RESUMO
O Compromisso de Compra e Venda
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx*
RESUMO
Nosso intuito, com o presente trabalho, é efetuar uma breve análise histórica do compromisso de compra e venda no direito brasileiro, desde a edição do Código Civil de 1916, até o novo Código Civil de 2002 e apontar os eventuais avanços e retrocessos que marcam o instituto desde o seu reconhecimento e inserção no Direito pátrio.
Palavras-chave: Compromisso. Compra. Venda. Registro. Contrato.
ABSTRACT
Our intention, with the work herein, is to make a brief historical analysis of the commitment of buying and selling in the brazilian law, from the Civil Code of 1916 to the new Civil Code of 2012 and to point out the eventual advances and regressions that embraces the institute since its acknowledgment and insertion in the patriotic Law.
Keywords: Commitment. Buying. Selling. Registry. Contract.
* Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP), advogado em São Paulo, Chefe do Departamento de Humanidades e professor de Filosofia Geral e
1. Introdução
Há, na doutrina pátria, aqueles que, a nosso ver acertadamente, sustentam que o compromisso de compra e venda ganhou, com o novo Código Civil, posição de destaque sobre a própria compra e venda, uma vez que, àquele, são reconhecidas garantias que, na prática, representam mais segurança ao compromissário, que ao próprio comprador.
Será, portanto, a análise desses eventuais avanços o objeto deste breve estudo sobre o compromisso de compra e venda no Direito Brasileiro.
2. Conceito
O compromisso de compra e venda é, segundo WALD (1994: p. 188)1 denominação imprópria de contrato preliminar, pré-contrato ou promessa de contrato. Trata-se, segundo ensina, de contrato autônomo, pelo qual as partes se comprometem a realizar, na ocasião oportuna, um contrato definitivo de compra e venda.
Para Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, é o “contrato pelo qual o compromitente-vendedor obriga-se a vender ao compromissário-comprador determinado imóvel, pelo preço, condições e modos avençados, outorgando-lhe a escritura definitiva assim que ocorrer o adimplemento da obrigação; por outro lado, o compromissário comprador, por sua vez, ao pagar o preço e satisfazer todas as condições
compromitente-vendedor ou de terceiro a quem os direitos deste foram cedidos”.2
Segundo Xxxxx Xxxxxxxxx, citado por Xxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, em sua tese de doutorado intitulada O parcelamento do solo urbano, 1983, o compromisso de compra e venda é “contrato que tem por objeto obrigar as partes a fazerem futuramente outro contrato, o de compra e venda, mediante bases pré- fixadas.”3
3. Origem Histórica
Não existe, entre os autores, unanimidade quanto à origem precisa do contrato de compra e venda (em Roma, emptio venditio), muito menos sobre o compromisso de compra e venda. Apesar disso, é pacífico, entre os autores, que o contrato de compra e venda pertence à categoria consensual, ao lado da locatio, da societas e do mandatum.
Parece, entretanto, não haver, entre aqueles que cuidaram do assunto, dúvidas de que a compra e venda origina-se da mancipatio e da traditio (formas de transferência da propriedade), cujas origens remontam à época arcaica (ações da lei), em que pese o fato de terem sido, ambas, grandemente utilizadas no período clássico (processo formular).
A mancipatio (ato solene), era utilizada para a transferência das denominadas res mancipi, enquanto a traditio, que se constituía em simples entrega, era destituída de formalidades, sendo utilizada nas transferências das denominadas res nec mancipi.
Com Xxxxxx Xxxxx aprendemos que, na categoria das res mancipi situam-se os terrenos itálicos (não os provinciais), os animais de tiro e carga (como o cavalo, a vaca, o burro), os escravos e as quatro servidões prediais rústicas mais antigas, que eram via, iter, actus e aquaeduetus. As demais coisas eram nec mancipi.4
estipuladas no contrato, tem direito real sobre
o imóvel, podendo reclamar a outorga de escritura definitiva, ou sua adjudicação compulsória, havendo recusa por parte do
1 XXXX, Xxxxxx. Obrigações e contratos. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.
2 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de direito civil
brasileiro. 19.ed. São Paulo:Saraiva, 2002, v. 4.
3 VIANA. Xxx Xxxxxxx Xxxxxxx. O parcelamento do solo urbano. tese de doutoramento defendida na USP em 1983.
4 XXXXX, Xxxxxx. Curso elementar de direito romano. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1992.
A res mancipi era uma espécie de troca imediata, ou seja, a troca da coisa pelo preço, havendo a simples transferência da propriedade, sem o nascimento de qualquer outra obrigação para as partes. A res mancipi não era, portanto, como diz XXXXX (1999, p.
contratos consensuais: emptio venditio, locatio conductio, mandatum e societas são a grande novidade, sem ritualismo: o consenso basta, não há troca física das coisas, nem mesmo a troca fictícia, é a simples promessa.
Em nosso direito, segundo xxxxxx
156) 5 venda contratual, geradora de
XXXXX (1983, p. 30)8, o art. 1.088 do Código
As obrigações resultantes de tal venda seriam em virtude de culpa do vendedor. Portanto, em virtude de um delito, e não de um contrato.
O compromisso, do latim compromissu, é uma promessa de trato a ser cumprido, tendo a boa-fé como princípio.
O direito romano, conforme preceitua Xxxxxx Xxxx, embora reconhecesse eficácia jurídica mais ampla aos contratos, que obedeciam às formalidades legais, relegava os pactos para um plano inferior, uma vez que estes últimos criavam apenas obrigações ditas naturais. Admitia, entretanto, a aplicação de sanções às partes que descumprissem os pactos.6
É preciso notar, entretanto, que o contrato não é criação romana. No direito arcaico (ações da lei), em institutos como a sponsio – fórmula de promessa – a obrigação surgia com determinados gestos, ritos ou palavras. A palavra, como ocorria na sponsio, vinculava o proponente, mas esta, embora fosse obrigação verbal, segundo a classificação de Xxxx (século II d.C.), não poderia ser tomada como forma de contrato. Não se indaga sobre a vontade de contratar. A palavra, quando pronunciada perante a pessoa certa, no lugar certo, criava o vínculo.
É nas obrigações consensuais, como xxxxxx XXXXX (2000, p.51)7 que a vontade de fazer o negócio se torna relevante. Abandona- se, pois, a fórmula simples. O núcleo do direito novo das “obrigações” serão quatro
Civil foi, em nosso direito, o germe do contrato preliminar, porque possibilitava a prévia contratação depois convertida em negócio definitivo, sistema que remonta às Ordenações Filipinas (livro IV, Título XIX).
4. Legislação Especial
Apesar do legislador do Código Civil de 1916 ter, na esteira do legislador português de 1603, alinhavado os contornos do contrato preliminar, coube à legislação especial disciplinar as bases do Compromisso de Compra e Venda. Assim, em apertada síntese e tomando por base a cronologia apresentada por XXXXX 9 e Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xx. 10 , é possível afirmar que o instituto veio retratado, pela primeira vez, no Decreto-Lei nº 58, de 17 de dezembro de 1937, que disciplinava o loteamento e venda de terrenos para pagamento em prestações.
O legislador de 1937 (o projeto do Decreto-Lei 58 é de Xxxxxxxx Xxxxxxxx e foi outorgado pelo então presidente Xxxxxxx Xxxxxx que, poucos dias antes havia dissolvido os partidos políticos), outorgou o Decreto-Lei nº 58, estabelecendo, na exposição de motivos, que o citado diploma tinha, entre as suas causas, (i) o grande desenvolvimento da loteação de terrenos para venda em prestações;
(ii) o crescimento da má-fé e solvabilidade de empresas; (iii) a ausência de garantia e segurança das transações imobiliárias; e, (iiii) o grande número de transações imobiliárias ocorridas no período, sem que o comprador tivesse possibilidade de verificar o título de propriedade.
Destacam-se, no referido diploma, os seguintes artigos:
5 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 6ª ed. Vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
6 Idem.
7 XXXXX, Xxxx Xxxxxxxx Xxxx. i – lições introdutórias.
São Paulo: Xxx Xxxxxxx, 2000.
8 Idem.
9 Idem.
10 XXXXXXX XXXXXX. Xxxx Xxxxxx de. Compromisso de compra e venda. São Paulo: Saraiva. 1979.
Art. 15. Os compromissários têm o direito de, antecipando ou ultimando o pagamento integral do preço, e estando quites com os impostos e taxas, exigir a outorga da escritura de compra e venda.
Art. 16. Recusando-se os compromitentes a passar a escritura definitiva no caso do art. 15, serão intimados, por despacho judicial e a requerimento do compromissário, a dá-la nos 10 dias seguintes à intimação, correndo o prazo em cartório.
§ 1º Se nada alegarem dentro desse prazo, o juiz, por sentença, adjudicará os lotes aos compradores, mandando:
a) tomar por têrmo a adjudicação, dela constando, além de outras especificações, as cláusulas do compromisso, que devessem figurar no contrato de compra e venda, e o depósito do restante do preço, se ainda não integralmente pago;
b) expedir, pagos os impostos devidos, o de transmissão inclusive, em favor dos compradores, como título de propriedade, a carta de adjudicação;
c) cancelar a inscrição hipotecária tão sòmente a respeito dos lotes adjudicados nos têrmos da escritura aludida no § 3º, do art. 1º.
§ 2º Se, porém, no decêndio, alegarem os compromitentes matéria relevante, o juiz, recebendo-a como embargos, mandará que os compromissários os contestem em cinco dias.
§ 3º Havendo as partes protestado por provas, seguir-se-á uma dilação probatória de 10 dias, findos os quais, sem mais alegação, serão os autos conclusos para sentença.
§ 4º Das sentenças proferidas nos casos dêste artigo caberá o recurso de agravo de petição.
§ 5º Estando a propriedade hipotecada, cumprido o dispositivo do § 3º, do art. 1º, será o credor citado para, no caso dêste artigo, autorizar o cancelamento parcial da inscrição, quanto aos lotes
trinta dias, que correrá em cartório, receber a escritura de compra e venda.
Parágrafo único. Não sendo assinada a escritura nesse prazo, depositar-se-á o lote comprometido por conta e risco do compromissário, respondendo êste pelas despesas judiciais e custas do depósito.
Art. 22. As escrituras de compromisso de compra e venda de imóveis não loteados, cujo preço deva pagar-se a prazo, em uma ou mais prestações, serão averbadas à margem das respectivas transcrições aquisitivas, para os efeitos desta lei.
É comum, entre aqueles que se ocuparam do assunto, afirmar-se que a inserção do Decreto-Lei nº 58 no sistema legal do país deveu-se a uma necessidade de coibir abusos, principalmente dos proprietários de imóveis urbanos que, de certa forma, amparados pela norma do art. 1.088 do Código Civil de 1916, faziam uso excessivo do direito de arrependimento com o consequente desfazimento dos negócios jurídicos.
Entre os que abordaram o tema, o professor Xxxxxxx Xxxxx, na obra que escreveu, intitulada Da compra e venda e da troca11, foi incisivo em afirmar que a grande valorização de imóveis ocorrida nas grandes cidades brasileiras durante as décadas de 1920 e 1930, foram a causa do loteamento de terras e terrenos.
Entretanto, lembra o mestre Xxxxx, pessoas “e companhias menos idôneas, não obstante findos os pagamentos, deixavam de entregar os lotes, comprados em prestações, durante anos e anos, preferindo, em lugar disso, devolver as quantias recebidas e sujeitarem-se às perdas danos.” 12
Em que pese o fato do Decreto-Lei nº 58 ter sido publicado no auge da ditadura Xxxxxx, não se pode negar, como xxxxxx XXXXX (1983, p. 30)13, que veio, em boa hora, acabar com os “efeitos nefatos que gera aos
comprometidos.
Art. 17. Pagas todas as prestações
do preço, é lícito ao compromitente requerer a intimação judicial do compromissário para, no prazo de
11 ALVIM. Agostinho. Da compra e venda e da troca.
6. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1961, , p. 267.
12 Idem.
13 Idem.
compromissários-compradores o exercício pelos loteadores da faculdade prevista no art.
1.088 do Código Civil, fonte amarga de decepções e de justificados desesperos, desfazendo, ao cabo de longos anos, a promessa avençada, com a só devolução do dobro do preço pago, são de todos conhecidos, dando azo ao surgimento da lei protetora, neutralizando a aplicação do famigerado dispositvo”.
O citado art. 1.088 do Código Civil de 1916, que foi o germe do contrato preliminar, porque possibilitava a prévia contratação depois convertida em negócio definitivo, assim dispunha:
Art. 1088 – Quando o instrumento público for exigido como prova do contrato, qualquer das partes pode arrepender-se, antes de o assinar, ressarcindo à outra as perdas e danos resultante do arrependimento.
Pode-se, portanto, observar, que referido artigo 1.088 permitia o arrependimento das partes “arrependimento sem direito de arrepender”, na expressão “pitoresca” de Pontes de Mirando (a referência é de Xxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx em sua obra citada), o que motivou a edição do Decreto-Lei nº 58/1937.
É interessante notar, antes de analisarmos as mudanças introduzidas pelo Decreto-Lei nº 58, que XXXXX (1988, p. 54)14, depois de exaustiva análise histórica do contrato, na Europa e especialmente na Itália, faz expressa alusão ao desenvolvimento do fascismo, lembrando que, tal qual ocorre em todos os fenômenos político-sociais, aquele também não deixou no plano das estruturas jurídicas da Itália. Lembra o ilustre professor italiano, que o objetivo explícito, e programa dos responsáveis do estado fascista, foi o de operar uma transformação radical de todo o ordenamento jurídico, que o tornasse conforme à ideologia oficial do regime e à organização das relações sociais e
Lembra, ainda, o autor, que o fascismo não foi fenômeno exclusivo da Itália e que, na Alemanha, já em 1933, Xxxx Xxxxx afirmava que a loucura do individualismo e do liberalismo, daquele momento em diante não tinha mais espaço no direito alemão e que a liberdade e a iniciativa autônoma do indivíduo deveriam submeterem-se aos interesses da comunidade nacional. Assim, de acordo com tal ideologia “o contrato não pode ser expressão da liberdade do indivíduo e meio para a satisfação dos seus interesses particulares, mas deve constituir instrumento para a realização do bem comum da nação alemã”.15
Ora, não se pode olvidar, que o Decreto- Lei nº 58 foi outorgado no auge do Estado Novo e que sua publicação ocorreu no dia 10/12/1937, uma semana após a dissolução dos partidos políticos pelo então presidente Xxxxxxx Xxxxxx (ocorrida no dia 03/12/1937)16 que, como se sabe, era adepto dos regimes totalitários italianos e alemães, tendo, inclusive, implantado uma ditadura do mesmo estilo, no Brasil.
Para DINIZ 17 , citando o verbete do professor Xxxxxx Xxxxxx publicado na Enciclopédia Saraiva, v. 16, p. 453, “a expansão imobiliária, com a crescente valorização da propriedade imóvel, e o processo inflacionário da moeda fizeram com que o art. 1.088 beneficiasse promitentes- vendedores inescrupulosos, pois, fundado no princípio da ampla liberdade contratual, assegurava-lhes um auspicioso meio de enriquecimento sem causa.”
É, portanto, no intuito de equilibrar tal situação, conforme destacou XXXXX (1983, p. 31) 18 que “o artigo 16 do Decreto-Lei nº 58 confere verdadeiro direito real ao compromisso inscrito, proteção que seu art.
22 ampliou aos relativos a imóveis não registrados e, em sucessivas alterações do texto, ambas hipóteses se igualaram”.
É preciso ressaltar, no entanto, que, em 1938, foi editado o Decreto 3.079, de 15/11/1938, que regulamentou o Decreto-Lei
econômicas promovidas por este.
15 Idem, p. 55.
16 XXXXXX, Xxxxxxx. Diário – 1937/1942. São Paulo:
14 XXXXX, Xxxx. O contrato. Coimbra: Livraria Almedina, 1988
Siciliano/FGV. 1995.
17 Op. cit.
18 Idem.
nº 58 e ampliou suas disposições para amparar, também, os imóveis não loteados cujo pagamento fosse realizado em prestações, ou seja, “foram aplicadas ao compromissos de compra e venda em geral”19.
Vale anotar, com Betioli 20 , que o Ordenamento Jurídico atual não possibilitaria tal hipótese, uma vez que os regulamentos ou decretos regulamentares não são leis, no sentido técnico, pois não podem inovar a ordem jurídica, criar deveres ou obrigações. Não podem ultrapassar os limites postos pela norma legal que especificam ou a cuja execução se destinam. Não olvidemos, entretanto, que, conforme acima exposto, estamos nos referindo a um período ditatorial.
Em 09 de novembro de 1939 foi outorgado o Decreto nº 4.857, de 09/11/1939 (denominado de Lei dos Registros Públicos), que, no parágrafo único do art. 244, estabelecia:
Art. 244 ....
Parágrafo único – Quando houver promessa de venda, quer por instrumento público, quer por instrumento particular, será este registrado ou averbado, para que possa ser transcrita a escritura definitiva de compra e venda com fidelidade e minudência.
Em 29/02/1940 foi outorgado o Decreto 5.318, que alterou a redação do citado parágrafo único do art. 244 do Decreto nº 4.857, estabelecendo, a partir de então, que:
Art. 244......
Parágrafo único - quando houver promessa de venda, será este registrado ou xxxxxxxx, para que possa ser a transcrita a escritura definitiva.
A ação de adjudicação compulsória, veio, posteriormente, regulamentada nos artigos 345 e 346 do Código de Processo Civil de 1939.
19 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Promessa de compra e venda e parcelamento do solo urbano. 6. ed. São Paulo: RT, 2002.
Em 11 de março de 1949 foi promulgada a Lei nº 649, que modificou o art. 22 do Decreto-Lei nº 58, ampliando sua abrangência. Assim, a partir da edição da referida Lei 649/49, toda promessa de compra e venda, sem cláusula de arrependimento, passou a configurar-se como Compromisso de Compra e Venda. Segundo DINIZ (2003, p. 567) 21 , com tal lei foi “efetivamente criado o direito real de promessa de venda e alterado o art. 22 do Decreto-Lei nº 58/37”
Isto porque o artigo 1º da citada Lei 649/49, com a modificação introduzida, posteriormente, pela Lei 6.014, de 27/12/1973 (CPC) assim estabelece:
Art. 1º - Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direitos de imóveis não- loteados, cujo preço tenha sido pago no ato de sua constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações, desde que inscritos em qualquer tempo, atribuem aos compromissos direito real, oponível a terceiros e lhes confere o direito de adjudicação compulsória.”
Depois, disciplinando a matéria vieram: a) A Lei nº 4.380, de 21/08/1964
que, em seu art. 69, regulamentou a cessão de direitos relativos a imóveis não loteados como caracterizadores de direito real oponível a terceiro; e,
b) O Decreto-Lei nº 271, de 28/02/1967, disciplinando o loteamento urbano, porém, mantendo as disposições do Decreto-Lei nº 58.
Vale lembrar, que os loteamentos das áreas situadas fora da zona urbana continuaram sujeitando-se à Lei 4.504, de 30/11/1964, também conhecida como Estatuto da Terra.
O Decreto-Lei nº 271 é, na verdade, conforme ensina VIANA 22 , resultado de projeto mais amplo, denominado “Estatuto do Planejamento Integrado Municipal”, da lavra
20 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Introdução ao direito –
lições de propedêutica jurídica. 8. ed. São Paulo: Letras & letras.2002.
21 Idem.
22 Idem.
do professor Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx, que ordenava os loteamentos urbanos em áreas rurais. Tal projeto continha normas para: loteamentos, documentação para loteamentos, registro de loteamentos; desapropriações de áreas rurais e concessão de uso de terrenos, entre outros.
Ainda, segundo VIANA (1983, p. 31)23, não vingou o projeto do professor Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx e o Decreto-Lei nº 271/67 restringiu- se a disciplinar o loteamento urbano, mantendo-se, para os demais, a legislação em vigor.
Em 1969 foi promulgado o Decreto-Lei nº 745/69, que estabeleceu a necessidade de interpelação judicial ou extrajudicial para a caracterização da mora, seja o contrato inscrito ou não.
Com relação a este último diploma, aponta ainda VIANA (1983, p. 32) 24, que a jurisprudência ampliou seu alcance, “impondo a interpelação nos contratos inscritos e nos não inscritos, ficando estes até, de certa forma, melhor situados, com a admissão de purgação da mora em juízo, na fase de contestação da ação de rescisão.”
Em 1973 veio o Código de Processo Civil (Lei nº 6.014/73) que, em seu art. 1.218, manteve a redação dos artigos 345 e 346 do Código de Processo Civil de 1939, pelo menos de modo aparente, conforme conclui VIANA25, pois estabelece o rito sumaríssimo (hoje sumário – arts. 275 a 281) para a adjudicação compulsória.
Em 19 de dezembro de 1979, com a promulgação da Lei nº 6.766, também conhecida como Lei de Parcelamento do Solo Urbano, houve a revogação do Decreto-Lei nº 271/67, e a introdução de significativas alterações no Decreto-Lei nº 58/37, como é o caso do art. 25 da referida Lei 6.766/79, que reconhece eficácia real ao compromisso de compra e venda de imóveis, quando registrados, nos seguintes termos:
Art. 25 – são irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e promessa de cessão, os que atribuam direito à adjudicação compulsaria e, estando registrados,
23 Idem.
24 Idem.
25 Idem, ibidem.
confiram direito real oponível a terceiros.
Entretanto, conforme ensina DINIZ (2002, p. 568)26, citando Xxxxxx Xxxxxx, “a Lei 4.380/64 já havia atribuído eficácia de direito real à promessa de cessão de compromisso, desde que sem cláusula de arrependimento e com imissão de posse, inscrito o contrato no registro imobiliário.”
5. O Instituto no Código Civil de 2002.
Com o advento da Lei nº 10.406, em 10 de janeiro de 2002, denominada “Novo Código Civil”, há, pode-se afirmar, um avanço em relação ao Instituto em exame, uma vez que o legislador do novo código introduziu, no elenco dos direitos reais do art. 1.225, o direito do promitente comprador do imóvel.
E, um pouco adiante, mais especificamente nos artigos 1.417 e 1.418, o legislador de 2002, como que ratificando o disposto na legislação especial e o entendimento doutrinário vigente, estabeleceu:
Art. 1417. Mediante promessa de compra e venda, em que não se pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1418 – O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
É interessante notar, à guisa de comparação, que o parágrafo único do art. 244 do Decreto nº 4.857, de 09 de novembro de 1939, anteriormente citado, continha
26 Idem.
Art. 244 ....
Parágrafo único – Quando houver promessa de venda, quer por instrumento público, que por instrumento particular, será este registrado ou averbado, para que possa ser transcrita a escritura definita de compra e venda com fidelidade e minudência.
Tal dispositivo, entretanto, como se demonstrou, foi modificado com o advento do Decreto nº 5.318, de 29/02/1940, que lhe deu a seguinte nova redação:
Art. 244....
Parágrafo único: Quando houver promessa de venda, será esta inscrita ou averbada para que possa ser transcrita a escritura definitiva.
Anote-se, por oportuno, que a mudança patrocinada pelo legislador de 1940
possibilitou, para alguns, o entendimento de que apenas a escritura pública é apta a produzir os efeitos legalmente reconhecidos à promessa de compra e venda. Tal posição, entretanto, foi equacionada com o advento do Código Civil de 2002, que, tal qual o legislador de 1939, reconhece tais efeitos, tanto ao instrumento público, quanto ao particular.
Entretanto, para ter os efeitos reais reconhecidos e estabelecidos pelo novo Código, deve o Compromisso de Compra e Venda conter os seguintes requisitos: a) o compromissário deve ter cumprido com todas as suas obrigações contratuais; b) haver recusa injustificada do vendedor ou de terceiros em outorgar a escritura; c) inexistir cláusula de arrependimento; e, d) ser registrado no Cartório de Registro de imóveis competente.
6. Natureza
Se, por um lado, foram sanadas, pelo legislador de 2002, as dúvidas quanto á eficácia de direito real do compromisso de
compra e venda, por outro, ainda existe divergência, em nossa doutrina, quanto à natureza jurídica do instituto.
Para Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx 27 o compromisso de compra e venda é “novo direito à categoria dos reias (restrita antes ao de gozo sobre coisas alheias e de garantia). Em face desse direito, fica o proprietário do bem sem a posse, em que é imitido o adquirente, perdendo, além disso, o direito de disposição.” Para Washington de Xxxxxx Xxxxxxxx,
em seu Curso de direito civil – direito das coisas 28, é “um novo direito real, voltado a garantir, efetivamente, aquele que se compromete a adquirir um imóvel. Trata-se, em outras palavras, de direito à aquisição para o futuro.” Para os fins do art. 1.225 é direito real, entretanto a aquisição da propriedade dependerá de novos requisitos específicos. Há, segundo ensina, inovações trazidas pelo Código, pois:
a) o promitente comprador adquire a posse relativa direta antes do pagamento; e,
b) o promitente vendedor permanece na qualidade de possuidor absoluto.
Para Xxxxxx Xxxxxxxxx, citado por Xxxxx Xxxxxx Xxxxx 29 – “é direito real sobre coisa alheia de gozo e fruição, tendo os mesmos caracteres da enfiteuse, da servidão, do usufruto, do uso, da habitação, uma vez que, até que o compromissário-comprador tenha o domínio, já usa e goza do bem, percebendo-lhe os frutos e extraindo-lhe as utilidades, impedindo sua alienação válida a outrem, durante todo o tempo em que estiver pagando as prestações estipuladas.”
Para Xxxxxxx Xxxxx, citado por XXXXX (2002, p. 565) 30 é “direito real sobre coisa alheia sui generis, porque envolve um pouco do direito real de gozo e um pouco do direito real de garantia, reduzindo-se a uma mera limitação do poder de disposição do proprietário que o constitui e que, com seu registro, fica impedido de alienar a coisa.” O direito do compromissário é extenso, se
27 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Contratos civis. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
28 37a. ed. revista e atualizada por Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx (p. 325).
29 Idem, p. 564.
30 Idem.
assemelha ao domínio útil. Tem o compromissário:
a) posse do bem;
b) a faculdade de uso e gozo; e, c) pode trespassar o contrato, embora ainda não seja dono do imóvel que prometeu comprar.
Para DINIZ (2002, p. 565-566)31 “é um
direito real sobre coisa alheia de aquisição”. Segunda a ilustre professora, é óbvio “que não é direito real pleno ou ilimitado, como a propriedade, já que o compromissário- comprador não tem direito real sobre coisa própria, não é ele o dono do bem”. Para a autora, “trata-se de um direito real sobre coisa alheia, mas não se configura como direito real de gozo, apesar do direito do compromissário- comprador ser tão extenso que se assemelha ao domínio útil, já que tem a posse do imóvel, podendo dele usar e gozar. Também não é satisfatória sua inclusão nos direitos reais de garantia, destinado, tão somente , a assegurar a prestação prometida no contrato, pois os direitos reais de garantia têm outra finalidade.
P. ex., o ônus real de garantia, como o hipotecário, assegura o inadimplemento da obrigação, desempenhando um papel acessório.”
Há, ainda, aqueles que, embasados na doutrina de Xxxxxxx e Xxxxxx sustentam que é como o domínio, nos termos do Código Francês promesse de vente vaut vente.
7. O Compromisso de Compra e Venda como Contrato Preliminar.
Ainda há, em nossa doutrina, quem sustente que o Compromisso de Compra e Xxxxx é contrato preliminar, portanto sujeito às regras dos arts. 462 a 466 do Código Civil de 2002.
Tal posição, entretanto, hoje minoritária, sucumbe, a nosso ver, diante da própria caracterização de contrato preliminar definida pelo legislador de 2002.
É esclarecedora sobre o tema a posição de XXXXX (2002, p. 570) 32 , quando xxxxxx, com fundamento na lição de Xxxxxxx Xxxxx que “o compromisso ou promessa irrevogável não é um contrato preliminar porque a adjudicação compulsória só seria possível nas
obrigações de dar, e o contrato preliminar gera tão somente uma obrigação de fazer o contrato definitivo, nem o juiz teria o condão de converter tal obrigação de celebrar contrato em obrigação de dar ou entregar alguma coisa. Se ordena o compromisso a adjudicação do imóvel ao compromissário é porque está a dar, coativamente, execução específica à obrigação de dar que nasce do contrato de compra e venda. Daí a ser o compromisso uma nova modalidade de compra e venda, desaparecendo do cenário jurídico a promessa de compra e venda como contrato preliminar.
Ainda, xxxxxxx XXXXX (1995, p. 246) 33 , “de negócio jurídico que tivesse a natureza de contrato preliminar, não pode nascer direito real.”
Tem-se, portanto, que o Compromisso de Compra e Xxxxx era pré-contrato até ser modificado pelas leis especiais. Hoje, entretanto, com a promulgação do novo Código, tal caracterização está superada.
É interessante notar, ainda com fundamento na doutrina de XXXXX (1995, p. 241)34, que o contrato preliminar de compra e venda gera a obrigação de contrair o contrato definitivo e contém implicitamente a faculdade de arrependimento. A rigor, conclui o mestre Xxxxxxx, “a parte que se recuse a concluir o contrato definitivo não está a usar, propriamente falando de uma faculdade de se arrepender, salvo se estipulou arras penitenciais”. A recusa de contratar é inadimplemento de obrigação que se resolve em perdas e danos.
Prossegue, o renomado autor, afirmando que a “promessa de venda como contrato preliminar propriamente dito desapareceu praticamente do comércio jurídico devido à superioridade manifesta do outro negócio jurídico que continua designado pelo mesmo nome, mas é nitidamente distinto, bem como em razão da tendência para a ele assimilar toda promessa que não contenha o pacto de arras penitenciais.” Seria melhor, conclui, denominar esse negócio jurídico pela expressão compromisso de venda. Concluído o compromisso ele é irretratável. Levando-se ao Registro de Imóveis, impede-se que o bem seja alienado a terceiro. Imite-se na posse do
31 Idem.
32 Idem.
33 Idem.
34 Idem.
imóvel e se comporta como se fora seu dono. Preenchidas as condições que o habilitam a pedir o a escritura, obtém-se, através de sentença, se a outra parte não quiser cumprir.
Para o mesmo XXXXX (1995, p. 243)35 a possibilidade de substituir o contrato definitivo por uma sentença; e, a atribuição ao promitente comprador de um direito real, impedem que se denomine tal negócio jurídico de contrato propriamente preliminar ou promessa de venda. É, na verdade, compromisso de venda. O consentimento já foi dado – portanto, as partes se obrigam a repeti- lo no instrumento definitivo, na escritura pública indispensável.
Concluímos, com o mestre xxxxxx que: se a promessa irrevogável de venda fosse um contrato preliminar propriamente dito, não poderia o legislador atribuir natureza real ao direito do compromissário, restrito que seria à pretensão de exigir da outra parte a celebração do contrato definitivo, cuja inexecução daria lugar, logicamente a perdas e danos.
Outra polêmica, surgida com o advento do novo Código Civil, que parece também já estar superada, é a de que a escritura pública seria essencial à validade do Compromisso de Compra e Venda.
Aqueles que se posicionaram favoravelmente à ideia adotaram como pressuposto a regra do art. 108 do novo Código Civil que estabelece:
Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Sustentam, portanto, os defensores da ideia, a tese, segundo a qual, o instrumento particular daria margem a fraude, daí a necessidade da escritura pública.
Entretanto, conforme vem sustentando a boa doutrina, ao mesmo tempo em que o art.
108 estabelece a necessidade da escritura pública para determinados negócios jurídicos, contém, em seu corpo, a expressão: “ ... não
35 Idem.
dispondo a lei em contrário...”. Ora, o artigo 1.417, que disciplina o direito do compromissário-comprador estabelece, de modo cristalino, que, “mediante promessa de compra e venda, em que não se pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.”. Parece, portanto, restar claro, que o legislador de 2002 não privilegiou, nem o instrumento público, nem o particular, sendo ambos, no sistema do código, hábeis para a aquisição do novo direito real de que trata o inciso VII do art. 1.225.
8. Tratamento Jurisprudencial
Embora, com a promulgação do novo Código Civil pareçam estar superadas as grandes controvérsias nascidas em torno do Compromisso de Compra e Venda, é importante salientar, entretanto, que nossos tribunais tiveram papel decisivo no estabelecimento de alguns princípios que acabaram sendo adotados pelo legislador de 2002.
Destacam-se, portanto, as seguintes decisões de nossos tribunais sobre o tema :
a) Súmulas do Supremo Tribunal Federal:
Súmula 166 – é inadmissível o arrependimento no compromisso de compra e venda sujeito ao regime do DL 58, de 10/12/1937.
Súmula 167 – não se aplica o aplica o regime do DL 58, de 10/12/1937, ao compromisso de compra e venda não inscrito, salvo se o promitente vendedor se obrigou a efetuar tal registro.
Súmula 168 – para os efeitos do DL 58, de 10/12/1937, admite-se a inscrição imobiliária do compromisso de compra e venda no curso da ação.
Súmula 412 – no compromisso de compra e venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal por quem o deu, ou a sua restituição em dobro, por quem o recebeu, exclui indenização maior a título de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os encargos do processo.
Súmula 413 – o compromisso de compra e venda de imóveis, ainda que não loteados, dá direito à execução compulsória, quando reunidos os requisitos legais.
b) Súmulas do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 76 – a falta de registro do compromisso de compra e venda do imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor.
Súmula 84 – é inadmissível a oposição de embargos de terceiros fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro.
Súmula 239 – o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
9. Conclusão
É pacífico o entendimento de que o homem possui, desde os primórdios da civilização, duas preocupações básicas: a subsistência e a fixação da moradia.
Portanto, estando esta última, entre as principais preocupações do homem, é possível afirmar que a propriedade, além de ser uma realidade, é fator importante na organização da estrutura social vigente, nas diferentes épocas e lugares.
Observa-se, entretanto, que essa constante preocupação do homem em fixar sua moradia, foi, em certo sentido, abalada, pois, à medida que o homem desenvolveu algumas técnicas agrícolas e, mais recentemente, industriais, que lhe possibilitaram melhorar suas condições de subsistência, precisou conviver, contrapartida, com o rápido aumento da população, que, através dos tempos, se instala densamente em pequenas áreas, possibilitando, com isto a formação de aglomerados populacionais – as cidades.
No Brasil, esse crescimento populacional, especialmente nas grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, ocorreu, de forma considerável, nas quatro últimas décadas do século XX, embora os autores que se ocuparam do tema apontem o surgimento das indústrias, nas primeiras
décadas do mesmo século XX, como a principal causa desse crescimento.
Veja-se, à guisa de comparação, que, no último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, realizado em
36 Rio de Janeiro: Xxxxx Xxxxx Editor, 2004, p. 276.
2000, a cidade do Rio de Janeiro possui 4.766.636 habitantes, com 1.802.347 domicílios particulares permanentes.
Foi, portanto, no cenário acima relatado, que o Código Civil de 1916 foi promulgado. Assim, parece razoável supor, que o legislador de 1916 não tinha, como de fato não teve, preocupação com o estabelecimento de regras que disciplinassem as aquisições de imóveis, para pagamento a prazo.
Entretanto, com o advento das primeiras indústrias e o crescimento populacional experimentado, não somente pela cidade do Rio de Janeiro, mas também e principalmente, por São Paulo, houve a necessidade de estabelecer-se uma legislação que, no mínimo, pudesse colocar um freio nas pessoas e companhias menos idôneas, conforme a lição de Xxxxxxxxx Xxxxx acima citado, que vislumbravam, no mercado imobiliário, a possibilidade de enriquecimento desmedido, utilizando-se, para tal, da faculdade que lhes concedia o citado art. 1.088 do Código Civil de 1916, ou seja, “deixar de entregar os lotes, comprados em prestações, durante anos e anos, preferindo, em lugar disso, devolver as quantias recebidas e sujeitarem-se às perdas danos”.
Coube, portanto, como demonstrado, à legislação especial as primeiras tentativas de regulamentação dos negócios jurídicos que têm por objeto a compra de imóveis comprados em prestações. Vimos, entretanto, que, apesar da tentativa do legislador de 1937 em estabelecer regras disciplinando a comercialização de imóveis loteados, norma posteriormente ampliada para os imóveis não loteados, desde que ausente a possibilidade de arrependimento, subsistiram, no mercado
imobiliário, as tentativas para caracterização do compromisso de compra e venda como obrigação de fazer, que se resolve em perdas e danos, com a consequente desvantagem do compromissário comprador. Daí a edição das sucessivas leis acima apontadas, ora visando o aprimoramento e o preenchimento das lacunas deixadas pela lei anterior, ora regulamentando as novas situações vividas pela sociedade, em virtude do crescente desenvolvimento de algumas cidades brasileiras.
Vimos, também, que, nesse período, foi de fundamental importância a atuação de nossos tribunais, especialmente no que tange à fixação de entendimentos, como os exarados nas súmulas supra citadas, que contribuíram, de maneira decisiva para dar maior segurança aos compromissários compradores de imóveis para pagamento em prestações.
Chegamos, portanto, ao século XXI e às mudanças introduzidas ao instituto pelo novo Código Civil de 2002, especialmente as introduzidas pelos artigos 1.225, 1.417 e 1.418, as quais, se não trouxeram, em si, grandes novidades (a jurisprudência e a doutrina pátrias já haviam fixado os entendimentos ali exarados), serviram para consolidá-los e fixá-los, em lei, fato este que possibilita maior segurança à compra e venda de imóveis para pagamento a prazo, realizada através de compromisso de compra e venda.
Assim, concluindo, podemos afirmar que, relativamente ao compromisso de compra e venda de imóveis para pagamento em prestações, houve avanço do novo Código Civil de 2002, tanto em relação ao Código Civil de 1916, quanto em relação à legislação especial que tratou da matéria.
REFERÊNCIAS
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