ADVOCACIA TRABALHISTA
Coordenador
Xxxxxxxx Xxxxxxx
ADVOCACIA TRABALHISTA
Temas que todo advogado trabalhista precisa dominar
2024
ASPECTOS PRÁTICOS DO ATESTADO MÉDICO
NO CONTRATO DE TRABALHO
Xxxxx Xxxxxxxxxxx Marques1
1. CONCEITO DE ATESTADO
O atestado médico é um documento emitido por profissional habi- litado, capaz de justificar a ausência do empregado no emprego, por mo- tivo de doença ou de acidente no trabalho. Tal documento faz com que não seja caracterizada falta do empregado, visto que é uma justificativa para a incapacidade laboral. Assim, é garantido o recebimento integral da remuneração referente aos dias não trabalhados, bem como o repou- so semanal remunerado.
2. PROFISSIONAIS HABILITADOS PARA EMISSÃO DE ATESTADO
A Lei nº 605/1949, que relata sobre o repouso semanal remunerado, prevê, em seu artigo 6º, que tal remuneração não será devida, se o em- pregado se ausentar injustificadamente, não cumprindo integralmente seu horário de trabalho, durante toda a semana anterior ao repouso.
No § 1º, alínea “f ” do mesmo artigo, é dito que se constitui motivo justificado a ausência do empregado por doença, devidamente compro- vada, e o § 2º complementa que tal comprovação se dará por meio de atestado médico.
A Lei nº 12.842/13, em seu artigo 4º, inciso XIII, relata sobre o exer- cício da medicina, reconhecendo como atividade privativa do médico a atestação médica de condições de saúde, doenças e possíveis sequelas.
Do mesmo modo, a Lei 5.081/66, que regulou o exercício da odon- tologia, em seu artigo 6º, inciso III, estende aos dentistas a capacidade de
1. Graduado em Direito pela Universidade Paulista – 2010. Pós-Graduado pela Universidade Metropolitana – 2021. Advogado trabalhista atuante na área preventiva e contenciosa.
atestar estados mórbidos e outros, até mesmo para justificação de faltas ao emprego.
Portanto, médicos e dentistas são os profissionais legalmente habi- litados para a emissão de atestados capazes de justificar a ausência do empregado ao emprego, não sendo considerada sua ausência falta ao serviço.
Outros profissionais, por exemplo, psicólogos, fisioterapeutas e nutricionistas, não possuem poderes para atestar condições da saúde, doença ou estado mórbido, capazes de justificar faltas ao trabalho, con- tudo, por mera liberalidade, os empregadores podem aceitar atestados emitidos por tais profissionais.
3. ORDEM DE PREFERÊNCIA DOS ATESTADOS
A Lei nº 605/1949, em seu artigo 6º, §2º, prevê a seguinte ordem de preferência de atestados: 1) atestado do médico da instituição da previ- dência social a que estiver filiado o empregado; 2) de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; 3) de médico da empresa ou por ela designado; 4) de médico a serviço de representação federal, estadual, ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; 5) ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, médico de sua escolha.
O Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula nº 15, reconhe- cendo o dever de observar a ordem preferencial citada anteriormente.
Nesse sentido, a jurisprudência do TST é pacífica em reconhecer como legais os descontos efetuados, em caso de atestados apresentados em inobservância da ordem prevista.
Na prática, é muito comum empregados apresentarem atestados prevendo determinados dias de afastamento, contudo esse período pode ser revisto e até diminuído pelo médico do trabalho, em caso de necessi- dade, levando em consideração a hierarquia apontada.
Por isso, é de extrema importância sempre submeter os atestados médicos apresentados pelos empregados ao serviço de medicina do tra- balho do empregador.
4. REQUISITOS PARA VALIDADE DO ATESTADO
A validade do atestado médico está condicionada a alguns requisitos específicos, previstos na Resolução nº 1.658/2002 do Conselho Federal de Medicina: I – especificar o tempo concedido de dispensa à atividade, necessário para recuperação do paciente; II – estabelecer o diagnóstico, quando expressamente autorizado pelo paciente; III – registrar os dados de maneira legível; IV – identificar-se como emissor, mediante assinatu- ra e carimbo ou número de registro no Conselho Regional de Medicina.
Sobre tais requisitos, duas grandes polêmicas são levantadas: 1 – A obrigatoriedade de constar o CID no atestado e; 2 – a necessidade do carimbo médico no documento.
O diagnóstico médico materializado pelo CID (Classificação In- ternacional de Doenças) somente pode ser formalizado com a expressa concordância do paciente, portanto, a recusa do atestado médico pelo empregador por não apresentar tal dado não encontra fundamento legal. O atestado médico é válido sem a presença do CID.
Já sobre o segundo ponto, mesmo que a resolução nº 1.658/2002 do CFM diga que a identificação do emissor deve ocorrer mediante as- sinatura e carimbo, o que se vê, nos pareceres do Conselho Federal de Medicina 2 e dos Conselhos Regionais de Medicina sobre o tema é a rela- tivização da necessidade da presença do carimbo nos atestados médicos; portanto, desde que presentes assinatura com nome e número de regis- tro, mesmo que feitos à caneta, o atestado continua válido.
Em relação ao atestado médico emitido por meio de consulta por telemedicina, regulamentada pela Resolução nº 2.314/2022 do CFM, alguns outros requisitos são exigidos: I – identificação do médico, in- cluindo nome, CRM, endereço profissional; II – identificação e dados do paciente (endereço e local informado do atendimento; III – registro de data e hora; IV – assinatura com certificação digital do médico no pa- drão ICP-Brasil ou outro padrão legalmente aceito; V – que foi emitido em modalidade de telemedicina.
2. Parecer CFM nº 40/2019. Não há obrigatoriedade legal ou ética para o uso de carimbos em qualquer documento emitido por médico no exercício profissional. O que se exige é que a identificação esteja legível e conste o número do registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) de onde atua o médico.
Para a verificação da veracidade do atestado médico emitido em consulta por telemedicina, há o portal xxxxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xxx.xx/xxxxxx- do, no qual é possível, por meio da leitura de QR Code ou envio do do- cumento em formato .PDF, analisar sua originalidade e se o profissional que o emitiu está regularmente habilitado.
5. SOMA DE ATESTADOS DESCONEXOS E AFASTAMENTO PREVIDENCIÁRIO
Outro fato comum, na rotina trabalhista, é a apresentação de diver- sos atestados com períodos iguais ou inferiores a 15 dias, em razão da mesma doença.
Nesses casos, se a somatória dos dias de afastamento dos atestados ultrapassar 16 dias e os atestados forem apresentados num período de 60 dias, esses afastamentos são capazes de gerar o direito à concessão de auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença). Tal enten- dimento está previsto no § 4º do artigo 75 do Decreto 3.048/99.
Importante salientar que, embora possam existir atestados com CIDs diferentes, se decorrentes de um mesmo motivo, podem ser so- mados, por exemplo, quando um segundo afastamento decorre da ne- cessidade de maior tempo de recuperação, em virtude de um primeiro afastamento por motivos cirúrgicos.
Nesses casos, é necessário o encaminhamento do empregado para uma avaliação ocupacional com o médico do trabalho, antes do encami- nhamento ao órgão previdenciário.
6. APRESENTAÇÃO DE ATESTADO MÉDICO NO AVISO PRÉVIO
O aviso prévio integra o contrato de trabalho para todos os fins, con- forme previsto no artigo 487, § 1º da CLT, portanto a apresentação de atestado médico, no período, pode gerar consequências, a depender do tempo de afastamento concedido.
Em caso de apresentação de atestado médico, com afastamento igual ou inferior a 15 dias, sem a concessão de auxílio por incapacidade tem- porária e, estando o período inserido integralmente no aviso prévio, não há qualquer alteração no curso normal do prazo referente ao aviso pré- vio, pois os primeiros 15 dias de afastamento são de responsabilidade do
empregador (hipótese de interrupção do contrato, havendo pagamento sem prestação de serviço).
Caso o afastamento seja igual ou inferior a 15 dias e seu prazo ul- trapasse o termo final do aviso prévio, haverá também a interrupção do contrato, razão pela qual o empregador não poderá finalizar o contrato de trabalho, conforme bem pontuado por Alice Monteiro de Barros3 e também Henrique Correia4.
Nesse caso, o termo final do aviso prévio se estende para o dia ime- diatamente seguinte ao da alta médica, devendo o empregado cumprir os dias faltantes de trabalho no período.
Já em caso de afastamento superior a 15 dias, com a concessão de auxilio por incapacidade temporária, considerando que o aviso prévio conta como tempo de serviço, mesmo se indenizado, o contrato de tra- balho será prorrogado durante a vigência do auxílio concedido, confor- me entendimento contido na Súmula 371 do TST, e os efeitos da sus- pensão do contrato, conforme artigo 476 da CLT. Portanto, os efeitos da dispensa apenas se concretizarão depois da cessação do benefício.
7. APRESENTAÇÃO DE ATESTADO MÉDICO NO CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO
O contrato de trabalho por prazo determinado é aquele previsto no
§ 2º do artigo 443 da CLT, cuja duração não pode exceder dois anos, em caso de serviços de cuja natureza ou transitoriedade justifique a prede- terminação do prazo, atividades empresariais de caráter transitório e o de experiência, que não pode exceder 90 dias.
Nesses casos, mesmo com a predeterminação do prazo final, é pos- sível a apresentação de atestado médico que ultrapasse tal data, gerando, assim, consequências jurídicas no contrato de trabalho.
3. “... impossibilidade de o empregador dissolver o contrato de trabalho, durante a cessão temporária da obrigação de trabalhar, mesmo que arque com as reparações devidas...” XXXXXX. Xxxxx Xxxxxxxx. Curso de Direito do Trabalho. 5. ed. São Paulo: Ltr, 2009. p. 868.
4. “Durante os afastamentos, ou seja, nas hipóteses de interrupção e suspensão, o emprega- dor não poderá colocar fim ao contrato de trabalho. ” XXXXXXX. Xxxxxxxx. Súmulas, OJs do TST e recursos repetitivos – comentados e organizados por assunto / Xxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxx – 10ª. ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Juspodivm, 2022. p. 280.
ACORDO EXTRAJUDICIAL: MODO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
INDIVIDUAIS TRABALHISTAS
Iara Marthos Águila1
1. INTRODUÇÃO
A homologação de acordo extrajudicial em matéria trabalhista foi introduzida no ordenamento jurídico trabalhista por meio da Lei nº 13.467/2017, denominada Reforma Trabalhista, que inseriu na Conso- lidação das Leis do Trabalho (CLT) os artigos 855-B ao 855-E, Capítulo III-A. Nesse ponto, o legislador adota mecanismo que permite a desjudi- cialização das relações de trabalho com a indicação de solução consen- sual extrajudicial para controvérsias decorrentes do contrato individual de trabalho.
A alteração legislativa acompanha modificações verificadas ao lon- go do tempo nas relações de trabalho e no perfil dos trabalhadores e empregadores. As inovações tecnológicas e seus desdobramentos apli- cados ao sistema de produção promovem mudanças, por vezes profun- das, nas relações de emprego e fazem surgir novos e diferentes conflitos trabalhistas.
No cenário inovador que envolve as relações de trabalho, a solução jurisdicional estatal para os conflitos laborais muitas vezes não satisfaz às necessidades das partes interessadas e envolvidas no conflito, de modo que não consegue alcançar a entrega efetiva e rápida do direito subjetivo previsto no ordenamento jurídico trabalhista. Outras vezes a jurisdição não alcança a especificidade da controvérsia. Nesse contexto, o acordo extrajudicial representa possibilidade de solução de conflito de modo mais célere, eficaz e adequado.
A Lei nº 13.467/2017 estabeleceu requisitos para validar o acor- do extrajudicial, inclusive com previsão sobre a necessidade de sua
1. Doutora e Mestre em Direito; Professora Titular de Direito do Trabalho na Faculdade de Direito de Franca; Advogada Trabalhista.
homologação pela Justiça do Trabalho. Ainda que a previsão legal tenha autorizado e regulamentado o acordo extrajudicial em matéria de direito individual do trabalho, existe resistência de parte da magistratura traba- lhista em reconhecer o alcance amplo do ajuste de vontade em análise, sobretudo em relação a cláusula de quitação geral inclusa no acordo.
A indisponibilidade de direitos individuais trabalhistas e a hipos- suficiência financeira do trabalhador são fundamentos usados com fre- quência para fundamentar a não homologação do acordo ajustado en- tre os interessados ou mesmo para justificar a homologação parcial do acordo, descaracterizando, assim, a vontade dos acordantes. Contudo, citados fundamentos perdem força quando o acordo extrajudicial é xxx- xxxxxx após a extinção do contrato de trabalho e quando comparado com o acordo judicial, ato processual que permite seja afastada a indisponibi- lidade de direitos individuais.
O acordo extrajudicial celebrado entre os interessados e seus ad- vogados, sem vício de vontade e com observância dos requisitos legais, representa solução verdadeiramente consensual e pacífica de conflito, e que, portanto, deve ser homologado pela Justiça do Trabalho nos termos acordados.
2. MODOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
Os conflitos trabalhistas possuem diferentes formas de resolução. No Brasil, os conflitos individuais trabalhistas são predominantemente solucionados pela jurisdição, de modo que a Justiça do Trabalho detém o protagonismo, senão a exclusividade para atuar na solução dos conflitos individuais trabalhistas.
Contudo, conforme aponta Santos2, alguns fatores como a morosi- dade da prestação jurisdicional, o papel político exercido pelos juízes, a explosão da litigiosidade com grande aumento de demandas expressam a existência de crise na administração da Justiça. Soma-se a esse cenário o fato de que, em grande medida, as relações de trabalho se transforma- ram e os trabalhadores em muitos casos possuem perfil diferente daque- le verificado até o final do século XX, sendo assim, é necessário novo
2. XXXXXX, Xxxxxxxxxx xx Xxxxx. Introdução à sociologia da administração da justiça. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 21, nov. 1986, p. 11-44.
olhar e uma nova interpretação para utilização de novos mecanismos de solução das controvérsias, de acordo com Xxxxxxxxxxx e Bryant3.
O Poder Judiciário promoveu e vem promovendo algumas altera- ções na tentativa de tornar a solução da lide mais célere, como na im- plantação de Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas (CEJUSC-JT), no entanto, a mediação e conciliação continuam a ser uma fase do processo judicial trabalhista e não observa a necessida- de de desjudicialização dos conflitos.
O acordo extrajudicial expressa modo de solução de conflito por meio consensual, representando a iniciativa das partes na tomada de de- cisão e na negociação para mais rapidamente resolver de forma segura e justa um conflito. O manejo pelas partes interessadas de métodos al- ternativos à jurisdição estatal para resolver conflitos de interesses surge como alternativa à jurisdição, convivendo com ela sem exclusão entre eles, tanto assim que a jurisdição e os métodos consensuais extrajudi- ciais de solução de conflito devem atuar de maneira complementar e colaborativa.
A Lei nº 13.467/2017, que promoveu significativa reforma na legis- lação trabalhista, caminhou em direção contrária ao posicionamento do Judiciário Trabalhista, concedendo às partes, em dissídios individuais, maior autonomia da vontade na resolução consensual e extrajudicial de conflitos, abrindo uma nova perspectiva para soluções alternativas de conflitos decorrentes das relações de emprego, regulamentando o acordo extrajudicial.
A adoção e regulamentação na seara trabalhista de métodos alter- nativos de solução de conflitos individuais eleva a segurança jurídica e harmonia no ambiente de trabalho para novo patamar, compatível com os desafios que se manifestaram no final da segunda metade do século XX e adentraram no século XXI.
3. XXXXXXXXXXX, Xxxxx; XXXXXX, Xxxxx. Acesso à justiça. Tradução de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxxx. Porto Alegre: Fabris, 1988.
3. ACORDO EXTRAJUDICIAL EM CONFLITO INDIVIDUAL TRABALHISTA
O texto legal expresso no Capítulo III-A (artigos 855-B ao 855-E), da CLT, trata do processo de jurisdição voluntária para homologação de acordo extrajudicial. Conforme ensina Xxxxxxxxxx, enquanto o processo contencioso está voltado para um litígio atual e já deflagrado, o processo voluntário atua para prevenir a lide.4
O processo de jurisdição voluntária (terminologia usada no texto legal) objetiva a homologação de acordo extrajudicial e a alínea f, do artigo 652, da CLT, amplia a competência das Varas do Trabalho para homologar acordo extrajudicial em matéria de competência da Justiça do Trabalho.
A inovação legislativa faculta às partes resolver conflito ou evitar li- tígio por meio de acordo extrajudicial, no entanto, submete o ajuste feito pelas partes (ou interessados) ao Judiciário Trabalhista para ser homo- logado, o que indica que a validade do acordo está condicionada à sua homologação, fazendo emergir a necessidade do processo de jurisdição voluntária.
No que toca à celeuma sobre a natureza da jurisdição voluntária (natureza de jurisdição ou natureza de função administrativa), existem entendimentos diferentes sobre os efeitos da homologação do acordo: parte da doutrina acolhe posicionamento de que a decisão proferida na jurisdição voluntária somente faz coisa julgada formal,5 tendo em vista que não existe lide e nem partes, portanto, não pode existir sentença; outra parte da doutrina6 sustenta que a decisão sobre a homologação tem natureza de sentença e a homologação do acordo faz coisa julgada material, tendo em vista a atividade jurisdicional exercida pelo juiz do trabalho investido na função jurisdicional.
4. XXXXXXXXXX, Xxxxxxxxx. Instituições de processo civil. v. 1. Tradução de Xxxxxx Xxxxxx de Xxxx Xxxxxxx. Campinas: Servanda, 1999, p. 75.
5. XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Curso de direito processual do trabalho. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 207.
6. XXXXXX, Xxxxxxx. Processo de jurisdição voluntária para homologação de acordo extrajudi- cial. In: TUPINAMBÁ, Carolina (Coord.). Soluções de conflitos trabalhistas: novos caminhos. São Paulo: LTr, 2018, p. 231.
O artigo 855-D, da CLT, resolveu a polêmica no âmbito trabalhista, tendo em vista que determina ser sentença a decisão do juiz do trabalho sobre a homologação do acordo extrajudicial. Com isso, da sentença que homologa os termos do acordo não cabe recurso das partes, nos termos do artigo 831, da CLT. Por outro lado, da sentença que não homologa o acordo cabe recurso ordinário.
O juiz do trabalho não está obrigado a homologar o acordo realiza- do extrajudicialmente, assim como não está obrigado a homologar acor- do judicial, no entendimento pacífico do TST exposto em sua Súmula 418, mas a decisão que rejeita a homologação deve ser fundamentada. Os critérios, que devem ser observados pelo magistrado trabalhista para homologar ou não o acordo, não foram expressos no dispositivo legal, o que exige interpretação sistemática e teleológica da Lei nº 13.467/2017 para estabelecer os critérios para a homologação.
A previsão legal determina a obrigatoriedade das partes estarem re- presentadas por advogados diferentes, sendo vedada a representação por advogado comum. Ao trabalhador é facultada a assistência por advoga- do do sindicato da categoria profissional do obreiro.
Após negociação e havendo consenso para o acordo extrajudicial será elaborada petição escrita com os termos do acordo. A petição inicial deve especificar a relação jurídica existente entre os interessados, os da- dos do contrato de trabalho, o objeto do conflito e os termos da solução acordada. A petição inicial deve indicar também o valor total acordado, data e forma de pagamento, bem como outras obrigações assumidas, com a devida discriminação das verbas e valores individualizados que compõem o valor do acordo e multa pelo descumprimento.
De acordo com diretriz do Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região7, a petição inicial deve indicar o valor da causa e, se for o caso, requerimento de justiça gratuita, além de outras informações que os in- teressados entenderem necessárias.
Após elaboração da petição inicial os advogados que representam os interessados devem assinar em conjunto a petição inicial, que será acompanhada de procuração, documentos pessoais e constitutivos (no
7. xxxxx://xx0.xxx0.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxx/x-xxx-0/xxxxxx-xx-xxxxxxxxxxx/xxxxxx-xxxxxxxxxx-
-de-metodos-consensuais-de-solucao-de-disputas-conflitos-individuais.
caso de pessoa jurídica) dos requerentes e outros documentos necessá- rios para a análise do caso pelo juiz do trabalho, como, por exemplo, CTPS e Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho.
Na sequência a petição é distribuída para Vara do Trabalho por um dos advogados atuantes no processo, devendo o advogado do outro inte- ressado habilitar-se no processo para receber as notificações. Distribuí- da a petição do acordo, o juiz tem prazo de quinze dias para analisar o acordo, podendo homologá-lo de plano ou indeferir o pedido de homo- logação. Se o juiz entender necessário, pode designar audiência antes de proferir sentença.
Homologado o acordo e cumpridos seus termos os autos serão ar- quivados. Descumprido o acordo segue a execução de título executivo judicial. Não homologado o acordo os interessados (ou partes) podem interpor recurso ordinário.
A petição para homologação do acordo extrajudicial suspende o pra- zo prescricional dos créditos especificados na petição e somente voltará a correr após o trânsito em julgado da decisão que negar a homologação.
Importante ressaltar que a possibilidade de acordo extrajudicial não afasta a observância do prazo legal para o pagamento das verbas resci- sórias (estabelecido no § 6º, do artigo 477 da CLT) e também não afasta a aplicação de multa prevista no § 8º, do mesmo artigo, para o caso de atraso ou não pagamento das verbas rescisórias.
Na medida em que a previsão legal estabelece requisitos formais de validade do acordo extrajudicial, observados os requisitos legais o acor- do deve ser homologado. No entanto, parte significativa da magistratura do trabalho resiste a homologação de acordo extrajudicial com cláusu- la da quitação geral, com fundamento na indisponibilidade de direitos individuais trabalhistas decorrente da hipossuficiência financeira do trabalhador.
4. ACORDO EXTRAJUDICIAL E INDISPONIBILIDADE DE DIREITOS INDIVIDUAIS TRABALHISTAS
A interpretação dada por grande parte do Judiciário Trabalhista à indisponibilidade de direitos individuais como limitadora da autonomia da vontade das partes acordantes desestimula o acordo extrajudicial, uma
vez que, a vontade dos acordantes por vezes não é validada, tendo em vista a não homologação do acordo que contém cláusula de quitação ge- ral ou mesmo transação de direitos sem correspondente contrapartida.
Os fundamentos apontados para a recusa da homologação não têm previsão legal expressa. Na regulamentação sobre o acordo extrajudicial o legislador estabeleceu apenas uma ressalva para limitar o objeto do acordo: o prazo para pagamento das verbas rescisórias e a aplicação da multa prevista no § 8º, do art. 477, da CLT. É evidente que a higidez da vontade das partes acordantes também é requisito para validar os termos do acordo.
O princípio da indisponibilidade ou irrenunciabilidade de direitos tem como base a natureza de ordem pública dos direitos protetivos dos trabalhadores, sendo este princípio equivocadamente aplicado para afas- tar os efeitos do acordo extrajudicial no que se refere à cláusula de quita- ção geral das obrigações decorrentes do contrato de trabalho.
A indisponibilidade de direitos individuais trabalhistas tem como fundamento a hipossuficiência econômica do trabalhador. Por certo, a dependência econômica do obreiro é motivadora de desigualdade e se verifica ao longo de todo o contrato de trabalho como marca caracte- rística, posto que a necessidade do empregado na manutenção do tra- balho como fonte de subsistência em contraposição à força econômica do empregador detentor do emprego coloca o trabalhador em posição de vulnerabilidade, reveladora do desequilíbrio existente entre as partes contratantes.
A assimetria de forças entre os contratantes se verifica no decorrer do contrato de trabalho e perde força de existência após a extinção da re- lação jurídica laboral estabelecida, tendo em vista o término da situação de subordinação própria dos contratos de emprego.
Em comparação com o acordo judicial, não se verifica a mesma preocupação com a indisponibilidade de direitos no acordo judicial ou na conciliação formalizada no curso do processo de jurisdição conten- ciosa. A conciliação efetuada em juízo tem aceitação pacífica na doutri- na e jurisprudência brasileiras, inclusive com quitação geral do contrato de trabalho, alcançando direitos além das parcelas pleiteadas na petição inicial da reclamação trabalhista. Sendo assim, o magistrado que não homologa o acordo extrajudicial exclusivamente com fundamento na