OS CONTRATOS DE PARCERIA PÚBLICO- PRIVADA COMO POSSIBILIDADE DE ABERTURA PARA NOVOS NEGÓCIOS COM O PODER PÚBLICO
OS CONTRATOS DE PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA COMO POSSIBILIDADE DE ABERTURA PARA NOVOS NEGÓCIOS COM O PODER PÚBLICO
OS CONTRATOS DE PARCERIA PÚBLICO- PRIVADA COMO POSSIBILIDADE DE ABERTURA PARA NOVOS NEGÓCIOS COM O PODER PÚBLICO
Los contratos de participación público-privada como una posible apertura de nuevos negocios con el gobierno
XXXX, X. X. XXXXXX, X. X.
Recebimento: 23/05/2011 - Aceite: 18/10/2011
RESUMO: O presente artigo aborda e analisa o interesse público como sendo o interesse da sociedade e não o das corporações que, por vezes, tomam o público – fazendo a sociedade refém – para si. Faz uma análise crítica da Lei de Parcerias Público-Privadas, a Lei 11.079/04 que traz a possibilidade de uma abertura de novos negócios. Se de um lado se busca a efetiva realização das carências estruturais já tão conhecidas da sociedade, por outro, se objetiva a efetiva potencialidade de negócios em que se tenha um mínimo de garantias de um retorno seguro de investimentos. Observam, os autores, que a própria noção de interesse público não deve ser vista como oposta aos interesses privados e que talvez a Lei seja mais uma tentativa de se possibilitar e até mesmo de se incentivar a participação ativa da sociedade em um processo de rediscussão da prática administrativa em um espaço modificado cultural e politicamente nas últimas décadas.
Palavras-chave: Parceria público-privada. Economia. Negócio.
RESUMEN: En este artículo se ponen el interés público y el interés de la sociedad, no las corporaciones que a veces hacen público - volviendo rehén a la sociedad - para sí misma. Hace un análisis crítico de la Ley de Las asocia- ciones público-privadas. La Ley 11.079/04 ofrece la posibilidad de la apertura de un nuevo negocio. Si de un lado es la búsqueda efectiva de realización de las deficiencias estructurales ya tan conocidas en la sociedad, de outro objectiva negocio potencial efectivo en el que haya garantías mínimas de compensaciones seguras de sus inversiones. Los autores señalan que la pro- pia noción de interés público no debe verse en contraposición a los intereses
privados, y que tal vez la Ley sea un intento más a permitir e incluso alentar a que la participación activa de la sociedad en un proceso de re-examen de la práctica en un espacio con modificaciones de orden cultural y político en los últimos decenios.
Palabras clave: Asociación público-privada. Economía. Negocios.
O ambiente da discussão
O 44º Presidente dos Estados Unidos da América é negro e descende de muçulmanos. Independente do seu carisma e da ajuda invo- luntária do seu tolo predecessor, Xxxxx foi eleito com a ajuda de uma ferramenta virtual ainda nova à época da sua eleição que permi- tia aos seus eleitores o acompanhamento, em tempo real, da sua vida pessoal e política. O twitter – agora sinônimo de êxito eleitoral – passou a ser usado pelos políticos brasileiros e por importantes parcelas da sociedade.
Depois de eleger e reeleger um metalúr- gico oriundo dos sindicatos, o Brasil elege para o seu topo institucional uma militante presa e torturada nos anos da ditadura militar. O Brasil será sede da Copa do Mundo de 2014 e as suas 12 cidades-sede necessitam de vultosos investimentos em infra-estrutura. Estudos técnicos mostram a incapacidade de tanto o sistema viário quanto o aeroviário suportarem a demanda no período dos jo- gos. O sistema carcerário é um caos. O país vive crise iminente de energia, os viventes no campo que o digam. Apenas dois anos depois da Copa, em 2016, o maior evento esportivo do planeta terá, pela primeira vez na história, a América Latina como palco. A cidade do Rio de Janeiro, com todas as suas mazelas e belezas inigualáveis, sediará os jo- gos olímpicos e paraolímpicos. Os Tribunais de Contas, as Controladorias, os Ministérios Públicos da União e dos Estados, atentos para a “fiscalização” do uso do dinheiro público e para a aplicação da lei de responsabilidade
fiscal, já começam a perceber que a palavra transparência e os espetáculos do controle estão sendo incapazes de mitigar a sangria de recursos públicos. O mundo se volta para nós e precisamos escolher a resposta que queremos dar ao mundo. O privado interessa ao público e o público interessa ao privado. Anote-se, já por aqui, que as carências de in- fra-estrutura não nasceram com Copa ou com Olimpíadas; é o crescimento econômico do Brasil que exige importantes investimentos de modo a superarmos gargalos históricos.
Muito já se disse sobre crise do ideário político-institucional do welfare state e so- bre o processo consequente de transferência da prestação dos serviços públicos ao setor privado; assim como muito já se discutiu sobre a “publicização do privado” ou “priva- tização do público”, o que de regra somente consagra a própria sobrevivência desta visão dicotômica e, por isso mesmo, deveriam ser expressões evitadas (TIMM, 2006, p.151). Independente da discussão teórica sobre estes processos que não são de agora, o certo é que a lei 11.079/04 é mais um reflexo da imbri- cação e ambivalência dos ambientes público e privado, sem perder de vista o interesse público na execução de obras e prestação de serviços de natureza pública.
Para o diapasão proposto, interesse públi- co deve ser compreendido como sendo o in- teresse da sociedade e não o das corporações que, por vezes, tomam o público – fazendo a sociedade refém – para si. Portanto, os crité- rios a serem utilizados para interpretação da Lei de Parcerias Público Privadas são aqueles que partem da sociedade para o Estado, e não
o contrário. A lei toma para si as necessidades da contemporaneidade e abandona explicita- mente o publicismo do começo do século XX e isso não é uma arbitrariedade dos autores, é o comando constitucional operando para dar novas ordens ao jurídico e aos juristas.
Talvez seja mais uma tentativa de se possibilitar e até mesmo de se incentivar, a participação ativa da sociedade num processo de rediscussão da prática administrativa num espaço modificado cultural e politicamente nas últimas décadas, onde se busca(ria) uma alternativa transcendente “tanto a social-democracia do velho estilo, quanto o neoliberalismo”, naquilo que comumente se denominou “terceira via” (GIDDENS, 2000,
p. 36). Como esclarece o próprio Xxxxxxx, a denominada “xxxxxxxx xxx” xxxxx, xx xxxx, a social-democracia modernizada. Um movimento de centro-esquerda, onde não se teria abandonado a política da solidariedade tradicionalmente defendida pela esquerda, mas que reconheceria a necessidade de se trabalhar alianças que proporcionassem uma base para ações práticas. De modo que seus principais objetivos passariam, necessariamente, pela reforma do Estado, a revitalização da sociedade civil, a criação de fórmulas para o desenvolvimento sustentado e a preocupação com uma nova política internacional (GIDDENS, 1998).
Estes elementos configuram um Estado para além das garantias sociais as quais ele não se desincumbiu. Isto porque exige desta institucionalidade uma postura tão segura que seja capaz de enxergar nele o parceiro para
o desenvolvimento de uma obra ou serviço público, com um mínimo de garantias que permitam o aporte de recursos e o seu retorno com previsão de mercado. Nada mais, apenas uma legítima expectativa da viabilidade do negócio que pode(rá) ser feito, num mundo onde os capitais ainda caem na tentação da especulação financeira e fogem da efetiva construção dos bens a serem entregues para
a humanidade por intermédio de um Estado disposto a construir-se nesta direção.
Em razão das próprias exigências deste ambiente em que o Estado se insere como parceiro “interessado” na tomada destes ser- viços públicos, o Brasil mostra a sua solidez ao mercado internacional. Aceita o convite do FMI para transformar-se em credor na ordem dos US$ 4,5 bilhões. Diminui o risco-país. Credencia-se para eventos mundiais (Copa, Olimpíadas, etc.). Busca sua cadeira perma- nente no Conselho de Segurança da ONU. E, junto com China, Rússia e Índia, é tido como um dos grandes mercados em emergência.
Neste mesmo caminho, não há escolas, a energia é insuficiente, ferrovias inexistem, a navegação de cabotagem é insipiente, nossos portos inacessíveis à produção, a mão de obra ainda é incapaz de satisfazer as necessidades da construção civil e da alta qualificação da indústria contemporânea. Há um período de escolhas aberto para o País.
O preço pela política econômica restritiva à tomada de novos empréstimos internacio- nais é, no entanto, a redução da capacidade/ possibilidade de investimento próprio em infra-estrutura e serviços públicos que de- mandariam aporte de magníficas quantias de poupança pública; esta é insuficiente para o mínimo das necessidades de um País do porte e das necessidades do Brasil real.
É justamente sob esta realidade de impos- sibilidade de investimento próprio do Estado aliada à urgência destas abordagens frente ao crescimento econômico do país, que surge a lei das parcerias público-privadas (nº. 11.079, de 30 de dezembro de 2004).
Não que isso seja novo ou original. Na verdade, outra vez, estamos atrasados no que se refere à modernidade institucional. A própria idéia de “concessão patrocinada” já podia ser observada no art. 24 (vetado) do projeto de lei que viria a ser a de nº 8.987/95, quando estabelecia que o poder concedente
poderia garantir, no contrato de concessão, uma receita bruta mínima ou, no caso de obras viárias, o correspondente a um tráfego mínimo, durante o primeiro terço do prazo da concessão. À época, o então Presidente FHC sustentou o veto sob o argumento de que “garantias como essa do estabelecimento de receita bruta mínima, além de incentivarem ineficiência operacional do concessionário, representam, na realidade, um risco potencial de dispêndio com subsídio pelo Poder Públi- co” (Mensagem de veto nº. 181/95). Ainda que a Lei 11.079/04 não tenha se referido expressamente a “receitas brutas mínimas”, o certo é que eventuais modelagens dos con- tratos podem induzir esta garantia, pois a lei possibilita esta abertura contratual.
Alguns autores reconhecem que os pro- cessos de reforma do Estado, com privatiza- ções de empresas estatais e flexibilização dos serviços públicos, tiveram embrião ainda no governo de Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, mas somente tomaram forma no governo de Xxxx Xxxxxx Xxxx xx Xxxxx (XXXXXXXX, 1997, p. 15-16). Apenas uma ressalva: enquanto no primeiro projeto de governo se opera(va) a alienação do patrimônio público, no segun- do se busca alianças para o aumento deste patrimônio, já que as PPP’s prevêem indis- tintamente a reversão do objeto do contrato ao poder público.
Então, mesmo sem fazer juízos valorati- vos sobre a opção política tomada num ou n’outro governo e nem sobre a pertinência ou a necessidade de se fazer uma nova aná- lise sobre o papel a ser desempenhado pelo Estado Brasileiro na economia, o fato é que a Lei 11.079/04 oportuniza aos agentes econô- micos uma série de negócios de interesse do Estado, mediante as regras e lógicas próprias do mercado, reforçando a importância da sua função “regulatória”. E isto porque o Estado deverá garantir a livre e ampla concorrência, avaliar as propostas com vistas aos custos sociais e aos danos ambientais, proteger os
consumidores finais e assegurar a eficiência na execução do contrato, elementos que a própria lei assegura em seus princípios (art. 4º).
Ora, gerar elementos que possibilitem a concretização da Lei de PPPs na vida, somente será possível com o diálogo aberto para a contemporaneidade. Os princípios do velho direito administrativo do príncipe, legitimados, ainda, pelas derivações do art. 37 da Constituição, que organiza o Estado, por isso, são coadjuvantes quando se trata de Lei de PPPs. A razão é singela: o que legitima a estrutura jurídico-legislativa nova é o Art. 175 da CF, nascido para regular a ordem econômica.
Portanto, falar de PPP é trazer a vida pul- sante para o mundo do direito para tê-lo como mero instrumento de realização e satisfação das necessidades da sociedade a partir das poupanças privadas por ela acumuladas.
A Lei concreta
Pela própria brevidade da Lei 11.079/04, tem-se encontrado uma verdadeira profusão de análises sobre o “sentido” das PPP’s no ordenamento jurídico. Seja pelo viés admi- nistrativo, fiscal ou constitucional, cada um tem buscado – pela experiência ou interesse próprio – fazer os elogios e críticas aos ins- titutos da lei que, em verdade, ainda depende da execução e aplicação para se consolidar como um efetivo instrumento de parceria entre o público e o privado.
O dissenso talvez seja potencializado pela própria inexperiência fática que não proporciona uma análise mais acurada dos problemas e méritos da Lei nova, pois como ensina Xxxxxx Xxxxxxxx:
Aqueles que têm experiência prática, que convivem com a atividade forense, sabem que essa inefável ‘vontade da lei’
não passa de uma doce miragem. Pode- se dizer que a verdade dos fatos pode interessar ao intérprete, especialmente ao juiz, porém apenas como o estágio inicial da formação do juízo; e sem perder de vista que os ‘fatos’ , assim como a ‘ver- dade’ com que lidamos, são igualmente culturais, historicamente constituídos.
[...]
Xxxx Xxxxxxx, escrevendo sobre a que- relle entre Xxxxxxx e o positivismo de Xxxx, mostra que os ‘fatos, não apenas quando valorados, mas até mesmo quan- do descritos, são objeto de multíplices controvérsias jurídicas, porque, como diz Xxxxxxx, o processo não trata de fatos em estado puro, mas, ao contrário, de fatos que carecem de interpretação que lhes atribua significado. (XXXXXXXX XX XXXXX, 2006, p. 81-109)
Então, sem ter a pretensão de desvelar a lei que institui(u) as normas gerais para licita- ção e contratação de parceria público-privada no âmbito dos Poderes de Estado – mesmo porque ela não passaria de uma quimera -, é preciso, antes de tudo, conhecer o que diz ela mesma para o fim jurídico-político ao qual ela se (pro)põe no ordenamento jurídico.
Isto porque é a própria lei – e somente ela
– que institui e esclarece que existem somente duas modalidades de contrato de “concessão” de parceria público-privada: a patrocinada e a administrativa (art. 2º).
A “concessão patrocinada” é aquela na qual se delega ao particular a execução de obras ou serviços públicos mediante contra- prestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado “adicional” à tarifa cobrada dos usuários (art. 2º. § 1º). Evidente que aqui se busca oportunizar a execução de obras e serviços nos quais a tarifa cobrada seria insuficiente ou impraticável sem a ajuda financeira do Estado como instrumento de (re)equilíbrio na remuneração.
E, a “concessão administrativa” é aquela na qual se delega a prestação de serviços onde a Administração é a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens (art. 2º.
§ 2º). Como o particular não poderia cobrar “tarifa” dos usuários – já que não seria pos- sível seccionar os usuários deste serviço –, o Poder Público assumiria a contraprestação como usuário único (PINTO, 2005, p. 28-38). O exemplo mais usado é sempre o da coleta do lixo, experiência em São Paulo; e, dentre nós, a tentativa da construção e administração dos presídios.
Importante notar que por referência ex- pressa ao art. 31 da Lei 9.074/95, nos proje- tos de PPP apresentados pelos particulares, podendo o Governo encampá-los ou não, é assegurado aos autores ou responsáveis eco- nômicos pelos ditos projetos participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução das obras ou serviços. Embora no projeto de lei original tivesse previsão expressa da possibilidade de participação do particular na futura e eventual licitação, se optou pela referência legislativa pela própria previsão já existente na regulação das concessões.
A lei estabelece algumas vedações às PPP’s (art. 4º.). Primeiro, um limite mínimo de preço de R$ 20 milhões. Segundo, um período mínimo de prestação de serviço de 5 (cinco) anos. E, terceiro, uma vedação quanto ao objeto único de fornecimento de mão-de-obra, fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. Todas as vedações em vista da preservação do maior benefício das PPP’s: a otimização do erário e a maior eficiência econômica.
Além disso, as PPP’s deverão ter um prazo máximo de 35 anos, o que se justifica em razão dos altos custos dos empreendimentos que se busca realizar e a necessidade de re- torno hábil para o concessionário (art. 5º, I), e um limite de crédito de até 70% das fontes de recursos da SPE, aumentado para 80% nas
regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde
o IDH é inferior à média nacional (art. 27) Afora estes limites objetivos, a contrata-
ção das PPP’s prevê expressamente (art. 4º)
a eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da so- ciedade; o respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; a indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; a responsabilidade fiscal na celebração e exe- cução das parcerias; a transparência dos pro- cedimentos e das decisões; a sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria; e, a repartição objetiva de riscos entre as partes.
E, no que diz respeito à repartição dos riscos, eis um traço essencial das PPP’s. Isto porque enquanto a Lei 8.987/95 diz que a concessão de serviço público é a delegação de sua prestação à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco, a Lei 11.079/04 prevê expressamente a repartição objetiva dos riscos do negócio a ser havido entre o público e o privado. A eficiência eco- nômica da PPP depende, portanto, de ambas as partes: de um lado a execução do contrato com vista ao retorno financeiro; de outro, a mesma execução com vista à regulação e consecução do interesse público envolvido.
Se de um lado existe repartição objetiva dos riscos, de outro existe divisão expressa na Lei 11.079/04 das garantias que podem/ devem ser prestadas de parte a parte.
Então, se de um lado a lei das PPP’s prevê, em seu art. 5º, VIII, a prestação pelo parceiro privado de garantias de execução suficientes e compatíveis com os ônus e riscos envolvidos no negócio, observado o limite 10% do valor do contrato (§ 3º do art. 56 da Lei 8.666/93), podendo ser acrescido o valor dos bens (§ 5º do art. 56 da Lei 8.666/93), de outro lado a lei
das PPP’s prevê, em seu art. 8º e incisos, uma série de garantias que poderão ser prestadas pela Administração. Dentre elas citam-se: a vinculação de receitas (com a ressalva do in- xxxx XX xx xxx. 000 xx Xxxxxxxxxxxx Xxxxxxx); a instituição ou utilização de fundos especiais; a contratação de seguro-garantia; a garantia prestada por organismos internacionais ou instituições financeiras que não sejam con- troladas pelo Poder Público; as garantias prestadas por fundo garantidor ou empresa estatal criada para essa finalidade; ou, ainda, outros mecanismos admitidos em lei.
Pela expressa menção a “outros mecanis- mos”, a lei estabelece que as garantias pres- tadas pelo Poder Público não são excludentes nem tampouco exaustivas.
Como o particular somente receberá a sua contraprestação mediante a prévia disponi- bilização do serviço objeto do contrato (art. 7º), ressalvada a hipótese de contratação do pagamento após a disponibilização de parcela fruível do serviço contratado (§ único do art. 7º), é da essência do negócio a prestação de garantias do futuro adimplemento do contra- to, já que somente após o investimento e o decurso de um prazo razoável para disponibi- lização do serviço é que o crédito se revestirá de exigibilidade (XXXXXXXX XX XXXXX, 2005, p. 61-97) contra o parceiro público.
O propósito é notadamente oferecer se- gurança ao parceiro privado que se (pro)põe a realizar obra e prestar o serviço público, tornando verdadeiramente atrativa a execu- ção destes contratos em vista da análise dos seus riscos. Dentre as garantias, entretanto, a que talvez melhor demonstre esta intenção do Estado de se mostrar como verdadeiro in- teressado, já que sua configuração se dissocia da própria Administração, é a possibilidade de constituição de um fundo garantidor que, somente no âmbito da União, já está autori- zado a garantir as PPP’s num limite global de R$ 6 bilhões (art. 16).
Este fundo, com efeito, terá necessa- riamente natureza privada com patrimônio distinto dos seus cotistas, inclusive da pró- pria Administração. Seus bens e direitos respondem pelas obrigações dos contratos a que estiverem vinculados, ficando sujeitos à eventual penhora ou alienação judicial. Pela sua própria natureza, o fundo – como garantia
– também não entra no regime de precató- rios, já que os conhecidos riscos de demora no pagamento seriam mais um motivo para inviabilidade dos negócios que assegura.
Outro reflexo da subsunção do contrato de PPP às leis de mercado é a necessidade de criação de uma Sociedade de Propósito Espe- cífico – SPE para implantar e gerir o objeto da parceria (art. 9º). Ainda que pela sua própria natureza, esta modalidade de sociedade esteja sujeita muito mais ao Direito Empresarial, Comercial e, mais especificamente, Societá- rio, do que propriamente ao Direito Adminis- trativo, releva o fato de que mesmo podendo assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários sujeitos à negociação em bolsa de valores, a Administração não poderá ser titular da maioria do capital votante, res- salvada a possibilidade de bancos de fomento oficiais eventualmente assumirem o controle da sociedade, se o contrato assim o permitir.
Nesta linha e pela própria paridade entre as partes parceiras e até mesmo como mais um reflexo da subsunção do contrato às leis do mercado, a Lei 11.079/04 prevê, em seu art. 11, III, o emprego de mecanismos priva- dos na resolução de eventuais conflitos, o que se configura na possibilidade de indicação de juízo arbitral no contrato.
Segundo Xxxxxxxx, independente da lei prever ou não a possibilidade de indicação do juízo arbitral, as partes poderiam indicá-lo como já o fazem em outros contratos admi- nistrativos a despeito de previsão legislativa específica. A Constituição Federal e a Lei 9.307/96 já autorizariam essa indicação. Mas é justamente pela desnecessidade da
autorização legislativa que releva outro ponto
fundamental das PPP’s, porque:
Com a parceria público-privada pro- mete-se estabelecer um novo cenário de atuação conjunta do setor estatal e dos agentes particulares, com ênfase no caráter associativo do contrato entre as partes. Vale dizer: uma atuação preci- puamente coordenada entre os sujeitos contratantes, com redução – na medida do possível – da prepotência estatal: uma atuação que privilegie a busca de solu- ções consensuais. A expressa referência legal à arbitragem tem a ver com essa promessa de maior estabilidade, com menos surpresas advindas do exercício unilateral das prerrogativas estatais e o incremento da atividade cooperante (TALAMINI, 2005. p. 333-358)
Isto demonstra o objetivo indissociável do Estado se mostrar como verdadeiro parceiro para o negócio que será executado pela ini- ciativa privada em vista do interesse público, mas com garantias efetivas ao privado. Para tanto, o agente político se submete(ria) à lógica do privado e às regras do mercado. Nesta perspectiva, o contrato se estabelece a partir da legítima expectativa de ambos, numa relação verdadeiramente coordenada dos seus objetivos e riscos.
Qualquer interpretação que não sopese esta lógica econômica do pacto colocará em risco não apenas aquele negócio específico, mas toda a segurança do instituto que ora se oferta tanto ao público quanto ao privado.
Veremos as razões aos receios de inefeti- vidade, mas não sem antes observar a realida- de da Lei Estadual 12.234/05, que pelos seus próprios termos já mostra a possibilidade de incompreensão dentre nós.
A Lei Estadual 12.234/05
Sem entrar no mérito da eventual incons- titucionalidade da Lei Estadual que (quem
sabe violando prerrogativa da União, prevista no art. 22, XXVII, da CF) estabelece normas gerais para licitação e contratação das PPP’s no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, é de se notar a evidente contradição axioló- gica entre a Lei Estadual 12.234/05 e a Lei Federal 11.079/04.
Enquanto a Lei Federal se mostra reflexo de um processo estrutural de “privatização do público” ou de co-existência destes ambien- tes com o Estado se mostrando interessado na cooperação dos parceiros privados, numa lógica de mercado onde se repartem os ris- cos, as garantias e os próprios objetivos do negócio que deve ser proveitoso para ambos, no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a lei é outra.
Aqui, diferente de lá, o Estado reassume sua postura arrogante. Numa clara expressão da sua prepotência, o art. 2º. da Lei 12.234/05 estabelece que PPP dentre nós outros é o vínculo jurídico para implantação, expansão, melhoria ou gestão de serviços, empreendi- mentos e atividades de interesse público, em que haja investimento pelo parceiro privado, que responderá pelo seu respectivo financia- mento e pela execução do objeto.
A divergência de matriz determinante é evidente. Enquanto numa se fala em repar- tição “objetiva” dos riscos, n’outra se fala em repartição dos riscos “de acordo com a responsabilidade” de cada um, conforme pre- visão em Edital. A Lei Estadual determinar ao parceiro privado a assunção de obrigações de resultado definidas pelo Poder Público, como liberdade de escolha dos meios para sua implementação, numa clara manifestação da subordinação de um para com o outro.
Então, mesmo que lei estadual tenha o mérito de instituir e regular o programa de PPP’s no Estado do Rio Grande do Sul, sua principiologia está muito distante da Lei 11.079/04; o que, de fato, apenas colabora para a insegurança jurídica do instituto e o consequente desinteresse dos parceiros pri-
vados na consecução dos negócios regionais que mais necessitariam, hoje, de investimento em infra-estrutura e serviços.
Uma interpretação viável
Existe um frequente alerta para os ris- cos de inefetividade da PPP’s frente a uma interpretação que relativize o contrato e as legítimas expectativas daqueles que se (pro) põem a executar obras ou serviços públicos.
Estes riscos vão, desde a relativização da arbitragem pela inescapável intervenção do Judiciário nas relações de interesse público, pois, como xxxxxx Xxxxxxxx,
De resto, o sucesso da arbitragem como mecanismo de composição de conflitos no âmbito das parcerias público-privadas
– e, xxxxx, o próprio sucesso das PPPs como um todo – dependerá em larga medida do respeito ao princípio fun- damental da boa-fé, ínsito à imposição constitucional de moralidade adminis- trativa (art. 37, caput).
Têm sido frequentes os episódios em que a Administração vincula-se espontanea- mente à arbitragem e depois, na medida em que o processo encaminha-se num sentido que não lhe apraz, invoca sua condição de Poder Público investido de “interesses indisponíveis” para libertar- se do juízo arbitral ou desconsiderar seu resultado. (TALAMINI, 2005. p. 333-358).
Até a tendência de se fazer uma interpreta- ção “socializadora” do contrato, fazendo-se o uso indevido de valores constitucionais para se redistribuir riquezas à custa do particular, tido sempre como o “mais forte” em relação aos usuários dos seus serviços.
Nesse sentido, Xxxx adverte:
Teorias atuais sobre a funcionalização social do contrato, que defendem um grau indiscriminado (e por isso preda-
dor) de intervenção nos pactos privados apenas trazem insegurança ao ambiente regulatório, já que permitem alterar a essência do relacionamento estabelecido entre empresa e o ente público, sem que se tenha previsibilidade dos destinos da decisão do agente político ou do Judiciário.
Decisões judiciais que , à primeira vis- ta, podem ser populares com aplicação irrestrita de regras de direito público às relações privadas (como a extensão de direitos fundamentais gratuitos) tam- bém contribuem para um ambiente de instabilidade.
O sucesso das PPP depende de uma ruptura com este pensamento antieconô- mico, que rejeita a realidade social atual que estabelece seus vínculos de produção e consumo através de intermediação do mercado. Paradoxalmente, por mais curioso que possa parecer dentro da ló- gica da política, é perfeitamente racional do ponto de vista econômico encontrar o interesse coletivo na manutenção do con- trato e no respeito à lógica do mercado (TIMM, 2006)
Mas, independente disso, as PPP’s são a possibilidade de abertura para capital o privado de uma gama de necessidades de infra-estrutura e serviços, os quais não se pode(ria) abrir mão sem prejuízo da própria otimização do patrimônio público da (e para a) sociedade.
Então, para o êxito das PPP’s – do qual não se pode prescindir em razão das necessi- dades básicas do novo país que ora pretende se mostrar ao mundo como parceiro confiável de negócios –, é imprescindível deixar de lado os princípios do velho direito adminis- trativo do príncipe, como derivações do art. 37 da Constituição, para uma nova concepção do Estado parceiro, mas regulador da ordem econômica, já que a Lei 11.079/04 não pode ter outra matriz senão aquela prevista no art. 175 da CF.
Lembrando-se que a própria noção de interesse público não deve ser vista como oposta aos interesses privados; pelo contrá- rio, o que se busca(ria) é o próprio incentivo de ações privadas também asseguradas como preceito fundamental na direção de metas coletivas (BINENBOJM, 2005), numa verdadeira imbricação destes ambientes que, sobretudo agora, se mostram parceiros público-privados para a consecução dos ser- viços públicos.
Conclusão
Nesta quadra da história o público não pode mais prescindir do privado, nem o privado do público. A própria sobrevivência desta visão dicotômica deveria ser evitada.
A Lei 11.079/04 traz a possibilidade de uma abertura de novos negócios para estes ambientes. Se de um lado se busca a efetiva realização das carências estruturais já tão conhecidas da sociedade, n’outro se objetiva a efetiva potencialidade de negócios onde se tenha um mínimo de garantias de um retorno seguro de seus investimentos.
Para o êxito desta modalidade, é im- prescindível (re)conhecer o fundamento do instituto que se (pro)põe com o oferecimento do Estado como real parceiro interessado, deixando de lado princípios do direito ad- ministrativo, oriundos do art. 37 da CF, para assumir sua função regulatória das atividades do mercado, já que a Lei 11.079/04 deve ser compreendida como reflexo do art. 175 da CF.
Esta percepção do valor do modelo que se propõe deve perpassar toda a interpretação que se fizer dos contratos de parceria público- privada que ora começam a ser firmados. O retorno aos velhos princípios pode(rá) pôr em cheque não apenas o modelo, mas a própria possibilidade de realização dos objetos que se pretende contornar. O sucesso das PPP’s depende desta ruptura, e o país depende do sucesso desta coordenação de interesses.
AUTORES
Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxx - Mestre e Doutor em Direito pela UNISINOS. Sócio fundador da Va- riani, Xxxxxxxx e Advogados Associados. E-mail: xxxxxxxx@xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx
Laércio de Lima Leivas - Especialista em Processo Civil pela UNISINOS. Sócio da Variani,
Xxxxxxxx e Advogados Associados. E-mail: xxxxxxx@xxxxxxxxxxx.xxx.xx
REFERÊNCIAS
BINENBOJM. Xxxxxxx. As parcerias público-privadas (PPPs) e a Constituição. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador. Instituto de Direito Público da Bahia, n. 2, maio-jun- jul, 2005. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx >. Acesso em: 22 maio 2011.
XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxx X. Verdade e Significado. p. 81-109. Studia Jurídica 89 . Org. XX Xxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxx Xxxx Xxxxxx. Coimbra: Editora Coimbra, 2006.
XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxx X. Curso de Processo Civil: processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005.
XXXXXXX, Xxxxxxx. A terceira via: reflexões osbre o impasse político atual e o futuro da social-
democracia. Rio de Janeiro: Record, 2000.
. Há uma alternativa. Entrevista dada à Revista Veja de 30 de setembro de 1998. Disponível em
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