SUMÁRIO
1. A cessão da posição contratual é um instituto típico do Direito Civil, sendo o contrato através do qual o outorgante de um outro contrato transmite a um terceiro, com o consentimento do outro outorgante, o complexo de direitos e obrigações que para si derivam de tal contrato.
2. Tal figura envolve três sujeitos (o cedente, o cedido e o cessionário) e pressupõe a existência de dois contratos: o contrato-base (aquele inicialmente celebrado, onde se consagrou o conjunto de direitos e deveres que serão objeto da cessão) e o contrato- instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual).
3. No âmbito do Direito da Contratação Pública, as especiais exigências impostas pelos princípios da transparência, da concorrência e da igualdade levaram à adaptação daquele instituto do Direito Civil: apesar de no art.º 316.º do Código dos Contratos Públicos (CCP) se prever uma norma geral de admissibilidade de cessão da posição contratual, nos artigos seguintes o legislador estabeleceu um conjunto de requisitos que visam impedir que através da sua utilização sejam violados aqueles princípios estruturantes.
4. Assim, se quanto à cessão promovida pelo contraente público se consagra uma quase total liberdade – podendo o cocontratante apenas recusá-la quando tenha fundado receio de que a mesma envolve um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do contrato pelo potencial cessionário ou a diminuição das suas garantias (art.º 324.º, do CCP) – já no que toca à cessão da posição contratual do cocontratante os limites legais são muito mais apertados, pois de outro modo ficaria aberta uma via para contornar as exigências procedimentais que precedem a celebração dos contratos públicos.
5. Na reforma do CCP introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31-08, o legislador consagrou no art.º 318.º-A uma nova figura que assume características distintas – a cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante.
6. Quando a relação contratual esteja em situação que permitisse ao contraente público proceder à sua resolução por incumprimento das obrigações que impendem sobre o cocontratante e caso tenha essa possibilidade sido prevista no próprio contrato, pode o contraente público impor ao cocontratante a cessão, o que faz mediante ato
administrativo, sendo tal cessão eficaz a partir da data por si indicada, nos termos do n.º 4 do art.º 318.º-A, do CCP.
7. A escolha do cessionário também não é livre, estando o contraente público obrigado a interpelar, gradual e sequencialmente, os concorrentes que participaram no procedimento pré-contratual original, de acordo com a respetiva classificação final, a fim de concluir um novo contrato para a adjudicação da conclusão dos trabalhos – art.º 318.º-A, n.º 2.
8. Esta figura tem traços muito distintos da cessão da posição contratual civil e também da geral da contratação pública: quer quanto ao momento em que pode operar (não quando os contraentes livremente decidam, mas só quando estejam reunidos os pressupostos para a resolução do contrato por incumprimento), quer quanto à liberdade contratual das partes (o cedente não pode optar por celebrar ou não a cessão e escolher o cessionário com quem o irá celebrar, limitando-se o cedido a autorizar ou não autorizar a cessão; pelo contrário, o cedido – contraente público – impõe a cessão ao cedente – cocontratante – não sendo este livre de optar pela celebração ou não da cessão, não podendo escolher a quem cederá a posição contratual, nem podendo escolher o como e o quando de tal cessão, que opera por mero efeito do ato administrativo emitido pelo cedido, sendo este quem fixa a data a partir da qual produz efeitos).
9. Não obstante tais diferenças, não deixamos de estar perante uma forma de transmissão das obrigações e não perante um novo contrato – trata-se de uma alternativa à resolução contratual e não de uma consequência desta.
10. Quando o n.º 2 do art.º 318.º-A se refere a “concluir um novo contrato”, reporta-se à necessidade de “adjudicação da conclusão dos trabalhos” (ou seja, à execução da parte ainda não executada pelo primitivo cocontratante), sendo este “novo contrato” o contrato-instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual), típico da cessão da posição contratual.
11. Trata-se, pois, do mesmo contrato, apenas se operando uma alteração dos seus sujeitos, sem que o contrato deixe de produzir efeitos – ao contrário da resolução, cuja consequência é a destruição dos efeitos do contrato e a sua consequente cessação.
12. Também não se confunde esta figura com a resolução sancionatória: nesta há uma nova adjudicação da proposta ordenada em lugar subsequente, ao passo que no caso do art.º 318.º-A isso não acontece, continuando a ser a primeira proposta adjudicada aquela a ser executada pelo novo cocontratante.
13. Para que possa o contraente público lançar mão do disposto no art.º 318.º-A do CCP, não pode o contrato celebrado já estar extinto por resolução.
14. Sendo a declaração de resolução uma declaração unilateral recetícia, com o seu recebimento por parte da inicial cocontratante opera-se a resolução do contrato a partir da data indicada pela entidade adjudicante, cessando nesta todos os efeitos do contrato.
15. Após a data da resolução já não pode a entidade adjudicante impor ao cocontratante inicial a cessão da posição contratual, pois nesse momento já o contrato cessou a sua produção de efeitos, não podendo a posição de qualquer das partes ser cedida a um terceiro.
16. Perante uma situação de incumprimento das obrigações do cocontratante, à entidade adjudicante cabe optar por um de dois caminhos: ou a resolução do contrato ou a cessão da posição contratual. O que não pode é optar por ambas, fazendo operar a resolução e, posteriormente, pretendendo impor a cessão de posição contratual ao cocontratante.
17. Nos termos do art.º 318.º-A, n.º 3 do CCP, a execução do contrato ocorre nas mesmas condições já propostas pelo cedente no procedimento pré-contratual original, havendo apenas da parte do novo cocontratante uma manifestação de vontade de se vincular aos termos da proposta apresentada pelo cocontratante inicial.
18. Não pode o novo contrato ser a formalização dos termos da proposta que o novo cocontratante havia apresentado aquando do procedimento concursal, sob pena de não consubstanciar uma cessão da posição contratual, mas sim uma nova adjudicação.
19. A falta de concurso dirigido à escolha do cocontratante implica a preterição total do procedimento legalmente exigido, que é causa de nulidade, nos termos do disposto no art.º 161.º, n.º 1, alínea l), do Código do Procedimento Administrativo, para que remete o n.º 2, do artigo 284.º do CCP.
DESCRITORES: TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES / CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL / INCUMPRIMENTO DO CONTRATO / RESOLUÇÃO POR INCUMPRIMENTO / CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL POR INCUMPRIMENTO DO COCONTRATANTE / NOVO CONTRATO / CONTRATO-INSTRUMENTO / RESOLUÇÃO SANCIONATÓRIA
ACÓRDÃO Nº
06
2022
1.ª Secção – SS Data: 08/02/2022 Processo: 1912/2021
RELATOR: Conselheiro Xxxxxx Xxxxxxx
Transitado em Julgado
Acordam os Juízes do Tribunal de Contas, em Subsecção da 1.ª Secção:
I. RELATÓRIO
1. O presente processo compreendeu as seguintes etapas fundamentais:
a) A União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão submeteu a fiscalização prévia um contrato de “Aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços ajardinados na União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão – Lote A” celebrado, em 19-08-2021, com a empresa MAGOFLOR – Jardins do Magoito, Lda., pelo valor de 554.741,64€ (quinhentos e cinquenta e quatro mil, setecentos e quarenta e um euros, e sessenta e quatro cêntimos), acrescido de IVA, correspondente a um valor anual de 184.913,88 € (cento e oitenta e quatro mil, novecentos e treze euros, e oitenta e oito cêntimos), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, “pelo prazo de doze meses, renovando-se automaticamente, por iguais períodos, até ao limite máximo de vigência total de 3C (trinta e seis) meses, salvo indicação em contrário, com a antecedência mínima de 3 (três) meses, com início no dia seguinte ao da sua assinatura”.
b) O processo foi objeto de devolução pelo Departamento de Controlo Prévio (DECOP) da Direção-Geral do TdC ao requerente para este prestar informação complementar bem como, querendo, se pronunciar sobre questões suscitadas e exercer o contraditório.
c) Na sequência da devolução, a entidade requerente remeteu dados informativos adicionais e apresentou a sua alegação.
d) Em Sessão Diária de Visto de 08-11-2021 foi decidido devolver o contrato à entidade adjudicante para ulterior pronúncia, tendo esta apresentado documentos e nova alegação.
e) Em Sessão Diária de Visto de 14-01-2022 foi decidido devolver o contrato para ulterior pronúncia à entidade adjudicante, tendo esta apresentado nova alegação, devidamente ponderada no presente Xxxxxxx.
II. FUNDAMENTAÇÃO
I. Factos provados
2. Com relevo para a presente decisão, consideram-se assentes os seguintes factos, evidenciados pelos documentos constantes do processo:
a. Por deliberação do órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão de 09-02-2021, foi aprovada a abertura de um concurso público internacional para a aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços públicos ajardinados na União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão.
b. O preço base global para o procedimento foi fixado em 1.839,699,00€ (um milhão, oitocentos e trinta e nove mil, seiscentos e noventa e nove euros), sendo de:
(i) 1.040.142,46€ (um milhão e quarenta mil, cento e quarenta e dois euros e quarenta e seis cêntimos) para o Lote A;
(ii) 799.556,94€ (setecentos e noventa e nove mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e noventa e quatro cêntimos) para o Lote B.
c. O aviso do concurso foi publicitado no Diário da República, II série, de 18-02-2021, e no Jornal Oficial da União Europeia, de 19-02-2021.
d. A modalidade estabelecida para a avaliação do critério legal de adjudicação foi a de proposta economicamente mais vantajosa, determinada pela modalidade de melhor relação qualidade-preço.
e. No relatório final, datado de 08-06-2021, o júri do concurso, propôs a adjudicação do Lote A ao concorrente "SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A.", pelo valor de 494.480,55 € (quinhentos e noventa e quatro mil setecentos e quarenta e um euros e cinquenta e cinco cêntimos), acrescido de IVA à taxa em vigor, e do Lote B ao concorrente “Magoflor - Jardins do Magoito, Lda.", pelo valor de 426.431,52 € (quatrocentos e vinte e seis mil quatrocentos e trinta e um euros e cinquenta e dois cêntimos), também acrescido de IVA à taxa em vigor.
f. Por deliberação do órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão de 09-06-2021, foi adjudicado o Lote A à empresa SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A., pelo preço contratual máximo de 494.480,55€ (quatrocentos e noventa e quatro mil quatrocentos e oitenta euros e cinquenta e cinco cêntimos) acrescido de IVA à taxa legal em vigor e com um prazo de execução inicial de 12 (doze) meses, renovável por igual período até ao limite global de 3 anos, o que foi formalizado por contrato outorgado entre a entidade adjudicante e tal sociedade em 06-07-2021.
g. Consta do contrato celebrado com a empresa SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A uma cláusula com o seguinte teor:
“CLÁUSULA C.ª
(Cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante)
1. Nos termos do artigo 318º-A do CCP em caso de incumprimento, pelo cocontratante, das suas obrigações, que reúna os pressupostos para a resolução do contrato, o cocontratante ceda a sua posição contratual ao concorrente do procedimento pré- contratual na sequência do qual foi celebrado o contrato em execução, que venha a ser indicado pelo contraente público, pela ordem sequencial daquele procedimento.
2. Para o efeito previsto na parte final do número anterior, o contraente público interpela, gradual e sequencialmente, os concorrentes que participaram no procedimento pré-contratual original, de acordo com a respetiva classificação final, a fim de concluir um novo contrato para a adjudicação da conclusão dos trabalhos.
3. A execução do contrato ocorre nas mesmas condições já propostas pelo cedente no procedimento pré-contratual original.
4. A cessão da posição contratual opera por mero efeito de ato do contraente público, sendo eficaz a partir da data por este indicada.
5. Os direitos e obrigações do cocontratante, desde que constituídos em data anterior à da notificação do ato referido no número anterior, transmitem-se
automaticamente para o cessionário na data de produção de efeitos daquele ato, sem que este a tal se possa opor.
6. As obrigações assumidas pelo cocontratante depois da notificação referida no n.º 4 apenas vinculam a entidade cessionária quando este assim o declare, após a cessão.
7. A caução e as garantias prestadas pelo cocontratante inicial são objeto de redução na proporção do valor das prestações efetivamente executadas e são liberadas seis meses após a data da cessão, ou, no caso de existirem obrigações de garantia, após o final dos respetivos prazos, mediante comunicação dirigida pelo contraente público aos respetivos depositários ou emitentes.”
h. Em 06-08-2021, o Presidente da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão dirigiu à SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A. uma carta com o seguinte teor:
“Assunto: resolução do Contrato Nº 23/PS/21- Aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços ajardinados na União das freguesias de Massamá e Monte Abraão- Lote A
Exmos. Senhores, Considerando:
- o contrato supra identificado, celebrado entre as partes a C de julho de 2021, com início no dia da sua assinatura conforme clausulado do mesmo;
- a verificação, desde essa data até ao presente, de uma execução além de parcial, deficitária e insuficiente dos referidos serviços objeto do contrato constatando-se um incumprimento das densidades necessárias à prestação de serviços (sem permanência do número de colaboradores previstos), a inexistência no terreno dos meios humanos identificados e cuja lista de nomes e anos de experiência foi apresentada em sede de proposta da vossa entidade, a não utilização dos meios materiais e dos equipamentos propostos e integrantes da memória descritiva da proposta e um incumprimento do plano de prestação de serviços previsto e adjudicado;
- as diversas comunicações verbais e escritas remetidas a vossas excelências nomeadamente, além dos emails remetidos ao vosso representante na execução do contrato Arq. Xxxxxxx Xxxxxxxx, os nossos ofícios nº 2950/2021 datado de 19 de julho de 2021 e nº 3205/2021 datado de 3 de agosto de 2021, cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido, e sempre com o intuito de ir interpelando permanentemente vossas excelências ao cumprimento das obrigações contruais, pese embora as nossas tentativas de manter compreensivamente a relação contratual em vigor, a vigência do referido contrato;
Afigura-se ao presente impossível para a nossa entidade adjudicante tendo em conta o incumprimento pela vossa entidade das obrigações decorrentes da mesma.
Por toda a factualidade que é do conhecimento de ambas as partes relativa à execução do contrato em causa e tendo o contraente público, nos termos do artigo 302º do Código dos Contratos Públicos (doravante CCP) os poderes de dirigir o modo de execução das prestações e fiscalizar o modo de execução do contrato bem como o poder de resolver unilateralmente o contrato vimos, deste modo, nos termos legais e contratuais resolver o contrato invocando a resolução sancionatória por incumprimento imputável ao cocontratante tendo em conta que, esgotados todos os prazos dados para cumprimento visando que o cocontratante cumprisse as suas obrigações contratuais nos termos do artigo 325º do CCP, a situação de incumprimento permaneceu, tornando-se num incumprimento definitivo das obrigações decorrentes da relação contratual existente. Assim, nos termos da alínea a) e b) do nº1 do artigo 333º do CCP que refere que o contraente público pode resolver o contrato a título sancionatório em caso de “a) incumprimento definitivo do contrato por facto imputável ao cocontratante” e “b) incumprimento, por parte do cocontratante, de ordens, diretivas ou instruções transmitidas no exercício do poder de direção sobre matéria relativa à execução das prestações contratuais” e das cláusulas 1Cª e 18ª do Caderno de Encargos do procedimento, vem o contraente público através da presente comunicação invocar a resolução sancionatória do contrato nos termos legais face à factualidade verificada desde o início da sua vigência, operando a extinção do contrato nos termos da alínea c) do artigo 330º do CCP por resolução.
Deste modo e nos termos do artigo 309º do CCP os atos administrativos do contraente público relativos à execução do contrato constituem título executivo, pelo que se determina a resolução unilateral do contrato pelos fundamentos factuais e legais invocados, tendo a referida resolução efeitos a partir do dia 9 de agosto de 2021.
Com os melhores cumprimentos,
O Presidente”
i. Por deliberação do órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão de 09-08-2021, foi aprovada por unanimidade a proposta nº 236- A36/2021, com o seguinte teor:
“a) Resolução do contrato por decisão do contraente público, nos termos da alínea e) do artigo 302º do CCP, alínea d) do nº2 do artigo 307º do CCP e da alínea c) do artigo 330º do CCP, a título sancionatório conforme previsto no artigo 333º do CCP pelos fundamentos factuais e legais supra invocados, mormente o disposto nas alíneas a) e
b) do nº1 do referido artigo e as estipulações das Cláusulas 1Cº e 18º do Caderno de Encargos do procedimento;
b) A ratificação da comunicação remetida através de Ofício nº 327C/2021, que se anexa, datado de C de agosto de 2021, notificando o cocontratante dos fundamentos da resolução sancionatória do contrato, tendo sido notificado dos efeitos da referida resolução a partir do dia 9 de agosto de 2021;
c) A aprovação da decisão de aplicação de sanções contratuais ao cocontratante, nos termos do artigo 329º do CCP, tal como previstas na Cláusula 12ª do Caderno de Encargos, em montante a determinar em face da decisão de aprovação de aplicação das mesmas.”
j. Por deliberação do órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão de 11-08-2021, foi aprovada por unanimidade a proposta nº 237-A37/2021, com o seguinte teor:
“a) A aprovação da proposta de aplicação de sanções contratuais ao cocontratante, nos termos do artigo 329º do CCP, tal como previstas na Cláusula 12ª do Caderno de Encargos, no montante global de 23.C52,CC € (vinte e três mil seiscentos e cinquenta e dois euros e sessenta e seis cêntimos), notificando-se o cocontratante da mesma.
b) A aprovação da dedução de parte do valor das sanções contratuais apuradas nos pagamentos pendentes ao cocontratante;
c) A aprovação da execução da garantia prestada pelo cocontratante através de caução, para dedução do valor parcial das sanções contratuais apuradas;
d) A notificação ao cocontratante do valor das sanções contratuais aplicadas.”
k. As deliberações aprovadas em 09-08-2021 e 11-08-2021 foram notificadas à SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A. através de email datado de 12- 08-2021.
l. Por deliberação do órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão de 12-08-2021, foi aprovada por unanimidade a proposta nº 240- A38/2021, com o seguinte teor:
“1) A decisão de operar a cessão da posição contratual do concorrente do procedimento pré-contratual, nos termos da alínea f) do artigo 302º do CCP e da alínea e) do artigo 307º do CCP, para os efeitos do artigo 318º-A;
2) A aprovação da proposta de adjudicação por cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante, para a aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços ajardinados na União das Freguesias de Massamá e Monte Abraão- Lote A à empresa “MAGOFLOR - JARDINS DO MAGOITO LDA.”, com o NIF 503 8C8 531, pelo preço contratual máximo de 554.741,C4 € (quinhentos e
cinquenta e quatro mil, setecentos e quarenta e um euros e sessenta e quatro cêntimos) acrescido de IVA à taxa legal em vigor e com um prazo de execução inicial de 12 (doze) meses, renovável por igual período até ao limite global de 3 anos, conforme compromisso e assunção de compromissos plurianuais que se anexa nº 9187, 02020308
- Manutenção dos Espaços verdes e fonte de financiamento Transferências no âmbito das Adm. Públicas;
3) Autorização para proceder à notificação da decisão de adjudicação por cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante via email à entidade cessionária, nos termos do nº2 do artigo 318º-A do CCP;
4) Autorização para notificar via email a entidade cessionária para apresentar os documentos de habilitação exigidos no Programa e nos termos do artigo 81º do CCP, ao abrigo da aliena a) do nº 2 do artigo 77º do CCP e prestar a respetiva caução conforme exigido no Programa e nos termos do artigo 88º e 89º do CCP, ao abrigo da aliena b) do nº 2 do artigo 77º do CCP, no montante de 18.491,39 € (dezoito mil quatrocentos e noventa e um euros e trinta e nove cêntimos) correspondente a uma caução no valor de 10% do preço contratual referente ao prazo de vigência inicial do contrato, tendo em conta o preço total resultante da proposta adjudicada ser considerado anormalmente baixo, nos termos do nº 2 e 4 do artigo 89º do CCP;
Nos termos do nº 4 do artigo 89º do CCP, fica a entidade cessionária notificada de que, prevendo o contrato renovações, cada renovação será condicionada à prestação de nova caução, que terá por referência o preço de cada um dos respetivos períodos de vigência.
5) Aprovação da minuta de contrato nos termos do artigo 98º do CCP, anexa, ao abrigo da alínea d) do nº 2 do artigo 77º do CCP, a fim de concluir um novo contrato para a adjudicação da conclusão dos trabalhos;
C) Autorização de notificação da minuta do contrato à entidade cessionária nos termos do artigo 100º do CCP, para efeitos de pronúncia sobre o teor desta, nos termos da aliena a) do nº 2 do artigo 77º do CCP e aceitação da mesma no período máximo de 5 dias a contar da notificação, nos termos do artigo 101º do CCP;
7) A nomeação, nos termos do nº 1 do artigo 290º-A do CCP e por deliberação do órgão competente para a mesma da Coordenadora Técnica da área Ambiente e Espaço Urbano, Xxxxxxxx Xx, como gestora do contrato.”
m. A deliberação do órgão executivo da indicada União de Freguesias de 12-08-2021 foi notificada à MAGOFLOR - JARDINS DO MAGOITO LDA. por email datado de 13-08-2021.
n. A entidade fiscalizada foi instada a pronunciar-se acerca da legalidade do contrato em apreço, atendendo a que o mesmo foi celebrado com preterição de todas as formalidades legais previstas no CCP, designadamente a abertura de um procedimento concursal, aberto à concorrência.
Ao que respondeu:
“Tendo em conta o previsto no artigo 318.º-A do CCP e a Cláusula C.ª do Contrato N.º 23/PS/21, e por todo o já exposto nos esclarecimentos apresentados nas respostas dadas nos pontos 19. e 20. do presente documento, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, a entidade adjudicante visou pautar a sua atuação na celebração do contrato em apreço pelo que julgou, salvo melhor opinião, ser consonante com a legalidade das formalidades do CCP no referente a esta figura jurídica da cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante, derivando o contrato em apreço dessa cessão de posição contratual do primeiro classificado ao segundo, após interpelação por ato do contraente público.
A própria classificação na ordenação final do procedimento pré-contratual do agora cocontratante neste contrato derivou de um procedimento concursal aberto à concorrência e em que a mesma funcionou tendo sido apresentadas e admitidas várias propostas.
Assim, salvo melhor opinião, visou-se a celebração do contrato em apreço com base nas disposições legais invocadas e pelos motivos expostos.”
o. Em sessão Diária de Visto, de 8-11-2021, foi decidido devolver o contrato à entidade fiscalizada para, entre outras questões, se pronunciar:
“(…) sobre a eventual ilegalidade decorrente da alteração do preço contratual, não admitida pelo n.º 3 do artigo 318.º-A do CCP, dado que o contrato submetido a fiscalização previa, outorgado na sequência de resolução contratual sancionatória do contrato celebrado com o adjudicatário inicial, e de cessão da posição contratual ao abrigo do n.º 1 do mesmo artigo 318.º-A, foi celebrado por valor acima do inicialmente adjudicado, e o preço, enquanto um dos aspetos de execução do contrato, submetido à concorrência, integra “as condições já propostas pelo cedente do procedimento pré- contratual original”, a que alude o citado n.º 3 do artigo 318-A do CCP;
Sendo que se assim se entender, a celebração do contrato por valor superior ao inicialmente adjudicado, poderá ter conduzido à alteração do resultado financeiro, e poderá constituir fundamento de recusa de visto, nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC.”
Respondeu o seguinte:
«A entidade adjudicante pautou a sua atuação convicta, salvo melhor opinião, de que estaria perante um quadro legal possível por verificação dos pressupostos inerentes ao artigo 318º-A do CCP. Visando nortear a sua atuação pela perfeita harmonia entre os princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da imparcialidade, da proporcionalidade, da boa-fé, da tutela da confiança, da sustentabilidade e da responsabilidade, bem como os princípios da concorrência, da publicidade e da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação, tendo em conta os mesmos, a entidade adjudicante considerou que, na sequência da resolução contratual em causa por incumprimento das obrigações contratuais, a forma como efetuara a interpretação e aplicação do artigo 318º-A do CCP era a adequada. A entidade adjudicante considerou, salvo melhor opinião de vossas excelências, que a legalidade estaria assegurada face ao cumprimento da letra do artigo que prevê esta possibilidade, atuando a entidade adjudicante com o intuito de zelar pelo cumprimento da mesma, tomando uma decisão que julgou à data enformada de plena legalidade.
Tendo em conta a necessidade de dar cumprimento às competências legalmente transferidas nesta matéria para a União de freguesias por força da alínea a) do Nº1 do artigo 2º do Decreto-Lei 57/2019, de 30 de abril, o carácter de extrema urgência em assegurar um serviço que não poderia ser descontinuado, mormente numa época de temperaturas elevadas, e dado que o prejuízo para o organismo público acarretaria danos físicos e financeiros elevados, a abertura de um novo procedimento concorrencial nos termos legalmente previstos face ao valor do contrato, poderia por em causa o princípio da prossecução do interesse público tendo em conta que a demora na celebração de novo contrato na sequência de abertura de novo procedimento concorrencial traria previsivelmente graves prejuízos para o interesse público, dada a ausência de execução daqueles serviços cuja importância se afigura extrema num área verde de objeto contratual que ronda os 192.C18,90 m2 e numa época de necessária e permanente ininterrupção dos mesmos pela estação do ano que se vivia, podendo igualmente colocar em causa o estrito cumprimento de forma atempada e útil das competências derivadas e legalmente impostas à entidade adjudicante pela alínea a) Nº1 do artigo 2º do Decreto-Lei 57/2019, de 30 de abril e pela alínea a) do Nº2 do artigo 38º da Lei 50/2018, de 1C de agosto.
A entidade adjudicante atuou, na aplicação do artigo 318º-A do CCP, ainda que salvo melhor opinião se possa entender que erradamente, de que as condições em que deveria ocorrer o novo contrato derivado da cedência da posição contratual do primeiro cocontratante seriam condições de execução do mesmo, isto é, condições de execução dos serviços objeto do contrato, nomeadamente as garantias de que a entidade interpelada a cumprir teria de garantir na sua atuação que os serviços de manutenção
dos espaços decorriam com as mesmas características qualitativas e quantitativas que o previsto no contrato e proposta do cocontratante do contrato inicial. Foi esta interpretação que a entidade adjudicante fez do novo artigo 318º-A do CCP, salvo opinião de vossas excelências de que essa interpretação se encontra eventualmente errada ou incompleta. De notar, contudo, que estamos em ambos os casos das empresas Magoflor e SAMSIC, perante a celebração de contratos por preços apresentados como anormalmente baixos e que, face aos valores de mercado apresentados pelas restantes empresas concorrentes, consideravelmente distantes destes e muito mais elevados, que, salvo melhor opinião, a celebração de um contrato com uma outra empresa concorrente pelo preço apresentado pela empresa SAMSIC, poderia colocar em causa o respeito pelo disposto no Nº2 do artigo 1º A do CCP, aumentando o risco de desrespeito pelas normas aplicáveis em matéria social, laboral, ambiental, de igualdade de género e de prevenção e combate à corrupção, decorrentes do direito internacional, europeu, nacional ou regional, tendo em conta que estamos perante preços anormalmente baixos ainda que com justificação detalhada dos mesmos. Assim, a existir na opinião de vossas excelências a consideração de uma eventual ilegalidade na interpretação e aplicação do artigo 318º-A do CCP, decorrente de alteração do preço contratual na cessão da posição contratual por resolução sancionatória do contrato inicial e a eventual consideração desta para condução à recusa de visto por alteração do resultado financeiro do contrato, nos termos da alínea
c) do nº 3 do artigo 44º da LOPTC, a entidade adjudicante refere contudo que, a existir, essa verificação se deveu a um desconhecimento de causa e que a sua atuação se pautou pelos moldes descritos com a convicção de cumprimento estrito da legalidade.”
2. Factos não provados
3. Com relevo para a decisão final de fiscalização prévia não há factos que se devam considerar não provados.
II.3 Motivação da matéria de facto
4. A consideração como provada da matéria de facto acima elencada baseou-se no expresso reconhecimento de factos pela requerente e na prova documental por ela fornecida, tendo o tribunal extraído os factos diretamente dos documentos apresentados e esclarecimentos prestados.
III - DE DIREITO
5. A principal questão a analisar no presente acórdão prende-se com a legalidade e a admissibilidade da cessão de posição contratual que a entidade adjudicante invoca estar na base da celebração do contrato submetido a fiscalização prévia.
6. Invoca a entidade adjudicante que celebrou o contrato sub judice com base no procedimento concursal por si anteriormente promovido e que levou a uma primeira adjudicação à sociedade Samsic Portugal - Facility Services, S.A., pelo preço contratual máximo de 494.480,55€.
7. Face ao incumprimento contratual por parte de tal sociedade, celebrou novo contrato com a sociedade MAGOFLOR – Jardins do Magoito, Lda., pelo valor de 554.741,64€, o que alega ter feito ao abrigo do disposto no art.º 318.º-A do Código dos Contratos Públicos (CCP), uma vez que havia sido tal proponente classificada em segundo lugar no referido procedimento concursal.
8. Para decisão do presente processo importa, antes de mais, fazer um enquadramento jurídico da figura da cessão de posição contratual no Direito Civil e no Direito da Contratação Pública, subsumindo, depois, o caso concreto às conclusões que dali se retirem.
Enquadramento normativo
9. A cessão da posição contratual é uma figura típica do Direito Civil e está consagrada no art.º 424.º e ss. do Código Civil (CC).
10. Dispõe o n.º 1 do art.º 424.º do CC que “no contrato com prestações recíprocas, qualquer das partes tem a faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente, antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão”.
11. Trata-se de um instituto que – a par de outros como a cessão de créditos ou a sub-rogação (transmissões de créditos) ou a assunção de dívidas (transmissão de dívidas) – se insere na categoria geral das formas de transmissão das obrigações, sendo, nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxx, “a mais complexa das formas ou variantes da transmissão das obrigações” (Das Obrigações em Geral, volume II, 6.ª edição, Almedina, Coimbra, pág. 291).
12. O facto de se tratar de uma forma de transmissão das obrigações molda desde logo a natureza do instituto – há uma deslocação de um direito pré-existente da titularidade de um sujeito para outro, sem alteração do seu conteúdo essencial.
13. A imagem criada pelo termo “transmissão”, como sublinha o autor vindo de citar (Das Obrigações…, cit., pág. 287), “longe de constituir um mero recurso anódino da linguagem jurídica, reveste um sentido bem definido: o de que o direito de crédito, nascido na titularidade do adquirente, é o mesmo direito que pertencia ao transmitente, e não um outro moldado apenas à semelhança do primeiro” (realce no original).
14. Como decorre da noção legal do art.º 424.º, n.º 1 do CC, esta figura consiste no contrato pelo qual o outorgante de um outro contrato transmite a um terceiro, com o consentimento do outro outorgante, o complexo de direitos e obrigações que para si derivam de tal contrato.
15. Envolve três sujeitos (o cedente, o cedido e o cessionário) e pressupõe a existência de dois contratos: o contrato-base (aquele inicialmente celebrado, onde se consagrou o conjunto de direitos e deveres que serão objeto da cessão) e o contrato-instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual) – assim Pires de Lima e Xxxxxxx Xxxxxx, Código Civil Anotado, volume I, 4.ª edição, Xxxxxxx Xxxxxxx, 0000, pág. 400, nota 1.
16. Trata-se, pois, de uma situação de modificação subjetiva do contrato, enquadrada pela liberdade contratual – cedente e cessionário acordam na transmissão da posição contratual, à qual o cedido consente, assim se podendo operar livremente.
17. No âmbito do Direito da Contratação Pública, as especiais exigências impostas pelos princípios da transparência, da concorrência e da igualdade necessariamente levaram a que não pudesse ser feita uma transposição integral e sem qualquer adaptação daquele instituto do Direito Civil.
18. Apesar de no art.º 316.º do Código dos Contratos Públicos (CCP) se prever uma norma geral de admissibilidade de cessão da posição contratual, nos artigos seguintes o legislador estabeleceu um conjunto de requisitos que visam impedir que através da sua utilização sejam violados aqueles princípios estruturantes.
19. Assim, se quanto à cessão promovida pelo contraente público se consagra uma quase total liberdade – podendo o cocontratante apenas recusá-la quando tenha fundado receio de que a mesma envolve um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do contrato pelo potencial cessionário ou a diminuição das suas garantias (art.º 324.º, do CCP) – já no que toca à cessão da posição contratual do cocontratante os limites legais são muito mais apertados.
20. Facilmente se compreende que assim seja, pois de outro modo ficaria aberta uma via para contornar as exigências procedimentais que precedem a celebração dos contratos públicos, o que justifica que o art.º 317.º, n.º 1 do CCP consagre uma proibição absoluta de cessão da posição do cocontratante quando a escolha tenha sido determinada por ajuste direto, nos casos em que só possa ser convidada uma entidade (alínea a) ), às entidades abrangidas pelas causas de impedimento previstas no art.º 55.º (alínea b) ) e quando existam fortes indícios de que a cessão da posição contratual ou a subcontratação resultem de atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras da concorrência (alínea c)).
21. Também pelos mesmos motivos, no art.º 318.º, n.ºs 1 e 2, do CCP, se estabelecem requisitos apertados para a concessão de autorização à cessão por parte do contraente público, relativos, nomeadamente, à habilitação e requisitos mínimos exigíveis ao potencial cessionário.
22. Não obstante todas estas restrições e requisitos adicionais, ainda assim, não deixa esta figura da cessão da posição contratual consagrada no CCP de se mover no âmbito da liberdade contratual – o cocontratante toma livremente a decisão de ceder a sua posição contratual a um terceiro, o que pode ser aceite pelo contraente público de forma também livre, apenas estando essas vontades de cocontratante e contraente público balizadas por requisitos mais apertados, impostos pelo CCP.
23. Na reforma do CCP introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31-08, porém, veio o legislador consagrar uma nova figura que assume características distintas – a cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante, prevista no art.º 318.º-A.
24. Como a própria epígrafe da norma desde logo adianta, estamos neste caso perante uma figura que tem aplicação não em qualquer momento e circunstância da vida da relação obrigacional, mas apenas quando exista uma situação de incumprimento por parte do cocontratante.
25. Com efeito, dispõe a norma em causa que “o contrato pode prever que, em caso de incumprimento, pelo cocontratante, das suas obrigações, que reúna os pressupostos para a resolução do contrato, o cocontratante ceda a sua posição contratual ao concorrente do procedimento pré-contratual na sequência do qual foi celebrado o contrato em execução, que venha a ser indicado pelo contraente público, pela ordem sequencial daquele procedimento”.
26. Assim, para que possa operar a cessão aqui prevista é necessário que a relação contratual esteja em situação que permitisse ao contraente público proceder à sua resolução por incumprimento das obrigações que impendem sobre o cocontratante.
27. Perante uma tal situação, e tendo essa possibilidade sido prevista no próprio contrato, pode o contraente público impor ao cocontratante a cessão, o que faz mediante ato administrativo, sendo tal cessão eficaz a partir da data por si indicada, nos termos do n.º 4 do art.º 318.º-A, do CCP.
28. A escolha do cessionário também não é livre, estando o contraente público obrigado a interpelar, gradual e sequencialmente, os concorrentes que participaram no procedimento pré-contratual original, de acordo com a respetiva classificação final, a fim de concluir um novo contrato para a adjudicação da conclusão dos trabalhos – art.º 318.º- A, n.º 2.
29. Deste figurino legal ressaltam traços muito distintos entre esta figura e a da cessão da posição contratual acima analisada.
30. Desde logo, o momento em que pode tal cessão operar: ao contrário de uma normal cessão de posição contratual (cuja ocorrência depende apenas e só da vontade dos contraentes), só quando estejam reunidos os pressupostos para a resolução do contrato por incumprimento pode a cessão consagrada no art.º 318-A do CCP ter lugar.
31. Por outro lado, no que pode ser considerado o traço mais marcante desta figura em relação à cessão da posição contratual civilística, há uma inversão da relação triangular que caracteriza este instituto jurídico.
32. Na cessão da posição contratual civil, o cedente opta livremente por celebrar esse contrato e escolhe o cessionário com quem o irá celebrar, limitando-se o cedido a autorizar ou não autorizar a cessão.
33. A liberdade contratual de todas as partes intervenientes no negócio jurídico permanece intocada, nada lhes sendo imposto e podendo optar por contratar ou não contratar (o cedente e o cessionário), autorizar ou não autorizar (o cedido), sendo cedente e cessionário livres de escolher com quem e quando contratar.
34. Já no figurino implementado pelo art.º 318.º-A do CCP, o centro de gravidade do equilíbrio do contrato desloca-se do cedente para o cedido, que já não se limita a uma simples opção de autorização ou não autorização da cessão.
35. Com efeito, desde que verificados os pressupostos de resolução do contrato por incumprimento, o cedido (contraente público) passa a poder impor a cessão ao cedente (cocontratante), não sendo este livre de optar pela celebração, ou não, da cessão, não podendo escolher a quem cederá a posição contratual, nem podendo escolher o como e
o quando de tal cessão – ela opera por mero efeito do ato administrativo emitido pelo cedido, sendo este quem fixa a data a partir da qual produz efeitos.
36. Nesta figura há, pois, uma compressão quase total da liberdade contratual do cocontratante (cedente), em detrimento do contraente público (cedido).
37. Atenta esta sua configuração, poder-se-á questionar se este instituto não estará mais próximo da figura da sub-rogação legal (ou forçada ou ex lege) do que da cessão de posição contratual.
38. Segundo Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx (Direito das Obrigações, 6.ª edição, Xxxxxxxx, Xxxxxxx, 0000, pág. 722), o que distingue as duas figuras é o facto de na sub-rogação legal a transmissão da posição contratual não depender da vontade das partes, antes derivando da lei – “não se exigem as três declarações de vontade que caracterizam a cessão do contrato”.
39. Sucede, porém, que não obstante a considerável compressão da liberdade contratual, no art.º 318.º-A do CCP não se verifica essa total dispensa da vontade das partes.
40. Por um lado, apesar de poder a cessão ser imposta pelo contraente público, ela não é imposta a este pela lei. O art.º 318.º-A admite a previsão contratual que permita a cessão em determinadas circunstâncias, mas não obriga o contraente público a fazê-la.
41. Ao contrário do que ocorreria se estivéssemos perante uma sub-rogação legal ou forçada, perante uma situação de incumprimento que possa levar à resolução do contrato, o contraente público é livre de optar por esta (e consequente cessação dos efeitos do contrato) ou pela cessão de posição contratual prevista na cláusula do contrato.
42. Também o potencial cessionário é livre de aceitar ou não a cessão – quando interpelado pelo contraente público nos termos do n.º 2 do art.º 318.º-A, pode o proponente aceitar ou recusar a cessão proposta.
43. Já no que diz respeito à liberdade do cocontratante, também esta não fica totalmente coartada: a lei não lhe impõe a cessão da posição contratual sempre que existam motivos para a resolução por incumprimento – só se constar no contrato uma cláusula que preveja tal possibilidade fica o cocontratante obrigado a aceitá-la, desde que se verifiquem os pressupostos e o contraente público por tal opte. Caso tal cláusula contratual não exista, não pode o cocontratante ser obrigado a aceitar a cessão da posição contratual.
44. No fundo, a liberdade do cocontratante não é totalmente suprimida, embora fique limitada ao momento da celebração do contrato – caso aceite a inclusão de uma cláusula
que preveja a cessão nos termos e condições previstas no art.º 318.º-A, não poderá a esta opor-se, mas é livre de aceitar ou recusar a contratação naqueles termos.
45. Como refere Xxxxx Xxxxx (“Incumprimento e cessão da posição contratual: alguns problemas decorrentes do novo artigo 318º-A do CCP”, Revista de Contratos Públicos, n.º 16, março de 2018, pág. 8), a imposição de previsão no contrato visa “obter a priori o consentimento do cocontratante à cessão, desde que se verifiquem os restantes pressupostos legais”.
46. No que toca à resolução, uma interpretação sistemática, literal e teleológica do art.º 318.º-A, do CCP, leva também a distinguir as duas figuras.
47. Desde logo, o facto de o legislador ter inserido o art.º 318.º-A no Capítulo VI – Cessão da Posição Contratual e Subcontratação – e não no Capítulo VII – Incumprimento do Contrato
– do CCP, aponta claramente ter sido sua intenção enquadrá-lo como uma figura alternativa às consequências previstas para o incumprimento do contrato.
48. Do teor literal do artigo fica também evidente que o legislador entende que o novo instituto se move ainda dentro do contrato já celebrado, não havendo qualquer novação da relação obrigacional.
49. Não só o n.º 1 menciona “o contrato em execução” – o que aponta para que tenha o contrato de estar ainda em execução e não cessado aquando da aplicação desta norma – como no n.º 3 claramente se diz que “a execução do contrato ocorre nas mesmas condições já propostas pelo cedente no procedimento pré-contratual original”.
50. A isto não se opõe a referência constante do n.º 2, a “concluir um novo contrato”. Essa referência a um novo contrato está associada à necessidade de “adjudicação da conclusão dos trabalhos” (ou seja, à execução da parte ainda não executada pelo primitivo cocontratante) e a própria natureza da cessão de posição contratual, como acima se disse, implica sempre a existência de um segundo contrato – o contrato-instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual).
51. Veja-se neste sentido a posição de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx (“Modificação subjetiva, pagamentos diretos a subcontratados e resolução do contrato: novidades do CCP revisto”, Revista de Contratos Públicos, n.º 17, abril de 2018, pág. 34), segundo o qual esta exigência legal não se traduz na adjudicação de um novo contrato, mas sim na “necessidade de titular, através de instrumento jurídico consensual, a nova relação jurídica que se estabelece”.
52. Por último, uma interpretação teleológica da norma leva também à conclusão segundo a qual este mecanismo é uma alternativa e não uma consequência da resolução contratual.
53. Perante uma situação que deveria determinar uma resolução contratual e a consequente abertura de novo procedimento concursal, o legislador pretendeu aproveitar o procedimento anteriormente levado a cabo (no âmbito do qual os princípios da transparência, da concorrência e da igualdade foram já salvaguardados), dando a oportunidade aos proponentes preteridos (e pela ordem em que foram graduados) de executarem o contrato nos mesmos termos em que foi adjudicado ao anterior cocontratante.
54. Nas palavras de Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx (Código dos Contratos Públicos Anotado e Comentado, 9.ª edição revista e atualizada, Almedina, Coimbra, julho de 2021, pág. 854, nota 1), “este preceito (…) visa evitar os inconvenientes da instauração de novo procedimento adjudicatório em caso de incumprimento do cocontratante”.
55. Trata-se, pois, do mesmo contrato, apenas se operando uma alteração dos seus sujeitos, sem que o contrato deixe de produzir efeitos – ao contrário da resolução, cuja consequência é a destruição dos efeitos do contrato e a sua consequente cessação.
56. Há logicamente traços muito semelhantes entre esta figura e a da resolução sancionatória, chegando mesmo Xxxxx Xxxxxxxxx a considerá-las “equivalentes” (Direito dos Contratos Públicos, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, julho de 2021, pág. 700).
57. Esse mesmo autor, porém, claramente aponta para a inexistência de novação e para a continuação da execução do contrato nos termos da proposta inicialmente aceite, distinguindo a situação do art.º 318.º-A da adjudicação secundária: ao passo que nesta há uma nova adjudicação da proposta ordenada em lugar subsequente, no caso do art.º 318.º- A isso não acontece, continuando a ser a primeira proposta adjudicada aquela a ser executada pelo novo cocontratante (ob. cit., pág. 983).
58. Também Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx (ob. cit., pág. 854-855, nota 2) entende que o que se coloca ao contraente público é uma opção entre a resolução do contrato e a cessão da posição contratual do cocontratante, “o que implica, portanto, que o contrato ainda vigora, por não ter sido resolvido embora houvesse para isso fundamento”, sendo para isso fundamental que o concorrente ordenado em segundo lugar adira à proposta do que foi inicialmente escolhido, “já que, no procedimento de formação do contrato, apenas se vinculou aos termos da sua proposta e não da que apresentou o cocontratante”.
59. Da análise vinda de efetuar resulta, portanto, que o instituto previsto no art.º 318.º-A do CCP continua a revestir a natureza de cessão da posição contratual, muito embora com um regime próprio e distinto, mas não se confundindo com outras figuras como a resolução sancionatória ou a sub-rogação legal ou forçada.
Do contrato submetido a fiscalização prévia
60. Feito este percurso pela figura da cessão da posição contratual no Direito Civil e no Direito da Contratação Pública, revertamos a análise feita para a apreciação do contrato submetido a este tribunal para fiscalização prévia.
61. Para maior facilidade de análise, sintetizemos cronologicamente os passos que precederam a celebração do contrato:
a) Em 09-06-2021, na sequência de procedimento concursal por si promovido, o órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão deliberou adjudicar o Lote A à empresa SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A., pelo preço contratual máximo de 494.480,55€ (quatrocentos e noventa e quatro mil quatrocentos e oitenta euros e cinquenta e cinco cêntimos), com um prazo de execução inicial de 12 (doze) meses, renovável por igual período até ao limite global de 3 anos;
b) Em 06-07-2021, essa adjudicação foi formalizada por contrato outorgado entre a entidade adjudicante e tal sociedade;
c) Em 06-08-2021, o Presidente da União de Freguesias de Massamá e Monte - Abraão dirigiu à SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A. uma carta na qual, além do mais, comunicou a esta vir “através da presente comunicação invocar a resolução sancionatória do contrato nos termos legais face à factualidade verificada desde o início da sua vigência, operando a extinção do contrato nos termos da alínea c) do artigo 330º do CCP por resolução. Deste modo e nos termos do artigo 309º do CCP os atos administrativos do contraente público relativos à execução do contrato constituem título executivo, pelo que se determina a resolução unilateral do contrato pelos fundamentos factuais e legais invocados, tendo a referida resolução efeitos a partir do dia 9 de agosto de 2021”;
d) Em 09-08-2021 e 11-08-2021, o órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão deliberou por unanimidade, além do mais, “a) Resolução do contrato por decisão do contraente público, nos termos da alínea e) do artigo 302º do CCP, alínea d) do nº2 do artigo 307º do CCP e da alínea c) do artigo 330º do CCP, a título sancionatório conforme previsto no artigo 333º do CCP pelos fundamentos factuais e legais supra invocados, mormente o disposto nas alíneas a) e
b) do nº1 do referido artigo e as estipulações das Cláusulas 1Cº e 18º do Caderno de Encargos do procedimento; b) A ratificação da comunicação remetida através de Ofício
nº 327C/2021, que se anexa, datado de C de agosto de 2021, notificando o cocontratante dos fundamentos da resolução sancionatória do contrato, tendo sido notificado dos efeitos da referida resolução a partir do dia 9 de agosto de 2021; c) A aprovação da decisão de aplicação de sanções contratuais ao cocontratante, nos termos do artigo 329º do CCP, tal como previstas na Cláusula 12ª do Caderno de Encargos, em montante a determinar em face da decisão de aprovação de aplicação das mesmas” e ainda “a) A aprovação da proposta de aplicação de sanções contratuais ao cocontratante, nos termos do artigo 329º do CCP, tal como previstas na Cláusula 12ª do Caderno de Encargos, no montante global de 23.C52,CC € (vinte e três mil seiscentos e cinquenta e dois euros e sessenta e seis cêntimos), notificando-se o cocontratante da mesma”;
e) Em 12-08-2021, o órgão executivo da União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão aprovou por unanimidade “1) A decisão de operar a cessão da posição contratual do concorrente do procedimento pré-contratual, nos termos da alínea f) do artigo 302º do CCP e da alínea e) do artigo 307º do CCP, para os efeitos do artigo 318º- A; 2) A aprovação da proposta de adjudicação por cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante, para a aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços ajardinados na União das Freguesias de Massamá e Monte Abraão- Lote A à empresa “MAGOFLOR - JARDINS DO MAGOITO LDA.”, com o NIF 503 8C8 531, pelo preço contratual máximo de 554.741,C4 € (quinhentos e cinquenta e quatro mil, setecentos e quarenta e um euros e sessenta e quatro cêntimos) acrescido de IVA à taxa legal em vigor e com um prazo de execução inicial de 12 (doze) meses, renovável por igual período até ao limite global de 3 anos, conforme compromisso e assunção de compromissos plurianuais que se anexa nº 9187, 02020308
- Manutenção dos Espaços verdes e fonte de financiamento Transferências no âmbito
das Adm. Públicas”;
f) Em 19-08-2021, foi celebrado o contrato entre a União de Freguesias de Massamá e Monte Abraão e MAGOFLOR – Jardins do Magoito, Lda., tendo como objeto “a aquisição de serviços de manutenção e conservação de espaços ajardinados na União das freguesias de Massamá e Monte Abraão - Lote A”, estabelecendo-se que se inicia “no dia seguinte ao da sua assinatura e vigora pelo período inicial de 12 (doze) meses, renovando-se automaticamente por iguais períodos até ao limite máximo de vigência total de 3C (trinta e seis) meses” e sendo o preço estabelecido de 682.332,22€ (seiscentos e oitenta e dois mil, trezentos e trinta e dois euros e vinte e dois cêntimos), sendo 554.741,64€ (quinhentos e cinquenta e quatro mil, setecentos e quarenta e um euros e sessenta e quatro cêntimos) respetivos aos serviços objeto do contrato e 127.590,58€ (noventa e oito mil e setenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos) correspondentes ao valor do IVA.
62. Deste elenco cronológico da atuação da entidade adjudicante resulta desde logo uma conclusão que choca com o que acima se referiu como um dos traços essenciais do instituto consagrado no art.º 318.º-A do CCP: à data da celebração do contrato aqui em apreço, já o contrato inicialmente celebrado com a primeira proponente estava extinto por resolução.
63. Com efeito, por comunicação dirigida à SAMSIC PORTUGAL - FACILITY SERVICES, S.A. em 06-08-2021, a entidade adjudicante comunicou-lhe a resolução do contrato com efeitos a partir de 09-08-2021.
64. Sendo a declaração de resolução uma declaração unilateral recetícia, com o seu recebimento por parte da inicial cocontratante operou-se a resolução do contrato a partir da data indicada pela entidade adjudicante, tendo nesta cessado todos os efeitos do contrato.
65. Logicamente, e em coerência com o que acima se disse aquando da análise do instituto da cessão da posição contratual, após a data da resolução já não poderia a entidade adjudicante impor ao cocontratante inicial a cessão da posição contratual, pois nesse momento já o contrato cessara a sua produção de efeitos, não podendo a posição de qualquer das partes ser cedida a um terceiro.
66. Ou seja, quer na data em que a entidade adjudicante deliberou fazer operar a cessão da posição contratual (12-08-2021), quer na data em que o novo contrato foi celebrado (19- 08-2021), já o contrato inicial se mostrava extinto, o que inviabilizava a sua transmissão a qualquer dos demais proponentes que haviam sido preteridos no procedimento concursal.
67. Perante uma situação de incumprimento das obrigações do cocontratante, à entidade adjudicante cabia optar por um de dois caminhos: ou a resolução do contrato ou a cessão da posição contratual. O que não podia é optar por ambas, fazendo operar a resolução e, posteriormente, pretendendo impor a cessão de posição contratual ao cocontratante.
68. Tendo optado pela resolução do contrato, ficou-lhe vedada a possibilidade de recorrer à cessão da posição contratual consagrada no art.º 318.º-A do CCP.
69. Ainda que assim não fosse e estivesse o anterior contrato em execução, da análise do contrato submetido a fiscalização prévia verifica-se que este não é um mero contrato- instrumento destinado a titular a alteração da titularidade do contrato inicial.
70. Conforme impõe o art.º 318.º-A, n.º 3 do CCP, a execução do contrato ocorre nas mesmas condições já propostas pelo cedente no procedimento pré-contratual original.
71. Ora, lido o contrato celebrado e aqui em apreço, verifica-se que se trata de uma nova adjudicação e não de uma mera alteração de titularidade do contrato inicialmente celebrado:
a) O preço não é o da proposta apresentada pelo cocontratante original, mas sim o da proposta apresentada pelo proponente que agora assume a posição daquele;
b) O prazo estipulado no novo contrato é o prazo total, como se a adjudicação inicial nunca tivesse ocorrido, não se tendo em consideração o período já decorrido de execução do contrato inicialmente celebrado.
72. Estamos, pois, perante um novo contrato e não perante uma mera formalização da cessão de posição do cocontratante num contrato já existente.
73. Não houve da parte do novo cocontratante uma manifestação de vontade de se vincular aos termos da proposta apresentada pelo cocontratante inicial, antes tendo o novo contrato sido a formalização dos termos da proposta que o novo cocontratante havia apresentado aquando do procedimento concursal.
74. Ou seja, ainda que o contrato não tivesse sido resolvido e pudesse a posição contratual do cocontratante ser cedida, o contrato celebrado entre as partes e submetido a fiscalização não consubstancia uma cessão da posição contratual, mas sim uma nova adjudicação.
75. A conclusão a que se chega da análise vinda de efetuar é a de que, não estando o contrato em execução e sendo por isso insuscetível de cessão e configurando o contrato submetido a fiscalização prévia uma nova adjudicação, deveria a escolha do cocontratante ter sido precedida de novo procedimento concursal, não bastando o mero ato administrativo da entidade adjudicante de escolha do segundo proponente do anterior procedimento concursal.
76. O contrato inicialmente celebrado extinguiu-se por resolução e, consequentemente, também os efeitos do procedimento concursal na sequência do qual foi celebrado.
77. O contrato submetido a fiscalização prévia, é, por isso, um contrato autónomo, não procedido, como no caso era exigido, de procedimento concursal.
78. Sendo que a falta de concurso dirigido à escolha do cocontratante implica a preterição total do procedimento legalmente exigido, que é causa de nulidade, nos termos do
disposto no art.º 161.º, n.º 2, alínea l), do Código do Procedimento Administrativo, para que remete o n.º 2, do artigo 284.º do CCP.
Efeitos das ilegalidades do contrato no processo de fiscalização prévia: recusa de visto
79. Sendo o processo de fiscalização prévia orientado para a prolação de uma decisão final de concessão ou recusa de visto, as ilegalidades identificadas têm de ser enquadradas nas previsões das alíneas do art.º 44.º, n.º 3 da LOPTC.
80. Como vimos, o contrato sob apreciação está afetado de nulidade, o que é um fundamento absoluto de recusa de visto, não sendo permitida a concessão deste ainda que acompanhada de recomendações – art.º 44.º, n.º 3, alínea a) e n.º 4 (a contrario) da LOPTC.
81. Além disso, a ilegalidade verificada tem inegável influência no resultado financeiro do contrato.
82. É jurisprudência unânime deste tribunal que a alteração do resultado financeiro do contrato pode ser meramente potencial e que este ocorre quando no âmbito de procedimento regulado pelo CCP se violam regras fundamentais sobre o imperativo de um procedimento concorrencial (neste sentido veja-se, por todos, o Xxxxxxx 17/2021 – 1.ª S/SS, de 29/06/2021, e a jurisprudência aí citada).
83. No caso que nos ocupa, a alteração do resultado financeiro do contrato não é meramente potencial pois, como vimos, o preço do novo contrato celebrado é superior ao preço inicialmente acordado com o cocontratante cuja posição contratual a entidade adjudicante pretendia ver cedida, pelo que há uma inequívoca alteração do resultado financeiro, decorrente da preterição do formalismo imposto por lei.
84. Assim, também por força do disposto na alínea c) do art.º 44.º, n.º 3 da LOPTC deve o visto ser recusado.
85. Em conclusão, verificam-se os fundamentos de recusa de visto ao contrato submetido a fiscalização prévia previstos no artigo 44.º, n.º 3, alíneas a) e c) da LOPTC.
Decisão
Pelos fundamentos supra indicados e ao abrigo do disposto no artigo 44.º, n.º 3, alíneas a) e c), da LOPTC, acordam os juízes do Tribunal de Contas, em subsecção da 1.ª Secção, em recusar o visto ao contrato objeto de fiscalização prévia nos presentes autos.
São devidos emolumentos nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas (Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de maio, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 139/99, de 28 de agosto, e pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril).
Lisboa, 8 de fevereiro de 2022.
Os Juízes Conselheiros,
Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx – Relator
participou na sessão por videoconferência, e assina digitalmente o Xxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
participou na sessão por videoconferência, e votou favoravelmente o Xxxxxxx
Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx
participou na sessão por videoconferência, e votou a decisão, com a seguinte
“Declaração:
Voto a decisão, mas não acompanho a respectiva fundamentação na parte em que aplica o art.º 161.º, n.º 1, al. l), do CPA e comina com o desvalor nulidade o contrato em apreciação, por invalidade consequente, decorrente da omissão do procedimento concursal legalmente devido. No caso, atendendo ao regime do art.ºs 283.º, n.ºs 1 e 2 e 284.º, n.º 1, do CCP, consideraria anulável o contrato sob fiscalização. Porque a referida ilegalidade alterou ou pode ter alterado o resultado financeiro do contrato, manter-se-ia a recusa de visto.”
Processo de Fiscalização Prévia: 1912/2021
Entidade Fiscalizada: União das Freguesias de Massamá e Monte Abraão - Sintra
- CONCLUSÃO –
CONCLUSÃO em 2022-02-09, ao Exmo. Senhor Xxxxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, informando V. Ex.ª que do Acórdão aprovado na sessão ordinária realizada em 08/02/2022 consta “ACÓRDÃO Nº 06/2021”, sendo que o mesmo é do ano de 2022. Xxxx exposto apresento à consideração de V. Ex.ª a fim de ordenar o que tiver por conveniente.
A Chefe de Divisão,
(XXXX XXXXX XX XXXXXX XXXXX XXXXXXXX)
-CLS-
Há, efetivamente, manifesto erro de escrita na indicação do número do Acórdão.
Assim, onde no cabeçalho do mesmo consta “ACÓRDÃO n.º 6/2021”, deverá passar a ter-se como
escrito “ACÓRDÃO n.º 6/2022”.
Anote-se e notifique-se