Inexigibilidade de Licitação – Credenciamento – Contratação de Serviços Médicos e de Plantões
Inexigibilidade de Licitação – Credenciamento – Contratação de Serviços Médicos e de Plantões
Vem, à esta Assessoria Jurídica do Município, solicitação de parecer conclusivo acerca da possibilidade de se contratar serviços médicos diversos, através de processo de credenciamento.
A contratação mediante prestação de serviços, seja com pessoa física ou jurídica só pode ser realizada em caráter eventual, esporádico ou contingencial, restringindo-se sempre às atividades-meio da Administração. Especificamente no que concerne à área da Saúde, a Constituição Federal admitiu a possibilidade dos serviços serem atribuídos a terceiros:
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
§1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.
Portanto, percebe-se que a prestação de serviços de saúde por pessoas físicas ou jurídicas é autorizada em lei de forma complementar, mediante contrato ou convênio para execução de parte dos serviços, visto que o Município não poderia abrir mão da prestação de serviços que lhe incumbe, transferindo-o a terceiros.
A contratação de serviços médicos em caráter excepcional e sem o provimento de cargos por concurso público decorre da obrigatoriedade do Estado,
em caráter contínuo, prover serviços de saúde para o cidadão, nos termos dos arts. 2º e 7º da Lei Federal 8.080/1990:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
Mais a frente, o art. 24 do mesmo diploma legal assim preleciona:
Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.
Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.
Portanto, há comandos legais suficientes para determinar que os serviços de saúde devem funcionar para atender ao cidadão de forma universal e que, inclusive, o Ente Estatal pode recorrer aos serviços privados, em caráter complementar, quando os serviços próprios forem insuficientes para prover a assistência necessária.
Neste sentido, o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará editou a Resolução nº 14.172:
EMENTA: CONSULTA. PREFEITURA MUNICIPAL DE OURILÂNDIA DO NORTE. EXERCÍCIO 2017. ADMISSIBILIDADE. CONTRATAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA ÁREA DA SAÚDE COMO PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE MÉDICOS PARA EXECUÇÃO DE PLANTÕES. VERIFICAÇÃO DE EXCEPCIONALIDADE PREVISTA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FIXAÇÃO DOS PLANTÕES MÉDICOS EM TURNOS DE 12 OU 24 HORAS. REGULAMENTAÇÃO MUNICIPAL. TERCEIRIZAÇÃO. PROCESSO LICITATÓRIO PRÉVIO. CREDENCIAMENTO. PRECEDENTES DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO - TCU. REQUISITOS COM FUNDAMENTO NA LEI FEDERAL N. 0 8.080/1990; LEI FEDERAL N. 0 9.637/1998 e PORTARIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE N. 0 1.034/2010. OBSERVÂNCIA DO MANUAL DE ORIENTAÇÕES PARA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. IMPACTOS NOS LIMITES DE DESPESA COM PESSOAL. SUBSTITUIÇÃO DE MÃO-DE-OBRA X PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. VERIFICAÇÃO IN CONCRETO. INTELIGÊNCIA DO ART. 18, §1º, DA LEI COMPLEMENTAR N. 0 101/2000.
Cumpre esclarecer que a contratação, pela Administração Pública, através da modalidade conhecida por Credenciamento se dá, juridicamente, através de inexigibilidade de licitação, nos termos do caput do art. 25 da Lei nº 8.666/1993.
Sabe-se que o rol existente no art. 25 da Lei nº 8.666/1993 é meramente exemplificativo, sendo possível a contratação por inexigibilidade de licitação sempre que inexistir, de acordo com a justificativa dos autos, concorrência para a contratação do objeto pretendido.
A idéia de se realizar um processo licitatório se dá pela necessidade da Administração facultar, à todos os interessados, a possibilidade de contratar consigo e escolher a melhor proposta através de critérios objetivos, insertos no bojo do Edital.
No entanto, se o interesse da Administração é contratar tantos quantos se apresentem – obviamente que cumprindo requisitos prévios estabelecidos em Edital –, não há escolha da melhor proposta, razão pela qual o procedimento licitatório é inexigível. A opção pelo credenciamento se dá desta forma, ou seja, quando a Administração possui interesse de contratar todos que se habilitarem e cumprirem requisitos mínimos insertos no Edital de Credenciamento.
O Professo Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx, em sua obra “Contratação Direta Sem Licitação” assim dispõe:
Se a Administração convoca todos os profissionais de determinado setor, dispondo-se a contratar todos os que tiverem interesse e que satisfaçam os requisitos estabelecidos, fixando ela própria o valor que se dispõe a pagar, os possíveis licitantes não competirão, no estrito sentido da palavra, inviabilizando a competição, uma vez que a todos foi assegurada a contratação.” (XXXXXXXXX, 2000)
Mais à frente, na mesma obra, arremata tratando das condições necessárias à consecução de um credenciamento:
“1. todos os que satisfaçam às condições exigidas: não pode haver só um fornecedor que realize o objeto, pois a característica principal é que todos os selecionados serão contratados, embora demandados em quantidades diferentes;
2. impessoalidade na definição da demanda, por contratado: exclui- se a vontade da Administração na determinação da demanda pelo credenciado;
3. que o objeto satisfaça na forma definida no edital: atividade bastante regulamentada ou de fácil verificação, na qual as diferenças pessoais entre os credenciados têm pouca relevância;
4. que o preço de mercado seja razoavelmente uniforme: comprovação e demonstração pela Administração da vantajosidade do preço por ela fixado em relação ao que poderia decorrer de um processo licitatório”. (XXXXXXXXX, 2000)
O TCU, também, já consagrou o Credenciamento como forma de contratação pela Administração Pública, nos seguintes termos:
Admissão do credenciamento como hipótese de inexigibilidade de licitação
O Comandante do Exército solicitou ao TCU orientação acerca da viabilidade jurídica da celebração de convênio de cooperação entre o Exército Brasileiro e a Agência de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas (ADS), com vistas à aquisição de gêneros alimentícios diretamente dos produtores rurais, cooperativas e associações, cadastrados pela referida agência, que seriam contratados diretamente, por inexigibilidade de licitação. Os produtos adquiridos seriam destinados, em especial, ao Comando da 12ª Região Militar, responsável pelo suprimento de gêneros para as organizações militares distribuídas na Amazônia Ocidental (Roraima, Amazonas, Acre e Rondônia), totalizando 96 unidades do Exército, inclusive aquelas localizadas ao longo de 11.600 Km do perímetro Norte e Noroeste do Brasil, totalizando um efetivo em torno de 20.000
militares, cujo abastecimento vem sendo feito com dificuldades. Para o relator, a solicitação formulada ao Tribunal não atendia aos requisitos de admissibilidade para ser conhecida como “consulta”. Não obstante, considerou pertinente, ante a relevância da matéria, fossem prestadas ao interessado, excepcionalmente, sem caráter de prejulgamento de tese, as seguintes informações: 1a) “é juridicamente viável a celebração de convênio de cooperação com vistas ao fornecimento de produtos regionais para os pelotões de fronteira, pois, presente o interesse do Exército, configura-se a mútua colaboração, a fim de, como garantia da soberania e da defesa nacional, proporcionar à população circunvizinha das unidades inserção na economia local, havendo, portanto, um interesse público em promover seu desenvolvimento, fundamentalmente no que se refere à estratégia militar pensada para a região”; 2a) “não se afigura legítima a contratação por inexigibilidade de licitação para as unidades do Exército situadas nas cidades em que não exista dificuldade de acesso a suprimentos alimentícios, pois nestas localidades a estratégia militar invocada não teria lugar, representando simples aquisição de alimentos”; 3a) “embora não esteja previsto nos incisos do art. 25 da Lei n.o 8.666/1993, o credenciamento tem sido admitido pela doutrina e pela jurisprudência como hipótese de inexigibilidade inserida no caput do referido dispositivo legal, porquanto a inviabilidade de competição configura- se pelo fato de a Administração dispor-se a contratar todos os que tiverem interesse e que satisfaçam as condições por ela estabelecidas, não havendo, portanto, relação de exclusão”; 4a) “na hipótese de opção pelo credenciamento dos agricultores que formarão a rede de suprimento de gêneros para as organizações militares distribuídas na Amazônia Ocidental, deve ser observado que, para a regularidade da contratação direta, é indispensável a garantia da igualdade de condições entre todos os interessados hábeis a contratar com a Administração, pelo preço por ela definido”; e 5a) “é possível à Administração realizar a contratação direta, mediante inexigibilidade de licitação, desde que haja a demonstração inequívoca de que suas necessidades somente poderão ser atendidas dessa forma, cabendo a devida observância das exigências do art. 26 da Lei n.o 8.666/1993, principalmente no que concerne à justificativa de preços”. Acórdão n.º 351/2010-Plenário, TC- 029.112/2009-9, rel. Min-Subst. Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx, 03.03.2010.
Portanto, desde que haja demonstração inequívoca de que as necessidades da Administração somente poderão ser atendidas através de um procedimento de Credenciamento; que todos os que satisfaçam os requisitos exigidos pela Administração sejam contratados, mesmo que em quantidades diferentes; que o preço estipulado pela Administração esteja corretamente justificado, denotando vantajosidade na opção do Credenciamento em detrimento de outra modalidade; que a atividade credenciada seja bastante regulamentada ou de fácil verificação, na qual as diferenças pessoais entre os credenciados tem pouca
relevância; que seja garantida a impessoalidade da Administração na demanda pelo Credenciado, ou seja, garantir meios imparciais para estabelecer quantificação de demanda, como um sorteio, por exemplo.
Desta feita, atendidas as determinações acima, é possível a contratação, através de Credenciamento, pela Administração Pública, observando- se, sempre, o princípio da Impessoalidade.
De outra ponta, o Edital de Credenciamento garante a ampla participação dos interessados e, da mesma forma, estabelece, de forma clara e objetiva a maneira com que os serviços serão executados, inexistindo quaisquer cláusulas restritivas.
É o parecer, S.M.J.
Soure (PA), 30 de setembro de 2022.