SUMÁRIO
1. O instrumento contratual aqui em apreço é qualificável, de forma consensual, como uma prestação de serviços estabelecida entre contraentes públicos, de índole interadministrativa, tendo por objeto a gestão do programa de aquisição de navios seis navios de patrulha oceânicos, da classe “Viana do Castelo”, destinados à Marinha Portuguesa, sendo indubitavelmente um contrato de prestação de serviços diretamente relacionado com esses equipamentos militares.
2. Na verdade, neste mesmo contrato o Ministério da Defesa apresenta-se a contratar, numa prestação de serviços para gestão da aquisição de equipamentos militares, com uma empresa de capitais públicos que é do seu domínio.
3. O regime jurídico da contratação pública nos setores da defesa e da segurança encontra- se atravessado de especificidades próprias que estão bem salientadas no percurso histórico legislativo neste domínio, tanto ao nível nacional como europeu (comunitário).
4. Assim, ao nível do direito europeu, há que considerar a Diretiva 2009/81/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, relativa à coordenação dos procedimentos de adjudicação de contratos pelas entidades ou entidades adjudicantes nos domínios da defesa e segurança, a qual teve como objetivo fundamental o estabelecimento de regras de contratação específicas para os setores de defesa e segurança no sentido de abrir o mercado de defesa na União Europeia (UE) sem colocar em risco os interesses legítimos de segurança dos seus Estados-Membros.
5. Esta Diretiva aplica-se, em princípio, a todos os contratos de aquisição de equipamento militar, obras e serviços e a aquisições sensíveis com fins de segurança e que envolvam informações classificadas, sabendo, no entanto, que os Estados-Membros têm o direito, ao abrigo do Art.º 346.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), de isentar determinados contratos do campo de aplicação da mesma Diretiva quando tal seja estritamente necessário para proteger os seus interesses essenciais de segurança.
6. Depois, ao nível nacional o cotejo do regime do Decreto-Lei n.º 104/2011) na sua conjugação com a Lei n.º 49/2009 de 5 de agosto, que rege o acesso ao comércio ou à industria de bens e serviços militares, por um lado, com o regime jurídico previsto no Código dos Contratos Públicos (CCP), pelo outro, permite divisar significativas diferenças no que concerne à margem de livre apreciação de que gozam, no setor da defesa, as entidades adjudicantes na prossecução do interesse público no seu equilíbrio com a garantia da liberdade de concorrência e os princípios do mercado.
7. Ora, é precisamente esse regime legal específico que permite essa latitude de conformação ao interesse público da defesa e da segurança, tanto por via do acionamento do
mecanismo excecional do Art.º 346.º do TFUE como através dos meios previstos no Decreto-Lei n.º 104/2011, que justificará, na ótica do tribunal recorrido, que aqui se acolhe, a exclusão como tal, de forma isolada, no presente caso, da contratação in-house, sem que o mencionado mecanismo de exceção do Art.º 346.º do TFUE seja também acionado.
8. Sendo neste enquadramento legal desenvolvido no texto da fundamentação deste acórdão, aqui sumariado, sem que tenha sido prevista (inicial ou subsequentemente), de forma expressa, a contratação in-house, que se percebe que não faz sentido invocar o mecanismo da especialidade ou da subsidiariedade, como faz a recorrente (com a menção a essa exceção ou contratação prevista no Art.º 5.º-A, n.ºs 1 e 5, do CCP), tanto numa articulação do sistema de normas aqui em jogo como também por via do apelo a uma composição entre os princípios de direito aqui convocáveis.
9. Assim, não é a contratação in-house que se desenha aqui como o regime-regra e a liberdade de auto-regulação da administração pública, neste sector da segurança e defesa, tão naturalmente fechado à concorrência, não deixa de se poder concretizar com amplitude adequada, através dos meios específicos (Decreto-Lei n.º 104/2011) e até excecionais (Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE) que o legislador oferece neste mesmo domínio da atuação pública.
10. Nesse sentido, as situações de exceção in-house, neste domínio da contratação pública na área da defesa e da segurança, são absorvidas do ponto de vista jurídico por aqueles meios específicos expressamente consagrados legislativamente (Decreto-Lei n.º 104/2011 e Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE), não fazendo sentido falar no funcionamento de um princípio de supletividade ou de especialidade com o regime geral da contratação pública.
11. Por outro lado, a evidente componente remuneratória presente no contrato em análise retira, desde logo, este específico instrumento contratual, do domínio da contratação excluída, tal como consente a própria recorrente ao se referir ao inciso normativo final “e que não prevejam uma remuneração”, presente no n.º 2 do Art.º 5.º do CCP e no n.º 6 do Art.º 1.º da Diretiva 2014/24/UE sobre contratação pública por aquele transposta.
12. Pelo que não se poderá concluir, como faz a recorrente, que a formação deste contrato não se encontrava submetida, à partida, ao regime especial de contratação previsto pelo Decreto-Lei n.º 104/2011.
13. Ora, sabemos que, neste caso concreto, o Governo português não invocou, na sua Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2021, descrita no texto do acórdão aqui sumariado, de forma expressa ou com a invocação de qualquer justificação, o enquadramento do contrato objeto de fiscalização prévia na exceção prevista no Art.º 346.º do TFUE.
14. Pode, assim, defender-se que a contratação in-house é um regime de exceção face a situações em que a contratação é feita dentro de casa, quando a Administração Pública não tem necessidade de recorrer ao mercado para suprir as suas necessidades. Essa avaliação terá que ser exigente de forma a não corromper o princípio da concorrência, pilar da contratação pública.
15. Trata-se de uma derrogação excecional das regras de contratação pública gerais e não das regras especiais, derivadas, designadamente do mencionado Decreto-Lei n.º 104/2011, e, por isso, a sua interpretação deve ser restrita de forma a preservar o princípio da concorrência.
16. Estamos a falar de um regime específico de contratação pública na defesa e segurança que concede uma grande amplitude e flexibilidade à entidade pública na escolha dos seus contratantes e também nos procedimentos de contratação aplicáveis (regime do Decreto-Lei n.º 104/2011 que transpôs a Diretiva 2009/81/CE) ou mesmo no afastamento total das especiais regras procedimentais e concorrenciais com a invocação do mecanismo excecional consagrado na alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do TFUE.
17. Mecanismo excecional, aliás, que a entidade recorrente não deixa de considerar que se encontraria aqui preenchido na situação em presença e que o Governo português não pretendeu utilizar expressamente.
18. É neste contexto que se confirma o acerto na recusa de visto determinada pelo tribunal a quo que assentou na premissa de preterição do procedimento legalmente exigido, isto porque qualquer contratação direta estabelecida entre entidades públicas, neste específico sector, deve ser articulada obrigatoriamente através da invocação dos meios especiais excecionais aqui convocáveis e que inexistem na contratação pública em geral.
19. Pelo que a invocação dessa exceção, no domínio da defesa e da segurança, desenquadrada dos meios específicos (Decreto-Lei n.º 104/2011) e até excecionais (Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE) que o legislador oferece neste mesmo domínio da atuação pública, não deixa de violar os procedimentos previstos no mesmo Decreto-Lei n.º 104/2011, sendo essa violação fulminada de nulidade, nos termos do disposto no Art.º 161.º, n.º 1, alínea l), do Código de Procedimento Administrativo, para que remete o n.º 2 do Art.º 284.º do CCP, aplicável ex vi do estabelecido no Art.º 65.º, n.º 1, do Decreto-Lei referenciado.
20. O conceito de razões imperiosas de interesse geral de que fala o citado Art.º 60.º, n.º 3, da Diretiva 2009/81/CE, tem de ser equacionado com a situação em concreto e com os meios jurídicos e procedimentais que se encontram ou encontravam disponíveis à entidade pública em causa.
21. E, na verdade, foi o Governo e a entidade fiscalizada que optaram pela integração do contrato em causa no regime-regra do Decreto-Lei n.º 104/2011, não tendo sido acionados os
mecanismos de salvaguarda do interesse público previstos neste setor da defesa e da segurança, tanto os procedimentos específicos do Decreto-Lei n.º 104/2011 como a cláusula excecional do Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE.
22. O que faria todo o sentido caso se confirme a afirmação da própria recorrente que alega “que o contrato se traduz em questões sensíveis de segurança e defesa nacional centrais para a soberania do Estado Português”.
ACÓRDÃO Nº
~42
27
2022
1.ª Secção – PL Data: 18/10/2022
Recurso Ordinário: 6/2022 Processo: 139/2022
RELATOR: Xxxx Xxxxxx X. X. Coelho
Não Transitado
Acordam os Juízes do Tribunal de Contas, em Plenário da 1.ª Secção:
I. RELATÓRIO
1. A Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, em representação do Ministério da Defesa Nacional, interpôs recurso ordinário, para o Plenário da 1.ª Secção, do Ac. n.º 18/2022 – 1.ª S/SS, de 3/6, que recusou o visto ao «Contrato Interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal Defence, S.A. para a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (NPO) da Classe “Viana do Castelo” Destinados à Marinha Portuguesa», celebrado em 28/1/2022 e com prazo de execução entre 2022 e 2029, tendo o valor máximo de
€ 4.245.000,00 (quatro milhões duzentos e quarenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
2. Esta recusa de visto fundamentou-se, em síntese, na preterição total do procedimento legalmente exigido para a celebração do contrato em apreço, viciando de nulidade o ato praticado, nos termos do disposto no Art.º 161.º, n.º 1, alínea l), do Código do Procedimento Administrativo (CPA), para que remete o n.º 2 do Art.º 284.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), aplicável ex vi do estabelecido no Art.º 65.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 104/2011 de 6/11. Mais foi entendido que, por essa via, esse contrato sob apreciação se encontrava afetado de nulidade, o que é fundamento absoluto de recusa de visto – cfr. Art.º 44.º, n.º 3, alínea a) e n.º 4 (a contrario) da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC) -, sendo ainda considerado que a ilegalidade verificada tinha inegável influência no resultado financeiro do contrato.
3. A recorrente Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) apresentou as alegações constantes dos autos, que aqui se dão por reproduzidas, onde formula as seguintes conclusões:
I. O douto Acórdão recorrido, ao recusar o Visto ao contrato da ora Recorrente, relativo ao processo de Fiscalização Prévia n.º 139/2022, não fez a exacta interpretação do regime legal aplicável à celebração do "Contrato interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal S.A. para a gestão do programa de aquisição de seis navios de patrulha oceânicos (NPO) da classe "Viana do Castelo" destinados à Marinha Portuguesa".
II. O “Contrato” encontra-se objetivamente submetido ao regime inscrito no Decreto-Lei n.º 104/2011.
III. Em função da dimensão substancialmente delegatória do Contrato, este deve ser entendido como desprovido de interesse concorrencial e, ex vi o artigo 14.º, n.º 1 a contrario desse diploma, estando dele objetivamente excluído.
IV. No domínio da defesa, o interesse público assume uma dimensão predominantemente nacional que se manifesta, designadamente, na obrigação de salvaguardar a segurança da informação classificada e de garantir a segurança no fornecimento os quais são subsumíveis à noção de interesses essenciais de segurança.
V. A alínea b), do n.º 1, do art.º 34C.º, do TFUE, constitui, em relação às matérias e nos casos a que expressamente se refere, uma derrogação do conjunto das disposições do Tratado, sejam estas de natureza processual ou material, sendo irrelevante que as medidas nacionais alterem as condições de concorrência no mercado interno, caso se trate de produtos destinados a fins especificamente militares.
VI. O artigo 34C.º, n.º 1, alínea b) do TFUE permite a aquisição de equipamento de natureza e finalidade puramente militares, vulgarmente designado como material militar stricto sensu (hard defence material ou military harware), bem como as atividades com este diretamente relacionadas – atividades diretamente relacionadas, por exemplo, as atividades de assistência técnica ou de formação dos operadores de determinado equipamento militar.
VII. O legislador europeu acolheu, nas diretivas sobre equipamento militar, as manifestações específicas do interesse público, de forma a proporcionar aos Estados-Membros a possibilidade de os acautelar sem terem que recorrer, para tal, à alínea b), do n.º 1, do artigo 34C.º do TFUE.
VIII.O princípio da prossecução do interesse público assume primazia face ao princípio da concorrência no âmbito da contratação no setor da defesa.
IX. Estando prevista uma disciplina própria para a formação dos contratos públicos previstos no Decreto-Lei n.º 104/2011, e havendo uma relação de especialidade entre este diploma legal e o CCP, terá que obrigatoriamente se aplicar aquela disciplina, impondo-se o CCP, nos termos do artigo 73.º, do Decreto-Lei n.º 104/2011, a tudo o que ali não esteja expressamente regulado.
X. A Diretiva n.º 2009/81/CE recorda, ao longo de diversas disposições, tais como o artigo 25.º, 1.º parágrafo ou o artigo 47.º, n.º 1, que o regime de contratação pública civil se mostra aplicável subsidariamente.
XI. De acordo com o princípio da interpretação conforme ao Direito da União Europeia (também designado por princípio do efeito indirecto), o órgão jurisdicional nacional é obrigado a interpretar a respectiva lei nacional, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva.
XII. O Decreto-Lei n.º 104/2011 definiu diferentes tipos de procedimentos pré-contratuais com uma característica comum: a da existência obrigatória de uma fase de qualificação dos candidatos.
XIII. A excepção in-house não é um procedimento pelo que não pode, por natureza, estar prevista no Decreto- Lei n.º 104/2011.
XIV.A excepção in-house foi erguida pelo TJUE, prima facie, como princípio geral de direito e apenas mais tarde veio a ser materializada nas diretivas sobre contratação pública de 2014.
XV. Nos termos em que foi modelada pelo TJUE e no quadro do Direito da União Europeia, a excepção in-house tem uma vocação geral, não contrariada pelas especialidades da contratação pública no domínio da segurança e da defesa.
XVI. A excepção ou contratação in-house expressa uma cedência normativamente justificada em que o “perímetro da concorrência” cede por se reconhecer que a operação in-house é, em primeira linha, uma tradução do princípio da liberdade de auto-organização do sector público.
XVII. No caso sub judice ficou demonstrado o cumprimento, pela entidade fiscalizada, da obediência aos critérios cumulativos previstos no artigo 5.º-A, n.ºs 1 e 5 do CCP.
XVIII. O entendimento do Tribunal de Contas vertido no acórdão sob recurso, ao proibir a aplicação da excepção ou contratação in-house no setor da defesa, e ao exigir o consequente lançamento de procedimentos pré- contratuais para a gestão e construção de navios NPO, coloca seriamente em causa a segurança nacional e a defesa do Estado Português e é gravemente lesiva do interesse público.
XIX. A eventual abertura de procedimento concursal para a aquisição de NPO é apta a por em causa a segurança nacional e a soberania do Estado Português, tornando legítima a existência de razões imperiosas de interesse geral que devem ser ponderadas pelo Tribunal de Contas em ordem a conceder o visto ao “Contrato”.
Termos em que, face ao exposto e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se o Acórdão recorrido, e, consequentemente, ser concedido o Visto ao contrato sob fiscalização, como é de Direito e Justiça.
4. No recurso foi, ainda, apresentado um requerimento dirigido ao Xx.xx Presidente deste Tribunal com vista ao alargamento da discussão e votação da deliberação aos restantes juízes, nos termos do n.º 2 do Art.º 86.º da LOPTC, o qual veio a ser indeferido por ser legalmente impossível, nos moldes melhor explicitados no despacho de fls. 510 dos autos.
5. Posteriormente, ao abrigo do disposto no Art.º 99.º, nº 1, da LOPTC, o Ministério Público emitiu parecer fundamentado, pugnando, em síntese, no sentido da não procedência do recurso, dizendo que o tribunal recorrido demonstrou as razões que o levaram a não admitir a contratação in-house em matéria de defesa e segurança, dando a conhecer o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de apoio, e as razões que levaram à recusa do visto: a preterição total do procedimento legalmente exigido para a celebração do contrato em apreço, fulminando de nulidade o ato praticado.
C. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II. QUESTÕES A DECIDIR
7. Conforme doutrina e jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas no requerimento de recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. Art.ºs 97.º, n.º 1 e 100.º, n.º 2, da LOPTC, e Art.ºs 635.º, n.ºs 3 e 5, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil – CPCivil -, estes ex vi Art.º 80.º da mesma LOPTC).
8. Tendo em conta este contexto normativo e o teor das conclusões efetuadas pela recorrente, são as questões em apreciação, aqui colocadas na lógica correta da sua apreciação sequencial:
. (i) do erro de julgamento na aplicação do direito aos factos, uma vez que a recusa do visto foi escorada numa errada aplicação e interpretação da lei e do direito aplicável, isto porque o contrato em apreço se apresenta excluído da contratação concorrencial, desde logo porque não se encontra submetido, objetivamente, ao regime-regra que deriva do Decreto-Lei n.º 104/2011 de 6/10, ou, ainda, porque a exceção in-house, aqui convocável em termos gerais, assim o determina;
. (ii) da questão de saber se no domínio da defesa o princípio da prossecução do interesse público assume primazia face ao princípio da concorrência no âmbito da contratação, porque o legislador europeu acolheu, nas Diretivas sobre equipamento militar, as manifestações
específicas desse interesse público, de forma a proporcionar aos Estados-Membros a possibilidade de os acautelar sem terem de recorrer, para tal, à alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE);
. (iii) da outra questão de saber se será de aplicar a exceção ou contratação in-house prevista no Art.º 5.º-A, n.ºs 1 e 5, do CCP ao contrato cujo visto foi recusado, porque aquela exceção in-house não coloca em causa as especialidades da contratação pública no domínio da segurança e da defesa; e
. (iv) por último, se se pode concluir que o entendimento do tribunal recorrido, ao proibir a aplicação da exceção ou contratação in-house no setor da defesa, e ao exigir o consequente lançamento de procedimentos pré-contratuais neste contrato de gestão e construção de navios NPO, coloca seriamente em causa a segurança nacional e a defesa do Estado Português, sendo também gravemente lesivo do interesse público.
III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1 DE FACTO
9. Na decisão recorrida foi dada por assente, por provada, a seguinte factualidade, não impugnada nestes autos de recurso, que se mantém:
A. Do procedimento pré-contratual
a. Através da Resolução n.º 72/2021, de 20/05/2021 (publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 111, de 09/06/2021, p. 28 e ss.), o Conselho de Ministros decidiu, além do mais:
“4 — Autorizar o Ministério da Defesa Nacional a celebrar um contrato com a IdD — Portugal Defence, S. A., ao abrigo do disposto nos artigos 5.º-A, 33C.º e 338.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, na sua redação atual, e do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, tendo por objeto a prestação de serviços de gestão do programa em causa, para a totalidade da duração do mesmo, tal como definida no anexo I à presente resolução, acrescida do prazo de garantia do último navio, incluindo as atividades associadas à condução dos procedimentos de contratação que se mostrem necessários no âmbito do programa, designadamente os respeitantes à construção, à revisão do projeto de engenharia e ao fornecimento dos bens e serviços de apoio logístico para sustentar o ciclo de vida dos navios, até ao montante máximo de 1,5 % do valor da componente do programa a que se refere a alínea a) do n.º 1, o qual está incluído no montante a que se refere a alínea b) do n.º 1 tal como definido no anexo II, devendo o mesmo obedecer aos termos de referência constantes do anexo III à presente resolução e da qual faz parte integrante.
5 — Determinar que o acompanhamento e fiscalização da execução do contrato referido no número anterior são assegurados por uma equipa constituída de representantes do Ministério da Defesa Nacional, sem prejuízo do disposto no artigo 290.º-A do CCP.
(…)
7 — Delegar, com a faculdade de subdelegação, no membro do Governo responsável pela área da defesa nacional, a competência para a prática de todos os atos subsequentes a realizar no âmbito da presente resolução.”
b. No anexo III à referida Resolução foi determinado que “o contrato a celebrar entre o MDN e a IdD, S. A., cumpra as seguintes disposições:
1 — O objeto do contrato a celebrar consistirá na prestação de serviços de gestão do programa em causa, tal como definido no n.º 3 da presente resolução, devendo respeitar o âmbito do Programa estabelecido na documentação atinente, a apresentar pela Marinha Portuguesa (Marinha).
2 — A remuneração da IdD, S. A., deve incluir três partes alíquotas, não podendo ultrapassar, no seu conjunto, o montante máximo de 1,5 % do valor da componente do Programa a que se refere a alínea a) do n.º 1 da presente resolução, melhor detalhada no anexo II, assim consideradas:
a)Uma associada aos custos de arranque da capacidade de gestão do programa, com o valor previsional de € 000 000;
b) Uma associada ao ritmo de execução da prestação dos serviços de gestão do programa, para os anos de 2021 até 2031 (atendendo ao período de garantia de dois anos), com o valor previsional médio anual de € 304 8C8, correspondente a um montante global de € 3 353 550 para a totalidade do período do programa;
c) Uma componente final indexada à performance dos serviços prestados, medida em função do cumprimento dos prazos que vierem a ser definidos no contrato a celebrar e dos resultados a alcançar, designadamente quanto aos preços e prazos de entrega dos navios, com o valor previsional de € C3C 750.
3 — A IdD, S. A., fica dispensada da prestação de cauções contratuais.
4 — A Marinha apoiará o Ministério da Defesa Nacional no âmbito do contrato a celebrar com a IdD, S. A., e, através da Equipa de Acompanhamento e Fiscalização (EAF), a que se refere o n.º C da presente resolução, apoiará o MDN na sua função de acompanhamento e fiscalização deste contrato, designadamente quanto à preparação e condução dos procedimentos a serem realizados pela IdD, S. A., até à respetiva adjudicação.
5 — A Marinha, através da EAF, apoiará ainda o MDN na função de acompanhamento e fiscalização das construções, durante a fase de execução do respetivo contrato e até à assinatura do auto de receção definitivo do último navio, incluindo o dever de informação à IdD, S. A., de todos os elementos necessários à gestão do programa, bem como de outros aspetos que se venham a revelar pertinentes.
C — No contrato a celebrar será ainda previsto o estabelecimento dos mecanismos concretos de colaboração entre a IdD, S. A., a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, a Marinha e a EAF, relativos à partilha de informação entre estas entidades de todos os elementos necessários à gestão e fiscalização da execução do programa, bem como de outros aspetos que se venham a revelar pertinentes.
7 — Todas as faturas no âmbito do programa deverão ser emitidas pelo(s) fornecedor(es) em nome do beneficiário, a Marinha, que procederá ao respetivo pagamento.
8 — A IdD, S. A., deve explorar, na máxima extensão possível e no respeito pelo quadro legal aplicável, a participação da indústria nacional no programa de aquisição em causa, tendo em conta designadamente os requisitos de segurança de abastecimento e de segurança da informação, que vierem a ser definidos, quer na fase de construção dos navios, quer na perspetiva da fase de manutenção dos navios durante o seu ciclo de vida, e maximizar as parcerias internacionais que se mostrem ajustadas, nomeadamente tendo em conta a participação portuguesa em projetos cooperativos no âmbito da União Europeia ou da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
9 — Todos os contratos outorgados em representação do MDN, em execução do Programa de Aquisição dos seis NPO, serão remetidos a «visto prévio» ou a «declaração de conformidade» pelo Tribunal de Contas, nos termos da lei.”
c. Em 22/07/2021, Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional proferiu o seguinte despacho: “(…) à DGRDN, para que com caráter de urgência diligencie pelo início dos trabalhos tendentes à elaboração do contrato a celebrar entre o MDN e a IdD”.
d. Através do Despacho n.º 7325/2021, de 09/07/2021 (publicado no Diário da República, 2.ª série, parte C, n.º 142, de 23/07/2021, p. 30), Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional delegou “no diretor-geral de Recursos da Defesa Nacional, Dr. Xxxxx Xxxxxx Xxxx Xxxxx Xxxxxxx, com faculdade de subdelegação, a competência para a prática de todos os atos necessários à elaboração da minuta do contrato a celebrar entre o MDN e a IdD, incluindo a designação de uma equipa de negociação do contrato, constituída por representantes da Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, bem como por representantes da Marinha Portuguesa a indicar pelo Chefe do Estado-Maior da Armada”.
e. Através do Despacho n.º 23/DIR/2021, de 26/07/2021 (nessa data assinado, apesar de datado de 23/06/2021), Sua Excelência o Senhor Diretor-Geral dos Recursos da Defesa Nacional determinou a composição da “Equipa de Negociação do contrato a celebrar entre o Ministério da Defesa Nacional (MDN) e a IdD – Portugal Defence, SA (IdD)”, mais tendo determinado que:
“2. A Equipa de Negociação deve preparar uma proposta de minuta de contrato, contendo todos os termos e condições do contrato a celebrar entre o MDN e a IdD, abrangendo quer o clausulado contratual quer as especificações técnicas a cumprir, a qual deverá ser remetida à minha apreciação, previamente ao seu envio à IdD para efeitos de negociação.
3 – Findo o processo negocial, a minuta de contrato daí resultante será remetida, nos termos do definido pelo Despacho n.º 7325/2021, de 9 de julho, a Sua Excelência o Ministro da Defesa Nacional para efeitos de aprovação, acompanhada do relatório final da Equipa de Negociação.”.
f. Por ofício datado de 14/09/2021, Sua Excelência o Senhor Diretor-Geral dos Recursos da Defesa Nacional convidou “a IdD-Portugal Defence (IdD) à negociação da proposta de minuta do contrato a celebrar, em anexo, para a aquisição de seis NPO da Classe "Viana do Castelo".
g. Por ofício datado de 12/11/2021, Sua Excelência o Senhor Diretor-Geral dos Recursos da Defesa Nacional envio a minuta de contrato negociada entre as partes ao Gabinete de Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional, para efeitos de aprovação.
h. Por despacho proferido em 19/12/2021, Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional aprovou a minuta de contrato a celebrar entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD – Portugal Defence, S.A.
i. Através do Despacho n.º 1158/2022, de 21/01/2022 (publicado no Diário da República, 2.ª série, parte C, n.º 20, de 28/01/2022, p. 47), Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional delegou, com faculdade de subdelegação, “no diretor-geral de Recursos da Defesa Nacional, Dr. Xxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxx Xxxxxxx, o exercício das seguintes competências:
a) A outorga do contrato com a IdD — Portugal Defence, S. A., em representação
do Ministério da Defesa Nacional, nos termos do n.º 1 do artigo 10C.º do Código dos Contratos Públicos (CCP);
b) A instrução do processo de fiscalização prévia do contrato junto do Tribunal de Contas;
c) A designação do gestor do contrato a que se refere o artigo 290.º -A, do CCP;
d) A constituição da equipa de acompanhamento e fiscalização da execução do contrato, nos termos e para os efeitos do disposto designadamente no artigo 305.º do CCP;
e) O exercício do poder de conformação da relação contratual previsto na alínea b) do artigo 302.º do CCP;
f) A autorização dos pagamentos contratualmente devidos, nos termos do artigo 29.º do Decreto-
-Lei n.º 155/92, de 28 de julho, na sua atual redação.”
j. Por email datado de 21/01/2022, a IdD foi notificada para efeitos de outorga do contrato e apresentação da documentação necessária.
k. Não foi remetido aos autos pela entidade adjudicante qualquer convite ou outra documentação que evidencie a existência de negociação prévia à aprovação da minuta do contrato com outra entidade que não a IdD-Portugal Defence S.A.
l. Não foi efetuada qualquer publicação da intenção de contratar em qualquer jornal oficial.
m. A IdD – Portugal Defence, S.A. (IdD), é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos que tem por objeto social:
a) Assegurar a interface I&D (investigação e desenvolvimento) entre a Economia da Defesa e os Centros de Investigação e Desenvolvimento das Universidades Portuguesas;
b) Gerir as participações sociais que lhe estejam cometidas;
c) Assegurar a interface público/privado na Economia da Defesa;
d) Apoiar as operações de rentabilização de património na área da Defesa Nacional, nomeadamente no âmbito da execução da respetiva Lei de Infraestruturas e gerir o património da Defesa Nacional que lhe esteja cometido, em articulação com a Direção- Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) e a Estamo – Participações Imobiliárias, S.A.;
e) Assessorar as transações de equipamentos militares, nomeadamente no âmbito da execução da Lei de Programação Militar, em articulação com a DGRDN;
f) Assegurar a conceção, a indústria, o comércio e a manutenção de material de defesa e de desmilitarização de munições e outros acessórios, a conversão de materiais e ainda todas as atividades e produtos que com eles se relacionem.
B. Do contrato sujeito a fiscalização
n. Em 28/01/2022 foi outorgado “Contrato Interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal Defence, S.A. para a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (NPO) da Classe “Viana do Castelo” Destinados à Marinha Portuguesa”, que “define os termos e condições da gestão do PROGRAMA NPO, a assegurar pela Portugal Defence, relativo à aquisição de seis Navios de Patrulha Oceânicos, da classe “Viana do Castelo”, destinados à Marinha Portuguesa, para a totalidade da duração do mesmo e mediante um preço máximo global e parcial fixo, e data certa, e que compreende a revisão do projeto de engenharia, o fornecimento de seis NPO e dos bens e serviços de apoio logístico para sustentar o respetivo ciclo de vida”, vigorando e produzindo efeitos a partir da data da comunicação da concessão do Visto do Tribunal de Contas até à data em que ocorrer a receção definitiva do último NPO.
o. Nos termos da cláusula 2.ª, n.º 2, “a gestão do PROGRAMA NPO, a que se refere o número
anterior, compreende:
a. Numa primeira fase, a prestação pela Portugal Defence, na qualidade de entidade adjudicante do Contrato de CONSTRUÇÃO, de todos os serviços inerentes à preparação, escolha e condução do procedimento de formação do contrato, que inclui a elaboração das peças procedimentais, a constituição do júri, a análise, avaliação e negociação das propostas, a adjudicação, a elaboração e outorga do referido contrato, e que culmina com a sua entrada em vigor;
b. Numa segunda fase, que se inicia com a entrada em vigor do Contrato de CONSTRUÇÃO, e inclui a gestão do PROGRAMA NPO pela Portugal Defence, tendo em vista a revisão do projeto de engenharia e o fornecimento dos seis NPO e dos bens e serviços de apoio logístico para sustentar o ciclo de vida dos navios, e que termina na data da RECEÇÃO DEFINITIVA do último NPO”.
p. A cláusula 4.ª do contrato prevê que “O PROGRAMA NPO é financiado através da LPM, com orçamento global máximo de €352.000.000 (trezentos e cinquenta e dois milhões de euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, não podendo exceder, em cada ano económico, os montantes anuais previstos na RCM, acrescidos do saldo apurado no exercício orçamental anterior”.
q. O preço global do contrato é de €4.245.000,00 (quatro milhões duzentos e quarenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, “a pagar nos seguintes termos e condições:
a. Uma primeira componente, no valor de € 254.700,00, associada à conclusão das seguintes prestações:
i. Plano Global de Execução do Contrato - € 20.000,00;
ii. Versão final completa das peças do procedimento de formação do Contrato de CONSTRUÇÃO - € 74.700,00;
iii. Conclusão do procedimento de formação do Contrato de CONSTRUÇÃO,
correspondente à outorga do contrato - € 150.000,00;
iv. Conclusão da instrução do processo de fiscalização prévia junto do Tribunal de Contas, que ocorrerá com a decisão sobre o visto - € 10.000,00.
b. Uma segunda componente, no valor de € 3.353.550,00, a pagar em 11 (onze) prestações anuais de € 304.8C8,18 cada, no período de 2022 a 2032, correspondentes às prestações associadas à gestão global e ao ritmo de execução do PROGRAMA NPO, incluindo a revisão do projeto de engenharia, a construção e entrega dos seis NPO, e o fornecimento dos bens e serviços de apoio logístico, para a totalidade do período do programa e atendendo ao período de garantia de dois anos, de acordo com os seguintes marcos físicos:
i.2022: com a entrega do SIGAF;
ii.2023: com o início da construção do 1.º NPO, conforme marco físico que vier a ser definido no Contrato de CONSTRUÇÃO;
iii.2024: correspondente ao ‘entregável’ (marco físico) que vier a ser definido no Contrato
de CONSTRUÇÃO;
iv.2025 a 2030: com a RECEÇÃO PROVISÓRIA de cada NPO; v.2031 e 2032: com a RECEÇÃO DEFINITIVA do 5.º e C.º NPO.
c. Uma terceira componente, final e indexada à performance da gestão do PROGRAMA NPO no valor de € C3C.750,00, medida em função do cumprimento dos prazos definidos no presente
contrato e dos resultados alcançados, designadamente quanto aos preços e prazos de entrega dos navios:
i. Pelo cumprimento dos prazos de RECEÇÃO PROVISÓRIA dos navios, o valor de €
50.000,00 por cada NPO;
ii. Pelo cumprimento do preço contratual inicial de cada NPO que vier a ser fixado no Contrato de CONSTRUÇÃO, a quantia de € 5C.125,00 por cada NPO”.
r. A cláusula 8.ª prevê que as entidades responsáveis pela execução do contrato são:
“a) A Portugal Defence, na qualidade de entidade responsável pela gestão do PROGRAMA NPO nos termos definidos na RCM e no contrato, obrigando-se a gerir, em nome próprio e sob sua responsabilidade, o PROGRAMA NPO durante todo o período de duração do mesmo, assumindo o risco pela sua execução, nos termos previstos no presente contrato e na lei;
b) O MDN, enquanto entidade responsável por assegurar, por si ou através da Marinha, o fornecimento do MFE, que inclui o apoio logístico à construção dos NPO e a sustentação do acompanhamento e fiscalização da construção dos navios, conforme previsto na RCM e no contrato;
c) A Marinha, enquanto entidade destinatária final e utilizadora dos NPO, e que exerce as funções de AM, de acompanhamento e fiscalização da construção dos NPO, através da EAF, e de EEF, bem como designa os respetivos peritos nos termos da legislação aplicável.”
s. Nos termos da redação original da cláusula 28.ª, era permitida a subcontratação e a cessão da posição contratual pela Portugal Defence, mediante autorização prévia, por escrito, do MDN.
t. Em 26/04/2022, as partes outorgaram uma adenda ao contrato, nos seguintes temos:
“CLÁUSULA 1.º
Objeto da adenda
A presente adenda procede à alteração da cláusula 28.ª do contrato celebrado entre as partes em 28 de janeiro de 2022, a qual passa a ter a seguinte redação:
“CLÁUSULA 28.ª
Subcontratação e cessão da posição contratual
A Portugal Defence não poderá ceder ou transferir para terceiro a posição que ocupa no presente contrato enquanto entidade gestora do Programa NPO, nem proceder à subcontratação quanto a alguma ou algumas das prestações contratuais compreendidas na gestão do programa.”
CLÁUSULA 2.ª
Vigência e produção de efeitos da adenda
A presente adenda entra em vigor e produz efeitos nos mesmos termos definidos na cláusula 42.º
do contrato.”
C. Do processo neste tribunal
u. A Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional submeteu em 01/02/2022 a fiscalização prévia o “Contrato Interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal Defence S.A. para a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (NPO) da Classe “Viana do Castelo” Destinados à Marinha Portuguesa”, celebrado em 28/01/2022.
v. Através do Ofício DFP - 3612/2022, datado de 08/02/2022, a entidade Requerente foi notificada, para juntar documentos e, entre outros, prestar os seguintes esclarecimentos: “1. Considerando que, nos termos da RCM n.º 72/2021, “o Ministro da Defesa Nacional determinou que a gestão do programa de aquisição de seis NPO fosse cometida à IdD, S.A., em articulação com a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional e com a Marinha Portuguesa”, esclareça por que motivo a Marinha Portuguesa não é outorgante do contrato em apreço, e bem assim como considera possível a correlativa assunção de responsabilidades, como seja a de entidade corresponsável pela execução do Programa NPO, num contrato em que não é parte.
2. Esclareça, fundamentadamente, qual a base legal que alicerçou o procedimento não concorrencial que culminou com a outorga do contrato em apreço, pronunciando-se especificamente sobre a eventual não aplicação do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, ao procedimento em apreço.
3. Sem prejuízo da resposta à questão anterior, demonstre que se encontram preenchidos todos os pressupostos para o recurso a contratação excluída ao abrigo do disposto nos artigos 5.º-A e B do CCP, remetendo documentação demonstrativa de todos os factos alegados.
4. Justifique a ausência de procedimento pré-contratual, indicando se houve convite, caderno de encargos, relatório de análise de proposta, atas das negociações entre as partes e subsequente tramitação antes da autorização de adjudicação, e remeta esses mesmos elementos caso existam, já que a sua falta, nos termos da alínea l) do artigo 1C1.º do CPA, implica a nulidade dos contratos por preterição total do procedimento exigido, como também tem sido jurisprudência deste Tribunal (vide os Acórdãos n.ºs 7/2018- 1ª S/SS e 2C/2018- 1ª S/SS).
5. Sem prejuízo da resposta à questão anterior, esclareça qual a entidade que elaborou os anexos ao contrato ora em apreço, e em que medida os mesmos vinculam a obrigação da cocontratante no âmbito do cumprimento das suas obrigações contratuais, nomeadamente as da primeira fase de gestão do Programa NPO, nas quais se insere a obrigação de elaboração das peças do procedimento.
6. Remeta a decisão de adjudicação, porquanto apenas foi enviada aos autos a aprovação da minuta do contrato pelo Ministro da Defesa Nacional.
7. Pese embora se afaste a aplicação da parte II do CCP para a formação do contrato em apreço, face ao disposto no artigo 5.º-B do referido Código, a celebração dos contratos no âmbito do setor
público fica sujeita aos princípios gerais de atividade administrativa, bem como, com as devidas adaptações, aos princípios gerais da contratação pública, devendo ser cumpridos alguns formalismos previstos na parte II, do CCP, pelo que:
a. Esclareça concretamente com que critério foi calculado por essa entidade a estimativa dos preços parcelares, relativamente a cada uma das fases da prestação de serviços em apreço, demonstrando- o documentalmente;
b. Demonstre que a despesa associada ao contrato em apreço respeita os princípios da economia, eficiência e eficácia;
c. Demonstre que os valores dos serviços associados ao contrato se contêm dentro dos preços de mercado para serviços de idêntica natureza, remetendo toda a documentação que serviu de suporte à decisão de contratar sem sujeição às regras da concorrência;
d. Remeta os estudos realizados nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 18.º da Lei de Enquadramento Orçamental que antecederam a aprovação do programa de aquisição de seis navios de patrulha oceânicos (NPO), neles destacando a parte relativa ao contrato em apreço.
8. Tendo em consideração a especial relação entre as partes decorrente da aplicação do artigo 5.º- A do CCP, esclareça como considera admissível o previsto da Cláusula 28.ª do contrato, ao prever que a IdD pode subcontratar ou ceder a posição contratual, mediante autorização prévia do MDN.
9. Na sequência da questão anterior, esclareça se prevê a subcontratação para a prestação de serviços, e obra, a contratualizar contratualizados no procedimento pré-contratual relativo ao contrato de CONSTRUÇÃO processo remetido.
10. Esclareça e evidencie documentalmente a separação de funções e responsabilidades entre a equipa de acompanhamento e fiscalização da execução do contrato e o gestor do contrato, considerando o disposto no artigo 290.º-A do CCP.
11. Demonstre, documentalmente, que o objeto do contrato em apreço se encontra abrangido pelas dotações inscritas na Lei de Programação Militar (LPM) para os anos de 2021 a 2029, na capacidade “Patrulha e Fiscalização”, projeto “Aquisição Novos Meios de Patrulha e Fiscalização”.
12. Tendo presente o 5.º § dos considerandos ínsitos no contrato em apreço, e a cláusula C.ª do caderno de encargos, na medida em que procederam à alteração dos prazos de receção provisória previstos na RCM n.º 72/2021, pronuncie-se acerca da legalidade dos mesmos, designadamente demonstrando que não existe qualquer discrepância relativamente aos prazos previstos naquele instrumento legal.
13. No seguimento do ponto anterior, esclareça, ainda, como considera legalmente possível a previsão de encargos na cláusula C.ª do contrato em apreço, a serem suportados entre 2022 a 2032, atendendo ao horizonte temporal definido no Anexo I à RCM n.º 72/2021 (até 2031).
14. Justifique em que termos o escalonamento do encargo resultante do contrato se mostra ajustado aos prazos de execução e ao pagamento faseado das prestações objeto do mesmo estabelecidos, respetivamente, na cláusula C.ª e 18.ª do instrumento contratual, balizando a respetiva programação temporal e financeira para cada um dos anos de execução do contrato.
15. Atenta a descrição do objeto contratual esclareça, por referência ao disposto no n.º 2 da clausula 2.ª do contrato, se a IdD assumirá alguma das competências que nos termos do CCP são atribuídas ao órgão competente para a decisão de contratar e, em caso de resposta afirmativa, demonstre que o instrumento em causa é suficiente para o efeito.
16. Sem prejuízo da resposta à questão anterior, esclareça se a verba prevista na clausula 4.ª do contrato foi ou será de alguma forma transferida para a cocontratante, fundamentando legalmente a sua resposta.
17. Pronuncie-se sobre a legalidade do previsto no n.º 2 da clausula 1C.ª do contrato quanto ao valor atribuído ao silêncio, identificando a norma legal em que se fundamenta a atribuição dos efeitos aí previstos, relacionando a sua resposta com as competências do órgão com competência para decisão de contratar.
18. Esclareça se o valor a que respeita a clausula 27.º do contrato já se encontra inserido no preço contratual.
(…)”
w. A Requerente veio responder àquela notificação através de email datado de 07/03/2022 (registo n.º 3416/2022), nos seguintes termos:
“1. (…)
O estatuto da Marinha no seio do contrato sub judice reflete a sua posição relativa no Programa de Aquisição de seis novos Navios de Patrulha Oceânicos (doravante designado Programa NPO), delimitada por algumas obrigações, atenta a particular articulação de responsabilidades que o contrato em apreço pressupõe, no contexto da relação jurídica interadministrativa, nos termos admitidos na Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 72/2021, de 9 de junho.
Com efeito, ela espelha uma opção do poder político, que sem ignorar, naturalmente, o papel relevante da Marinha, face ao domínio e à capacitação técnica deste ramo das Forças Armadas, reconhece, unicamente, ao Ministério da Defesa Nacional (MDN) a qualidade de parte no contrato (n.º 4 da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho). Importa, ademais, sublinhar que, mesmo que não fosse despicienda a eventual qualificação da Marinha enquanto parte no contrato, a par do MDN, o interesse público que subjaz a este contrato é assegurado por este Ministério, compreendendo, por maioria de razão, os anseios e o interesse da Marinha, sabendo que, face ao disposto no artigo 4.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 183/2014, de 29 de dezembro, na sua redação atual – que aprovou a orgânica do Ministério da Defesa Nacional –, aquele ramo está integrado na administração direta do Estado através do MDN. Desse ponto de vista, o MDN representa a visão de conjunto que abarca não só os legítimos anseios da Marinha, mas também a definição da orientação estratégica do segmento da indústria da defesa nacional, beneficiando, portanto, da reunião num só ente da “parte” representada pelo MDN, assumindo-se como uma realidade jurídica constituída e corporizada pela pessoa coletiva Estado/MDN, que recolhe no seu seio a Marinha.
A correlativa assunção das responsabilidades da Marinha no contrato não se esgota, nem se confunde com um hipotético estatuto de “parte”, nem é incompatível, na perspetiva deste Ministério, com o acervo de competências que lhe são fixadas no contrato, claramente instrumentais à necessária fluidez da sua execução, mas sob a batuta do MDN, este sim outorgante do contrato. Tão pouco as tarefas que caem na alçada da Marinha podem ser elevadas para um plano jurídico-formal de igualdade, face às partes identificadas no contrato, na linha das relações contratuais insinuadas na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho. Na verdade, também, neste particular, a inserção da Marinha no contrato incorpora o papel reservado a esta entidade, concretamente, na alínea b) do n.º 1, conjugada com o introito, e no n.º 1, do Anexo III, todos da mesma RCM, devendo, pois, o objeto do contrato, por um lado, congregar o “material e serviços a fornecer pelo Estado”, “a providenciar pela Marinha” e, por outra banda, “respeitar o âmbito do Programa estabelecido na documentação atinente, a apresentar pela Marinha Portuguesa”.
Conclui-se que, de um ângulo estritamente técnico-funcional, não existirá, certamente, outra instituição nacional que privilegie e domine o conhecimento da “construção naval de guerra” e assuma, por isso, o patrocínio da informação relativa às especificações técnicas dos NPO a construir, sendo, além do mais, ela a destinatária do “produto final”. O que, aliás, em bom rigor, a RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, nem sequer poderia contornar, tendo como seguro que os padrões, ao nível da conceção técnica dos navios devem obedecer à definição de critérios objetivos, que repousa na esfera jurídica daquele ramo, de acordo com a Lei Orgânica n.º 2/2021, de 9 de agosto (Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas).
Deste modo, a Marinha, com o enquadramento ora exposto, tem de assumir, especificamente no domínio das suas atribuições, as vestes de autoridade técnica, atento o disposto no artigo 7.º, n. os 4 e 5, alíneas c), da Lei Orgânica n.º 2/2021 – tipo de autoridade que consiste no poder de fixar e difundir normas de natureza especializada, sem que tal inclua competência disciplinar em matéria de conformação operacional e técnica dos navios a construir.
A autoridade técnica da Marinha, reconhecida pelas partes no contrato, advém-lhe, pois, das competências atribuídas, pela lei orgânica (Decreto-Lei 185/2014, de 29 de dezembro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 19/2022, de 24 de janeiro) do ramo e respetiva regulamentação, designadamente ao Estado-Maior da Armada, à Superintendência do Material e à Direção de Navios.
A Marinha deve assumir, no âmbito da relação contratual interadministrativa constituída, que o contrato sob análise titulou, não uma posição de parte – pois não assume na relação em concreto um vínculo obrigacional em que deva ser credora de prestações perante a IdD Portugal Defence, SA, (adiante designada apenas por IDD) - mas apenas uma posição de prestação de atividade administrativa de cooperação e de colaboração para com esta entidade e com o MDN, através da Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN), na conformação técnica dos navios a construir e em função desse escopo, que se projeta, em particular nas cláusulas 1.ª, alíneas a) e d), e 9.ª, do contrato.
A partir daí, sendo esses os exatos limites da intervenção da Marinha, eles não lhe permitem catapultar a sua ação para um patamar que caracterize ou exteriorize poderes próprios de qualquer parte num contrato, à luz do regime previsto no Código dos Contratos Públicos (CCP), posto que a sua qualificação de “autoridade técnica” não esvazia, nem substitui, a capacidade do MDN na definição do rumo do interesses público que subjaz ao Programa NPO e, concomitantemente, na edificação da decisão final capaz de determinar a produção de efeitos jurídicos na esfera jurídica da outra parte. Para ilustrar o que acabou de ser dito, basta atentar no disposto no n.º 4 da cláusula 2C.ª para alcançar que, as modificações substantivas admitidas no contrato, e que revestem caráter determinante para a sua execução, estão sujeitas à aprovação obrigatória do MDN, sem prejuízo da intermediação prévia da Marinha.
É, pois, no MDN, na realidade, que radicam os poderes de conformação do contrato, bem como o exclusivo exercício dos poderes de resolução sancionatória do contrato, ou da aplicação de penalidades por mora do cocontratante IdD, poderes esses tutelados pelo contraente público nos termos dos artigos 302.º e ss. do CCP, e que, despidos deles, não é possível a qualquer entidade abrangida pelo artigo 2.º do mesmo CCP, arrogar-se ou revindicar a titularidade da plenitude de poderes só consentida a uma parte rotulada de contraente público.
Afigura-se, assim, seguro afirmar que estão, essencialmente, acopladas à Marinha as funções de natureza consultiva, ilustradas pela designação de peritos [Cfr. cláusula 8.ª, n.º 1, alínea c), do contrato], e de apoio à tomada de decisões pelo MDN, traduzido na fixação de parâmetros técnicos, conforme já se enfatizou anteriormente, e no acompanhamento e fiscalização, quer deste contrato, quer do contrato de construção, nos termos, respetivamente, dos n. os 4 e 5, do Anexo III da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, sem que a natureza dessas funções belisque a subordinação daquele ramo ao MDN, no tocante à consagração do exercício de poderes previstos no CCP, no âmbito deste contrato, material e formalmente privativos do contraente público assim qualificado. Em suma, o recorte de responsabilidades da Marinha definido no contrato está comprimido, em boa verdade, pela manifestação da vontade do MDN, situando-se, neste circunspeto, aquele ramo num plano infra, no quadro das relações que fluem do contrato, de cooperação com o MDN, cabendo a este o exercício dos poderes de autoridade previstos no CCP, já anteriormente referidos, e assegurar, nessa medida, a prossecução do interesse público inerente ao preenchimento das necessidades operacionais da Marinha.
2. (…)
O procedimento adotado, de natureza não concorrencial, resulta de uma opção adstrita ao exercício da atividade administrativa do Governo, vertida no introito e no n.º 4 da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, balizada pelo recurso ao regime consagrado no artigo 5.º-A do CCP, não estando o presente contrato, por via disso, sujeito à parte II do mesmo CCP.
A convocação do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, prevista na RCM, visa acautelar a possibilidade de recorrer aos mecanismos consagrados naquele diploma para efeitos da aquisição dos navios e fornecimentos conexos, e não para estabelecer, do ponto de vista do MDN, qualquer
compromisso com a obrigatoriedade da adoção de um procedimento concorrencial no âmbito deste contrato, sob pena de entrar em contradição com o figurino desenhado, ab initio, na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, inspirado pela figura da contratação excluída.
Isso não quer dizer que a chamada à demanda do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, seja excluída, posto que o desígnio da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, não se circunscreve a marcar as referências do procedimento que conformou o presente contrato, abarcando, naturalmente, os procedimentos subsequentes relativos, quer à construção dos seis NPO, quer ao ‘Material e serviços a fornecer pelo Estado’ e, nesse caso, admitida a aplicação do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, nos termos, aliás, aflorados na cláusula 12.ª do contrato.
Sem prejuízo do que foi dito anteriormente, convém, ainda, realçar que a integração da Diretiva n.º 2009/81/CE no nosso ordenamento jurídico, através do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, não inibe ou afasta o recurso às soluções contempladas no regime regra da contratação pública adotado na Diretiva n.º 2014/24/UE, e enxertadas no CCP, conforme é pugnado na linha da orientação defendida no ponto 2.1 da Comunicação 2019/C157/01, da Comissão Europeia. A motivação da posição inscrita naquela comunicação facilmente se alcança, quando confrontada com a invocação do disposto no artigo 5.º-A do CCP, no procedimento em curso, em detrimento do regime previsto no Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro. Na verdade, sabendo que o Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, não abarcou uma norma com a amplitude do disposto no artigo 5.º-A do CCP, revelar-se-ia pouco curial que a busca de soluções aplicáveis ao setor de defesa, em matéria de aquisição de material de guerra, fosse sujeita a um regime mais apertado, em contravenção com o regime mais flexível previsto no artigo 5.º-A, do CCP, aplicável aos demais sectores da Administração Pública.
A inaplicabilidade do CCP ao sector da Defesa seria tanto mais estranha, quando a natureza e a sensibilidade das aquisições de material de guerra recomendariam o recurso a soluções mais ágeis e abrangentes, admitidas pelo artigo 5.º-A do CCP, e ficasse, ao invés, confinado unicamente ao regime alinhado no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, cujas soluções no domínio da contratação excluída, em comparação com as regras tipificadas no artigo 5.º-A do CCP, revelam um espectro mais restritivo e vocacionado para dimensões específicas no contexto da Defesa, que, não sendo obviamente desprezíveis, são, todavia, claramente redutoras da visão da formação de contratos, que carecem, seguramente, das soluções amplificadas pela matriz normativa do artigo 5.º-A do CCP.
3. (…)
A não aplicação da parte II do CCP, resulta da observação de três condições cumulativas, fixadas nas alíneas a), b) e c), do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP, que se encontram preenchidas, conforme se demonstrará:
- Quanto ao requisito estatuído na alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP, densificado pelo disposto no seu n.º 3, pode facilmente concluir-se que, sendo a totalidade do capital social da IdD
– Portugal Defence, S.A., por um lado, e a nomeação de um representante quer na assembleia
geral, quer no conselho da administração da IdD, por outro, num caso e noutro detidos e assegurados unicamente pelo Estado, impende sobre o MDN o controle da IdD, designadamente no que respeita às orientações estratégicas sectoriais, em tudo semelhante àquele que é exercido relativamente aos seus serviços, de tal modo que não se vislumbra qualquer autonomia na tomada de decisões relevantes da vida daquela entidade, sem antes serem filtradas pelo “acionista” Estado, tendo como seguro o compromisso incontornável da IdD com os objetivos estratégicos configurados pelo MDN, e a influência dominante que este exerce sobre aquele, atento o disposto nos artigos 5.º e 9.º, do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, conjugado com o artigo 8.º da orgânica do MDN: “Sem prejuízo dos poderes conferidos por lei ao Conselho de Ministros ou ao membro do Governo responsável pela área das finanças, compete ao Ministro da Defesa Nacional participar no exercício da função acionista do Estado e exercer as competências legalmente atribuídas ao ministério setorial, a respeito das empresas do setor empresarial do Estado nas áreas da defesa nacional e da promoção da base tecnológica e industrial de defesa.”
- Relativamente à condição prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP, a atividade da IdD é centrada, toda ela, no desenvolvimento de funções que lhe foram confiadas pelo MDN, mediante a previsão expressa no artigo 2.º dos respetivos estatutos, corolário da visão estratégica perfilhada pelo Estado português, acolhida no artigo 1.º, n.º 5, da Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho - que aprovou a Lei de Programação Militar (LPM). Ademais a percentagem de atividade desenvolvida pela IdD em prol do MDN (próxima dos 100%) resulta clara da observação do volume de negócios registado nos últimos 3 exercícios económicos (n.º C do artigo 5.º-A):
RENDIMENTOS E GASTOS | PERÍODOS | ||
2021 (EST) | 2020 | 2019 | |
Vendas | 56 382,15 | 36 576,68 | 47 539,02 |
Prestações de serviços | 1 272 763,68 | 1 294 042,41 | 1 270 908,27 |
Transferências correntes e subsídios à exploração obtidos | 1 000 000,00 | 1 000 000,00 | 750 000,00 |
Em que, 95% do valor da rubrica “prestações de serviços” se refere a rendimentos provenientes dos serviços de desmilitarização contratualizados com a DGRDN e titulados pelos contratos de aquisição de serviços de desmilitarização de munições e explosivos provenientes dos Ramos das Forças Armadas, e 100% do valor da rubrica “Transferências correntes e subsídios à exploração obtidos”, é proveniente do MDN, destinando-se à realização de atividades, no plano nacional e internacional, de desenvolvimento e implementação da estratégia de promoção das indústrias de defesa nacionais, incluindo as da Base Tecnológica e Industrial de Defesa (BTID), conforme previsto no artigo 7.º e no Anexo I da Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2021.
- No que tange ao requisito previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP, conforme já se teve o ensejo de dizer anteriormente, o capital social da IdD é detido, exclusivamente, pelo Estado, de acordo com o disposto no artigo 3.º, n.º 1, dos estatutos da IdD, que ora se juntam em anexo (Elementos_Complementares_Estatutos IDD 29-0C-2020 Certif).
4. (…)
A nulidade cominada pela alínea l) do artigo 1C1.º do CPA pressupõe a “preterição total do procedimento legalmente exigido”.
Ora, aos contratos abrangidos pelo regime de contratação excluída – como sucede com o contrato celebrado entre a IdD e o MDN - não é aplicável a parte II do CCP, o que significa que à entidade adjudicante não lhe é exigido aplicar qualquer um dos procedimentos de formação dos contratos aí previstos, sem prejuízo da sujeição “aos princípios gerais da atividade administrativa, bem como, com as devidas adaptações face à natureza do contrato, aos princípios gerais da contratação pública previstos no n.º 1 do artigo 1.º-A, devendo sempre ser feita menção à norma que fundamenta a não aplicação da parte II ao contrato em causa” (artigos 5.º-A, n.º 1, e 5.º-B, n.º 1, ambos do CCP), o que se fez na RCM n.º 72/2001, de 9 de junho de 2021 que serviu de base à decisão de contratar, em especial no respetivo introito.
Por sua vez, o n.º 2 do referido artigo 5.º-B estabelece que “os contratos com objeto passível de ato administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos ficam sujeitos às normas constantes do Código do Procedimento Administrativo, com as necessárias adaptações”.
E sobre estas normas a doutrina de Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx ensina que «(…) o facto de aos contratos (…) não se aplicar o regime da contratação pública do Código não significa que a sua formação decorra livremente, ao sabor da vontade ou conveniência da respetiva entidade adjudicante. Longe, muito longe disso, ainda que as constrições legais não sejam equiparáveis às constantes do CCP.” (Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, 201C, páginas 1C1 e 1C2). No entender dos autores deverão ser observados, com as necessárias adaptações, os princípios ou as normas (consoante se trate da previsão hoje incorporada no n.º 1 ou no n.º 2, do referido artigo 5.º-B do CCP) que regulam o procedimento e os atos administrativos, designadamente os princípios da “procedimentalização (e respetiva documentação) da atividade administrativa” (artigo 1.º do CPA entre outros), da participação dos interessados na formação da decisão (artigo 100.º do CPA) ou da exigência de decisão e respetiva notificação (artigos 114.º e 12C.º e ss. do CPA), e não quaisquer normas constantes da parte II do CCP.
Neste conspecto, cumpre assinalar, que numa redação anterior o n.º 5 do artigo 5.º do CCP exigia que, quanto aos contratos de aquisição de serviços de saúde, de carácter social, de educação e de formação profissional – previstos na alínea f) do n.º 5 do artigo 4.º do CCP, e, por isso, subtraídos ao regime da parte II do Código – lhes fosse aplicável o disposto nos artigos 49.º e 78.º do CCP – referentes, respetivamente, às especificações técnicas que devem incluir-se no caderno de encargos e à publicação do anúncio da adjudicação de contratos sobre tais serviços.
Esta exigência, de acordo com a doutrina, parecia «(…) contradizer, pelo menos em parte, a mencionada regra da inaplicabilidade do Código, pois a exigência de um caderno de encargos (implícita na remissão para o art.º 49.º) e a publicação de um anúncio de adjudicação (ínsita na remissão para o art.º 78.º) pressupõem a existência de um procedimento pré-contratual de que
aquele caderno de encargos constitui uma peça e aquela adjudicação um remate» (Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, 201C, página 159).
Talvez por essa mesma razão a referida norma tenha sido revogada.
Termos em que não podemos deixar de concluir que o processo em questão não é (nem tem de ser) composto pelas peças procedimentais exigidas pelo artigo 40.º do CCP e, nomeadamente, “convite, caderno de encargos, relatório de análise de proposta, atas das negociações entre as partes e subsequente tramitação”, pois que o processo em questão, inserindo-se no âmbito do regime contratação excluída, fica dispensado de tal tramitação, por força do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP. Da mesma forma, não podemos deixar de concluir que os princípios essenciais que regulam a atividade administrativa foram observados, encontrando-se o processo devidamente instruído e documentado, designadamente através de:
• Autorização da despesa e da inerente decisão de contratar, conforme deliberado através dos n. os 1 e 4 da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho (deliberação já junta aos autos);
• Delegação de competências no Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional para elaboração da minuta de contrato, para efeitos de negociação com a IDD, conforme determinado pelo Despacho do Ministro da Defesa Nacional n.º 7325/2021, de 9 de julho, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 142, de 23 de julho (documento já junto aos autos);
• Constituição da Equipa de Negociação, pelo Despacho do Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional n.º 23/DIR/2021, de 0X xx xxxxx xx 0000 (xxx. já junto aos autos);
• Envio de convite à IDD para negociação, acompanhada de proposta de minuta de contrato, através do Ofício da DGRDN n.º C377, de 14 de setembro de 2021, que ora se junta em anexo (Elementos_Complementares_Ofício-Convite Ofício-Convite C377 14-09-2021 e MINUTA 14-09- 2021);
• Envio da minuta de contrato negociada entre as partes ao Gabinete de S. Ex.ª O Ministro da Defesa Nacional, para efeitos de aprovação, conforme Ofício da DGRDN n.º 797C, de 12 de novembro de 2021, que ora se junta em anexo (Elementos_Complementares_Ofício 797C 12-11- 2021 e MINUTA 12-11-2021);
• Ofício da IDD n.º CA-319/2021 de 1C-11-2021 e Email DGRDN de 7-12-2021 (Elementos_: Complementares_Oficio CA-3191C-11-2021 e Email 7-12-2021);
• Aprovação da minuta do contrato por despacho de S. Ex.ª o Ministro da Defesa Nacional de 19 de dezembro de 2021 (documento já junto aos autos);
• Despacho de S. Ex.ª o Ministro da Defesa Nacional n.º 1158/2022, de 21 de janeiro, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 20/2022, de 28 de janeiro, que procede à delegação de competências no Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional para a outorga do contrato, em representação do MDN, e para a prática dos atos subsequentes (já junto aos autos);
• Despacho do Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional n.º 4/DIR/2022, de 21 de janeiro, que procede à constituição da Equipa de Acompanhamento e Fiscalização do Contrato e designação do Gestor do Contrato, nos termos do artigo 290.º-A do CCP (doc. já junto aos autos);
• Notificação da IDD para efeitos de outorga do contrato e apresentação da documentação necessária – email de 21 de janeiro de 2022, que ora se junta em anexo (Elementos Complementares_Notificação Outorga Contrato 21-01-2022);
• Contrato outorgado a 28-01-2022.
Conclui-se, assim, pelo exposto, que, não sendo aplicável a parte II do CCP ao contrato em apreço e não sendo, em consequência, exigível a observação das regras que regulam os procedimentos pré- contratuais de formação dos contratos, não se verifica “preterição total do procedimento exigido”, logo, não opera a nulidade prevista na alínea l) do artigo 1C1.º do CPA.
Sobre a eventual nulidade do contrato sub judice por preterição total do procedimento, o Tribunal de Contas invoca ainda a sua jurisprudência, designadamente os Acórdãos n. os 7/2018-1.ª S/SS e 2C/2018-1.ª S/SS.
Compulsados os mesmos, verifica-se que, em ambos os acórdãos, é cominada a nulidade de contratos públicos sujeitos à parte II do Código: é que, em ambos os casos, estamos perante um procedimento pré-contratual por “ajuste direto” (um deles alegadamente fundado no artigo 259.º do CCP, outro no artigo 24.º CCP), o que significa que as entidades adjudicantes estavam obrigadas a cumprir as regras e tramitação procedimental constante do CCP, regras essas que o Tribunal considerou não terem sido observadas.
Ora, não é o caso presente: conforme já foi sublinhado, ao contrário do que acontece no caso do procedimento de ajuste direto ou em qualquer um dos outros procedimentos pré contratuais previstos no n.º 1 do artigo 1C.º do CCP, no regime de contratação excluída a entidade adjudicante fica dispensada tout court da adoção da tramitação procedimental, ou da aplicação de qualquer regra especialmente prevista na parte II do CCP (n.º 1 do artigo 5.º-B do CCP).
5. (…)
Os anexos que acompanham o contrato foram elaborados pelo MDN e pela Marinha – neste caso, em particular, no que respeita à definição de especificações técnicas que devem ser observadas na construção dos NPO, de acordo com o n.º 1 do anexo III da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho - “devendo respeitar o âmbito do Programa estabelecido na documentação atinente a apresentar pela Marinha Portuguesa” -, tendo, naturalmente, sido objeto de discussão e avaliação prévia no quadro das negociações com o cocontratante.
A ampla autonomia reconhecida à IdD na condução da gestão do Programa NPO, na qualidade de cocontratante, aferida, designadamente, na estatuição de um quadro de referência do Caderno de Encargos (Anexo I-QRCE), previsto na cláusula 3.ª, alínea a), do contrato, é calibrada, no entanto, por um significativo feixe de mecanismos ao dispor do MDN, que permitem sintonizar a ação da IDD com as obrigações contratuais que lhe estão adstritas, com particular enfoque nas garantias que devem ser asseguradas no quadro dos contratos a celebrar pela IDD, “em
representação do MDN”, no âmbito da execução do contrato em análise, atendendo ao interesse
público subjacente.
A “tenaz” em torno do cumprimento das obrigações contratuais da IdD é desenhada no contrato
através de um duplo eixo:
- Desde logo, num plano técnico, a vontade da XxX está comprimida, para além do referido anexo I, também pelo anexo II do contrato, e que retrata a Especificação de Requisitos dos NPO3S a contemplar na construção dos navios. Dito de outro modo, quaisquer modificações de natureza técnica na construção dos navios que o cocontratante pretenda introduzir na primeira fase do procedimento só pode ser operada mediante o aval da “Autoridade para as Modificações”, de harmonia com o disposto na alínea a) da cláusula 1.ª do contrato.
Sem perder de vista a autonomia da IdD, o contrato consagrou na cláusula 9.ª a existência de Equipa Conjunta de Coordenação (ECC) que permita o fluxo de informação de modo célere e a coordenação entre a Marinha, entidade que efetivamente detém experiência secular na construção dos navios, e a IDD na execução do contrato.
- Noutro plano, reconduzível a uma dimensão contratual, que não se confunde com a perspetiva técnica, a autonomia da IDD, fundada até em opções de cariz comercial, não sendo inconciliável com as obrigações tecidas no contrato, também não poderia assentar em total discricionariedade que, no limite, poderia desvirtuar a matriz nuclear do Programa NPO, principalmente nos domínios financeiro, técnico e até jurídico.
Precisamente para atalhar os riscos que, eventuais, ações ou opções da IDD pudessem significar para as finalidades do Programa NPO, foi o contrato blindado em sucessivas comportas que, e a despeito da colaboração da Xxxxxxx na configuração dos interesses que o MDN representa, desaguam na prolação da decisão final do MDN, sem ignorar, claro está, as soluções equacionadas quer no “fórum” constituído à sombra da ECC, quer pela IDD.
Deste modo, o percurso das etapas compreendidas no Programa NPO, desdobradas no contrato, ainda que espelhe a autonomia da IDD, é balanceado, se for o caso, pelo crivo primacial das decisões que pontuam e condicionam, inapelavelmente, a ação do cocontratante, expressas, nomeadamente, nas cláusulas C.ª, n.º C, 9.ª, n.º 8, 12.ª, n.º 5, 1C.ª, n.º 1, alíneas a) e b), 2C.ª, n.º 4, e 28.ª, n.º 1, do contrato.
Cabendo ao MDN dirimir ou decidir as situações ou questões suscitadas pela IdD, autorizado pelos artigos, designadamente, 302.º e 307.º, n.º 2, alínea a), do CCP, a falta de reporte ou o incumprimento das decisões tomadas ao abrigo das cláusulas retromencionadas, equivale ao incumprimento de obrigações agregadas ao cocontratante, sancionado nos termos da cláusula 33ª, n.º 1, alínea a), do contrato, com a respetiva resolução.
Convém, ainda, destacar que o poder de resolução do MDN, escorado nos seus poderes de direção e fiscalização, não se confina a este contrato, espraiando-se na valoração do cumprimento das obrigações da IDD na esfera do contrato de construção, mediante a extensão dos efeitos da resolução do contrato admitida pela cláusula 37.ª.
C. (…)
Conforme resulta do exposto na resposta à questão 4, é nosso entendimento de que a sujeição “com as devidas adaptações face à natureza do contrato, aos princípios gerais da contratação pública previstos no n.º 1 do artigo 1.º-A”, não significa a aplicação ou cumprimento de “alguns formalismos” em concreto previstos na parte II do CCP, sob pena de contradição insanável com a previsão normativa ínsita no n.º 1 do artigo 5.º-B.
Por esta razão, é nosso entendimento não serem aplicáveis, em concreto, designadamente, a necessidade de rececionar formalmente uma proposta (artigo 5C.º do CCP), proceder à sua análise (artigo 70.º do CCP) e efetuar a respetiva adjudicação (artigo 7C.º do CCP).
De qualquer modo, esclarece-se, quanto à “aparente ausência de decisão de adjudicação” cuja exigência formal se contesta pelas razões já expostas, que a decisão de aprovação da minuta do contrato tem implícita a adjudicação da prestação de serviços de gestão do Programa NPO nos termos e condições previstos no contrato, o qual foi negociado em conformidade com o superiormente determinado, considerando-se assim, que o ato de aprovação da minuta do contrato reveste efeito equivalente ao ato de adjudicação (de uma proposta cujos termos e condições integram o contrato a celebrar).
7. (…)
7. a. Quanto a esta questão, sublinha-se que os valores parcelares contratualmente fixados são os previstos na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, mais concretamente, no n.º 2 do seu Anexo III, que determina o seguinte:
“2 — A remuneração da IdD, S. A., deve incluir três partes alíquotas, não podendo ultrapassar, no seu conjunto, o montante máximo de 1,5 % do valor da componente do Programa a que se refere a alínea a) do n.º 1 da presente resolução, melhor detalhada no anexo II, assim consideradas:
a) Uma associada aos custos de arranque da capacidade de gestão do programa, com o valor previsional de € 000 000;
b) Uma associada ao ritmo de execução da prestação dos serviços de gestão do programa, para os
anos de 2021 até 2031 (atendendo ao período de garantia de dois anos), com o valor previsional médio anual de € 304 8C8, correspondente a um montante global de € 3 353 550 para a totalidade do período do programa;
c) Uma componente final indexada à performance dos serviços prestados, medida em função do cumprimento dos prazos que vierem a ser definidos no contrato a celebrar e dos resultados a alcançar, designadamente quanto aos preços e prazos de entrega dos navios, com o valor previsional de € C3C 750.”. Tais valores parcelares correspondem, assim, aos custos e à remuneração inerentes às prestações contratuais a executar em cada um dos momentos mais relevantes da gestão do Programa NPO pelo cocontratante, com base nos encargos estimados no ponto seguinte.
Por outro lado, no decurso da negociação, foi acordada a decomposição do preço no que respeita às partes alíquotas a que se referem as alíneas a) e c) suprarreferidas (€ 254.700,00€ e C3C.750,00€,
respetivamente), tendo em conta a valorização dos serviços a prestar na 1.ª fase e os resultados a alcançar pela IDD no âmbito da gestão do Programa NPO.
Destaca-se, no que respeita à primeira componente remuneratória identificada na alínea a) do n.º 1 da Cláusula C.ª, o facto de pretender assegurar o financiamento necessário à concretização de um conjunto de trabalhos que se têm por essenciais à formação do contrato a celebrar com o construtor dos NPO. Acresce o facto de se pretender que os seis NPO sejam dotados de capacidades multifuncionais que lhes acrescentem flexibilidade de emprego operacional e que permitam contribuir e dar resposta a missões no extremo superior do espetro de empenhamentos, com particular realce para a guerra de minas, a vigilância submarina, a projeção de força e a recolha de informações operacionais. Estas capacidades acrescidas serão essenciais para que os novos NPO possam ser utilizados no quadro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN/NATO), através da possível participação no âmbito da segurança coletiva, viabilizando também o empenhamento destes meios navais no contexto da Organização das Nações Unidas (ONU) e da União Europeia, em missões de segurança marítima e em operações de paz.
7. b. Neste âmbito, cumpre referir que, o cálculo da despesa associada ao presente contrato (remuneração da IdD), teve por base os custos resultantes da gestão do Programa NPO, cobrindo todo o período em referência, ou seja, desde a data de produção de efeitos do contrato, após o Visto do Tribunal de Contas, até 2032, considerando os dois anos do período de garantia dos navios a entregar, perfazendo uma duração total previsível de 10/11 anos.
Dada a duração e especial complexidade do Programa, tiveram-se em consideração, entre outros, os seguintes custos:
a) Os custos inerentes aos recursos humanos que será necessário afetar à gestão do Programa NPO. Em rigor, na medida em que todo o processo de contratação relativa à construção dos NPO será conduzido pela IDD, a mesma terá de proceder à constituição de uma equipa de projeto, à qual serão afetas 4 a 5 pessoas, obedecendo a um modelo de governação com a seguinte estrutura a que corresponde um encargo anual estimado em 305.000,00€:
i.Um gestor do projeto, que assegurará a coordenação funcional entre as áreas financeira, jurídica e técnica, bem como a interligação com as entidades envolvidas: DGRDN, Marinha Portuguesa e construtor(es) dos NPO;
ii.Um controller financeiro, responsável pela gestão financeira do Programa NPO;
iii. Um a dois juristas, responsáveis pela preparação, condução e conclusão dos procedimentos contratuais, bem como pela execução jurídica dos contratos de construção;
iv. Um a dois engenheiros navais, responsáveis pelo apoio à revisão do Projeto de Engenharia da classe “Viana do Castelo”, definição dos requisitos técnicos e acompanhamento da execução técnica dos contratos de construção, juntamente com a Marinha Portuguesa.
b) Os custos com deslocações, estadas, ajudas de custo e km’s para acompanhamento da execução do Programa NPO (fases de construção e entrega), com o valor anual de aproximadamente 15.000,00€;
c) Os custos com software e hardware de alocação exclusiva à gestão do Programa NPO, com o valor anual de 4.000,00€;
d) Os custos com instalações, comunicações e outros bens consumíveis, no valor anual estimado de 19.000,00€;
e) Os custos com seguros e outros custos, com o valor anual de 20.000,00€.
7. c. O valor global da remuneração da IdD representará, assim, no máximo, 1,5 % do valor da componente do Programa NPO a que se refere a alínea a) do n.º 1 da presente RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, ou seja, 4.245.000,00€, correspondente a 1,5% do valor total previsto para a construção dos seis NPO fixado em 283 milhões de euros, o qual será pago nos termos e condições previstos na cláusula C.ª do contrato celebrado.
Sublinhe-se que a remuneração da IDD contrasta, em muito, com os preços praticados para a prestação de serviços de idêntica natureza e objeto similar, cobrados por exemplo pela ‘Nato Support Procurement Agency’ (NSPA), cujo ‘fee’ mínimo, como é do conhecimento desse Tribunal, é de 3% do orçamento do respetivo programa aquisitivo.
Face ao exposto nos pontos precedentes, considera-se que a despesa associada ao contrato sub judice, observa os princípios da economia, eficiência e eficácia que presidem à assunção de compromissos e à realização da despesa pública por parte dos serviços e entidades do Estado, a que se refere o artigo 18.º da Lei do Enquadramento Orçamental (LOE) (Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro, com as alterações dadas pelas Leis n.º 2/2018, de 29 de janeiro, 37/2018, de 7 de agosto, e n.º 41/2020, de 18 de agosto), na medida em que se traduzem na: “a) Utilização do mínimo de recursos que assegurem os adequados padrões de qualidade do serviço público; b) Promoção do acréscimo de produtividade pelo alcance de resultados semelhantes com menor despesa; c) Utilização dos recursos mais adequados para atingir o resultado que se pretende alcançar.”
7. d. Sobre os estudos que antecederam a aprovação do Programa NPO, importa salientar que os mesmos se alicerçam, primeiramente, na documentação estruturante relativa às capacidades militares.
A referida documentação estabelece que para o cumprimento das missões cometidas às Forças Armadas, especificadas nas Missões das Forças Armadas 2014 (MIFA 2014) e decorrente dos respetivos cenários de emprego, do conceito de ação militar e das orientações específicas, definidos no Conceito Estratégico Militar (CEM 2014). Verifica-se, assim, a necessária edificação e sustentação das capacidades militares (Como capacidade militar deverá ser entendido o conjunto de elementos que se articulam de forma harmoniosa e complementar e que contribuem para a realização de um conjunto de tarefas operacionais ou efeito que é necessário atingir, englobando componentes de Doutrina, Organização, Treino, Material, Liderança, Pessoal, Infraestruturas e Interoperabilidade (DOTMLPII)) constantes no Sistema de Forças 2014 (SF 2014) (Aprovado pelo Conselho Superior de Defesa Nacional em 30 de julho de 2014), garantindo a qualidade e quantidade dos meios e forças identificados, consubstanciando desta forma a estratégia genética do Estado.
Nesta conformidade, o SF 2014 estabelece, na capacidade “Patrulha e Fiscalização”, a necessidade de edificar a totalidade dos 10 (dez) Navios de Xxxxxxxx Xxxxxxxxx, para substituição das corvetas das classes “Xxxx Xxxxxxxx” (Classe de navios que entrou ao serviço entre 1970 e 1971, inicialmente composta por seis navios: NRP “Xxxx Xxxxxxxx”, NRP “Xxxxxxx Xxxx”, NRP “Xxxxxxx Xxxxxxx”, NRP “General Xxxxxxx D'Eça”, NRP “Xxxxxxx xx Xxxxxxxx” e NRP “Xxxxxxx Xxxxxxx”. Atualmente apenas uma está operacional: NRP “Xxxxxxx Xxxx”) e “Xxxxxxx xx Xxxxxxx” (Classe de navios que entrou ao serviço entre 1974 e 1975, inicialmente composta por quatro navios: NRP “Xxxxxxxx xx Xxxxxxx”, NRP “Xxxx Xxxx”, NRP “Xxxxxx Xxxxxxxxx” e NRP “Xxxxxxxx e Carmo”. Atualmente apenas uma está operacional: NRP “Xxxx Xxxx”), e que têm como finalidade:
1) Assegurar uma adequada mobilidade e capacidade para o exercício de uma ação continuada de vigilância, controlo e fiscalização nos espaços marítimos sob soberania e jurisdição nacionais, designadamente em áreas oceânicas da Zona Económica Exclusiva e da plataforma continental, assim como a busca e salvamento nas áreas marítimas sob responsabilidade nacional [Search And Rescue (SAR)];
2) Participar, no plano da cooperação internacional, em ações combinadas visando a segurança no mar (e.g. Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira - FRONTEX), bem como a fiscalização no âmbito de acordos internacionais relativos à exploração dos recursos naturais (e.g Northwest Atlantic Fisheries Organization (NAFO) ou North East Atlantic Fisheries Commission (NEAFC));
3) Executar tarefas de âmbito diverso, designadamente o apoio:
i. A missões operacionais atribuídas aos meios combatentes (como a guerra de minas);
ii. Ao controlo das fronteiras marítimas e da imigração ilegal;
iii. A ações contra o narcotráfico;
iv. À assistência às populações em caso de acidente, catástrofe e de calamidade pública. O Programa original relativo à Aquisição de Navios de Patrulha Oceânica destinados à Marinha Portuguesa, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2004, de 22 de dezembro, conheceu várias vicissitudes e viria a ser definitivamente interrompido por força da crise financeira que o país atravessou no período 2011-2014, tendo sido entregues xxxxxx 0 xxxxxx (XXX “Xxxxx xx Xxxxxxx” e NRP “Figueira da Foz”) dos 10 programados. Somente em 2015, no quadro do investimento aprovado pela Lei Orgânica n.º 7/2015, de 18 de maio, viria a ser possível retomar o programa de aquisição de novos navios, com a construção, em Portugal, de mais dois NPO (NRP “Sines” e NRP “Setúbal”), fruto da parceria de duas empresas nacionais.
Atualmente, verifica-se que das dez corvetas a substituir, apenas duas se mantêm operacionais, sendo que os custos de sustentação destes meios crescem de forma insustentável, a cada ano que passa, devido à sua, cada vez maior, obsolescência logística.
Os quatro NPO entretanto construídos, têm cumprido de uma forma reconhecidamente muito satisfatória as missões que lhes foram atribuídas, mostrando a sua polivalência e excelentes capacidades para suportar o mar. Para além destes atributos, os NPO são meios com custos de
operação significativamente mais baixos que as corvetas, desde logo por terem sensivelmente metade dos elementos da guarnição.
Adicionalmente, a alteração do contexto estratégico internacional vem colocar um enfoque na vigilância submarina por forma a garantir a salvaguarda das comunicações intercontinentais (cabos submarinos) e o controlo efetivo da plataforma continental. Deste modo, entende-se que a próxima série de NPO (a 3.ª) poderá, mantendo o seu carácter de meio de duplo-uso e enquanto plataforma de alto valor operacional, possuidora de grande flexibilidade de emprego e de elevada adaptabilidade para acomodar a incorporação de novas tecnologia, desempenhar missões militares, em especial de recolha de informações/vigilância submarina, reforçando significativamente o contributo de Portugal para o esforço de defesa comum da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e da União Europeia (EU), num ambiente de grande incerteza estratégica.
Considera-se, assim, que o Programa NPO é uma prioridade para o interesse nacional, reafirmada em sede do processo legislativo de aprovação da Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho, que procedeu à revisão da Lei de Programação Militar (LPM) e na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, e que veio incluir, nas suas dotações, as verbas necessárias para concretizar o programa de construção da 3.ª série de NPO.
A estimativa das incidências orçamental e financeira, ano a ano, e em termos globais, do Programa NPO foi efetuada no contexto acima descrito, aquando dos trabalhos preparatórios de revisão da Lei de Programação Militar (LPM), aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho, tendo por base o custo atualizado de construção dos NPO da 2.ª série, acrescido de custos de novos sistemas a atualizar e/ou adquirir, fruto das lições apreendidas, como por exemplo, os sistemas de propulsão, armamento e as embarcações de apoio (semirrígidas).
Assim, as dotações financeiras para o programa de aquisição dos seis NPO (3.ª série), encontram- se inscritas no mapa anexo à LPM a que se refere o n.º 1 dos seus artigos 1.º e 4.º, na capacidade Marinha – Patrulha e fiscalização – entre os anos 2019 a 2030, como segue:
(Em milhões de Euros)
LPM/NPO | 2019 | 2020 | 2021 | 2022 | 2023 | 2024 | 2025 | 2026 | 2027 | 2028 | 2029 | 2030 | Total |
LPM - dotações capacidade | 1,9 | 0,5 | 16,0 | 40,0 | 26,0 | 28,0 | 30,00 | 33,0 | 58,0 | 58,0 | 62,50 | 10,0 | 363,9 |
RCM 72/2021, 9JUN - Programa NPO | - | - | 16,5 | 40,0 | 26,0 | 28,0 | 30,0 | 33,0 | 58,0 | 58,0 | 62,5 | - | 352,0 |
A Ficha de projeto (confidencial, entregue na Assembleia da República) prevê apenas o valor total agregado da despesa máxima prevista para o Programa NPO (2019-2029), ou seja, 352 milhões de euros, o qual inclui todos os encargos inerentes à sua execução, incluindo os encargos com a gestão do programa.
E, nos termos do n.º 4 da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, o montante relativo ao contrato em apreço (gestão do programa) está incluído na componente do Programa a que se refere a alínea
b) do n.º 1 da referida Resolução, pelo que os valores desagregados do Programa NPO são os seguintes:
(Em milhões de Euros – valores sem IVA)
Programa NPO | 2021 | 2022 | 2023 | 2024 | 2025 | 2026 | 2027 | 2028 | 2029 | 2030 | Total |
Aquisição dos 6 NPO (*) | 13,3 | 32,2 | 21,0 | 22,5 | 24,1 | 26,5 | 46,6 | 46,6 | 50,2 | - | 283,0 |
MFE, AL e MAF (**) | 3,2 | 7,2 | 4,8 | 5,2 | 5,55 | 6,15 | 11,0 | 11,0 | 10,7 | - | 64,8 |
Gestão do Programa (***) | - | 0,6 | 0,3 | 0,3 | 0,35 | 0,35 | 0,4 | 0,4 | 1,5 | - | 4,2 |
ST alínea b) n.º 1 | 3,2 | 7,8 | 5,1 | 5,5 | 5,9 | 6,5 | 11,4 | 11,4 | 12,2 | - | 69,0 |
Total | 16,5 | 40,0 | 26,0 | 28,0 | 30,0 | 33,0 | 58,0 | 58,0 | 62,5 | - | 352,0 |
(*) Componente a que se refere a alínea a) do n.º 1 da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, que inclui, para além dos navios, a revisão projeto de engenharia e o fornecimento dos bens e serviços de apoio logístico.
(**) Componente a que se refere a alínea b) do n.º 1 da RCM 72/2021, de 9 de junho, e que inclui o Material a Fornecer pelo Estado (MFE) – equipamentos e sistema SEWACO – o apoio logístico à construção e o acompanhamento e fiscalização da construção dos navios.
(***) Custos de gestão do programa previstos no contrato com a IDD (incluídos no montante aprovado para a componente a que se refere a alínea b) do n.º 1 da RCM).
É de referir, ainda, que nos termos do n.º 4 do artigo 8.º da LPM, os saldos verificados no fim de 2021 transitarão para o orçamento do corrente ano, e assim sucessivamente, para reforço das dotações da mesma Capacidade, até à completa execução do Programa NPO, através de abertura de créditos especiais, autorizada pelo membro do Governo responsável pela área da Defesa Nacional.
8. (…)
A subcontratação ou cedência de posição contratual, conforme foi enfatizado no ponto 5 desta resposta, está, inelutavelmente, subordinada à autorização prévia, por escrito, do MDN, de harmonia com o disposto no n.º 1 da cláusula 28.ª.
Assim, para além de critérios contratuais que possam obstar à subcontratação arrolada pela cocontratante, de acordo com o n.º 4 daquela cláusula, o MDN, na sua decisão, deve, naturalmente, observar outros limites de ordem legal. O que, no caso em apreço, tendo como pano de fundo a autovinculação imposta pelos pressupostos que presidiram à especial relação contratual a estabelecer entre o MDN e a IDD a coberto do artigo 5.º-A do CCP, ela condicionará a hipotética subcontratação ou cedência de posição contratual da IDD, restringida ao universo de pessoas coletivas, que comunguem da mesma natureza “pública”, suscetível de ser abrangido e integrado no leque de entidades adjudicantes vertido no artigo 2.º daquele diploma, desde que, sublinha-se, integrem a previsão de “controlo análogo” ínsita naquele normativo. Apenas e só neste caso será possível a subcontratação ou a cessão de posição contratual.
9. (…)
No âmbito da 1.ª fase da gestão do Programa NPO não foi ponderada, nem suscitada, a possibilidade de a IdD proceder à subcontratação de prestação de serviços, dadas, precisamente, as características inerentes àquela entidade e que justificaram a sua escolha.
Contudo, em tese, tal possibilidade não pode ser totalmente excluída, tendo em conta a longa duração do contrato, pelo que, à cautela, não se podem ignorar as vicissitudes que podem perturbar a vida deste contrato, em último caso, até pela circunstância de poderem ocorrer alterações societárias na estrutura da própria cocontratante, de algum modo visionadas na cláusula 29.ª, permitindo-se, nesse caso, ao MDN a faculdade de se socorrer da prerrogativa consentida pela cláusula 28.ª, nos estritos limites sinalizados no ponto anterior.
Já no âmbito do contrato de construção, em que a IDD surgirá eivada de outro estatuto - o de contraente público - ao abrigo do qual, ainda que em representação ou no interesse do MDN, irá estabelecer com o(s) operador(es) económico(s) uma relação sinalagmática, constituindo, neste particular, um encargo que é assacado à IDD delimitar os termos em que o(s) cocontratatante(s) possam recorrer à subcontratação, sendo certo, todavia, que deve obedecer às condições e limites consignados, em especial, no artigo 59.º, do Decreto-Lei n.º 104/2011, e no capítulo VI da parte III do CCP.
10. (…)
No âmbito dos contratos da Defesa, em particular os de maior expressão financeira e complexidade, a função de acompanhamento permanente da execução contratual é, desde há muito, assegurada pelas designadas Missões ou Equipas de Acompanhamento e Fiscalização (MAF ou EAF), como acontece no caso presente.
A partir de janeiro de 2018, com a entrada em vigor da figura do “gestor do contrato” introduzida pela revisão de 2017 do CCP, o chefe ou coordenador da(s) MAF ou EAF passou a ser designado como “gestor do contrato”. Compete assim, ao chefe da equipa garantir as funções que, por lei, são atribuídas ao gestor do contrato, cabendo-lhe assegurar, designadamente, a função de principal interlocutor e representante do contraente público no seu relacionamento com o cocontratante na fase de execução contrato e a coordenação dos trabalhos a desenvolver pela MAF ou EAF, conforme definido no respetivo despacho de constituição, de modo a assegurar o acompanhamento permanente da execução contratual nas suas várias vertentes (técnica, material e financeira) e o reporte periódico à entidade adjudicante, para os efeitos que forem tidos por convenientes.
Deste modo, o Despacho n.º 4/DIR/2022, já junto aos autos, seguiu a mesma metodologia, constituindo a EAF e definindo as atribuições desta, e indicando expressamente que a função prevista no artigo 290.º-A do CCP é assegurada pelo chefe da EAF, conforme especificado no contrato (cláusula 21.ª, n.º 2) e no n.º 3 daquele Despacho.
Assim, não obstante as alterações recentemente introduzidas no artigo 290.º-A, pelo Decreto-lei n.º 30/2021, de 21 de maio, não se vislumbra a necessidade de alterar a metodologia que tem vindo a ser adotada para este tipo de contratos, uma vez que, optando a entidade adjudicante por atribuir a função de “gestor do contrato” a um determinado indivíduo (no caso, ao chefe da EAF), a equipa, cujos trabalhos este coordena, terá a função de coadjuvar o gestor do contrato no exercício da sua função.
11. (…)
Sobre esta matéria remete-se para a resposta ao quesito 7.d.
12. (…)
Para melhor enquadramento das questões 12. e 13. importa referir o seguinte:
A LPM atualmente em vigor foi aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho. Os fatores de planeamento que serviram de suporte à lei previam, à data, dotações entre os anos de 2020 a 2029, a assinatura do contrato de construção dos NPO em 2019 e as entregas dos navios, respetivamente em 2022, 2024, 202C, 2027, 2028 e 2029.
Após trabalhos internos de preparação e decisão política, foi proposta a RCM a autorizar a despesa, em 29 de outubro de 2020. A RCM foi aprovada no dia da Marinha (20 de maio de 2021), decorridos cerca de sete meses depois da proposta inicial e dois anos após a aprovação da LPM. Neste contexto, a RCM continha já uma primeira “atualização” do plano de entregas, a saber: 2023, 2024, 202C, 2027, 2028 e 2029. O valor total das dotações iniciais previstas na LPM para o programa manteve-se, tendo sido atualizada a dotação prevista para o ano de 2021 (somatório das dotações previstas de 2020/2021).
O contrato agora objeto de fiscalização foi assinado em 28 de janeiro de 2022. Mais de um ano após a proposta de RCM e cerca de 3 anos após a revisão da LPM. Durante os trabalhos de elaboração do contrato, foi considerado como o mais adequado, prever o melhor planeamento de entregas conhecido à data, sem qualquer alteração dos montantes máximos estipulados para a despesa, prevista na RCM e enquadrada legalmente nas dotações da LPM aprovadas pela Assembleia da República. Ficou assim estipulado, contratualmente, as seguintes datas de entregas que deverão constar no contrato de construção ainda a ser elaborado e contratualizado: 2025, 202C, 2027, 2028, 2029 e 2030. Estas datas refletem, necessariamente, o hiato temporal já decorrido desde a aprovação da LPM. Importa relevar que durante a execução do programa, a LPM será revista, pelo menos, mais duas vezes e que o plano de entregas e a calendarização financeira serão, nesse contexto, atualizados conforme se revelar necessário.
Neste enquadramento, durante a preparação e negociação da minuta de contrato a celebrar com a IDD constatou-se que, tendo em conta os prazos médios de construção dos navios, bem como o tempo necessário para a execução de todos os serviços e trabalhos que necessariamente precedem o início da sua construção, o calendário de entregas previsto no Anexo I à RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, não era já exequível, tornando-se por essa razão necessário reajustar, mais uma vez, os prazos de receção provisória dos NPO.
Tendo sido a questão identificada e colocada superiormente a S. Ex.ª o Ministro da Defesa Nacional, a indicação expressa resultante do seu Despacho de 22 de julho de 2021, constante do ofício n.º 32C8/CG (já junto aos autos sob a designação Elementos_ Complementares_Despacho MDN 22-07-2021), foi no sentido de que “(…) os prazos previstos (leia-se, na RCM) para a entrega dos navios devem ter-se por indicativos ou previsionais (…)”, termos em que foi atualizado o calendário de entregas, prevendo-se atualmente que a entrega do primeiro navio ocorra no ano de 2025 (ao invés de 2023) e o sexto no ano de 2030 (ao invés de 2029).
Ou seja, o deslizamento dos prazos referidos reflete um juízo de antecipação assumido por S. Ex.ª o Ministro da Defesa Nacional, em que os prazos previstos na referida RCM cedem à realidade das circunstâncias, situação a que não será, certamente, alheia a inevitável introdução de ajustamentos na RCM, o que só deverá acontecer após a revisão da própria LPM, (conforme previsto no seu artigo 15.º, será revista no presente ano para entrar em vigor em 2023). Refira-se que, neste tipo de programas de edificação de capacidades militares a longo prazo, esta situação não é inédita assistindo-se, por vezes, a uma falta de sintonia entre os calendários de execução planeados e a sua efetiva operacionalização e a consequente necessidade de atualização.
13. (…)
A programação financeira (anual) prevista no Anexo II da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, tem por base o calendário de entregas dos NPO constante do Anexo I, o qual, conforme referido no ponto anterior, foi ajustado, em face dos prazos de execução expectáveis e mediante concordância expressa de S. Ex.ª o Ministro da Defesa Nacional, provocando naturalmente o diferimento dos correspondentes encargos.
Sendo certo que a RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, aprova o montante máximo de despesa global do Programa (352.000.000,00€ acrescido de IVA à taxa legal em vigor), e estabelece os tetos máximos anuais a respeitar entre os anos de 2021 a 2029 constantes do Anexo II, salienta-se que aos montantes máximos anuais (dotações iniciais) acrescem os saldos transitados apurados na execução orçamental dos anos anteriores, até à completa execução do programa, conforme previsto no n.º 2 da RCM, em conformidade com o permitido pelo o n.º 4 do artigo 8.º da LPM:
“4 — Os saldos verificados no fim de cada ano económico transitam para o orçamento do ano seguinte, para reforço das dotações das mesmas capacidades até à sua completa execução, através de abertura de créditos especiais, autorizada pelo membro do Governo responsável pela área da defesa nacional.”
Em igual sentido, as dotações anuais serão reforçadas pela transferência de verbas oriundas da restituição do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) suportado pelo Estado, conforme previsto no n.º 3 da RCM n.º 72/2021 com suporte no n.º 2 do artigo 8.º da LPM.
Assim, reputa-se como legalmente possível a previsão de encargos para além do ano de 2029, desde que os mesmos se contenham dentro do limite máximo de despesa aprovado pela RCM 72/2021, de 9 de junho, e sejam satisfeitos através dos montantes que venham a resultar da transição de saldos não executados em ano(s) anterior(es).
Tendo em conta que, conforme já salientado, a atual LPM vai ser objeto de revisão no curto prazo (processo de revisão a iniciar ainda este ano), a programação financeira da capacidade “Patrulha e Fiscalização” e, consequentemente, do Programa NPO, deverá ser será objeto do necessário ajustamento, através dos respetivos e adequados instrumentos.
14. (…)
De acordo com os fatores de planeamento utilizados, a programação financeira anual, conforme estabelecido nas cláusulas C.ª e 8.ª, é a que consta na seguinte tabela:
15. (…)
Conforme decorre, desde logo, da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, e do contrato assinado, a IDD assumirá algumas competências do MDN, como será o caso da prática do ato de adjudicação e outorga na esfera do contrato de construção. No entanto, como já se teve oportunidade de assinalar na resposta à questão 5, esse e outros passos que conformam a ação da IDD no âmbito do contrato, são sindicados e submetidos à aprovação do MDN, pelo que, em bom rigor, materialmente, a projeção dos efeitos dos atos a produzir pela IDD, está sujeita à emanação, vinculativa, da decisão do MDN.
Neste sentido, no contexto do procedimento de formação do contrato para a construção dos navios, a escolha do tipo de procedimento adjudicatório a realizar e o respetivo preço-base ou a definição e formulação do tipo contratual público a estabelecer por parte da IDD, será realizada de forma
autónoma e diretamente responsável, mas sempre sob a atividade de coordenação do MDN, através da DGRDN, que reserva na sua esfera jurídica de competências, no contexto contratual em causa, certos poderes típicos da superintendência administrativa, concernentes à conformação da relação contratual estabelecida, devendo a IDD cooperar e colaborar neste particular podendo, no limite, ser até suscitada a anulação e revogação dos atos da IDD, nas matérias que atinjam os fundamentos da satisfação da necessidade em apreço.
Assim, o contrato interadministrativo adotado na relação a constituir entre o MDN e a IDD, autorizado pelo disposto nos artigos 5.º-A e 338.º, do CCP, afigura-se suficiente, na perspetiva deste Ministério, estribada, ainda, na obrigatoriedade que impende sobre a IDD relativamente aos contratos “outorgados em representação do MDN, em execução do Programa de Aquisição dos seis NPO,” serem remetidos a «visto prévio» ou a «declaração de conformidade» pelo Tribunal de Contas.
Diga-se, aliás, que o regime consagrado no artigo 338.º, do CCP, limita-se a amplificar a herança do regime inovador previsto nos artigos 179.º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo (CPA) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de novembro, entretanto revogado pelo artigo 14.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 7 de janeiro (que aprovou o CCP), no quadro, designadamente, das relações de cooperação entre os entes públicos. Não é seguramente, um acaso, que a opção de enxertamento daquele regime tenha recaído, precisamente, no CCP.
Na verdade, o regime sinalizado constituiu um traço indelével na composição do exercício dos poderes públicos da Administração, projetada na possibilidade de recorrer aos contratos administrativos para prosseguir as suas atribuições. Mas mais, defendia Xxxxxx xx Xxxxxxx (CEFA, pág. 101) que, para além dos contratos administrativos nominais consignados no nosso ordenamento jurídico, admitia a faculdade da administração celebrar quaisquer contratos atípicos, apenas com as limitações decorrentes da lei ou da natureza das relações a estabelecer, corolário da tese acolhida no sistema jurídico português “dos contratos administrativos substitutivos e integrativos de atos administrativos”. Esta posição doutrinária já vivificada no CPA aprovado pelo DL n.º 442/91, tem, hoje, pleno eco no art.º 33C.º, do CCP, alargada aos “demais contratos sobre o exercício de poderes públicos”.
A autonomia contratual dos contraentes públicos expressa-se, ainda, com relevância para a questão em apreço, num segmento específico dos contratos: os contratos administrativos de cooperação, que resultam da cooperação entre contraentes públicos. A qualificação em torno deste tipo dos contratos administrativos, enquanto instrumento capaz de aquilatar a cooperação entre entes públicos na realização de atribuições comuns ou o cumprimento de deveres legais da mesma natureza tem na sua génese, em particular, a distinta e a notável marca do Professor Xxxxxxx Xxxxxxx (Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, págs. 420 e segs.). O recurso à modalidade do contrato interadministrativo, consentido pelo artigo 338.º, também daquele diploma, pode assumir roupagens distintas, desde que não ofendam ou contrariem a lei
ou a “natureza do poder exercido através do contrato”, não excluindo aquele comando legal a aplicação das disposições constantes da parte III, do CCP. O n.º 2, do artigo 338.º, do CCP, acolhe, claramente, a admissibilidade da sua aplicação, em certas circunstâncias, “pelo qual um deles se submeta ao exercício dos poderes de autoridade pelo outro”, pois, conforme refere Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx (Código comentado e anotado, 2008), “o n.º 1 (…) não afasta a possibilidade da celebração de contratos heterogéneos, que pressupõem alguma subordinação de uma das partes à outra.”.
Firmado no normativo ínsito no n.º 2, do artigo 338.º, do CCP, permitiu-se convocar o artigo 33C.º, que praticamente o precede, para (re)definir através da consensualização alcançada pelas partes, sobre o modo do exercício dos poderes públicos pela idD, relativamente à prática de determinados atos administrativos na alçada do MDN. O contrato celebrado conciliou, pois, no seu regaço, a elasticidade, excecional, conferida com larga margem aos contraentes públicos na edificação dos “compromissos” que densificam os contratos interadministrativos, por um lado, e a importação das regras previstas no artigo 33C.º, admitida pelo n.º 2, do artigo 338.º, por outro, e que traduz um adágio sobejamente conhecido e aplicado na interpretação das normas jurídicas: “quem pode o mais, pode o menos”. Por outras palavras, se o artigo 33C.º abraça a possibilidade dos particulares concorrerem com o contraente público na definição de parte ou totalidade do ato administrativo, mediante a outorga de um contrato – V. os abundantes exemplos contidos, a este propósito, na anot.ª ao art.º 33C.º, do CCP (Código comentado de Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx) -, então, não se descortinaria qualquer razão para que a relação entre dois contraentes públicos não pudesse ser norteada por idêntico princípio, sabendo, ademais, que, não sendo um princípio absoluto, tratando-se de duas entidades públicas, sobressaem especiais garantias na observação dos parâmetros de legalidade na conformação da respetiva relação.
Isto sem querer dizer que, in casu, o contraente público fosse despido das vestes de autoridade que caracterizam o exercício dos poderes públicos, assumindo o MDN, indiscutivelmente, uma posição altaneira na relação estabelecida com a IDD, face à subordinação jurídica deste no contrato celebrado entre ambos.
Portanto, sem perder de vista os poderes públicos do MDN, o contrato preservou na esfera jurídica do MDN um núcleo de poderes, refletidos, em última análise, num instrumento de “veto”, à sua disposição, sobre as decisões tomadas pela IDD, conforme a melhor explanação já alinhada na resposta à questão ao ponto 5. Dito de outro modo, qualquer decisão adotada, hipoteticamente, pela IDD, ancorada nas competências do MDN, franqueadas por este contrato, que manche, designadamente, os princípios ou normas legais do CCP que conformam este contrato, soçobra, de imediato, sendo certo que o MDN não hesitará em socorrer-se do referido instrumento, que, povoa, aliás, diversas cláusulas estipuladas no contrato, nos termos já referidos no ponto 5.
Bem vistas as coisas, poder-se-á até afirmar, num plano substantivo, que a decisão de contratar, verdadeiramente, nunca descola totalmente do perímetro das competências do MDN, já que, qualquer desalinhamento da pronúncia da IDD com os valores que inspiram o CCP, autoriza o
MDN a laquear os seus efeitos, de acordo, nomeadamente através da figura da “resolução”, invocada no art.º 33C.º, conjugado com os artigos 302.º e 307.º, n.º 2, al. a), todos do CCP, tomando com certo que as posições (decisões) relativas das partes assentes, no contrato, não colocam o MDN e a IDD num plano paritário, cedendo a segunda, face à primeira.
Sendo esta a linha de raciocínio que estratifica a opção por este contrato, atípico, reconheça-se, resultante da interação defendida entre os artigos 338.º e 33C.º, do CCP, admite-se, contudo, visto de um ângulo conceptual, a possibilidade, subsidiária, do recurso à figura da delegação de poderes prevista no artigo 44.º, n.º 1, in fine, do CPA, enquanto uma exigência formal que se constituirá como necessária ao suporte de transferência do exercício de poderes para a IDD, em concreto, face ao(s) procedimento(s) concursal(ais) a desenvolver que venham a estar previsto(s) no âmbito do Plano Global de Execução do Contrato planeado pela IDD – sujeito à aprovação do MDN, conforme a cláusula 1Cª, n.º 1, alínea a) - , atento o facto da IDD ser uma sociedade integrada no perímetro do sector público empresarial da defesa nos termos do artigo 8.º, do Decreto-Lei n.º 183/2014, de 29 de dezembro, submetida à influência dominante do MDN, ao abrigo do disposto no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, cujo escopo concorre para o desenvolvimento da base tecnológica e industrial da defesa na esteira do artigo 1.º, n.º 5, da Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho.
Assim, Sua Excelência o Ministro da Defesa Nacional, habilitado para o efeito pelo n.º 7 da RCM n.º 72/2021, e pelo artigo 109.º, n.ºs 1 e 3, do CCP, em face do(s) efetivos(s) contrato(s) a celebrar tendo em vista a execução do Programa NPO, poderá vir a delegar, na IDD, com maior ou menor extensão, consoante o caso, os poderes que o próprio contrato já admite.
Salienta-se que a possibilidade da delegação de competências em órgão de diferente pessoa coletiva, encontra previsão no n.º 1 do artigo 44.º, do CPA – “Os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um ato de delegação de poderes, que outro órgão ou agente da mesma pessoa coletiva ou outro órgão de diferente pessoa coletiva pratique atos administrativos sobre a mesma matéria.” – e acolhimento na doutrina.
Nesta ponderação, não é despiciendo o facto de a IDD, não obstante a sua natureza jurídica empresarial, ser uma “entidade pública reclassificada” (à luz da lei orçamental financiada por “receitas gerais” inscritas no orçamento do programa orçamental da Defesa - art.º 12.º, n.º 1, da LOE 2021) e estar sujeita ao “controlo análogo” do Estado, à semelhança do que acontece com os institutos públicos. E, como nos ensina Xxxxxxxx Xxxxxxx, a propósito das várias categorias de institutos públicos “o que faz com que uma empresa, em sentido económico, possa ser considerada pública, é a conjugação dos capitais públicos com a direção pública, ou seja, os capitais são fornecidos por uma pessoa coletiva de direito público e os órgãos dirigentes da empresa são nomeados e exonerados pelo Governo, ao qual pertencem ainda os poderes de tutela.”(XXXXXXX, Xxxxxxxx, Manual de Direito Administrativo, 10ª Edição revista e atualizada pelo Prof. Doutor Xxxxx Xxxxxxx do Amaral, Tomo I, Coimbra Editora, 1973, pág. 378). Dito de outro modo, por
Freitas do Amaral, “as empresas públicas, como de resto todos os institutos públicos, estão sujeitas à intervenção do Governo, que reveste as modalidades da superintendência e da tutela (…) É que, enquanto as autarquias locais são independentes do Estado, as empresas públicas (como os demais institutos públicos) não o são. Gozam de autonomia, é certo, mas não de independência. As empresas públicas não se autoadministram, como as autarquias locais: desenvolvem uma administração estadual indireta.” (AMARAL, Diogo Freitas do,Curso de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, Coimbra, 1987, pág. 355/358).
Integrando-se a IDD no conceito de “empresa pública”, por força dos artigos 2 .º, 3.º, 5.º e 13.º, do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, na sua redação atual, e exercendo o Estado (através do Ministro da tutela e do Ministro das Finanças) uma influência dominante direta, traduzido nos poderes e controlo do Governo, previstos designadamente nos artigos 24.º a 29.º, do referido diploma, não parecem subsistir razões substantivas que obstem à delegação de poderes, entendida como “o acto pelo qual um órgão da Administração, normalmente competente em determinada matéria, permite, de acordo com a lei, que outro órgão ou agente pratiquem atos administrativos sobre a mesma matéria.” (Idem, pág. C33/C34), para tanto bastando que estejam reunidos os três requisitos legais, ou seja, para além do ato de delegação propriamente dito, a existência de uma norma habilitante (que preveja expressamente a faculdade de um órgão delegar poderes noutro) e a existência de dois órgãos, o delegante (o normalmente competente) e o delegado (o eventualmente competente), da mesma pessoa coletiva ou de pessoas coletivas distintas. Isso mesmo admite Xxxx Xxxxxxx, ao afirmar: “Embora a maioria esmagadora dos casos de delegação ocorra, entre nós no âmbito de relações interorgânicas, ou seja, entre órgãos da mesma pessoa colectiva pública (…) em Portugal, conhecem-se múltiplos casos de delegação entre órgãos de pessoas coletivas diferentes: delegações de competências da câmara municipal nas juntas de freguesia (…), e delegações de membros do Governo em órgãos directivos de institutos públicos. Se nos recordarmos do que noutro ponto se disse quanto ao significado da personalidade colectiva dos entes públicos a que chamámos instrumentais, facilmente se compreenderá que a previsão da delegação nestes de competências de órgãos do Estado resulta de eles não serem tratados como pessoas colectivas autónomas, mas como serviços integrantes da organização estadual.” (CAUPERS, João, Direito Administrativo I – Guia de Estudo, Editorial Notícias, 199C). Salienta- se que, no conceito de administração indireta (instrumental), estão incluídos os institutos públicos e as empresas públicas.
1C. (…)
A verba prevista na cláusula 4.ª do contrato não será objeto de transferência para a IDD, sendo a sua execução uma competência exclusiva a cargo da Marinha, nos termos da cláusula 1.ª, alínea e), do contrato, de acordo com as dotações inscritas na capacidade Marinha – Patrulha e Fiscalização - conforme mapa anexo à LPM, e conforme decorre do n.º 3 da RCM n.º 72/2021 e do n.º 7 do seu Anexo III.
17. (…)
Tomando como segura a ampla margem de conformação consentida às partes na regulação deste contrato, amplificada pela natureza interadministrativa do contrato (artigos 5.º-A e 338.º do CCP), o “silêncio” previsto no n.º 2 da cláusula 1C.ª resulta do acordo gizado entre os outorgantes, enquanto mecanismo que visa imprimir celeridade na condução do Programa NPO+, obstando a situações que, resultado da falta de resposta, inquinassem o cumprimento de prazos na construção dos NPO, iluminado pelo princípio da liberdade contratual, autorizado pelos artigos 279.º e 280.º, n.º 4, do CCP.
Admitindo que o “deferimento tácito” possa emergir, resultado, nomeadamente, de um equívoco na contagem do prazo de 15 dias para a pronúncia do MDN, consagrado no n.º 2 da cláusula 1C.ª
– não se pretende, note-se, que o “silêncio” possa constituir o paradigma no processo decisório do MDN -, a mesma cláusula 1C.ª, no número 3, contém uma solução de recurso que permite que o MDN emita “ordens, instruções e diretivas” suscetíveis de corrigirem os eventuais efeitos perniciosos decorrentes da circunstância de ser tomada uma “decisão” tácita que contrarie as finalidades do Programa NPO - ainda que a ratio da cláusula 1C.ª, n.º 3, seja mais abrangente, envolvida pelos poderes de direção e fiscalização do cumprimento do conjunto de obrigações contratuais acopladas à IDD, que vai para além no n.º 2 da cláusula 1Cª, e não almeje, portanto, prevenir, unicamente, quaisquer efeitos não desejados pelo MDN, ditados pelo seu “silêncio”.
18. (…)
O valor previsto na cláusula 27.ª não se encontra inserido no preço contratual. A percentagem residual do valor de eventuais serviços ou trabalhos complementares correspondente a 1% do preço contratual, reflete a necessidade de balizar a elasticidade conferida pelo artigo 370.º, n.º 4, do CCP, recentemente alterado, consignando assim uma limitação dissuasora de “trabalhos imprevistos” que, a verificar-se, estará sujeita a uma nova autorização de despesa, tudo se passando como se de uma nova “resolução” se tratasse.
(…)”.
x. Em Sessão Diária de Visto de 17-03-2022 foi decidido devolver o contrato à entidade adjudicante, entre outros, para os seguintes efeitos:
“1. Atendendo ao objeto contratual e ao âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 104/2011, indique qual a norma que fundamenta o afastamento do regime de contratação especial previsto no Decreto-Lei n.º 104/2011.
2. Remeta todas as atas respeitantes às reuniões de negociação do contrato em apreço.
3. Demonstre, documentalmente, que os valores dos serviços associados ao contrato se contêm dentro dos preços de mercado para serviços de idêntica natureza, remetendo toda a documentação que serviu de suporte à decisão de contratar sem sujeição às regras da concorrência.
4. Remeta os estudos realizados nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 18.º da Lei de Enquadramento Orçamental que antecederam a aprovação do programa de aquisição de seis navios de patrulha oceânicos (NPO), neles evidenciando a parte relativa ao contrato em apreço.
5. Pondere proceder à retificação do clausulado contratual, através de adenda, de forma a eliminar do mesmo a possibilidade de subcontratação prevista na cláusula 28.ª.
(…).”
y. A entidade Requerente veio responder àquela notificação através de email datado de 27-04- 2022 (registo n.º 6539/2022), nos seguintes termos:
“1. (…)
Conforme sublinhado na resposta anterior formulada por esta Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, relativamente à questão suscitada no ponto 2 do texto anexo ao Of.º DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro, a integração da Diretiva n.º 2009/81/CE (Diretiva da Defesa) no ordenamento jurídico nacional, através do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, não inibe ou afasta o recurso às soluções contempladas no regime regra da contratação pública adotado pela Diretiva n.º 2014/24/EU (Diretiva Clássica), e enxertadas no CCP, na esteira da linha da orientação pugnada no ponto 2.1 da Comunicação 2019/C 157/01, da Comissão Europeia (Publicada no JOUE C 157/01 de 8.5.2019).
E tanto assim é, que o próprio artigo 73.º do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro, admite o convívio entre um e outro diploma, prevendo a aplicação, subsidiária, do CCP, em tudo o que não esteja regulado naquele diploma.
É, pois, o comando legal ínsito no artigo 73.º, do Decreto-Lei n.º 104/2011, que autoriza o recurso ao disposto no artigo 5.º-A, do CCP, sabendo que o Decreto-Lei n.º 104/2011 não contém uma norma que perfilhe uma solução idêntica ou análoga à prevista naquele dispositivo do CCP, o qual se afigura decisivo na promoção de uma solução consentânea com a natureza das entidades envolvidas, partes no contrato.
2. (…)
A documentação relevante referente à negociação do contrato foi já enviada a esse Tribunal em sede da resposta anterior, nomeadamente os documentos que marcam o início e o final do processo negocial, do qual, formalmente, não foram lavradas atas.
3. (…)
Para o efeito, enviam-se em anexo dois Sales Agreement celebrados com a NSPA (Nato Support Procument Agency), que atestam o valor (fee) cobrado por esta Agência em serviços similares:
• Elemento Complementar_3_SA PRT 53 AAA
• Elemento Complementar_3_SA PRT C2 RC 4. (…)
Sobre esta questão reitera-se o explanado na resposta anterior no sentido de que os estudos que antecederam a aprovação do Programa NPO, alicerçam-se, não nos estudos a que se refere o n.º
3 do artigo 18.º da LEO, mas sim na documentação estruturante relativa às capacidades militares
- nomeadamente Missões das Forças Armadas 2014 (MIFA 2014), Conceito Estratégico Militar (CEM 2014) e Sistema de Forças 2014 (SF 2014) – que conformaram a informação com base na qual a Assembleia da República, autorizou e integrou, na Lei de Programação Militar (LPM), aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2019 de 17 de junho, o Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (Programa NPO) e o respetivo financiamento.
Ademais, afigura-se que a necessidade dos estudos a que se refere o n.º 3 do artigo 18.º da LEO - “3 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores a avaliação da economia, da eficiência e da eficácia de investimentos públicos que envolvam montantes totais superiores a cinco milhões de euros, devem incluir, sempre que possível, a estimativa das suas incidências orçamental e financeira líquidas ano a ano e em termos globais.” – se encontra satisfeita através dos mapas financeiros que acompanham a LPM enquanto ´plano ou programa plurianual legalmente aprovado´, onde constam as estimativas das incidências orçamentais, ano a ano e globais, conforme mapa Anexo à LPM (anexo a que se refere o n.º 1 do artigo 1.º da LPM).
Pese embora o suprarreferido, importa salientar o seguinte:
Os NPO da classe «Viana do Castelo» destinam-se a prover a edificação da capacidade de patrulha e vigilância, com os 10 NPO previstos no sistema de forças, aprovado pelo Conselho Superior de Defesa Nacional, nos termos do artigo 5.º da Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas, aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2021, de 9 de agosto.
O espectro de missões previstas na capacidade de patrulha e vigilância são nomeadamente o de patrulha dos espaços marítimos sob soberania, jurisdição ou responsabilidade nacional, no cumprimento dos compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português no âmbito da salvaguarda da vida humana no mar e da busca e salvamento marítimo, designadamente os decorrentes das convenções Safety of Life at Sea (SOLAS - 1974) e Maritime Search and Rescue (SAR - 1979). Além disso, esses navios são também fundamentais para assegurar a fiscalização da pesca, o controlo dos esquemas de separação de tráfego, a prevenção e combate à poluição marítima, bem como a prevenção e combate a atividades ilegais como o narcotráfico, a imigração ilegal, o tráfico de pessoas ou armas e outros ilícitos, em colaboração com outras autoridades nacionais e europeias.
No âmbito da capacidade, pretende-se também assegurar o empenhamento de meios navais oceânicos em missões de capacitação operacional marítima dos Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e uma contribuição mais expressiva em operações de segurança cooperativa no âmbito da Iniciativa 5+5 e da União Europeia (UE), designadamente no combate às redes de migração irregular, no âmbito da Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira, e na preservação dos recursos piscícolas, no quadro da Organização das Pescarias do Noroeste Atlântico e da Comissão de Pescas do Atlântico Nordeste.
Existe, por outro lado, a necessidade de dotar os novos navios com capacidades multifunções que lhes acrescentem flexibilidade de emprego operacional e que permitam contribuir e dar resposta a
missões no extremo superior do espetro de empenhamentos, com particular realce para a guerra de minas, a vigilância submarina, a projeção de força e a recolha de informações operacionais. Essas capacidades acrescidas permitirão empregar meios no quadro da Organização do Tratado do Atlântico Norte, através da possível participação no âmbito da segurança coletiva, viabilizando também o empenhamento destes meios navais no contexto da Organização das Nações Unidas e da UE, em missões de segurança marítima e em operações de paz.
No presente, esta capacidade tem sido assegurada recorrendo a quatro NPO e às duas corvetas das classes «Xxxx Xxxxxxxx» e «Xxxxxxxx xx Xxxxxxx» (que restam das 10 iniciais), estas com 4C e 50 anos de idade e que há muito ultrapassaram a estimativa de vida útil de 35 anos para a qual foram projetadas.
Por se ter ultrapassado largamente a vida útil das corvetas, verifica-se em concomitância um significativo desgaste/fadiga das plataformas, bem como uma obsolescência generalizada dos sistemas e equipamentos instalados, pelo que se considera não ser economicamente viável a realização de ações de manutenção de regeneração, executando-se apenas as estritamente necessárias para garantir os padrões mínimos de operacionalidade e de segurança destes meios. Os quatro NPO, entretanto, construídos, têm cumprido, de uma forma reconhecidamente satisfatória, as missões que lhes foram sendo atribuídas, demonstrando a sua polivalência e excelentes capacidades para suportar o mar, sendo, contudo, em número significativamente insuficiente para garantir as obrigações do Estado e da Marinha no mar.
Procura-se assim, com a conclusão deste programa, garantir a edificação da capacidade de patrulha e vigilância com meios que cumpram o largo espectro de missões a atribuir, que sejam tecnologicamente evoluídos e que permitam obter um conjunto alargado de ganhos de eficiência pela sua gestão integrada, tanto na sua componente de operação como de manutenção.
Estatisticamente, nas Marinhas, a relação de custos entre a aquisição de sistemas e a sua operação e manutenção é de um para três unidades monetárias (Melo, Gouveia 2019. Uma Marinha útil e minimamente significativa. Comissão Cultural de Marinha, Cadernos Navais n.º 53 julho – setembro, ISBN: 978-989-8159-92-2), pelo que, considerando que o programa de aquisição dos C navios orça em 352.000.000,00 €, estima-se os encargos com a operação e manutenção, ao longo dos 35 anos do seu ciclo de vida, em cerca 1.055.800.000,00 €, conforme granulado nos pontos seguintes.
No que à manutenção planeada dos navios concerne, está estabelecido um ciclo operacional de 48 meses, repetível ao longo da sua vida útil, e que prevê ações de manutenção com diferentes alcances (conforme ilustração infra).
Adicionalmente, considerando um custo não recorrente referente à componente de modernização de meio de vida (cerca de 25% do custo dos navios), imperativa para a manutenção das capacidades operacionais e à sustentação logística do meio naval, estima-se que o encargo global de manutenção, ao longo do ciclo de vida, para todos os navios, seja de 438.300.000 €.
Relativamente à operação, considerando o conceito de emprego padrão destes navios (220 dias de missão/C0 % de navegação), influenciado, em grande medida, pelo facto da guarnição dos NPO ser 37% inferior à das corvetas, e atento ao histórico existente, estima-se que o custo de operação dos NPO seja cerca de 27% inferior ao de uma corveta (quadro infra), o que representa um encargo total, para os C navios ao longo dos 35 anos de vida útil, de cerca de C17.500.000 €.
Já quanto ao valor do contrato ora em apreço dado o âmbito dos serviços a contratar, aporta-se que este não provoca outras incidências orçamentais e financeiras para além das já previstas na LPM, na RCM n.º 72/2021 e no plano de pagamentos previsto e já conhecido desse Tribunal.
5. (…)
Não obstante se reiterar a fundamentação constante da resposta anterior formulada por esta Direção-Geral, que propugna pela possibilidade de subcontratação desde que, eventuais subcontratados, reúnam as mesmas condições que permitiram a contratação da IdD à luz do artigo 5.º-A, n.º 1, do CCP, tendo em vista ir ao encontro da recomendação ventilada por esse Tribunal, foi acolhida, pelas partes, a alteração da cláusula 28.ª do contrato, a qual veda a possibilidade de recurso à subcontratação para a prestação dos serviços contratualizados à IdD, bem como à cessação da posição contratual, conforme adenda que se junta em anexo.”
z. Em Sessão Diária de Visto de 06/05/2022 foi decidido devolver novamente o contrato à entidade adjudicante para ulterior pronúncia, nos seguintes termos:
“1. Atento o disposto nos artigos 2.º e 3.º da LPM e no n.º 2, do artigo 4.º da LOMDN, esclareça como considera legalmente possível a atribuição da competência para a gestão da aquisição dos C NPO à IDD, uma vez que as competências que resultam de tal atribuição não parecem ser passíveis de delegação em entidades que não integram os serviços centrais do MDN;
2. Sem prejuízo da questão anterior, demonstre, justificadamente, que a despesa que o contrato em apreço comporta se pode considerar como estando incluída no âmbito dos investimentos públicos das Forças Armadas, a que respeita o n.º 1 do artigo 1.º da LPM;
3. Enquadre ainda a prestação de serviços em apreço no âmbito do objeto social da IDD, demonstrando que o mesmo se insere nas atribuições que lhe estão legalmente atribuídas;
4. Atendendo à missão e know how da Armada Portuguesa, esclareça como considera que a gestão da aquisição dos C navios NPO, se encontra melhor acometida à IDD;
5. Atendendo a que não se considera estar ainda demonstrado, nem por via dos estudos prévia, nem por via da documentação relativa a “Sales Agreement” celebrados com a NSPA, insiste- se para que demonstre que a decisão de contratar os serviços em apreço (e não a aquisição dos NPOs) foi devida e legalmente fundamentada, com base em estudos de custo-benefício, que abordem as matérias da economia, eficácia e eficiência da celebração do contrato em apreço, com a IDD, com comparação com outras alternativas, quer sejam por via de externalização, quer por via de utilização de recursos internos;
C. Na sequência da questão anterior, demonstre detalhadamente, a adequação dos preços relativos a cada componente do objeto contratual;
7. Tendo presente a natureza do contrato em apreço, bem como o objeto do mesmo, esclareça de que forma considera que o superior interesse segurança e defesa nacional se encontra devidamente acautelado por uma entidade externa às Forças Armadas.”
aa. A entidade requerente veio responder àquela notificação através de email datado de 25/05/2022 (registo n.º 7862/2022), nos seguintes termos:
“1. (…)
Conforme salientado na resposta formulada pela Direção-geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) às questões suscitadas nos pontos 15 e 1C do V/Of.º DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro, para as quais se remete, a gestão pela IDD do programa de aquisição dos seis NPO resultada determinação expressa na RCM n.º 72/2021. Todavia, este aspeto não significa que o mesmo se encontre eximido do controle do MDN, nos termos fixados no contrato interadministrativo celebrado com a IDD, à luz do artigo 338.º, do CCP.
Efetivamente, n.º 1 do artigo 2.º da LPM atribui ao Governo a competência para promover a execução do objeto compreendido na presente Lei, a qual é, tendencialmente, centralizada nos serviços centrais do Ministério da Defesa Nacional (MDN), determinando o n.º 2 que tal execução se concretiza através da assunção dos compromissos necessários para implementação das capacidades nela previstas.
Os artigos 2.º e 3.º da LPM remetem-nos, pois, para um plano que cai na alçada da decisão e do acompanhamento político-financeiro, respetivamente, do Governo e da Assembleia da República, que não é posto em causa neste Programa, na medida que os mecanismos de controle da execução do contrato celebrado com a IDD, por um lado, e as verbas acopladas a este Programa, por outro, mantém-se em ambos os casos na esfera da competência dos serviços centrais do MDN.
A circunstância do citado artigo 2.º, n.º 1, da LPM, conferir, tendencialmente, aos serviços centrais do MDN a promoção da execução da LPM não é, quanto a nós, de todo incompatível com a opção assumida ou, pelo menos, não se traduz numa impossibilidade absoluta da “transferência” das
atribuições do MDN para a IDD no que diz respeito à condução dos procedimentos de contratação, conforme resulta, aliás, do n.º 3 do artigo Cº da LPM, sendo certo que são planos distintos.
Na realidade, no que refere à condução dos procedimentos de contratação, o artigo C.º, n.º 1, conjugado com o n.º 2 do mesmo artigo, da LPM, esclarece que os respetivos procedimentos podem ser conduzidos de forma centralizada pelos serviços centrais do MDN, não excluindo, porém, que outras entidades possam desenvolver tais procedimentos. Tanto assim é que o n.º 3 daquele artigo admite que tais procedimentos possam ser conduzidos de forma descentralizada.
Por outro lado, importa reiterar que, conforme sublinhado na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, a IDD é uma entidade pública, com natureza empresarial, que irá assegurar a gestão do Programa NPO em articulação com os serviços centrais do MDN, concretamente, com a DGRDN. Neste âmbito, e nos termos do contrato submetido à apreciação desse douto Tribunal, a IDD irá prestar serviços de gestão do Programa NPO, prosseguindo, em articulação com a DGRDN e com a Marinha portuguesa, as atividades associadas à condução dos procedimentos de contratação respeitantes à construção, à revisão do projeto de engenharia e ao fornecimento dos bens e serviços de apoio logístico para sustentar o ciclo de vida dos Navios.
Recorde-se, por último que a IDD é detida exclusivamente pelo Estado português, não podendo, ainda que parcialmente, ser participada por entidades que não pertençam ao setor público (artigo 3.º, n.º 3 dos Estatutos) e foi criada por prosseguir finalidades públicas que lhe foram confiadas estatuariamente pelo MDN. Nos termos do artigo 2º dos Estatutos, a IDD foi criada para prosseguir o seguinte objeto social:
Artigo Segundo (Objeto)
1. A sociedade tem por objeto:
a) Assegurar a interface I&D entre a Economia da Defesa e os Centros de Investigação e Desenvolvimento das Universidades Portuguesas;
b) Gerir as participações sociais que lhe estejam cometidas;
c) Assegurar a interface público/privado na Economia da Defesa;
d) Apoiar as operações de rentabilização de património na área da Defesa Nacional, nomeadamente no âmbito da execução da respetiva Lei de Infraestruturas e gerir o património da Defesa Nacional que lhe seja cometido, em articulação com a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) e a Estamo, Participações Imobiliárias, S.A.;
e) Assessorar as transações de equipamentos militares, nomeadamente no âmbito da execução da Lei de Programação Militar, em articulação com a DGRDN;
f) Assegurar a conceção, a indústria, o comércio e a manutenção de material de defesa e de desmilitarização de munições e outros acessórios, a conversão de materiais e ainda todas as atividades e produtos que com eles se relacionem.
Com efeito, ainda que a IdD não se compreenda nos serviços centrais do MDN referidos no n.º 2 do artigo 4.º da LOMDN, integra-se, todavia, no seu perímetro empresarial conforme o disposto
no artigo 8.º da LOMDN, constituindo uma das entidades através das quais este Ministério prossegue as suas atribuições, conforme resulta do artigo 3.º:
“O MDN prossegue as suas atribuições através das Forças Armadas e dos serviços integrados na administração direta do Estado, de organismos integrados na administração indireta do Estado, de órgãos consultivos, de outras estruturas e de entidades integradas no setor empresarial do Estado.”.
2. (…)
Em complemento à resposta às questões suscitadas nos pontos 11 e 4, respetivamente, dos V./ Of. DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro, e DFP - 891C/2022, de 18 de março, os encargos com o contrato em apreço inscrevem-se na dotação financeira prevista no mapa anexo à LPM, a que se refere o n.º 1, do seu artigo 4º, na capacidade Marinha-Patrulha e fiscalização. Com efeito, o investimento público nas Forças Armadas em matéria de armamento e equipamento, concretizado nas dotações aprovadas pela LPM, pela sua dimensão, complexidade e natureza, não pode deixar de ser entendido como abrangendo todos os encargos necessários à concretização da edificação da respetiva capacidade (artigo 1.º, n.º 1, da LPM), incluindo as despesas administrativas como, por exemplo, as relativas a assessorias técnicas ou à gestão, acompanhamento da execução e fiscalização dos programas.
Entende-se assim, que a contraprestação da IDD decorrente dos serviços de gestão do Programa, incluindo a tramitação do procedimento de contratação relativo à construção dos seis NPO, integra-se na referida dotação, a título de custos relativos aos serviços prestados, os quais embora tenham uma natureza instrumental, são essenciais à concretização das prestações principais do Programa NPO.
3. (…)
A prestação de serviços compreendidos no objeto da RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, e do contrato em apreço, enquadra-se no objeto social da IDD, encontrando fundamento estatutário na alínea
e) do n.º 1 do artigo 2.º dos seus Estatutos, que comete à IDD:
e) Assessorar as transações de equipamentos militares, nomeadamente no âmbito da execução da
Lei de Programação Militar, em articulação com a DGRDN”. 4. (…)
A missão e o know how da Armada Portuguesa encontram-se plenamente salvaguardados, conforme tivemos oportunidade de enfatizar na resposta às questões referidas nos pontos 1 e 5 do V/ Of.º DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro, na medida em que estamos perante planos distintos de atuação.
Desde logo, porque o objeto da prestação de serviços que a IDD irá desenvolver se encontra perfeitamente delimitado, abarcando a prossecução de atividades de natureza administrativa- jurídica conexas com a prossecução do procedimento de formação do contrato com o construtor naval, balizadas por critérios técnico-navais previamente demarcados. Com efeito, a definição das especificações técnicas (ERNPO3S), incluindo as alterações e ajustamentos técnicos que sejam
necessários efetuar em resultado da revisão do projeto de engenharia, são competência da Marinha Portuguesa, mais concretamente, da Autoridade para as Modificações Técnicas, conforme previsto na cláusula 1ª, alínea a), do contrato em apreço. Efetivamente, as ERNPO3S – da autoria da Marinha através da Autoridade para as Modificações referida – contém a especificação de requisitos para a construção dos navios, incluindo as caraterísticas, especificações, quantidades e requisitos técnicos, operacionais e de desempenho dos NPO, aplicáveis à revisão do projeto de engenharia, à construção dos navios, aos bens e serviços de apoio logístico e ao acompanhamento e fiscalização da construção, que poderá ser objeto de construção (cf. alínea f) da cláusula 1ª do contrato).
Concomitantemente, nos termos do n.º C da RCM n.º 72/2021, será a Equipa de Acompanhamento e Fiscalização (EAF), da qual farão parte representantes da Marinha, que realizará as atividades de direção, acompanhamento e fiscalização técnicas da construção dos Navios, de forma permanente e ininterrupta até à receção definitiva do último Navio (cf. alínea d) da cláusula 1ª, e alínea c), da cláusula 8ª).
Por seu lado, as atividades a desenvolver pela IDD no âmbito da gestão do Programa NPO encontram-se elencadas na cláusula 15ª do contrato, subsumindo-se aos demais aspetos da execução e gestão daquele Programa, incluindo as funções cometidas ao gestor do contrato de construção a celebrar.
É aliás a circunstância de a execução deste Programa envolver, de acordo com as respetivas competências, as entidades em causa, que se prevê, na cláusula 9.º do contrato, a criação de uma Equipa Conjunta de Coordenação, que será responsável por assegurar a colaboração entre as entidades envolvidas, em respeito das funções a cargo de cada uma delas.
5. (…)
Em complemento às respostas relativas às questões suscitadas nos pontos 7, b), c) e d) do V/Of.º DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro, e 3 e 4, do V/Of.º DFP – 891C/2022, de 18 de março, importa assinalar que a próxima série de NPO (a 3.ª) poderá - mantendo o seu carácter de duplo-uso e enquanto plataforma de alto valor operacional, possuidora de grande flexibilidade de emprego e de elevada adaptabilidade para acomodar a incorporação de novas tecnologia - desempenhar missões militares, em especial de recolha de informações/vigilância submarina, reforçando significativamente o contributo de Portugal para o esforço de defesa comum da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e da União Europeia (EU), num ambiente de grande incerteza estratégica.
Por este motivo, o Programa NPO é uma prioridade para o interesse nacional, refletido pela aprovação da Lei Orgânica n.º 2/2019, de 17 de junho, que procedeu à revisão da LPM e na RCM n.º 72/2021, de 9 de junho, que incluiu nas suas dotações as verbas necessárias para concretizar o programa de construção da 3.ª série de NPO.
Convém referir, neste particular, que “compete ao Governo, sob direção e supervisão do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional, promover a execução da presente lei, a qual é, tendencialmente, centralizada nos serviços centrais do Ministério da Defesa Nacional, sem
prejuízo da competência da Assembleia da República”, conforme previsto no n.º 1, do artigo 2.º, da
LPM.
Embora possa parecer “redundante” a citação de legislação, designadamente o previsto nos n.ºs 2, 3 e 4, do artigo 1.º da LPM, importa não perder de vista o aí estatuído e aprovado por inédito consenso político, pela Assembleia da República, permitindo-nos sublinhar o texto com alguns aspetos relevantes para o tema em análise:
“2 — As capacidades inscritas na presente lei são as necessárias à consecução dos objetivos de forças decorrentes do planeamento de forças, tendo em conta a inerente programação financeira, garantindo uma visão coerente e integrada da defesa nacional e respondendo a objetivos de interoperabilidade, flexibilidade e adaptabilidade.
3 — A interoperabilidade, flexibilidade e adaptabilidade são promovidas através da aquisição de meios que permitam operações conjuntas e que maximizem as diferentes valências presentes nas Forças Armadas, respondendo às necessidades de defesa no atual ambiente de segurança internacional.
4 — A presente lei visa também promover o duplo uso das capacidades militares, permitindo, em respeito pelo enquadramento constitucional, responder a necessidades no âmbito de missões civis. 5 — A presente lei visa ainda, respeitando as regras em matéria de concorrência, potenciar o investimento na economia nacional, através das indústrias da defesa, do apoio à inovação e ao desenvolvimento, e da criação de emprego qualificado, constituindo-se como uma alavanca para o desenvolvimento da Base Tecnológica e Industrial de Defesa.
Foi neste sentido que se decidiu que “a gestão do programa de aquisição de seis NPO fosse cometida à IdD, S. A., em articulação com a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional e com a Marinha Portuguesa, explorando, na máxima extensão possível, as possibilidades conferidas designadamente pelo artigo 5.º-A do Código dos Contratos Públicos”.
Isto é, fazendo uso das virtualidades da IDD, a qual, reitera-se, não executará financeiramente o contrato de aquisição do Programa de Aquisição dos NPO, pretende-se, seguindo-se, aliás, um modelo concetual análogo e inspirado num modelo com anos de maturidade e provas dadas utilizado pela “NATO Support and Procurement Agency” (NSPA) o qual, com base em um contrato prévio celebrado com o País cliente (“Sales Agreement”), atua e gere programas de aquisição em nome do cliente e celebra, por conta deste, contratos com os fornecedores de material militar. A NSPA, enquanto entidade que não pode gerar lucros nem apresentar prejuízos, aplica uma “fee” relativo aos serviços prestados, que pode variar entre 3% a C% ou, nalguns casos, até superior.
À semelhança do que acontece em Espanha ou na Holanda, a IDD foi criada para exercer competências de assessoria no âmbito da aquisição, gestão do ciclo de vida e alienação/desativação dos equipamentos militares, com ganhos de eficiência e eficácia para o MDN.
Trata-se, portanto, de um modelo semelhante aos designados “contratos chave na mão”, ou seja,
de gestão completa de Programas de aquisições militares complexos, em que a IDD tem a função
de assegurar a execução de todo o processo, desde a aquisição à entrada em operação, incluindo a monitorização da manutenção e a venda, preferencialmente, antes do fim da vida útil dos equipamentos (ciclos longos de 30 a 40 anos).
Tratando-se de processos de contratação altamente especializados e de elevado risco financeiro, torna-se fundamental assegurar uma gestão integrada, conduzida por equipas multidisciplinares, dotadas dos necessários conhecimentos jurídicos, técnicos e financeiros, que a IDD, pela sua especial vocação, tem vantagem em concretizar.
Para validar esta metodologia, do ponto de vista da sua economicidade, eficácia e eficiência, utilizou-se, pois, como fator comparador, os contratos celebrados pela NSPA. No caso da IDD, a gestão do Programa NPO compreende todo o período da sua extensa duração, cerca de 10 anos, em contrapartida de uma remuneração que representa 1,5% do valor afeto à construção dos C NPO (283 milhões de euros), valor esse que contrasta fortemente com o valor praticado pela NSPA, o qual, tendo em conta a dimensão e complexidade do programa, poderia atingir C% do valor do programa, ou seja, 17 milhões de euros.
Note-se que este modelo é inovador em Portugal e apenas agora está a ser testado. De todo o modo, conforme preconizado na RCM n.º 72/2021, considera-se que esta solução permite, respeitando as regras da concorrência a que se encontra vinculada, potenciar a economia de defesa, em particular, e o investimento na economia nacional, no geral, garantindo o retorno nacional do investimento efetuado.
Seguramente que ela constitui um ensaio para outro tipo de estratégia no tocante à atividade das indústrias da defesa nacional, imprimindo outro rumo, que não se confunde com o vetor industrial a que tradicionalmente está associado, vocacionando, in casu, a IDD, para a assunção de um papel congregador e de escala na gestão de recursos, focada, em particular, no desenvolvimento das indústrias de defesa nacional, e que este Programa procura figurar como exemplo inovador.
C. (…)
Relativamente a esta questão, não existem outros dados para além daqueles que foram reportados na nossa resposta à questão alinhada no ponto 7, a), b) e c), do V/Of.º DFP – 3C12/2022, de 8 de fevereiro.
7. (…)
Julgamos que a resposta a esta questão se encontra nas respostas dadas às questões precedentes 1, 3, e 4. Efetivamente, embora a IDD configure uma entidade externa à estrutura orgânica das Forças Armadas, é também uma entidade inserida no perímetro da Defesa, encontrando-se o seu objeto social (identificado em 1) e as atividades por esta desenvolvidas perfeitamente enquadradas no âmbito da segurança e defesa nacional, confere se extrai do artigo 3.º da LOMDN.
Das atividades desenvolvidas pela IDD destacam-se:
a) A gestão das participações do Estado nas Empresas ligadas à segurança e à defesa: Arsenal do Alfeite, ETI, Navalrocha, OGMA, EID, EDISOFT e Extra - Explosivos da Trafaria). O Arsenal do Alfeite presta serviços de construção, manutenção e
reparação de navios, sistemas de armamento e de equipamentos militares e de segurança da Marinha Portuguesa e de outras Marinhas da NATO; a ETI (EMPORDEF – Tecnologias de Informação, S.A.) atua no mercado do Virtual Training, desenvolvendo sistemas para formação e simulação e soluções de apoio à manutenção nos setores aeronáutico, segurança e defesa; a Navalrocha – Sociedade de Construção e Reparações Navais, S.A. é um estaleiro que oferece soluções one- stop-shop de reparação naval; a OGMA – Indústria Aeronáutica de Portugal, S.A. tem por objeto a fabricação de aeroestruturas e da manutenção e reparação de aeronaves; a EID – Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Eletrónica, S.A. desenvolve, produz e fornece equipamentos e sistemas avançados para o setor da defesa, nas áreas das Comunicações Navais, Comunicações Táticas, Comunicações Militares e Integração de Sistemas; a EDISOFT – Empresa de Serviços e Desenvolvimento de Software, S.A. desenvolve soluções de engenharia de software, integração de sistemas e consultoria tecnológica para sistemas críticos em meio terrestre, marítimo, espacial ou no ciberespaço para os mercados da defesa e civil; a Extra – Explosivos da Trafaria, S.A. é uma empresa de eliminação de materiais energéticos;
b) A atividade de desmilitarização de munições, explosivos e outros acessórios provenientes das Forças Armadas; e
c) A atividade de gestão do património da defesa nacional, em execução da Lei de Infraestruturas Militares (em articulação com a DGRDN e a ESTAMO).
Como se pode observar, a atividade desenvolvida pela IDD concorre para a prossecução da política de defesa nacional. Por esta razão, as ações representativas do seu capital social pertencem exclusivamente ao Estado, a pessoas coletivas de direito público ou a empresas públicas do setor empresarial do Estado, conforme determinado o n.º 3 do artigo 3.º dos seus Estatutos.
Acresce, por último, que a equipa da IDD, desde ao nível do seu conselho de administração, como dos seus diretores e demais colaboradores, possui as adequadas credenciações de segurança nacionais, da União Europeia e Nato, em grau adequado às respetivas competências, emitidas pelo Gabinete Nacional de Segurança (GNS).”
II. 2 DE DIREITO
10. Como se expôs anteriormente, as questões a decidir neste recurso são:
- . (i) aferir do erro de julgamento na aplicação do direito aos factos, uma vez que a recusa do visto foi escorada numa errada aplicação e interpretação da lei e do direito aplicável, isto porque o contrato em apreço se apresenta excluído da contratação concorrencial, desde logo porque não se encontra submetido, objetivamente, ao regime-
regra que deriva do Decreto-Lei n.º 104/2011 de 6/10, ou, ainda, porque a exceção in-house, aqui convocável em termos gerais, assim o determina;
- (ii) apreciando, para isso, se no domínio da defesa o princípio da prossecução do interesse público assume primazia face ao princípio da concorrência no âmbito da contratação, isto porque o legislador europeu acolheu, nas diretivas sobre equipamento militar, as manifestações específicas de interesse público, de forma a proporcionar aos Estados-Membros a possibilidade de os acautelar sem terem de recorrer, para tal, à alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE);
- (iii) e, também, da questão de saber se é de aplicar a exceção ou contratação in- house prevista no Art.º 5.º-A, n.ºs 1 e 5, do CCP ao contrato cujo visto foi recusado, isto porque essa exceção in-house não coloca em causa as especialidades da contratação pública no domínio da segurança e da defesa; e
- (iv) por último, se se pode concluir que o entendimento do tribunal recorrido, ao proibir a aplicação da exceção ou contratação in-house no setor da defesa, e ao exigir o consequente lançamento de procedimentos pré-contratuais neste contrato de gestão e construção de navios NPO, coloca seriamente em causa a segurança nacional e a defesa do Estado Português, sendo também gravemente lesiva do interesse público.
11. Recorde-se, neste conspecto, que as entidades fiscalizadas estão sujeitas ao ónus de alegarem e provarem o preenchimento dos requisitos legais para obtenção do visto, atento o disposto no Art.º 81.º, n.º 1, da LOPTC, as instruções constantes das Resoluções da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (TdC), aprovadas ao abrigo do Art.º 77.º, n.º 1, al. b), da LOPTC e os respetivos encargos instrutórios decorrentes do conteúdo das devoluções determinadas pelo Departamento de Fiscalização Prévia (DFP) e pelo TdC, com suporte no disposto pelo Art.º 81.º, n.º 1, da LOPTC.
12. Tal como se expendeu, as conclusões das alegações definem o objeto do recurso e delimitam o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (cf. Art.ºs 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPCivil), sem prejuízo das questões passíveis de conhecimento oficioso (cf. art.º 608.º, n.º 2, ex vi art.º 663.º, n.º 2, do CPCivil), normas supletivamente aplicáveis ao presente recurso nos termos do art.º 80.º da LOPTC.
13. Na apreciação do recurso, o tribunal ad quem apenas está obrigado a resolver as questões que sejam submetidas à sua apreciação, e não a apreciar todos os argumentos produzidos nas alegações e conclusões de recurso, além de que não tem de se pronunciar sobre as questões
cuja decisão fique prejudicada, tudo conforme resulta do disposto nos Art.ºs 608.º, n.º 2, e 663.º, n.º 2, ambos do CPCivil.
14. Passemos, pois, a analisar cada uma das questões suscitadas no recurso e que se enquadraram como os seus fundamentos. Isto porque só na apreciação destas questões, que atravessam também a apreciação do regime legal aplicável à formação do contrato submetido a fiscalização, a análise da legalidade ou ilegalidade do procedimento seguido para a formação do contrato e suas consequências jurídicas, se conseguirá concluir, do mesmo modo, sobre a pertinência dos fundamentos para a recusa de visto aqui questionada pelo recurso.
- (i) Do erro de julgamento na aplicação do direito aos factos, uma vez que a recusa do visto foi escorada numa errada aplicação e interpretação da lei e do direito aplicável
15. E para deslindar dos questionamentos que baseiam estes mesmos fundamentos do recurso haverá que cuidar, em primeiro posto, de qualificar o contrato aqui em apreço para saber, após isso, qual o seu regime aplicável, isto é, se o contrato em apreço se encontra excluído da contratação concorrencial, desde logo porque não se encontra submetido, objetivamente, ao regime que deriva do Decreto-Lei n.º 104/2011 de 6/10, ou, ainda, porque a exceção in-house aqui convocável em termos gerais assim o determina, tal como advoga a entidade recorrente.
1C. O contrato em apreço, designado por «Contrato Interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal Defence, S.A. para a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos da Classe “Viana do Castelo” destinados à Marinha Portuguesa», celebrado em 28/1/2022, tem por objeto “a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (PROGRAMA NPO) da Classe “Viana do Castelo” Destinados à Marinha Portuguesa”, gestão essa “a assegurar pela Portugal Defence, relativo à aquisição de seis Navios de Patrulha Oceânicos, da classe “Viana do Castelo”, destinados à Marinha Portuguesa, para a totalidade da duração do mesmo e mediante um preço máximo global e parcial fixo, e data certa, e que compreende a revisão do projeto de engenharia, o fornecimento de seis NPO e dos bens e serviços de apoio logístico para sustentar o respetivo ciclo de vida”.
17. O identificado programa de aquisição era financiado através da Lei de Programação Militar, com orçamento global máximo de €352.000.000 (trezentos e cinquenta e dois milhões de euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, não podendo exceder, em cada ano económico, os montantes anuais previstos na Resolução de Conselho de Ministros que autoriza o mesmo contrato.
18. O preço global do identificado contrato de gestão do programa de aquisição foi de
€4.245.000,00 (quatro milhões duzentos e quarenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, com uma primeira componente, no valor de € 254.700,00, associada à conclusão do plano global de execução, à versão final completa das peças do procedimento de formação do contrato de construção, à outorga do mesmo contrato e à instrução do processo de fiscalização prévia junto do Tribunal de Contas, que ocorrerá com a decisão sobre o visto, com uma segunda componente, no valor de € 3.353.550,00, a pagar em 11 (onze) prestações anuais de € 304.868,18 cada, no período de 2022 a 2032, correspondentes às prestações associadas à gestão global e ao ritmo de execução do PROGRAMA NPO, incluindo a revisão do projeto de engenharia, a construção e entrega dos seis NPO, e o fornecimento dos bens e serviços de apoio logístico, para a totalidade do período do programa, e uma terceira componente, final e indexada à performance da gestão do PROGRAMA NPO no valor de € 636.750,00, medida em função do cumprimento dos prazos definidos no presente contrato e dos resultados alcançados, designadamente quanto aos preços e prazos de entrega dos navios.
19. O mesmo contrato, aqui em apreço, prevê que as entidades responsáveis pela execução do contrato são:
a) A Portugal Defence, na qualidade de entidade responsável pela gestão do PROGRAMA NPO nos termos definidos na Resolução do Conselho de Ministros e no contrato, obrigando-se a gerir, em nome próprio e sob sua responsabilidade, o PROGRAMA NPO durante todo o período de duração do mesmo, assumindo o risco pela sua execução, nos termos previstos no presente contrato e na lei;
b) O Ministério da Defesa Nacional, enquanto entidade responsável por assegurar, por si ou através da Marinha, o apoio logístico à construção dos NPO e a sustentação do acompanhamento e fiscalização da construção dos navios, conforme previsto na Resolução do Conselho de Ministros e no contrato; e
c) A Marinha, enquanto entidade destinatária final e utilizadora dos mencionados NPO.
20. Tal instrumento contratual é qualificável, de forma consensual, como uma prestação de serviços estabelecida entre contraentes públicos, de índole interadministrativa, tendo por objeto a gestão do programa de aquisição dos referidos navios, sendo indubitavelmente um contrato de prestação de serviços diretamente relacionado com esses equipamentos militares.
21. Recorde-se, também, que o Ministério da Defesa celebra esta prestação de serviços para gestão da aquisição de equipamentos militares com uma empresa de capitais públicos que é do domínio daquele primeiro.
22. O mesmo contrato encontra-se balizado pela identificada Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2021, de 20/05/2021, e nesta o Governo diz expressamente que se autoriza “o Ministério da Defesa Nacional a celebrar um contrato com a IdD — Portugal Defence, S. A., ao abrigo do disposto nos artigos 5.º-A, 336.º e 338.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, na sua redação atual, e do Decreto-Lei n.º 104/2011, de 6 de outubro, tendo por objeto a prestação de serviços de gestão do programa em causa, para a totalidade da duração do mesmo, tal como definida no anexo I à presente resolução”.
23. Cumpre referir, também assim, que a celebração deste contrato submetido a fiscalização não foi precedida de quaisquer dos procedimentos previstos no identificado Decreto-Lei n.º 104/2011, salientando a entidade fiscalizada em diversos momentos processuais que isso se devia ao facto daquele instrumento contratual se encontrar excluído da previsão legal dos procedimentos concorrenciais, como contrato excluído pela preponderância do interesse público da defesa e segurança, sendo além disso considerado contratação in-house.
24. É este contrato aqui submetido a fiscalização prévia que deve ser equacionado em torno do regime jurídico da contratação pública neste setor específico da defesa.
25. Este regime jurídico da contratação pública nos setores da defesa e da segurança encontra-se atravessado de especificidades próprias que estão bem salientadas no percurso histórico legislativo neste domínio, tanto ao nível nacional como europeu (comunitário).
2C. Ao nível do enquadramento do direito europeu, que é aqui um aspeto central, tal como salientado no acórdão recorrido e nas alegações de recurso, há que considerar a Diretiva 2009/81/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, relativa à coordenação dos procedimentos de adjudicação de contratos pelas entidades ou entidades adjudicantes nos domínios da defesa e segurança, a qual teve como objetivo fundamental o estabelecimento de regras de contratação específicas para os setores de defesa e segurança no sentido de abrir o mercado de defesa na União Europeia (UE) sem colocar em risco os interesses legítimos de segurança dos seus Estados-Membros.
27. Esta Diretiva aplica-se, em princípio, a todos os contratos de aquisição de equipamento militar, obras e serviços e a aquisições sensíveis com fins de segurança e que envolvam informações
classificadas, sabendo, no entanto, que os Estados-Membros têm o direito, ao abrigo do Art.º 346.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), de isentar determinados contratos do campo de aplicação da mesma Diretiva quando tal seja estritamente necessário para proteger os seus interesses essenciais de segurança.
28. De acordo com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça Europeu (vd., entre outros, os acórdãos Xxxxxxxx, processo 000/00, xx 00/0%0000, Xxxxxxxx x. Xxxxxxx, processo X-000/00 xx 00/0/0000, Xxxxxxxx x. Xxxxxx, processo C-239/06, de 15/12/2009, Comissão v. Portugal, processo C-38/06, de 4/3/2010), essa isenção permitida ao abrigo do Art.º 346.º do TFUE está limitada a casos excecionais e claramente definidos. Deve ser demonstrado, com base numa avaliação casuística, que estão preenchidas as condições para a sua aplicação, não devendo a interpretação do preceito redundar na atribuição aos Estados-Membros do poder de derrogar disposições do Tratado através da mera invocação dos seus interesses.
29. Um relatório da Comissão de avaliação da implementação da Diretiva 2009/81/CE, publicado em 2016 (COMMISSION STAFF WORKING DOCUMENT Evaluation of Directive 2009/81/EC on public procurement in the fields of defence and security, disponível em xxxxx://xxx- xxx.xxxxxx.xx/xxxxx-xxxxxxx/XX/XXX/?xxxxxxxxx%0X00000XX0000), concluiu que a mesma Xxxxxxxx ajudou a abrir o mercado interno da defesa, mas que ainda havia espaço para mais progressos.
30. Isto porque uma parte muito significativa das despesas com contratos de defesa ainda era realizada fora das regras de contratos públicos da União Europeia, o que, por sua vez, afetava a eficiência e efetividade da mesma Diretiva. As razões desse condicionamento, no dizer desse relatório, tinham a ver com o facto de as isenções, incluindo o Art.º 346.º TFUE, parecerem ainda sujeitas a uma interpretação demasiado ampla que não restringe a sua utilização a casos verdadeiramente excecionais, como exigido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. Este fator provavelmente é especialmente relevante para explicar o uso muito limitado da diretiva para a aquisição de equipamentos estratégicos e sistemas complexos. Além disso, uma parte significativa das despesas com aquisições no setor da defesa pode ter sido gasta em contratos celebrados no âmbito de programas de cooperação iniciados muito antes da adoção da diretiva.
31. Salienta-se, no mesmo sentido, os esforços políticos e de regulação subsequentes no seio da União Europeia no sentido de trazer maior concorrência e transparência a este sector, sem detrimento do interesse público aqui em jogo.
32. Assim, reportando-nos a esses esforços, vejam-se (i) a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social
Europeu e ao Comité das Regiões COM(2016) 950 de 30/11/2016, que descreve o Plano de Ação Europeu no Domínio da Defesa, entre outros objetivos, para um mercado europeu dos equipamentos de defesa aberto e competitivo, em que expressa que as duas diretivas relativas aos contratos públicos e às transferências na UE foram adotadas com vista a melhorar o funcionamento do mercado da defesa e a aumentar a concorrência, tendo simultaneamente em conta as especificidades do setor da defesa, mas que se forem plenamente aplicadas, poderão dar um contributo significativo para a consecução do objetivo de criar um mercado europeu de equipamentos de defesa aberto e competitivo, “havendo muito mais a fazer para que tal aconteça”, (ii) a Recomendação (UE) 2018/624 da Comissão Europeia de 20/4/2018 sobre o acesso ao mercado transfronteiriço para subfornecedores e pequenas e médias empresas (PME’s) que propõe medidas para melhorar a posição das mesmas PME’s nas cadeias de abastecimento de defesa, (iii) o Relatório A9-0025/2021, de 8/3/2021, do Parlamento Europeu sobre a aplicação da Diretiva 2009/81/CE relativa aos contratos públicos nos domínios da defesa e da segurança, (iv) o Regulamento (UE) 2021/697 do Parlamento Europeu e do Conselho de 29/4/2021 que cria o Fundo Europeu de Defesa, que, entre outros objetivos, visa a promoção de uma indústria europeia de defesa competitiva, inovadora e eficiente em toda a União e fora dela, no pressuposto da criação de um mercado da defesa mais integrado na União e promoção de produtos e tecnologias de defesa europeus no mercado interno, e (v) a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões COM(2022) de 15/2/2022, que evoca o contributo da Comissão para a defesa europeia, no apoio de uma cooperação mais estreita no domínio da defesa entre os Estados-Membros e entre as indústrias, assente nos recursos financeiros necessários e no reforço das despesas em colaboração, em consonância com os compromissos existentes, a fim de melhorar a relação custo-eficácia, reforçar a interoperabilidade, promover a inovação e melhorar a competitividade e a resiliência industriais.
33. O que leva a considerar esta área da contratação pública como uma autêntica “terra de ninguém”, onde as exceções ao regime-regra se multiplicam, encontrando-se distante a consolidação de um verdadeiro mercado comum no sector da defesa – assim, Durval Xxxxx Xxxxxxx, “O contexto particular dos contratos públicos do sector da defesa no Mercado Interno Europeu. European Defense Procurement: A particular approach”, in e-Pública, Vol. II No. 1, Janeiro 2015, pp. 57-68.
34. Ao nível nacional o CCP prevê, neste contexto, a sua não aplicação “aos contratos celebrados ao abrigo do disposto no artigo 346.º” do referido TFUE (Art.º 4.º, n.º 1, alínea e), do CCP), o que deve ser interpretado, na conjugação com o Art.º 15.º, n.º 2, 2.ª parte, da Diretiva 2014/24/UE
sobre contratação pública, em ser autorizada a exclusão da aplicação do CCP com a invocação do Art.º 346.º do TFUE, quando, num caso concreto, o procedimento de adjudicação ou a execução de um contrato obrigue o Estado a divulgar informação contrária aos interesses essenciais da segurança do Estado, tendo este determinado que os interesses essenciais em causa não podem ser garantidos por medidas menos invasivas – assim, Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx, Direito dos Contratos Públicos, 5.ª edição, 2021, Coimbra: Almedina, pp. 294-295.
35. Por outro lado, na sequência da mencionada Diretiva 2009/81/CE, num esforço da sua transposição, veio a ser publicado o mencionado Decreto-Lei n.º 104/2011, de 6 de outubro, que, tal como aquela Diretiva, visa proporcionar a um Estado-Membro da União Europeia a melhor forma de acautelar as manifestações específicas do interesse público na área da defesa e da segurança sem terem de recorrer, para tal, ao mencionado mecanismo da alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do TFUE.
3C. Tal como bem expressa a recorrente na sua motivação de recurso, o cotejo do regime deste mesmo diploma nacional (Decreto-Lei n.º 104/2011) na sua conjugação com a Lei n.º 49/2009 de 5 de agosto, que rege o acesso ao comércio ou à industria de bens e serviços militares, por um lado, com o regime jurídico previsto no CCP, pelo outro, “permite divisar significativas diferenças no que concerne à margem de livre apreciação de que gozam, no setor da defesa, as entidades adjudicantes na prossecução do interesse público”.
37. E, continua a mesma recorrente, a pp. 26-27 das mesmas alegações, numa síntese que aqui se acolhe:
“(…) Veja-se a título de exemplo a questão da credenciação de segurança, e os seus reflexos na margem de livre apreciação da fiabilidade de candidatos e cocontratante que nos parece ser paradigmática da primazia que o princípio da prossecução do interesse público assume face ao princípio da concorrência no âmbito da contratação no setor da defesa.
O quadro jurídico vigente permite, designadamente, nos casos em que a entidade adjudicante faça uma prévia investigação, prevista no n.º 4, do art.º 55º, do Decreto-Lei n.º 104/2011 – feita com base, nomeadamente, em fontes protegidas –, excluir um candidato desde que a informação recolhida deponha no sentido da falta de fiabilidade do candidato para a salvaguarda de informação classificada. Permite-se ainda, caso se verifiquem as condições previstas no art.º 52.º, do Decreto-Lei n.º 104/2011, que os motivos dessa exclusão não sejam comunicados aos candidatos.
Esta necessidade, característica do setor da defesa, traduz-se na circunstância de as entidades adjudicantes – que na realidade são sempre assimiláveis ao Estado, num sentido lato – não poderem permitir que o fluxo de informação classificada e a cadeia de fornecimento sejam infiltradas ou dominadas por adversários ou inimigos, o que dá origem a um regime jurídico em que o princípio da prossecução do interesse público, na forma da
defesa dos interesses essenciais de segurança, se sobrepõe de forma dominante a todos os restantes princípios enformadores do mercado interno, o que não tem paralelo no CCP.
Em síntese, todo o regime da salvaguarda de informação classificada e da segurança do fornecimento, previsto no Decreto-Lei n.º 104/2011, em conjunto com o disposto na Lei n.º 49/2009, relativamente ao acesso à atividade económica no setor da defesa, configura um quadro normativo que faculta às entidades adjudicantes uma ampla liberdade na escolha do cocontratante.
Fá-lo, conforme vimos supra, permitindo até o recurso a fontes protegidas, mas também, estabelecendo uma fase obrigatória de qualificação em todos os procedimentos pré-contratuais previstos no Decreto-Lei n.º 104/2011, e ainda, através, designadamente, dos preceitos previstos nos artigos 55.º e 5C.º, do Decreto-Lei n.º 104/2011, que acrescentam requisitos de habilitação, de qualificação e impõem cláusulas contratuais ou compromissos que não estão previstos no CCP.”
38. Um regime que, no dizer do acórdão recorrido e citando Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx, se assume numa “postura intermédia e equilibrada, aprovando um regime jurídico que, a um tempo, se revelaria mais flexível em matéria militar, acolhendo as preocupações dos Estados-membros quanto à sua defesa e segurança interna, sem que, a outro tempo, permitisse a pura derrogação do regime concorrencial de contratação pública” – cfr. Direito da Contratação Pública, volume I, Lisboa: AAFDL Editora, 2021, p. 224).
39. Ora, é precisamente esse regime legal específico que permite essa latitude de conformação ao interesse público da defesa e da segurança, tanto por via do acionamento do mecanismo excecional do Art.º 346.º do TFUE como através dos meios previstos no Decreto-Lei n.º 104/2011, que justificará, na ótica do Tribunal recorrido, que aqui se acolhe, a exclusão como tal, de forma isolada, no presente caso, da contratação in-house, sem que o mencionado mecanismo de exceção do Art.º 346.º do TFUE seja também acionado.
40. Este Decreto-Lei n.º 104/2011 nunca sofreu qualquer alteração legislativa, mantendo-se fiel ao direito que transpôs da União Europeia.
41. A própria Diretiva que o mesmo transpôs também apenas foi alterada pelo Regulamento (UE) 2015/2340 da Comissão (L-330, de 16 de dezembro de 2015) de 15 de dezembro de 2015, no respeitante aos seus limiares de aplicação no contexto dos processos de adjudicação de contratos.
42. O Relatório A9-0025/2021, de 8/3/2021, do Parlamento Europeu, acima identificado, justamente sobre a aplicação da Diretiva 2009/81/CE relativa aos contratos públicos nos domínios da defesa e da segurança, nunca se refere à possibilidade da contratação in-house, mas tão só à utilização da exclusão prevista no Art.º 346.º do TFUE. Neste caso, para levantar suspeitas sobre se a sua
utilização não constituiu uma forma de limitar a aplicação da Diretiva 2009/81/CE e para apontar no sentido da necessidade de abordar o problema das exclusões, tanto em termos legislativos (a fim de limitar a utilização) como em termos de medidas de controlo e execução a adotar pela Comissão.
43. Este Relatório do Parlamento Europeu revela, do mesmo modo, a intenção de impor uma aplicação efetiva da Diretiva e de exortar os Estados-Membros a aumentar a concorrência, a transparência e a não discriminação.
44. Por outro lado, como refere o acórdão recorrido e não pode desmentir a recorrente, antes da publicação da Diretiva 2009/81/CE já existia basta jurisprudência europeia sobre a contratação in-house (recorde-se que o Acórdão Teckal é de 18/11/1999), sendo que a mesma contratação não foi referida nessa Diretiva, nem no diploma nacional que a transpôs - Decreto-Lei n.º 104/2011, de 06.10. -, apesar do legislador na primeira versão do CCP, em 2008, a prever.
45. O legislador europeu, através, especialmente da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, expressamente admitiu a exclusão decorrente da contratação in-house, mas nessa e nas duas Diretivas do mesmo ano de 2014 não se referiu à defesa e segurança e nada foi recomendado para que fosse alterada a Diretiva 2009/81/CE, apesar dos diversos pedidos dirigidos à Comissão – rejeitados por esta -, depois da entrada em vigor da Diretiva de 2009, no sentido de fazer menção expressa à contratação in-house numa futura revisão dessa Diretiva.
4C. É este enquadramento de um regime que em face da história das soluções legislativas encontradas e da própria mens legislatoris que ressalta destes 13 anos de aplicação da Diretiva 2009/81/CE, sem que tenha sido prevista (inicial ou subsequentemente), de forma expressa, a contratação in-house, que se percebe que não faz sentido o mecanismo da especialidade ou da subsidiariedade a que apela a tese da recorrente, tanto numa articulação do sistema de normas aqui em jogo como também por via do apelo a uma composição entre os princípios de direito aqui convocáveis.
47. Temos como certo, também assim, que, neste caso concreto, o Governo português não invocou, na sua Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2021, acima descrita, de forma expressa ou com a invocação de qualquer justificação, o enquadramento do contrato objeto de fiscalização prévia na exceção prevista no Art.º 346.º do TFUE.
48. Sendo essa conclusão inequívoca, seja qual fosse o entendimento que se possa fazer do antecedente jurisprudencial citado do Tribunal Geral da União Europeia, no seu acórdão de 18
de junho de 2013, Portugal v. Comissão, processo T-509/09, no qual este terá decidido que o Estado Português não podia pedir a comparticipação financeira da União para aquisição de dois navios-patrulha oceânicos, com os contornos de financiamento à data disponíveis, e considerá- los ao mesmo tempo como estando abrangidos pelo Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE por estar em causa a “prossecução dos interesses essenciais da segurança” do Estado Português.
49. Isto porque para a própria recorrente não persistem dúvidas que os navios (NPO) aqui em causa são enquadráveis no disposto na alínea b) do n.º 1 do Art.º 346.º do TFUE, correspondendo à noção de equipamento militar aí consagrada, o que confere ainda maior razão à argumentação expendida no acórdão recorrido.
- (ii) Da questão de saber se no domínio da defesa o princípio da prossecução do interesse público assume primazia face ao princípio da concorrência no âmbito da contratação
50. Não oferece dúvidas a aceção de que se aplicam à contratação pública, independentemente da natureza do contrato celebrado pela Administração Pública ou entidade equiparada, os princípios fundamentais da atividade administrativa consagrados no plano constitucional e infraconstitucional, entre os quais se encontra o princípio da prossecução do interesse público.
51. E que esse mesmo interesse público assume, neste setor da defesa, caraterísticas muito especiais.
52. Mas, a verdade, é que à luz do direito da União Europeia, os interesses públicos em causa no setor da defesa terão de ser compatibilizados com outros princípios e regras fundamentais como sejam as liberdades de circulação ou a aplicação do direito da concorrência.
53. Sendo que não obstante a natural primazia do interesse público que aqui se pode encontrar até no desenho normativo das regras europeias e nacionais aplicáveis à contratação pública nestas matérias da defesa e da segurança, a verdade é que o balanceamento com os demais princípios, nomeadamente com o princípio da concorrência, tem de ser encontrado caso a caso, como tem ponderado amiúde o próprio TJUE.
54. E é nessa articulação casuística e em face das circunstâncias aqui conformadas, em nosso entender, que faz sentido convocar, como na realidade foi convocado pelo acórdão recorrido, o primado do direito europeu, numa interpretação conforme ao direito da União Europeia a que esta jurisdição financeira, mas também a entidade recorrente, deve atenção e respeito.
55. O que se traduz, como é natural, na interpretação da lei nacional à luz do texto e da finalidade do direito europeu, designadamente nas regras europeias que aqui são sobejamente referidas.
5C. O que nos leva a questionar, como faz o acórdão recorrido e a recorrente nas suas alegações de recurso, se o legislador europeu acolheu, nas diretivas sobre equipamento militar, as manifestações específicas de interesse público, de forma a proporcionar aos Estados-Membros a possibilidade de os acautelar sem terem de recorrer, para tal, à alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do TFUE?
57. Pensamos que sim, pela forma como se pode articular esse mecanismo com a resposta às exigências do princípio do interesse público que foram criadas pelo regime legal do Decreto-Lei n.º 104/2011, que transpôs a Diretiva n.º 2009/81/CE para a ordem jurídica nacional, tal como acima se deixou exposto.
- (iii) Da outra questão de saber se é de aplicar a exceção ou contratação in-house prevista no Art.º 5.º-A, n.ºs 1 e 5, do CCP a este mesmo contrato.
58. Questiona a entidade fiscalizada, aqui recorrente, o entendimento do Tribunal recorrido no que respeita à entidade fiscalizada não poder invocar o Art.º 5.º-A do CCP, antes devendo o contrato submetido a fiscalização prévia ter sido precedido de um dos procedimentos consagrados no Art.º 14.º do Decreto-Lei n.º 104/2011, diploma que, como vimos, estabelece a disciplina aplicável à contratação pública nos domínios da defesa e da segurança.
59. Assim, não seriam, aqui, invocáveis, no dizer da aqui recorrente, “as regras gerais constantes do Código dos Contratos Públicos (CCP) — em particular, as que consentem a contratação direta entre entidades públicas (vulgo contratação in house), atualmente previstas no artigo 5.º-A do CCP, correspondentes à transposição de equivalentes regras previstas nas Diretivas n.ºs 2014/24/UE (artigo 12.º) e 2014/25/UE (artigo 28.º)”.
C0. E que, o mesmo acórdão recorrido, entenderia que essa mesma exceção in-house “— ou seja, a permissão de contratação direta entre entidades públicas em certas circunstâncias — não poderia ser convocada no domínio dos contratos nos domínios da defesa e da segurança submetidos a esse regime especial”.
C1. De onde, por ser esse o caso do contrato, “a sua celebração haveria preterido o procedimento legalmente exigido, ditando a respetiva nulidade e, por consequência, a recusa de visto, tudo ex vi artigo 161.º/1, l) do CPA e artigo 44.º/3, a) da LOPTC”.
C2. Ora, teremos de precisar, que se é certo que a recusa de visto determinada pelo tribunal a quo assentou na premissa de preterição do procedimento legalmente exigido, a verdade é que o mesmo Tribunal recorrido não afirmou na sua fundamentação que a cláusula de exceção in- house não é aplicável “tout court” no domínio da contratação pública do sector da defesa e da
segurança, mas antes que qualquer contratação direta estabelecida entre entidades públicas, neste sector, deveria ser articulada obrigatoriamente através da invocação dos meios especiais excecionais aqui convocáveis e que inexistem na contratação pública em geral.
C3. Estamos a falar, necessariamente, na existência de um regime específico de contratação pública na defesa e segurança que concede uma grande amplitude e flexibilidade à entidade pública na escolha dos seus contratantes e também nos procedimentos de contratação aplicáveis (regime do Decreto-Lei n.º 104/2011 que transpôs a Diretiva 2009/81/CE) ou mesmo no afastamento total das especiais regras procedimentais e concorrenciais com a invocação do mecanismo excecional consagrado na alínea b), do n.º 1, do Art.º 346.º do TFUE.
C4. Mecanismo excecional, aliás, que a entidade recorrente não deixa de considerar que se encontraria aqui preenchido na situação em presença e que o Governo português não pretendeu utilizar expressamente.
C5. Mas essa conclusão do acórdão recorrido, que aqui se acompanha, assenta também numa articulação normativa que escapa à crítica e à argumentação da motivação de recurso apresentada. Veja-se a seguinte passagem do acórdão recorrido que aqui se deixa reproduzida (§§ 30 a 35):
“30. A transposição deste regime específico para os contratos celebrados no setor da defesa levou à necessidade da sua compatibilização com o CCP. Até à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, não havia qualquer referência no CCP ao Decreto-Lei n.º 104/2011, de 0C de outubro, estando apenas prevista na alínea i) do n.º 4 do art.º 5.º a inaplicabilidade da Parte II à formação dos “contratos diretamente abrangidos pelo disposto no artigo 34C.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”.
31. O Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, veio introduzir duas importantes alterações:
a. Aditou uma alínea e) ao art.º 4.º, n.º 1, nos termos da qual o CCP passou a deixar de ser aplicável aos contratos celebrados ao abrigo do disposto no artigo 34C.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia;
b. Aditou ao art.º 5.º, n.º 4, uma nova alínea h), dispondo que a Parte II do CCP é inaplicável à formação dos “contratos celebrados ao abrigo do disposto no regime jurídico dos contratos públicos no domínio da defesa e da segurança, designadamente do Decreto-Lei n.º 104/2011, de C de outubro”.
32. A compatibilização destas duas normas implica algum esforço interpretativo, tudo culminando numa avaliação a efetuar pela entidade adjudicante da adequação ou não do regime previsto no Decreto-Lei n.º 104/2011, de 0C de outubro, às especiais necessidades de segurança que a celebração do contrato em causa envolva, conforme explana Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx: “torna-se necessário que a entidade adjudicante proceda a uma avaliação destinada a apurar se as necessidades de segurança a proteger com o contrato são ou não
compatíveis com o regime de contratação previsto no Decreto-Lei n.º 104/2011. Se esse regime puder ser aplicado, pode invocar a alínea h) do n.º 4 do artigo 5.º para a formação do contrato. Se esse regime tão-pouco for suficiente para dotar a entidade adjudicante da flexibilidade necessária para a prossecução das missões de interesse público a que se refere o artigo 34C.º do TFUE, a entidade adjudicante ficará então autorizada a invocar a alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º do CCP” (Ob. cit., p. 20C).
33. Em suma:
a. quando a situação se enquadre na exceção prevista no art.º 34C.º do TFUE e, nessa medida, os especiais interesses de segurança e defesa exijam não só o afastamento total do CCP, mas também do próprio Decreto- Lei 104/2011, de 0C de outubro, poderá e deverá ser invocado o art.º 4.º, n.º 1, alínea e), do referido CCP;
b. quando o contrato a celebrar preencha os elementos do âmbito de aplicação daquele Decreto-Lei, deve a situação ser enquadrada no art.º 5.º, n.º 4, alínea h), daquele Código, que afasta a aplicação da Parte II na formação do contrato, aplicando-se somente o referido Decreto-Lei.
34. Note-se que a aplicação da referida alínea h) do n.º 4 do art.º 5.º pressupõe necessariamente existência de um regime especial que seja aplicável – “O legislador do CCP só se pode encontrar seguro de que a inaplicabilidade da sua Parte II aos contratos em matéria militar não ofende as liberdades comunitárias se a entidade adjudicante tiver confirmado que a formação desses contratos é, ainda, regulada por uma lei especial que assegura a proteção daquelas liberdades” (Idem, p. 225).
35. Por esse motivo, o art.º 5.º-B, n.º 1, do CCP, quando dispõe que “A celebração dos contratos a que se referem os artigos 5.º e 5.º-A fica sujeita aos princípios gerais da atividade administrativa, bem como, com as devidas adaptações face à natureza do contrato, aos princípios gerais da contratação pública previstos no n.º 1 do artigo 1.º-A, devendo sempre ser feita menção à norma que fundamenta a não aplicação da parte II ao contrato em causa”, deve ser interpretado restritivamente, sendo o seu âmbito de aplicação limitado apenas aos contratos que não estejam abrangidos por legislação específica. Nessa hipótese aplica-se somente o disposto nessa mesma legislação”.
CC. Argumenta a entidade recorrida, neste ponto, com o facto de o contrato aqui em causa não ser congenitamente suscetível de estar submetido à concorrência do mercado, porque desprovido de interesse concorrencial, consubstanciando-se num instrumento jurídico que organiza a transferência ou delegação de poderes e resp0nsabilidades pela execução de uma missão pública.
C7. Nesse sentido, afirma a recorrente, este contrato delegatório encontra-se excluído do regime da contratação pública e estará isento, também por aqui, da submissão a qualquer modelo de tramitação pré-contratual mais ou menos concorrencial.
C8. Mas, a verdade é não se pode dizer que o contrato aqui em causa, de uma prestação de serviços de gestão do programa de aquisição de seis navios patrulha, que prevê a “remuneração” (sic) à
IdD-Portugal, SA., enquanto prestadora de serviços, no valor global de € 4.245.000,00 (quatro milhões duzentos e quarenta e cinco mil euros), consagra apenas uma transferência das verbas necessárias à execução das tarefas implicadas na delegação.
C9. Isto se atentarmos não só à natureza empresarial da sociedade prestadora dos serviços em causa, não obstante a sua estrutura de capital análoga à das Entidades Públicas Empresariais, como também às parcelas a que correspondem o montante da prestação global acordada e a sua justificação enquanto remuneração:
a)uma parcela associada aos custos de arranque da capacidade de gestão do programa, com o valor previsional de € 000 000;
b) uma outra parcela associada ao ritmo de execução da prestação dos serviços de gestão do programa, para os anos de 2021 até 2031 (atendendo ao período de garantia de dois anos), com o valor previsional médio anual de € 304 868, correspondente a um montante global de € 3 353 550 para a totalidade do período do programa; e
c) uma componente final indexada à performance dos serviços prestados, medida em função do cumprimento dos prazos que vierem a ser definidos no contrato a celebrar e dos resultados a alcançar, designadamente quanto aos preços e prazos de entrega dos navios, com o valor previsional de € 636 750.
7o. De referir, também assim, que o Ministério da Defesa Nacional se vinculou à disponibilização de uma equipa de membros seus para o acompanhamento e fiscalização da execução dessa prestação de serviços, como decorrerá da responsabilidade, em primeira linha, que ele deve assumir na execução da Lei de Programação Militar e na própria gestão de aquisição dos navios em causa para a qual, aliás, não deixa de deter as competências, a organização e os recursos humanos capacitados.
71. Sendo que aquela evidente componente remuneratória retira, desde logo, este específico instrumento contratual, da contratação excluída, tal como consente a própria recorrente ao se referir ao inciso final “e que não prevejam uma remuneração”, presente no n.º 2 do Art.º 5.º do CCP e no n.º 6 do Art.º 1.º da Diretiva 2014/24/UE sobre contratação pública por aquele transposta.
72. Pelo que não se poderá dizer, como conclui a mesma recorrente, que a formação deste contrato não se encontrava submetida, à partida, ao regime especial de contratação previsto pelo Decreto-Lei n.º 104/2011.
73. A recorrente critica a argumentação expendida no acórdão de que a exceção in-house coloca em causa as especialidades da contratação pública no domínio da segurança e da defesa, mais advogando que não se entende a posição jurisprudencial assumida no acórdão recorrido à luz da aplicação subsidiária do Código de Contratos Públicos ao Decreto-Lei n.º 104/2011, e designadamente do seu Art.º 5.º-B, n.º 1, e à Diretiva 2009/81/CE, do regime próprio relativo à contratação pública in-house, e porque a mesma contratação in-house não constitui qualquer procedimento pré-contratual mas sim a uma exceção relativa à obrigatoriedade de adoção de um procedimento pré-contratual na contratação pública.
74. Todavia, tem de reconhecer-se que a análise jurisprudencial presente no acórdão recorrido, no seu alinhamento pretoriano, tal como adjetivado pela recorrente, não deixa de possibilitar um condicionamento de cariz acrescido à possibilidade de invocação da mesma exceção in-house, enquanto cláusula excludente do procedimento concorrencial que se assume legislativamente como regime-regra e num critério de supletividade como é próprio da dimensão principialista.
75. O princípio da concorrência não deixa de ser aqui o princípio efetivamente em crise, a necessitar de maior proteção e efetividade, numa coadunação com o princípio do interesse público que já decorre satisfatoriamente não só do regime legal do Decreto-Lei n.º 104/2011, que transpôs a Diretiva n.º 2009/81/CE para a ordem jurídica nacional, como também do acionamento do mecanismo de salvaguarda do Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE.
7C. Mais se lembre, que não obstante o conteúdo vinculante das normas princípio, estas normas tem uma normatividade própria, são, essencialmente, normas impositivas de otimização, compatíveis com vários graus de concretização consoante os condicionalismos fáticos e jurídicos do caso concreto, em que se requer a sua aplicação.
77. As normas-princípio contêm apenas exigências ou standards, que em primeira linha (prima facie) devem ser realizadas, ao invés das (normas) regra, que desde que válidas, têm de cumprir-se na exata medida das suas prescrições, que postulam fixações normativas definitivas. Por conseguinte, na interpretação e aplicação dos indicados princípios a administração não procede a uma operação de mera subsunção da norma no caso concreto, mas procede a um raciocínio lógico-racional ou teleológico-objetivo, inerente ao juízo ponderativo e ponderação dos bens em confronto e se pretendem harmonizar, que lhe confere, necessariamente, alguma margem na escolha num leque de soluções alternativas e igualmente plausíveis e legítimas (pronunciando- se sobre a aplicação dos princípios jurídicos em sede de contratação pública e sobre a possibilidade de afastamento das regras legais em prol de princípios, vejam-se Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxx e outros, Concursos e Outros Procedimentos de Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx,
0000, Xxxxxxx: Almedina, pp. 168-177, e Xxxxx Xxxxxxxxx-Xxxxxxx, Direito da Contratação Pública, ob. cit., pp. 51-64).
78. Assim, não é a contratação in-house que se desenha aqui como o regime-regra e a liberdade de auto-regulação da administração pública, neste sector da segurança e defesa, tão naturalmente fechado à concorrência, não deixa de se poder concretizar com amplitude adequada, através dos meios específicos (Decreto-Lei n.º 104/2011) e até excecionais (Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE) que o legislador oferece neste mesmo domínio da atuação pública, como já foi afirmado atrás.
79. Nesse sentido, as situações de exceção in-house , neste domínio da contratação pública na área da defesa e da segurança, são absorvidas do ponto de vista jurídico por aqueles meios específicos expressamente consagrados legislativamente (Decreto-Lei n.º 104/2011 e Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE), não fazendo sentido falar no funcionamento de um princípio de supletividade ou de especialidade com o regime geral da contratação pública.
8o. Na verdade, a regra da especialidade invocada no Art.º 73.º do Decreto-Lei n.º 104/2011, é uma regra que permite, sobretudo, fazer funcionar o regime-regra do CCP, com os seus mecanismos e procedimentos concorrenciais, e os princípios ligados à contratação pública, sendo que a contratação in-house não deixa de se constituir como uma cláusula de afastamento e de exceção a esses mesmos princípios.
81. Sabendo, também assim, que a contratação in-house não se assume como excluída da aplicação do CCP mas apenas contratação excluída, à qual não se aplicarão os procedimentos próprios da contratação pública (cfr. Art.º 5.º-A, n.ºs 1 e 2, do CCP).
82. Pelo que se terá de concluir, como fez o acórdão recorrido, que é inaplicável o disposto no Art.º 73.º do Decreto-Lei n.º 104/2011, ao caso em presença, para efeitos da invocação autónoma da contratação in-house, isto é, de forma a se, uma vez que não faz aqui sentido uma aplicação subsidiária ou supletiva dessa mesma cláusula de exclusão do regime concorrencial, pelas razões acima apontadas.
83. Pode, assim, concluir-se que a contratação in-house é um regime de exceção face a situações em que a contratação é feita dentro de casa, quando a Administração Pública não tem necessidade de recorrer ao mercado para suprir as suas necessidades. Essa avaliação terá que ser exigente de forma a não corromper o princípio da concorrência, pilar da contratação pública.
84. Trata-se de uma derrogação excecional das regras de contratação pública gerais e não das especiais, derivadas, designadamente do Decreto-Lei n.º 104/2011, e, por isso, a sua interpretação deve ser restrita de forma a preservar o princípio da concorrência.
85. Pelo que a sua utilização, no domínio da defesa e da segurança, desenquadrada dos meios específicos (Decreto-Lei n.º 104/2011) e até excecionais (Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE) que o legislador oferece neste mesmo domínio da atuação pública, não deixa de violar os procedimentos previstos no mesmo Decreto-Lei n.º 104/2011, sendo essa violação fulminada de nulidade, nos termos do disposto no Art.º 161.º, n.º 1, alínea l), do CPA, para que remete o n.º 2 do Art.º 284.º do CCP, aplicável ex vi do estabelecido no Art.º 65.º, n.º 1, do Decreto-Lei referenciado.
8C. A recusa de visto fundamentou-se, recorde-se, na preterição total do procedimento legalmente exigido para a celebração do contrato em apreço, viciando de nulidade o ato praticado. Mais foi entendido que, por essa via, esse contrato sob apreciação se encontrava afetado de nulidade, o que é fundamento absoluto de recusa de visto – cfr. Art.º 44.º, n.º 3, alínea a) e n.º 4 (a contrario) da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC) -, sendo ainda considerado que a ilegalidade verificada tinha inegável influência no resultado financeiro do contrato.
- (iv) E, por último, da questão de saber se o entendimento do tribunal recorrido coloca seriamente em causa a segurança nacional e a defesa do Estado Português, sendo também gravemente lesivo do interesse público
87. Numa última argumentação, a recorrente defende que ao proibir a aplicação da exceção ou contratação in-house no setor da defesa, e ao exigir o consequente lançamento de procedimentos pré-contratuais neste contrato de gestão e construção de navios NPO, a decisão recorrida coloca seriamente em causa a segurança nacional e a defesa do Estado Português, sendo também gravemente lesiva do interesse público. Por outro lado, sempre poderia o Tribunal a quo ter recorrido às razões imperiosas de interesse geral aqui presentes, permitindo a manutenção da eficácia do contrato, desde logo, nos termos do Art.º 60.º, n.º 3, da Diretiva 2009/81/CE.
88. Temos de contrariar esta conclusão, isto porque ela se encontra em contradição com os próprios pressupostos da decisão recorrida.
89. Na verdade, foi o Governo e a entidade fiscalizada que optaram pela integração do contrato em causa no regime-regra do Decreto-Lei n.º 104/2011, não tendo sido acionados os mecanismos de salvaguarda do interesse público previstos neste setor da defesa e da segurança, tanto os
procedimentos específicos do Decreto-Lei n.º 104/2011 como a cláusula excecional do Art.º 346.º, n.º 1, alínea b), do TFUE.
9o. O que faria todo o sentido caso se confirme a afirmação da própria recorrente que aduziu “que o contrato se traduz em questões sensíveis de segurança e defesa nacional centrais para a soberania do Estado Português” (pp. 67 das suas alegações de recurso).
91. Sendo que o conceito de razões imperiosas de interesse geral se tem de equacionar, como é óbvio, com a situação em concreto e com os meios jurídicos e procedimentais que se encontram ou encontravam disponíveis à entidade pública em causa e que derivam da interpretação e da aplicação do direito que é assumida pelo TdC nesta precisa situação.
92. Pelo que se entende que não se encontram reunidas as circunstâncias de que fala o citado Art.º 60.º, n.º 3, da Diretiva 2009/81/CE.
93. E, na verdade, a decisão recorrida, e bem, não proibiu a contratação em causa, pois isso estaria fora do alcance da sua jurisdição. Antes considerou inválida a forma como a contratação veio a assumir na sua procedimentalização, recusando por isso o visto em fiscalização prévia.
94. Impõe-se, pois, negar provimento ao recurso em todos os seus fundamentos, confirmando-se o acórdão recorrido.
***
IV – DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se, em Plenário da 1.ª Secção, negar provimento ao recurso, em todos os seus fundamentos, confirmando-se o acórdão recorrido que recusou o visto ao descrito contrato de prestação de serviços, «Contrato Interadministrativo entre o Ministério da Defesa Nacional e a IdD-Portugal Defence, S.A. para a Gestão do Programa de Aquisição de Seis Navios de Patrulha Oceânicos (NPO) da Classe “Viana do Castelo” Destinados à Marinha Portuguesa», celebrado em 28/1/2022, objeto de fiscalização prévia.
***
São devidos emolumentos legais, ao abrigo do Art.º 16.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/96, de 31- 5).
Registe e notifique.
Lisboa, 18 de Outubro de 2022
Os Juízes Conselheiros
(Xxxx Xxxxxx X. X. Coelho – Relator)
(Xxxxx Xx Xxxxxxxx)
(Xxxxxxx Xxxxxxx)