N° 154
N° 154
Promoção de exportações via internacionalização das firmas de capital brasileiro
Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx e Xxxxx xx Xxxxx Xxxxx
Setembro de 2002
Promoção de exportações
via internacionalização das firmas de capital brasileiro
Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx e Xxxxx Xxxxx Xxxxx
Setembro de 2002
Ref.: Contrato firmado entre o BNDES, FUNCEX e FGV para a elaboração do Projeto “A POLÍTICA COMERCIAL BRASILEIRA: ANÁLISE E PROPOSTAS DE REFORMA”.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 3
2. A DECISÃO DE INVESTIR NO EXTERIOR PARA APOIAR A EXPANSÃO DAS EXPORTAÇÕES: ALGUMAS QUESTÕES CONCEITUAIS 5
2.1. Modelos comportamentalistas 6
2.2. A teoria eclética da internacionalização da firma 8
2.3. As multinacionais dos países em desenvolvimentos 11
2.4. Por que as firmas brasileiras não investem mais no exterior para apoiar suas exportações? 13
3. A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE INVESTIMENTO DIRETO NO EXTERIOR 20
3.1. As tendências do investimento brasileiro no exterior 20
3.2. Revisão dos estudos sobre as decisões de investimentos no exterior das firmas brasileiras 23
3.2.1. O estudo de Xxxxxxx Xxxx (1994) 23
3.2.2. A Pesquisa da Fundação Xxx Xxxxxx – Brasil, Leonel, Arruda e Xxxxxxx (1996) 26
3.2.3. A pesquisa do BNDES (1995) 28
3.3. Análise das características e dos determinantes do investimento no exterior. Resultados da pesquisa realizada entre as firmas exportadoras. 29
4. OS IMPACTOS DO INVESTIMENTO DIRETO NO PAÍS EMISSOR E OS PROBLEMAS DE POLÍTICA PARA ESTIMULAR A INTERNACIONALIZAÇÃO PRODUTIVA DAS FIRMAS 43
4.1. Os impactos no país emissor e os dilemas de política pública 44
4.2. Alguns casos da experiência internacional de apoio ao investimento no exterior 51
5. COMENTÁRIOS FINAIS: ALGUMAS SUGESTÕES DE POLÍTICA PARA PROMOVER A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS FIRMAS DOMÉSTICAS 54
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 58
1. INTRODUÇÃO
Existe um alto grau de insatisfação com o grau de internacionalização das firmas brasileiras. Esta insatisfação com a internacionalização envolve desde a magnitude e a diversificação das operações de exportação até o montante do investimento direto no exterior. É reconhecido que a economia brasileira têm uma baixa relação exportações/PIB, um baixo coeficiente médio de exportação na indústria e uma alta concentração das exportações em um número pequeno de firmas e de produtos. Os investimentos no exterior das empresas brasileiras são relativamente baixos, especialmente quando comparados com empresas coreanas ou de outros países do sudeste asiático ou quando comparadas com alguns países latino-americanos.
A análise da experiência exportadora brasileira indica que a conquista e a manutenção de certos mercados externos podem requerer das firmas exportadoras a realização de investimentos nesses países. Estes investimentos têm sido apontados recentemente como de importante potencial alavancador das exportações e estão relacionados às estratégias das firmas para superarem diversos obstáculos resultantes das características do mercado – barreiras não-tarifárias, institucionais ou culturais –, ou como resultante das características do produto exportado1. Normalmente, além dos gastos para a prospeção do mercado, as despesas consistem em: i) rede de distribuição; ii) o armazenamento do produto e a logística do transporte; e iii) o cumprimento de requisitos técnicos ou de demandas específicas do mercado. Também no caso de outros países, a experiência de internacionalização das firmas indica que o investimento para conquistar novos mercados (market seeking) parece ser importante, e existe consenso que a decisão de investir depende do tipo de produto e das características do mercado.
Normalmente, o investimento no exterior para apoiar as exportações é realizado com fundos próprios ou com financiamento externo (via empréstimos ou colocação de títulos). Mas é muito provável que o funding desse tipo de estratégia seja uma restrição relevante para muitas firmas exportadoras brasileiras, médias e grandes, dada a baixa capacidade de poupança interna de muitas delas, as restrições do mercado de capital doméstico e as dificuldades de aceso ao mercado financeiro internacional. O fato de que o financiamento das necessidades de investimentos em novos mercados tornou-se um instrumento explícito no arcabouço de apoio ao esforço exportador de alguns países de renda média é um reconhecimento da importância deste tipo de investimento e de que o funding pode ser uma restrição relevante para este tipo de operação.
Os objetivos da presente pesquisa são três:
i) Entender melhor porque existe um baixo nível de investimento no exterior das firmas brasileiras, inclusive do tipo de investimento em comercialização e distribuição nos mercados compradores.
1 Apesar de não se dispor de dados quantitativos que permitam avaliar a importância deste tipo de investimento e o seu impacto sobre o valor exportado, estudos de casos de experiências exportadoras voltadas para o mercado americano indicam que, freqüentemente, esses investimentos foram cruciais para a penetração no mercado e para a manutenção e a expansão da clientela.
ii) Analisar a necessidade e a importância da demanda por investimentos de apoio à exportação. Isto implica identificar melhor quem é o demandante potencial deste tipo de investimento: tipo de exportador, tipo de produto/setor e mercados. Procurar-se-á estabelecer também que tipos de investimentos são os mais necessários.
iii) Delinear uma proposta de atuação do Estado no apoio à internacionalização via investimento. Para isto se procurará, por um lado, identificar que tipos de restrições (i.e. financeiras, legais, institucionais), as empresas brasileiras enfrentam para realizar esse tipo de investimento; e, por outro, analisar a experiência internacional de apoio público nessa matéria.
O trabalho estará organizado em quatro seções, além desta introdução. Na segunda seção, se discutem algumas idéias conceituais sobre os determinantes do investimento no exterior, procurando entender porque as firmas se internacionalizam e investem no exterior ou porque, depois de recorrer estágios iniciais na internacionalização, não evoluem para formas de maior comprometimento com o mercado externo. Os condicionantes das multinacionais dos países desenvolvidos são também discutidos, para compreender melhor as limitações das empresas brasileiras. Na terceira seção, a experiência de investimento no exterior das firmas brasileiras é discutida, revisando alguns trabalhos anteriores sobre o tema e analisando os resultados de uma pesquisa especialmente preparada para este estudo. Nesta seção, se discutirá as restrições para a realização dos empreendimentos e os produto/setores com maiores necessidades de investimento no exterior. A quarta seção discute os efeitos do investimento direto sobre a economia do país emissor e os problemas de política que o investimento direto no exterior coloca. Revisam-se algumas experiências internacionais de apoio à exportação e se sugerem algumas linhas básicas de apoio à internacionalização das firmas brasileiras. As questões que se procura responder nesta última seção é se há realmente necessidade de uma política de apoio e que tipo de política seria.
2. A DECISÃO DE INVESTIR NO EXTERIOR PARA APOIAR A EXPANSÃO DAS EXPORTAÇÕES: ALGUMAS QUESTÕES CONCEITUAIS
Nesta seção serão discutidos alguns problemas conceituais sobre a decisão do investimento externo como instrumento de apoio às exportações. Trata-se de entender um momento específico da internacionalização das firmas: a decisão de realizar um investimento em um determinado mercado de destino das exportações para ampliar e fortalecer as vendas nesse mercado.
A decisão de investir em um mercado externo para facilitar as exportações2 deve ser entendida como parte do processo de expansão das vendas externas de uma firma, uma decisão que faz parte do marketing internacional da produção local. A primeira questão desta seção é entender as razões e motivações que levam a uma firma – que exporta através de representantes comerciais externos ou diretamente para um certo importador – a abrir escritórios comerciais, armazéns, centros de distribuição, laboratórios ou montar ou finalizar o produto no mercado de destino.
A análise teórica e aplicada tende a ver esta decisão, que normalmente implica um upgrade no posicionamento no mercado externo, bem como parte de um processo de penetração gradual no mercado externo (ou de evolução da internacionalização da firma) ou bem, como parte da estratégia de transformação da empresa doméstica em multinacional. Esta estratégia de transformação em firma multinacional depende das características da firma, do setor ou do ambiente macroeconômico e legal.
A internacionalização da firma, entendida no sentido amplo de exportar e/ou produzir no exterior, é tratada tanto na literatura de administração e de negócios como na análise econômica. Na área de administração, os modelos dominantes são os “comportamentalistas” (ou teorias sobre o comportamento exportador), que visualizam o processo de internacionalização como um processo gradual ou evolutivo, focando nas razões e características desse gradualismo. Na análise econômica, o paradigma principal é a teoria eclética da internacionalização, que aplica o conceito de custos de transação às decisões de internacionalização da firma. A teoria eclética procura explicar quais características das firmas e dos mercados estimulam a internacionalização da produção de uma firma, diferenciando esse processo em termos das características do produto e dos mercados.
Mas, no caso dos países em desenvolvimento, a grande maioria das firmas exportadoras não tem investimentos no exterior, nem produtivos nem de comercialização. Por exemplo, no caso do Brasil, grande parte das firmas exportadoras, cuja propriedade é majoritariamente brasileira, não passou da fase simplesmente exportadora, sem investimentos em instalações comerciais ou fabris no exterior. A percepção existente é que firmas brasileiras com um alto grau de internacionalização exportadora têm um baixo nível de investimento no exterior. Esta situação pode ser resultado da falta de necessidade para suas estratégias ou resultado de algum tipo de barreira ou restrição.
2 O tipo de investimento que se está analisando consiste basicamente em: escritório comercial, infra-estrutura de logística e distribuição, instalações e serviço de assistência pós-venda, investimentos para o acompanhamento das tendências do mercado e laboratórios e oficinas para o desenvolvimento e adaptação do produto às características do consumidor externo.
Este fato característico do Brasil e de muitos países em desenvolvimento leva à segunda questão desta seção. Por que nem todas as firmas que se internacionalizam via-exportação chegam à etapa de investimento no exterior? Quais são as razões desta falta de investimento? Quais são as barreiras/restrições que afetam a possibilidade de investir?
A seguir se analisarão os modelos comportamentalistas e, depois, se apresentará a “teoria eclética da internacionalização da firma”, procurando identificar os determinantes do processo de investimento para a exportação. Nesta revisão da literatura, se procurará identificar as principais restrições e dificuldades para a expansão da internacionalização das firmas, para passar de uma etapa unicamente exportadora para uma etapa onde se combina exportação, com diversos arranjos para a comercialização, e eventualmente produção. Após da revisão da literatura, se discutirá as aplicações da teoria eclética à análise das firmas multinacionais dos países em desenvolvimento, com o objetivo de assinalar fatores específicos adicionais que podem afetar a trajetória de internacionalização das firmas nesses países. Finalmente, as conclusões levantarão algumas hipóteses explicativas sobre o baixo grau de internacionalização das firmas brasileiras.
2.1. Modelos comportamentalistas
Os modelos comportamentalistas, no campo da literatura de administração, entendem que existem outros fatores, além do econômico, que moldam as decisões das firmas em relação à internacionalização. Estes fatores são de natureza diversa, estando relacionados com o ambiente externo da firma, as características da organização e as atitudes psicológicas dos administradores da firma.
Uma hipótese chave destes modelos é que a internacionalização da firma é um processo gradual, que implica um envolvimento sucessivamente crescente da firma com os mercados externos. Este envolvimento gradual pode tomar, primeiro, a forma de exportação via agentes; depois, passar à exportação via subsidiárias; e, finalmente, chegar à fabricação local no mercado externo. As distintas fases pelas quais passa o relacionamento com o mercado externo indicam um crescente comprometimento de recursos da firma com aquele mercado. As formas organizacionais deste maior envolvimento podem se dar através da formação de joint ventures, licenciamento, ou subsidiárias, tanto para o atendimento comercial como para a produção fabril.
Uma linha importante dentre os modelos comportamentalistas é a escola de Uppsala.3
Na concepção da escola de Uppsala, o processo de internacionalização é gradual porque existem diferenças culturais e distância psicológica entre o exportador, por um lado, e o mercado a ser conquistado, pelo outro. Estas diferenças ou distâncias geram incertezas sobre os resultados das transações e só podem ser diminuídas através do conhecimento da outra cultura. O processo de conhecimento do mercado externo é gradual e, principalmente, empírico. A firma deve aprender a outra cultura pela experiência no próprio mercado. Na medida que a firma vai conhecendo o mercado externo,
3 O principal autor da escola de Upssala é Xxxxxxxx. Para uma análise representativa da escola, veja-se os trabalhos de Xxxxxxxx e Xxxxxx (1977, 1990).
entendendo as características da outra cultura, diminuem as incertezas iniciais e, desta maneira, pode aumentar o comprometimento de recursos nesse mercado.
Para a escola de Uppsala, o processo de internacionalização tem duas características básicas: conhecimento do mercado e comprometimento de recursos. Para avançar nesse processo, a firma deve se envolver em atividades comerciais (que lhe permitem conhecer) e tomar decisões de comprometimento de recursos. Os escritórios comerciais, subsidiárias comerciais e fabris indicam uma seqüência de maior comprometimento de recursos, como resultado do maior conhecimento.
Na mesma linha, Cavusgil (1980) considera que o padrão gradual de internacionalização decorre das maiores incertezas, dos custos de informação mais elevados e da falta de conhecimento empírico em atividades de marketing no exterior, especialmente para empresas médias e pequenas. A exportação teria as características de uma inovação para a firma, pois há nesta atividade, tal como na pesquisa e desenvolvimento, uma grande incerteza, que só pode ser reduzida gradualmente através do conhecimento, fruto da própria experiência exportadora. Na medida que a firma reduz a incerteza com a experiência e o conhecimento adquirido na atividade, esta pode comprometer mais recursos.
Uma das principais críticas à escola de Uppsala é que é muito determinista, não reconhecendo que a firma pode se manter em um determinando estágio e não evoluir, assim como pode fazer uma escolha estratégica diferente quanto aos modos de entrada e expansão no mercado internacional. Em uma critica à consistência teórica dos modelos, Xxxxxxxx (1993) considerou estes modelos como conceitual e metodologicamente insuficientes. Questões do tipo por que o processo acontece (ou não acontece), ou como predizer a passagem de um estágio da internacionalização para o seguinte não estariam adequadamente tratadas.
Os modelos comportamentalistas não explicam suficientemente porque as firmas podem não evoluir da maneira prevista, quais seriam as restrições e as dificuldades para avançar na trajetória esperada de internacionalização. Para explicar esta indeterminação, estes modelos argumentam que não existe um tempo padrão entre o início da exportação e o investimento no exterior. A falta de investimento (ou comprometimento de recursos) de muitas firmas pode refletir simplesmente a continuação das incertezas sobre o mercado, ou a não redução da distância psicológica e cultural.4
Mas as decisões de investimento no exterior parecem estar também relacionadas com as características dos ativos e do produto da firma. As teorias da internacionalização que enfatizam esses fatores, assim como custos de transação e imperfeições nos mercados, podem ajudar a entender a não evolução das firmas para a fase de investimento no exterior.
4 As restrições para o investimento nos mercados externos não são muito discutidas nesta literatura. Há, sim, uma discussão das dificuldades de internacionalização das firmas, não tanto pelos aspectos financeiros, mas pelas questões culturais, ambientais, de distância psicológica.
2.2. A teoria eclética da internacionalização da firma
A teoria eclética da internacionalização da firma foi desenvolvida principalmente por Dunning5 e procura explicar a decisão de produzir ou não em um mercado externo. Os autores desta abordagem entendem que determinadas falhas de mercado (custos de informação e transação, oportunismo dos agentes e especificidades de ativos) levariam uma empresa a utilizar o investimento direto ao invés de licenciamento ou da exportação, como modo de entrada em um mercado externo. Uma empresa utilizaria o investimento direto como modo de entrada quando dispusesse de vantagens diferenciais com relação a outras firmas e desejasse proteger tais vantagens utilizando-se de sua própria estrutura. Para entender a decisão de produção internacional, deve-se adicionar o condicionamento criado por algumas variáveis estruturais e conjunturais, tais como: características do país e da indústria, assim como variáveis operacionais e estratégicas específicas da firma.
Uma empresa pode contar com três tipos de vantagens diferenciais: as de propriedade, as de internalização e as de localização. As vantagens de localização (L) são as oferecidas por um país ou região determinados. As vantagens de propriedade (ownership, O) ou de capacidades próprias desenvolvidas pela organização são as que lhe permitem posicionar-se relativamente melhor no mercado estrangeiro quando comparada com os produtores locais ou outros produtores estrangeiros. Se os custos de incorporação e organização produtiva são menores que os custos de transação6 associados à transferência dessas capacidades a um produtor local – (as chamadas vantagens de internalização, I), a firma investirá na produção nesse mercado.
As vantagens de propriedade (O) de uma firma podem ser de natureza estrutural, derivada da posse de ativos intangíveis (patentes, marcas, capacidades tecnológicas e de management, habilidade para a diferenciação de produtos)7, e/ou de natureza transacional, derivada da capacidade de hierarquia, decorrentes do common governance de atividades diversas que resultam da própria característica multinacional da empresa.
A exploração dessas vantagens de propriedade em terceiros mercados pode ser feita de diversas maneiras. Uma opção é a exportação os bens e serviços que produz desde seu país de origem. Uma segunda opção é conceder licenças de produção desses bens a outras firmas instaladas nos terceiros mercados. Uma terceira opção é internalizar essas vantagens de propriedade, instalando plantas próprias em outros mercados. A escolha depende de uma análise de custos e benefícios entre as distintas alternativas. As opções são afetadas por um conjunto de fatores, tais como: forma de concorrência no setor, grau de imperfeição da informação disponível no país de destino, o nível de proteção e enforcement dos direitos de propriedade, as características do país emissor e receptor do investimento e a variedade e tipo de produtos que a firma pretenda produzir no mercado externo.
5 Além de Xxxxxxx (1980,1988), outros autores da teoria eclética da internacionalização da firma foram Xxxxxxx e Xxxxxx (1976) e Xxxxxx (1981).
6 Os aspectos envolvidos nos custos de transação seriam relativos a variáveis do ambiente (incerteza e complexidade) e a variáveis do comportamento humano (racionalidade limitada e oportunismo). A racionalidade limitada poderia implicar dificuldade de comunicação entre as partes em uma transação, particularmente se esta ocorresse entre culturas distintas. O oportunismo pode surgir quando o controle sobre o contrato é imperfeito. A empresa pode preferir internalizar para evitar o oportunismo.
7 Muitos destes ativos intangíveis estão associados a práticas tecnológicas e internas das firma.
Dado um determinado contexto legal e econômico, a decisão de produzir no exterior, ao invés de licenciar ou exportar, está fortemente influenciada pela natureza dos ativos intangíveis. Alguns ativos intangíveis, especialmente os que resultam das práticas tecnológicas, de management, ou de comercialização da firma, são conhecimento implícito, que a firma pode usar, mas não vender nem licenciar8. Este tipo de ativos intangíveis estimula o investimento na produção internacional da firma.
Os motivos para que a firma deseje internalizar um mercado de insumos ou de produtos – ou seja que deseje produzir em lugar de comprar ou vender9 – podem ser: i) risco e incerteza; ii) obtenção de economias de escala; iii) aqueles decorrentes do fato de uma transação de bens ou serviços poder produzir custos e benefícios externos àquela transação, que não se refletiriam nos termos negociados pelas partes envolvidas. A firma internaliza, decide produzir, para obter economias de escala ou para reduzir custos de transação e coordenação, resultantes da incerteza e da existência de externalidades.10
Da mesma forma que os ativos intangíveis, resultantes do conhecimento implícito, a existência de vantagens de localização também favoreceria a produção local ao invés da exportação ou licenciamento. Algumas das vantagens de localização são: abundância de recursos naturais (importam, neste caso, a magnitude, o custo e a qualidade dos recursos) e de recursos humanos, know how tecnológico, infra- estrutura, instituições, tamanho do mercado, estabilidade política e econômica, o regime cambial e o esquema de política econômica.
Como uma maneira de ordenar as inúmeras alternativas que podem surgir das diferentes combinações de vantagens de propriedade, de internalização e de localização, Dunning (1988) classifica o investimento estrangeiro em quatro grandes tipos, de acordo com o objetivo principal do investimento: resource based, market based, rationalized specialization (efficiency based) e trade and distribution. Na Tabela 2.1 pode se observar quais são as vantagens de propriedade, localização e internalização que são necessárias para cada tipo de investimento. A tabela mostra também que tipo de produto/setor combina com mais freqüência essas vantagens, originando cada um dos tipos de investimento direto.
Os dois tipos de investimento que este trabalho está interessado em analisar são os tipos trade and distribution e market based. No primeiro caso, trata-se de um investimento fundamentalmente comercial, cujo objetivo seria, no caso da exportação, colocar melhor os produtos no mercado de destino. As vantagens de propriedade necessárias para este tipo de investimento não seriam muito sofisticadas: acesso aos mercados e a disponibilidade de produtos a distribuir. A vantagem de internalização estaria em evitar a misrepresentation do agente comercial (oportunismo do agente e proteção da qualidade do produto final) e garantir um fluxo adequado de vendas (controlar diretamente as cadeias de distribuição).
8 A venda e licenciamento desses ativos estão sujeitos a diferentes falhas de mercado, dificultando a captura da rentabilidade desses ativos e facilitando os comportamentos oportunistas dos licenciados ou compradores.
9 Nesse caso, a firma vai produzir no mercado externo ao invés de exportar desde o mercado doméstico.
10 Dunning (1988) menciona outros fatores de internacionalização, tais como: a necessidade do vendedor de proteger a qualidade do produto final, evitar ou usufruir as políticas governamentais (política comercial, tributária e de preços) e controlar cadeias de distribuição no mercado de destino.
Esse tipo de investimento seria feito perto do mercado consumidor e onde fosse mais conveniente para realizar os serviços de pós-vendas do produto. O tipo de produto que requereria este tipo de investimento seria aquele que por suas características necessita manter contato com os consumidores finais ou sua oferta no mercado de destino é dependente de serviços adicionais.
Tabela 2.1
Classificação dos Investimentos Diretos das Empresas Multinacionais
Tipos de Investimento | Vantagens de Propriedade (O por que da atividade multinacional) | Vantagens de Localização (Onde será feita a atividade multinacional) | Vantagens de Internalização (Como será feita a atividade) | Tipos de Produto/Setor |
1. Resource Based | Capital, tecnologia, accesso a mercados; ativos complementários | Possessão de recursos naturais infra-estrutura adequada; Mão de obra não qualificada e abundante | Estabilidade da oferta a preços certos; controle dos mercados; dominio da tecnologia | Petróleo, cobre, bauxita, bananas, cacau, hoteis, produção para exportação de bens intensivos em mão de obra não qualificada |
2. Market Based | Capital, tecnologia, informa- ção, habilidades organizacio- nais e administrativas; excesso de P&D , economias de escala Trade marks e goodwill | Custos de materiais e trabalhis- tas; caract do mercado; politicas governamentais; custos de transporte | Reduzir custos de transacção e informação e incertezas do comprador; proteger direitos de propriedade e qualidade | Informática, produtos farmacéuticos, veículos auto- motores, cigarros, seguros, publicidade |
3. Rationalized Specialization (efficiency) a) Produtos b) Processos | As mesmas que no caso 2, mais accesso a mercados; economias de escopo e diversi ficação geográfica | a) economias de especialização do produto e concentração; b) Baixos custos trabalhistas, incentivos para a produção local | a) as mesmas que as do tipo 2, mais ganho de economias de common governance b) economias de integração vertical | a) veículos automotores, aparelhos elétricos, serviços de negócios e P&D b)eletrônica de consumo, texteis e vestuário, indústria fotográfica e farmaceutica |
4. Trade and distribution (import and export merchating) | Accesso a mercados; produtos para distribuir | Fonte de insumos e mercado local; necessidade de estar perto dos consumidores; serviços pós-vendas | Necessidade de proteger a qua- lidade dos insumos; necessidade de garantir as vendas e necessi dade de evitar misrepresentation do agente | Uma grande variedade de produtos, particularmente os que requerem contato com sub-contratistas ou consumi- dores finais |
Fonte: Dunning (1988)
O tipo de investimento market based é um investimento produtivo realizado com o objetivo de explorar o mercado doméstico do país receptor do investimento. Os requerimentos de vantagens de propriedade são bem maiores do que no caso do investimento trade and distribution. A firma precisaria contar com capital, tecnologia, habilidades organizacionais e administrativas, uma marca diferenciada no mercado e uma clientela cativa. É possível para uma firma diferenciar sua marca e obter uma clientela cativa no processo de vender via exportações, mas para produzir no mercado de destino precisa de vantagens proprietárias adicionais, para compensar os custos adicionais da internalização. As vantagens de internalização seriam as usuais: redução de custos de transação, proteção dos direitos de propriedade e manutenção da qualidade do produto. As vantagens de localização estariam relacionadas com os custos de produção no mercado de destino (materiais e trabalhistas), as características dos mercados (do país emissor e receptor), as políticas governamentais e os custos de transportes. Alguns exemplos de indústrias onde se requereriam este tipo de investimento são: informática, produtos farmacêuticos, veículos automotores, cigarros e publicidade.
O investimento market seeking – e em menor medida o tipo trade and distribution – permite não só o acesso a um mercado determinado, mas também facilita a expansão das vendas, pois permite: i) adaptar produtos aos gostos locais; ii) melhorar as relações com os usuários que necessitam bens adaptados a necessidades específicas; e iii) projetar uma imagem de “corporação local”.
Em indústrias onde os gostos e modas mudam rápida e sistematicamente, o investimento efficiency based ou market seeking pode permitir a atualização da firma em relação às tendências do mercado. Isto também pode melhorar as capacidades de desenho e atualização da firma.
Segundo a teoria eclética, uma firma vai continuar o seu processo de internacionalização – passando a produzir no mercado de destino – se possuir vantagens proprietárias, que façam necessário ou vantajoso internalizar mercados.11 Podemos esperar, então, que em indústrias onde os ativos proprietários intangíveis sejam importantes, será possível encontrar um número importante de firmas multinacionais. Igualmente, países com infra-estrutura e desenvolvimento tecnológicos, que propiciem a criação de vantagens de propriedade, tenderão a ter um número maior de firmas com investimentos produtivos no exterior. Por outro lado, firmas sem vantagens proprietárias muito sofisticadas não terão incentivos para internalizar mercados e localizar a produção em outros mercados. Assim, essas firmas deterão seu processo de internacionalização na etapa exportadora ou, no máximo, realizarão alguns investimentos no exterior para comercializar o produto feito no mercado doméstico.
A teoria eclética coloca, então, uma questão importante para a discussão da formação de multinacionais brasileiras. Para produzir no exterior é necessário ter vantagens de propriedade. Sem vantagens de propriedade muito significativas, as falhas de mercado e a existência de custos de transação não justificariam a internacionalização da produção. Por que haveria necessidade de internalizar mercados e de integrar a produção para frente, sem ativos específicos a proteger?
2.3. As multinacionais dos países em desenvolvimentos
Se segundo a teoria eclética, a existência de vantagens de propriedade (ativos específicos) da firma é crucial para a internacionalização da produção, quais poderiam ser essas vantagens das firmas nos países em desenvolvimento (PED), que permitiriam investir e concorrer em outros países.
Xxxxxxxxxx e Xxxxx (1999) assinalam que existem dois tipos de explicações para a existência de firmas multinacionais dos PED. Por um lado, a explicação de tipo microeconômica, que enfatiza a aprendizagem tecnológica das firmas, processo este que permitiria o desenvolvimento de algumas vantagens proprietárias específicas. Por outro lado, a explicação macroeconômica, que vincula as etapas de desenvolvimento econômico do país com a condição de receptor e emissor de investimento estrangeiro direto. O desenvolvimento econômico de um país permitiria a expansão das vantagens proprietárias das firmas, mudando gradualmente, tanto os setores dentro do país que emitiriam investimento, quanto os países de destino desse investimento (primeiro outros PEDs e, posteriormente, países desenvolvidos).
Dentre as explicações microeconômicas, parece relevante para a experiência brasileira, a idéia12 de que as firmas dos PED poderiam desenvolver certas habilidades ou ativos especiais, aprendendo e desenvolvendo a partir de tecnologias difundidas, assim como conhecimentos especiais de marketing ou habilidades gerenciais. Estas vantagens, mais a capacidade para adaptar produtos para as condições
11 Neste caso, a firma internaliza para frente – o mercado de exportação –, passando a produzir no mercado de destino, protegendo os direitos de propriedade sobre seus ativos específicos (e intangíveis) e a qualidade de seus produtos.
12 Xxxxxxx Xxxxxxxxxx e Xxxxx (1999), Lall (1983) seria o autor representativo desta explicação e este desenvolvimento analítico seria resultado da experiência da segunda onda de investimento direto dos PED, quando as firmas dos PED concentraram investimentos em países de igual nível de desenvolvimento.
dos PED e para operar no ambiente desses países, permitiriam a algumas firmas dos PED internacionalizar sua produção, principalmente, em outros países do mesmo nível de desenvolvimento. Com este tipo de vantagens proprietárias, seria muito difícil operar nos países desenvolvidos (PD), a não ser em joint ventures com firmas de maior capacidade tecnológica, de maneira a poder operar nas mesmas condições das firmas locais.
Xxxxxxxx e Xxxxxxxxx (1990) formularam uma outra justificativa microeconômica para a expansão multinacional da firma dos PED.13 A explicação destes autores reconhece que muitos PEDs teriam um estágio tecnológico mais avançado que a simples adaptação de tecnologias difundidas. A gradual transformação da estrutura industrial de um conjunto de PEDs teria resultado na expansão de competências tecnológicas genuinamente inovadoras de um número importante de firmas, através de distintas formas de aprendizagem e do próprio processo de internacionalização. Estas vantagens proprietárias permitiriam às firmas dos PED investir, não somente em outros PEDs, mas também nos PDs e em setores tecnologicamente mais complexos.
A explicação macroeconômica foi desenvolvida por Xxxxxxx (1988) e Xxxxxxx et alt (1997). A relação entre investimento direto estrangeiro (IDE) emitido e recebido em um PED passa por uma série de etapas a medida que a economia se desenvolve, em um “caminho de desenvolvimento dos investimentos” (CDI), que poderia ser caracterizado pela existência de cinco etapas.
Na primeira etapa do CDI, o país é muito pouco desenvolvido para atrair investimento direto e as firmas locais não têm vantagens proprietárias de nenhum tipo para poder investir no exterior. Na segunda etapa, um grau maior de desenvolvimento possibilita atrair investimento direto, enquanto que o desenvolvimento – em alguns setores de bens de consumo ou de baixo grau de diferenciação – de vantagens país-específicas,14 permitem a emissão de investimento resource e market based, em países vizinhos ou outros países em desenvolvimento. Estes PEDs receptores ofereceriam, normalmente, vantagens de localização como resultado da alta proteção.
Na terceira etapa do processo, se o país perseguir uma estratégia de relativo isolamento, a emissão do IDE será pouca, porque o governo estimulará o investimento doméstico, devido aos problemas de balanço de pagamentos. Se o país se inserir mais abertamente na economia mundial, as firmas podem continuar desenvolvendo vantagens proprietárias país-específicas e, também, em atividades inovativas.15 Os destinos do investimento continuam sendo os países vizinhos (ou a região) e outros PEDs, mas as firmas começam a ter uma base mais global. Há também investimentos para PD em atividades comerciais ou montagem de produtos.
Na quarta e quinta etapa, as firmas desenvolvem vantagens proprietárias firma-específicas (tecnologia, capacidade de diferenciação de produto, know how em marketing, habilidades gerenciais para organizar a
13 Esta explicação, segundo Xxxxxxxxxx e Xxxxx (1999), seria uma racionalização da experiência mais recente das firmas multinacionais dos PED, com investimentos nos PD e em setores mais complexos,
14 Alguns exemplos de vantagens proprietárias país-específicas, na segunda etapa seriam: tecnologia e management adaptados ao grau de desenvolvimento e insumos de baixos custos (incluídos os gerenciais e técnicos).
15 Alguns exemplos de vantagens proprietárias, na terceira etapa do CDI: capacidade de diferenciação de produto, habilidades de marketing, controle sobre o mercado de insumos e produtos.
atividade multinacional). Os setores emissores de investimento direto seriam mais capital e conhecimento- intensivos e os países-destino seriam dependentes das estratégias das multinacionais locais.
As fases de Xxxxxxx et alt (1997) guardam correspondência com as ondas de investimentos das firmas dos PEDs observadas pelos especialistas. Na primeira onda de investimentos de firmas dos PEDs, as vantagens proprietárias eram basicamente país-específicas, como resultado da adaptação de tecnologias às condições de alta proteção e mercados reduzidos. Isto permitia a estas firmas investir em outros PEDs, também fechados, usufruindo as vantagens de localização resultantes da proteção.16
A segunda onda de investimento dos PEDs já esteve associada com vantagens firma-específicas, como resultado do desenvolvimento econômico e tecnológico dos PEDs e pelas próprias políticas de estímulo ao desenvolvimento industrial. Estes investimentos se dirigiram tanto para os PEDs, como para os PDs. Neste último caso, os investimentos procuravam não só mercados, mas também a obtenção de ativos específicos (strategic asset seeking) para melhorar os ativos proprietários .
Segundo Xxxxxxx et alt (1997), as reformas estruturais tiveram um papel importante para melhorar as vantagens proprietárias e para obrigar as firmas locais a serem competitivas globalmente. A liberalização comercial obrigou as firmas a competir globalmente, pois reduziu seus market-shares no mercado doméstico, obrigando-as a exportar e a investir no exterior. Mas, dada a debilidade das firmas dos PEDs
– uma base de vantagens competitivas deficientes em matéria de ativos intangíveis –, as firmas devem reforçar suas vantagens proprietárias, associando-se com detentores de tecnologia, investindo no mercado doméstico e no exterior, buscando ativos intangíveis.
A análise das multinacionais nos PEDs mostra que a criação e o desenvolvimento de vantagens proprietárias específicas – necessárias para justificar o processo de investimento no exterior – pode ser um processo gradual, que depende da própria história da firma, mas que está muito influenciado pelas políticas domésticas, basicamente a política educacional e a tecnológica, assim como a política comercial e de concorrência. O investimento direto no país pode ajudar à internacionalização das firmas domésticas na medida que contribua ao desenvolvimento de ativos proprietários específicos destas firmas.
2.4. Por que as firmas brasileiras não investem mais no exterior para apoiar suas exportações?
O grau de investimento no exterior das firmas de um país está associado ao grau de desenvolvimento desse país, ao ambiente de estímulo para o desenvolvimento de ativos proprietários específicos e às características da sua oferta doméstica.
Nos modelos comportamentalistas, a internacionalização produtiva das firmas é o resultado de uma seqüência onde a firma reduz incertezas em relação ao mercado externo e pode, portanto, comprometer recursos. Na teoria eclética da internacionalização, o investimento produtivo no exterior é uma escolha que depende de condições necessárias (existência de vantagens proprietárias), mas que está
16 Com a abertura comercial, as vantagens baseadas na adaptação de tecnologias obsoletas perderam relevância, porque as firmas devem concorrer com as firmas dos PDs.
condicionada pela existência de outras vantagens e do contexto econômico – legal onde a firma está inserida.
O interessante do enfoque da teoria eclética é que coloca em discussão um vasto conjunto de condicionantes da internacionalização das empresas. Não há um destino de investimento pré- determinado para a empresa exportadora que se inicia como exportadora. Para investir no exterior, o exportador, além de reduzir incertezas, deve ter condições e deve ser estimulado pelo contexto econômico-legal no país emissor e no país receptor. Esses estímulos mudam com o grau de desenvolvimento do país, com o grau de concorrência no mercado doméstico e com o marco jurídico.
As políticas tecnológicas e as políticas educacionais domésticas são decisivas para o desenvolvimento de ativos proprietários firma-específicos e, portanto, são instrumentos chaves para a internacionalização produtiva das firmas. Mas, a política comercial e a de concorrência não são menos importantes para criar incentivos para a internacionalização. Por exemplo, em muitos países, incluído o Brasil, as reformas estruturais recentes contribuíram para aumentar o processo de internacionalização das firmas ao forçar a procura de novos mercados e de novos ativos específicos que permitiriam enfrentar a concorrência internacional.17
Mas, o investimento tipo trade and distribution não requer grandes vantagens proprietárias específicas. Por que, então, as firmas brasileiras exportadoras apresentam baixos níveis deste tipo de investimento? A falta desse investimento não pode ser atribuída exclusivamente ao baixo grau de desenvolvimento nem às falências da política de estímulos à inovação tecnológica de um país. No caso brasileiro, a insuficiência de investimentos no exterior para apoiar exportações parece estar fortemente relacionada a três razões: i) ao processo macroeconômico, que afetou a taxa de investimento global da economia; ii) a algumas características da exportação; e iii) ao baixo coeficiente exportação-vendas da maioria dos exportadores brasileiros de manufaturas.
O desempenho macroeconômico do Brasil afetou fortemente a internacionalização das empresas brasileiras. Em primeiro lugar, o ambiente macroeconômico que viveu o Brasil entre 1980 e 1994 foi altamente instável, afetando as decisões de exportar e de investir dentro e fora do país. Os planos de estabilização que se sucederam nesse período tinham como característica central diminuir os incentivos para exportar ao apreciar a taxa de câmbio real ou ao ampliar, ainda que temporariamente, o mercado doméstico. Todos os planos de estabilização contraíram as quantidades exportadas de manufaturados e desaceleram o quantum de semimanufaturados. O Plano Real combinou de forma expressiva as duas características dos planos de estabilização anteriores, deprimindo fortemente as exportações em 1995, mas o sucesso da estabilização e o ambiente competitivo criado pela liberalização comercial mantiveram os incentivos para a conquista e a defesa dos mercados externos.18
17 Ao respeito, veja-se as conclusões do Goulart et alt (1994) e Xxxxx (2001) sobre o papel da liberalização comercial na internacionalização das empresas brasileiras.
18 A partir de 1996 e até 1998, os quantuns exportados de todos as classes de produtos voltaram a crescer a taxas expressivas. No caso de manufaturados, a taxa média anual do quantum exportado situou nas proximidades de 6%.
O contexto macroeconômico não só alterou reiteradamente os incentivos para exportar e se internacionalizar, mas também reduziu o mercado de capitais e de crédito e gerou uma incerteza muito forte sobre o futuro dos preços relativos. Financiamento e relativa estabilidade de preços relativos são pré-condições para o investimento. As firmas brasileiras não tiveram essas pré-condições e, portanto, investiram pouco no plano doméstico, na década de oitenta e na primeira metade dos anos noventa. A contrapartida disto foi uma magnitude de investimento no exterior pouco expressiva para o tamanho da economia brasileira.
Na segunda metade dos anos noventa, a estabilização trouxe a possibilidade de traçar um horizonte de médio prazo para os preços relativos, mas subsistiram os problemas de financiamento, pela impossibilidade de criar um mercado de financiamento de longo prazo para as empresas. O mercado financeiro internacional foi uma alternativa para as firmas grandes e algumas médias, mas certamente não foi um recurso possível para a maioria das firmas médias e as pequenas. No mercado doméstico, os recursos financeiros de longo prazo foram, basicamente, ofertados pelo BNDES e o mercado de capitais continuou estreito e fechado para as firmas médias e pequenas. Isto afetou o processo de investimento na economia local e as possibilidades de expansão no exterior. Apesar de contar com um requisito essencial, a estabilidade, a economia brasileira não conseguiu eliminar uma restrição existente ao processo de investimento, criando mecanismos de poupança de longo prazo que pudessem ser utilizados como funding do processo de ampliação da capacidade produtiva.
O segundo fator que dificulta o processo de investimento está relacionado com algumas características da estrutura das exportações brasileiras. As características são os tipos de produtos exportados, a origem do capital dos exportadores nos setores onde são necessários investimentos e a concentração de destinos.
Em relação ao tipo de produto exportado, a pauta está concentrada em poucos produtos, muitos deles com características homogêneas, ou seja, sem marcas ou especificidades que demandem instalações no exterior para controlar a qualidade e evitar “misrepresentation” do agente comercial/importador ou para realizar serviços de pós-venda. Normalmente, são vendidos a clientes com contratos de longo prazo – contendo especificações de qualidade e preço do produto – ou a “dealers” que atuam no Brasil ou no país de destino. Estas são as características de um conjunto muito representativo das exportações brasileiras, formado pelos produtos do complexo soja, café, açúcar, fumo, minério de ferro, alumínio, celulose e pasta e semimanufaturados de ferro e aço. No ano 2000, este conjunto representava aproximadamente 30% das exportações, um grau de participação já significativo, mas que pode ser ainda maior em um momento de recuperação de preços internacionais de commodities primárias e industrializadas.
Os bens de consumo, os bens intermediários diferenciados (auto-peças, laminados e fundidos de aço, outros produtos metalúrgicos) e os bens de capital requerem investimento no exterior para formar redes de serviços de pós-vendas, fornecer peças de reposição ou para estar próximos do cliente, com o objetivo de adaptar o produto às necessidades do mercado. Como se verá no próximo capítulo, no caso dos bens de capital e dos bens intermediários diferenciados, os exportadores avançaram na instalação de unidades de trade and distribution no exterior.
No caso dos bens de consumo semi-duráveis e não duráveis, os produtores necessitam de investimentos no exterior se sua estratégia de penetração privilegiar a marca e a diferenciação do produto. Se este não for o caso, normalmente, os produtos são vendidos para um atacadista ou uma rede de varejo, que coloca a marca e distribui. Um exemplo desta última alternativa foram os calçados, o produto mais representativo da pauta exportadora de bens de consumo semi-duráveis. Os produtores de calçados utilizaram, pelo menos até recentemente, uma estratégia baseada no preço, operando com marcas de terceiros ou de grandes distribuidores. Só marginalmente, em mercados latino-americanos, os produtores de calçados se aventuraram com marcas próprias. Pode-se observar, no entanto, uma mudança de estratégia recente, com esforços de utilizar redes de distribuição com marca própria. Um outro exemplo da baixa diferenciação dos bens de consumo não duráveis é o caso da carne.
Os bens duráveis com mais peso na pauta são os automóveis, cuja produção e comercialização está em mão de firmas multinacionais estrangeiras. A indústria de auto-peças comercializa seus produtos dentro de redes internacionais de produção e fornecimento.19
O exemplo de automóveis nos leva a uma outra característica que pode ter ajudado a inibir o investimento dos exportadores no exterior: a origem do capital das firmas exportadoras nos setores de bens intermediários, de bens de capital e de bens de consumo. Uma alta participação de firmas estrangeiras na exportação não estimula os investimentos no exterior pois estas firmas utilizam a rede de distribuição e atendimento ao cliente das filiais no mercado de destino ou da matriz. Xxxxxxx (1999) analisou o desempenho exportador das firmas estrangeiras vis-a-vis as firmas nacionais, entre 1995 e 1997.
A Tabela 2.2 mostra a participação das firmas com controle estrangeiro no total exportado por setor da CNAE a dois dígitos. A conclusão que pode se extrair da tabela é que na maioria dos setores onde é preciso o investimento no exterior para apoiar as vendas externas, a participação de firmas estrangeiras é muito forte. Por exemplo, a participação do capital estrangeiro foi significativa nos setores produtores de máquinas e equipamentos, indo de 60% até 80% das exportações e em veículos automotores.
Alternativamente, nos setores onde a necessidade de investimento no exterior para apoiar as exportações é relativamente menor, a preponderância das firmas brasileiras entre os exportadores brasileiros foi maior, como nos casos de três setores exportadores de commodities industriais: metalurgia básica, papel e celulose, e alimentos e bebidas.
Finalmente, existem setores produtores de bens intermediários diferenciados – produtos de metal, de papel e da madeira, minerais não metálicos e produtos têxteis – e de bens de consumo – vestuário, calçados, móveis e alimentos – onde haveria necessidade e possibilidade de investimento. Isto porque estes produtos necessitam de investimentos em logística e serviços próximos ao cliente no mercado de destino, e porque os exportadores, segundo o estudo de Moreira (1999), foram preponderantemente firmas nacionais.
19 Nesta setor estavam os exemplos mais significativos de internacionalização de produtores industriais na década de oitenta e noventa. Os estudos de internacionalização da FUNCEX foram majoritariamente de empresas deste setor. Na década de noventa muitas dessas empresas nacionais foram vendidas para firmas estrangeiras.
Tabela 2.2
Participação das Empresas Estrangeiras no Total das Exportações da Indústria de Transformação – 1995-1997
(%)
Setores CNAE | 1995 | 1996 | 1997 | Var. 95/97 |
Produtos Têxteis | 15,2 | 13,9 | 20,6 | 35 |
Produtos Químcos | 38,9 | 43,1 | 43 | 10,5 |
Metalurgia Básica | 12,3 | 12 | 12,5 | 2,2 |
Produtos de Metal | 44,3 | 48,9 | 49,8 | 12,4 |
Máquinas e Equipamentos | 64,5 | 61,6 | 65,7 | 1,8 |
Máquinas para Escritório e Informática | 71 | 82,5 | 86 | 21 |
Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos | 78 | 81,8 | 80,9 | 3,7 |
Material Eletrônico e de Comunicações | 84,8 | 83,9 | 80 | -5,6 |
Instrumentos Médico-Hospitalares, | ||||
de Precisão e Óticos | 79,5 | 86 | 85,3 | 7,2 |
Veículos Automotores | 83,1 | 83,9 | 85,8 | 3,3 |
Outros Equipamentos de Transporte | 26,4 | 25 | 6,3 | -76,3 |
Vestuário e Acessórios | 19,4 | 24,4 | 26,6 | 36,8 |
Couros e Calçados | 3,3 | 3,3 | 3,7 | 13,3 |
Celulose, Papel e Produtos de Papel | 14,2 | 14,8 | 14,5 | 2,3 |
Editorial e Gráfica | 5,3 | 5,8 | 8,3 | 57,9 |
Móveis e Indústrias Diversas | 19 | 22,2 | 24,6 | 29,4 |
Alimentos e Bebidas | 14,7 | 14 | 22,7 | 54,3 |
Fumo | 95,3 | 95,6 | 92,2 | -3,2 |
Produtos de Madeira | 10 | 12,5 | 8,8 | -12,8 |
Borracha e Plástico | 68,6 | 71,5 | 71,5 | 4,1 |
Minerais não Metálicos | 22,7 | 25,7 | 23,3 | 2,7 |
Média Geral | 41,5 | 43,4 | 43,4 | 9,5 |
Fonte: Xxxxxxx (1999).Tabela 13
Adicionalmente às características mencionadas da pauta exportadora (concentração, tipo de produto e origem dos exportadores/tipo de produto), a distribuição dos destinos das exportações de manufaturados, em particular, e das exportações, em geral, é muito concentrada. Os mercados de produtos manufaturados eram, até muito pouco tempo atrás, muito concentrados nos Estados Unidos e na Argentina. Isto implica que as firmas manufatureiras podem apoiar perfeitamente suas vendas externas concentrando seus investimentos de comercialização em poucos mercados.
O terceiro fator condicionante da internacionalização produtiva é o coeficiente de exportação (exportação/vendas totais). A maioria das firmas industriais exportadoras tem um baixo coeficiente de exportação, mesmo para as que mantêm uma atividade contínua ou permanente de vendas externas. Um baixo coeficiente de exportação pode ser um dos responsáveis do não aprofundamento da internacionalização produtiva, pois valores relativamente reduzidos de exportações na receitas totais não justificariam grandes investimentos da firma no exterior para apoiar essas vendas, nem brindariam estímulos para realizar esforços adicionais para ampliar e sustentar as vendas ao exterior.
Xxxxxxxx (2001) encontrou queda do coeficiente de exportação20 em uma amostra representativa de firmas industriais exportadoras,21 entre 1992 e 1996 – de 18% para 15% –, mas identificando uma recuperação parcial que levou o coeficiente para 16,4% em 1998. Houve diferenças importantes de acordo com o porte da empresa e a freqüência exportadora.
20 Medido como exportação/receitas líquidas de vendas.
21 A amostra de firmas representava 95% das firmas industriais exportadoras em 1998 e em torno de 90%, na média dos cinco anos analisados. A seleção de firmas por porte e freqüência procurou reproduzir a mesma distribuição da população exportadora.
As firmas micro e pequenas apresentaram um crescimento importante do coeficiente, entre 1992 e 1998, passando de 9,8% para 20%, no caso das micro-firmas, e de 8,6% para 14,3%, no caso das pequenas. Mas elas não são muito representativas dentro das exportações industriais, pois responderam por menos de 4% das vendas externas em 1998. As firmas grandes, que representavam 76% das exportações e exportavam em média 33 milhões de dólares em 1998, diminuíram o coeficiente de exportação de 20,1%, em 1992, para 15% em 1996, em linha com a estrutura de incentivos gerada pela política macroeconômica. Mas a partir desse ano, as exportações voltaram a crescer dentro das receitas líquidas das empresas grandes, chegando a 17% em 1998. As firmas médias permaneceram com coeficientes entre 13,5% e 15% no período analisado.
Os resultados de Xxxxxxxx (2001) não são muito diferentes quando se analisam as firmas desde o ponto de vista da regularidade exportadora. As firmas exportadoras permanentes – que exportaram todos os anos da amostra – apresentaram coeficientes de exportação entre 18% e 20%, enquanto que as contínuas – exportadora em mais da metade dos anos da amostra – mostram coeficientes oscilantes, mas que não superam 11% das vendas dessas firmas.
Xxxxxxx (1999) encontrou evidências que as firmas estrangeiras têm, em média, uma maior propensão a exportar (coeficiente de exportação) em todos os setores da manufatura.22 Com isto, os coeficientes de exportação das firmas nacionais tendem a ser, em geral, inferiores à média em qualquer setor da indústria. As evidências de Xxxxxxx (1999) indicam que, justamente, quem mais precisa investir para apoiar exportações – as firmas de propriedade total e majoritariamente nacional – são as que menores incentivos têm do ponto de vista do volume relativo de vendas ao exterior sobre as vendas totais.
Nunca é demais lembrar que baixos coeficientes de exportação são reflexos dos incentivos para exportar vis-a-vis para vender no mercado doméstico e do próprio tamanho do mercado doméstico. Portanto, mudar o coeficiente de exportação significa alterar os incentivos relativos das vendas externas sobre as vendas domésticas. O tamanho do mercado continuará sendo um atrativo para as empresas domésticas e este fator constitui uma diferencia fundamental das grandes firmas brasileiras com as grandes firmas chilenas ou argentinas, por exemplo, que, por seus mercados domésticos pequenos, mantêm um grau de internacionalização produtiva relativamente maior.
Em resumo, dada a perspectiva de manutenção do cenário macroeconômico de estabilidade, devemos lembrar que será preciso mudar dois componentes da realidade atual da exportação para aumentar o investimento no exterior e, assim, potencializar exportações: a estrutura das exportações (tipo de produtos, concentração em poucos produtos e destinos, e a origem do capital dos exportadores nos setores onde se precisam investimentos) e a importância relativa da vendas externas nas vendas totais, para uma grande maioria de produtores manufatureiros brasileiros. Começar a mudar estas características de nossas exportações parece ser pré-condição de um processo maior e sustentado de investimento no exterior.
22 Veja-se Xxxxxxx (1999), Tabela 12.
Para mudar as características da estrutura exportadora parece fundamental a manutenção da estabilidade macroeconômica combinada com uma alta taxa de câmbio real pois permitirá investimentos na produção de comercializáveis, o que certamente aumentará o volume, a diversificação de produtos e de destinos da pauta exportadora. Por sua vez, um maior volume de exportações – e a permanência dessas receitas – por unidade exportadora, particularmente no caso de firmas nacionais produtoras de bens de consumo, de capital e de bens intermediários diferenciados, incentivará investimentos em comercialização e a conquista de mercados externos.
3. A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE INVESTIMENTO DIRETO NO EXTERIOR
O objetivo desta seção é analisar a experiência brasileira de investimento direto no exterior. Para isso, se revisarão, primeiro, as tendências agregadas do investimento no exterior, as diferentes fases e alguns de seus determinantes. Depois, se apresentarão os resultados de alguns estudos de casos de empresas que realizaram investimentos fora do país. Esses estudos normalmente procuraram identificar as motivações para o investimento no exterior de uma amostra de firmas, assim como as restrições e dificuldades que essas empresas enfrentaram para a realização desses investimentos. Por último, serão analisados os resultados da pesquisa de campo realizada neste estudo, que tinha como objetivo identificar as motivações e as restrições que empresas enfrentam para o investimento no exterior.
3.1. As tendências do investimento brasileiro no exterior
Os diversos xxxxxxx00 que analisaram a evolução e as características do investimento brasileiro no exterior coincidem em que existem diversas fases no processo, com diferenças nas especificidades setoriais, nas motivações estratégicas, nas modalidades de financiamento e nas formas de implementação do investimento.
Esses mesmos autores também coincidem em vincular os determinantes dessas fases ao macro- contexto do país. Assim, por exemplo, a estabilização ou o processo de integração regional (Mercosul) teve impactos muitos fortes no processo de investimento no exterior.
A dependência do contexto macroeconômico parece ser uma característica dos processos de internacionalização das empresas da América do Sul. Em função da extrema instabilidade das políticas econômicas e da alta variabilidade dos preços relativos, o macro – contexto podia viabilizar projetos, assim como inibir investimentos privados no exterior. Em outros países em desenvolvimento, como nos países asiáticos, a internacionalização esteve muito mais associada a variáveis da estrutura da economia e das características das firmas.
A primeira fase do investimento de empresas brasileiras no exterior, no período de meados dos anos sessenta até 198224, foi um processo basicamente concentrado na Petrobrás, em instituições financeiras e em empresas de construção.25
Os investimentos da Petrobrás estavam motivados pela procura de fontes alternativas de fornecimento de petróleo para o país (resource-seeking). A expansão dos investimentos de bancos no exterior, à frente das firmas nacionais, foi considerada chamativa por Guimarães (1986), porque normalmente os
23 Por exemplo, veja-se, Xxxxxxx Xxxx (1994), Xxxxxxx et alt (1994) e Xxxxx (1999).
24 Xxxxxxx Xxxxx (1999), o investimento no exterior não teve importância até 1972. Entre 1972 e 1976, as cifras oficiais registram um investimento acumulado de US$ 238 milhões, para passar a um acumulado de US$ 863 milhões entre 1977 e 1982. 25 Xxxxx (1999) enfatiza que as cifras oficiais de investimento no exterior, particularmente nos países em desenvolvimento e nos anos setenta, subestimavam o valor dos recursos domésticos no exterior. As cifras oficiais incluíam somente operações autorizadas e realizadas à taxa de câmbio oficial, mas havia um outro conjunto de operações realizadas com recursos existente no exterior e não ingressados no país. Por isso, a importância da Petrobrás na época, que devia registrar suas operações, pode estar superestimada. Os cálculos de Xxxxxxxxx (1986) assinalam um estoque de investimento no exterior muito superior ao acumulado das cifras oficiais.
bancos seguem, e não precedem, o movimento de investimento no exterior das firma nacionais produtoras de bens e serviços. Segundo sua interpretação, os investimentos de bancos no exterior estavam vinculados com as atividades de captação no mercado financeiro internacional e, em menor medida, com os fluxos de residentes para o exterior. Os investimentos das empresas construtoras estavam relacionados ao desenvolvimento de ativos específicos (know how em grandes obras públicas), resultantes do processo de expansão da construção de obras públicas, realizado pelo Brasil na década de setenta. As companhias construtoras se inseriram basicamente nos países petroleiros, aproveitando o surto de investimento público nesses países, após as altas do preço internacional do petróleo.
A implementação de diversos instrumentos (cambiais, fiscais e financeiros) alentou o crescimento e a mudança da composição das exportações até 1980, com o crescimento das vendas de firmas manufatureiras, mas não houve uma expansão do investimento direto dessas empresas no exterior. Os poucos investimentos de firmas manufatureiras correspondiam aos investimentos da Copersucar, do grupo Gerdau, Gradiente e Caloi.26
Na década de oitenta, a economia brasileira enfrentou sérios problemas macroeconômicos, assim como dificuldades com os instrumentos de promoção do comércio exterior e estagnação da produção industrial. Esse conjunto de fatores reduziu o ritmo de expansão das exportações de produtos manufaturados, principalmente após 1986. Apesar de que a manutenção de alguns incentivos para exportar, junto com as altas taxas de câmbio reais, permitiram um crescimento da internacionalização de muitas firmas domésticas, os problemas macroeconômicos e as incertezas derivadas da alta inflação terminaram reduzindo os incentivos à expansão da produção de comercializáveis, levando assim à diminuição ou postergação dos investimentos, tanto no mercado local como no exterior.
No período 1983-1992, os investimentos diretos no exterior totalizaram US$ 2,5 bilhões, mas concentrados nos últimos três anos do período. O setor financeiro continuou sendo um investidor importante, com 37% do total investido no período, a Petrobrás participou com 30% do total investido e as empresas do setor manufatureiro representaram somente 10%.27
A pesquisa sobre caracterização do processo de internacionalização, feita pelo BNDES em 1995, detectou importantes diferenças nas características dos investimentos nos anos oitenta. Em primeiro lugar, à diferença dos anos setenta, quando só grandes empresas – com faturamento acima de US$ 500 milhões – tinham investimentos no exterior, observou-se uma participação maior das empresas com faturamento entre US$ 200 e US$ 500 e daquelas com faturamento inferior a US$ 100 milhões. Em segundo lugar, o número de subsidiárias instaladas no exterior aumentou mais rapidamente do que nos anos anteriores a 1979, especialmente o número de subsidiárias produtivas. Em terceiro lugar, a pesquisa detectou um forte crescimento da participação da América do Sul como localização dos investimentos, chegando a ser a região com o maior número de implantações de subsidiárias na década.
26 Segundo Guimarães (1986), até 1982, os investimentos estavam concentrados em poucas firmas e também geograficamente. As três primeiras firmas absorviam 66% dos investimentos e as 21 primeiras firmas tinham uma participação de 90% do total investido no exterior. Os países desenvolvidos receberam 64% do investimento, principalmente por causa das decisões da Petrobrás.
27 Dados do Banco Central consignados no trabalho de Xxxxx (1999).
Finalmente, houve uma diversificação dos setores da indústria de transformação com investimentos no exterior, deixando de ser um processo concentrado na indústria mecânica e de alimentos, para apresentar implantação de subsidiárias em material de transporte, têxtil e siderurgia, entre outros gêneros da indústria.
Na primeira metade da década de noventa, a abertura econômica estimulou um processo de reestruturação empresarial e houve, simultaneamente, uma nova fase de internacionalização exportadora das empresas manufatureiras. Segundo Xxxxxxx et alt (1994), as importações e a concorrência externa foram estímulos para que as firmas manufatureiras se ajustassem e passassem a investir e concorrer no mercado internacional, como forma de enfrentar a concorrência no mercado doméstico das firmas multinacionais. A liberalização comercial reduziu o grau de controle das firmas locais sobre o mercado doméstico, levando estas firmas a encarar as exportações e a presença nos mercados externos como uma estratégia permanente.
Algumas das características dos anos oitenta, detectadas pela pesquisa do BNDES (1995), se acentuaram na primeira metade da década de noventa, apontando para uma diversificação maior em termos de porte de empresas, uma alta concentração das localizações no Cone Sul e uma proporção maior de unidades produtivas no total de unidades implementadas no exterior. Em ambos os períodos, a construção foi o setor individual com o maior número de instalações de unidades no exterior.
Comparando os dois períodos, a difusão de investimentos em faixas menores de faturamento se aprofundou nos anos noventa, chegando os grupos com vendas inferiores a US$ 500 milhões a participar com 53% dos investimentos realizados entre 1990 e 1994. O crescimento do número de subsidiárias continuou se acelerando, particularmente de unidades produtivas. Esta aceleração do crescimento do número de unidades produtivas influenciou para que, em 1994, esse tipo de unidades representasse 45 % do total das unidades no exterior, no caso dos grupos do setor industrial da amostra, e 44%, no caso dos grupos do setor serviços. A participação da América do Sul na localização dos investimentos no exterior foi maior do que na década de oitenta, chegando a mais de 50% do total investido no período. Finalmente, em termos de setores da indústria, os de material de transporte e mecânica foram os gêneros com o maior número de investimentos e, em ambos os casos, com uma forte participação de unidades produtivas no total de unidades implantadas no período.
Em meados da década de noventa, como resultado da estabilização macroeconômica, houve uma ampliação significativa do mercado doméstico, junto com uma apreciação da taxa de câmbio real. Estes dois fatores desestimularam a expansão internacional das firmas domésticas, particularmente nos dois primeiros anos do programa de estabilização. Por esta razão, observou-se um menor investimento no exterior na época, mas as estratégias de internacionalização exportadora não foram totalmente revertidas.
Após a interrupção temporária da expansão da internacionalização, por causa das oportunidades geradas pela estabilização no mercado doméstico, o investimento no exterior, na segunda metade da década de noventa, esteve basicamente concentrado no Mercosul, como resultado das oportunidades
abertas pelo processo de integração. Este movimento no Mercosul representou uma nova fase de expansão da internacionalização de firmas brasileiras. A desvalorização da moeda brasileira e a crise recessiva da Argentina reduziram a intensidade do processo investidor naquele país por parte das firmas brasileiras.
Ainda que não tenha sido possível dispor dos dados do Banco Central sobre investimento no exterior para os últimos anos da década de noventa, as evidências indicam que o processo investidor foi mais intenso nas empresas produtoras de bens manufaturados, particularmente na siderurgia, em material de transporte e bens intermediários. As firmas produtoras de bens intermediários internacionalizaram sua produção como parte de estratégias de integração em redes de produção global, particularmente na indústria de auto-peças. O crescimento das exportações manufatureiras e as demandas de mercados exigentes, como o americano, estimularam a maior presença das firmas manufatureiras no exterior.
3.2. Revisão dos estudos sobre as decisões de investimentos no exterior das firmas brasileiras
Nesta subseção, serão apresentados os resultados de alguns estudos de caso e pesquisas sobre firmas investidoras no exterior. O objetivo desta revisão é identificar as motivações e as restrições ou dificuldades para avançar na internacionalização.
Alguns desses estudos estiveram motivados pela literatura de administração, procurando, portanto, descrever a seqüência gradual para a internacionalização, os modos de entrada (escolha e seqüência dos modos de entrada) e o timing adotado pelas firmas investidoras, enfatizando, entre outras coisas, o papel das diferenças culturais entre as firmas brasileiras e o país receptor. Quando se parte do marco fornecido pela teoria eclética de internacionalização, a identificação das hipóteses desta corrente é sempre mais difícil, pelos problemas para identificar as vantagens proprietárias e as vantagens de internalização nas decisões de investimento no exterior. O estudo de casos de Xxxxxxx Xxxx (1994), analisado a seguir, pode ser visto como um exemplo de utilização de algumas ferramentas da teoria eclética de internacionalização.
3.2.1. O estudo de Xxxxxxx Xxxx (1994)
O trabalho de Xxxxxxx Xxxx analisou uma amostra de 22 empresas – selecionadas entre as 500 maiores empresas do Brasil –, que realizaram investimentos no exterior entre 1989 e 1991. A maioria das empresas era de capital nacional, predominando as empresas de controle familiar, mas de administração profissionalizada. Para a quase totalidade desse grupo de empresas, as receitas com as exportações representavam entre 10% e 20% de sua receita total. As empresas, em sua maioria, eram fornecedoras de peças e componentes ou de produtos acabados para grandes consumidores industriais ou comerciais. Uma outra característica importante das empresas da amostra era o elevado grau de desenvolvimento tecnológico dentro de tecnologias e produtos de conhecimento disseminado.
Segundo o estudo, uma das principais razões para o investimento no exterior era “a necessidade de estabelecer parcerias com as empresas compradoras, em função das mudanças ocorridas nas relações entre empresas e seus fornecedores”. Para essa amostra de firmas, a instalação de subsidiárias era vista como necessária para oferecer soluções a problemas tecnológicos e de especificação do produto (desenho de novas peças, ajuste da especificação para reduzir defeitos e novas formas logísticas do fornecimento dos insumos).
Dadas as diferentes características setoriais das firmas da amostra, seguindo Xxxxxxx Xxxx (1994), as razões mais específicas para o investimento no exterior foram agrupadas por ramo industrial.
a) Indústria de alimentos (COPERSUCAR, Perdigão e Sadia): estas empresas não tinham intenções de estabelecer plantas produtivas no exterior, contentando-se com escritórios comerciais ou acordos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico.28 A disponibilidade da matéria prima era a motivação principal (vantagem de localização) de manter as unidades produtivas localizadas no território brasileiro.
b) Industria têxtil e de confecções (Artex, Hering, São Paulo Alpargatas e Staroup). O propósito das operações no exterior foi vender produtos de maior valor agregado e aumentar a margem de lucro, através de joint ventures nos países importadores. As empresas brasileiras tinham condições de realizar transferência de tecnologia gerencial e de produção. Nestes aspectos residia as vantagens específicas destas firmas.
c) Indústria de embalagens (Toga e Itap). A embalagem é um produto que deve ser projetado especificamente para um cliente. Por isso, as plantas devem se instalar junto ao cliente. As duas empresas incluídas no estudo exportavam as bobinas de embalagens (matéria prima) do Brasil e terminavam o produto no exterior.
d) Indústria siderúrgica e de bens de capital (Grupo Gerdau, Prensas Schüler, Fupresa, Weg Motores e Villares). O grupo Gerdau já tinha, no momento do estudo, usinas no exterior para atender aos mercados regionais. As outras empresas da amostra, como normalmente acontece com as empresas produtoras de bens de capital que atingem um estágio exportador avançado, tinham plantas para montagem de peças de grande porte e de escritórios para assistência técnica.
e) Indústria de autopeças (COFAP, Metal Leve, Sabó e Sifco). Os movimentos de internacionalização destas empresas foram originados pelas mudanças da indústria automobilística. A estrutura mundial da indústria consumidora e a existência de grandes clientes em mercados externos, que precisam ser atendidos com rapidez e flexibilidade obrigaram estas empresas a instalar unidades no exterior, para apresentar soluções tecnológicas em tempo
28 O caso da COPERSUCAR foi paradigmático. Em realidade, a empresa instalou-se nos Estados Unidos com o objetivo de processar o grão de café e fazer café solúvel para vender no mercado americano. O fracasso da estratégia esteve motivado pela falta de amadurecimento gerencial para esse empreendimento.
curto. A vantagem específica destas empresas era a capacidade de resposta, em tempo e com um alto padrão tecnológico, às demandas de seus clientes globais.
f) Indústria aeronáutica (EMBRAER). O estudo assinala que Embraer desenvolveu um produto de qualidade internacional e identificou um nicho de mercado. A existência de aeronaves no exterior obrigava a firma a instalar unidades de manutenção e reparos.
A Tabela 3.1 apresenta um quadro resumo das empresas da amostra, de seus empreendimentos no exterior e das principais motivações.
Tabela 3.1
INVESTIMENTO NO EXTERIOR DE UMA AMOSTRA DE FIRMAS EXTRAIDO DO TRABALHO DE XXXXXXX XXXX (1994)
EMPRESA | ATIVIDADE PRINCIPAL | EMPREENDIMENTOS NO EXTERIOR | |||
Características | Localização | Ano | Motivações | ||
ARTEX S.A | Roupa de cama mesa, banho e roupas | Escritório comercial com armazem | EUA | Expandir exportações nos EUA | |
GRUPO BRASMOTOR | Linha branca de eletrodomésticos | Empresa | Argentina | 1990-91 | Empresa pertencia a Philips holandesa comprada pela Whirlpool |
COFAP | Auto-peças Amortecedores, aneis, pistão, blocos e cabeçotes de motores | Escritório comercial Fábrica Escritório comercial Fábrica Fábrica | Alemanha Ohio,EUA Uruguai Argentina Portugal | 1991 1991 | Assistência técnica e pós-venda |
COPERSUCAR | Alimentos: açúcar e café alcool | Fábrica | EUA | 1976-86 | Penetração de mercados de alto valor agregado (café solúvel) |
EMBRAER | Aeronaves de porte medio | Escritório comercial Escritório comercial | Florida -EUA França | 1979 1983 | Assistência técnica e pós-venda |
FUPRESA | Fundição de precisão | Escritório comercial e assistência técnica | Alemanha | 1983 | Proximidade c/cliente /estoque Internacionalização |
GRUPO GERDAU | Produtos de aço plano | Usinas | Uruguai, Chile Canadá, Alemanha | 1981 1989,1992 | Sinergia com os mercados locais; exportar p/Eua e Ásia |
GRADIENTE | Equipamentos de audio e video | Fábrica Fábrica | México Inglaterra | 1973/86 1979 | Marca e distribuição |
HERING | Confecções, malharia | Fábrica Licencia Comercial/Tinturaria | Espanha Argentina EUA | 1988 | Para o atendimento de curto prazo |
ITAP | Materias plásticas, emba- lagens, resinas e pigmentos. | TBC Packaging | EUA | 1983 | Produtos e acabamento de produtos exportados do Brasil |
METAL LEVE S.A | Autopeças, metalurgia, máquinas e ferramentas | Assistência Tecnica Grupo de desenvolvi mento Base de produção | Reino Unido, EUA,AL EUA EUA | 1985 1987-89 1988 | Assistência técnica e comercial; estoque de produtos acabados para os mercados americano e europeu; descentralizaçaõ geográfica |
PERDIGAO AGROIN | Alimentos industrializ. (Produtos suínos, frangos) | Escritório comercial | Xxxxxxxx, Xxxxx | 0000-00 | Comercialização |
INVESTIMENTO NO EXTERIOR DE UMA AMOSTRA DE FIRMAS (CONTINUAÇÃO) EXTRAIDO DO TRABALHO DE XXXXXXX XXXX (1994)
PRENSAS SCHULER | Prensas hidráulicas e mecânicas de diversos | Assistência Tecnica | EUA | 1986 | Assistência técnica. |
SABO IND | Autopeças | Transferencia de tec Fabrica de juntas (aquisição) | Alemanha Argentina Alemanha | 1992 1993 | Penetrar no mercado alemão; atender clientes just-in-time |
SADIA | Alimentos | Escritórios comerciais | Toquio Milão Buenos Aires | 1991 1991 1991 | Acompanhamento mais próximo do mercado |
SÃO PAULO ALPARGATAS | Confecções, tecidos e calçados | Fabrica Fábrica Comercialização | Alemanha Espanha EUA | 1989 1988 1988 | Flexibilidade no atendimento ao cliente; penetyrar em segmentos de maior margem |
SHARP DO BRASIL | Eletroeletronica telecomunicações | Machline Serviços MTB Managemente and Technology for Banking SBI International Ltd. | Portugal Budapeste NY-EUA | 1989 1989 1985 | Projetos industriais na Europa Oci- dental e identificação de novas opor- tunidades na Europa Central O escritório de EUA assessora na importação de partes e equipament. |
SIFCO | Produtos forjados e usina dos | Firmas de usinagem | EUA | 1989 1991 | Cumprir prazos de contratos |
STAROUP S.A | Confecções de jeans | Fábrica; Transferencia de tecn; criação de marca; privatização de empre- as da familia | Portugal URSS EUA Hungria | 1989-91 | Agregar valor ao produto e melhorar as margens de lucro |
TOGA | Embalagens flexíveis e semirígidas | Escritório comercial Escritório Fábrica | Dallas Menphis Tennessee | 1984 1988 1988 | Comercialização com rede das empresas americanas |
VILLARES | Elevadores, máquinas e equipamentos, informática | Assistência Tecnica Comércialização | Argentina, Chile, Co- lombia, EUA,México, Paraguai, Uruguai | ||
WEG MOTORES | Motores elétricos, bombas Motores trifásicos | Empresa comercial Escritório/assistencia | EUA Bélgica | 1991 | Atuar junto aos fabricantes de máquinas e equipamentos dos EUA |
3.2.2. A Pesquisa da Fundação Xxx Xxxxxx – Brasil, Leonel, Arruda e Xxxxxxx (1996)
Com ajuda de informações jornalísticas e do banco de dados da própria Fundação xxx Xxxxxx, os pesquisadores detectaram que, entre 1990 e 1994, 150 empresas brasileiras tinham realizado algum tipo de investimento produtivo ou instalado escritórios ou depósitos no exterior. O número total de empreendimentos foi de 285, distribuídos da seguinte maneira: 112 na América Latina , 80 nos Estados Unidos, México e Canadá , 68 na Europa e 25 na Ásia.
A amostra utilizada para a pesquisa foi integrada por essas empresas, mais algumas empresas com antigos investimentos no exterior, totalizando 160 empresas. O número de respostas foi de 57 e a pesquisa estava interessada em identificar fatores determinantes da internacionalização, os principais obstáculos e o papel dos condicionantes culturais e da própria história da organização, na linha das preocupações dos modelos comportamentalistas.
Os fatores determinantes da expansão, listados por ordem de importância, se encontram na Tabela 3.2.
Tabela 3.2
Fatores determinantes para a expansão internacional
1 | ▪ Necessidade de estar próximo ao cliente |
2 | ▪ Conquista de novos mercados |
3 | ▪ Acesso à tecnologia |
4 | ▪ Estar presente em blocos regionais |
5 | ▪ Fontes internacionais de financiamento |
6 | ▪ Ultrapassar barreiras protecionistas |
7 | ▪ Ajustar-se às regulamentações do mercado local |
8 | ▪ Acesso à rede de fornecedores |
9 | ▪ Reação ao comportamento da concorrência |
Fonte: Brasil et alt (1996).
Tal como nos estudos de caso de Xxxxxxx Xxxx (1994), a razão principal foi a necessidade de estar próximo ao cliente, para ajustar a especificação do produto, para melhorar a logística de fornecimento ou para brindar serviços de assistência técnica.
Segundo os autores, esses fatores determinantes estão condicionados a dois aspectos: o papel da liderança na organização e o estabelecimento de alianças e parcerias para conquistar o mercado externo.29 Estes dois aspectos podem ajudar ou retardar a internacionalização das empresas. Assim, no caso do papel das lideranças, a menor distância cultural em relação à Europa, de alguns executivos – devido às origens pessoais e familiares – facilitou a internacionalização naquele continente (Staroup, Weg, Mangels).
Em relação às alianças e parcerias, os autores identificaram que as alianças foram centrais para o acesso à tecnologia, conhecimento de mercado, perfil da concorrência e para superar barreiras culturais. Procurar colaboração para enfrentar a concorrência foi muito importante nos casos de Metal Leve, Freios Varga, Xxxxxxx, Andrade Gutierrez, Xxxxx e Oxford. As parcerias também foram fundamentais para o acesso à tecnologia de produto e processo, como no caso de WEG e de Usiminas. Os autores entendem que uma liderança mais internacionalizada é positiva para facilitar e estimular as alianças.
Em relação aos obstáculos, a amostra tinha restrições para detectá-los corretamente, porque estava concentrada em empresas já internacionalizadas. Apesar disso, a pesquisa identificou que o maior obstáculo para as empresas foi de caráter interno, relacionado a aspectos burocráticos e de legislação no Brasil.30 O segundo aspecto por ordem de importância foi a questão do financiamento, “pelas dificuldades encontradas no acesso às fontes de financiamento internacionais”. Questões legais e culturais foram outros dois fatores importantes. Segundo os autores, as diferenças jurídicas podem obrigar a mudar os tipos de contratos e a prática legal das firmas, e as diferenças culturais podem produzir importantes prejuízos para as empresas que não estiverem atentas a este aspecto.
29 A identificação destes aspectos condicionantes foi resultado dos estudos de caso feitos pelos autores durante o projeto. Nestes estudos, Xxxxxxx continuou uma linha de pesquisa feita anteriormente com Xxxxxxxx Xxxxxx na Funcex –Série de Empresas e Negócios Internacionais.
30 A pesquisa foi feita sobre experiências em um período de importantes restrições às saídas de divisas.
As maiores dificuldades na gestão de negócios internacionais foram localizadas no acesso à informação. A identificação de parceiros, a carência de recursos financeiros e o desconhecimento de práticas de negócios em outros países foram os outros fatores assinalados.
3.2.3. A pesquisa do BNDES (1995)
O estudo do BNDES publicado em 1995 foi realizado com as respostas de 30 grandes grupos econômicos nacionais. Ao mesmo tempo, a Área de Planejamento do Banco (DEPES/GEPES) consolidou as repostas junto com informações econômicas, elaborando um cadastro de grupos econômicos privados brasileiros, com subsidiárias no exterior. Os trinta grupos informantes da pesquisa instalaram 101 subsidiarias no exterior, em um período que vai desde começos da década de setenta até 1994. As subsidiárias da amostra estavam concentradas nos setores de mecânica, material de transporte e construção.
Tal como nos dois estudos anteriores, a pesquisa do BNDES identificou que o investimento no exterior pressupõe uma expansão anterior das exportações. Assim, as empresas com coeficiente exportação/faturamento baixo (<10%) tinham uma proporção pequena (21%) das subsidiárias no exterior.
Um outro elemento que a pesquisa tentou identificar foi a forma de implantação das subsidiárias produtivas da indústria. De acordo com os modelos comportamentalistas, que enfatizam a redução gradual das distâncias com o mercado estrangeiro, a maioria das subsidiárias produtivas implantadas (63%) foi resultado de compras ou de associação com firmas existentes. A compra ou associação com firmas existentes permite aproximar a firma investidora da realidade cultural e organizacional do país receptor. Mas esta atitude das firmas também pode ser entendida pelo enfoque dos custos de transação. A compra ou associação permite obter as vantagens proprietárias da firma existente (tecnológicas ou resultantes de adaptação de processos ou produtos) e reduzir os custos de transação da implementação no novo mercado.
A pesquisa parece sugerir que a forma de implantação está relacionada ao tipo de investimento. Como mencionado, quando se trata de unidades produtivas, as firmas preferem firmas existentes, enquanto que quando se trata de implementar uma unidade comercial ou fazer um investimento não relacionado à produção, a preferência das empresas parece ser de novas unidades - 81% das novas subsidiárias não produtivas foram unidades novas.
Em relação à participação acionária nas empresas no exterior, a pesquisa comprovou que os grupos brasileiros mantinham o controle integral ou com participação de terceiros em 76% das unidades. O trabalho identificou também que a natureza do controle varia conforme a região econômica. As associações foram mais freqüentes nos países da América do Sul e Portugal, enquanto que nos países mais afastados da realidade cultural e institucional brasileira, como os Estados Unidos, as unidades foram em sua maioria filiais ou controladas integralmente.
❖ As motivações para o investimento no exterior
O fortalecimento do poder de competição, pela proximidade do mercado consumidor, foi assinalado pela maior proporção de firmas (75% da amostra). Esta razão foi particularmente importante para as firmas do setor metal-mecânico e para os produtores de bens intermediários.
A segunda razão mais apontada foi a de suprir o mercado regional. Esta foi uma motivação importante para os produtores de bens intermediários não metálicos e para as subsidiárias instaladas na América do Sul e no Mercosul.
O processo de integração regional gerou oportunidades de investimento no exterior, e por isto a integração regional foi o terceiro motivo mais importante para a instalação de subsidiárias no exterior. Este foi um argumento importante para a indústria metal-mecânica e para a decisão de instalação em Europa e no Mercosul.
Uma razão freqüentemente mencionada nos estudos é da necessidade de proximidade dos clientes industriais. Esta não foi uma razão importante para o conjunto de firmas do BNDES, ainda que sim para as firmas produtoras de bens intermediários. Elas consideraram esta motivação como um dos três principais determinantes do investimento no exterior e a segunda razão em importância para se instalar no mercado norte-americano.
❖ As dificuldades encontradas para a realização do investimento
Os problemas do financiamento doméstico e os problemas culturais constituíram os entraves mais assinalados pelas firmas. A maioria das firmas, mais de 66%, assinalou a dificuldade de obter financiamento no Brasil para a unidade no exterior como um problema. A segunda questão com o maior número de empresas foi a de diferenças culturais entre os países, na linha do enfatizado pelos modelos comportamentalistas da internacionalização das firmas.
Em terceiro lugar, a dificuldade de acesso ao mercado financeiro local e/ou o alto custo do financiamento foi a terceira razão mais assinalada pelas firmas. Um outro problema cultural – dificuldade de transferir executivos e técnicos – foi assinalado por um número significativo de firmas.
3.3. Análise das características e dos determinantes do investimento no exterior. Resultados da pesquisa realizada entre as firmas exportadoras.
❖ Características da amostra
Ao contrário de estudos anteriores, onde a amostra só continha empresas com investimentos no exterior, a pesquisa realizada para este estudo selecionou um conjunto de exportadores, com diferentes características de tamanho e freqüência exportadora, para pesquisar algumas características das decisões de investimento passadas, as intenções de investimento ou a decisão de não investir no exterior.
Esta diversidade de tamanho e de características exportadoras (medida, entre outras coisas, pela freqüência exportadora) permite capturar melhor as diferentes atitudes em relação ao investimento no exterior, do que uma amostra concentrada em firmas exclusivamente investidoras. Em relação à distribuição por porte da amostra, as firmas micro e pequenas (até 99 empregados) representaram 46% da amostra, enquanto que as firmas de porte médio (100 a 499 empregados) tiveram um peso de 32,8% e as firmas grandes (mais de 500 empregados) constituíram 21% da amostra. Considerando a distribuição das firmas pelo seu desempenho exportador, as exportadoras permanentes, ou seja aquelas que exportaram todos os anos entre 1994 e 2000, tiveram um peso de quase 53% da amostra. Os exportadores assíduos – com exportações entre 4 a 6 anos no período 1994-2000 – representaram 19,6% da amostra. O restante da amostra esteve constituído pelos exportadores esporádicos e iniciantes – que exportaram em até três anos no período 1994-2000 –, sendo que os iniciantes não exportaram antes de 1997.
A Tabela 3.3 apresenta as características básicas da amostra em relação ao investimento no exterior. Somente 20% do total das empresas da amostra informaram possuir algum tipo de investimento no exterior31 para apoiar a comercialização dos produtos feitos no Brasil ou para produzir no exterior. Essa proporção era quase o dobro (38,1%) no caso das firmas grandes e seis pontos percentuais inferior no caso das empresas de porte pequeno e médio.
Tabela 3.3
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Total da amostra, por porte e por freqüência exportadora
(%)
Total da amostra | Por porte de empresa | Freqüência | |||
Pequeno - Médio | Grande | até Assídua | Permanente | ||
Com | 20 | 13,7 | 38,1 | 18,4 | 21,4 |
Sem | 80 | 86,3 | 61,9 | 81,6 | 78,6 |
Esperava-se que o conjunto de firmas exportadoras permanentes, ou seja com uma atividade exportadora contínua, tivesse uma maior proporção de firmas com investimentos no exterior. Como esperado, a proporção de firmas exportadoras permanentes com investimentos no exterior é maior do que no caso dos exportadores menos freqüentes, mas a diferença não é muito significativa.
O objetivo da análise deste trabalho é a atitude investidora das empresas com maioria de capital nacional. As firmas totalmente e majoritariamente nacionais apresentaram uma proporção menor de firmas com investimentos no exterior (17,1%), mas não foi muito diferente do que a do total das empresas da amostra. O subconjunto de firmas nacionais com alguma participação estrangeira teve uma proporção maior de firmas com investimento no exterior, o que resulta razoável, pois muitas firmas nacionais se associam com estrangeiras para realizar investimentos na região ou para fortalecer sua presença em mercados externos (Tabela 3.4).
31 Para efeito do estudo, consideravam-se como investimentos no exterior distintos tipos de investimento, tais como representação comercial, armazéns, despesas com canais de distribuição, rede de assistência técnica e fábrica.
Tabela 3.4
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Total da amostra e firmas de capital nacional
(%)
Total da amostra | Firmas de capital nacional | Totalmente Nacional | Majoritariamente Nacional | |
Com | 20 | 17,1 | 16,3 | 23,1 |
Sem | 80 | 82,9 | 83,7 | 76,9 |
Proporção no | 100 | 69,8 | 61,3 | 8,5 |
total de firmas |
Como esperado, os conjuntos de firmas nacionais grandes e exportadoras permanentes tiveram uma proporção maior de empresas com investimento no exterior (Tabela 3.5). Porém, é chamativo que mais de 80% das firmas nacionais que tiveram uma atividade exportadora permanente no período 1994-2000 não apresentassem nenhum tipo de investimento no exterior.
Tabela 3.5
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Firmas de capital nacional
Total, por porte e por freqüência exportadora
(%)
Total | Por porte de empresa | Por freqüência exportadora | |||
Pequeno - Médio | Grande | até Assídua | Permanente | ||
Com | 17,1 | 12,3 | 35,4 | 14,1 | 18,4 |
Sem | 82,9 | 87,8 | 64,6 | 85,9 | 81,6 |
A relação entre desempenho exportador das firmas e investimento no exterior pode ser vista através de outras variáveis que refletem a atividade exportadora. Considerando, por exemplo, o ano de início da exportação, a Tabela 3.6 apresenta a proporção de firmas com ou sem investimento no exterior. O conjunto de exportadores mais antigos tem uma proporção maior de empresas com investimentos no exterior. A proporção de firmas com investimento declina com a entrada mais recente no negócio da exportação, como esperado pelos modelos comportamentalistas.
Tabela 3.6
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Firmas de capital nacional
Classificadas de acordo com o período de inicio da exportação
(%)
Antes de 1970 | 1970-1979 | 1980-1989 | 1990-1994 | 1995-2001 | |
Com | 31,3 | 24,2 | 18,1 | 9,8 | 13,6 |
Sem | 68,8 | 75,8 | 81,9 | 90,2 | 86,4 |
Proporção no | 5,7 | 11,7 | 25,5 | 18,1 | 39 |
total de firmas |
Supõe-se que as firmas com uma proporção maior de seu faturamento resultante das atividades de exportação deveriam ter investimentos no exterior, pois a importância das vendas externas justificaria algum tipo de investimento para potencializar a entrada no mercado externo. Portanto, deveria ser encontrada uma relação positiva entre coeficientes de exportação-faturamento e proporção de firmas com investimento no exterior. A Tabela 3.7 mostra essa relação. Efetivamente, a proporção de firmas com investimentos cresce junto com o aumento do coeficiente exportação-faturamento, mas observam-
se algumas anomalias como a queda da proporção no conjunto com coeficiente entre 15%-20% e uma baixa proporção no conjunto de empresas com exportações maiores a 30% do faturamento.32
Tabela 3.7
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Firmas de capital nacional
Classificadas de acordo com a participação das exportações no faturamento em 2000
(%)
Até 5% | 6%-9% | 10%-14% | 15%-20% | 21%-30% | Mais de 30% | |
Com Sem | 11,4 88,6 | 16,2 83,8 | 27 73 | 13,2 86,8 | 22,9 77,1 | 12,8 87,8 |
Uma outra afirmação dos estudos empíricos do Brasil é a de que empresas familiares têm dificuldades para avançar no processo de internacionalização, com exceção do caso em que a família proprietária tenha origem estrangeira. A Tabela 3.8 apresenta os dados de investimento das firmas de capital nacional, classificadas por tipo de controle do capital. Em realidade, o que parece decisivo para o investimento no exterior é a abertura ou não do capital, pois firmas com estas características parecem ter uma propensão de investimento no exterior maior do que firmas fechadas.
Tabela 3.8
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior Total da amostra e firmas de capital nacional Classificadas de acordo com o tipo de controle do capital
(%)
Total da amostra | Familiar Capital Fechado | Não Familiar Capital Fechado | Familiar Capital Aberto | Não Familiar Capital Aberto Bolsa Local | Não Familiar Capital Aberto Bolsa Local e Estrangeira | |
Com | 20 | 16,5 | 14,5 | 50 | 18,2 | 20 |
Sem | 80 | 83,5 | 85,5 | 50 | 81,8 | 80 |
Por último resulta interessante observar as características setoriais do investimento no exterior. A Tabela
3.9 apresenta os dados de investimento das firmas de capital nacional, organizados segundo os setores manufatureiros da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE – IBGE). Tal como em outros estudos, as indústrias de alimentos, couro e calçados e vestuários apresentam uma baixa proporção de investimentos no exterior. Surpreendentemente, máquinas e equipamentos não elétricos, um setor que precisa montar uma rede de manutenção e serviços, apresentou uma baixa proporção de firmas com investimento no exterior. Em linha com outros estudos, os setores de máquinas elétricas e de equipamentos de precisão apresentaram uma alta proporção de firmas com investimento no exterior.
32 Uma explicação para estas anomalias pode ser o fato de que, dada a informação disponível, consideramos só o faturamento do ano 2000. Como esse foi um bom ano para as exportações, pode ter resultado em um alto coeficiente de exportação-faturamento para firmas sem investimentos no exterior.
Tabela 3.9
Proporção de firmas com e sem investimentos no exterior em setores manufatureiros selecionados
Firmas de capital nacional
(%)
Setores com mais de 20% das firmas com investimento no exterior | ||||||||
Produtos de Borracha e Plástico | Produtos Minerais não Metálicos | Metalúrgica básica | Maquinas e Equipamentos Elétricos | Equipamentos de Precisão e Automação | Veículos | |||
Com | 35 | 21,4 | 35,7 | 20 | 30 | 35 | ||
Sem | 65 | 78,6 | 64,3 | 80 | 70 | 65 | ||
Setores com menos de 20% das firmas com investimentos no exterior | ||||||||
Alimentos e Bebidas | Têxteis | Vestuário e Acessórios | Couro e Calçados | Produtos Químicos | Produtos de Metal excl. Maq. | Maquinas e Equipamentos | Mat. Eletrônico Equipamento de Comunicação | |
Com | 12,5 | 18,5 | 5,9 | 10 | 16,7 | 8,7 | 7,7 | 14,3 |
Sem | 87,5 | 81,5 | 94,1 | 90 | 83,3 | 91,3 | 92,3 | 85,7 |
❖ Localização, tipos de investimento e motivações dos principais investimentos no exterior
As principais características em termos de localização, tipos de investimentos e motivações dos investimentos realizados são as seguintes:
▪ Os principais investimentos no exterior das firmas de capital nacional da amostra estão concentrados nos Estados Unidos e na Argentina.
▪ Quase 85% das unidades no exterior destas firmas são utilizadas em atividades de comércio e distribuição dos produtos.
▪ Os investimentos em unidades produtivas representam 12% do total e estão concentrados nos setores: têxtil, químico, metalurgia básica e veículos.
▪ As necessidades de logística, a costume de comprar de empresas já instaladas no país e a necessidade de acompanhar as tendências do mercado consumidor foram as motivações principais mais assinaladas pelas firmas para realizar investimentos no exterior.
A Tabela 3.10 apresenta os destinos dos principais investimentos das firmas de capital nacional e a participação das firmas por porte e freqüência exportadora nos investimentos em cada país. Setenta e três por cento das unidades no exterior das firmas de capital nacional está concentrado em dois mercados: Estados Unidos e a Argentina. Dois pontos a destacar desta tabela são a significativa participação nos investimentos das firmas pequenas e médias, em quase todos os casos, com exceção do Uruguai e da Holanda, e a importante presença de investimentos de firmas exportadoras não permanentes nos mercados da Venezuela, do Uruguai, da Holanda e da Itália.
Tabela 3.10
Destinos dos investimentos e características das firmas investidoras Firmas de capital nacional
– Proporção calculada sobre o número de unidades no exterior –
(%)
Países | Distribuição do principal investimento por pais | Porte das empresas investidoras no país | Freqüência exportadora das empresas investidoras no país | ||
Até Médio | Grande | Até Assídua | Permanente | ||
Estados Unidos | 40,0 | 68,2 | 31,8 | 41 | 59 |
Argentina | 32,7 | 67 | 33 | 44,4 | 55,6 |
México | 7,3 | 75 | 25 | 50 | 50 |
Chile | 3,6 | 100 | 0 | 0 | 100 |
Venezuela | 3,6 | 50 | 50 | 100 | 0 |
Uruguai | 1,8 | 0 | 100 | 100 | 0 |
Holanda | 1,8 | 0 | 100 | 100 | 0 |
Itália | 1,8 | 100 | 0 | 100 | 0 |
China | 1,8 | 100 | 0 | 0 | 100 |
Paraguai | 1,8 | 100 | 0 | 100 | 0 |
Colômbia | 1,8 | 100 | 0 | 0 | 100 |
Equador | 1,8 | 100 | 0 | 0 | 100 |
A Tabela 3.10 mostra alguns fatos estilizados da experiência brasileira do investimento no exterior. Em primeiro lugar, os investimentos estão localizados nos principais mercados de destino das exportações de produtos manufaturados: Estados Unidos, Argentina, México, Chile e Venezuela. Em segundo lugar, a integração regional parece ser um outro fator importante para a localização dos investimentos (Mercosul absorveu 36% dos principais investimentos). Em terceiro lugar, a proximidade geográfica, pela menor distância física e cultural, também é outro fator estimulador do investimento, a julgar pela localização de investimentos na Colômbia e Equador, mercados muito recentes de produtos manufaturados.
Tabela 3.11
Distribuição por tipos de investimento Principal investimento
Firmas de capital nacional
Total, por porte e por freqüência exportadora
(%)
Tipos de investimento | Total | Por porte das empresas | Por freqüência exportadora | ||
Até Médio | Grande | Até Assídua | Permanente | ||
Representação comercial | 42,7 | 51 | 25 | 46 | 40 |
Canal de distribuição | 22,7 | 24 | 21 | 23 | 23 |
Fábrica | 12 | 6 | 25 | 6 | 18 |
Rede de assistência técnica | 9,3 | 10 | 8,5 | 14 | 5 |
Armazém | 8 | 6 | 12,5 | 9 | 7,5 |
Investimentos em vendas/marketing | 2,7 | 2 | 4 | 2 | 2,5 |
Pesquisa e desenvolvimento | |||||
Outros | 2,6 | 1 | 4 | 5 |
A Tabela 3.11 mostra a distribuição, por tipos, do principal investimento das firmas de capital nacional. O tipo de investimento com a maior proporção entre estas firmas é o investimento em representação comercial, seguido pelos investimentos em canais de distribuição. Na distribuição do total de firmas, as fábricas representam uma proporção pequena, de 12%, mas quando se analisa a distribuição por porte ou freqüência, observa-se que as empresas grandes têm maior proporção de investimentos produtivos no exterior, assim como também as exportadoras permanentes.
A distribuição dos tipos de investimento por setor pode diferir significativamente da média da amostra. A Tabela 3.12 mostra a distribuição por tipo de investimento em cada setor da indústria. O investimento produtivo no exterior está concentrado nos setores: têxteis, produtos químicos, minerais não metálicos, metalúrgica básica e peças e veículos. Os produtores de bens de capital têm seus investimentos concentrados em representação comercial e canais de distribuição, com pouco investimento em redes de assistência técnica.
Tabela 3.12
Distribuição por tipos de investimento Principal investimento
Firmas de capital nacional Setores
(%)
Tipo de investimento | Total | Setores da indústria manufatureira | ||||||
Alimentos e Bebidas | Têxteis | Calçados e Couro | Celulose Papel | Produtos Químicos | Produtos Borracha e Plástico | Minerais Não Metálicos | ||
Representação | ||||||||
Comercial | 42,7 | 50 | 20 | 66,7 | 50 | 33,3 | 44,4 | |
Canal de Distribuição | 22,7 | 40 | 33,3 | 50 | 11,1 | 33,3 | ||
Fábrica | 12 | 40 | 22,2 | 66,7 | ||||
Rede de assistência técnica | 9,3 | 22,2 | 11,1 | |||||
Armazém | 8 | 11,1 | 33,3 | |||||
Investimentos em vendas/ marketing | 2,7 | 50 | ||||||
Pesquisa e desenv. | ||||||||
Outros | 2,6 | 11,1 | ||||||
Tipo de investimento | Total | Setores da indústria manufatureira | ||||||
Metalúrgica básica | Produtos Metálicos, exclusive Máquinas | Maquinas e Equipamentos | Maquinas e Equip. Elétricos | Material Eletrônico, Equipam. Comunica | Equipam. Precisão e Automação | Veículos | ||
Representação | ||||||||
Comercial | 42,7 | 50 | 20 | 100 | 60 | 100 | 25 | 42 |
Canal de Distribuição | 22,7 | 12,5 | 20 | 20 | 50 | 25 | ||
Fábrica | 12 | 12,5 | 17 | |||||
Rede de assistência técnica | 9,3 | 25 | 20 | 8 | ||||
Armazém | 8 | 40 | 8 | |||||
Investimentos em vendas/marketing | 2,7 | 20 | ||||||
Pesquisa e desenv. | ||||||||
Outros | 2,6 | 25 |
Em relação às motivações do investimento no exterior, as necessidades de logística foram a motivação que a maior parte das firmas considerou de primeira importância. Na Tabela 3.13 são apresentadas as percentagens de firmas que consideraram uma lista de fatores como de primeira importância. O costume de comprar de firmas instaladas no país, um fator importante no mercado americano, apresentou a segunda maior freqüência de respostas. O terceiro fator em importância foi a necessidade de acompanhar as tendências do mercado para adaptar produtos. O fator regulatório, que reuniu a maior proporção de firmas, foi a existências de altas tarifas de importação.
Tabela 3.13
Motivações para investir no exterior das firmas de capital nacional
– Percentagem de firmas que considerou cada um destes fatores como de primeira importância –
(%)
Características da demanda do mercado comprador | Total |
▪ Costume de comprar de empresas já instaladas no país | 36,4 |
▪ Necessidade de atender a demanda just in time | 20 |
▪ Necessidade de acompanhar de perto as tendências do | 34,5 |
mercado para adaptar estratégias e produtos | |
▪ Seus competidores nesses mercados fizeram investimentos | 5,5 |
Características de seus produtos
▪ Necessidades de serviços de manutenção e peças | 23,6 |
▪ Necessidades de manter show rooms | 16,4 |
▪ Necessidades de logística | 52,7 |
Fatores legais ou regulatórios
▪ Existência de altas tarifas importação | 27,3 |
▪ Risco de medidas não tarifárias como anti-dumping | 5,5 |
▪ Existência de legislação rigorosa de proteção ao consumidor | 20 |
❖ Os planos de investimento no exterior
As Tabelas 3.14 até 3.17 apresentam os resultados relacionados com os planos de investimentos no exterior das firmas de capital nacional. A Tabela 3.14 mostra que uma alta proporção, 29%, das firmas de capital nacional está disposta a investir no exterior.33 O aumento da proporção de firmas com planos de investimento, em relação à situação atual, é particularmente importante no caso de firmas de porte pequeno e médio e de atividade exportadora, até 2000, não permanente.
A Tabela 3.15 aponta que, como resultado dos problemas macroeconômicos da Argentina, o Mercosul está em quarto lugar como destino dos investimentos, atrás da Europa, dos Estados Unidos e do México. As intenções de investimentos no México, Chile e Venezuela estão relacionadas com o dinamismo que esses mercados apresentaram no período recente, especialmente para as vendas de produtos industrializados.
33 Na amostra, a proporção de firmas de capital nacional com investimentos no exterior, no presente, é de 17,1%.
Tabela 3.14
Proporção de firmas com e sem planos de investimentos no exterior Firmas de capital nacional
(%)
Total | Por porte de empresa | Por freqüência exportadora | |||
Até Médio | Grande | até Assídua | Permanente | ||
Com | 29 | 28,2 | 33,3 | 31 | 27 |
Sem | 71 | 71,8 | 66,7 | 69 | 73 |
Tabela 3.15
Principais localizações dos planos de investimentos no exterior
(%)
Países | Proporção do total de unidades planejadas |
Europa | 21,6 |
EUA | 20,4 |
Xxxxxx | 00 |
Xxxxxxxx | 0,0 |
Xxxxx | 6,2 |
Venezuela | 3,7 |
Equador | 2,5 |
China | 2 |
Xxxxxxx | 0 |
Xxxxxxxx | 2 |
Índia | 2 |
Panamá | 2 |
Em termos setoriais (Tabela 3.16), dois setores com predomínio de firmas exportadoras de capital nacional, calçados e produtos de metal, mostram uma alta proporção de intenções de investimento no exterior. Isto significa uma mudança em relação à situação atual de investimentos no exterior desses setores, podendo ajudar a diversificar a oferta exportadora desses produtos e a ganhar espaço nos mercados externos.
Tabela 3.16
Proporção de firmas com e sem planos de investimentos no exterior em setores selecionados
(%)
Setores com mais de 30% das firmas com planos de investimento | ||||||||
Couro Calçados | Prod. Químicos | Prod. de Borra. e Plástico | Minerais não Metálic. | Metalúrgic Básica | Prod.Metal excl. Maq | Equipam. Precis e Automatação | Veículos | |
Com Sem | 33,3 66,7 | 30,6 69,4 | 40 60 | 42,9 57,1 | 35,7 64,3 | 30,4 69,6 | 40 60 | 40 60 |
Setores com menos de 30% das firmas com planos de investimentos | |||||||
Alimentos e Bebidas | Têxteis | Vestuário Acessórios | Madeira | Celulose e Papel | Maquinas Equipamen | Maq.,Equip Elétricos | |
Com Sem | 12,5 87,5 | 29,6 70,4 | 11,8 88,2 | 25 75 | 11,1 88,9 | 20,5 79,5 | 26,7 73,3 |
Tabela 3.17
Distribuição por tipo de investimento Planos de investimentos
Total e setores da indústria
(%)
Tipos de investimento | Total das firmas | Têxteis | Couro Calçados | Prod. Químico | Prod. de Borr e Plástico | a. Minerais não Metálic. | Metalúrgic Básica | Prod.Metal excl. Maq | Maquinas Equipamen | Maq.,Equip Elétricos | Mat.Eletrôn./ Eq.Comunica | Equipam. Precis e Automatação |
Representação comercial | 42,6 | 38,5 | 45,5 | 47,1 | 50 | 16,7 | 50 | 57,1 | 38,5 | 60 | 66,7 | 42,9 |
Canal de distribuição | 23,3 | 23,1 | 9,1 | 17,7 | 33,3 | 50 | 28,6 | 15,4 | 42,9 | |||
Fábrica | 7,8 | 15,4 | 5,9 | 12,5 | 14,3 | 7,7 | ||||||
Rede de assistência tecnica | 7,8 | 5,9 | 37,5 | 23,1 | 20 | 33,3 | ||||||
Armazém | 7,8 | 15,4 | 9,1 | 11,8 | 8,3 | 7,7 | 20 | |||||
Investimentos em venda/ | ||||||||||||
Marketing | 2,3 | 9,1 | 16,7 | 14,3 | ||||||||
Pesquisa e desenvolvimento | 0,7 | 5,9 | 16,7 | |||||||||
Outros | 7 | 7,6 | 18,2 | 5,9 | 8,3 | 7,7 | ||||||
Não respondeu | 0,8 | 9,1 |
O resultado mais importante que mostra a Tabela 3.17 – tipos de investimento por setor – é que os planos de investimentos estão concentrados em investimentos tipo trade and distribution, da mesma maneira que os investimentos atuais. Os setores de calçados e de produtos de metal, que mostraram maior intenção investidora em relação ao comportamento atual e à média da amostra, não escapam desta regra geral.
Uma diferença em relação à situação presente dos investimentos é a aparição de intenções de investimentos produtivos nos setores de produtos de metal e de máquinas e equipamentos. Setores que já têm investimentos produtivos, como produtos têxteis e químicos e de metalúrgica básica, mostram planos de instalação de fábricas no exterior.
❖ Dificuldades para o planejamento e a implementação dos investimentos no exterior
As empresas foram consultadas sobre suas dificuldades para planejar ou implementar investimentos no exterior. A Tabela 3.18 apresenta a percentagem de firmas investidoras, de capital nacional, que considerou uma determinada dificuldade como de primeira importância.
As respostas sobre as dificuldades, para o total de firmas de capital nacional, indicam que existem dois tipos de dificuldades importantes: as relacionadas com informações sobre mercados e regulação dos investimentos no exterior e as relacionadas com diversas necessidades de financiamento. Mas estes dois tipos de dificuldades não têm a mesma representatividade.
A Tabela 3.18 indica que as dificuldades relacionadas com obtenção de informação são mais generalizadas e representativas dos problemas das firmas investidoras. Assim, as duas dificuldades mais apontadas pelas firmas foram: obter informações sobre os mercados externos (26,2 % das firmas) e falta de informação sobre regulação de investimentos nos mercados externos (19,3% das firmas investidoras nacionais). As dificuldades relacionadas com o financiamento são de primeira importância para uma proporção menor de firmas do que no caso das dificuldades de informação. Por exemplo, a inexistência de linhas de financiamento no mercado financeiro doméstico foi considerada dificuldade de primeira importância para 12,1% das firmas investidoras de capital nacional.
Tabela 3.18
Dificuldades para o planejamento e a implementação de investimentos no exterior Firmas investidoras de capital nacional
Total, por porte e freqüência exportadora
– Percentagem de firmas que considerou cada uma destas dificuldades como de primeira importância –
(%)
Tipo de dificuldades | Por porte das firmas | Por freqüência exportadora | ||||
Dificuldades internas à empresa | Total | Pequeno | Médio | Grande | Assídua | Permanente |
Problemas para obter informações sobre os mercados externos | 26,2 | 23 | 27,2 | 25 | 31,9 | 22,1 |
Falta de capacitação dos quadros gerenciais | 5,6 | 5 | 4,9 | 8,3 | 4,3 | 6,7 |
Falta de fundos próprios | 15,3 | 17 | 11,7 | 12,5 | 10,1 | 16 |
Falta de garantias para apresentar aos bancos estrangeiros | 4 | 7 | 1,9 | 4,2 | 4,3 | 3,7 |
Dificuldade para lidar com fornecedores localizados no exterior | 10,3 | 11 | 13,6 | 6,3 | 10,1 | 9,8 |
Dificuldades externas à empresa | Total | Pequeno | Médio | Grande | Assídua | Permanente |
Inexistência de linhas de financiamento no mercado financeiro doméstico | 12,1 | 12 | 10,7 | 10,4 | 13 | 11 |
Inexistência de garantias públicas para apresentar aos bancos estrangeiros | 5,9 | 6 | 8,7 | 4,2 | 8,7 | 3,7 |
Falta de linhas de financiamento para prospecção de mercados | 15,6 | 19 | 13,6 | 12,5 | 13 | 16,6 |
Falta de informação sobre regulação de investimentos nos mercados externos | 19,3 | 20 | 18,4 | 16,7 | 17,4 | 17,8 |
A fragmentação do universo das firmas de capital nacional, de acordo com o porte ou a freqüência exportadora, não muda a hierarquia das dificuldades existentes dentro do conjunto de empresas nacionais. Com o aumento do porte da empresa, a proporção de firmas com dificuldades relacionadas ao financiamento diminui, mas a percentagem de firmas com problemas de para obter informações aumenta. Como esperado, as firmas exportadoras permanentes parecem ter menos problemas para obter informações sobre os mercados externos do que os exportadores somente assíduos.
❖ Razões para a não realização de investimentos no exterior
A pesquisa perguntou sobre as razões pelas quais as firmas não têm e/ou não pensam em realizar investimentos no exterior. A Tabela 3.19 apresenta os resultados, consignando a percentagem de firmas que considerou uma determinada razão como de primeira importância.
A razão – de primeira importância – com a maior proporção de firmas de capital nacional não investidoras no exterior foi a falta de necessidade do investimento no exterior. A percepção de que a falta de investimento no exterior está relacionada com estratégias e características das firmas, e não com restrições, é reforçada pela falta de representatividade das razões fora do alcance da firma: estas foram consideradas de primeira importância por somente 15% das firmas de capital nacional sem nenhum tipo de investimento no exterior.
As firmas não teriam necessidade de investir no exterior porque, dentre outras coisas, as características do produto e/ou do mercado não demandariam a realização de tais investimentos. A Tabela 3.19 reforça esta percepção ao mostra que a percentagem de firmas que considerou as características do produto exportado como uma razão de primeira importância para não realizar investimentos foi de 25,7%.
Tabela 3.19
Razões para não ter nem planejar investimentos no exterior Firmas de capital nacional
Total, por porte e freqüência exportadora
– Percentagem de firmas que considerou
cada uma destas razões como de primeira importância –
(%)
Razões | Total | Por porte de empresa | Por freqüência exportadora | ||
até Médio | Grande | até Assídua | Permanente | ||
Falta de necessidade | 40 | 38,2 | 54,2 | 39,2 | 40,7 |
Características do produto exportado | 25,7 | 26,3 | 20,8 | 27,5 | 24,1 |
Características do mercado | 17,1 | 16,7 | 20,8 | 16,7 | 17,6 |
Dificuldade fora do alcance da empresa | 15,2 | 22 | 4,2 | 15,7 | 14,8 |
Supõe-se que as firmas grandes teriam ainda menos restrições para a realização de investimentos no exterior e, portanto, a decisão de não investir deveria ser parte de uma estratégia da firma. Isto é o que mostra a Tabela 3.19 ao considerar as firmas grandes. A proporção deste tipo de firmas que não vê necessidade de investimento foi maior do que a média, e a proporção de firmas com restrições fora do alcance da empresa foi menor do que a média das firmas que não têm nem planejam investimentos no exterior.
Tabela 3.20
Razões para não ter nem planejar investimentos no exterior Firmas de capital nacional
Distribuição por setores da indústria
– Percentagem de firmas que considerou
cada uma destas razões como de primeira importância –
(%)
Razões | Alimentos e bebidas | Têxteis | Couro calçados | Produto químico | Prod. de borracha e plástico | Minerais não metálicos |
Falta de necessidade | 30,8 | 43,8 | 31,6 | 59,1 | 50 | 50 |
Características do produto exportado | 7,7 | 25 | 31,6 | 18,2 | 20 | 50 |
Características do mercado | 38,5 | 6,3 | 26,3 | 4,5 | 10 | 0 |
Dificuldade fora do alcance da empresa | 15,4 | 18,8 | 10,5 | 13,6 | 20 | 0 |
Razões | Metalúrg. básica | Prod. metal. excl. maq. | Máquinas e equipam. | Mat. eletrônico eq. comunic | Equipam. precis. e automação | Veículos |
Falta de necessidade | 50 | 26,7 | 26,7 | 25 | 33,3 | 63,6 |
Características do produto exportado | 37,5 | 60 | 40 | 0 | 16,7 | 18,2 |
Características do mercado | 12,5 | 6,7 | 13,3 | 50 | 50 | 9,1 |
Dificuldade fora do alcance da empresa | 0 | 6,7 | 20 | 25 | 0 | 9,1 |
A Tabela 3.20 mostra a distribuição por setores da indústria das razões para não ter nem planejar investimentos no exterior. Os setores produtores de bens de capital como máquinas e equipamento, equipamentos de comunicações e equipamentos de automação mostram menores proporções de firmas com falta de necessidade de investimento do que a média das firmas de capital nacional. Simultaneamente, as características do produto exportado ou do mercado parecem afetar as decisões de investimento nestes setores. Finalmente, os produtores de maquinas e equipamentos e equipamentos de comunicações apresentaram um maior proporção de firmas com dificuldades externas para a realização do investimento no exterior.
❖ Resumo dos principais resultados da pesquisa
Somente 17% das firmas de capital nacional assinalaram possuir algum tipo de investimento no exterior. As firmas grandes, com atividade permanente ou antiga na exportação parecem ter mais predisposição para investir no exterior. Os setores que apresentaram maior proporção de firmas investidoras foram: produtos de borracha, metalúrgica básica, veículos e equipamentos de precisão e automação.
Os principais investimentos no exterior das firmas de capital nacional da amostra estão concentrados nos Estados Unidos e na Argentina. Quase 85% das unidades no exterior destas firmas são utilizadas em atividades de comércio e distribuição dos produtos. Enquanto isso, os investimentos em unidades produtivas representam 12% do total e estão concentrados nos setores: têxtil, químico, metalurgia básica e veículos. As principais motivações apresentadas pelas firmas para esse investimento foram: as necessidades de logística, o costume de comprar de empresas já instaladas no país e a necessidade de acompanhar as tendências do mercado consumidor.
Os planos de investimentos apresentados pelas firmas de capital nacional indicam que a proporção de firmas investidoras poderá aumentar no futuro próximo, especialmente no caso de firmas de porte menor e dos exportadores menos permanentes. A localização de investimentos futuros é semelhante à atual, com a exceção da perda de importância do Mercosul como destino dos investimentos das firmas nacionais.
Em termos de tipo de investimento, os planos futuros continuam concentrados em investimentos tipo trade and distribution, da mesma maneira que os investimentos atuais. Os setores de calçados e de produtos de metal, que mostraram maior intenção investidora em relação ao comportamento atual e à média da amostra, não escapam desta regra geral.
Um primeiro resultado interessante da pesquisa é que os problemas de informação são o conjunto de dificuldades mais importante para planejar e realizar investimentos. Em realidade, as dificuldades relacionadas com as diversas necessidades de financiamento também são importantes, mas estes dois tipos de dificuldades não têm a mesma representatividade entre as firmas nacionais investidoras. Foi maior o número de firmas investidoras que indicou que as dificuldades relacionadas com obtenção de informação são de primeira importância.
Um segundo resultado interessante da pesquisa está relacionado com as respostas de por que as firmas não têm nem planejam investimentos no exterior. A razão – de primeira importância – com a maior proporção (40%) de firmas de capital nacional não investidoras no exterior foi a falta de necessidade do investimento no exterior. A percepção que surge das respostas é que a falta de investimento no exterior está relacionada com estratégias e características das firmas e não com restrições externas às firmas. Isto é reforçado pela falta de representatividade das razões fora do alcance da firma, que foram consideradas de primeira importância por somente 15% das firmas de capital nacional que não investem no exterior.
4. OS IMPACTOS DO INVESTIMENTO DIRETO NO PAÍS EMISSOR E OS PROBLEMAS DE POLÍTICA PARA ESTIMULAR A INTERNACIONALIZAÇÃO PRODUTIVA DAS FIRMAS
Os objetivos desta seção são dois. Por um lado, apresentar alguns dos efeitos do investimento direto no exterior sobre a economia do país emissor, basicamente, os impactos sobre o nível de emprego, as exportações e o balanço de pagamentos. Por outro, discutir os problemas de política que o investimento no exterior cria para o país emissor, em especial, a conveniência ou não de algum tipo de política de estímulo à internacionalização da produção das firmas domésticas. Para contribuir na reflexão sobre as ferramentas mais adequadas, serão discutidas algumas experiências de apoio direto aos investimentos no exterior como no caso de USA, Coréia e Turquia. Como conclusão desta seção serão apresentadas algumas recomendações para o apoio e o estímulo ao investimento no exterior.
Com relação aos impactos, a literatura teórica e a experiência das firmas indicam que o investimento no exterior pode ser importante para aumentar o volume exportado, mas que os efeitos dependem das características do produto, do mercado receptor e do tipo de investimento. Por exemplo, os investimentos que têm como objetivo aumentar o espaço no mercado externo (trade and distribution) ou aumentar a produtividade da firma (efficiency-seeking) tendem a aumentar as exportações e a eficiência da firma investidora. Os investimentos feitos para obter insumos melhores e de forma mais econômica (resource-seeking) normalmente não têm um impacto direto sobre as exportações da firma investidora e do país emissor, podendo contribuir para o aumento das importações. Pode-se alegar, porém, que o aumento da produtividade da firma investidora terá um efeito positivo sobre as exportações líquidas dessa firma. O investimento direto para produzir no exterior (market seeking) também pode ter um efeito negativo sobre as exportações, na medida que substitui exportações por produção no mercado de destino (Unctad, 1996).
Os impactos do investimento no exterior sobre a criação líquida de empregos sempre foram um argumento de peso contra as políticas de apoio a este tipo de investimento. Normalmente, estimava-se que o impacto líquido mais provável seria negativo, criando emprego no exterior em detrimento do emprego doméstico.34 O impacto líquido sobre o emprego é ainda mais difícil de estimar que o impacto líquido sobre as exportações e o balanço de pagamentos. O investimento no exterior pode gerar um conjunto de efeitos indiretos sobre a produtividade das firmas e da economia que permita compensar parcial ou totalmente os efeitos diretos negativos sobre o emprego.
A ambigüidade dos resultados econômicos no país emissor do investimento no exterior contribui para criar dilemas de política em relação a esta atividade. Em relação ao emprego, por exemplo, o dilema existe porque se o investimento no exterior pode não estimular, ou até reduzir, a criação de emprego na economia doméstica, faz sentido utilizar recursos públicos para estimular a criação de empregos no
34 Este sempre foi um argumento muito importante na discussão pública nos Estado Unidos, o principal país emissor de investimento direto. Por exemplo, na discussão recente do Nafta, os sindicatos americanos argumentaram que os menores custos trabalhistas e o acesso ao mercado americano estimulariam o investimento direto das firmas americanas no México, criando emprego no México e reduzindo o emprego líquido nos Estados Unidos. Até o momento, não foi observado nenhum efeito negativo significativo sobre o emprego americano, como resultado da criação do Nafta e da localização de investimentos no México.
exterior, especialmente em um contexto de baixo crescimento da oferta de empregos? Em relação às exportações e ao balanço de pagamentos, a questão que se coloca é se um país que está recebendo poupança externa deve propiciar a saída de capitais na forma de investimento comercial e produtivo no exterior, quando não é claro o efeito positivo sobre as exportações, podendo agravar a necessidade de recursos externos do país emissor?
A linha de argumentação escolhida em relação a esses dilemas de política econômica é que o investimento no exterior nem sempre é uma escolha e que nas circunstâncias da concorrência em alguns mercados e produtos pode se transformar em uma necessidade para muitas firmas domésticas. Consequentemente, a não realização destes investimentos pode acarretar perda de dinamismo dessas empresas sob pressão da concorrência internacional, ocasionando impactos negativos sobre o emprego e a competitividade da economia. A comparação que deve ser feita para a análise da conveniência ou não do investimento é, portanto, entre as perdas e ganhos de uma situação sem investimento versus as perdas e ganhos de uma situação com investimento direto no exterior. Nesta comparação, os efeitos negativos sobre o emprego e o balanço de pagamentos do investimento no exterior podem ser menores do que na situação de perda de competitividade e de mercados das firmas domésticas.
Aceita a idéia de não inibir ou até estimular o investimento no exterior, resta discutir os melhores instrumentos para criar um marco favorável para esta atividade. Por um lado, muitos países, desenvolvidos e em desenvolvimento, contam com mecanismos de seguro para mitigar os riscos comerciais e políticos do investidor no exterior. Alguns exemplos dessas políticas serão apresentados.
Financiamento e seguro contra riscos do investimento podem ser políticas necessárias, porém não suficientes para a internacionalização produtiva das firmas. Como ficou claro da análise dos determinantes do investimento no exterior, para esta atividade é necessário contar com: i) o desenvolvimento de ativos específicos ou proprietários, o que implica um grau importante de desenvolvimento tecnológico; ii) a construção de capacidades para diferenciar, em termos de produtos e serviços associados ao fornecimento desses produtos; e iii) um forte contexto competitivo no mercado doméstico, que obrigue as corporações nacionais a aumentar sua eficiência e a buscar novos mercados. Portanto, políticas horizontais de desenvolvimento tecnológico, que propiciem a melhor adaptação de tecnologias existentes e permitam a criação de novos produtos e processos, junto com políticas regulatórias que aumentem o grau de concorrência nos mercados domésticos parecem ser mais adequadas para facilitar a internacionalização das empresas de um país.
4.1. Os impactos no país emissor e os dilemas de política pública
❖ A ambigüidade dos impactos no país emissor
Os críticos das políticas de estímulo ao investimento de firmas domésticas no exterior coincidem em uma série de argumentos em relação aos hipotéticos impactos sobre emprego, exportações, renda, taxa de investimento e arrecadação tributária. Os argumentos podem ser resumidos da seguinte maneira.
1) Deslocamento de emprego. O investimento cria emprego no exterior, particularmente no caso de investimento resource-seeking de mão de obra mais barata.
2) Reduções de exportações. Poderia gerar a substituição de exportações por vendas realizadas diretamente com a produção no exterior. Também pode haver uma substituição de exportações para terceiros mercados, através de vendas realizadas a partir da base de produção no exterior.
3) Transferência de conhecimentos. O investimento no exterior estaria também transferindo conhecimentos organizacionais, tecnológicos, comerciais e capacitando recursos humanos no exterior em vez de fazê-lo no país de origem.
4) Redução da arrecadação tributária. O investimento direto no exterior pode reduzir a base tributária doméstica, pela menor renda doméstica e pelo menor lucro da firma investidora, especialmente se utilizar preços de transferência.
5) Menor taxa agregada de investimento na economia local. Se em uma determinada economia existem problemas de emprego e baixa taxa agregada de investimento, é desejável que as firmas locais invistam no exterior em vez de fazê-lo no país de origem? As respostas a esta questão são matéria muito controversa, porque além do tema do emprego ser um tópico sensível – que normalmente dificulta uma discussão isenta –, as evidências empíricas não são numerosas e seus resultados pouco definitivos para favorecer claramente uma resposta positiva ou negativa a esta questão.35
Os efeitos do investimento no exterior sobre as exportações da economia doméstica foram os mais estudados, mas não estão isentos de posições controversas e ambigüidades.36 Na análise de um produto individual, o investimento direto no estrangeiro – para produção no mercado externo – pode substituir praticamente as exportações anteriores à realização do investimento. Mas o impacto no comércio exterior de uma subsidiária não termina neste ponto. Uma subsidiária no exterior pode gerar demanda de outros produtos domésticos, como bens de capital, bens intermediários ou serviços. Estes bens e serviços podem ser supridos por firmas relacionadas ao investidor ou por fornecedores no país doméstico.37 Isto pode levar a um novo comércio entre o país emissor e o país receptor, podendo levar também a novos investimentos, por exemplo, na ampliação da capacidade da rede de fornecedores locais.
O investimento no exterior pode, portanto, substituir exportações, mas pode estimular ou criar um novo comércio, mudando a composição do comércio exterior do país emissor. De acordo com a Unctad (1996), o efeito criação de comércio do investimento no exterior normalmente supera o efeito substituição, ao menos na evidência dos países desenvolvidos.
35 Unctad (1993) assinala que é muito complexo determinar quantitativamente o efeito líquido do investimento estrangeiro emitido por um país. A literatura é muito mais extensa sobre os efeitos do investimento direto no país receptor.
36 Veja-se Unctad (1996).
37 Existe sempre a possibilidade de que os fornecedores sejam firmas de terceiros países. Mas, a experiência indica que as relações de clientela entre as firmas internacionalizadas e seus fornecedores se mantêm, muitas vezes estimulando a própria internacionalização desses fornecedores.
O World Investment Report (Unctad, 1996) apresentou um sumário dos estudos empíricos – feitos nos países desenvolvidos –, sobre os efeitos nas exportações do investimento no exterior. Os principais pontos destacados dos resultados empíricos foram:
1) A taxa de crescimento das exportações de uma economia está associada positivamente com a taxa de crescimento do investimento direto no exterior, mas a força deste relacionamento cai com o aumento do nível do investimento no estrangeiro. Isto implica que, no início, as afiliadas estrangeiras são dependentes das exportações das firmas no país de origem, mas à medida que o investimento cresce e se consolida, há menor demanda de produtos locais.
2) Muitos dos estudos mostraram que, ainda que o nível de exportações do país emissor continuou a crescer, a composição desta exportação mudou, passando de produtos finais para componentes e peças.
3) A produção da subsidiária no país receptor tende a diminuir as exportações do mesmo produto a partir de terceiros países para este mercado, indicando a importância do investimento direto para obter market-share no país receptor.
Unctad (1993) considera que a análise dos efeitos líquidos do investimento sobre o balanço de pagamentos do país emissor não deve limitar-se aos efeitos de criação ou substituição de comércio. Para a Unctad (1993), o efeito líquido depende não só das mudanças nos fluxos de comércio, mas também da criação de novas vantagens competitivas por parte de firmas e países envolvidos e dos efeitos sobre a conta de capital e os serviços de fatores.
Em relação à conta de capital e aos serviços de fatores, o impacto vai depender de vários fatores. Um dos fatores é a estrutura do financiamento do investimento no exterior. Isto pode afetar não só a conta de capital, mas também outros itens do balanço de pagamentos, particularmente os serviços de fatores. A conta de capital pode ser pouco afetada se a utilização de financiamento externo, através de subsidiárias estabelecidas no exterior, gerar uma saída de capitais menor do que o montante total do investimento a ser realizado. Um outro exemplo de como a estrutura de financiamento afeta o balanço de pagamentos é o caso da realização de investimentos com uma alta proporção de recursos de subsidiárias já instaladas no exterior. Neste caso, a saída de recursos pode ser muito baixa, mas, em compensação, os ingressos de lucros e dividendos no país de origem da matriz podem ser praticamente nulos.
Um outro fator que pode afetar o balanço de pagamentos em relação ao investimento no exterior é a existência de risco cambial (expectativa de desvalorização) no país de origem do investimento, o que pode reduzir a remessa de lucros do exterior e estimular o investimento na subsidiária externa, ao mesmo tempo que estimula a saída de capital para investimento no exterior.
❖ Os dilemas da política pública de apoio ao investimento no exterior
A grande dificuldade para definir a conveniência ou não de ter políticas públicas para estimular o investimento das firmas domésticas no exterior é a ambigüidade dos efeitos líquidos no país de origem. Reforça a posição dos críticos ao apoio ao investimento no exterior o fato de que os efeitos diretos (número de empregos não criados no país de origem da firma internacionalizada ou montante da saída de capital) têm maior objetividade quando comparados com a menor definição dos efeitos indiretos (criação de empregos e investimento na rede de fornecedores domésticos da firma internacionalizada, criação de novas exportações de peças e bens intermediários ou ingressos de lucros e dividendos).
Adicionalmente à ambigüidade dos impactos, a política pública nesta matéria, nos países em desenvolvimento, se enfrenta com o problema da melhor utilização de um recurso relativamente escasso, como são as divisas externas. Esta questão pode ser colocada nos seguintes termos: é desejável que um país em desenvolvimento que está absorvendo recursos externos estimule a saída de capitais no conceito de investimento no exterior? Adicionalmente, se o investimento no exterior reduz as exportações líquidas do país emissor, ao substituir exportações por produção no mercado externo, pode agravar mais ainda os problemas do financiamento do balanço de pagamentos.
Mesmo reconhecendo as dificuldades em avaliar os impactos positivos para a economia como um todo, o argumento em favor de políticas públicas para o investimento no exterior deve procurar se basear na constatação que, muitas vezes, o investimento no exterior não é uma escolha voluntária, mas uma decisão inevitável e necessária para a firma exportadora, pois não existem alternativas disponíveis para sustentar o esforço de vendas e penetração nos mercados externos.
A internacionalização via investimento externo pode ser a única alternativa para firmas que competem em forma globalizada e que enfrentam transformações no plano tecnológico e produtivo. O investimento externo é vitalmente necessário para poder continuar competindo nos mercados externos e desenvolvendo a linha de produtos da firma.
Nesses casos, a competitividade tem parâmetros globais e portanto as firmas devem ser internacionalizar para: i) ter acesso a tecnologias e práticas internacionais; ii) proteger e ampliar posições nos mercados externos; iii) aumentar valor agregado de suas vendas no exterior; e iv) melhorar a qualificação de seus recursos humanos. A internacionalização permite também explorar melhor as economias de escala e as vantagens que podem surgir de seus ativos proprietários, focando-se e especializando-se. O BOX 4.1 ilustra como o investimento no exterior pode auxiliar o desenvolvimento tecnológico da firma.
BOX 4.1. O investimento no exterior e o desenvolvimento tecnológico da firma
Nos PEDs, as vantagens proprietárias de tipo tecnológico das firmas são resultado do processo de aprendizagem, da experiência e das práticas tecnológicas mais do que da posse de tecnologias próprias. Portanto, o investimento no exterior pode contribuir positivamente para o desenvolvimento tecnológico da firma investidora pois:
1) Pode elevar os recursos destinados a P&D, já que se expande o tamanho do mercado da firma e, portanto, a possibilidade de recuperar o investimento em P&D.
2) Quando o mercado o requer, por suas exigências e características, as firmas instalam laboratórios e centros de pesquisas que contribuem para o desenvolvimento das capacidades de inovação das firmas.
3) A própria produção no exterior pode ser uma fonte de estímulo e de retro-alimentação em termos de conhecimentos de processos e produtos, em mercados com diferentes escalas, materiais, gostos e skills. Neste sentido pode reforçar a base tecnológica e as vantagens proprietárias da firma ao expandir seus conhecimentos (Se a firma conhece por experiência, uma experiência qualitativamente diferente no mercado internacional pode ser fundamental para os conhecimentos da firma).
Os investimentos asset-seeking na Europa ou nos Estados Unidos podem trazer vários benefícios tecnológicos. No caso de compra de uma firma existente, o comprador tem acesso à base de experiência, habilidades e conhecimento tecnológico que antes não tinha. Se o investimento for numa planta nova (greenfield), ainda é possível obter spillovers tecnológicos, no caso de instalação em áreas com grande concentração de firmas de alta tecnologia ou dos fornecedores locais.
Extraído de Xxxxxxxxxx e Xxxxx (1999).
A não realização do investimento no exterior pode reduzir a capacidade da firma doméstica de competir globalmente, gerando efeitos distributivos negativos, assim como perda de renda na economia doméstica. Alternativamente, o investimento no exterior pode gerar uma cadeia virtuosa de efeitos sobre o emprego, particularmente, se gerar investimentos complementares no país emissor.38 O BOX 4.2 mostra por que todas estas considerações devem ser levadas em conta no momento da avaliar as políticas públicas de apoio para o investimento no exterior.
Um estudo realizado pela FUNCEX (2000), que avaliou o desempenho das exportações brasileiras para o mercado americano, fornece importantes elementos para interpretar o investimento no exterior como uma necessidade para concorrer no mercado internacional. O estudo enfatizou, entre outras conclusões, a necessidade de investimento em logística e comercialização para reforçar e ampliar a posição exportadora no mercado americano.
38Um exemplo é o caso das empresas internacionalizadas que utilizam fornecedores domésticos para suas operações no exterior. Isto gera investimento, emprego e exportações na economia doméstica.
BOX 4.2. Elementos para a avaliação de políticas públicas para o apoio ao investimento no exterior
No caso da necessidade do investimento no exterior para manter a capacidade de competição, a metodologia de avaliação das políticas públicas deve considerar o resultado líquido para a economia da não realização do investimento no exterior (perda do emprego, das exportações e da competitividade das firmas domésticas sob pressão competitiva) versus o resultado líquido de realizar o investimento no exterior (manutenção do emprego e da competitividade dessas firmas mais efeitos indiretos sobre o balanço de pagamentos e externalidades diversas).
A questão dos efeitos do investimento no exterior sobre as variáveis domésticas deve, portanto, ser colocada nos seguintes termos. Se uma empresa é competitiva localmente e ainda tem oportunidades de investimento competitivo na economia doméstica é possível que o investimento dessa firma em outros mercados diminua o emprego, as exportações e a renda no país local. Mas, se a empresa estiver perdendo competitividade e precisando investir no exterior para ganhar mercados ou aumentar sua eficiência, a relocalização do investimento do mercado local para o externo pode não implicar perda líquida de empregos ou renda para a economia doméstica. Pode ajudar a melhorar a competitividade da firma, equilibrar sua situação financeira, elevando a sofisticação das atividades realizadas no país de origem e ter externalidades positivas sobre o investimento e o emprego dos fornecedores da firma.
Para a maioria das empresas entrevistadas, a realização de investimentos no mercado americano foi condição essencial para a consolidação neste mercado, dadas as condições de acesso e as características específicas ou distintivas do funcionamento do mercado americano. As características específicas do mercado norte-americano colocam desafios não-triviais que “requerem a adoção por estas empresas, de estratégias diferenciadas que envolvem adaptações de produtos e processos produtivos, certificações de produto, operação de sistemas logísticos no mercado de destino, incorporação de empresas nos Estados Unidos, estabelecimentos de parcerias estáveis com atores locais e a “focagem” da atuação da empresa em nichos de mercado onde a competição via preços é de alguma forma mitigada por critérios de qualidade e servicing”.39
Este tipo de estratégia não é adotada com a mesma intensidade e velocidade em todos os setores e, quando adotada, não tem o mesmo “formato”. Para muitas empresas, “a adoção deste tipo de estratégia eqüivale a adotar como objetivo prioritário tornar-se um fornecedor local” para igualar os produtores domésticos, em termos de prazo de entrega, qualidade e serviços.
Parece importante ilustrar as conclusões do estudo da FUNCEX (2000) com alguns exemplos de investimentos (em diferenciação e logística) realizados pelas empresas exportadoras brasileiras no mercado americano (vide BOX 4.3).
39 FUNCEX (2000), pág. 51.
Box 4.3.
Investimentos para diferenciar o produto
Normalmente, as empresas devem realizar uma série de investimentos no mercado americano com o objetivo de conquistar um nicho e diferenciar seu produto. A estratégia de diferenciação permite às empresas um hedge contra a pressão sobre os preços. “O mercado americano reconhece produtos de qualidade, reconhece um bom serviço e paga um prêmio por isso”.
Para muitas empresas, a diferenciação significa tratar de forma específica cada cliente, “customizar” o produto e os serviços associados ao mesmo, e para isso precisam ter agilidade, flexibilidade e assumir custos como armazenagem e estrutura nos EUA. Para outras, muito freqüente no caso do setor têxtil, a diferenciação consiste em desenvolver produtos de acordo com a moda americana, com contratação de pesquisas e de um profissional no mercado americano. Nesses casos, resulta necessário também atender as demandas dos clientes e acompanhar a evolução do produto e das técnicas de vendas no varejo.
Em alguns setores, atingir este objetivo de diferenciação pode significar a necessidade de implantar um centro de engenharia de aplicação junto a clientes, noutros ele pode exigir a manutenção de equipes de vendas locais para atuar diretamente junto a varejistas.
Para todas as empresas, exportar parece implicar a capacidade de gerar produtos diferenciados e de alto padrão de qualidade, disponibilizando-os no mercado nas condições de prazo, preço e serviços demandados pelos clientes.
Investimentos de logística
Pelo fato de ser um país de dimensões continentais, a logística pode, inicialmente, ser um fator negativo e, posteriormente, um fator positivo para as estratégias de competição das empresas exportadoras no mercado americano. Adicionalmente, a difusão do paradigma da “produção enxuta” tornou a logística um requisito essencial de competitividade para enfrentar a competição de fornecedores locais e/ou dos países vizinhos.
Um exemplo da complexidade que assume a logística é a entrega just-in-time de um produto brasileiro a um cliente situado no norte dos EUA. “...a mercadoria chega aos portos americanos no Mississipi, depois sobe o Mississipi e é estocada em um porto neste rio. A partir deste, a cada duas horas um caminhão é direcionado à fábrica do cliente, o qual possui um estoque de apenas 3 horas. Caso o caminhão fique parado por um tempo superior a 1 hora, a linha de produção da fábrica do cliente terá de ser interrompida.”
Em alguns casos, a logística nos EUA é um fator restritivo, capaz de limitar a área geográfica de atuação das empresas no mercado. Por exemplo, para uma empresa exportadora de papel de impressão, a geografia americana aparece como um obstáculo para a distribuição de mercadorias. A logística obriga a tomada de decisão entre “atacar” somente uma área ou todo o território americano ou, alternativamente, montar um sistema logístico que permita à empresa atender todo o mercado americano de maneira competitiva.
Algumas empresas exportadoras vão gradativamente expandindo sua atuação através da abertura de diversas unidades regionais e há, ainda, empresas que buscam montar sistemas logísticos mais sofisticados para atender grandes clientes.
Investimentos para se tornar um fornecedor local
Para uma grande empresa de madeira, a concorrência com produtores locais no mercado americano, que não precisam atravessar grandes distâncias para entregar seus produtos, obrigou a ter uma estrutura próxima ao mercado consumidor. Isto permitiu ter agilidade e qualidade no atendimento.
Para uma grande empresa do setor metalúrgico, fabricante de portas e fechaduras, uma das principais estratégias adotadas para enfrentar a concorrência dos países asiáticos e atender às novas exigências dos clientes foi a adoção de uma unidade no território norte-americano, para cumprir os requerimentos de prazos de entrega, qualidade e preços mais baixos. A estrutura local possui armazenagem para pronta entrega e um escritório de venda, que permite à empresa controlar todo o processo de importação e distribuição dos produtos no território americano.
Fonte: FUNCEX (2000).
4.2. Alguns casos da experiência internacional de apoio ao investimento no exterior
Um instrumento muito utilizado para apoiar o investimento no exterior é o seguro contra riscos políticos. Os Estados Unidos têm uma agência governamental que oferece seguro contra riscos políticos, mas também financiamento e garantias para os investidores pequenos e médios. A Turquia tem um programa especial para o financiamento de lojas de comercialização no exterior de bens de consumo diferenciados.
🙜 Estados Unidos
O governo americano conta com uma agência de apoio ao investimento no exterior chamada Overseas Private Investment Corporation (OPIC) que financia operações de investimento no exterior e oferece também garantias e seguro contra risco político. Adicionalmente, fornece um conjunto de serviços de apoio ao investidor americano no exterior. A agência opera desde 1971 e o objetivo é apoiar principalmente o investidor de porte pequeno e médio.
No caso de empréstimos, a OPIC disponibiliza fundos de médio e longo prazo, com valores desde US$ 1milhão até US$ 200 milhões, mas, normalmente, o valor das operações de financiamento é muito inferior a US$ 200 milhões, pois o objetivo da agência é realizar operações com empresários pequenos e médios. O financiamento pode alcançar até 50% dos projetos novos e até 75% da ampliação de projetos existentes (anteriormente financiados ou não pela agência). Os prazos vão de 5 anos até 12 anos, podendo chegar até 15 anos, todos com um período de carência para o pagamento das amortizações.
Os empréstimos podem ser realizados para uma firma que vai fazer um investimento no exterior (corporate-finance transactions) ou para financiar um projeto específico de investimento no exterior (project financing). No primeiro caso, mesmo que o investimento seja no exterior, a companhia americana é a responsável pelo pagamento e o oferecimento das garantias. Os empréstimos podem ser para capital de giro, ativos fixos ou expansão das instalações. O investidor americano deve ser proprietário de 25% do empreendimento no exterior.
No segundo caso, o financiamento é para uma entidade no exterior – que realiza um projeto de investimento
– e essa entidade deve contar com a participação de mais de 25% de uma firma americana. As garantias apresentadas podem estar no país do investimento ou nos Estados Unidos. Esta firma é responsável pelos compromissos financeiros com a OPIC até o projeto ficar pronto, mas posteriormente, os compromissos são responsabilidade da entidade no exterior. Os empréstimos são de 3 anos até 15 anos.
A OPIC também realiza operações mistas (corporate and project financing) e financia a instalação de franquias de firmas americanas no exterior, com o requerimento de que a firma americana participe em 25% ou mais nas operações franqueadas ou tenha algum tipo de envolvimento significativo.
Junto com capitais privados, a agência criou uma família de fundos para realizar investimentos em participações societárias em empresas novas, em expansão ou em empresas privatizadas nos países emergentes. Os fundos são geridos por administradores privados em várias regiões e setores de
atividade, e, ao final de 1999, tinham uma carteira de US$ 3,0 bilhões. Estes fundos financiam joint- ventures, investimentos de distribuição, franquias e outras entidades no exterior que contam com participação significativa de firmas americanas.
A OPIC oferece garantias para empresas pequenas e médias que tomam empréstimos para realizar investimentos no exterior. As garantias estão disponíveis para novos projetos ou para ampliação dos existentes, assim como participações societárias, operações de leasing ou outras formas de investimento de longo prazo. As instituições que financiam a operação de investimento têm que ser majoritariamente americanas. Os riscos cobertos são os de não conversibilidade da moeda (currency inconvertibility), expropriação e violência política.
Em relação aos serviços oferecidos aos investidores, a OPIC organiza missões de investidores americanos para países selecionados, com o objetivo de permitir que os empresários americanos conheçam autoridades e empresários locais, assim como também prepara missões de investidores estrangeiros para os Estados Unidos. A OPIC organiza regularmente seminários sobre questões relacionadas aos investimentos no exterior.
Os requerimentos que deve cumprir uma operação financiada pela OPIC são: i) rentabilidade econômica e financeira; ii) impactos neutros ou positivos no emprego nos Estados Unidos; iii) impactos neutros ou positivos no desenvolvimento americano e do país receptor; e iv) respeito ao médio ambiente e às normas trabalhistas. Os investimentos financiados pela OPIC em um determinado país não devem substituir exportações americanas em terceiros mercados nem podem aceitar incentivos do país receptor relacionados com o comércio (requerimentos de importação ou exportação), que poderiam danificar o comércio exterior americano.
A diretória da OPIC é integrada em partes iguais por representantes do setor privado (de associações de pequenos e médios empresários) e por representantes do governo.
🙜 Coréia
A organização encarregada de fornecer garantias e seguro de crédito do comércio exterior na Coréia – the Korea Export Insurance Corporation – oferece também seguro contra riscos de investimentos no exterior. Os riscos cobertos são políticos, como a guerra, nacionalização ou falta de conversibilidade da moeda doméstica. A cobertura é por um montante equivalente até 90% do investimento mais uma estimativa de dividendos esperados. O período pode ser até 15 anos, mas pode ser estendido.
A agência coreana também oferece seguros para projetos de construção no exterior. Os riscos cobertos são os de falta de pagamento por razões políticas ou comerciais.
🙜 Turquia
O EXIMBANK da Turquia oferece garantias contra risco político para os investimentos no exterior dentro do Overseas Investment Insurance Programme, que foi implementado conjuntamente com a Agência
Multilateral de Garantia do Investimento (MIGA). Assim como na Coréia, o banco da Turquia oferece também seguro contra risco político para os projetos de construção no exterior feitos pelas empresas turcas de construção.
Uma linha interessante, pelos impactos sobre a exportação, é o programa de financiamento para lojas de comercialização no exterior. O Overseas Chain Store Investment Credit Programme tem como objetivo favorecer as vendas diretas de produtos diferenciados no exterior. Para isso, o programa financia investimentos em pontos de vendas ou cadeias de lojas para facilitar a comercialização dos produtos nos mercados externos. Neste programa, os créditos são de até sete anos e o crédito cobre até 75% do investimento no exterior.
5. COMENTÁRIOS FINAIS: ALGUMAS SUGESTÕES DE POLÍTICA PARA PROMOVER A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS FIRMAS DOMÉSTICAS
Este trabalho teve três objetivos. Em primeiro lugar, procurou analisar as razões para o baixo grau de investimento no exterior das firmas brasileiras, especialmente aquele tipo de empreendimento relacionado com o apoio às vendas nos mercados estrangeiros. Em segundo lugar, buscou explicitar a necessidade de investimento em comercialização externa para ampliar as exportações de produtos diferenciados. Por último, discutiu os problemas de política para estimular a internacionalização produtiva das firmas.
Há muitas explicações para os determinantes do investimento no exterior das firmas locais. Resumindo a literatura teórica, pode-se dizer que o investimento no exterior das firmas de um determinado país é resultado do grau de desenvolvimento desse país, das características de sua estrutura produtiva e exportadora e de fatores ambientais e culturais. Mas, se estes são os determinantes, é natural se perguntar porque o Brasil não conta com um número maior de firmas internacionalizadas, dado seu desenvolvimento relativo e a diversificação de sua estrutura produtiva.
O trabalho discutiu três hipóteses para responder esse aparente paradoxo: um ambiente macroeconômico não favorável ao investimento em geral, a estrutura das exportações – excessivamente concentrada em destino/produtos, com forte peso das commodities primárias e industrializadas e a origem do capital dos exportadores de bens diferenciados – e, por último, o baixo coeficiente exportação- vendas totais da maioria dos exportadores brasileiros.
O papel do ambiente propício ao investimento não pode ser desprezado, pois as mesmas condições que facilitam o investimento doméstico permitem também implementar decisões de investir no exterior. Nas décadas de oitenta e noventa, justamente no período em que a internacionalização exportadora das firmas brasileiras cresceu, houve uma piora das condições que estimulam o investimento por duas razões: o aumento do nível e da variabilidade da taxa de inflação e a diminuição da alocação da poupança pública em programas de investimento produtivo. Nesse contexto macroeconômico, as firmas expandiram seus negócios no exterior com baixa taxa de investimento doméstico e externo. Depois com a economia estabilizada, limitações do sistema financeiro e do mercado de capitais restringiram as decisões de investimento das empresas brasileiras, tanto dentro do país como no exterior.
A análise da experiência de internacionalização das empresas brasileiras, realizada na seção 3, listou um conjunto de fatores, relacionados ao ambiente macroeconômico e institucional, que inibiram as decisões de investimento para apoiar as exportações no exterior, mas sem dúvida o tipo de produto exportado e a origem do capital da firma exportadora foram razões importantes para limitar os investimentos no exterior. Por um lado, o Brasil mantém até agora uma pauta muito concentrada em produtos homogêneos, que não requerem grandes volumes de investimentos no exterior para apoiar o esforço de exportação. Por outro, nos produtos diferenciados – onde se concentram as maiores necessidades de investimentos em comercialização no exterior –, o país tem uma oferta exportadora muito concentrada em mãos de produtores estrangeiros. As redes de distribuição e logística da matriz
(ou de uma associada) da empresa estrangeira exportadora que opera no Brasil eliminam a necessidade de realizar esse tipo de investimentos.40
As hipóteses deste trabalho podem ser utilizadas para explicar a baixa internacionalização das firmas brasileiras. A análise desenvolvida sobre as causas da situação de internacionalização pode fazer parte do diagnóstico de como o país chegou à situação atual de firmas exportadoras com pouco investimento nos mercados de destino. Mas este trabalho foi além de avançar uma explicação da situação atual, pois procurou também responder as questões de por quê é necessário investir no exterior e como o governo pode estimular esse investimento.
A resposta à questão de por quê é necessário investir no exterior é muito simples. Em determinados produtos e mercados externos é preciso investir em logística/comercialização para superar diversas restrições à entrada e para oferecer serviços adicionais à clientela como estratégia de concorrência e conquista desses mercados. Nesses casos, a falta de investimentos em logística, distribuição, serviços pós-vendas (manutenção e peças) dificulta a entrada e inibe o crescimento das vendas no mercado. O investimento no exterior, nessas situações, não é uma escolha voluntária, mas uma decisão inevitável para sustentar o esforço de venda e penetração no mercado externo.
Quais são os tipos de produtos/mercados onde o investimento em logística/comercialização é necessário? O investimento em logística ou em comercialização é necessário em produtos manufaturados diferenciados ou em condições de ser diferenciados, e em mercados altamente competitivos, como o americano. Isto permite construir uma relação de clientela que fortalece as quantidades vendidas e as receitas do exportador.
Apesar da ambigüidade dos efeitos líquidos do investimento produtivo no exterior sobre a economia do país emissor, o investimento em logística/comercialização externa tem efeitos positivos sobre a economia, aumentando o valor das exportações de um país e ajudando, por sua vez, a diversificar a pauta exportadora, incrementando a participação de produtos diferenciados.
Há, portanto, justificativa e benefícios em adotar políticas de apoio ao investimento externo em comercialização, mas ela não precisa ser generalizada, pois poderá otimizar seus impactos na exportação se estiver centrada nos bens com possibilidades de diferenciação – intermediários e de consumo – e nos bens de capital.
Frente à necessidade de desenvolver investimentos no exterior para ampliar o valor exportado, quais seriam as políticas públicas mais adequadas para estimular este tipo de investimento?
40 Observe-se que o trabalho assinalou a existência de uma relação de causalidade entre a estrutura de exportação e o baixo grau de internacionalização das firmas brasileiras. Deve salientar-se que o problema de estrutura que está sendo discutido não se refere só ao tipo de produto exportado, mas também à origem do capital da oferta exportadora de produtos diferenciados. Em outras palavras, há um baixo grau de investimento externo em logística e comercialização não só porque a proporção de produtos diferenciados é baixa (falta diversificação da pauta), mas também porque a oferta está concentrada em produtores estrangeiros, com redes próprias no exterior.
No exterior, as agências governamentais de crédito e seguro à exportação utilizam o instrumento do seguro contra risco político e, em menor medida, o financiamento do investimento. O exemplo americano mostra também a possibilidade de combinar esses instrumentos com uma oferta de serviços de apoio ao investidor.
No caso brasileiro, o desenho da política adequada deve partir do diagnóstico das restrições e problemas que afetam a predisposição de investir no exterior das firmas de capital nacional. Os elementos-chave do diagnóstico esboçado – baixa capacidade de diferenciação e pouco peso do negocio de exportação para a maioria das firmas – indicam que a mudança significativa da situação de investimento no exterior das firmas brasileiras tem como pré-requisitos: i) a consolidação das exportações como parcela significativa das receitas dos produtores domésticos; e ii) maior geração e desenvolvimento de ativos proprietários, o que permitiria criar condições para maior inovação e diferenciação dos produtos domésticos.41
Os componentes centrais de uma política de longo prazo para estimular o investimento no exterior são, portanto, as políticas tecnológicas e as políticas educacionais, pois estas são fundamentais para a criação e o desenvolvimento de ativos proprietários firma-específicos. A estrutura de incentivos para a inovação e a diferenciação de produtos e processos não depende exclusivamente das políticas tecnológicas e educacionais. É preciso também aumentar o grau de contestabilidade dos mercados domésticos através da política comercial e de concorrência. A maior competição no mercado doméstico força as empresas locais a procurar novos mercados (e aumentar a relação exportação/vendas totais) e a desenvolver ativos específicos, que permitam enfrentar a concorrência internacional. Esta relação entre maior concorrência no mercado doméstico e investimentos no exterior foi observada na experiência brasileira de início da década de noventa.42
A pesquisa realizada especialmente para este estudo, com uma amostra de exportadores, com e sem investimentos no exterior mostrou algumas outras razões da baixa internacionalização investidora, a demanda potencial e o tipo de produtos que poderiam se beneficiar de políticas de apoio ao investimento no exterior.
Os resultados da pesquisa mostraram as intenções de aumentar o investimento no exterior em relação à situação atual, especialmente nos casos de calçados e produtos de metal. Estes dois tipos de produtos, assim como outros setores que também mostraram intenções de ampliar os investimentos, têm uma potencialidade de diferenciação importante.
Dadas as restrições do financiamento no país, uma linha de financiamento de longo prazo é o componente central de uma política de curto prazo para estimular o investimento no exterior. Seria importante estudar a possibilidade de combinar o financiamento com um esquema de seguro contra riscos políticos.
41 Frischtak (2000) enfatiza a criação de marcas individuais e coletivas que poderiam ajudar neste processo de internacionalização e expansão dos produtos brasileiros no exterior.
42 Diversos analistas do processo de internacionalização das empresas domésticas enfatizaram este aspecto. Veja-se Goulart et all (1994) e Xxxxx (2001).
A pesquisa realizada, no entanto, mostrou a persistência de uma velha dificuldade para a internacionalização das firmas domésticas: a falta de conhecimento dos mercados externos e das regulações que afetam o investimento no exterior.43 Como resultado deste tipo de problemas, um segundo elemento de uma política de curto prazo de apoio à internacionalização deveria ser a organização e a divulgação de informações relevantes para a decisão de investimento no exterior.
Os problemas de informação, que enfrentam as firmas com intenções de investimento, têm várias dimensões, mas uma ação de organização e divulgação de informações deveria incluir: dados sobre os mercados externos, sobre as políticas regulatórias do investimento no exterior, assim com a organização de missões de empresários para o exterior e o estímulo de missões empresarias estrangeiras no país.44
Finalmente, a pesquisa revelou que um conjunto significativo de empresas exportadoras de capital nacional, quase 70% das firmas desse tipo, não têm nem planejam ter investimentos no exterior. As razões principais mais alegadas foram: i) a falta de necessidade; e ii) as características do produto das firmas. Isto significa que políticas de disseminação de informação relevante ou melhorias nas condições de financiamento podem não mudar significativamente a atitude estratégica dos produtores domésticos em relação ao investimento no exterior.
43 A pesquisa da Fundação Xxx Xxxxxx (1996) mostra que as maiores dificuldades foram localizadas no acesso à informação. Xxxxx (2001) assinala que o isolamento geográfico e cultural inibe o acesso a fontes de informação sobre oportunidades de negócios no exterior. Frischtak (2000) entende que é necessário conhecer e ser conhecido para ter acesso a informações sobre oportunidades e ser procurado.
44 Xxxxxxxxxx e Xxxxx (1999a) propõem que os países formem “agências que promovam o investimento no exterior, brindando informações sobre oportunidades, difundindo exemplos de investimento no exterior e lições que surgem dos mesmos”. Consideram também importante fomentar a associação ou formação de grupos de investidores em um determinado país, para o intercâmbio de experiências, a ajuda mútua e a disseminação de informação. Frischtak (2000), por exemplo, aponta para a importância de programas de formação de executivos internacionais, com estadias no exterior, como uma maneira de atrair informações internacionais para a realidade das empresas brasileiras.
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