PLANO ESTADUAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS DO ESTADO DO CEARÁ
PLANO ESTADUAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS DO ESTADO DO CEARÁ
CADERNO TEMÁTICO
Mecanismos de Cobrança dos Serviços de Limpeza Pública e Manejo de Resíduos Sólidos
CONTRATO Nº 38/2014/CONPAM
51 pags
1
CEARÁ FEVEREIRO DE 2015
APRESENTAÇÃO
A empresa GAIA ENGENHARIA AMBIENTAL e a ECO SAM,
2
disponibilizam para o Governo do Estado do Ceará e para a sociedade, vários cadernos contendo o panorama da gestão dos resíduos sólidos do estado do Ceará. Nesta publicação, foi abordado as formas e mecanismos de cobrança dos serviços de limpeza pública e manejo de resíduos sólidos. Neste caderno, desejamos dar uma contribuição positiva no sentido de fazer parte da evolução e do desenvolvimento das atividades ambientais no estado do Ceará contribuindo assim, para a melhoria de vida da sociedade cearense em especial a que será atendida pelo serviço prestado neste tipo de estudo realizado. Na oportunidade, deixamos expressos nossos votos de agradecimentos a todas as instituições que disponibilizaram dados, ao mesmo tempo em que reconhecemos os esforços da equipe técnica que contribuiu para a confecção deste documento.
ELABORAÇÃO
Governo do Estado do Ceará
APOIO NA ELABORAÇÃO
Gaia Engenharia Ambiental e EcoSam
EQUIPE TÉCNICA
Xxxx Xxxxxx Xxxxx
Advogado
Xxxxxxxx Xx Xxxx
3
Advogada
SUMÁRIO
2. APLICABILIDADE DE TAXAS E TARIFAS 9
3.2. Aplicabilidade da taxa aos serviços de limpeza pública: 12
4. COMPETÊNCIA PARA INSTITUIÇÃO DA TAXA 19
6. EXEMPLOS DE COBRANÇAS ADOTADAS 22
7. FORMAS DE TRIBUTAÇÃO NAS DIVERSAS ETAPAS DOS SERVIÇOS 29
7.1. Imposto sobre Produtos Industrializados 30
8. CONTRIBUIÇÃO PARA FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL E PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL E PROGRAMA DE FORMAÇÃO DO PATRIMÔNIO DO SERVIDOR PÚBLICO 31
10. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SOBRE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE INTERESTADUAL, INTERMUNICIPAL E DE COMUNICAÇÃO 36
11. A FUNÇÃO EXTRAFISCAL DOS TRIBUTOS E BENEFÍCIOS FISCAIS 38
12. RECOMENDAÇÕES E CONCLUSÕES 43
1. INTRODUÇÃO
A humanidade vive uma era de incertezas, onde a degradação ambiental chegou a patamares jamais vistos na história humana. Temos um crescente padrão consumista, que, durante bastante tempo, não deu importância ao ciclo de vida dos produtos e aos processos aí inclusos, gerando grande volume de materiais descartados, dentre os quais há crescente quantidade de materiais sintéticos de difícil absorção pelo ambiente ou mesmo nocivos e tóxicos.
Diante dessa realidade mundial, Xxxxxxxx Xxxxxxx (2010) afirma que a sociedade contemporânea está diante de “um verdadeiro dilúvio de lixo”. Não há exagero nas palavras do autor quando se sabe que diariamente são descartados cerca de 2 milhões de toneladas de resíduos domiciliares no planeta, totalizando em 730 milhões de toneladas anuais ou ainda que a somatória dos refugos das atividades humanas resulta anualmente em cerca de 30 bilhões de toneladas (WALDMAN, 2010). Tais números criam fatos intrigantes (para não dizer surreais e assustadores), como é o caso do Grande Vórtice de Lixo do Pacífico (Great Pacific Garbage Vortex), uma imensa “sopa plástica” formada por 100 milhões de toneladas de refugos e que ocupa cerca de 15 milhões de km² no norte do Oceano Pacífico, podendo ser o primeiro continente artificial da história (WALDMAN, 2010).
Já no Brasil, em 2012, foram gerados quase 63 milhões de toneladas de resíduos sólidos domiciliares. Os resíduos de construção e demolição vêm crescendo mais do que o ritmo de crescimento da população brasileira e mais do que a renda (ABRAMOVAY, SPERANZA E PETITGAND, 2013). De 1991 a
2000, a população de nosso país cresceu 15,6%; já a quantidade de resíduos descartados aumentou 49%. Só em 2009, enquanto a população cresceu 1%; o lixo cresceu 6% (WALDMAN, 2012).
Para esse quadro ser alterado é necessária uma ambiciosa transformação nos processos de produção, consumo e disposição ou reutilização dos materiais, buscando-se atingir as fontes de geração de resíduos sólidos, chamando à responsabilização os diversos atores participantes desses processos.
Felizmente, já existem exemplos que vêm conseguindo atingir mudanças significativas nesses processos. Em comum nesses bem-sucedidos
casos há justamente a responsabilidade compartilhada entre produtores, importadores, gestores e cidadãos, sendo esse o rumo também apontado pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.
No sentido da objetividade, para o presente trabalho será observada em especial uma das bases centrais para a responsabilidade compartilhada: o princípio do poluidor-pagador (PPP), associando-o à nossa realidade atual.
Uma grave falha nos mecanismos de mercado é a existência de externalidades negativas que não são contabilizadas nos custos de produção e consumo. No caso de um produto em que sua produção gere poluentes ou seu consumo gere poluição, e o produtor e o consumidor não sejam responsabilizados por esse potencial dano ambiental, o custo da prevenção ou da reparação desse dano acaba sendo da sociedade como um todo. Em outras palavras, o custo para a prevenção ou reparação desse dano ficou externo ao processo de produção e consumo, não recaindo sobre os reais poluidores as responsabilidades.
Através da aplicação do princípio do poluidor pagador, os potenciais poluidores são dissuadidos de poluir, pois terão que realizar os cálculos econômicos de modo a escolher o que é mais vantajoso: manter o nível de poluição gerada e arcar com o pagamento por esse dano ambiental ou tomar medidas para reduzir ou mesmo não poluir e não ter aquele custo. Além disso, por esse princípio, procura-se também internalizar as externalidades negativas da produção e do consumo, pondo os poluidores (sejam produtores ou consumidores) a arcar com os custos socioambientais daquela conduta, não deixando esse custo ser injustamente pago por toda a sociedade. É, dessa forma, um instrumento de redistribuição dos custos da poluição, visando, resumidamente, à internalização dos custos externos de deterioração ambiental, arcando o poluidor com os custos necessários à diminuição, eliminação ou neutralização desse dano.
Com efeito, para Canotilho, esse princípio do Direito Ambiental é o “que, com maior rapidez e eficácia ecológica, com maior economia e maior equidade consegue realizar os objetivos da política de proteção do ambiente. Os fins que o PPP visa realizar são a precaução, a prevenção e a equidade na redistribuição dos custos das medidas públicas.” (CANOTILHO; LEITE, 2011)
Com essa visão, também escreve Xxxxx que “o princípio do poluidor pagador constitui uma autêntica pedra angular no direito ambiental: sua efetividade pretende eliminar as motivações econômicas da contaminação ambiental, aplicando-se imperativos da ética ambiental” (XXXXX in: CANOTILHO; LEITE, 2011). Xxxxxxxxx afirma ainda que “nos planos jurídico e político, o princípio atenua a injustiça social resultante de encargos à sociedade (efeitos secundários) não incluídos nas decisões de produção ou de consumo por parte dos agentes poluidores. (CANOTILHO, 1995)”
Importa salientar como bem apontam Milaré (2011) e Xxxxxxxxx e Xxxxx (2011), o caráter preventivo desse princípio, que “não objetiva, por certo, tolerar a poluição mediante um preço, nem se limita apenas a compensar os danos causados, mas sim, precisamente, evitar o dano ao ambiente” (MILARÉ, 2011). Atente-se que, dessa forma, não há que se confundir com “direito de poluir”, pois o PPP não serve à tolerância com condutas inconsequentes, devendo a cobrança, portanto, ser efetuada sobre condutas que tenham respaldo na lei.
Ainda sobre esse sentido eminentemente preventivo do PPP, Xxxxxxxxx aponta que o pagamento realizado pelos poluidores deve ser proporcional aos custos de precaução e prevenção e não proporcional aos danos causados, atuando assim antes e independentemente dos danos ao ambiente terem ocorrido. Afirma o autor português que “os pagamentos decorrentes do princípio poluidor-pagador devem ser proporcionais aos custos estimados, para os agentes económicos, de precaver ou de prevenir a poluição. Só assim os poluidores são ‘motivados’ a escolher entre poluir e pagar ao Estado, ou pagar para não poluir investindo em processos produtivos ou matérias primas menos poluentes, ou em investigação de novas técnicas e produtos alternativos.” (CANOTILHO, 2011) (grifos do original).
No caso dos consumidores finais dos produtos, podemos traduzir esse pensamento entre a escolha de continuar com o mesmo padrão de consumo ou a escolha de repensar esse consumo tanto em termos quantitativos, gerando menos resíduos, quanto em termos qualitativos, preferindo produtos que produzam menor impacto ambiental ou que possam ser reutilizados.
Por esse raciocínio, ao menos em teoria, o resultado a ser alcançado será vantajoso em termos socioambientais, pois ou a poluição é reduzida a níveis aceitáveis ou mesmo inexistente, e os poderes públicos responsáveis pelo setor
passam a ter verbas suficientes para prevenir e combater sistematicamente a poluição, sem onerar a sociedade em geral, mas apenas aqueles que efetivamente causam a poluição.
Por essa importância e aplicabilidade, o PPP aparece no artigo 6º, inciso II da Lei da nº 12.305/2010, como um dos princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Xxxxxxxxx, Speranza e Petitgand (2013) escrevem que a “ambição transformadora da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) só será levada à prática se sua governança apoiar-se no princípio do poluidor pagador”, pois “é ele quem imprime conteúdo à noção de responsabilidade compartilhada e oferece as bases para que o ambiente legislativo e a conduta dos diferentes atores, públicos, privados e associativos, caminhem em direção à hierarquia de metas da PNRS”.
Esse pensamento resulta de o PPP estar diretamente ligado (juntamente com outros princípios) ao bom funcionamento ou mesmo à existência de determinados instrumentos da PNRS e determinados conteúdos que devem estar nos Planos Estaduais de Resíduos Sólidos e nos Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, sem os quais os objetivos e metas não podem ser alcançados.
Os exemplos internacionais que têm adotado o PPP como uma das suas bases vêm mostrando a sua importância na efetivação da responsabilidade compartilhada, conseguindo dentro de suas realidades alcançar êxito em alguns pontos que, no caso brasileiro, a PNRS elenca como metas a serem alcançadas pelos Planos Estaduais de Resíduos Sólidos-PERS e Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos-PMGIRS, especialmente com relação às metas de redução, reutilização e reciclagem (artigo 17, inciso III e artigo 19, inciso XIV), que têm maior relação com os objetivos do presente trabalho.
Outro ponto da PNRS que tem ligação direta com esse princípio é a obrigatoriedade de os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos terem em seu conteúdo um sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança desses serviços.
Observando-se o caráter geral da PNRS e o conjunto de seus princípios, objetivos e metas, é necessário ter em mente que a exigência desse conteúdo
não visa apenas a sustentabilidade financeira da gestão do manejo de resíduos sólidos, mas também a possibilidade de internalizar determinadas externalidades negativas, objetivando atingir as metas estabelecidas. Ocorre, entretanto, que o modo como em geral essa cobrança vem sendo realizada no Brasil peca justamente por não sair da mentalidade meramente arrecadatória, e dessa forma não implementando o princípio poluidor pagador e, portanto, não internalizando custos. Mais adiante, esse fato será melhor detalhado. Primeiramente, a seguir, discorreremos acerca da aplicabilidade dessa cobrança.
2. APLICABILIDADE DE TAXAS E TARIFAS
Tendo em vista a complexidade dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e a consequente necessidade de destacamento de significativa parcela de recursos públicos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos objetiva1 que esses serviços tenham garantida a sua sustentabilidade operacional e financeira, com a adoção de mecanismos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados.
Da mesma forma, a lei que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico (Lei Nº 11.445/07) incluiu dentre os princípios fundamentais a serem observados na prestação dos serviços a eficiência e a sustentabilidade econômica. Outros artigos da mesma lei reforçam a importância desse princípio, impondo, por exemplo, sua observância nos contratos de prestação do serviço. É neste sentido que os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-financeira assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela sua prestação ou disponibilização.
1 Art. 7º. São objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos:
[...]
X - regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e financeira, observada a Lei nº 11.445, de 2007;
Passemos à análise acerca dos mecanismos de cobrança: taxas e
tarifas.
3. TAXAS
3.1. Conceito:
A Constituição Federal, assim como o Código Tributário Nacional, possibilita aos entes federados, por meio de lei, a instituição de taxas em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.
Para Xxxx Xxxxx Xxxxxxxxx, “serviço público é todo aquele prestado pela administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado”. Tendo em vista que, nos termos do art. 175 da Constituição Federal, é incumbência do “Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”, passemos à análise da possibilidade de criação de taxas para a remuneração desses serviços.
Para o fim específico deste trabalho, nos deteremos à possibilidade de instituição de taxas em decorrência de prestação de serviços públicos relacionados à limpeza pública e manejo de resíduos sólidos.
O Código Tributário Nacional, ao estabelecer em seu artigo 77 que a cobrança de taxa tem como fato gerador a utilização efetiva ou potencial de serviço público, define que as taxas são tributos retributivos. Desta maneira, só podem ser cobrados em função de um serviço público efetivamente prestado (o que se chama de utilização efetiva) ao contribuinte ou colocado à sua disposição (o que se chama de utilização potencial). Os serviços são considerados efetivamente utilizados pelo contribuinte quando por ele usufruídos a qualquer título ou potencialmente utilizados quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento.
Caberá ao legislador, ao instituir a taxa, definir em lei o serviço como de utilização compulsória caso ultrapasse a fronteira dos interesses meramente individuais e não couber ao contribuinte a escolha por utilizá-lo ou não e, consequentemente, pagar a taxa ou não. Somente nesse caso poderá haver cobrança pela utilização potencial. Nos demais casos, somente será possível diante da utilização efetiva do serviço.
Além da característica contraprestacional, o serviço público deverá ser específico e divisível. Esses elementos compõem o conceito legal da taxa e são indispensáveis para a sua cobrança. Analisemos cada um deles.
Segundo o Código Tributário Nacional, em seu artigo 79, os serviços públicos serão considerados específicos quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de unidade ou de necessidades públicas (inciso II); e divisíveis quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários (inciso III). Desta forma, em termos práticos, o serviço será específico quando o contribuinte é capaz de identificar por qual serviço está pagando. Por outro lado, será divisível quando é possível a identificação dos usuários do serviço que será remunerado mediante o pagamento da taxa.
3.2. Aplicabilidade da taxa aos serviços de limpeza pública2:
Para fins de análise de mecanismos de cobrança pelos serviços do sistema de limpeza pública, podemos dividi-los em dois grupos. O primeiro é aquele relacionado com a manutenção da limpeza da cidade (limpeza urbana propriamente dita), o que compreende varrição e capina das ruas, desobstrução de bueiros, limpeza de parques públicos, poda de árvores, dentre outros. O segundo é aquele diretamente relacionado com o manejo de resíduos sólidos, o que compreende a coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos ou disposição final dos rejeitos.
Os serviços que compreendem a manutenção da limpeza urbana, apesar de serem específicos, não são divisíveis, pois os usuários do serviço não são identificáveis. A limpeza dos logradouros públicos, que envolve uma série de serviços, beneficia toda a coletividade, sendo impossível determinar quem são os usuários isoladamente considerados.
Este é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal Federal, que decidiu pela inconstitucionalidade da “Taxa de Limpeza Pública, Conservação de Vias e Logradouros”, por “ter fato gerador prestação de serviço inespecífico,
2 Lei Nº 11.445/2007:
Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I - saneamento básico: conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de: [...] c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades, infra- estruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas;
Art. 7o Para os efeitos desta Lei, o serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos é composto pelas seguintes atividades:
I - de coleta, transbordo e transporte dos resíduos relacionados na alínea c do inciso I do caput do art. 3o desta Lei;
II - de triagem para fins de reúso ou reciclagem, de tratamento, inclusive por compostagem, e de disposição final dos resíduos relacionados na alínea c do inciso I do caput do art. 3o desta Lei;
III - de varrição, capina e poda de árvores em vias e logradouros públicos e outros eventuais serviços pertinentes à limpeza pública urbana.
não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, não tendo de ser custeado senão por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais” (julgamento do Recurso Extraordinário 204.827, relator o Ministro Xxxxx Xxxxxx, DJ 25/4/97). Desde as primeiras decisões, este tem sido o entendimento pacífico no STF e inúmeros são os precedentes.
Ademais, o entendimento do STF pela inconstitucionalidade de cobrança de taxa de limpeza pública de caráter universal e indivisível foi reforçado no julgamento do Recurso Extraordinário 576.321 (relator o Ministro Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, DJe 13/2/09), o qual faz a diferenciação dos serviços de limpeza urbana e coleta de lixo. Vejamos:
Com efeito, a Corte entende como específicos e divisíveis os serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, desde que essas atividades sejam completamente dissociadas de outros serviços públicos de limpeza realizados em benefício da população em geral (uti universi) e de forma indivisível, tais como os de conservação e limpeza de logradouros e bens públicos (praças, calçadas, vias, ruas, bueiros). Decorre daí que as taxas cobradas em razão exclusivamente dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis são constitucionais, ao passo que é inconstitucional a cobrança de valores tidos como taxa em razão de serviços de conservação e limpeza de logradouros e bens públicos. (Grifos nossos)
Desta forma, conclui-se que a limpeza urbana, por ser um serviço geral, não pode ser remunerada por meio de taxa, devendo ser custeada exclusivamente por meio da arrecadação de impostos. Vale ressaltar que o Código Tributário Nacional cita três espécies de tributo, que são os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. Para os fins deste trabalho, é relevante a diferenciação entre taxas e impostos, visto que os serviços de limpeza urbana deverão ser custeados pelos últimos.
Diferentemente de taxa, imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica relativa ao contribuinte e servirá para financiar a manutenção da administração pública, serviços públicos e infraestrutura.
Desta forma, se é possível ao Estado identificar os usuários de determinado serviço e estes conseguem igualmente identificar o serviço que está sendo prestado, o justo é deles cobrar pela atividade estatal e não transferir o encargo para toda a sociedade, utilizando-se das receitas provenientes de impostos, recolhidos em decorrência de diversas manifestações de riqueza.
Já os serviços referentes ao manejo dos resíduos sólidos, em especial os referentes à coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final, tendo em vista serem específicos e divisíveis, ou seja, é possível identificar os usuários do serviço, podem ser remunerados mediante a cobrança de taxa. Segue entendimento do Supremo Tribunal Federal:
"Ementa (...) 1. Pacífica é a jurisprudência desta Corte no sentido de ser legítima a cobrança de taxa de coleta de lixo domiciliar, haja vista ser esse serviço de caráter divisível e específico."RE 596.945 AgR, Relator Ministro Xxxx Xxxxxxx, Primeira Turma, julgamento em 14/2/12, DJe de 29.3.2012.
"Ementa (...) 1. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido da legitimidade da taxa de coleta de lixo proveniente de imóveis, entendendo como específico e divisível o serviço público de coleta e tratamento de lixo domiciliar prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição." AI 311.693 AgR, Relator Ministro Xxxx Xxxxxxx, Primeira Turma, julgamento em 6.12.2011, DJe de 19/12/11.
O que ficou conhecido como “taxa do lixo” foi objeto de diversas discussões nos tribunais locais e superiores, até que uma série de precedentes no mesmo sentido embasou a edição de uma Súmula Vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, a quem cabe a última palavra na análise da constitucionalidade das matérias. Assim determina a Súmula Vinculante Nº 19 do STF:
STF Súmula Vinculante nº 19 - Taxa - Serviços Públicos de Coleta, Remoção e Tratamento ou Destinação de Lixo ou Resíduos Provenientes de Imóveis.
A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal3.
Pela clareza e didática, colacionamos decisão que serviu de precedente para a elaboração da súmula acima citada:
"(...) observo, inicialmente, que o Supremo Tribunal Federal fixou balizas quanto à interpretação dada ao art. 145, II, da Constituição, no que concerne à cobrança de taxas pelos serviços públicos de limpeza prestados à sociedade. Com efeito, a Corte entende como específicos e divisíveis os serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, desde que essas atividades sejam completamente dissociadas de outros serviços públicos de limpeza realizados em benefício da população em geral (uti universi) e de forma indivisível, tais como os de conservação e limpeza de logradouros e bens públicos (praças, calçadas, vias, ruas, bueiros). Decorre daí que as taxas cobradas em razão exclusivamente dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis são constitucionais, ao passo que é inconstitucional a cobrança de valores tidos como taxa em razão de serviços de conservação e limpeza de logradouros e bens públicos. (...) Além disso, no que diz respeito ao argumento da utilização de base de cálculo própria de impostos, o Tribunal reconhece a constitucionalidade de taxas quem na apuração do
3 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
montante devido, adote um ou mais dos elementos que compõem a base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não se verifique identidade integral entre uma base e a outra." RE 576.321 RG-QO, Relator Ministro Xxxxxxx Xxxxxxxxxxx, Tribunal Pleno, julgamento em 4.12.2008, DJe de 13.2.2009.
Superada a discussão acerca da possibilidade de instituição de taxa em decorrência da prestação de serviços relacionados ao manejo dos resíduos sólidos, passou-se à discussão acerca da base de cálculo.
A Constituição Federal estabelece que as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos (art. 145, §2º). Por sua vez, o Código Tributário Nacional dispõe que a taxa não pode ter base de cálculo4 ou fato gerador5 idênticos aos que correspondam a imposto (art. 77, § único). Essas vedações se justificam pela própria conceituação do imposto, que é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica relativa ao contribuinte (art. 16, CTN). Em sentido diametralmente oposto, as taxas têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição (art. 77, CTN).
Assim, a cobrança de determinado imposto não está relacionada a qualquer atividade estatal específica, sendo a sua base de cálculo uma grandeza econômica que não possui correlação de valor com o que o Estado gasta para a consecução dos seus fins. Já o valor arrecadado com as taxas deve guardar íntima relação com o valor gasto pelo Estado para prestar o serviço público específico e divisível. Em alguns casos, não sendo possível mensurar com exatidão o custo do serviço público prestado a cada contribuinte, determinando com precisão o valor da taxa a ser cobrada, é admissível uma aproximação, desde que exista correlação razoável entre seus valores.
Ressalte-se que a taxa é um tributo vinculado, ou seja, sua base de cálculo deve estar relacionada com o valor do serviço prestado pelo Estado a fim
4 Base de cálculo é a grandeza econômica sobre a qual se aplica a alíquota para calcular o montante relativo a determinado tributo.
5 Fato gerador é a situação prevista em lei que enseja o dever de pagar determinado tributo.
de estabelecer uma razoável proporcionalidade entre os custos dos serviços e o valor da taxa cobrada, garantindo a remuneração dos serviços e evitando o enriquecimento sem causa do Estado.
Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 232.393/SP, instado a se pronunciar acerca da constitucionalidade da taxa de coleta de lixo instituída pelo Município de São Carlos/SP, firmou entendimento de que o fato de a alíquota6 da referida taxa variar em função da metragem da área construída do imóvel - que constitui apenas um dos elementos que integram a base de cálculo do IPTU - não implica identidade com a base de cálculo do IPTU, afastando-se a alegada ofensa ao art. 145, § 2º, da CF, segundo o qual as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos (STF, informativo Nº 157). Ademais, não se confundem os conceitos de base de cálculo e alíquota.
O Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU tem como base de cálculo o valor venal do imóvel. Como se trata de um elemento essencial do imposto, sua definição deve constar da lei que o institui. Tomemos o caso do município de Fortaleza como exemplo. A Lei Municipal Nº 8703/2003 estabelece que o valor do venal do imóvel será calculado por meio de uma complexa fórmula (ilustrada em um dos anexos da lei), que leva em consideração fatores como o valor do metro quadrado do terreno, área edificada, área do terreno, testada, fator de depreciação, dentre outros. Assim, é incabível considerar que uma taxa cujo valor leve em consideração algum desses elementos terá a mesma base de cálculo do IPTU.
Percebe-se que, além decidir pela constitucionalidade da utilização de algum dos elementos da base de cálculo do IPTU na base de cálculo da “taxa do lixo”,o STF considerou a presunção de que os imóveis maiores produzirão mais lixo que os menores, sendo justa a cobrança da taxa com valores proporcionais a essa utilização presumida do serviço. Segue o acórdão da decisão que é utilizada como precedente pelo próprio Tribunal:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. TAXA DE COLETA DE LIXO: BASE DE CÁLCULO. IPTU. MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, S.P.
6 Alíquota é o percentual que será aplicado sobre a base de cálculo para apurar o valor do tributo.
I. - O fato de um dos elementos utilizados na fixação da base de cálculo do IPTU - a metragem da área construída do imóvel - que é o valor do imóvel (CTN, art. 33), ser tomado em linha de conta na determinação da alíquota da taxa de coleta de lixo, não quer dizer que teria essa taxa base de cálculo igual à do IPTU: o custo do serviço constitui a base imponível da taxa. Todavia, para o fim de aferir, em cada caso concreto, a alíquota, utiliza-se a metragem da área construída do imóvel, certo que a alíquota não se confunde com a base imponível do tributo. Tem-se, com isto, também, forma de realização da isonomia tributária e do princípio da capacidade contributiva: C.F., artigos 150, II, 145, § 1º. II. - R.E. não conhecido.
(RE nº 232.393/SP, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Xxxxxx Xxxxxxx, DJ de 5/4/02)
Reafirmando este entendimento, foi editada uma nova Súmula Vinculante7 tratando sobre o tema das taxas, em especial sobre a base de cálculo:
STF Súmula Vinculante nº 29 - Constitucionalidade - Adoção no Cálculo do Valor de Taxa - Elementos da Base de Cálculo Própria de Imposto.
É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra.
Em que pese a aceitação pacífica pelo STF da utilização de elementos como a área edificada de um imóvel no cálculo de taxa que tenha por finalidade a remuneração de serviços relacionados ao manejo de resíduos sólidos, é necessário fazer uma análise acerca da sua adequação com relação à Política Nacional de Resíduos Sólidos e à Lei Nº 11.445/07.
Se, por um lado, é um instrumento positivo para a garantia de sustentabilidade econômico-financeira do sistema de limpeza pública, por outro,
7 Precedentes: RE 576.321 RG-QO, RE 232.393, RE 177.835, AI 441.038 AgR, RE 346.695
AgR, RE 241.790, ADI 1926 MC, RE 491.216 AgR, RE 220.316.
não possui nenhuma função extrafiscal que impacte diretamente na qualidade e quantidade de lixo produzido por cada contribuinte.
Em síntese: o Poder Público poderá instituir taxa de manejo de resíduos sólidos para os serviços prestados diretamente pelo ente estatal, desde que não incluam a remuneração por serviços indivisíveis (limpeza urbana propriamente dita), sendo que o valor total da arrecadação possua correlação razoável com o valor do serviço e que seja adotado critério razoável de mensuração do grau de utilização individual do serviço. Apesar de não ser o critério ideal, é legal a utilização de elementos da base de cálculo do IPTU, como o exemplo da área do imóvel.
4. COMPETÊNCIA PARA INSTITUIÇÃO DA TAXA:
Todos os entes federados podem criar taxas no seu âmbito de atuação, ou seja, o ente competente para instituir e cobrar a taxa é aquele que presta o serviço público a ser remunerado.
O art. 30 da Constituição Federal estabelece que compete aos Municípios:
Art. 30. [...]
V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;
Prescreve o Plano Nacional de Resíduos Sólidos:
Art. 10. Incumbe ao Distrito Federal e aos Municípios a gestão integrada dos resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, sem prejuízo das competências de controle e fiscalização dos órgãos federais e estaduais do Sisnama, do SNVS e do Suasa, bem como da responsabilidade do gerador pelo gerenciamento de resíduos, consoante o estabelecido nesta Lei.
É fácil concluir, portanto, que os Municípios são os entes competentes para a instituição de taxa em decorrência da prestação de serviços relacionados ao manejo dos resíduos sólidos.
5. TARIFAS
Os serviços públicos poderão ser prestados de maneira direta ou indireta. Na prestação direta, os serviços são executados diretamente pelo Poder Público, pela própria administração, seja direta ou indireta. Já na prestação indireta, o serviço é executado por particulares, sejam pessoas jurídicas ou consórcio de empresas, mediante delegação, nas modalidades de concessão ou permissão de serviço público.
Em sendo prestados por delegatários, o serviço público será remunerado por meio de tarifa, que é um preço público, de caráter não tributário. Tanto as taxas como as tarifas possuem caráter contraprestacional, ou seja, remuneram uma atividade prestada pelo Estado, diretamente ou por meio de delegatários, respectivamente. Em ambos os casos, é necessário que o serviço seja específico e divisível, sendo possível a perfeita identificação do seu beneficiário.
Contudo, taxas e tarifas estão submetidas a regimes jurídicos diversos, situação da qual podem ser extraídas uma série de consequências. As taxas estão sujeitas ao regime jurídico tributário, configuram obrigação compulsória, de natureza legal; ao passo que as tarifas, não sendo tributos, estão sujeitas ao regime jurídico administrativo, configuram obrigação de natureza contratual.
O Plano Nacional de Saneamento Básico prescreve em seu art. 29:
Art. 29. Os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-financeira assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela cobrança dos serviços: I - de abastecimento de água e esgotamento sanitário: preferencialmente na forma de tarifas e outros preços públicos, que poderão ser estabelecidos para cada um dos serviços ou para ambos conjuntamente;
II - de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos urbanos: taxas ou tarifas e outros preços públicos, em conformidade com o regime de prestação do serviço ou de suas atividades;
III - de manejo de águas pluviais urbanas: na forma de tributos, inclusive taxas, em conformidade com o regime de prestação do serviço ou de suas atividades.
A legislação não estabeleceu qual a forma de remuneração preferencial para os serviços de manejo de resíduos sólidos. Vale ressaltar que, apesar de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos serem tratados em conjunto, somente o segundo poderá ser remunerado por taxa ou tarifa, conforme exposto anteriormente.
À primeira vista, pode parecer que a escolha depende meramente da conveniência da Administração. Contudo, há de se considerar a lição do Ministro Xxxxxxx Xxxxx, segundo o qual, “como o Poder Público não pode fugir a essas restrições de seu poder de tributar, é evidente que, nos casos em que é devida taxa, não pode ele – sob pena de fraude às limitações constitucionais – esquivar- se destas, impondo, ao invés de taxa, preço público” (STF, Tribunal Pleno, RE 89.876/RJ, Rel. Min. Xxxxxxx Xxxxx, julgado em 04/09/80). Segue o correspondente acórdão:
EMENTA: Tarifa básica de Limpeza Urbana.
1. Em face das restrições constitucionais a que se sujeita a instituição de taxa, não pode o Poder Público estabelecer, a vou arbítrio, que à prestação de serviço público específico e divisível corresponde contrapartida sob a forma, indiferentemente, de taxa ou de preço público.
2. Sendo compulsória a utilização do serviço público de remoção de lixo – o que resulta, inclusive, de sua disciplina como serviço essencial à saúde pública -, a tarifa de lixo instituída pelo Decreto nº 188, de 12 de novembro de 1976, do Poder Executivo do Município do Rio de Janeiro, é, em verdade, taxa.
3. Inconstitucionalidade do referido decreto, uma vez que taxa está sujeita do princípio constitucional da reserva legal. Recurso Extraordinário conhecido e provido.
Em complementação, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário 209.365/SP, Rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxxx, adotou a seguinte classificação dos serviços públicos levando em consideração suas características e a forma de remuneração:
[...]
1- Serviços Públicos propriamente estatais, em cuja prestação o Estado atue no exercício de sua soberania, visualizada sob o ponto de vista interno e externo; esses serviços são
indelegáveis, porque somente o Estado pode prestá-los. São remunerados, por isso mesmo, mediante taxa, mas o particular pode, de regra, optar por sua utilização ou não. Exemplo: o serviço judiciário, o de emissão de passaportes. Esses serviços, não custa repetir, por sua natureza, são remunerados mediante taxa e a sua cobrança somente ocorrerá em razão da utilização do serviço, não sendo possível a cobrança pela mera potencialidade de sua utilização [...] O que acontece é que certos serviços podem ser tornados obrigatórios pela lei e é isto o que significa a locução “posto a disposição” do contribuinte. É isto, aliás, o que resulta do dispositivo no art. 79, I, b, CTN.
2- Serviços Públicos essenciais ao interesse público: são serviços prestados no interesse da comunidade. São remunerados mediante taxa. E porque são essenciais ao interesse público, porque essenciais à comunidade ou à coletividade, a taxa incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial do serviço.
[...]
Como exemplo, podemos mencionar o serviço de distribuição de água, de coleta de lixo, de esgoto, de sepultamento.
[...]
3- Serviços Públicos não essenciais e que, não utilizados, disso não resulta dano ou prejuízo para a comunidade ou para o interesse público. Esses serviços são, de regra, delegáveis, vale dizer, podem ser concedidos e podem ser remunerados mediante preço público. Exemplo: o serviço postal, os serviços telefônicos, telegráficos, de distribuição de energia, de gás, etc.
6. EXEMPLOS DE COBRANÇAS ADOTADAS
Independentemente da forma de prestação e, consequentemente, da cobrança pelos serviços de manejo de resíduos sólidos, a razão de ser dessa remuneração extrapola a mera necessidade de recomposição dos custos na prestação dos serviços. A tendência de aumento populacional associado à adoção de práticas de consumo ambientalmente inadequadas e aumento da
quantidade de lixo produzido impõem, como dito no início deste trabalho, a urgência de mudanças de posturas, o que passa, necessariamente por um processo educativo.
Utilizando a cobrança pela prestação dos serviços como meio de implementar o princípio do poluidor-pagador, há a potencialidade de esse instrumento ser um meio de alerta e indução de redução da quantidade de resíduos gerados, desde que sejam adotados critérios que guardem estreita correlação com a qualidade e quantidade de resíduos produzidos.
Em nossa sociedade, há uma verdadeira “invisibilização” do lixo que produzimos. A maioria da população não tem informação sobre o ciclo de vida dos produtos que descarta, nem a informação sobre os destinos finais que recebem ou das possibilidades de esses resíduos serem reciclados ou reutilizados. É como se, magicamente, o lixo que produzimos, após ser colocado em sacos plásticos ou depositado em containers e levado pelo caminhão de coleta, simplesmente desaparecesse, deixando de ser nossa responsabilidade. Associa-se a essa ilusão o preconceito social acerca dos resíduos sólidos, como se eles fossem completamente imprestáveis e todos “maléficos”, devendo ser descartados para o mais longe possível de nossas vistas. Quando temos esse preconceito e desinformação aliados à falta de sentimento de responsabilidade juntamente com o império do consumismo, chega-se à bolha crescente de problemas que as sociedades atuais estão enfrentando, levando-nos aos graves números que exemplificamos no início deste trabalho.
Como demonstram os exemplos que colocaremos adiante, a cobrança pela prestação dos serviços pode ser, desde que aliada a outros instrumentos, uma forma de enfrentar esse problema e mudar a nossa realidade para um outro olhar e tratamento dos resíduos sólidos.
Fato comum entre os países e cidades que têm tido algum sucesso na redução da quantidade de resíduos sólidos produzidos e aumento na reutilização e reciclagem de materiais é exatamente a responsabilização dos produtores e dos consumidores. Dentre as formas de responsabilização está a cobrança pelo manejo dos resíduos sólidos. Essas cobranças, apesar das diferenças e formas específicas de cada local e país, possuem em comum a forte relação com o princípio do poluidor-pagador, que transparece através da explícita correlação entre o valor pago e a quantidade e/ou qualidade dos resíduos descartados.
Dessa forma, o financiamento público da coleta fica visível e, sendo proporcional à quantidade que é gerada, acaba por afetar diretamente os comportamentos de consumo (XXXXXXXXX, SPERANZA E PETITGAND, 2013).
Utilizada em alguns países ao norte da Europa, na Bélgica, na Suíça e no Japão, a taxa de coleta por volume de resíduo gerado possui três objetivos principais:
“limitar a demanda excessiva pelos serviços de gestão de resíduos por meio do incentivo à reutilização, reciclagem e compostagem; internalizar os custos sociais marginais dos resíduos; e enviar o sinal aos produtores incentivando-os a modificar a concepção dos produtos. A receita da taxa irá fomentar os serviços de gestão de resíduos (coleta, tratamento, destinação final)” (IPEA, 2012).
Nesse sentido, entre os países da Comunidade Europeia, o principal sistema de cobrança é o de implementação da taxa PAYT (Pay-as-you-throw), sigla que significa “pague pelo que descarta”. O modo como é realizada a cobrança ou as fórmulas para cálculo variam bastante de acordo com as especificidades de cada local, entretanto, a base da taxa é em função do volume ou do peso dos resíduos descartados, considerando o custo marginal de coleta e destinação final. Para que a taxa seja eficiente, seu nível deve ser relativamente alto para que haja incentivo suficiente ao aumento da triagem e redução de disposição final, devendo a taxa cobrir todos os custos de operação (IPEA, 2012).
Um estudo de 2006, realizado pelo Environmental Protection Agency reportou que havia mais de 7 mil programas PAYT nos Estados Unidos, incluindo 30 das 100 maiores cidades. O estudo apontou que onde o sistema era o PAYT, havia uma melhor eficiência. Lá, o PAYT conta com três tipos principais de coletas: através de sacos com identificação; através de carrinhos (ou latões) de tamanhos variados; ou um híbrido dos dois. O mais comum é o dos latões e em seguida o dos sacos. Há cidades que iniciam com um tipo e depois acabam mudando para outro, de acordo com as especificidades locais (GERLAT, 2012)8.
8 Disponível em xxxx://xxx.xxxxxxx.xxx/XxxxxXxx_XXXXXxxxxxx_0000.xxx
Em média, nas cidades estadunidenses que optaram pelo PAYT, houve uma queda de 16% a 17% da disposição dos resíduos e um aumento de 5% na reciclagem. (xxxx://xxx.xxxxxxx.xxx/XXXX_XX_xxxxxxxXXXX_x0.xxx). Deve-se atentar que isso é uma média geral, havendo grandes alterações entre as cidades de acordo com as realidades locais.
Na cidade de Austin, desde a década de 90, vigora o PAYT. Os moradores escolhem um recipiente dentre 3 tamanhos diferentes, pagando uma taxa mensal de acordo com o tamanho do latão que escolherem. Se em determinado mês o lixo gerado ultrapassar a capacidade do latão, os moradores pagam por cada saco de lixo adicional. Nessa cidade, apesar de, ao longo de uma década, ter aumentado em mais de 30 mil domicílios, a quantidade de lixo foi reduzida em cerca de 12 mil toneladas por ano. Na cidade de Portland, também nos Estados Unidos, a cobrança ocorre por saco de lixo recolhido. A cobrança significou uma redução de 8 mil toneladas de lixo por ano e uma economia de 700 mil dólares por ano. (XXXXXXXXXX, XXXXXXX e XXXXXXX, 2007)
No Brasil, dentre os municípios que utilizam alguma forma de cobrança pelo serviço, são poucos os exemplos em que a base de cálculo utilizada é a quantidade de resíduo gerada. Impera, na maior parte, o modelo que atrela de algum modo essa cobrança ao IPTU, às vezes utilizando a mesma base de cálculo desse imposto, podendo ser facilmente contestado na Justiça, diante das Súmulas exaradas pelo STF, que já foram anteriormente explicitadas neste trabalho.
Sobre essa forma de cobrança mais comum em nosso país é correta a afirmação de que:
Assim,
Quando a taxa é recolhida por meio do IPTU de forma independente do volume de resíduo produzido pelas famílias, há uma simples repartição dos custos entre os agentes demandantes dos serviços, tornando nulo o custo marginal de gestão e, consequentemente, dispersando a responsabilidade dos agentes econômicos em reduzir na fonte o volume de resíduo gerado. (IPEA, 2012)
Além de não incentivar os agentes produtores de resíduos sólidos a mudarem de comportamento – com redução na fonte
–, a Taxa (...) não vinculada ao volume de resíduo gerado deixa de implementar o princípio poluidor-pagador quando não está associado ao custo social marginal de tratamento do volume de resíduo. (IPEA, 2012)
Com essas características práticas, tem-se que uma cobrança que não utilize a quantidade de resíduos gerada como base de cálculo, estará cumprindo apenas em parte o que demanda a PNRS, pois, apesar de a cobrança desse tipo buscar por uma sustentabilidade financeira da gestão do manejo dos resíduos sólidos (art. 7º, X, da Lei da PNRS), peca por não implementar um dos princípios basilares dessa lei, qual seja, o princípio do poluidor-pagador (art. 6º). Ao não implementar esse princípio, falha também com relação à busca ao cumprimento das metas de redução dos resíduos sólidos, reutilização e reciclagem (art. 7º, II e III). Dentro dessa lógica, essa forma de cobrança, por não colaborar diretamente nessa redução dos resíduos, acaba por criar, portanto, uma gestão financeira menos eficiente, posto que, apesar de arrecadar, não trabalha a potencialidade da redução dos custos.
Em resumo, a cobrança pelo serviço de manejo dos resíduos sólidos que não implemente o princípio do poluidor-pagador não estará em completa harmonia com a Lei da PNRS (Lei nº 12.305/2010).
Um exemplo brasileiro de cobrança que implementava esse princípio, tendo em sua base cálculo a quantidade de resíduos gerados por domicílio, é o da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares e o da Taxa de Resíduos Sólidos de Serviços de Saúde, em São Paulo.
A organização do sistema de Limpeza Urbana do Município de São Paulo está disciplinada pela Lei Municipal nº 13.478/2002, que elencou como princípios, entre outros, a sustentabilidade ambiental, social e econômica dos serviços de limpeza urbana e o princípio do poluidor-pagador. Dentre os objetivos, encontram-se a individualização dos resíduos e a responsabilização de seus geradores, o incentivo à coleta seletiva, a responsabilização pós- consumo do produtor.
As taxas eram separadas em faixas de pagamento que levam em conta a produção de resíduos e o tipo de domicílio, se residencial ou não residencial. Para domicílios residenciais, o valor-base da taxa variou entre R$ 6,14 e R$ 61,36 para volumes entre 10L e mais de 60L de resíduos por dia. Para domicílios
não residenciais, o valor-base da taxa variou entre R$ 18,41 e R$ 122,72 para volumes entre 30L e 200L de resíduos por dia.
É importante destacar dessa Lei o mecanismo inédito da auto- declaração do valor a ser pago. Se por um lado, a auto-declaração gera um sentimento de responsabilidade no cidadão, por outro pode acarretar em uma maior dificuldade na fiscalização, caso a declaração não esteja condizente com a realidade.
Ocorre que, por falta de aceitação popular, essa taxa foi extinta em 2005 em decorrência de promessa de campanha eleitoral, demonstrando a dificuldade política que um instrumento como esse pode enfrentar, apesar de se aproximar dos objetivos de internalização do impacto e de redução da fonte (IPEA, 2012).
Situação parecida ocorreu no Ceará, no início da década passada, quando a Prefeitura de Fortaleza, através da Lei Municipal nº 8.621/2002, criou o Sistema de Limpeza Urbana de Fortaleza, que em seu artigo 27 permitia a cobrança de uma tarifa pela prestação do serviço. Para essa cobrança a cidade seria dividida em 25 Zonas Geradoras de Lixo e o valor seria calculado com base no tamanho da residência, consumo de energia elétrica e quantidade de lixo gerado na zona de localização da residência.
A impopularidade dessa cobrança era muito grande, levando a muitas polêmicas e embates políticos. Por fim, àquela época, o Tribunal de Justiça do Ceará julgou pela inconstitucionalidade dessa cobrança na Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 3496-30.2002.8.06.0000/0 (2002.0001.0070-3).
Há que se observar que nessa pretendida cobrança na capital cearense, ao contrário do caso de São Paulo, não se levava em conta diretamente a quantidade de resíduo gerada pelo domicílio, mas a quantidade gerada na zona em que o domicílio de encontrava, juntamente com o tamanho da residência e os consumos de água e energia, procurando chegar a um valor aproximado do que possivelmente o domicílio geraria.
Uma crítica realizada naquele período por opositores da cobrança era a de que não houve diálogo prévio com a população, não existindo participação popular na construção desse sistema e dessa cobrança. Caso essas críticas sejam verdade, é uma falha, posto que a participação não apenas é basilar para uma efetiva democracia, como serve ao diálogo entre poder público e população, servindo como base não apenas na visão técnica, mas aliando esta ao
conhecimento das pessoas que efetivamente vivem nos locais, gerando soluções mais próximas das realidades destas. Ademais, com uma efetiva participação popular, a barreira da impopularidade de tributos como esse tende a ser menor, conquanto ter sido construída, em parte, pelos próprios contribuintes.
Sobre isso, importa ainda salientar que atualmente essa participação é um princípio e exigência da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que em seu artigo 3º, inciso XI, define a gestão integrada de resíduos sólidos como conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável. No artigo 6º, inciso X, aponta como um dos princípios da PNRS o direito da sociedade à informação e ao controle social. Por controle social, entende-se, segundo o inciso VI do artigo 3º, como o conjunto de mecanismos e procedimentos que garantam à sociedade informações e participação nos processos de formulação, implementação e avaliação das políticas públicas relacionadas aos resíduos sólidos.
Além dessas questões, não pode ser esquecido que os valores cobrados, além de traduzir uma correlação, se não perfeita, pelo menos razoável com os custos do serviço prestado, deve observar ainda a capacidade contributiva do usuário. Isso importa dizer que a contribuição deve encontrar um equilíbrio entre custo do serviço e poder de renda do usuário, sob pena de ser injusto e não atingir nem o objetivo de sustentabilidade financeira, nem o caráter pedagógico e, portanto, nem o objetivo da sustentabilidade ambiental.
Essa observação tem ainda mais força na realidade de nossa sociedade brasileira e cearense, país e estado de histórica desigualdade de renda e padrão financeiro entre seus habitantes, existindo, dentro de uma mesma cidade, bairros cuja renda média chega ao padrão de países de alto poder aquisitivo, e bairros em que a renda média iguala-se a países financeiramente miseráveis.
Além desse fator de justiça social, outro ponto que leva a considerar a capacidade contributiva do usuário é o de que estudos apontam que há forte diferença no padrão de consumo das famílias de acordo com a faixa de renda na qual se inserem. Assim, quanto maior a renda, maior a tendência de consumo de produtos descartáveis.
Como exemplo disso, temos a diferença entre os resíduos sólidos produzidos entre as diferentes regiões de Fortaleza. Versão preliminar do Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos desse município aponta diferenças visíveis entre as Secretarias Regionais Executivas com predominância residencial. Na SERII, encontra-se o maior índice de fraldas e maior consumo de produtos descartáveis, característica de regiões com alto poder aquisitivo. Já a SER VI, que possui menor poder aquisitivo, apresenta os maiores índices de rejeito e resíduos de jardim, sendo a presença de recicláveis menor que as demais (SANETAL, 2012).
Por fim, essa necessidade de o cálculo e o valor da cobrança observarem a capacidade contributiva do usuário está imposta pelas Leis nº 11.455/07 e nº 12.305/10.
O artigo 30, inciso VI da Lei Nº 11.455/07 estabelece:
Art. 30. Observado o disposto no art. 29 desta Lei, a estrutura de remuneração e cobrança dos serviços públicos de saneamento básico poderá levar em consideração os seguintes fatores:
(...)
VI - capacidade de pagamento dos consumidores.
7. FORMAS DE TRIBUTAÇÃO NAS DIVERSAS ETAPAS DOS SERVIÇOS
A Política Nacional de Resíduos Sólidos menciona a Lei nº 11.445/2007, quanto à conceituação do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduo sólidos urbanos (art. 3º, XIX), levando-nos ao art. 7º daquela Lei, que trata das diretrizes nacionais para os serviços públicos de saneamento básico.
Por esse artigo 7º, temos: coleta; transbordo e transporte; triagem para fins de reuso ou reciclagem; de tratamento e de disposição final dos resíduos, além de varrição, capina e poda de árvores em vias e logradouros públicos.
Cada etapa pode ser realizada por uma ou mais pessoas, além de poderem ser verticalizadas em um mesmo empreendimento. (XXXX in CAVALCANTE, 2014)
Ao analisar a tributação nas diversas etapas dos serviços de manejo dos resíduos sólidos é necessário diferenciar tributação para custeio do serviço e
tributação em decorrência da realização do serviço. A tributação para o custeio do serviço será caracterizada exclusivamente por meio de instituição e cobrança de taxa e somente é possível nos casos em que o Poder Público presta diretamente o serviço. Já a tributação em decorrência da realização do serviço é aquela que incide sobre as diversas fases quando eles caracterizarem o fato gerador de tributos.
Como visto anteriormente, caso o serviço seja prestado pelo poder público, poderá ser cobrada taxa. A taxa não é tributo que incide sobre o serviço, mas para o seu custeio. Quando o serviço for realizado por particular delegatário do serviço público, será cobrada tarifa, que não é tributo, mas preço público e decorre de contrato.
Neste trabalho, estudaremos os tributos que incidem indiretamente na cadeia, sendo esses os seguintes: PIS/COFINS; IPI; ISS e ICMS. Destes, deteremo-nos especialmente no ponto em que trataremos acerca do ICMS, pois tanto esse é o tributo de maior peso no âmbito da logística reversa, representando cerca de 51% da tributação nesse setor (CNI, 2014), bem como é o tributo de atribuição dos estados, o que nos leva a uma maior importância em relação ao Plano Estadual de Resíduos Sólidos.
Precisamos ainda lembrar da diferença feita pelo PNRS entre resíduos sólidos e rejeitos (ou lixo), pois isso implica diferença de tratamento em relação a incidência tributária. Temos então que resíduos sólidos, de modo simplificado, são aqueles que ainda podem ser transformados e reinseridos no sistema de produção e consumo; já rejeitos são aqueles que não podem ser reutilizados ou transformados, ficando fora desse sistema e devendo ter a destinação final ambientalmente adequada.
Dito isso, passemos ao estudo dos tributos em específico.
7.1. Imposto sobre Produtos Industrializados
O IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) incide sobre a indústria recicladora, indústria de transformação. A incidência ocorre sobre o produto final da indústria, levando na prática a uma tributação dos resíduos utilizados como matéria-prima ou produto intermediário na fabricação, pois a utilização dos reciclados não gera qualquer crédito.
Em relação a isso, há, porém, o Decreto nº 7.619/2011, que busca incentivar as cooperativas de catadores, estabelecendo que as indústrias terão direito a crédito presumido de IPI quando adquirirem o material diretamente das cooperativas formadas por vinte ou mais pessoas, sem a participação de pessoa jurídica. Não é, entretanto, qualquer resíduo que possibilita esse crédito. O decreto elenca alguns tipos de resíduos sólidos cuja utilização geram o crédito presumido, fazendo diferença entre eles também quanto aos valores dos créditos, que podem ser de 50%, 30% ou 10%.
8. CONTRIBUIÇÃO PARA FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL E PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL E PROGRAMA DE FORMAÇÃO DO PATRIMÔNIO DO SERVIDOR PÚBLICO.
A COFINS (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) foi instituída pela A Lei Complementar Nº 70, de 30 de dezembro de 1991, devida pelas pessoas jurídicas, inclusive as a elas equiparadas pela legislação do imposto de renda, destinadas exclusivamente às despesas com atividades-fim das áreas de saúde, previdência e assistência social.
O Programa de Integração Social (PIS) destinado a promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas foi criado pela Lei Complementar Nº 07/1970. O fundo é composto de duas parcelas: a) a primeira, mediante dedução do Imposto de Renda e; b) a segunda, com recursos próprios da empresa, calculados com base no faturamento da empresa.
Somente contribuirão para o PIS como prestadoras de serviço de manejo de resíduos sólidos as pessoas jurídicas de direito privado e as que lhe são equiparadas pela legislação do Imposto de Renda, inclusive empresas prestadoras de serviços, empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias, excluídas as microempresas e as empresas de pequeno porte submetidas ao regime do Simples Nacional (LC 123/2006).
Ainda, a legislação estabelece que a obrigatoriedade de contribuição para o PIS não se aplica a quaisquer entidades integrantes da Administração Pública federal, estadual ou municipal, dos Territórios e do Distrito Federal, Direta ou Indireta.
Já o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), foi instituído na forma prevista pela Lei Complementar Nº 08/1970:
Art. 2º - A União, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal e os Territórios contribuirão para o Programa, mediante recolhimento mensal ao Banco do Brasil das seguintes parcelas: I - União:
1% (um por cento) das receitas correntes efetivamente arrecadadas, deduzidas as transferências feitas a outras entidades da Administração Pública, a partir de 1º de julho de 1971; 1,5% (um e meio por cento) em 1972 e 2% (dois por cento) no ano de 1973 e subsequentes.
II - Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios:
a) 1% (um por cento) das receitas correntes próprias, deduzidas as transferências feitas a outras entidades da Administração Pública, a partir de 1º de julho de 1971; 1,5% (um e meio por cento) em 1972 e 2% (dois por cento) no ano de 1973 e subsequentes;
b) 2% (dois por cento) das transferências recebidas do Governo da União e dos Estados através do Fundo de Participações dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a partir de 1º de julho de 1971.
Parágrafo único - Não recairá, em nenhuma hipótese, sobre as transferências de que trata este artigo, mais de uma contribuição.
Art. 3º - As autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações, da União, dos Estados, dos Municípios, do Distrito Federal e dos Territórios contribuirão para o Programa com 0,4% (quatro décimos por cento) da receita orçamentária, inclusive transferências e receita operacional, a partir de 1º de julho de 1971; 0,6% (seis décimos por cento) em 1972 e 0,8% (oito décimos por cento) no ano de 1973 e subsequentes.
Assim, PIS /COFINS incidem sobre a receita conseguida nas vendas de resíduos sólidos (para reciclagem e/ou reutilização) e nas prestações de serviços relacionadas ao manejo dos resíduos, quais sejam: coleta; transbordo e transporte; triagem; tratamento; disposição final dos resíduos; etc.
Em relação a esses tributos, a Lei nº 11.196/05 prevê a suspensão da incidência nos casos de venda para empresas do regime de lucro real, restringindo, porém, o usufruto de crédito pelas empresas que adquiram materiais com suspensão de PIS/COFINS (restrição que não ocorre às demais empresas).
A professora Xxxxxx Xxxxxxxxxx (2014, p.155), tecendo críticas a essa restrição, faz referência a Xxxxxxxx Xxxxx, que escreve:
(...) se o Estado deve proteger o meio ambiente, e tratar distintamente os contribuintes que exercem atividades que causam menor impacto ambiental, ele não pode tratar de modo desfavorável os contribuintes que usam insumos recicláveis, no lugar daqueles que extraídos da natureza, e causam impacto ambiental muito menor. A União Federal, ao vedar o direito aos créditos correspondentes às aquisições de materiais reutilizados, até diferenciou os contribuintes conforme o impacto ambiental dos produtos e de seus processos de elaboração. Fê- lo, porém, às avessas: quem causa mais impacto ambiental, foi favorecido; quem provoca menos impacto ambiental, foi prejudicado.
Confirmando esse entendimento, análise realizada pela Confederação Nacional da Indústria, lembrando que as cadeias de coleta, triagem e transporte não são formadas apenas por empresas do lucro real, chega à conclusão de que ocorre uma tributação cumulativa, que não é beneficiada por aquela suspensão, e que por isso não é compensada posteriormente.
Nesse caso, se nas etapas finais da cadeia há empresas do lucro real, a incidência cumulativa e não compensada de PIS/COFINS resulta em uma carga tributária mais elevada sobre os resíduos sólidos, inclusive comparativamente àquele incidente sobre a matéria-prima virgem. (CNI, 2014)
Concluem os autores com a visão de uma necessária revisão da legislação nesse ponto para que se seja adequada às urgências que demanda nossa atual realidade ambiental e princípios constitucionais.
9. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS
Em relação ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), de competência dos municípios e que está previsto no artigo 156, III, da Constituição Federal, temos que o fato gerador deste tributo é a prestação dos serviços constantes na lista anexa à Lei Complementar Nº 116.
Vejamos o que estabelece a Lei Complementar Nº 116:
Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.
§ 1o O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País.
§ 2o Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.
§ 3o O imposto de que trata esta Lei Complementar incide ainda sobre os serviços prestados mediante a utilização de bens e serviços públicos explorados economicamente mediante autorização, permissão ou concessão, com o pagamento de tarifa, preço ou pedágio pelo usuário final do serviço.
§ 4o A incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado.
Art. 3o O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local: (Vide Lei Complementar nº 123, de 2006).
VI – da execução da varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e
destinação final de xxxx, rejeitos e outros resíduos quaisquer, no caso dos serviços descritos no subitem 7.09 da lista anexa;
VII – da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa;
VIII – da execução da decoração e jardinagem, do corte e poda de árvores, no caso dos serviços descritos no subitem
7.11 da lista anexa;
Art. 8o As alíquotas máximas do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza são as seguintes:
I – (VETADO)
II – demais serviços, 5% (cinco por cento). Anexo:
7.09 – Varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer.
7.10 – Limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres.
7.11 – Decoração e jardinagem, inclusive corte e poda de árvores.
Percebe-se, assim, que o ISS incidirá sobre serviços de manejo de resíduos sólidos (de logística, de processamento ou de destinação adequada) prestados por particulares delegatários do serviço público. Pela análise das hipóteses de incidência, conclui-se que o ISS é cobrado em razão da prestação do serviço como um todo, não se destacando qualquer fase em especial. No entanto, poderá incidir sobre as diversas fases se, por alguma razão técnica, locacional ou outra, as fases tenham sido rateadas entre diversos parceiros públicos, tudo precedido de licitação
10. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SOBRE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE INTERESTADUAL, INTERMUNICIPAL E DE COMUNICAÇÃO
O Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) é de competência estadual. O entendimento corrente, a partir de uma leitura objetiva da regra de incidência em relação ao ICMS, é a de que esse imposto é devido em todas as etapas (MELO in CAVALCANTE, 2014). Vejamos a regra:
O imposto incide sobre:
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;
II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;
III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza;
IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios; V – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
VI – a entrada de mercadoria importada do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo permanente do estabelecimento;
VII – o serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior;
VIII – a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à
comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde estiver localizado o adquirente.
Apesar de esse ser o pensamento corrente, existe um questionamento sobre a incidência do ICMS nas etapas do manejo de resíduos sólidos, a partir da visão que questiona se os resíduos podem realmente ser tidos como mercadoria e bens de valor em todas essas etapas. Por essa visão, observa-se que para o ICMS incidir é necessário que o resíduo sólido esteja em contexto de cadeia produtiva, existindo uma valorização ou transformação. Isso não ocorre em todo o manejo, como bem aponta Melo (in CAVALCANTE, 2014, p.24):
(...) a princípio, em relação às atividades de coleta, transporte e transbordo de resíduos, não se poderia falar adequadamente em cadeia produtiva, uma vez que os resíduos sólidos permaneceriam sem qualquer valorização ou transformação, pairando a presunção de inexistência de riqueza; nesse diapasão, especialmente no caso do manejo de resíduos sólidos urbanos, qualificados como serviço público, pode ser equivocada a caracterização do resíduo sólido como mercadoria.
Tomando-se essa visão, não deveria haver, portanto, incidência desses tributos nessas etapas, a não ser, nos casos em que efetivamente o resíduo sólido sofra uma valorização ou transformação, havendo geração de riqueza.
Essa valorização ou transformação é o que ocorre a partir do momento em que o resíduo passa à triagem para reutilização e reciclagem, tornando-se “um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania” (art. 6º, VIII, da Lei nº 12.305/2010). Com a reutilização e os diversos processos de transformação, tem-se o resíduo transformado em matéria-prima para novos processos produtivos, passando a competir com a matéria-prima advinda da extração direta do meio ambiente. Com isso, pode-se falar na incidência de ICMS.
É necessário, deixar claro, entretanto, que, como já dito, o entendimento corrente é o de que, pela leitura objetiva da regra de incidência desse imposto, ele seria devido em todas as etapas. Não podíamos, porém, deixar de trazer à tona, neste trabalho, a ideia que foi acima apresentada, posto que ela pode frutificar em nova visão, que poderá beneficiar aqueles que trabalham com o
manejo, tendo em vista ser recorrente os altos custos para a efetivação desse serviço.
Em relação ao ICMS, em geral, no estado, ocorre o diferimento da incidência nas operações com resíduos, o que significa dizer que a cobrança do tributo é postergada até a etapa final, que é a entrada ou a saída do material na indústria transformadora (recicladora); ou seja, não é recolhido o imposto nas operações de compra e venda iniciais. Importa dizer que isso não faz com que o valor do tributo fique menor, mas apenas que o momento do recolhimento seja adiado.
A incidência desse imposto também se dá nas operações interestaduais, encerrando o diferimento na saída do material para outro estado, gerando “uma complexidade” e dificultando o comércio interestadual, “além de criar algumas possibilidades de fraude” (CNI, 2014, p.66).
O diferimento é interessante na medida em que torna mais simples as operações de comércio das empresas, muitas vezes de pequeno porte, nos estágios pregressos à entrada da mercadoria na indústria.
Existem críticas a uma maior falta de benefícios fiscais relacionados ao ICMS, que poderia ser melhor utilizado como fator de diferença de preços entre produtos que utilizam matéria-prima reciclada e os que usam matéria-prima de extração, beneficiando os produtos que possuem externalidades positivas, em detrimento daqueles mais poluentes. Sobre isso, falaremos um pouco no ponto a seguir.
11. A FUNÇÃO EXTRAFISCAL DOS TRIBUTOS E BENEFÍCIOS FISCAIS
Existem várias críticas, especialmente dos setores de reciclagem, quanto aos tributos incidentes sobre as atividades. As principais críticas recaem sobre o aspecto de os tributos gerarem dificuldades para a competitividade desses setores frente aos tradicionais, que não utilizam matéria-prima reciclada. Em relação a esse aspecto, podemos destacar a função extrafiscal dos tributos. Isso significa dar ao tributo não apenas um caráter meramente arrecadatório, mas a função de incentivar ou buscar adequar comportamentos econômicos e sociais, como, por exemplo, incentivar atividades menos
poluidoras ou atividades de reciclagem.
Em outras palavras, a extra fiscalidade seria “a atividade financeira que o Estado exercita sem o fim precípuo de obter recursos para seu erário, para o fisco, mas sim com vistas a ordenar ou reordenar a economia e as relações sociais.” (FALCÃO, 1982, p.48).
Sobre o mesmo assunto, destaca Xxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, citado por Xxxxxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxx (2008):
No estágio atual das finanças públicas, dificilmente um tributo é utilizado apenas como instrumento de arrecadação. Pode ser a arrecadação o seu principal objetivo, mas não é o único. O tributo também é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, setores econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens e produzindo, finalmente, os mais diversos efeitos na economia.
Assim, é importante e necessário que o Estado, no sentido de promover a preservação ambiental, como exigido constitucionalmente, mescle os sentidos fiscal e extrafiscal do direito tributário para diferenciar aqueles que poluem e aqueles que não poluem, buscando direcionar e induzir comportamentos desejáveis.
Com essa visão, pode-se afirmar que, para uma sociedade ser cada vez mais ambientalmente saudável e inovadora, é necessário pensar e efetivar formas de reduzir os custos das atividades e tecnologias que colaborem para isso, tornando-as mais atrativas tanto para quem realiza a atividade como para quem vai consumir o produto daquela atividade. Nisso, deve-se pensar no peso que os tributos causam aos custos da atividade e do consumo; pensando-se assim em meios de reduzir esse peso para as atividades mais desejáveis, como por exemplo, a reciclagem.
É com esse pensamento, que Xxxxxx (2007) escreve:
As atividades econômicas não-poluidoras deverão ser incentivadas por meio de instrumentos tributários e econômicos em detrimento das poluidoras como forma de reorientar as condutas dos agentes poluidores a adotarem novas e adequadas tecnologias limpas para reduzirem custos em seus processos de produção. Esse tipo de política econômica desenvolvida em nosso país diminuirá significativamente os
Custos sociais com a poluição ambiental, uma vez que o nível de bem-estar coletivo aumentará e, automaticamente, produzirá benefícios em termos de saúde pública.
XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx do. Direito tributário ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
Exatamente com esses sentidos é que, através do art. 8º, inciso IX, da lei nº 12.305/2010, temos estabelecidos como instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos os incentivos fiscais, financeiros e creditícios.
Art. 8º - São instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros:
(...)
IX – os incentivos fiscais, financeiros e creditícios
Esse artigo, em conjunto com o artigo 44º da mesma lei, respeitando-se os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, possibilita à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a ampliação de incentivos fiscais e creditícios para as atividades de reutilização, ao tratamento e à reciclagem de resíduos sólidos, para projetos relacionados à responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos, principalmente em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formada por pessoas de baixa renda, e para empresas dedicadas a limpeza urbana e atividades a ela relacionadas.
Afinal, como é notório, o gerenciamento de resíduos e as atividades de reciclagem e reutilização podem envolver altos custos e investimentos. Daí a importância do Estado, observando isso e diante da necessidade da sustentabilidade financeira do gerenciamento e diante da necessidade da sustentabilidade ambiental, dar suporte a essas atividades, beneficiando aqueles que melhor contribuem para a efetivação da sustentabilidade.
Acerca disso, temos as palavras de Xxxxxx Xxxxx (2010):
Um sistema de gerenciamento de resíduos requer investimentos altos. Uma efetiva implementação de um plano de gerenciamento de resíduos há de prever aportes financeiros elevados em consonância com outras políticas públicas. O acondicionamento, a coleta e transporte, os serviços de limpeza, O tratamento e disposição final, todas essas etapas fazem parte
do plano e não são baratas. Existem, ainda, sistemas de reciclagem que são bastante onerosos, como por exemplo, o co- processamento, a incineração, a biomassa, a gaseificação e o biodigestor. (...) Por isso, a previsão de concessão de incentivos fiscais, financeiros e creditícios é louvável e realmente necessária.
Nesse contexto, é que temos o Decreto nº 7.619/2011, já comentado anteriormente, que regulamenta a concessão de crédito presumido do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de resíduos sólidos.
Apesar de esses fatos e da necessidade de incentivo à reutilização e reciclagem serem de amplo conhecimento, Ribeiro, Queiroz e Grupenmacher (in CAVALCANE, 2014) alertam que “as políticas de incentivos fiscais no Brasil sobre material reciclado ainda são muito incipientes”, especialmente nos âmbitos dos municípios e estados.
Existem alguns benefícios de ICMS aprovados pelo CONFAZ, entretanto, em geral, “esses benefícios visam apenas simplificar a operação com resíduos sem valor de mercado relevante” (CNI, 2014, p.15).
Dentre alguns exemplos de concessão de benefícios e incentivos quanto ao ICMS, temos a Lei nº 1.095/1999, do Estado de Tocantins, que isentou do Imposto sobre Circulação de Mercadorias por 25 anos o segmento de reciclagem de resíduos sólidos, nas operações internas de saídas de papelão usado, sucata de metais, plásticos, vidros e outros resíduos sólidos, para os contribuintes cadastrados no programa Estadual de Coleta Seletiva do Lixo. Desta foram, é concedido crédito fiscal presumido, no percentual de 100% do valor do ICMS, para as indústrias que se instalarem no Estado até o final de 2015.
Outro exemplo vem do Estado do Amazonas, que através da Lei nº 2.826/2003 (art. 4º, XI), para efeitos de incentivos fiscais relacionados ao ICMS, considera de fundamental interesse para o desenvolvimento do Estado as indústrias que estimulem a atividade de reciclagem de material ou resíduo sólido a ser utilizado como matéria-prima na atividade industrial. Essa lei regula ainda especificamente a atividade de reciclagem, equiparando a indústria o estabelecimento que pratique operações com materiais e/ou resíduos sólidos destinados à reciclagem, que atenda, no mínimo, às normas técnicas para a gestão e garantia de qualidade e gestão do meio ambiente. Tal equiparação a
indústria é necessária, pois a Constituição daquele Estado somente permite incentivos desse tipo a empresas industriais.
Podemos ainda mencionar o Convênio ICMS nº 7, de 05/04/2013, segundo o qual, ficam autorizados os Estados do Ceará, Mato Grosso, Santa Catarina, o Distrito Federal, Amapá e Pernambuco (esses dois últimos acrescentados pelo Convênio ICMS nº 106 de 05/09/2013) a conceder, “na forma e condições estabelecidas em sua legislação, redução da base de cálculo do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e de Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, de forma que a carga tributária seja equivalente a aplicação de percentual de até 1% (um por cento) sobre o valor das operações internas com sucatas de papel, vidro e plásticos, destinadas a estabelecimento industrial, que tenham como objetivo a reciclagem.”
Dentro do pensamento aqui levantado, devem, portanto, surgir no Plano Estadual de Resíduos Sólidos, mecanismos que visem atingir os objetivos do PNRS através dos instrumentos de incentivos fiscais, financeiros e creditícios, garantindo possibilidades de desoneração dos resíduos sólidos a serem reutilizados ou reinseridos no sistema produtivo, além de garantir formas de incentivos aos municípios para a redução ou mesmo isenção do ISS na cadeia de manejo dos resíduos sólidos.
Destacam-se dentre as possibilidades de desoneração dos resíduos reaproveitados como matéria-prima pela indústria a isenção na cobrança do ICMS, o crédito presumido, além da ampliação do diferimento desse tributo.
O crédito presumido pode reduzir substancialmente o valor cobrado, quando incidente apenas sobre o valor adicionado pela indústria transformadora, mas não sobre o valor dos resíduos utilizados com matéria-prima, calculando-se com base no valor integral dos resíduos adquiridos pela indústria recicladora e na alíquota do tributo sobre o produto final dessa indústria, estimulando assim o uso de material reciclado como insumo pela indústria (CNI, 2014).
Deve-se ter em mente, também, a necessidade de que esses tributos não incidam sobre os serviços prestados por terceiros, buscando garantir a sustentabilidade financeira do manejo.
Atente-se que nessa parte final, concentramos as ideias acerca do ICMS e do ISS por serem mais pertinentes a este trabalho, já que o foco deve ser as
políticas estaduais e, de modo indireto, as municipais; não resultando, porém, em menor importância uma discussão em âmbito nacional sobre o assunto. Inclusive, em relação ao ICMS, é bastante necessário o debate sobre uma equalização entre os estados e definições acerca do trânsito interestadual, que resultem em acordos que visem a simplificação e a desoneração, sempre no intuito de atingir os objetivos estabelecidos pelo PNRS e pelos planos estaduais de resíduos sólidos.
Por fim, é de grande importância colocar que qualquer medida em relação a esses tributos, como já dito, precisa observar as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000). Isso importa dizer que deve haver por parte do Estado estudos que demonstrem em cada setor beneficiado a real eficácia da aplicação de mecanismos como os apresentados acima. Estudos esses não apenas prévios, mas constantes para verificar se a eficácia e os objetivos esperados continuam ao longo do tempo, ou se, por qualquer motivo, não está produzindo o efeito esperado. Tais estudos servem ainda para observar se os setores atingidos realmente estão pondo os produtos no mercado com os preços justos em relação aos valores dos recolhimentos de tributos, ou se, mesmo com benefícios tributários, continuam mantendo os valores altos como se tributados sem benefícios fossem, buscando assim aumentar os lucros através do apelo e status mercadológico dos produtos chamados “ecológicos” ou “sustentáveis”.
12. RECOMENDAÇÕES E CONCLUSÕES
Tendo em vista todo o exposto e com base
1) nos princípios expostos no artigo 6º da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, especialmente o princípio do poluidor-pagador, o princípio da visão sistêmica na gestão dos resíduos sólidos, o princípio do desenvolvimento sustentável, o princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
2) nos objetivos expostos no artigo 7º, especialmente o objetivo da não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos; o objetivo de estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; o
objetivo de gestão integrada de resíduos sólidos; o objetivo da regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e financeira;
Recomenda-se que seja prevista a adoção de sistemas de cobrança pelo serviço de manejo dos resíduos sólidos.
Recomenda-se que – pelas características do serviço prestado (serviço público específico e divisível), por existir maior e mais sedimentada base jurisprudencial e, portanto, proporcionando uma maior segurança jurídica – seja incentivada a cobrança por meio de Taxa.
Para que a cobrança atinja objetivos pedagógicos e de responsabilização, abrindo a possibilidade de alteração de padrões de consumo e, indiretamente, padrões de produção, recomenda-se que a base de cálculo leve em conta não apenas os custos totais da prestação do serviço, mas o volume ou peso dos resíduos produzidos individualmente. Deve-se ainda, respeitar a capacidade contributiva dos usuários, estabelecendo isenção da contribuição para faixas de renda familiar mais baixas e podendo estabelecer formas de cálculo diferenciadas para as diferentes faixas de renda.
Assim, além de ser uma cobrança mais justa, tanto em termos ambientais, por cobrar de acordo com a geração de resíduos, quanto em termos sociais, já que vivemos em uma realidade de grandes desigualdades e contrastes econômicos, estarão sendo observadas a diretriz de “inibição do consumo supérfluo e do desperdício de recursos” imposta pelo inciso IV do §1º do artigo 29 da Lei Nº 11.455/07; a “capacidade de pagamento dos consumidores”, como determina o inciso VI do artigo 30 dessa mesma lei; e a consideração do nível de renda da população da área atendida explicitada pelo inciso I do artigo 35 dessa lei9.
9 Art. 29. (...)
§ 1o Observado o disposto nos incisos I a III do caput deste artigo, a instituição das tarifas, preços públicos e taxas para os serviços de saneamento básico observará as seguintes diretrizes:
I - prioridade para atendimento das funções essenciais relacionadas à saúde pública; II - ampliação do acesso dos cidadãos e localidades de baixa renda aos serviços;
III - geração dos recursos necessários para realização dos investimentos, objetivando o cumprimento das metas e objetivos do serviço;
IV - inibição do consumo supérfluo e do desperdício de recursos;
Uma cobrança compatível com a realidade financeira do usuário também evita a disposição irregular dos resíduos nos “pontos de lixo”, fazendo-se o apontamento de que em grande parte das vezes não é o pequeno gerador o que mais descarrega lixo nesses locais, mas os grandes geradores de resíduos sólidos.
Os “pontos de lixo” fazem parte da realidade cearense. No caso de Fortaleza, existem cerca de 1800 pontos desse tipo (SANETAL, 2012), o que é apontado pelos estudos do relatório III para a versão preliminar do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos de município como um grave fato a ser combatido pela gestão. Alguns estudos sobre casos estrangeiros de implementação da cobrança apontam a uma tendência de aumento desses pontos por conta de geradores que tentam fugir da cobrança depositando o resíduo em locais irregulares. Os benefícios da cobrança, porém, mostram-se maiores do que a possibilidade de problemas. Tanto é assim, que aquele relatório, apesar do já enorme número de “pontos de lixo” na cidade, aponta para a necessidade de uma cobrança pelo serviço da gestão e manejo de resíduos
V - recuperação dos custos incorridos na prestação do serviço, em regime de eficiência; VI - remuneração adequada do capital investido pelos prestadores dos serviços;
VII - estímulo ao uso de tecnologias modernas e eficientes, compatíveis com os níveis exigidos de qualidade, continuidade e segurança na prestação dos serviços;
VIII - incentivo à eficiência dos prestadores dos serviços.
§ 2o Poderão ser adotados subsídios tarifários e não tarifários para os usuários e localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala econômica suficiente para cobrir o custo integral dos serviços. Art. 30. Observado o disposto no art. 29 desta Lei, a estrutura de remuneração e cobrança dos serviços públicos de saneamento básico poderá levar em consideração os seguintes fatores:
I - categorias de usuários, distribuídas por faixas ou quantidades crescentes de utilização ou de consumo; II - padrões de uso ou de qualidade requeridos;
III - quantidade mínima de consumo ou de utilização do serviço, visando à garantia de objetivos sociais, como a preservação da saúde pública, o adequado atendimento dos usuários de menor renda e a proteção do meio ambiente;
IV - custo mínimo necessário para disponibilidade do serviço em quantidade e qualidade adequadas; V - ciclos significativos de aumento da demanda dos serviços, em períodos distintos; e
VI - capacidade de pagamento dos consumidores.
Art. 31. Os subsídios necessários ao atendimento de usuários e localidades de baixa renda serão, dependendo das características dos beneficiários e da origem dos recursos:
I - diretos, quando destinados a usuários determinados, ou indiretos, quando destinados ao prestador dos serviços;
II - tarifários, quando integrarem a estrutura tarifária, ou fiscais, quando decorrerem da alocação de recursos orçamentários, inclusive por meio de subvenções;
III - internos a cada titular ou entre localidades, nas hipóteses de gestão associada e de prestação regional. Art. 35. As taxas ou tarifas decorrentes da prestação de serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos devem levar em conta a adequada destinação dos resíduos coletados e poderão considerar:
I - o nível de renda da população da área atendida;
II - as características dos lotes urbanos e as áreas que podem ser neles edificadas; III - o peso ou o volume médio coletado por habitante ou por domicílio.
sólidos, classificando a falta dessa cobrança como “alta ameaça” (SANETAL, 2012) ao futuro da gestão e como quesito de “alta prioridade” de implementação. Quanto a esses aspectos, deve-se ter em mente que a cobrança é um instrumento dentro de um sistema em que devem existir outros instrumentos, funcionando de forma que uns acabam por direta ou indiretamente combater os possíveis aspectos negativos uns dos outros e a potencializar os benefícios de
uns dos outros atuando em conjunto.
É possível que a cobrança desses mecanismos de remuneração seja feita em conjunto com outras cobranças, como, por exemplo, com a do IPTU, água e energia. Contudo, para que seja cobrada juntamente com as contas de água ou energia, é necessária a autorização do usuário. A cobrança conjunta pode ser interessante pela possibilidade de redução de custos, mas devem ser analisadas as peculiaridades locais.
Por exemplo, no Estado do Paraná, vários municípios cobravam a “taxa do lixo” juntamente com as contas de água ou energia. Após a intervenção do Ministério Público, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta segundo o qual os usuários poderiam escolher a maneira como seria realizada a cobrança, se nas contas de água/energia ou juntamente com o boleto do IPTU. Isto se deu por conta da ausência de manifestação prévia dos usuários, bem como pelo inconveniente de que a eventual falta no pagamento da taxa de lixo pudesse, ilegalmente, alcançar o corte no fornecimento de água/energia.
Já no Município de União da Vitória, a cobrança era realizada juntamente com o IPTU. O quadro de inadimplência do imposto e, consequentemente, da taxa de lixo, fez com que os gestores tivessem que pensar outra maneira de cobrança. A prefeitura propôs uma parceria com a concessionária SANEPAR (Companhia de Saneamento do Paraná) para a cobrança juntamente com a conta de água.
Recomenda-se ainda que seja legalmente previsto que a criação das formas de cobrança seja fruto de amplos e profícuos debates com a sociedade em geral e com as populações e comunidades locais. Para que o sistema de cobrança funcione em todos os aspectos desejados, é necessário que surjam de diálogos democráticos que aliem conhecimento popular e conhecimento técnico. Apenas com essa aliança será possível criar sistemas e cobranças que respeitem a características locais e comunitárias. Caso contrário, corre-se o risco
de cair em tecnicismos cujos modelos gerais podem não funcionar para realidades tão distintas. Além disso, não se pode esperar uma fácil adesão da população a algo sobre o qual não foi ouvida e da qual não participaram da criação. É preciso valorizar o conhecimento dos cidadãos que vivenciam cotidianamente os problemas e desafios da realidade local. Respeitando-se esse tipo de debate e processo, as soluções serão mais profícuas e duradouras.
Tendo-se esse respeito, estarão sendo implementados os princípios do respeito às diversidades locais e regionais e do direito da sociedade à informação e ao controle social, ambos princípios da PNRS.
É preciso lembrar que a competência para a implementação da cobrança é municipal.
Atualmente no Estado do Ceará, não há nenhum município que realize cobrança específica por esse serviço (IPEA, 2012).
Diante dessa realidade, recomenda-se que o Plano Estadual de Resíduos Sólidos estabeleça, além do que expomos acima, metas que proporcionem a alteração desse quadro em nosso estado e estimulem os municípios à criação dessa cobrança.
É importante ressaltar que os consórcios intermunicipais atualmente existentes no Ceará são voltados apenas para a administração de aterros, ou seja, para apenas uma única etapa da gestão dos resíduos sólidos. Apesar da possibilidade da cobrança por essa etapa específica do serviço, essa forma limitada não é a ideal, tendo em vista todas as questões até o momento expostas. Consórcios limitados a uma única etapa do serviço tendem a ter uma maior dificuldade para o cálculo referente à responsabilização individualizada, tão necessária para a efetivação do princípio poluidor-pagador. Ademais, os recursos advindos dessa cobrança só poderiam ser investidos nessa mesma etapa do serviço, gerando aos municípios possíveis dificuldades de planejamento que poderiam ser evitadas, caso todas as etapas fossem administradas em conjunto.
Diante dessa realidade, deve o Plano Estadual incentivar que os consórcios abranjam todas as etapas do serviço, posto que assim é possível melhorar e potencializar a logística e o planejamento, aumentando a possibilidade de melhora no serviço e de redução dos custos, criando ainda uma real possibilidade da efetivação do princípio poluidor-pagador.
Atrelada a isso, a realidade de grande parte dos pequenos municípios é a de falta de recursos que cubram os custos operacionais de todas as etapas do serviço. Inseridos em consórcios, formando rede com outros municípios, além de potencializar a logística, abrem a possibilidade de obter mais recursos, já que consórcios possuem prioridade de acesso a recursos da União. Alia-se a isso a necessidade de o Plano Estadual incentivar a regionalização dos consórcios, que poderão ampliar ainda mais as potencialidades dos municípios de uma mesma região e que possuem situações semelhantes, podendo inclusive o Poder Estadual fazer parte desses consórcios.
Antes de chegarmos ao final deste trabalho, é preciso reafirmar e dizer que essa cobrança é um instrumento dentre vários. De nada ou pouco adiantará o seu implemento caso esses outros instrumentos não sejam efetivados. É necessário para a efetividade dos objetivos uma combinação de instrumentos. É necessária uma visão e uma prática sistêmicas em que haja, dentre outros, a implantação de coleta seletiva, a criação de bons planos e sistemas de logística reversa, responsabilidade estendida do produtor, reciclagem, valorização dos catadores, efetiva fiscalização e aplicação de multas.
Nesse sentido, devem ser pensados em instrumentos de incentivos fiscais, financeiros e creditícios, garantindo possibilidades de desoneração dos resíduos sólidos a serem reutilizados ou reinseridos no sistema produtivo, destacando-se as possibilidades em relação ao ICMS, além de incentivos aos municípios para a redução ou mesmo isenção do ISS na cadeia de manejo dos resíduos sólidos. Com isso, estar-se-á possibilitando um maior grau de reciclagem e reutilização, reduzindo-se a extração de matéria-prima e possibilidades de serem atingidos aqueles objetivos do PNRS.
Por fim, as recomendações e observações aqui postas vão no sentido não apenas de que sejam observadas as normas legais vigentes, mas no sentido de as possíveis cobranças que venham a ser estabelecidas superem objetivos meramente fiscais ou visem apenas a sustentabilidade financeira. Ampliando a visão, espera-se que esse instrumento, junto aos diversos outros instrumentos sociais e ideias existentes e que ainda surgirão, visem verdadeiramente uma alteração do panorama socioambiental que hoje vivemos e da separação ilusória que o ser humano criou entre nossa espécie e o restante do ecossistema planetário. O objetivo maior é o de que sejam criados instrumentos para uma
mudança da realidade atual em nossa região, país e planeta, em uma direção que nos permita futuramente alcançar uma transformação do paradigma atual para um paradigma em que a vida (em todos os sentidos e formas) prevaleça sobre interesses individualistas e consumistas, que por hora ainda imperam em nossas sociedades.
13. REFERÊNCIAS
XXXXXXXXX, Xxxxxxx; SPERANZA, Xxxxxxx; XXXXXXXXX, Xxxxxx. Lixo zero : gestão de resíduos sólidos para uma sociedade mais próspera. São Paulo : Planeta Sustentável : Instituto Ethos, 2013.
XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx do. Direito tributário ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxx. Direito público do Ambiente. Coimbra: Faculdade de Direito de Coimbra, 1995.
XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxx; LEITE, Xxxx Xxxxxx Xxxxxx. Direito constitucional ambiental brasileiro. 4ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2011.
XXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx; XXXXXX, Xxx Xxxxx Xxxxxx. Anais do XVII Encontro Preparatório para o Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2008.
XXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx (Coord.). Tributação ambiental: reflexos na política nacional de resíduos sólidos. 1ª ed. Curitiba: CRV, 2014.
Confederação Nacional da Indústria. Proposta de implementação dos instrumentos econômicos previstos na lei n° 12.305/2010 por meio de estímulos à cadeia de reciclagem e apoio aos setores produtivos obrigados à logística reversa. Brasília: CNI, 2014.
XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Tributação e mudança social. Rio de Janeiro: Forense, 1982.
XXXXXX, Xxxxx. The Pay-As-You-Throw Playbook. Waste Age. Março/2012. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxx.xxx/XxxxxXxx_XXXXXxxxxxx_0000.xxx XXXXXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxxxx. A tributação do lixo na cidade de São Paulo: uma discussão dos aspectos fiscais e ambientais. Pesquisa em Debate. Ed. 7, v. 4, n. 2, Jul/Dez 2007.
IPEA, 2012. Diagnóstico dos Instrumentos Econômicos e Sistemas de Informação para Gestão de Resíduos Sólidos. Relatório de Pesquisa. Disponível em:
XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. Direito Administrativo Brasileiro. 26ª ed., atual. São Paulo: Malheiros, 2001
XXXXXX, Xxxx. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7ª ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
SANETAL. Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos de Fortaleza – Versão Preliminar: Relatório III. Fortaleza: agosto/2012.
XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. A tributação ambiental e seus reflexos na Política Nacional dos Resíduos Sólidos. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2010.
XXXXXXX, Xxxxxxxx. Lixo: cenários e desafios: abordagens para entender os resíduos sólidos. São Paulo: Cortez, 2010.
. Gestão do lixo domiciliar. Considerandos sobre a atuação do Estado. 2012. Disponível em: xxxx://xxx.xx.xxx.xx/xx/xxx_xxx_xxx_xxxxxx_xxxx_xxxxxxx_xxxxxx.xxx