Contrato de Corretagem
Contrato de Corretagem
Xxxxxx Xxxxxxxx
Professor Adjunto de Direito Civil na PUCRS Doutor em Direito Civil pela UFRGS
1. Conceito e função.
Segundo a dicção do art. 722, “pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”. Já se observa a nota característica da corretagem: a tentativa de aproximação de
potenciais contratantes.1
O corretor é um intermediário com a missão de encontrar pessoas
dispostas a contratar, nos termos desejados por seu cliente.
Nesse sentido, aponta Xxxxxxx Xxxxx que a atividade do corretor consiste “em aproximar pessoas que desejam contratar, pondo-as em contato. Cumpre sua função aconselhando a conclusão do contrato, informando as condições do negócio e procurando conciliar os interesses de pessoas que aproxima. A relação jurídica entre as partes e o corretor não surge exclusivamente do negocio contratual de mediação, pois direitos e obrigações nascem também do simples fato de que o intermediário haja concorrido de modo eficaz para a aproximação das partes na conclusão do negócio”.2
Como se observa, o corretor procura aproximar pessoas com interesses complementares. Em algumas oportunidades, os sujeitos que foram apresentados pelo corretor conseguirão celebrar um negócio jurídico, encontrando condições satisfatórias para ambos. Em outras tantas, não. É por isso que Araken de Xxxxx destaca que, neste tipo contratual, “alguém se obriga a contratar possíveis interessados em contratar com outra pessoa, em geral
1 No conceito proposto por Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx, observa-se a importância da intermediação: “o contrato de corretagem é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante remuneração, a agenciar negócios, para outra, ou fornecer-lhe informações para celebração de contrato. É intermediação que o corretor realiza, pondo o outro contratante em contato com pessoas, conhecidas ou desconhecidas, para a celebração de algum contrato, ou obtendo informes, ou conseguindo o que aquele necessita”. Instituições de direito civil, v. 3, p. 244. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
2 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 380.
compra e venda. Transforma-se a atividade do corretor numa interferência feliz,
concluindo-se o negócio almejado”.3
É justamente com a formação deste segundo negócio
jurídico – entre terceiros – que surgirá ao corretor o direito a obter remuneração, como será observado adiante.
2. Natureza jurídica da corretagem
Tendo em vista que o consenso é suficiente para a sua formação, a corretagem é
um contrato meramente consensual.4
Não se exige qualquer prestação ou a entrega de
determinado bem para que ele tenha valor jurídico. Pode ser formado por variados meios, desde que presente o consenso das partes.
A sua qualificação como bilateral é discutida em sede doutrinária. Xxxxxxx Xxxxx reputa que “o contrato de corretagem é simplesmente unilateral porque não se obriga a cuidar do negócio e levá-lo a bom termo. Se ficasse a cargo de corretor, o contrato não seria de simples mediação. Admite-se, não obstante, que não se desfigura se houver estipulação condicionando o pagamento da retribuição à circunstância de se concluir o negócio. Obriga o corretor a praticar atos de execução de que se tenha incumbido. Nessa hipótese, o contrato é
bilateral.”5 De seu turno, Xxxx Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx reputa bilateral o contrato, “porque gera
obrigações para os ambos contratantes”.6 Entendemos que esta segunda corrente, do mestre fluminense, é mais coerente com o contrato, pois, na verdade, é a remuneração do corretor que depende do negócio fechado. De resto, os deveres assumidos pelas partes brotam desde a contratação e, como será abaixo analisado, eles estão distribuídos de forma semelhante.
Outrossim, o contrato de corretagem é oneroso. Na linha do art. 724, “a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais”. Portanto, quando as partes
3 ASSIS, Araken de. Contratos Nominados: mandato, comissão, agência e distribuição, corretagem, transporte, p.
247. São Paulo: XX, 0000.
4 Refere Araken de Assis, a este respeito, que “além de típico, ou nominado, o contrato de corretagem é consensual. Ele se completa com a simples anuência de que o corretor atue para obter o negócio, acolhendo instruções do incumbente quanto ao negócio visado". Contratos Nominados: mandato, comissão, agência e distribuição, corretagem, transporte, p. 248. São Paulo: XX, 0000.
5 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos, p. 381. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
6 Instituições de Direito Civil. v. III, p. 245. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
silenciam a respeito da comissão, é cabível a “ação de arbitramento de honorários”, os quais serão fixados consoante os parâmetros da natureza do negócio, dos usos locais, do tempo dispendido para a aproximação das partes, a qualidade do assessoramento, dentre outros critérios.
Por fim, destaca-se que o contrato não é solene, muito embora seja de todo aconselhável a sua celebração por escrito, para estampar o que foi acordado e dirimir futuras dúvidas. Desta forma, poderá ser provado por distintos meios, como a troca de e-mails ou fax, ligações telefônicas, bem como com o aproveitamento da prova testemunhal, desde que
idônea, logicamente.7
3. Abordagem dos principais deveres do corretor.
Se fossemos resumir os principais deveres do corretor, utilizaríamos a seguinte frase: o corretor deve ser fiel ao seu cliente, zelando pelos seus interesses e pela sua proteção.8 Quem contrata um corretor espera que o profissional seja pró-ativo, que vasculhe o mercado em busca de oportunidades. Imagina que contará com a assessoria competente, por parte de um corretor que detém conhecimento específico. Nesse sentido, surge o dever do corretor de colocar o cliente à par das condições do mercado, da realidade subjacente ao negócio pretendido, com o objetivo de esclarecer o cliente quanto às reais chances de consecução do
7 Desta forma, a ausência de contratação escrita de forma alguma inibe o recebimento da comissão, desde que comprovado por outros meios a efetiva contratação. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. INTERMEDIAÇÃO DE COMPRA E VENDA MERCANTIL INTERNACIONAL. AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO. PROVA SUFICIENTE DA INTERMEDIAÇÃO E DA REALIZAÇÃO DOS NEGÓCIOS. 1. A atividade econômica da autora caracterizou-se como de intermediação de negócios mercantis, realizada através do contrato de corretagem, atualmente disciplinado pelo art. 722 e seguintes do CC, e não o contrato de comissão, ora disciplinado no art. 693 e seguintes do CC, nem tampouco o contrato de representação comercial autônoma, regulado pela Lei n. 4.886/65. 2. No contrato de corretagem, "a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais" (art. 724 do C.C.). 3. Restando evidenciado pela prova produzida que os usos correntes no Brasil, no negócio celebrado entre as partes - exportação de couros wet blue - que a comissão do intermediador é paga pelos exportadores, e não pela importadora, é devida a comissão pela requerida. 4. Os documentos constantes nos autos são suficientes para confortar a versão esposada na inicial, no sentido de que a ré se obrigou a pagar à autora comissão de 3% sobre os negócios intermediados pela autora, relativamente a remessa de couros para a empresa italiana DIVANIA. 5. Concretizadas as vendas, e inadimplido o pagamento da comissão, impõe-se o acolhimento da pretensão. Apelo Provido”. (TJRS, AC 70036347318, 19. C.C., Des. Rel. Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxx, x. 06.12.2011)
8 Art. 723: “O corretor é obrigado a executar a mediação com diligência e prudência, e a prestar ao cliente, espontaneamente, todas as informações sobre o andamento do negócio. Parágrafo único. Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência”.
fim colimado. Percebendo que o preço fixado pelo cliente é muito distante do valor de mercado do bem, o cliente poderá eventualmente adequá-lo ou aguardar um período para realizar o negócio. Estes ajustes são essenciais para ampliar a chance de sucesso da contratação.
O art. 38, do Decreto n. 81.871/78, arrola infrações disciplinares do Corretor de Imóveis, as quais são caracterizadas justamente em face da não observância de seus deveres profissionais. São consideradas infrações: (I) transgredir normas de ética profissional; (II) prejudicar, por dolo ou culpa, os interesses que lhe forem confiados; (III) exercer a profissão quando impedido de fazê-lo ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos ou impedidos; (IV) anunciar publicamente proposta de transação a que não esteja autorizado através de documento escrito; (V) fazer anúncio ou impresso relativo a atividade profissional sem mencionar o número de inscrição; (VI) anunciar imóvel loteado ou em condomínio sem mencionar o número do registro do loteamento ou da incorporação no Registro de Imóveis;
(VII) violar o sigilo profissional; (VIII) negar aos interessados prestação de contas ou recibo de quantia ou documento que lhe tenham sido entregues a qualquer título; (IX) violar obrigação legal concernente ao exercício da profissão; (X) praticar, no exercício da atividade profissional, ato que a lei defina como crime de contravenção; (XI) deixar de pagar contribuição ao Conselho Regional; (XII) promover ou facilitar a terceiros transações ilícitas ou que por qualquer forma prejudiquem interesses de terceiros; (XIII) recusar a apresentação de Carteira de Identidade Profissional, quando couber.
De outra banda, o corretor não tem o dever de elaborar contratos ou analisar as suas cláusulas. Este é uma atividade que compete a parte, que tem a prerrogativa de ser
orientada por advogado, caso assim deseje. 9
Como se observa, espera-se diligência do corretor, com atenção aos usos e costumes do mercado, bem como às normas legais. Ao exercer a sua atividade com seriedade, ampliará a chance de satisfação do cliente (com a viabilização do negócio pretendido) e fará jus à remuneração acordada, a qual será análisada no tópico seguinte.
9 Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: "para que seja devida a comissão, basta a aproximação das partes e a conclusão bem sucedida de negócio jurídico. A participação efetiva do corretor na negociação do contrato é circunstância que não desempenha, via de regra, papel essencial no adimplemento de sua prestação. Portanto, esse auxílio, posterior à aproximação e até a celebração do contrato, não pode ser colocado como condição para o pagamento da comissão devida pelas comitentes" (REsp 1.072.397/RS, 3. T., Rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx. DJE: 9/10/2009).
4. A remuneração do corretor.
Conforme o art. 725, “a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes”. Interpretando o dispositivo, a doutrina sugere existir uma “obrigação de resultado”, porquanto a remuneração do corretor é vinculada ao sucesso de sua atividade.10
À luz deste dispositivo, fica estampado que o corretor apenas terá direito à remuneração quando propiciar, efetivamente, a celebração do contrato desejado pelo cliente. Desta forma, nada será devido, caso o corretor, em que pese dedicar dezenas de horas de trabalho, não encontrar um interessado que aceite as condições desejadas por seu cliente. Como nenhum contrato será formalizado, nenhum valor poderá cobrar, a despeito de sua dedicação. Contudo, caso por uma coincidência do destino, o corretor na primeira hora de trabalho tenha a sorte de conhecer um sujeito que se interesse pelo negócio e forme com o seu cliente o negócio idealizado, terá pleno direito à remuneração pactuada. Nessa segunda hipótese, por aquelas poucas horas de serviço, receberá uma quantia significativa, que servirá para compensar o esforço em vão naquelas outras contratações.
Este arcabouço geral do direito à remuneração resolve a maioria dos casos. Contudo, há situações problemáticas, as quais geram conflito entre os contratantes. Um caso típico ocorre quando, após a celebração do contrato, observa-se o inadimplemento do terceiro. Figure-se o exemplo da compra e venda. Caso o corretor apresente ao seu cliente uma pessoa disposta a pagar o preço pretendido pelo apartamento e o contrato seja assinado, inclusive com o pagamento da comissão da corretagem, deverá o corretor restituir o valor, caso, no futuro, o comprador se mostre inadimplente em relação a integralização do preço? De um lado, argumentará o corretor que o seu trabalho foi bem executado, afinal o negócio foi viabilizado pela sua atuação, razão pela qual será justo receber a remuneração. De outro, o vendedor se mostrará insatisfeito, afinal, além de privado da posse do bem, necessitará
10 Ensina Washington de Xxxxxx Xxxxxxxx: “cuida o contrato de corretagem de obrigação de resultado, uma vez que o corretor obriga-se perante o comitente a obter para este ou mais negócios, conforme as instruções recebidas. A remuneração ao corretor só será devida uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação.” Curso de civil: direito das obrigações, v. 5, 2ª parte, p. 316. São Paulo: Saraiva, 2003.
ingressar em juízo para postular a resolução do contrato por inadimplemento do comprador, tendo ao fim o dever de restituir ao menos parcela do que recebeu por ocasião da contratação? Consideramos correta a posição do professor Xxxxxxx Xxxx, quando destaca que a remuneração do corretor independe do adimplemento das partes quanto ao contrato que as vincula. Ensina o mestre que: “a corretagem é devida, independentemente do cumprimento das obrigações entre comprador e devedor. Anteriormente ao advento do nosso Código Civil, por exemplo, a jurisprudência já decidira que descabe sujeitar o pagamento da corretagem à assinatura da escritura definitiva se as partes já chegarem a um acordo quanto aos pontos
essenciais da alienação.”11 Com efeito, tratam-se de relações distintas e como tal devem ser
tratadas. O contrato de corretagem vincula o cliente e o corretor. Já o de compra e venda, o cliente do corretor e um terceiro. Em cada negócio, há individualidade, de sorte que as partes, os deveres e o objeto são distintos.
O contrato de corretagem não é acessório do principal. Bem assinala Araken de Assis: “é frequente reputar-se o contrato de mediação, ou de corretagem, acessório do contrato principal. No entanto, o contrato de corretagem pode existir, valer e mostrar-se eficaz, inclusive quanto à remuneração, independentemente do desfazimento do contrato obtido pela atividade intermediadora, conforme resulta da parte final do art. 725. Ora, o autêntico contrato ‘acessório’, ou dependente, acompanha a sorte do ‘principal’. Por isso, a afirmativa de que o contrato é acessório contradiz a ‘noção mesma de acessoriedade dos contratos’, ou, como prefere Xxxxxxx Xxxxxxxx, afigura-se ‘tecnicamente injustificada’, uma
ilusão provocada pela intima relação econômica entre a corretagem e o contrato obtido”.12
Esta posição foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, em acórdão que foi alvo de notícia publicada no Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.13
11 Direito Civil: contratos em espécie, v. 3, p. 250. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
12 Contratos nominados, v. 2, p. 248. São Paulo: XX, 0000.
13 Notícia publicada no Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO CIVIL. DIREITO AO RECEBIMENTO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM. Ainda que o negócio jurídico de compra e venda de imóvel não se concretize em razão do inadimplemento do comprador, é devida comissão de corretagem no caso em que o corretor tenha intermediado o referido negócio jurídico, as partes interessadas tenham firmado contrato de promessa de compra e venda e o promitente comprador tenha pagado o sinal. Conforme o art. 725 do CC/2002, “a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude do arrependimento das partes”. A realização de um negócio jurídico de compra e venda de imóvel é um ato complexo, que se desmembra em diversas fases — incluindo, por exemplo, as fases de simples negociação, de celebração de contrato de promessa de compra e venda ou de pagamento de arras — até alcançar sua conclusão com a transmissão do imóvel, quando do registro civil do título imobiliário no respectivo Cartório de Registro, nos termos do art. 1.227 do CC/2002. Nesse contexto, somente com a análise, no caso concreto, de cada uma dessas fases, é possível aferir se a atuação do corretor foi capaz de produzir um resultado útil para a percepção da
O acórdão da Terceira Turma assentou que “para o efeito de tornar devida a remuneração a que faz jus o corretor, a mediação deve corresponder somente aos limites conclusivos do negócio jurídico, mediante acordo de vontade entre as partes, independentemente da execução do próprio negócio. A inadimplência das partes, após a conclusão deste, mesmo que acarrete a rescisão contratual, não repercute na pessoa do corretor”.
Nessa linha, como bem salienta Xxxxxx Xxxxxxx, pouco importa se o “contrato principal” for desfeito no futuro, pois “o que se remunera é a utilidade da atuação do corretor ao aproximar as partes e o respeito aos deveres que lhe são inerentes. Nessa utilidade é que
está a finalidade do negócio jurídico em questão.”14
Outra questão polêmica reside na celebração de contrato de compra e venda e posterior recusa por parte de Instituição Financeira de fornecer os valores para a satisfação do crédito. Novamente, aqui, consideramos que, salvo disposição contratual em sentido contrário, terá o corretor direito a perceber a sua remuneração, uma vez que propiciou a contratação. Se é ou não viável a consecução de um financiamento imobiliário, este risco não é do corretor, mas das partes.15
Distinta seria a hipótese se o contrato de compra e venda não tivesse sido celebrado. Apreciando um caso concreto, no qual ficou evidenciada a falta de regularidade dos documentos necessários à transmissão de propriedade, bem como a existência de intransponíveis óbices ambientais, malgrado a aproximação dos negociantes tenha sido propiciada pelo corretor, nenhuma remuneração lhe foi deferida.16
remuneração de que trata o art. 725 do CC/2002. Assim, para o efeito de tornar devida a remuneração a que faz jus o corretor, a mediação deve corresponder somente aos limites conclusivos do negócio jurídico, mediante acordo de vontade entre as partes, independentemente da execução do próprio negócio. A inadimplência das partes, após a conclusão deste, mesmo que acarrete a rescisão contratual, não repercute na pessoa do corretor”. REsp 1.339.642-RJ, Rel. Min. Xxxxx Xxxxxxxx, julgado em 12/3/2013.
14 Direito Civil: Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie, p. 535. 8. ed. São Paulo: Método, 2013.
15 Sobre o tema, assim decidiu o TJRS: “AÇÃO ORDINÁRIA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DANOS MORAIS. Danos morais inexistentes em razão do risco do negócio. A não realização do negócio decorreu de ausência de financiamento por parte da autora junto à CEF, não havendo provas da responsabilidade da demandada no evento. Os valores pagos pela autora, a título de comissão de corretagem, pagos ao profissional que intermediou o negócio, não são passíveis de devolução. Sentença mantida. Apelo Desprovido. Unânime”. (TJRS, AC 70053806311, 20. C.C., Rel. Des. Xxxxx Xxxxxx, x. 24/04/2013)
16 Íntegra da ementa: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO DE EXECUÇÃO. COBRANÇA DE COMISSÃO DE CORRETAGEM. Restando incontroverso que, não obstante o autor tenha aproximado as partes, o negócio fora realizado sem a presença do corretor e não se perfectibilizou em virtude da falta de regularização dos documentos e liberação ambiental. Assim, considerando que não houve resultado útil para ambos os contraentes, a comissão de corretagem não é devida. Precedentes jurisprudenciais. Apelação provida”. (TJRS, AC 70039386156, 16. C.C., Rel. Des. Xxx Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx, j. 18/04/2013)
5. A responsabilidade pelo adimplemento da comissão
Não há dúvidas quanto à natureza onerosa da corretagem. Contudo, a lei silencia a respeito da responsabilidade pelo adimplemento da comissão. Muitas pessoas, quiçá pelo costume social, imaginam que este custo deve recair sobre o vendedor. Trata-se, porém, de apenas uma impressão que não é esposada pela lei civil. Há silêncio, no Código Civil, quanto ao tema.
Com base nessa realidade, alguns autores sugerem que o ônus seja suportado pelo vendedor. Por ilustração, o magistério de Xxxxxxx Xxxxxxxx: “o costume predominante é no sentido de que, salvo disposição em contrário, a comissão corre por conta do comitente. De sorte que a venda procedida por um corretor a um comprador que não o procurou determina a obrigação de unicamente o vendedor pagar a remuneração. Não se parece razoável, nem fundado em direito, impor-se, ao comprador de um imóvel, o ônus de pagar a comissão a corretor com quem nada contratou e que somente prestou os serviços que lhe foram
solicitados pelo vendedor.” 17
O autor gaúcho, na passagem acima, parte do pressuposto de que quem contratou o corretor foi o vendedor, logo não seria lícito imputar ao comprador que desconhecia o corretor e que não o procurou a obrigação de pagar a comissão. Desta forma, alcança-se a conclusão de que, em verdade, quem deve arcar com esta remuneração é o interessado, que procura o corretor e o contrata. Pode ter sido o vendedor ou o comprador. A posição da parte no contrato é irrelevante. O que vale é a contratação da corretagem e não a da compra e venda ou outro negócio almejado.
Quanto ao ponto, muito pertinente a lição do professor Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx: “por vezes, é o interessado na compra a procurar um corretor, obrigando-se, perante ele, a responder pela comissão devida, se conseguir encontrar um imóvel conforme o
solicitado ou se obtiver o acordo do proprietário para a venda de determinado imóvel”.18
Prossegue o eminente jurista, salientando que: “poderão ser responsáveis, ainda, ambos os contratantes, desde que haja expressa convenção neste sentido, o mesmo ocorrendo quanto a
17 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contratos, p. 786. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
18 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Contrato de Corretagem Imobiliária, p. 162. 3. ed. São Paulo: Atlas.
responder terceiro pela paga da corretagem, devendo ele assentir no acordo para tanto estabelecido”.19
Com efeito, absolutamente nada impede que as pessoas acordem a divisão dos custos da corretagem, quer em partes iguais ou distintas. É plenamente lícito que o vendedor arque com 30% ou 50% da comissão e comprador com 70%, ou 50% ou 100%, desde que haja acerto entre os interessados. Se não houver esta divisão, vale a regra geral: a comissão é paga por quem contratou e foi brindado com o assessoramento do corretor.
É lapidar a conclusão de Araken de Assis: “respeitada a natureza do contrato de corretagem, que pressupõe a obrigação de o corretor obter para o incumbente determinado negócio (art. 722), desaparece toda dúvida acerca do devedor da comissão: trata-se da pessoa que contratou o corretor. Ao propósito, assentou a 1ª Turma do STF: “A comissão constitui obrigação a cargo de quem incumbe a realização da corretagem. Via de regra, a comissão do corretor é devida pelo vendedor”. No mesmo sentido, a 4ª Turma do STJ proclamou o seguinte: “Em princípio, quem responde pelo pagamento da comissão é aquele que contratou
o corretor, ou seja, o comitente”.20
No mesmo sentido, é a posição de Xxxxxxx Xxxx: “cliente é aquele que contrata o corretor para realizar o negócio. Esse contratante, caso seja efetivado o negócio pretendido, deve remunerar o corretor. A outra parte, que é aproximada, não se configura como cliente no contrato de corretagem e, por consequência, não tem a obrigação de pagar a comissão, que certos corretores exigem, recebendo duplamente.”21 Outro não é o alvitre de Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx Xxxxxx: “o intermediário tem direito a receber uma comissão por sua atuação e é esta a principal obrigação de quem contratou seus serviços (art. 724 do CC/2002).” 22
Desta forma, quem deve arcar com a remuneração do corretor é a pessoa que o contrata, como regra. Caso haja cláusula contratual (ou estampado por outro meio inequívoco)
o acerto para uma fórmula diversa, então pela autonomia privada esta nova composição é que deve ser prestigiada.
6. Análise da cláusula de exclusividade (art. 726)
19 Op. cit. p. 162.
20 Contratos Nominados, p. 266. São Paulo: XX, 0000
21 Direito Civil, v. 3, Contratos em Espécie, pp. 247/248. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
22 Contratos Direito civil e empresarial, p. 295. 4ª ed. São Paulo: XX, 0000.
Como regra, o corretor não possui exclusividade para a realização daquele negócio indicado pelo cliente. Com efeito, registra a prática o costume das pessoas contratarem diversos corretores, imaginando que assim encontrarão um número maior de interessados, o que potencializará a chance de efetiva contratação. Nesses casos, aquele corretor que, por competência ou sorte, encontrar o terceiro que realize negócio com o seu cliente, receberá a remuneração convencionada.
Todavia, nada proíbe a estipulação de exclusividade em favor de um corretor ou de uma empresa de corretagem. Embora não usual, esta exclusividade pode ser importante para viabilizar os investimentos necessários para a divulgação do produto. Com a certeza do recebimento da comissão, o corretor encontra maior tranquilidade para trabalhar, envidando o máximo esforço para atender o seu cliente.
Quando, portanto, é estabelecida a exclusividade em favor do corretor, quer por cláusula contratual expressa, quer por outro meio absolutamente idôneo de prova documental (como a troca de mails, cartas, etc.), prevê a lei que o corretor tenha direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua mediação.
A norma é justificada por duas especiais razões. Inicialmente, a exclusividade transmite a ideia de que o cliente deveria encaminhar ao corretor os eventuais interessados, abstendo-se de fechar negócios isoladamente ou com o auxílio de outros corretores. Ademais, a exclusividade gera a expectativa de que o corretor irá dedicar a maior parte do seu tempo atendendo este determinado contrato, que lhe brindou com o monopólio da negociação com terceiros. Daí o seu direito a ser remunerado, ainda que o negócio seja formalizado sem a sua efetiva contribuição.
Todavia, a lei contempla exceção. Trata-se da difícil prova, cujo ônus incumbe ao cliente, de demonstrar a ausência de zelo por parte do corretor na condução de seu trabalho. Provada a sua inércia ou ociosidade, desaparecer o direito à remuneração pelos negócios que foram realizados independentemente de sua contribuição.
7. Uma questão polêmica: a necessidade de inscrição no CRECI
Há divergência acerca da necessidade de inscrição do corretor, em órgão de classe, para justificar o recebimento da comissão.
De um lado, surgem precedentes que consideram típica, sob a ótica penal, a atividade de corretagem sem o competente registro no Conselho. Assentou o Superior Tribunal de Justiça, em precedente da Terceira Seção Turma que “a conduta do agente que exerce atividades de corretagem de imóveis após o cancelamento de sua inscrição no CRECI, por inadimplência das anuidades devidas, se amolda à contravenção penal prevista no art. 47 do Decreto-lei 3.688/1941, haja vista que permaneceu clandestinamente na profissão regulamentada, exercendo-a sem o preenchimento de condição legal a que está subordinado o seu exercício, qual seja, inscrição perante o órgão de fiscalização profissional”.23
Com efeito, muitos julgados destacam o trabalho em concreto realizado pelo
“corretor”, valorizando o papel da intermediação na consecução do negócio.24
Em sede
doutrinária, é a posição de Araken de Assis: “É importante assinalar, relativamente aos
23 Íntegra da ementa: “CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL. CORRETOR DE IMÓVEIS. EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES APÓS CANCELAMENTO DE SUA INSCRIÇÃO NO CRECI, POR INADIMPLÊNCIA DAS ANUIDADES. CONTRAVENÇÃO PENAL CONFIGURADA (ART. 47 DO DECRETO-LEI 3.688/1941. EXERCÍCIO ILEGAL DA PROFISSÃO OU ATIVIDADE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. A conduta do agente que exerce atividades de corretagem de imóveis após o cancelamento de sua inscrição no CRECI, por inadimplência das anuidades devidas, se amolda à contravenção penal prevista no art. 47 do Decreto-lei 3.688/1941, haja vista que permaneceu clandestinamente na profissão regulamentada, exercendo-a sem o preenchimento de condição legal a que está subordinado o seu exercício, qual seja, inscrição perante o órgão de fiscalização profissional.2. Não há que se falar, no caso dos autos, de violação à decisão administrativa proibitiva do exercício de atividade e, consequentemente, no crime previsto no art. 205 do CP, haja vista o disposto nos arts. 3º, 4º e 5º, da Resolução nº 761/2002, do Conselho Federal de Corretores de Imóveis - COFECI, no sentido de que o pagamento do débito acarreta a restauração automática da inscrição no CRECI, e que "o cancelamento de inscrição por falta de pagamento [...] não representa punição disciplinar mas, sim, mero ato administrativo de saneamento cadastral".3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 1ª Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Poços de Caldas - MG, o suscitado”. (CC 104.924/MG, 3. S., Rel. Min. Xxxxx Xxxxx, x. 24/03/2010. DJe 19/04/2010).
24 Por ilustração: “CORRETAGEM. INTERMEDIAÇÃO DE VENDA DE IMÓVEL RURAL. COMPROVADA. INSCRIÇÃO NO CRECI. DESNECESSIDADE. COMISSÃO DEVIDA. É desnecessário o registro no Conselho Regional de Corretores de Imóvel CRECI para legitimar a cobrança da comissão devida em razão de contrato de corretagem. Comprovada a intermediação pelo autor no atinente à venda do imóvel, faz jus à remuneração devida pelo trabalho desenvolvido. Contudo, pelo que se depreende dos autos, já foi alcançada ao corretor a remuneração pactuada, de modo que improcede o pleito deduzido na vestibular. Desproveram o apelo”. (TJRS, 16. C.C., AC 70030192876, Rel. Des. Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, x. 04/06/2009). No mesmo sentido: “AÇÃO DE COBRANÇA e RECONVENÇÃO. COMISSÃO DE CORRETAGEM. INTERMEDIAÇÃO DE VENDA. Desnecessária prova da inscrição no CRECI para cobrança de comissão de corretagem, mostrando-se devida a comissão do corretor de imóveis pelo ato da intermediação da venda, conforme precedentes jurisprudenciais, inclusive do STJ. Valor da comissão: deve ser calculado com base no valor da venda atualizada. Correção monetária não é um plus que se agrega, mas um minus que se evita. RECONVENÇÃO. Prova do pagamento deve ser feito pelo reconvinte, pois trata-se de fato constitutivo do seu direito. Art. 333, I, do CPC. Negaram provimento. Unânime”. TJRS, 16. C.C., AC 70019589324, Rel. Des. Xxxxx Xxxxx Xxxxxx, x. 08.08.2007.
corretores livres, que o direito à redistribuição pecuniária não se vincula ao registro no órgão de classe competente. Por exemplo, a 1ª Turma do STF assentou que, pronunciada a inconstitucionalidade do art. 7º da Lei 4.116/62 – diploma anterior à vigente Lei 6.530/78 -, tornou-se ilegítima a exigência de registro profissional para cobrar a comissão. Do mesmo
entendimento, já sob a vigência da lei nova, assim decidiu a 4ª Turma do STJ.”25
Com razão, há precedentes das Turmas que compõem a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, valorizando a liberdade de exercício do trabalho e coibindo o enriquecimento injustificado das pessoas que se valem da atividade de mediação e, após, recusam-se a adimplir o pactuado, sob fundamento da inexistência de inscrição no CRECI.26
Na nossa visão, uma alternativa razoável, para evitar o enriquecimento sem causa da pessoa beneficiada pela atuação do corretor e para estimular o cumprimento da lei acerca do registro profissional, seria a redução equitativa da comissão.27
25 Contratos nominados, v. 2, p. 265. São Paulo: XX, 0000.
26 Por ilustração: “PROCESSO CIVIL. COBRANÇA DA COMISSÃO DE CORRETAGEM. PRESCINDÍVEL A INSCRIÇÃO NO CRECI. INEXISTÊNCIA DE INFRINGÊNCIA AO ART. 401, CPC, UMA UMA VEZ QUE O OBJETIVO PRINCIPAL DA DEMANDA NÃO É PROVAR A EXISTÊNCIA DO CONTRATO EM SI, MAS A DEMONSTRAÇÃO DOS EFEITOS DECORRENTES DO PACTO.1. É possível a cobrança de valores decorrentes de intermediação exitosa para a venda de imóvel, sendo prescindível a inscrição do autor no CRECI, pois é livre o exercício do trabalho e vedado o enriquecimento ilícito do vendedor. 2 Em verdade, não é permitido provar-se exclusivamente por depoimentos testemunhais a existência do contrato em si, mas a demonstração dos efeitos dos fatos que envolveram as partes, assim como da prestação de serviços, afigura-se perfeitamente admissível, conforme precedentes da Corte. 3. A mera transcrição de parte do voto paradigma, sem, contudo, providenciar-se a demonstração analítica, apontando os pontos divergentes entre os julgados, não induz ao conhecimento do dissídio. 4. De outro lado, " não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida". Súmula 83/STJ. Recurso não conhecido”. (REsp 185.823/MG, 4. T., Rel. Min. Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, x. 14/10/2008. DJe 03/11/2008)
27 Já decidiu o STJ que os profissionais regularmente inscritos não podem ser tratados da mesma maneira que aqueles que atuam à margem, sendo razoável a redução da comissão destes últimos: “CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. CORRETAGEM. ALEGAÇÃO DE INTERESSE DO INTERMEDIADOR NO NEGÓCIO. FATO NÃO COMPROVADO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ. INCIDÊNCIA. PERCENTUAL. CRITÉRIO. VOLUME DO NEGÓCIO. AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO. CORRETOR NÃO INSCRITO EM ÓRGÃO DE CLASSE. REDUÇÃO. I. Não se configura nulidade no acórdão se o mesmo enfrentou suficientemente os temas essenciais ao deslinde da controvérsia, apenas que com conclusão desfavorável à parte. II. Impossibilidade de ser reexaminada a interpretação da matéria fática, em que o Tribunal estadual, soberano no seu exame, entendeu que houve o trabalho de intermediação, não demonstrado, na espécie, o interesse direto do corretor na realização do negócio, o que desfiguraria, em tese, a natureza da corretagem. Incidência da Súmula n. 7 do STJ. III. Percentual da comissão, contudo, extremamente elevado, dado o porte do negócio, a inexistência de contrato escrito e a circunstância de não se ter como razoável que a prática profissional sem a inscrição no Conselho de classe, submissão a fiscalização, pagamento de impostos e anuidade respectivas, possa gerar direitos iguais aos daqueles que exercem a atividade regularmente. Redução. IV. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido”. REsp 331.638/SP, 4. T., Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 07.10.2003. DJ: 24.11.2003, p. 309.