354/SP, rel. Min. Xxxx Xxxxxx, 4ª T., j. 02.02.2017, DJe 13.02.2017;
AgRg no Ag 1312098/MT, rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 4ª T., j. 21.06.2011, DJe 18.08.2011; REsp 247.295/SP, rel. Min. Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Direito, 3ª T., j. 29.03.2001, DJ 04.06.2001.
Diferentemente, prevê o Projeto de Lei 29/2017, em tramitação no Senado Federal: “Art. 125. Além das causas previstas na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), a prescrição da pretensão relativa ao recebimento de indenização ou capital será suspensa uma única vez quando a seguradora receber pedido de reconsideração da recusa de pagamento. Parágrafo único. Cessa a suspensão no dia em que o interessado for comunicado pela seguradora de sua decisão final”.
54 .STJ, AgRg no Ag 711.879/RJ, rel. Min. Xxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxx, 3ª T., j. 14.11.2007, DJ
26.11.2007.