Parecer nº: MPC/AF/99/2022 Processo nº: @LCC-21/00665558
Parecer nº: MPC/AF/99/2022 Processo nº: @LCC-21/00665558
Origem: Prefeitura de Navegantes
Assunto: Pregão Presencial para registro de preços visando à contratação de empresa especializada em prestação de serviços de assessoria e apoio em atividades técnicas relativas a estudos e projetos de obras viárias urbanas, obras de arte especiais
(OAE), entre outros.
Número Unificado: MPC-SC 2.1/2022.119
1 – RELATÓRIO
Tratam os autos da análise do Edital de Pregão Presencial nº 132/2021, lançado pela Prefeitura de Navegantes, com vistas ao registro de preços para a contratação de empresa especializada em prestação de serviços de assessoria e apoio em atividades técnicas relativas a estudos e projetos de obras viárias urbanas, obras de arte especiais (OAE), projetos de construção civil, projetos urbanísticos, montagem de programas de financiamento nacional e/ou internacional, revitalização de áreas públicas, estudos ambientais e supervisão e/ou fiscalização de obras.
Auditores da Diretoria de Licitações e Contratações – DLC sugeriram determinar a sustação cautelar do certame e a audiência do responsável para adoção das medidas corretivas ou anulação da licitação, em face de irregularidades passíveis de multa.1
1 Relatório nº DLC-1197/2021 (fls. 108/120).
O Conselheiro Relator acolheu o encaminhamento proposto,2 com deliberação sobre a medida cautelar ratificada em Plenário.3
Devidamente notificado, o Município de Navegantes apresentou manifestação em que pleiteia a revogação tutela assecuratória e defende a higidez da licitação.4
Ao reanalisar o feito, auditores do Tribunal alvitraram manter a sustação cautelar da licitação e declarar a ilegalidade do Edital de Pregão Presencial nº 132/2021-PMN, determinando sua anulação e recomendando providências à Unidade Gestora.5
Vieram-me os autos.
2 – ANÁLISE
Por meio do Edital de Pregão Presencial nº 132/2021, a Prefeitura de Navegantes lançou licitação para registro de preços com vistas à contração de empresa prestadora de serviços em diversas áreas de engenharia, senão vejamos:6
1. OBJETO
1.1. O presente Pregão visa à escolha da melhor proposta em conformidade com as quantidades e características descritas abaixo e na folha modelo “RELAÇÃO DE ITENS” para o seguinte objeto:
PREGÃO PRESENCIAL PARA REGISTRO DE PREÇOS VISANDO A CONTRATAÇÃO DE EMPRESA ESPECIALIZADA EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSESSORIA E APOIO EM ATIVIDADES TÉCNICAS RELATIVAS A ESTUDOS E PROJETOS DE OBRAS VIÁRIAS URBANAS, OBRAS DE ARTE ESPECIAIS (OAE), PROJETOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL, PROJETOS URBANÍSTICOS, MONTAGEM DE PROGRAMAS DE FINANCIAMENTO NACIONAL E/OU INTERNACIONAL, REVITALIZAÇÃO DE
2 Decisão Singular nº GAC/HJN-1020/2021 (fls. 121/127).
3 Fl. 132.
4 Fls. 133/136, por meio de procurador-geral investido à fl. 137.
5 Relatório nº DLC-1276/2021 (fls. 139/153).
6 Fl. 4.
ÁREAS PÚBLICAS, ESTUDOS AMBIENTAIS E SUPERVISÃO E/OU FISCALIZAÇÃO DE OBRAS, A FIM DE ATENDER AS NECESSIDADES DO MUNICÍPIO DE NAVEGANTES, ATRAVÉS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE PLANEJAMENTO URBANO DE NAVEGANTES/SC. (Grifos meus).
Os serviços foram agrupados em item único, com valor máximo estimado em R$ 7.603.293,64.7
Como se vê, há inegável amplitude do objeto licitatório, englobando, em apenas um lote, serviços bastante diversos, como elaboração de projetos de engenharia, programas de financiamento, estudos ambientais e supervisão de obras.
A necessidade do ente, por sua vez, foi assim definida em justificativa constante no Anexo VII (Termo de Referência) do edital em comento:8
3. JUSTIFICATIVA
Como cidade polo da região da foz do Rio Itajaí, o Município de Navegantes se depara com inúmeros desafios, entre os quais prover a cidade de infraestrutura suficiente e de qualidade para atender à demanda crescente por serviços públicos, que não raro envolve parcerias com o Governo do Estado e com a União, com a utilização de recursos que tem como maiores financiadores a Caixa Econômica Federal, o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul, BADESC – Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A e Banco do Brasil, todos a requererem projetos bem elaborados.
O município, tem já autorizado a contratação de financiamento no montante de R$ 21 milhões, para execução de obras de pavimentação e reurbanização de um importante conjunto de avenidas e ruas (Avenidas Conselheiro Xxxx Xxxx, Santos Dumont, João Sacavém, Nereu Liberato Nunes, Ruas Xxxxxx Xxxx, Xxxxx Xxxxx, Xxxx Xxxxxx e 26 de Agosto).
8 Fls. 47/48.
Para isso o município tem contado com o apoio da equipe técnica da AMFRI [Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí]. No entanto os projetos elaborados por aquela equipe necessitam ser analisados e customizados à realidade local, demandando corpo técnico e equipes multidisciplinares. No momento a administração municipal possui em seu quatro 8 profissionais de engenharia/arquitetura sendo: i) quatro lotados na Secretaria de Planejamento Urbano, os quais atuam na análise e fiscalização de projetos – alvarás, habite-se,...
ii) um na Secretaria de Saneamento Básico, atuando nas áreas de projeto e recuperação de redes de água e esgoto;
iii) um junto a Secretaria de Educação, o qual acompanha as ampliações e manutenções das unidades municipais de ensino e iv) um junto a Secretaria de Obras, o qual elabora projetos e acompanha a fiscalização de obras viárias e de prédios urbanos do município, sendo que este último já realiza jornada de trabalho extra para fazer frente às demandas.
Por conta disso, as obras necessárias, além de vultosas, vêm ganhando complexidade, o que faz com que não sejam aceitáveis indicações gerais para sua contratação, mas que haja projetos completos de engenharia, para os quais o pequeno corpo técnico municipal não tem como suprir, uma vez que não detém equipe multidisciplinar para atender as necessidades e complexidades dos projetos mencionados e de outros necessários ao desenvolvimento do município e ampliação/melhoria dos serviços prestados aos cidadãos.
Assim é que nos deparamos com a necessidade de contratação de empresa especializada na elaboração de projetos executivos e complementares, para ampliar o espectro de ação do Município, viabilizando a vinda de novos investimentos e principalmente garantindo a melhor aplicação dos recursos públicos. (Grifos meus).
A transcrição dos trechos acima se destina a evidenciar a necessidade pública delimitada pela Prefeitura
de Navegantes e as justificativas que embasaram a abertura de certame nos moldes do edital em comento.
Resta perquirir se o modelo de contratação idealizado se compatibiliza com o ordenamento jurídico.
Desde já, porém, registro coadunar auditores do Tribunal quanto à ilegalidade da licitação em tela.
Em suma, o gestor invocou: a) dever de “prover a cidade de infraestrutura suficiente e de qualidade para atender à demanda crescente por serviços públicos”; b) a situação recorrente de parcerias com outros entes estatais e agentes financiadores; c) a exigência de “projetos bem elaborados” e “customizados à realidade local”; d) a insuficiência do corpo técnico municipal, diante da inexistência de “equipe multidisciplinar para atender as necessidade e complexidade dos projetos mencionados e de outros necessários ao desenvolvimento do município”; e e) “a necessidade de contratação de empresa especializada na elaboração de projetos executivos e complementares”.9
Da análise dos motivos expressos, fácil notar que nenhum deles representa exclusividade do Município de Navegantes, sendo a realidade, se não da totalidade, da maioria dos municípios catarinenses.
Tal afirmação tem como objetivo ressaltar a importância da decisão a ser tomada pelo Tribunal de Contas, haja vista que a chancela ao modelo de contratação em tela poderia repercutir em proliferação de igual iniciativa por outras prefeituras. Esse, aliás, parece ter sido o caso dos autos.
Em suas justificativas, o Município de Navegantes afirmou que o certame “teve como base o Edital de Pregão Presencial nº 242/SMA/DSLC/2021, publicado pela Prefeitura
9 Fls. 47/48.
de Florianópolis. [...] que tramitou nessa Corte de Contas sob o nº @LCC-21/00401224” (com adequações no texto).
Nos referidos autos, a partir de divergência consignada em parecer da lavra do Procurador de Contas Diogo Xxxxxxx Xxxxxxxxxx,10 diferenciando contratação de obras propriamente ditas e dos estudos e projetos que as antecedem e da fiscalização e supervisão que são com elas concomitantes, o Plenário do TCE/SC reputou legal procedimento licitatório cujo objeto, de fato, possui acentuada semelhança com o do caso em realce.11
Sem pretender questionar a manifestação ministerial e a deliberação tomada naquele feito - tarefa esta já bem desempenhada por auditores da DLC -, reputo que tal entendimento não deve prevalecer em casos futuros.12
Em verdade, o TCE/SC vinha, reiteradamente, decidindo pela ilegalidade de editais licitatórios com definição imprecisa de objeto, como se extrai do Acórdão nº 503/2019 (@LCC-19/00561694), da Decisão nº 53/2021 (@LCC-
19/00878892) e do Acórdão nº 304/2021 (@LCC-19/00885597),
todos referentes a certames realizados pelo Município de Florianópolis.
Nos autos nº @LCC-19/00885597, tive oportunidade de manifestar sobre a matéria nos seguintes moldes:
A utilização de licitação “guarda-chuva”, além de encontrar óbice no art. 23, § 1º, no art. 54, § 1º, e no art. 55, inciso I, também afronta o art. 7º, § 2º, incisos II e III, e o art. 14, todos da Lei nº 8.666/93, é rechaçada pelas Cortes de Xxxxxx.
10 Parecer nº MPC/DRR/1762/2021 (fls. 178/191 dos autos nº @LCC- 21/0401224).
11 Decisão nº 694/2021 (fl. 203 dos autos nº @LCC-21/0401224).
12 Registre-se que já tramita processo a respeito de possível irregularidade semelhante lançada pelo Município de Chapecó (@LCC- 21/00662613).
A propósito, o Tribunal de Contas da União, por meio do Acórdão nº 3096/2016, determinara a anulação de certame em face de idêntica restrição:13
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de auditoria de conformidade cujo objetivo foi fiscalizar as obras de implantação da linha de transmissão LT 230KV entre os municípios de Rio Branco, Feijó e Cruzeiro do Sul, no Acre, além das subestações (SE) associadas.
ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo relator, em:
9.1. assinar prazo de 15 (quinze) dias, a contar da ciência desta deliberação, para que a Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. promova a anulação do contrato 0000000000, celebrado com o Consórcio Leme-Themag, decorrente da concorrência CC-012-4-0067, em razão das seguintes irregularidades:
9.1.1. ausência de parcelamento e indefinição de seu objeto, que só é determinado durante o curso da execução do ajuste, com infração aos arts. 7º, § 4º, 14, 23, § 1º, 40, I, e 54, § 1º, todos da Lei 8.666/1993, bem como ao disposto na Súmula 177-TCU, além de afronta aos princípios da isonomia, da seleção da proposta mais vantajosa e da publicidade (art. 3º, da Lei 8.666/1993);
Na mesma direção, é o posicionamento do Tribunal de Contas de Mato Grosso, conforme se depreende do seguinte trecho do voto condutor do Acórdão nº 187/2018, por meio do qual fora determinada a suspensão cautelar dos serviços vinculados a contrato tido como “guarda-chuva”:14
[...] Corroborou, ainda, quanto à provável afronta ao princípio da vantajosidade, a descrição bastante elástica do objeto contratado, que envolve praticamente todos os itens da estrutura física das unidades escolares. Esse tipo de contratação, segundo a doutrina e jurisprudências
13 Disponível em: xxxxx://xxxxxxxx.xxxx.xxx.xxx.xx/#/xxxxxxxxxxx/xxxxxxx-xxxxxxxx/%00XXX RDAO-COMPLETO-2197305%22. Acesso em: 17-2-2022.
14 Disponível em: xxxxx://xxx.xxx.xx.xxx.xx/xxxxxxxxx/xxxxxxx/xxx/000000/xxx/0000. Acesso em 17-2-2022.
pátrias, batizou-se com o nome de “contrato guarda-chuva”, em que outras firmas são subcontratadas para efetuar a manutenção dos múltiplos serviços, sendo que tal prática é repudiada pelas Cortes de Contas, por ferir o disposto no § 1º do artigo 23 da Lei de Licitações. (Grifos acrescidos).
Embora os precedentes mencionados acima tratem especificamente de contratação de obras, o mesmo entendimento pode ser aplicado aos casos de contratação de serviços de engenharia consistentes na elaboração de estudos/projetos ou na supervisão/fiscalização de obras, porquanto a disciplina legal é a mesma para ambos os objetos. Veja-se:
Art. 23. [...].
§ 1º As obras, serviços e compras efetuadas pela Administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala. [...].
§ 2º Na execução de obras e serviços e nas compras de bens, parceladas nos termos do parágrafo anterior, a cada etapa ou conjunto de etapas da obra, serviço ou compra, há de corresponder licitação distinta, preservada a modalidade pertinente para a execução do objeto em licitação.
Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.
§ 1º Os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam. [...].
Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
I - o objeto e seus elementos característicos; [...]. (Grifos meus)
No caso de serviços, a nova Lei de Licitações e Contratações foi além, estabelecendo critérios a serem observados, dentre os quais o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado. Ainda que o diploma não incida na espécie, importante o registro para reflexão da decisão a ser tomada pela Corte de Contas. Eis o teor da Lei nº 14.133/2021:
Art. 47. As licitações de serviços atenderão aos princípios:
[...]
II - do parcelamento, quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso.
§ 1º Na aplicação do princípio do parcelamento deverão ser considerados:
I - a responsabilidade técnica;
II - o custo para a Administração de vários contratos frente às vantagens da redução de custos, com divisão do objeto em itens;
III - o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado. (Grifo meu).
Ainda sobre o tema, colho da doutrina de Xxxxxxxx
A efetivação de contrato guarda-chuva caracteriza um caso típico de ausência de parcelamento do objeto, uma vez que, via de regra, por meio desse instrumento não há parcelamento de objeto da maneira que sua natureza o exigiria, possibilitando uma maior participação de interessados, levando à ampliação da economia e da competitividade. Nesse tipo de contrato o objeto é muito amplo, caracterizado pela dificuldade em defini-lo com
15 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Governança e Gestão de Obras Públicas. 1ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
precisão. Como contrato guarda-chuva possui essas indefinições, as partes acabam por efetuar contratos acessórios vinculados àqueles.
[...]
Os contratos guarda-chuvas, não raro, acontecem também quando da contratação de projetos básicos e/ou executivos, o que também caracteriza irregularidade, tendo em vista o não parcelamento do objeto. Neste caso o termo de referência não descreve de forma adequado os projetos que se pretende contratar, gerando insegurança aos contraentes em vários aspectos, incluindo prazo, custos e quantidade a ser contratada. O contrato guarda-chuva caracteriza fraude à licitação. (Grifos meus).
Assim, a essência do contrato vulgarmente conhecimento “guarda-chuva” consiste em um modelo de relação jurídica que, pela sua amplitude, à semelhança do objeto de uso humano, permite cobrir uma série de necessidades da Administração Pública que possam surgir ao longo do tempo.
A fim de evidenciar que o Edital de Pregão Presencial nº 132/2021-PMN possui efetivamente essa finalidade, além do que resulta do seu próprio objeto, limito-me à transcrição de um excerto elucidativo do Termo de Referência:16
4.2 Projetos de Obras Civis
4.2.1 Anotações iniciais
O conceito autoral e especificações técnicas são exclusivamente de responsabilidade dos autores, qualquer alteração deve ter a concordância da empresa projetista.
O programa de necessidades será fornecido pela prefeitura em tempo hábil de dez dias úteis após a assinatura da Ordem de Serviço, bem como toda a padronização de materiais e quaisquer outros elementos necessários para a perfeita
16 Fl. 51.
elaboração técnica dos projetos (espessuras de paredes, material e tipos de acabamento, forros e outros necessários para a elaboração dos projetos). (Grifo meu).
Somado a isso, a capacidade operacional exigida da empresa licitante consiste na comprovação de ter executado pelo menos 5 dentre 6 tipos de projetos listados, ao passo que a comprovação da capacidade profissional demanda pelo menos 8 profissionais com experiência dentre 9 áreas de especialização elencadas (itens 5.6.3 a 5.6.20 do edital em comento).17
Tais exigências excessivas possuem inegável relação com a amplitude do objeto licitatório, permitindo vislumbrar a causa (ausência de planejamento adequado) e as possíveis consequências (restrição da competividade e incerteza quanto à obtenção da proposta mais vantajosa) desse modelo de contratação.
Em arremate, colaciono trecho do Parecer nº MPC/1337/2020 exarado pela Procuradora de Contas Cibelly Farias nos autos nº @LCC-19/00885597:
A referida conduta de prever objeto amplo e indefinido amolda-se ao que tanto doutrina quanto jurisprudência denominam “contrato guarda-chuva”, em virtude de um mesmo contrato abranger uma série de objetos distintos entre si debaixo de uma mesma justificativa no espectro da licitação, o que é vedado, consoante o disposto nos arts. 54 e 55 da Lei n. 8.666/93. Nesse sentido, Joel de Menezes Niebuhr18 tece as seguintes considerações:
Os incisos do art. 55 da Lei nº 8.666/93 prescrevem cláusulas que, conforme o seu caput, são necessárias em todos os contratos administrativos. Todas essas cláusulas, em consonância ao § 1º do art. 54 e ao inciso XI do próprio
18 XXXXXXX, Xxxx xx Xxxxxxx. Licitação pública e contrato administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 674.
art. 55, ambos da Lei nº 8.666/93, devem guardar estrita conformidade com o instrumento convocatório e com o teor da proposta do licitante vencedor do certame.
Com efeito, o inciso I do art. 55 da Lei nº 8.666/93 determina que uma das cláusulas obrigatórias dos contratos é justamente o objeto e seus elementos característicos. Evidentemente, todos os contratos, administrativos ou privados, precisam dispor do seu objeto em detalhe, isto é, sobre o que é o contrato, ou melhor, o que o contratado terá que fazer. Trata-se da informação basilar do contrato. É importante que a Administração seja minuciosa na descrição do objeto, até para que ela posteriormente possa exigir tudo o que pretende do contratado (grifei).
No mesmo sentido, Marçal Justen Filho19 delineia as peculiaridades que tornam a especificação do objeto a ser contratado tão importante:
O objeto do contrato é seu núcleo. Consiste nas prestações que as partes de obrigam a realizar. O objeto imediato do contrato administrativo é a conduta humana (consistente em um dar, fazer ou não fazer). O objeto mediato do contrato administrativo é o bem jurídico sobre o qual versa a prestação de dar, fazer ou não fazer. O ato convocatório, ao definir o “objeto da licitação”, estabelece uma delimitação geral e imprecisa do “objeto do contrato”. Antes de examinadas as propostas e selecionada a mais vantajosa, não se pode precisar de modo rigoroso qual o conteúdo e a extensão da prestação assumida por cada parte. O instrumento deve definir, de modo preciso, as prestações que cada parte assume. Essa definição subordinar-se-á aos termos do ato convocatório e da proposta selecionada como a melhor. Todos os dados característicos e identificadores do objeto mediato deverão ser indicados, tais como marcas, especificações técnicas, dimensões, desempenho etc. essa descrição é relevante para permitir o exercício do controle de qualidade. No momento da execução do contrato, a Administração promoverá a verificação da compatibilidade
19 XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 2010, p. 709.
dos produtos entregues com a descrição contida no instrumento contratual (grifei).
Como se vê, a definição precisa dos limites do objeto a ser contratado é importantíssima não somente pela necessidade de se saber de antemão aquilo que vai ser contratado – de modo a garantir nível suficiente de garantia jurídica tanto para a Administração contratante quanto para os licitantes
–, como também para prevenir eventuais práticas irregulares, na medida em que quanto mais genérico o objeto, maior a chance de participação de empresas com interesses escusos, conforme a prática política vem comprovando ao longo das últimas décadas no país. Ademais, e não menos importante, a precisão do objeto afigura-se imprescindível para o exercício do controle e fiscalização da execução contratual. (Grifos no original e acrescidos).
Com essas razões, coaduno na íntegra o encaminhamento sugerido por auditores do Tribunal.
3 – CONCLUSÃO
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas do Estado de Santa Catarina, com amparo nas atribuições conferidas pelo art. 108 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, manifesta-se pela ADOÇÃO das providências sugeridas no Relatório nº DLC-1276/2021.
Florianópolis, 18 de fevereiro de 2022.
XXXXXXX XXXXXX
Procurador de Contas