INSPER
INSPER
LLM DIREITO DOS CONTRATOS
XXXXXXX XXXXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX
Os contratos de representação comercial e de distribuição stricto sensu: uma reflexão acerca dos seus principais elementos, controvérsias, distinções e similitudes.
São Paulo 2020
XXXXXXX XXXXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX
Os contratos de representação comercial e de distribuição stricto sensu: uma reflexão acerca dos seus principais elementos, controvérsias, distinções e similitudes.
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao programa de LLM em Direito dos Contratos do Insper, como requisito parcial para a obtenção do título de pós-graduada em Direito dos Contratos.
Orientadora: Prof. Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxx Xxxxxx
São Paulo 2020
O presente trabalho oferecerá uma reflexão ampla acerca de duas relevantes figuras contratuais da atualidade utilizadas no escoamento da produção – quais sejam, a representação comercial (ou agência) e a distribuição stricto sensu (ou concessão comercial) –, abordando, de forma abrangente, o surgimento desses institutos, suas terminologias e definições conceituais, bem como identificando os principais elementos, as características, os princípios norteadores do Direito e as regras a eles aplicáveis. Além dos aspectos gerais, serão apresentados alguns pontos polêmicos a fim de enriquecer o estudo e situar o leitor sob o ponto de vista prático desses dois tipos contratuais. Por fim, será realizado um cotejo analítico, expondo-se as diferenças e as similitudes existentes entre as espécies aqui envolvidas. Neste exame, adotou-se a metodologia descritiva, mediante pesquisa bibliográfica doutrinária pormenorizada, mas não exaustiva, com abordagem perfunctória, porém crítica, das referidas questões atinentes à matéria.
Palavras-chave: Representação comercial. Agência. Distribuição stricto sensu. Concessão comercial
This paper will offer a broad reflection on two relevant contractual figures that nowadays are used to commercially coverage market - namely, commercial representatives (or agencies) and the stricto sensu distributors (or commercial concession as channel partners) -, covering, in a comprehensive way, the emergence of these institutes, their terminologies and conceptual definitions, as well as identifying main elements, characteristics, guiding principles of law and rules applicable to them in Brazil. In addition to general aspects, some controversial points will be presented in order to enrich this study and situate reader from practical point of view of these two types of contract. Finally, an analytical comparison will be carried out, exposing differences and similarities between species involved here and potential risks as legal exposures. In this examination, the descriptive methodology was adopted, by means of a detailed, but not exhaustive, doctrinal bibliographic research, with a perfunctory but critical approach to referred issues related to this matter.
Keywords: Commercial representation. Sales representative. Agency. Stricto sensu
distribution. Distributors. Commercial concession. Sales channel partners.
2. Contrato de representação comercial ou agência 9
2.1. A regulamentação vigente e a questão da nomenclatura do instituto 9
2.2. Definição e características 11
2.3.1. As zonas de atuação e a garantia de exclusividade 14
2.3.2. A remuneração do representante 17
2.3.3. O direito de recusa do representado 20
2.3.4.2. Deveres do preponente 24
2.4. Formas de extinção do contrato 24
2.4.1. Decurso do prazo de duração 25
2.4.2. Resilição unilateral imotivada (denúncia) 26
2.4.3. Resolução por justa causa 28
2.4.4. Distrato ou resilição bilateral 30
2.5. A indenização tarifada pela Lei nº 4.886/65 32
3. Contrato de distribuição stricto sensu ou concessão comercial 34
3.1. Surgimento e generalidades 34
3.2. Contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu 35
3.2.2.1. Elementos essenciais 37
3.2.2.2. Elementos acidentais ou particulares 39
3.2.3. Características jurídicas 40
3.2.3.1. Contratos de distribuição como contratos de colaboração 40
3.2.3.2. Contratos de distribuição como contratos de duração 41
3.2.3.3. Contratos de distribuição como contratos relacionais 41
3.2.3.4. Contratos de distribuição como contratos por adesão 42
3.2.3.5. Redes de distribuição 43
3.2.3.6. Autonomia x controle externo x dependência econômica 43
3.2.3.7.1. A impossibilidade de aplicação analógica da Xxx Xxxxxxx (nº 6.729/79) aos contratos de distribuição 46
3.2.3.7.2. A impossibilidade de aplicação analógica da Lei do Representante Comercial (nº 4.886/65) aos contratos de distribuição 48
3.3. Extinção do contrato de distribuição stricto sensu 49
3.3.1. Decurso do prazo de duração 51
3.3.2. Resilição unilateral ou denúncia imotivada 52
3.3.3. Resilição bilateral ou distrato 55
3.3.4. Resolução motivada pelo inadimplemento de qualquer das partes (rescisão por justa causa) 55
3.3.4.1. Inadimplemento recíproco 56
3.3.5. Caso fortuito ou força maior 57
3.3.6. Extinção do sistema de distribuição e adoção de outro método de comercialização 58
4. Distinções e similitudes entre os contratos de representação comercial (agência) e de distribuição stricto sensu (concessão comercial) 59
1. INTRODUÇÃO
Ao longo das últimas décadas, o aumento frenético da demanda de mercado, atrelado ao dinamismo das relações comerciais, criou para a cadeia produtiva a necessidade de alargar os horizontes e de ampliar a eficiência do negócio como um todo, fomentando o lucro e reduzindo os custos e os riscos operacionais.
Para viabilizar o escoamento eficiente dos produtos e inserir os fabricantes nessa nova era mercadológica, as empresas passaram a contar com colaboradores externos independentes, que agem com total autonomia, desvinculados da empresa, mas constituindo verdadeira longa manus do empresário1.
Assim, novas técnicas comerciais mais convenientes foram surgindo, disseminando-se no meio empresarial no Brasil e no mundo e tomando o lugar de métodos ultrapassados, incompatíveis com a realidade social e econômica dos dias de hoje.
Entre as ferramentas de distribuição que se encontram atualmente à disposição do empresário para o escoamento da produção, ocupam lugar de destaque a representação comercial (agência) e a distribuição stricto sensu (concessão comercial), largamente difundidas na prática. A primeira perfaz figura típica, porém não tão moderna; a segunda, de criação mais recente, ainda não possui regulamentação legal.
Ambas integram a categoria dos chamados “contratos de colaboração” por excelência, nos quais as partes, jurídica e patrimonialmente autônomas, estabelecem uma relação de mútua cooperação e conjugação de esforços visando a um interesse comum, qual seja, o sucesso do negócio e a conquista da clientela.
Em razão de sua natureza colaborativa, esses contratos tendem a se protrair no tempo, sendo muitas vezes pactuados por prazo indeterminado, do que decorre outra característica dos contratos de representação e de distribuição stricto sensu: são contratos de duração, com obrigações de prestação continuada e periódica.
Entretanto, muitos dos problemas enfrentados na execução dessas duas espécies contratuais dizem respeito exatamente a seu enquadramento como contratos de duração e de colaboração2.
1 XXXXXXX, Xxxxxx. Do representante comercial: Comentários à Lei nº 4.886, de 9 de dezembro de 1965, à Lei nº 8.420, de 8 de maio de 1992, e ao Código Civil de 2002. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 2.
2 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Contrato de Distribuição: o inadimplemento recíproco. São Paulo: Atlas, 2015, p. 3.
Isso porque da duração do vínculo nasce a questão do risco da transformação das prestações pactuadas, que podem mudar ao longo do tempo conforme as vontades e os desmandos das partes ou se houver adversidades no caminho.
Desta longevidade decorre também o risco de inadimplemento das obrigações, muito mais latente nos contratos de duração do que nos de execução instantânea. Sem dúvida, a probabilidade de algum encargo não se consumar, modificar-se durante o curso ou ser cumprido com atraso nos contratos de prestações sucessivas e continuadas é consideravelmente maior3.
Acresça-se, a propósito, que a preservação do vínculo no tempo está diretamente atrelada ao comportamento guardado entre as partes no iter contratual. Como a lealdade e a confiança são a base de qualquer relação, uma vez quebrado o compromisso recíproco de colaboração e cooperação assumido pelas partes, dificilmente será possível o retorno do negócio ao status quo ante.
Dessa forma, pode acontecer de determinados atos das partes constituírem falta grave aos deveres laterais de conduta, caracterizando abuso do direito e dando ensejo à extinção do negócio, bem como à cobrança de eventual indenização.
Convém notar que, na maioria das vezes, o espírito de cooperação e colaboração presente no momento da contratação deixa de existir em sua extinção, cedendo lugar a conflitos internos e a disputas judiciais que desafiarão o intérprete do Direito na busca pela solução mais justa e adequada às partes.
A composição desses conflitos assume contornos ainda mais relevantes quando observada no âmbito dos contratos de distribuição, que, em razão da sua atipicidade, enfrentam sérios problemas de identificação das regras aplicáveis à espécie, mormente para apuração de eventual verba indenizatória.
A verdade é que são muitas as vertentes relacionadas aos contratos de representação e de distribuição stricto sensu, o que denota a complexidade e as particularidades dessas figuras contratuais tão essenciais ao mercado, que merecem ser estudadas.
Feitas essas considerações iniciais, cumpre esclarecer que a premissa essencial do presente trabalho reside em identificar as características, os princípios norteadores do Direito, as regras comuns e também as específicas aplicáveis aos contratos de representação comercial e de distribuição stricto sensu.
3 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, 2015, p. 4.
Assim, o objeto do presente estudo volta-se à abordagem global e perfunctória, porém crítica, dos principais elementos e debates envolvendo os apontados tipos contratuais.
O presente trabalho alinha-se a posicionamentos doutrinários de determinados juristas, cujos ensinamentos serão brevemente apresentados e contrapostos às demais correntes existentes, mas não de forma exauriente.
Importa realçar que não se ignora a relevância das demais modalidades contratuais, nem a existência de diversas correntes doutrinárias a respeito da matéria. Entretanto, como já realçado, a pretensão desta pesquisa não é esgotar a matéria, mas sim concentrar-se no estudo das duas espécies mais difundidas na prática comercial.
Pretende-se, desse modo, individualizar os dois institutos, trazendo à tona, de forma não exaustiva, questões polêmicas como as que envolvem, por exemplo, a terminologia, a tipicidade, a exclusividade de aprovisionamento e de atuação, a dependência econômica, a denúncia imotivada do contrato, a concessão de aviso prévio e o cálculo da indenização devida. O exame desses temas não se ocupará, contudo, das repercussões na jurisprudência
pátria.
Serão apresentados, também, pontos convergentes e divergentes entre as modalidades,
cujo cotejo analítico fornecerá elementos suficientes para a compreensão da inaplicabilidade analógica da Lei dos Representantes Comerciais (nº 4.886/65) aos contratos de distribuição em geral, os quais devem valer-se das regras gerais do direito das obrigações e do direito contratual na resolução de conflitos.
Estas questões serão abordadas ao longo de três partes: a primeira refere-se aos contratos de representação comercial, também denominados de agência; a segunda trata dos contratos de distribuição stricto sensu ou concessão comercial; e a terceira traz uma breve comparação dos dois institutos, com análise de suas principais semelhanças e diferenças.
Em suma, o objetivo do presente trabalho é contribuir para uma melhor compreensão da natureza e dos elementos dessas relações jurídicas.
2. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL OU AGÊNCIA
2.1. A regulamentação vigente e a questão da nomenclatura do instituto
Entre as figuras contratuais existentes à disposição dos empresários para realizar o escoamento da produção – os chamados “contratos de colaboração” –, destaca-se o contrato de representação comercial, largamente utilizado desde o seu surgimento, regulado pela Lei nº 4.886, de 09.12.1965, com alterações introduzidas pela Lei nº 8.420/1992, bem como pelos arts. 710 a 721 do Código Civil de 2002 e, supletivamente, pelas normas do mandato e da comissão. Também conhecido por contrato de agência, passou a ser assim denominado com o advento do Código Civil de 2002, que alterou a nomenclatura e revogou pouquíssimas
disposições da Lei nº 4.886/65, que permanece em vigor.
Vale realçar que não é unânime entre os juristas a correspondência destas duas figuras contratuais – representação e agência –, de modo que, para muitos, como Xxxxxxxxx Xxxx Xxxxx0, Pontes de Xxxxxxx e Xxxxxx Xxxxxxx0, são institutos distintos.
No entendimento de Xxxxxxx Xxxxx Xxxx0, pelo contrário, por praticamente inexistirem incompatibilidades entre as disposições do Código Civil de 2002 e as da Lei nº 4.886/65, com suas modificações, não há que se falar em distinção entre essas duas figuras. Acrescenta o autor, ainda, que referidos diplomas são, na realidade, complementares, porquanto “a lei do
4 “Há várias e marcantes diferenças dogmáticas na regulamentação feita pelas duas leis. A Lei 4.886/65 exige o registro do representante comercial autônomo no seu órgão regulador, enquanto o Código Civil não exige registro do agente nem mesmo cria esse órgão. O contrato de agência prevê um subcontrato (ou contrato à parte), chamado de distribuição, o que não acontece com o contrato de representação comercial, que é monolítico.
O art. 1º da Lei 4.886/65 diz que o representante comercial autônomo promove negócios mercantis, enquanto o Código Civil diz que o agente promove certos negócios. Compreendemos a expressão mercantis como referente a mercadorias; aliás, nota-se que as duas palavras são cognatas, isto é, nasceram juntas, são irmãs, da mesma família linguística. Por isso, o RCA representa mercadorias e não outros valores, como serviços e outros valores intelectuais. [...]
Por seu turno, o agente promove certos negócios, vale dizer, promove negócios mercantis e não mercantis, como valores não identificados; como a prestação de serviços de qualquer natureza; como os serviços bancários, seguros, investimentos. Não se sabe de algum RCA que represente bancos ou seguradoras. O agente, portanto, pode representar empresas que vendam mercadorias e os demais valores econômicos, como marcas e patentes, serviços médicos e odontológicos, de colocação de carpetes e cortinas, isto é, outros valores ‘in commercium’.
Por estas razões, e por outras que irão se revelar em seguida, chegamos à conclusão de que o RCA é um profissional, o agente é outro; o contrato de representação comercial é um tipo de contrato; o de agência é outro tipo. Assim sendo, o RCA é sempre um empresário; o agente nem sempre, poderá ser um empresário ou um civil. O agente poderá registrar-se na Junta Comercial ou no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, ou não se registrar em nenhum deles, agindo como cidadão.” XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx. Do representante comercial autônomo. 1. ed. São Paulo: Ícone, 2011, p. 144-145.
5 SAAD, Xxxxxxx Xxxxx. Representação comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 17.
6 Ibid., p.20-21.
representante comercial autônomo alude a negócios mercantis, ao passo que o Código Civil refere-se tão só a negócios”7.
Ao defender a correspondência dos institutos, Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx anota que:
A simetria dos institutos da agência e da representação comercial resulta em alguns questionamentos que exigem o enfrentamento de algumas elucidações. O Código Civil, ao introduzir o contrato de agência no direito brasileiro, não revogou e nem substituiu a lei especial que disciplina a representação comercial. Ao contrário, o art. 721 determina expressamente aplicação da lei especial, no que couber, ao contrato de agência. Por outro lado, em decorrência da identidade ontológica do contrato de agência e da representação comercial, não se pode afastar os efeitos jurídicos introduzidos pelo legislador pelo advento do Código Civil de 2002.
Com efeito, o novo Texto Civil opera nova metodologia de interpretação. A leitura da lei especial há de ser sustentada pelos princípios da Parte Geral do novo Texto Civil. Incorpora-se ao micro-sistema normativo da representação comercial (Lei n.º 4.886/65) a disciplina das normas contidas no capítulo pertinente ao contrato de agência. A permissão de aplicação de uma solução regulada no Código, para outra hipótese legislativa análoga, ainda que desprovida de regulação, caracteriza o que a doutrina denomina de sistema móvel. 8
A respeito, observa ainda o aludido autor que Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, ao comentar e atualizar a obra clássica de seu pai, Xxxxxx Xxxxxxx, reconheceu a correspondência de ambos os institutos e a complementariedade das normas9.
Em suma, basta confrontar o texto do art. 710 do Código Civil de 200210 com o do art.
1º da Lei nº 4.886/6511 para concluir-se que se trata do mesmo fenômeno jurídico12.
7 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx. 2014, p. 21.
8 XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. As similitudes entre os contratos de agência e representação comercial. In: XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx, XXXXXXX XX., Xxxxxxx Xxxxx (coords.). Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 476.
9 “Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, ao comentar e atualizar o clássico Do representante comercial: comentários à Lei nº 4.886, de 9 de dezembro de 1965, à Lei nº 8.420, de 8 de maio de 1992, e ao Código Civil de 2002, de autoria de seu pai Xxxxxx Xxxxxxx observa: ‘O Código Civil, no art. 710, regulando o contrato de agência, preserva a idéia legal do contrato de representação comercial. Coerente com o seu objetivo de unificar o Direito privado, o Código retirou do conceito do art. 710 a limitação aos negócios mercantis, existente no art. 1.º da Lei n.º 4.886/65. O contrato de agência, portanto, poderá envolver a intermediação de qualquer espécie de negócios, desde que estes não sejam o ‘objeto’ mediato de ato de intermediação regulamentado por outra lei especializada’”. Ibid., p. 472. 10 In verbis: “Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada”. 11 In verbis: “Art. 1º. Exerce a representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou a pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios”.
12 No presente trabalho serão utilizados indistintamente, como sinônimos, os seguintes termos: (i) representação comercial e agência, (ii) representante comercial e agente, e (iii) preponente e representado.
2.2. Definição e características
Historicamente, o fenômeno da representação comercial surgiu da figura do mascate ou vendedor ambulante, “a partir da ideia de profissionalização do mandato”13, e está diretamente atrelado à necessidade dos empresários de angariar clientes fora do estabelecimento comercial, o que os levou a contratar “outros empresários, que fazem do agenciamento de clientela o objeto de suas empresas”14.
Estes agentes são responsáveis por promover e intermediar profissionalmente os negócios do preponente, captando a clientela; entretanto, não adquirem as mercadorias dos preponentes e nem agem em nome próprio, mas sim em nome e por conta da empresa que representam.
Em regra, o representante não figura como parte na conclusão dos negócios. Contudo, na linha do que estabelece o Código Civil de 2002, eventualmente o objeto da avença pode ser ampliado, passando a “compreender a conclusão do contrato de venda e entrega das mercadorias”15, situação na qual passa a ser denominado, ainda que de forma imprópria e equivocada, contrato de “agência e distribuição”16.
Ressalte-se, porém, que não se trata de duas figuras distintas, mas sim de um “mesmo contrato de agência no qual se pode atribuir maior ou menor soma de funções ao preposto”17.
A definição deste tipo contratual tão popular está disposta no art. 710 do Código Civil de 2002, segundo o qual:
Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a
13 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx. Contratos de Colaboração Empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 203.
14 Ibid., p. 168.
15 Ibid., p. 207-208.
16 Diz-se que a denominação é imprópria e equivocada porque o Código Civil de 2002, para além da polêmica em torno da alteração do nome da figura contratual, inovou também ao acrescentar a possibilidade de o agente dispor da coisa a ser negociada, nomeando essa espécie de agência como “distribuição” (art. 710, parte final). Isso gerou confusão de ordem prática e conceitual com outro instituto, o contrato de distribuição “stricto sensu” ou concessão comercial, atípico, que não se confunde com o contrato de representação comercial ou agência aqui estudado, muito menos com a espécie “distribuição” do contrato de agência prevista na parte final do art. 710 do CC/02. Para Xxxxxxx Xxxxxx de Aragão e Xxxxxxx X. Xxxxxxxx xx Xxxxxx, o conflito semântico trata-se de “impropério legislativo” que revela a falta de rigor e a má técnica legislativa. XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx de; XXXXXX, Xxxxxxx
R. Monteiro de. O contrato de distribuição do art. 710, caput, parte final, do Código Civil de 2002. In: XXXXX, X. Xxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx X. (coords.). Representação Comercial e Distribuição: 40 anos da Lei nº 4.886/65 e as novidades do CC/02 (arts. 710 a 721). EC 45/04: estudos em homenagem ao prof. Xxxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 245.
17 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, op. cit., p. 169.
realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada.
Definição semelhante, mas com enfoque direto na pessoa do representante comercial, é dada pelo art. 1º da Lei n º 4.886/65:
Exerce a representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou a pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios.
Para Xxxx Xxxxxxx00, o contrato de representação comercial é aquele:
[...] em que uma parte se obriga, mediante remuneração, a realizar negócios mercantis, em caráter não eventual, em favor de uma outra. A parte que se obriga a agenciar propostas ou pedidos em favor da outra tem o nome de representante comercial; aquela em favor de quem os negócios são agenciados é o representado. O contrato de representação comercial é também chamado contrato de agência, donde representante e agente comercial terem o mesmo significado.
.
Com base nesses conceitos, Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx pontuam que o contrato de representação ou agência caracteriza-se, em regra: (i) pela autonomia de atuação do representante “para organizar e desempenhar sua atividade”; (ii) pelo caráter duradouro e pela habitualidade na prestação do serviço; (iii) pela intermediação do negócio, que é promovido “em nome e por conta do representado”; (iv) pela difusão dos produtos ou serviços e aproximação da clientela; (v) pela mediação e agenciamento de propostas ou pedidos; (vi) pela posterior transmissão dessas propostas ou pedidos, podendo o agente ser investido de poderes especiais para consumar ou executar o negócio; (vii) pelo direito à remuneração do representante em função do volume dos negócios úteis promovidos; e (viii) pela existência de delimitação territorial de atuação (zona de operação)19
A respeito, sintetizam os mencionados autores que:
O contrato de agência, nessa ordem de ideias, tem como objeto a atividade do agente, com caráter de estabilidade, voltada para a promoção, dentro de uma zona determinada, de contratos que serão concluídos pelo preponente, para cuja consecução empenhará múltiplas atividades, de impulso e de agilização, tudo em busca de conquistar, manter e incrementar a demanda dos produtos do preponente20.
Com relação à tipificação legal, pode-se dizer que o contrato de agência é típico, bilateral, oneroso, informal, consensual, comutativo, de duração e intuitu personae.
Quanto à forma, pode ser celebrado verbalmente ou por escrito, mas, quando realizado por escrito, deverá conter, além dos requisitos formais comuns a qualquer contrato, dez
18 XXXXXXX, Xxxx. Contratos e obrigações comerciais. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 269.
00 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 0000, p. 180-182.
20 Ibid., p. 208.
cláusulas obrigatórias, conforme determina o art. 27 da Lei nº 4.886/1965 em sua redação atual dada pela Lei nº 8.420/1992. São elas:
Art. 27. (...)
a) condições e requisitos gerais da representação;
b) indicação genérica ou específica dos produtos ou artigos objeto da representação;
c) prazo certo ou indeterminado da representação;
d) indicação da zona ou zonas em que será exercida a representação;
e) garantia ou não, parcial ou total, ou por certo prazo, da exclusividade de zona ou setor de zona;
f) retribuição e época do pagamento, pelo exercício da representação, dependente da efetiva realização dos negócios, e recebimento, ou não, pelo representado, dos valores respectivos;
g) os casos em que se justifique a restrição de zona concedida com exclusividade;
h) obrigações e responsabilidades das partes contratantes;
i) exercício exclusivo ou não da representação a favor do representado;
j) indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 35, cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação.
Como assinala Xxxxxxx Xxxxx Xxxx00, referido artigo “constitui o núcleo central da lei: estabelece as condições mínimas que devem presidir, através do contrato respectivo, as relações entre representantes e representados”.
Outra exigência, disposta no art. 2º do mencionado diploma legal, é a obrigatoriedade de registro dos profissionais nos Conselhos Regionais, de maneira que, como acrescenta o art. 5º, só será devida a remuneração àqueles agentes devidamente registrados22.
Nesse ponto, contudo, é importante fazer a ressalva de Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx de que os tribunais têm decido em sentido diverso, por entender que seria inconstitucional a exigência de registro para que o representante faça jus à remuneração23.
Para os autores, a ausência do registro pode privar o representante das vantagens típicas da categoria, tais como “a presunção de exclusividade (art. 711), a indenização tarifada por dispensa imotivada (art. 718), a remuneração por vendas feitas diretamente pelo preponente (art. 714) etc.” 24, mas nunca impedir o recebimento da justa contraprestação pelo negócio promovido.
21 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2014, p. 78.
22 In verbis: “Art. 2º É obrigatório o registro dos que exerçam a representação comercial autônoma nos Conselhos Regionais criados pelo art. 6º desta Lei”.
“Art. 5º. Somente será devida remuneração, como mediador de negócios comerciais, a representante comercial devidamente registrado”.
23 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 207.
24 Ibid., p. 206.
Sendo assim, “quem não estiver registrado, todavia, poderá invocar outras normas, como o Código Civil, para reclamar sua comissão por ter agido como mediador de negócios mercantis” 25.
2.3. Principais elementos
Dentre os elementos obrigatórios que integram o contrato de representação, alguns são mais delicados e controvertidos, gerando, na prática, questões de difícil resolução quando verificadas determinadas situações, mencionadas a seguir.
2.3.1. As zonas de atuação e a garantia de exclusividade
As zonas de representação delimitam o campo de atuação dos agentes. Em geral, são estabelecidas com base em critérios territoriais e geográficos, mas nada impede que sejam fixadas considerando-se outros aspectos, como, por exemplo, determinado grupo de clientes, produtos ou setores.
A definição da zona de atuação do agente é considerada, tanto pela Lei nº 4.886/65 quanto pelo art. 710 do Código Civil de 2002, elemento essencial dos contratos de representação e sua inobservância, apesar de não tornar nula ou inválida a avença, poderá desnaturar o negócio como tal, o que não impede a sua apuração por meio da análise de outras circunstâncias do caso concreto26.
Às partes é lícito, de comum acordo, reduzir ou ampliar a zona (ou zonas) descrita em contrato, contanto que essa alteração não implique “diminuição da média dos resultados auferidos pelo representante nos últimos 6 (seis) meses de vigência”, conforme disposto no §7º do art. 32 da Lei nº 4.886/6527.
25 XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx, 2011, p. 26.
26 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 209-210.
27 In verbis: “Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas. [...] §7º. São vedadas na representação comercial alterações que impliquem, direta ou indiretamente, a diminuição da média dos resultados auferidos pelo representante nos últimos seis meses de vigência”.
O art. 27, xxxxxxx “d”, “e” e “g” da Lei nº 4.886/6528 e os arts. 710 e 711 do Código Civil de 200229 facultam ainda às partes a possibilidade de estabelecer restrições à zona atribuída, inclusive mediante estipulação de cláusula de exclusividade.
Importante realçar que a delimitação da zona de atuação é um fator determinante quando o assunto é a fixação de cláusula de exclusividade. Conforme salientam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, “a maior relevância da zona está no problema de respeitar-se a exclusividade da representação”, sendo “muito raro que se estabeleça uma representação com o feito de exclusividade sem delimitar-lhe a zona de atuação”.
Tal delimitação, associada ao aspecto da exclusividade, reflete diretamente na remuneração percebida pelo agente, uma vez que “o agente ou distribuidor terá direito à remuneração correspondente aos negócios concluídos dentro de sua zona, ainda que sem a sua interferência”31.
Anote-se, ademais, que, uma vez silente o contrato acerca da zona de atuação do representante, o preponente não poderá constituir outro agente com igual incumbência para atuar na mesma área, bem como o agente não poderá representar negócios do mesmo gênero de outro fornecedor (CC/02, art. 711). Isto posto, é fundamental que toda e qualquer restrição esteja expressamente prevista em contrato, de forma clara, a fim de evitar conflitos.
Diferentemente da zona de atuação, a cláusula de exclusividade, apesar de considerada por Xxxxxx Xxxxxxx00 como “a condição mais importante a que se pode sujeitar a representação comercial”, não é elemento essencial dos contratos de agência ou representação.
A respeito da necessidade de convenção expressa do pacto de exclusividade, a Lei nº 4.886/65 é confusa e ambígua na sua definição: o art. 27, alínea “e”, exige que as partes esclareçam contratualmente se há ou não garantia de exclusividade do representante, já o art. 31, ao cuidar dessa questão, dispõe que:
28 In verbis: “Art. 27. Do contrato de representação comercial, além dos elementos comuns e outros a juízo dos interessados, constarão obrigatoriamente: [...] d) indicação da zona ou zonas em que será exercida a representação;
e) garantia ou não, parcial ou total, ou por certo prazo, da exclusividade de zona ou setor de zona; [...] g) os casos em que se justifique a restrição de zona concedida com exclusividade”.
29 In verbis: “Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada”. “Art. 711. Xxxxx xxxxxx, o proponente não pode constituir, ao mesmo tempo, mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência; nem pode o agente assumir o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes”.
30 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 210-211.
31 TARTUCE, Flavio. Direito Civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. v. 3. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 619.
32 XXXXXXX, Xxxxxx. Aspectos modernos de Direito Comercial: estudos e pareceres. v. 3. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 293.
Prevendo o contrato de representação a exclusividade de zona ou zonas, ou quando este for omisso, fará jus o representante à comissão pelos negócios aí realizados, ainda que diretamente pelo representado ou por intermédio de terceiros.
Parágrafo único. A exclusividade de representação não se presume na ausência de ajustes expressos.
Como se depreende da redação contraditória do art. 31, enquanto o caput estabelece que a exclusividade é assegurada ao representante estando ou não prevista em contrato, o parágrafo único prevê que a exclusividade não se presume na ausência de ajustes expressos. Um verdadeiro contrassenso.
Para completar o imbróglio, o art. 41 da Lei nº 4.886/1965 determina que, “ressalvada expressa vedação contratual, o representante comercial poderá exercer sua atividade para mais de uma empresa e empregá-la em outros mistéres ou ramos de negócios”.
O Código Civil de 2002, adotando posição diametralmente oposta à do parágrafo único do mencionado art. 31 da Lei nº 4.886/1965, colocou uma pá de cal na controvérsia e “inverteu” aquilo que a jurisprudência vinha aplicando como regra: agora, à luz do que estabelece seu art. 711, a presunção legal é de exclusividade recíproca, salvo ajuste expresso em contrário33-34.
Em outras palavras, a exclusividade está implícita, não depende mais de convenção, porém, para que seja afastada da relação contratual, é necessária disposição expressa nesse sentido.
Importante destacar que a exclusividade prevista no art. 711 do Código Civil de 2002 é bilateral, valendo tanto para o agente quanto para o preponente, ou seja, este não poderá constituir “ao mesmo tempo, mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência”, assim como aquele não poderá “assumir o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes”.
Em termos práticos e efetivos, a garantia de exclusividade impede tanto a concorrência de terceiros estranhos à relação quanto a atividade direta dos próprios envolvidos, agente e representado, na área de atuação prevista em contrato.
Revisitando os ensinamentos de Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx lembram que:
33 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 000-000, XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 0000, p. 23.
34 Para Washington de Xxxxxx Xxxxxxxx, “a partir da vigência do Código Civil de 2002, a exclusividade do agente, em determinada zona, e com incumbência certa, é presumida por lei, como regra geral, à falta de ajuste expresso que permita a constituição de um outro agente para a mesma zona e com igual incumbência. Assim, opera-se a exclusividade da representação quando não for existente cláusula contratual que autorize o proponente a quebrá- la. Por outro lado, está obrigado o agente à exclusividade do seu proponente, não podendo agenciar negócios semelhantes no interesse de outros proponentes”, XXXXXXXX, Xxxxxxxxxx xx Xxxxxx. Curso de direito civil: direito das obrigações. v. 5. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 313, apud SAAD, Xxxxxxx Xxxxx, op. cit., p. 22-23.
[...] a exclusividade não obsta, em princípio, que o preponente utilize outros agentes, na mesma zona, desde que se trate de ramo diverso do que foi confiado ao primeiro. Nem está, o agente, em princípio, impedido de exercer outras atividades por conta de diversos comitentes, se tais atividades não representarem concorrência com o preponente com quem firmou o contrato de agência35.
No que tange às consequências do seu inadimplemento, uma vez violada a garantia de exclusividade de zona pelo agente, o preponente estará autorizado a rescindir por justa causa o contrato, com base no disposto no art. 35, alínea “c”, da Lei nº 4.886/6536.
De seu turno, na hipótese de descumprimento por parte do representado, restando comprovada a ocultação de vendas e a sonegação de comissões, poderá o representante, além de exigir o pagamento da remuneração correspondente aos negócios realizados diretamente pelo preponente ou por terceiros (art. 714, do CC/0237), rescindir por justa causa o contrato nos termos do art. 36, alínea “b”, da Lei nº 4.886/6538 e do art. 718 do Código Civil de 200239, sendo-lhe assegurado, ainda, o pagamento das indenizações previstas em lei especial.
2.3.2. A remuneração do representante
A remuneração do representante consiste na comissão40 sobre os negócios úteis por ele promovidos em nome e a favor do preponente.
Por útil entende-se o negócio efetivamente concluído, em que há o pagamento do preço pelo cliente ao preponente. Nesse passo, uma vez não efetuado o pagamento, não há que se falar, em regra, em direito do agente à remuneração. E isso se dá porque a obrigação do agente é de resultado, e não de meio, logo, não basta a mera intermediação do negócio, mas sim o seu “resultado positivo”41.
É o que se extrai do caput do art. 32 da Lei nº 4.886/65, verbis: “O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas”.
35 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 232.
36 In verbis: “Art. 35. Constituem motivos justos para rescisão do contrato de representação comercial, pelo representado: [...] c) a falta de cumprimento de quaisquer obrigações inerentes ao contrato de representação comercial”.
37 In verbis: “Art. 714. Salvo ajuste, o agente ou distribuidor terá direito à remuneração correspondente aos negócios concluídos dentro de sua zona, ainda que sem a sua interferência”.
38 In verbis: “Art. 36. Constituem motivos justos para rescisão do contrato de representação comercial, pelo representante: [...] b) a quebra, direta ou indireta, da exclusividade, se prevista no contrato”.
39 In verbis: “Art. 718. Se a dispensa se der sem culpa do agente, terá ele direito à remuneração até então devida, inclusive sobre os negócios pendentes, além das indenizações previstas em lei especial”.
40 Conforme assinala Xxxxxxxxx Xxxx Xxxxx, “na colaboração por aproximação, como é o caso do representante comercial autônomo, o colaborador não tem lucro; ele recebe uma comissão calculada sobre o valor das vendas que angariou. Quem paga essa comissão é o produtor. O colaborador não assume o risco do negócio: a solvabilidade do comprador é risco assumido pelo produtor”. 2011, p. 175.
41 REQUIÃO, Xxxxxx Xxxxxxx. Nova regulamentação da representação comercial autônoma. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 55.
A propósito, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx00, em seus comentários à Lei nº 4.886/65, assinala que:
O dispositivo mostra que no contrato de representação se cria uma obrigação de resultado. O direito do representante fica dependendo do resultado efetivo do negócio, que deverá ser positivo, no sentido de que o pedido que agenciou foi aceito pelo representado, que o executou, completando-se o negócio com o pagamento do preço pelo cliente comprador. Se o cliente não paga o preço de venda do objeto, o negócio não tem resultado efetivo, com o representante comercial perdendo a sua remuneração ou sofrendo o seu estorno, caso tenha recebido adiantado.
Na mesma linha é o entendimento de Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00:
Na técnica do contrato de agência, a aquisição, pelo agente, do direito à remuneração, vincula-se a uma condição suspensiva: o cumprimento da prestação a cargo do terceiro que contratou com o preponente em razão do agenciamento. Isto quer dizer que a exigibilidade da comissão não surge apenas da conclusão do contrato, mas nasce do fato posterior do seu cumprimento pelo terceiro comprador.
Como acrescenta Xxxxxxxxx Xxxx Xxxxx00, “o tipo de trabalho executado pelo representante é de utilidade, de proveito. O representante não recebe a comissão pelo esforço desenvolvido, mas pelo proveito que proporcionou ao representado”, logo, se “a venda não se realizou, não houve pagamento, a comissão sobre ela não existe”.
Nesse contexto, uma vez liquidado o pagamento do preço da mercadoria pelo comprador, o agente adquire o direito de exigir a comissão correspondente45.
E o pagamento da remuneração, de acordo com o disposto no §1º do art. 32 da Lei nº 4.886/6546, deverá ser realizado pelo preponente até o dia 15 do mês subsequente ao da liquidação da fatura, se as partes não dispuserem de maneira diversa em contrato.
Com relação ao valor das comissões, este deverá ser calculado com base no valor total das mercadorias (Lei nº 4.886/65, art. 32, §4º)47.
Entretanto, na prática, referida disposição provoca intenso debate por parte da doutrina e da jurisprudência, na medida em que compõem o valor total das mercadorias os tributos incidentes sobre a operação (IPI e ICMS), e, algumas vezes, os custos de transporte e de seguro. Assim, como anota Xxxxxxx Xxxxx Saad48, enquanto para alguns “a base de cálculo da comissão
42 REQUIÃO, Xxxxxx Xxxxxxx, 2003, p. 55.
43 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 255.
44 XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx, 2011, p. 97.
45 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2014, p. 93.
46 In verbis: “Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas. [...] § 1° O pagamento das comissões deverá ser efetuado até o dia 15 do mês subseqüente ao da liquidação da fatura, acompanhada das respectivas cópias das notas fiscais”.
47 In verbis: “[...] § 4° As comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias”.
48 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, op. cit., p. 95.
de representante comercial deve ser o valor final da nota fiscal, incluindo também o que foi pago a título de tributos, como IPI e ICMS”, para outros, ele inclusive, “tributo não deve ser considerado como parte integrante da base de cálculo da comissão”.
O autor complementa lembrando que outro ponto de divergência prática diz respeito à possibilidade de correção monetária das comissões pagas fora do prazo entabulado, conforme preconiza o §2º do mencionado art. 32 da Lei nº 4.886/6549. A divergência se dá porque não há indicação expressa na lei do índice de correção monetária a ser utilizado nessas hipóteses, o que acaba levando as partes ao Judiciário a fim de dirimir a controvérsia50.
De seu turno, a situação prevista no §5º do mesmo dispositivo também conduz a circunstância de difícil resolução. Dispõe o texto normativo que, na hipótese de rescisão injusta do contrato por parte do preponente, haverá o vencimento antecipado das comissões pendentes51.
Sucede que esta norma colide com o disposto no caput do próprio artigo, na medida em que obriga o preponente ao pagamento antecipado de comissões a que o representante poderá vir a não ter direito, como no caso de pedidos executados, mas ainda não quitados pelo comprador, ou de pedidos cujo prazo de recusa ainda não tenha se esgotado52.
No mais, dispõe o §7º do mencionado art. 32 da Lei nº 4.886/65 que, nos contratos de representação e agência, são vedadas quaisquer alterações que signifiquem “diminuição da média dos resultados auferidos pelo representante nos últimos 6 (seis) meses de vigência”.
Em outras palavras, uma vez estabelecidos em contrato os critérios de remuneração do agente, não poderá o preponente alterá-los a seu bel-prazer.
Note-se que esta foi a forma encontrada pelo legislador para trazer equilíbrio ao contrato e tutelar os interesses do agente, parte mais fraca da relação, impedindo a modificação unilateral do contrato pelo representado.
Por fim, ainda no que tange à remuneração do agente, é importante mencionar o §1º do art. 33 da Lei nº 4.886/6553, que regula as hipóteses em que o representante não fará jus a
49 In verbis: “Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas. [...] §2° As comissões pagas fora do prazo previsto no parágrafo anterior deverão ser corrigidas monetariamente”.
50 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2014, p. 93.
51 In verbis: “[...] §5° Em caso de rescisão injusta do contrato por parte do representando, a eventual retribuição pendente, gerada por pedidos em carteira ou em fase de execução e recebimento, terá vencimento na data da rescisão”.
52 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, op. cit., p. 99.
53 53 In verbis: “Art. 33. Não sendo previstos, no contrato de representação, os prazos para recusa das propostas ou pedidos, que hajam sido entregues pelo representante, acompanhados dos requisitos exigíveis, ficará o representado obrigado a creditar-lhe a respectiva comissão, se não manifestar a recusa, por escrito, nos prazos de 15, 30, 60 ou 120 dias, conforme se trate de comprador domiciliado, respectivamente, na mesma praça, em outra
remuneração alguma. São elas: (i) insolvência do comprador; (ii) desfazimento do negócio por parte do comprador; e (iii) sustação da entrega da mercadoria devido à situação comercial do comprador, capaz de comprometer ou tornar duvidosa a liquidação.
Em qualquer dessas situações, entretanto, não poderá o representado ter dado causa ao cancelamento ou à frustação do negócio, sob pena de persistir o direito do agente de exigir a remuneração correspondente54. É o que se depreende do disposto no art. 716 do Código Civil de 2002: “A remuneração será devida ao agente também quando o negócio deixar de ser realizado por fato imputável ao proponente” .
Para Xxxxxx Xxxxxxx00, a frustração do negócio imputável ao representado é motivo inclusive “para a resolução do contrato por inexecução voluntária do representado ou proponente, ou seja, mediante a sua culpa em sentido amplo ou lato sensu”.
Já com relação à dispensa do agente pelo preponente e o seu reflexo na remuneração percebida, acrescenta o autor que, com base no disposto no Código Civil de 2002,
[...] duas regras deverão ser observadas:
a) Mesmo quando dispensado por justa causa, terá o agente direito a ser remunerado pelos serviços úteis prestados ao proponente, sem embargo de haver este perdas e danos pelos prejuízos sofridos (art. 717 do CC).
b) Por outro lado, se a dispensa se der sem culpa do agente (sem justa causa), terá ele direito à remuneração até então devida, inclusive sobre os negócios pendentes, além das indenizações previstas em lei especial (art. 718 do CC)56.
2.3.3. O direito de recusa do representado
O preponente não está obrigado a atender a todos os pedidos ou propostas encaminhados pelo agente, ainda que acompanhados dos requisitos exigíveis, sendo-lhe garantido o direito de recusa, que deverá ser exercido sem abuso e nos moldes e prazos previstos no art. 33 da Lei nº 4.886/65.
Caso contrário, será devida a respectiva comissão ao agente, ainda que o negócio não se concretize ou que haja motivo justo para a recusa, do que se conclui que o direito de recusa não é absoluto: deve ser exercido e comunicado pelo preponente em tempo hábil, mediante justa causa e sem abuso, sob pena de persistir o direito do agente à remuneração.
do mesmo Estado, em outro Estado ou no estrangeiro. [...] § 1º Nenhuma retribuição será devida ao representante comercial, se a falta de pagamento resultar de insolvência do comprador, bem como se o negócio vier a ser por ele desfeito ou for sustada a entrega de mercadorias devido à situação comercial do comprador, capaz de comprometer ou tornar duvidosa a liquidação”.
54 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Contrato de agência. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 85.
55 TARTUCE, Flavio, 2018, p. 619.
56 Ibid., p. 620.
A respeito do exercício abusivo do direito de recusa, estabelece o art. 715 do Código Civil de 200257 que é ilícita a conduta do preponente que, sem justa causa, “cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato”.
Isto posto, uma vez configurada a recusa sistemática e sem justo motivo dos pedidos colocados, é possível ao agente rescindir o contrato por justa causa, sendo-lhe devido também o pagamento de indenização.
De acordo com Xxxxxx Xxxxxxx00, o dispositivo “trata de um caso de deslealdade do preponente, a gerar a resolução do negócio e a aplicação do princípio da reparação integral dos danos”.
Por fim, quanto à forma, exige o art. 33 da Lei nº 4.886/65 que a recusa seja sempre expressa. Entretanto, conforme salientam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, a jurisprudência vem reconhecendo a validade da recusa verbal em determinados casos em razão das peculiaridades da espécie, que, como cediço, admite ajuste verbal do próprio contrato59.
2.3.4. Deveres das partes
Analisando a Lei nº 4.886/65 e os artigos 710 a 721 do Código Civil de 2002, percebe- se que não houve uma preocupação específica do legislador em dedicar um capítulo ou dispositivos exclusivos à previsão e à determinação dos direitos e das obrigações das partes nos contratos de representação e agência.
Com exceção do art. 712 do Código Civil de 200260, que prevê de forma genérica e simplista o dever de diligência nas relações, os direitos e os deveres das partes na execução do contrato de representação são mencionados tímida e esparsamente entre os artigos, cabendo ao operador do direito uma análise mais detida e acurada dos dispositivos a fim de identificar essas regras.
57 In verbis: “Art. 715. O agente ou distribuidor tem direito à indenização se o proponente, sem justa causa, cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato”.
58 TARTUCE, Flavio, 2018, p. 620.
59 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 254.
60 In verbis: “Art. 712. O agente, no desempenho que lhe foi cometido, deve agir com toda diligência, atendo-se às instruções recebidas do proponente”.
Em termos gerais, são aplicáveis aos contratos de representação e agência – assim como a todos os contratos (CC/02, art. 422)61 – os princípios da probidade, da boa-fé, da colaboração e da lealdade recíproca.
Em acréscimo, são atribuídos alguns deveres específicos às partes, em especial aos agentes, cuja inobservância pode configurar, em determinadas situações, falta grave apta a ensejar o desfazimento da representação por justa causa.
2.3.4.1. Deveres do agente
São dois os principais deveres do agente na execução dos negócios, dos quais decorrem os demais: (i) dever de diligência e (ii) dever de informação.
Segundo o dever de diligência, espera-se que o agente atue não apenas com zelo e aplicação no desempenho de sua atividade, respeitando as instruções recebidas do preponente, mas também se dedique a expandir os negócios do representado e a promover os seus produtos (art. 28 da Lei nº 4.886/65)62,63.
Sob essa ótica, deve haver empenho genuíno do agente em desenvolver e perpetuar o negócio do representado, o que os autores Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx chamam de “cuidado ativo”64.
Relacionado ao dever de diligência está o dever de fidelidade às instruções do preponente, as quais devem ser acatadas e respeitadas pelo agente, sob pena de se configurar falta grave que autorize a rescisão do contrato por justa causa (art. 35, alínea “c”, da Lei nº 4.886/65). Um exemplo é a fixação do preço e das condições do negócio pelo preponente, que deve ser estritamente observada pelo representante.
A respeito, o art. 29 da Lei nº 4.886/65 é categórico ao dispor que “salvo autorização expressa, não poderá o representante conceder abatimentos, descontos ou dilações, nem agir em desacordo com as instruções do representado”.
No mais, decorrem também do dever de diligência os deveres de lealdade e de eficiência.
61 In verbis: “Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
62 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2014, p. 87.
63 In verbis: “Art. 28. O representante comercial fica obrigado a fornecer ao representado, segundo as disposições do contrato ou, sendo este omisso, quando lhe for solicitado, informações detalhadas sobre o andamento dos negócios a seu cargo, devendo dedicar-se à representação, de modo a expandir os negócios do representado e promover os seus produtos”.
64 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 235.
No tocante ao dever de informação, é obrigação do agente, ainda que não esteja expressamente previsto em contrato65, prestar informações detalhadas acerca do andamento dos negócios a seu cargo, a fim de colocar o representado a par das condições do mercado, da perspectiva de vendas, da aceitação do produto, das características da clientela e da atuação da concorrência (art. 29 da Lei nº 4.886/65).
Trata-se, ainda, de um dever de prestação de contas, que envolve tanto a prestação contábil propriamente dita, com a discriminação de gastos e receitas da atividade do agente, como o fornecimento de informações acerca da missão confiada ao representante66.
Com efeito, é essa prestação de contas que permite ao representado analisar a viabilidade e as necessidades do seu negócio, e o descumprimento desse dever pode ensejar a responsabilização contratual do agente e ainda levar à ruptura do contrato por justa causa.
Acresça-se, outrossim, que estes deveres de diligência e de informação atribuídos ao agente não representam ingerência na autonomia que lhe é garantida para organizar e desempenhar a própria atividade como melhor lhe convier. Contudo, conforme salienta Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx00, “a autonomia do agente, em face do principal (ou preponente), não é absoluta, pois ele deve conformar-se às orientações recebidas, adequar-se à política econômica da empresa, prestar regularmente contas da sua atividade”.
No mais, para Xxxxx Xxxxxx Xxxxx00, existem também deveres secundários do agente, porém não menos importantes, em parte previstos no art. 19 da Lei nº 4.886/65, os quais merecem ser lembrados: (a) manter sigilo sobre as atividades de representação (alínea “d” do mencionado dispositivo); (b) arcar com todas as despesas decorrentes da atividade, salvo estipulação em contrário (CC/02, art. 713); (c) cuidar para que as mercadorias sejam devidamente recebidas pelo consumidor e em bom estado; (d) não colaborar com o exercício da profissão por aqueles que estejam legalmente proibidos, impedidos ou não habilitados (alínea “b” do dispositivo legal); e (e) apresentar a carteira profissional quando solicitada por quem de direito (alínea “f” do mesmo dispositivo legal).
65 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 235-237.
66 Ibid., p. 238.
67 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2000, p. 43.
68 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Tratado teórico e prático dos contratos. v. 3. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 411- 412.
2.3.4.2. Deveres do preponente
Por se tratar de contrato de colaboração propriamente dito, os deveres de lealdade, boa- fé, colaboração e informação são recíprocos às partes do contrato de representação ou agência. De acordo com Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, a violação aos deveres de lealdade e boa-fé, “que ambos os contratantes estão obrigados a guardar” na execução do contrato, é que torna “rescindível o contrato de agência, a pedido do agente, quando tais medidas antiéticas e antieconômicas vierem a ser adotadas pelo
preponente”.
Dentro do dever de informação atribuído ao preponente, incluem-se, ainda, os deveres de (a) prestar toda e qualquer informação necessária acerca do negócio e do produto em si, inclusive prazos e volumes das operações; (b) fornecer ao agente a documentação referente ao produto agenciado; e (c) informar ao agente, em tempo hábil, a aceitação do pedido ou os motivos da recusa70.
Outros deveres do representado, já abordados anteriormente, são o de remunerar os serviços prestados pelo agente (CC/02, arts. 714, 716, 717, 718 e 719) e o de não constituir, ao mesmo tempo, mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência, salvo ajuste em contrário (CC/02, art. 711).
2.4. Formas de extinção do contrato
A extinção do contrato de representação ou agência ocorre de diversas formas. Pode-se dizer que dois elementos são decisivos na hora de delimitar os impactos práticos da ruptura, em especial no tocante ao dever de indenizar: o prazo contratual (se determinado ou indeterminado) e a existência ou não de justa causa.
Segundo Xxxxx Xxxxxx Xxxxx00, o contrato de agência extinguir-se-á: (i) pelo decurso do prazo de duração; (ii) pela resilição unilateral, em especial quando pactuado por prazo indeterminado (art. 720 do CC/02 e art. 34 da Lei nº 4.886/65); (iii) pela resolução por justa causa (arts. 35 e 36 da Lei nº 4.886/65); (iv) pelo distrato (mútuo consenso); e (v) por força maior.
69 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 249.
70 Ibid., p. 239-240.
71 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx, 1996, p. 414.
2.4.1. Decurso do prazo de duração
Quando cumpridas todas as obrigações pactuadas pelas partes ou vencido o seu termo final (prazo determinado), ocorre a extinção natural do negócio, com o contrato deixando naturalmente de produzir seus efeitos.
Conforme salientam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, “ajustado o negócio por prazo certo, extingue-se automaticamente a relação contratual a seu termo final”, não havendo que se falar, portanto, em “obrigação do preponente de proporcionar qualquer indenização ao agente”, mesmo porque “quem ajusta o contrato por prazo determinado não pode se considerar surpreendido pelo seu exaurimento e, por conseguinte, não terá razão alguma para exigir qualquer tipo de reparação pela natural cessação da relação negocial”.
Importante frisar, ainda nas palavras dos aludidos autores, que a “extinção do contrato a seu termo natural não é rompimento e nem muito menos rescisão de negócio jurídico”. Isso tem fundamental relevância quando se analisa o § 1º do art. 27 da Lei nº 4.886/65, in verbis: “§1°. Na hipótese de contrato a prazo certo, a indenização corresponderá à importância equivalente à média mensal da retribuição auferida até a data da rescisão, multiplicada pela metade dos meses resultantes do prazo contratual”.
Segundo ensinamento de Xxxxxxx Xxxxxxxxxx, retomado por Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, a controvérsia relacionada ao mencionado artigo existe porque “há quem defenda a aplicação desse preceito tanto nos casos de rompimento prematuro do contrato de prazo certo como no de expiração pura e simples da duração do ajuste, de modo que ao agente caberia sempre, na falta de culpa, direito à indenização prevista na lei especial”. Respeitado esse entendimento, a verdade é que a aplicação do referido preceito está adstrita exclusivamente à hipótese de desfazimento do contrato por prazo certo antes do seu termo final, ou seja, em caso de rescisão prematura. Logo, não abrange a hipótese de extinção natural do contrato, em que se cumprem todas as obrigações dele decorrentes e não é devida
qualquer indenização.
Nesse sentido, inclusive, é a conclusão de Xxxxxx Xxxxxxx00:
No caso de contrato com prazo certo ou determinado de duração, chegando a termo, extingue-se normalmente sem que disso advenham quaisquer direitos para as partes;
00 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 0000, p. 267-268.
73 XXXXXXXXXX, Ghedale. Comentários à lei do representante comercial. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p. 110-111, apud Ibid., p. 269.
74 REQUIÃO, Xxxxxx, 2005, p. 253.
pode ocorrer, todavia, a rescisão antes do termo, quando uma das partes não cumprir sua obrigação ou simplesmente denunciá-lo sem motivos justos. A rescisão nesse caso, sendo culposa, resolve-se em perdas e danos a favor da parte lesada.
Vale lembrar, por fim, que todo contrato por prazo determinado converte-se a prazo indeterminado após ser prorrogado ou renovado. É o que resulta do disposto nos §§ 2º e 3º do art. 27 da Lei nº 4.886/65.
2.4.2. Resilição unilateral imotivada (denúncia)
Conforme realçado no item anterior, os contratos por prazo determinado podem, ainda que não seja usual, excepcionalmente ser extintos por iniciativa de uma das partes antes do vencimento do seu termo final, contanto que haja o pagamento da indenização correspondente. A regra determina que o contrato por prazo certo não deve ser extinto antes do seu regular cumprimento, a não ser por justo motivo, ocasião na qual não é devida indenização alguma pelo rompimento. Todavia, se ainda assim houver ruptura unilateral antecipada por iniciativa do representado, “o caso será de responsabilidade civil contratual, cabendo-lhe responder amplamente por todos os prejuízos do agente, segundo o direito comum, e nós não
teremos que cuidar da tarifação da lei especial”75.
Ressalte-se que, na hipótese de rompimento indevido do contrato por prazo determinado, uma vez demonstrado pelo contratante lesado que os prejuízos sofridos foram superiores à indenização tarifada do § 1º do art. 27 da Lei nº 4.886/65, nada impede que reivindique a reparação integral do dano, inclusive à luz do que determina o Código Civil de 2002 a respeito da responsabilidade civil (e.g., arts. 389, 390, 391, 473, 927 e seguintes).
Por sua vez, nos contratos por prazo indeterminado as únicas formas de se extinguir o vínculo contratual são pela declaração de vontade das partes (resilição bilateral/distrato), ou pela iniciativa de apenas uma delas, independentemente de motivação (resilição unilateral/denúncia imotivada)76.
Como ninguém é obrigado a permanecer perpetuamente vinculado a um contrato, se não houver o mútuo consenso para extinguir o contrato, restará à parte interessada a opção de resilir unilateralmente a avença (ato conhecido como denúncia).
75 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 267.
76 Ibid., p. 276.
Sempre que a resilição unilateral ocorrer sem justo motivo, a dispensa será considerada injusta, gerando ao denunciante o dever de indenizar a parte lesada nos termos tarifados pela Lei nº 4.886/65.
Estabelece, também, o art. 718 do Código Civil de 2002 que, “se a dispensa se der sem culpa do agente, terá ele direito à remuneração até então devida, inclusive sobre os negócios pendentes, além das indenizações previstas em lei especial”.
Note-se que a lei especial prevê o cabimento de dois tipos de indenização na hipótese de denúncia imotivada do contrato por iniciativa do preponente, que podem ser concomitantes ou não: a primeira, descrita no art. 27, decorrente da denúncia imotivada propriamente dita, e a segunda, estabelecida no art. 34, devida em razão de não ser concedido ao representante o necessário aviso prévio77.
Na linha do que preconiza a Lei nº 4.886/65 em seu art. 27, alínea “j”, a indenização devida ao representante quando a denúncia não estiver amparada em justa causa “não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação”, sendo facultado às partes convencionar indenização em montante superior, porém nunca inferior àquele previsto pela lei especial.
Por sua vez, dispõe o art. 34 da Lei nº 4.886/6578 que, caso não seja respeitada a exigência legal de concessão de aviso prévio ao representante, será devido o pagamento de indenização correspondente a um terço (1/3) das comissões auferidas pelo representante nos três meses anteriores.
Assim, para exercer o seu direito potestativo, a lei exige que a parte interessada notifique o outro contratante com certa antecedência (aviso prévio), sob pena de restar configurado o abuso de direito e de ser devido o pagamento de indenização ao contratante lesado (CC/02, art. 720)79.
77 Conforme acrescenta Xxxxxx Xxxxxxx: “A indenização constitui um direito independente do aviso prévio. Aquele tem a natureza compensatória de perdas e danos pela violação contratual, e este possui um sentido remuneratório, salarial”. XXXXXXX, Xxxxxx. 2005, p. 251.
78 In verbis: “Art. 34. A denúncia, por qualquer das partes, sem causa justificada, do contrato de representação, ajustado por tempo indeterminado e que haja vigorado por mais de seis meses, obriga o denunciante, salvo outra garantia prevista no contrato, à concessão de pré-aviso, com antecedência mínima de trinta dias, ou ao pagamento de importância igual a um terço (1/3) das comissões auferidas pelo representante, nos três meses anteriores”.
79 In verbis: “Art. 720. Se o contrato for por tempo indeterminado, qualquer das partes poderá resolvê-lo, mediante aviso prévio de noventa dias, desde que transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto do investimento exigido do agente”.
De acordo com o Código Civil de 2002, o aviso prévio deve ser de no mínimo noventa dias, “desde que transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos realizados pelo agente” (CC/02, art. 720)80.
Em outras palavras, é assegurado às partes o direito de denunciar, a qualquer tempo, o contrato de agência por prazo indeterminado; entretanto, em atenção aos princípios da boa-fé e da lealdade, a denúncia não poderá ser exercida de forma abrupta, tomando de assalto a outra parte, sendo necessário propiciar à parte denunciada tempo hábil para que haja a compensação dos investimentos por ela realizados em função dos negócios.
Para Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, “se o prazo de amortização ainda não se completou, o denunciante deverá ampliar o pré-aviso para um lapso que permita tal desiderato. Se não o fizer, terá de responder pelo prejuízo provocado em detrimento do parceiro”. Eles acrescentam, ainda, que “o vulto e a natureza desses investimentos serão, destarte, os fatores decisivos para a razoável definição do pré-aviso e da eventual indenização”.
Dessa forma, o prazo mínimo de noventa dias poderá inclusive ser ampliado caso o vulto dos investimentos assim o justifique. Do contrário, será devida indenização à parte lesada.
2.4.3. Resolução por justa causa
Como visto no item precedente, a ruptura do contrato de agência pode se dar por iniciativa unilateral de uma das partes, mas as consequências da dispensa irão depender da existência ou não de motivo justo que a ampare.
De acordo com Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, “se o denunciante tiver motivo para rescindir o contrato por culpa da outra parte, não terá de conceder-lhe prazo algum, nem de prestar-lhe qualquer tipo de indenização”82.
Os motivos considerados justos para a rescisão do contrato de representação, seja por prazo determinando ou indeterminado, estão enumerados taxativamente nos artigos 35 e 36 da Lei nº 4.886/6583.
Segundo o art. 35, constituem motivos justos para a rescisão por parte do representado:
- a desídia do representante no cumprimento das obrigações decorrentes do contrato;
- a prática de atos que importem em descrédito comercial do representado;
80 Anteriormente, o prazo previsto era de pelo menos trinta dias, conforme dispunha o art. 34 da Lei nº 4.886/65, alterado pelo art. 720 do CC/02.
81 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 278.
82 Ibid., p. 279.
83 REQUIÃO, Xxxxxx, 2005, p. 253.
-a falta de cumprimento de quaisquer obrigações inerentes ao contrato de representação comercial;
- a condenação definitiva por crime considerado infamante;
- força maior.
(a) Por desídia, entende-se a conduta negligente, omissa, desinteressada e descuidada do agente, de forma sistemática, na execução da atividade que lhe foi confiada. Sua demonstração não é tarefa fácil, na medida em que envolve muitos elementos subjetivos de difícil comprovação. Importante acrescentar, nesse passo, que o simples declínio das vendas, assim como o não atingimento de cota mínima predeterminada não justificam, de plano, a rescisão do contrato por falta grave84.
(b) Com relação à prática de atos que importem o descrédito comercial do representado, vale realçar que cumpre ao representante agir sempre com retidão e ser vigilante na execução dos negócios do preponente, a fim de conservar e zelar pela boa imagem comercial que este construiu no mercado.
(c) No que tange ao descumprimento de quaisquer obrigações inerentes ao contrato de representação, ressalte-se que tais obrigações abrangem tanto as previstas expressamente em contrato quanto aquelas intrínsecas à natureza do negócio.
(d) A respeito da condenação definitiva por crime considerado infamante, cabe aqui a ressalva de que, nos dias atuais, a reprovabilidade do ato praticado depende muito da sensibilidade moral de cada indivíduo85. De qualquer forma, o art. 4ª da Lei nº 4.886/65 traz como exemplos alguns crimes infamantes que possibilitam a rescisão contratual por justa causa a pedido do representado (falsidade, estelionato, apropriação indébita, contrabando, roubo, furto, lenocínio ou crimes também punidos com a perda de cargo público).
(e) Por fim, no que se refere ao motivo de força maior, assim também entendido o caso fortuito, assinala Xxxxxxx Xxxxx Xxxx00 que, “desde que inevitável o acontecimento em relação à vontade do representado e para cuja realização não concorreu, o rompimento do contrato terá o respaldo do justo motivo”.
De seu turno, representam motivos justos para a rescisão por parte do representante (art.
36 da Lei nº 4.886/65):
- redução de esfera de atividade do representante em desacordo com as cláusulas do contrato;
- a quebra, direta ou indireta, da exclusividade, se prevista no contrato;
84 REQUIÃO, Xxxxxx, 2005, p. 256.
00 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 0000, p. 106.
86 Ibid., p. 107
- a fixação abusiva de preços em relação à zona do representante, com o exclusivo escopo de impossibilitar-lhe ação regular;
- o não-pagamento de sua retribuição na época devida;
- força maior.
(a) A redução da esfera de atividade do representante em desacordo com as cláusulas do contrato, além de ser expediente expressamente vedado pelo art. 32, §7º da Lei nº 4.886/65, porque diminui o poder de ação e a capacidade de venda do representante, a ponto de ensejar o pedido de rescisão por parte do agente, representa grave violação aos princípios do “pacta sunt servanda” e da lealdade contratual.
(b) A violação, direta ou indireta, da cláusula de exclusividade prevista em contrato, como já mencionado anteriormente, representa falta grave apta a conferir ao representante o direito de rescindir por justa causa o contrato e exigir a indenização correspondente.
(c) A fixação abusiva de preços em relação à zona do representante configura expediente abusivo que revela a “má vontade e deslealdade do representado e seu desejo de provocar a rescisão do contrato”87, reduzindo gradativamente a ação do representante a ponto de fazê-lo desistir do negócio. Em outras palavras, o representado age fraudulentamente com o propósito de criar condições indiretas que levem o representante a renunciar ou abandonar a representação88.
(d) O não pagamento da comissão na época devida deve ser recorrente para ensejar a rescisão por justa causa. Dito isto, o simples atraso, punido com a correção monetária do débito, não autoriza, por si só, a rescisão por justa causa89.
(e) No tocante ao motivo de força maior, cabem aqui as mesmas considerações feitas na hipótese de rescisão por justa causa a pedido do representado.
2.4.4. Distrato ou resilição bilateral
Como já mencionado no item 1.4.2. supra, é possível extinguir-se o vínculo contratual pela simples declaração de vontade das partes (resilição bilateral/distrato) quando “ambos os contraentes, por mútuo consenso, resolverem extinguir o contrato, seja ele por tempo determinado ou não”90.
87 XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx, 2011, p. 66.
88 XXXXXXX, Xxxxxx. 2005, p. 268.
00 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 0000, p. 109.
90 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx, 1996, p. 414.
Conforme acrescenta Xxxxxxxxx Xxxx Xxxxx00, “a resilição ocorre por comum acordo entre as partes. Por exemplo: o representado comunica ao representante que não tem mais interesse em manter contrato e este concorda com a sua dissolução. As partes firmam o distrato, por mútuo consentimento”.
Importante realçar que no caso de resilição bilateral, em que há consenso e comunhão de interesses entre as partes, estas podem dispor da maneira que acharem mais conveniente acerca de assuntos como o cabimento de eventual indenização, a compensação de investimentos realizados, a forma de pagamento das comissões pendentes, entre outros pontos polêmicos.
2.4.5. Força maior
O contrato de agência pode ser extinto por qualquer das partes, sem justa causa, quando verificado motivo de força maior92.
Constituem situações extremas, imprevisíveis e/ou inevitáveis, que fogem do alcance da vontade das partes e, quando verificadas, impedem de maneira absoluta e definitiva o cumprimento, por qualquer dos contratantes, das obrigações por eles assumidas na avença.
Segundo Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, “a força maior pode afetar tanto o preponente quanto o agente, e, uma vez verificada na esfera de um deles, este estará autorizado a rescindir a avença por justa causa (Lei nº 4.886/65, arts. 35, alínea e; e 36, alínea e)”.
Acrescentam mencionados autores94 que, “sendo justo o motivo de cessação do cumprimento do contrato, o contratante que se viu impossibilitado de dar sequência à relação de agência nenhuma indenização deverá a outra parte”, ressalvado ao agente, entretanto, “o direito de receber, no devido momento, as comissões pelos serviços já concluídos”, a teor do disposto no art. 719 do Código Civil de 200295, inclusive a fim de coibir o locupletamento ilícito do preponente com relação ao trabalho útil desenvolvido pelo representante.
91 XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx, op. cit., p. 63.
92 Cf. arts. 35, alínea “e”, e 36, alínea “e”, da Lei nº 4.886/65. Na prática, aqui também está englobado o caso fortuito. A respeito, mencionando os ensinamentos de Xxxxxxx Xxxxxxxx, acrescentam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx que, “muito embora a lei civil fale em ‘força maior’, a doutrina entende que o termo abrangeria as situações de caso fortuito, uma vez ‘serem ambas as noções, na atualidade, equivalentes’”. XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 272. No mesmo sentido: REQUIÃO, Xxxxxx. 2005, p. 261.
93 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, loc. cit.
94 Ibid., loc. cit.
95 In verbis: “Art. 719. Se o agente não puder continuar o trabalho por motivo de força maior, terá direito à remuneração correspondente aos serviços realizados, cabendo esse direito aos herdeiros no caso de morte”.
Ilustrativamente, pode-se citar como motivos de força maior: a morte, a interdição ou o decreto de falência de qualquer das partes, bem como atos governamentais supervenientes e situações de calamidade pública. Exemplo atual disso é a crise mundialmente instaurada com a pandemia provocada pelo novo Coronavírus em 2020, que gerou uma paralisação sistêmica de todas as esferas da vida civil, cujos reflexos negativos ainda são incomensuráveis nas relações contratuais.
2.5. A indenização tarifada pela Lei nº 4.886/65
Nos contratos de representação ou agência, talvez um dos principais interesses resguardados pela Lei nº 4.886/65, em conjunto com os arts. 710 a 721 do Código Civil de 2002, seja aquele referente à indenização do agente nos casos de dispensa imotivada por iniciativa do preponente.
Através da adoção de critérios claros e objetivos para guiar as partes e os operadores de direito nas situações de denúncia imotivada do contrato, a Lei nº 4.886/65 estabeleceu o que se denomina “indenização tarifada”, que permite a compensação do agente dispensado sem justa causa independentemente de comprovação de dano efetivo.
Buscou o legislador, na verdade, até em razão do caráter “paternalista” e social da lei especial, mitigar os prejuízos do agente nessas hipóteses, sobretudo aqueles decorrentes da perda da clientela. Conforme acrescentam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx00, referido prejuízo com a perda da clientela “é legalmente presumido e seu montante pode ser estipulado em cláusula contratual pelas próprias partes, mas não pode ser menor do que a tarifa legal”.
Sendo assim, uma vez verificada a denúncia imotivada do contrato de agência, serão devidas as seguintes indenizações tarifadas pela Lei nº 4.886/65:
00 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 285.
Concessão de aviso prévio legal
Não haverá acréscimo da indenização prevista no art. 34.
Contrato por prazo determinado (rompido precocemente)
art. 27, §1º: equivalente à média mensal da retribuição auferida até a data da rescisão, multiplicada pela metade dos meses resultantes do prazo contratual.
Contrato por prazo indeterminado
art. 27, alínea “j”: indenização mínima de 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida pelo agente durante o tempo em que exerceu a representação.
Dispensa imotivada do agente
Inobservância do aviso prévio legal
Acréscimo da indenização prevista no art. 34: um terço (1/3) das comissões auferidas pelo representante nos três meses anteriores.
3. CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO STRICTO SENSU OU CONCESSÃO COMERCIAL
3.1. Surgimento e generalidades
Como é cediço, diversas são as figuras contratuais à disposição do empresário para realizar o escoamento de sua produção, podendo dar-se a comercialização de forma direta pelo próprio fabricante/fornecedor ou por meio de “agentes” independentes, que exercerão papel fundamental na captação de clientes, divulgação e venda do xxxxxxx00.
Ao longo das últimas décadas, a participação desses colaboradores externos no processo de venda aumentou significativamente em razão da constante busca do produtor em otimizar suas vendas, reduzir custos, distâncias e riscos empresariais, e, ainda, fugir da “rigidez típica dos esquemas societários (ou hierárquicos)”98.
Diante do exponencial aumento do consumo e da demanda, alguns antigos tipos contratuais ficaram defasados para suprir determinados mercados e ramos da atividade comercial, cedendo lugar a novas técnicas mercadológicas mais propícias, dentre as quais se destaca a distribuição lato sensu.
A escolha pela distribuição indireta possibilitou aos fabricantes não apenas dedicarem- se exclusivamente à atividade produtiva, bem como diminuir seus custos e riscos, mas também permitiu o encurtamento de distâncias, o acesso a mercados até então não explorados e a agregação de outros serviços (e.g., assistência técnica, treinamento de pessoal, instalação etc.). Foi assim que o contrato de distribuição passou a ocupar posição de destaque entre aqueles chamados “contratos colaborativos”, que buscam acomodar os interesses dos empresários e conjugar esforços, sem, contudo, interferir na autonomia jurídica e patrimonial
de cada um.
Importante esclarecer que o termo “contrato de distribuição” aqui empregado deve ser compreendido “como um gênero a que pertencem os mais variados negócios jurídicos, todos voltados para o objetivo final de alcançar e ampliar a clientela (comissão mercantil, mandato
97 XXXXXX, Xxxxxxxxxx. Contrato de Distribuição. In: XXXXXXXXX, Xxxxxxxxx (coord.); XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx et al. Contratos empresariais: contratos de organização da atividade econômica. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 209.
98 XXXXXXXX, Xxxxx X. Contrato de distribuição. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 53.
mercantil, representação comercial, fornecimento, revenda ou concessão comercial, franquia comercial etc.)”99.
Em outras palavras, os contratos de distribuição lato sensu “representam todas as modalidades jurídicas de cunho contratual com função econômica de escoamento da produção, de efetivação concreta da disposição e/ou de possibilidade de consumação dos bens de consumo pelos destinatários finais da cadeia econômica” 100.
Feitas essas considerações iniciais, cumpre observar que o objeto do presente capítulo compreende a análise apenas e tão somente de uma dessas modalidades – talvez a mais difundida –, denominada contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu101. Referida categoria vem sendo, aliás, ostensivamente empregada ao longo dos últimos anos no escoamento de toda sorte de produtos, abrangendo os setores de bebidas, automóveis, derivados de petróleo, vestuário, tecnologia e até mesmo de artigos de luxo.
3.2. Contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu
3.2.1. Definição
O contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu é, na essência, um contrato de cooperação comercial, de criação relativamente recente e socialmente típico, pelo qual um comerciante, denominado distribuidor ou concessionário, assume a obrigação periódica de revender, por conta própria, mediante vantagens especiais (tais como exclusividade, margens de preço etc.) e respeitando padrões organizativos, mercadorias de certo fabricante, chamado fornecedor ou concedente, sob fiscalização e com assistência deste, em determinada zona102.
Xxxxx X. Forgioni103, em prestigiada doutrina sobre o tema, define o contrato de distribuição como sendo:
[o] contrato bilateral, sinalagmático, atípico e misto, de longa duração e de caráter estável, que encerra um acordo vertical, pelo qual um agente econômico (fornecedor)
99 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 169.
100 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx de; XXXXXX, Xxxxxxx X. Monteiro de, 2006, p. 248.
101 As expressões contrato de concessão comercial, contrato de distribuição stricto sensu e contrato de distribuição serão mencionadas indistintamente no presente estudo, como sinônimas, assim como os termos fabricante, produtor, fornecedor ou concedente, e também distribuidor, concessionário ou revendedor.
102 Esta definição mescla conceitos de Xxxxxxxxx xx Xxxx, Xxx Xxxxxxx Xxxxxx Xx. e Xxxxxx Xxxxxxx. XXXX, Xxxxxxxxx xx. Contrato de Distribuição. São Paulo: Saraiva, 1987, p. 29; XXXXXX XX., Xxx Xxxxxxx. Contrato de distribuição ou concessão mercantil. In: XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXX XX., Xxxxxxx Xxxxx (coords.). Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 454; e REQUIÃO, Xxxxxx, 2005, p. 39.
103 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 53.
obriga-se ao fornecimento de certos bens ou serviços a outro agente econômico (distribuidor), para que este os revenda, tendo como proveito econômico a diferença entre o preço de aquisição e de revenda e assumindo obrigações voltadas à satisfação das exigências do sistema de distribuição do qual participa.
Outra definição pertinente do contrato de distribuição é a elaborada por Xxxxxxxxx xx Xxxx000 em seu relevante estudo sobre a matéria:
[O] contrato de distribuição é aquele contrato mediante o qual o fabricante obriga-se a vender, continuadamente, ao distribuidor, que se obriga a comprar, com vantagens especiais, produtos de sua fabricação, para posterior revenda, em zona determinada. Ou seja, é um contrato de concessão comercial.
Segundo observa o autor, “a distribuição é a concessão comercial lato sensu, diversa, apesar de paralelas e semelhantes, da concessão comercial stricto sensu”, porquanto mais ampla, vez que atribui certa liberdade às xxxxxx000,106.
Destaque-se, outrossim, a respeitável definição do autor português Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx000, que classifica o contrato de concessão como um “contrato-quadro”:
É a concessão um contrato-quadro [...], que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força do qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações (mormente no que concerne à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes) e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente. Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente fixados, os bens que este se obrigou a distribuir.
Por fim, mas não menos importante, a clássica definição do jurista francês Xxxxxx Xxxxxxxx, revisitada por Xxxxxx Xxxxxxx em seu estudo pioneiro sobre o contrato de concessão comercial no Brasil, e que serviu de inspiração para os demais autores:
[Consiste em] uma convenção pela qual um comerciante, chamado concessionário, coloca sua empresa de distribuição ao serviço de um comerciante ou industrial chamado concedente, para assegurar, exclusivamente, sobre um território determinado, durante um período limitado e sob a fiscalização do concedente, a distribuição de produtos cujo monopólio de revenda lhe é concedido108.
104 XXXX, Xxxxxxxxx, 1987, p. 29.
105 Ibid., p. 41-42.
106 No mesmo sentido, defende o autor mexicano Xxxxxx Xxxx Xxxxx que o contrato de distribuição deve ser chamado de contrato de concessão, na medida em que o fabricante, de modo direto ou por intermédio de uma empresa comercializadora, concede ao comprador o direito de revender seus produtos, mediante certas condições. XXXX XXXXX, Xxxxxx. Contratos Mercantiles. 7. ed. México: Xxxxxx, 0000, p. 323, tradução livre.
107 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 2000, p. 49.
108 REQUIÃO, Xxxxxx. O contrato de concessão de venda com exclusividade (concessão comercial). Revista de Direito Mercantil 7/17, 1972, apud SCHERKERKEWITZ, Iso Chaitz. Contratos: (teoria e prática). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 267.
3.2.2. Elementos
Ao analisar os conceitos apresentados, é possível extrair alguns elementos inderrogáveis à caracterização e à existência propriamente dita do tipo contratual, os chamados “elementos essenciais” do negócio, e outros que decorrem da autonomia privada das partes, considerados “elementos acidentais ou particulares”, que definem condições específicas, mas não fundamentais, de cada relação.
3.2.2.1. Elementos essenciais
Como “elementos essenciais”, podem ser listados os seguintes:
(a) Destinação do produto adquirido à revenda. Trata-se do elemento distintivo primordial do contrato de distribuição. Envolve a transferência de titularidade do bem do patrimônio do fornecedor para o do distribuidor e, posteriormente, do distribuidor para o do adquirente final. Nesse aspecto, o produto não pode ser adquirido pelo distribuidor para uso próprio, sob pena de desnaturar o tipo negocial. Há necessariamente a obrigação de revenda, consistindo a remuneração do distribuidor “[no] lucro decorrente da diferença entre o preço de aquisição da mercadoria e seu preço de revenda (= margem de comercialização)”109.
(b) Celebração de sucessivos contratos de compra e venda, em caráter periódico e não eventual (vínculo duradouro).
(c) Contrato interempresarial, celebrado entre empresários (fabricante e distribuidor) que desempenham suas atividades profissionalmente e com habitualidade e que devem, portanto, ser tratados como iguais.
A respeito, Xxxxx X. Forgioni110,111 acrescenta que “o fornecedor não é, necessariamente, o fabricante podendo ser um industrial ou um intermediário do comércio”, de maneira que podem ser considerados contratos de distribuição “tanto (a) aqueles celebrados entre o fabricante e o distribuidor master, quanto (b) aqueles celebrados entre esse distribuidor e outros agentes econômicos, que também distribuirão o produto no mercado”. Dito isto, “o adquirente
109 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 63.
110 Ibid., p. 40, destaques no original.
111 De forma contrária a Xxxxx X. Xxxxxxxx e a Xxxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx xx Xxxxx, Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx entendem que uma das partes necessariamente deve ser um fabricante, bem como que o produto comercializado deve ser efetivamente por ele fabricado, não havendo que se falar em distribuição nos casos de “mera subdistribuição ou revenda”. XXXX, Xxxxxxxxx, 1987,
p. 30; XXXXX, Xxxxx Xxxxxx, 1996, p. 389; XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 292.
do bem vendido pelo distribuidor poderá ser [ou não] o consumidor final”, sendo possível, portanto, a celebração de “distribuição de segundo grau”.
(d) Autonomia jurídica e patrimonial do concessionário, que atua em nome e por conta própria, assumindo todos os riscos da comercialização do produto.
(e) Concessão de vantagens especiais ao distribuidor (e.g., preço de compra diferenciado, descontos, prazos ampliados, exclusividade etc.) que facilitem a atividade comercial e, por conseguinte, a obtenção dos resultados esperados. Decorre do dever de colaboração e é uma forma de recompensar o distribuidor pela perda parcial de sua autonomia ao adentrar uma rede de distribuição.
(f) Subsunção do distribuidor a determinadas regras de padronização ligadas à política de vendas (e.g., padrão de atendimento, treinamento de pessoal, vestimenta, embalagem, publicidade e até indicação de preço de revenda) e ao controle de qualidade, exigidas pelo fabricante de sua rede de concessionários. Trata-se do controle empresarial externo que o concedente exerce sobre seus concessionários a fim de coordenar a atividade e zelar pelo prestígio do negócio112.
Note-se que existe certa divergência doutrinária quanto à classificação deste elemento como essencial ou acidental. Enquanto alguns autores consideram-no essencial ao negócio (e.g., Xxx Xxxxxx Xxxxxxxxxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx X. Xxxxxxxx xx Xxxxx), outros classificam-no como acidental (e.g., Xxxxx X. Forgioni e Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Dearo Xxxxxxx).
A respeito, explica Xxx Xxxxxx Scherkerkewitz113 que “o contrato de distribuição pressupõe a existência de algum controle por parte do produtor sobre o distribuidor”, com o intuito de “aumento da eficiência e um consequente aumento geral da lucratividade”.
Para Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx:
[...] mais do que a exclusividade, o que caracteriza a concessão comercial é a subordinação econômica em que se coloca o concessionário frente ao concedente, porque embora comercie com autonomia jurídica, não se pode afastar do plano geral da rede criada pelo concedente114.
112 Para Xxxxxx Xxxxxxx, “[q]uando o concedente submete o concessionário a certos padrões organizativos, de molde a permitir a muitos juristas nisso vislumbrarem uma integração horizontal da empresa concessionária na empresa concedente, o faz para assegurar ou, conquistar, no mercado, a clientela e para promover a excelência de sua marca. Daí se explica a preocupação da concedente e que os serviços prestados pela concessionária aos fregueses, chamados de assistência técnica pós-venda, sejam de nível qualitativo tão excelente como se ela própria os fosse fornecer. Com isso, sem dúvida, se pretende proteger o prestígio da marca”. XXXXXXX, Xxxxxx, 2005, p. 40.
000 XXXXXXXXXXXXXX, Xxx Xxxxxx, 0000, p. 274.
114 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 198.
Ainda segundo os autores, o contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu seria marcado “pela dominação econômica exercida pelo fabricante com o propósito de manter a integração da rede de distribuição”115.
Sucede, entretanto, que nem sempre o distribuidor é a parte “subordinada” da relação. Muitas vezes, “sobretudo quando se contempla os contratos firmados entre fornecedores e grandes varejistas”116, esse controle é exercido pelo distribuidor, sendo dependente o fornecedor. Logo, nas palavras de Xxxxx X. Forgioni117, o controle contratual exercido pelo concedente “não é, necessariamente, um apanágio do contrato de distribuição”, o que desloca o caráter de subordinação do âmbito dos elementos essenciais para o dos particulares ou acidentais.
3.2.2.2. Elementos acidentais ou particulares
São “elementos acidentais ou particulares” os seguintes pontos:
(a) Delimitação da área (zona, território ou setor) de atuação do concessionário, com garantia de exclusividade (monopólio de revenda) ou não.
Nesse aspecto, cumpre salientar que a estipulação de zona, assim como a garantia de exclusividade territorial, não são elementos essenciais ao negócio, sendo facultativa sua presença, e seu estabelecimento dependerá tanto da influência econômica exercida pelas partes, quanto dos interesses ali envolvidos.
Ressalte-se que a exclusividade foi considerada por muito tempo elemento intrínseco ao negócio. Entretanto, este entendimento encontra-se superado nos dias atuais, sendo aquela considerada meramente “particular” ou “acidental”, apesar de muito recorrente na prática.
Em linhas gerais, a garantia de exclusividade territorial tem a função de afastar a concorrência intramarca, criando uma espécie de “reserva de mercado a favor do distribuidor exclusivo”, com o concedente assumindo o compromisso “de não vender as mercadorias objeto do contrato a outro distribuidor [ou por ele próprio] dentro de determinada área geográfica” 118. Importante realçar, contudo, que a delimitação da zona de atuação não garante automaticamente ao concessionário a exclusividade territorial. Conforme acrescenta Ana
115 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 288.
116 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, 2015, p. 30.
117 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 43.
118 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, op. cit., p. 32-33.
Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx000, “é perfeitamente possível que se atribua uma área de atuação ao distribuidor sem conceder-lhe, no entanto, a garantia de não enfrentar a concorrência de outros distribuidores da mesma rede”.
Além da exclusividade territorial, pode ser pactuada também a “exclusividade de comercialização”, reconhecida em favor do concedente, pela qual o concessionário obriga-se a comercializar apenas os produtos de determinado fornecedor, podendo tal limitação incidir somente em relação a alguns produtos ou modelos.
(b) Integração do distribuidor a uma rede de concessionários, quando for o caso de distribuição por rede.
(c) Imposição ao concessionário de aquisição de cota mínima de determinado produto, em certo intervalo de tempo, tendo como contrapartida o dever do fabricante de entregar a quantidade convencionada.
(d) Exigência de manutenção de estoque pelos concessionários.
(e) Dever dos concessionários de prestar serviço de assistência técnica aos consumidores em função das particularidades do produto (especialmente quando envolve a comercialização de produtos de alta complexidade).
(f) Publicidade do produto, cujas despesas podem ou não ser partilhadas pelas partes, cabendo ao fornecedor arcar com os custos das ações de marketing da rede de distribuição no âmbito nacional e ao concessionário, com as despesas publicitárias locais.
(g) Prestação de informações globais sobre o mercado: perspectiva de vendas, aceitação do produto, características da clientela e atuação da concorrência, por exemplo. Isso decorre do dever de informação.
3.2.3. Características jurídicas
Uma vez identificados seus elementos, cumpre agora analisar as características gerais dos contratos de distribuição.
3.2.3.1. Contratos de distribuição como contratos de colaboração
Os contratos de concessão comercial ou distribuição stricto sensu pertencem à categoria dos contratos de colaboração comercial, nos quais as partes, patrimonialmente autônomas,
119 Ibid., 2015, p. 33.
estabelecem uma relação de mútua cooperação e conjugação de esforços, visando ao proveito econômico. É uma relação de áleas interdependentes, porém distintas120.
Nesse aspecto, é possível dizer que existem interesses complementares das partes, uns comuns e outros contrapostos: enquanto de um lado o distribuidor abre mão de parte de sua autonomia empresarial para sujeitar-se às orientações do fornecedor, de outro ele beneficia-se da notoriedade e da consolidação da marca do fabricante no mercado, comercializando produtos de ampla aceitação, por exemplo. Tal condição representa, sem dúvida, maior chance para o distribuidor incrementar seus ganhos.
Assim, considerando-se que o distribuidor intenta obter lucro com a revenda e o produtor deseja impulsionar a comercialização de seu produto, quanto maior o empenho do distribuidor em conquistar o mercado e alavancar as vendas, maior será o ganho de ambos. Esse é o espírito colaborativo.
3.2.3.2. Contratos de distribuição como contratos de duração
Em razão de sua natureza colaborativa, os contratos de concessão comercial tendem a se protrair no tempo, sendo muitas vezes pactuados por prazo indeterminado, do que decorre outra característica deste tipo contratual: são contratos de duração, com obrigações de execução continuada e periódica.
Evidentemente, para que as partes possam atingir seus objetivos e cumprir com suas atribuições, é fundamental que a avença perdure por tempo hábil e suficiente.
A respeito, explica Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, com clareza:
No contrato de distribuição, a estabilidade do negócio no tempo é do interesse de ambas as partes. Para o fornecedor, a continuidade da relação possibilita construir uma rede eficiente de terceiros encarregados em comercializar suas mercadorias. Por outro lado, a garantia da duração representa um estímulo para que o distribuidor promova os investimentos necessários para o adequado desenvolvimento da atividade de revenda. 121
3.2.3.3. Contratos de distribuição como contratos relacionais
Os contratos de distribuição, à luz da doutrina norte-americana, também podem ser classificados como contratos relacionais122.
120 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, 2015, p. 57.
121 Ibid., p. 55.
122 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 47-48.
A essência dos contratos relacionais está intimamente ligada a sua natureza duradoura e colaborativa, na medida em que a “construção da relação se estende ao longo da vida do negócio”123, valendo-se as partes de cláusulas mais amplas e abrangentes como bases para o comportamento que será adotado no decorrer do relacionamento (caráter aberto).
Para Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx000, “qualificar o contrato de distribuição como relacional salienta o papel da lealdade e da confiança como base da relação contratual, posto que a preservação do vínculo por certo tempo depende intimamente do comportamento das partes”, mesmo porque, como já realçado, o sucesso de uma parte beneficia as demais e o negócio como um todo.
3.2.3.4. Contratos de distribuição como contratos por adesão
Quanto à sua formação, o contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu pode ser qualificado, em regra, como “por adesão”125, vez que aos distribuidores não é dada a possibilidade de negociar ou exigir cláusulas, especialmente quando integram uma rede de distribuição consolidada.
Referido modelo é adotado pelos fabricantes como forma de padronizar as regras e as condições contratuais previstas à rede de concessionários, evitando-se, assim, comportamentos discrepantes de seus integrantes, bem como eventuais conflitos internos em razão de condições privilegiadas concedidas a este ou àquele parceiro.
Ressalte-se, todavia, que é possível, porém pouco usual, a negociação das cláusulas no contrato de distribuição. Isso ocorre, na prática, especialmente quando se trata de um primeiro distribuidor, que introduzirá determinado produto no mercado126.
123 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, 2015, p. 60.
124 Ibid., loc. cit.
125 A doutrina estabeleceu uma diferenciação conceitual entre os termos “de adesão” e “por adesão”. Conforme esclarece Xxxxxxx Xxxxx, “é pressuposto do contrato de adesão o monopólio de fato ou de direito, de uma das partes, que elimina a concorrência para realizar o negócio jurídico. Se a situação não se configura desse modo, poderá haver contrato por adesão, jamais contrato de adesão”. XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 120. No mesmo sentido, argumenta-se que “[...] é justamente o fato de não se permitir a conclusão de contratos individuais, entre fabricante e cada um dos membros da rede distribuidora, vedando-lhes o ajuste de condições diversas daquelas impostas a todos os parceiros, aliada à liberdade do distribuidor de contratar ou não, que atribui ao ajuste da distribuição o caráter de contrato por adesão, e não o de contrato de adesão” e, ainda, que “[...] a faculdade do distribuidor, de contratar ou não, segundo as cláusulas e condições previamente estabelecidas pelo fabricante, é, indubitavelmente, o indicador seguro de se estar diante de um contrato por adesão, e não de adesão”. XXXX, Xxxxxxxxx, 1987, p. 62 e 64, realces no original.
126 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, op. cit., p. 62.
3.2.3.5. Redes de distribuição
A distribuição indireta dos produtos no mercado pode ocorrer de forma individual, por um único distribuidor, ou integrada, por meio de uma rede de concessionários, em que múltiplas empresas independentes atuam no escoamento de um mesmo produto (ou produtos) de determinado fabricante.
A escolha pela rede de distribuição é, em geral, vantajosa ao fabricante, pois lhe permite difundir seu produto no mercado e alavancar suas vendas dispondo de parcerias e arranjos com outros empresários, sem precisar fazer investimentos significativos a fim de otimizar o próprio negócio.
A estruturação da rede pressupõe a existência de vários contratos independentes de concessão comercial ligados por um interesse comum (sucesso e eficiência do negócio e, consequentemente, incremento da lucratividade), e seus membros devem atuar coordenada e cooperativamente, segundo critérios e diretrizes traçados pelo fornecedor.
Assim é que o concessionário, ao incorporar-se a uma rede de distribuição, abre mão de parte de sua autonomia empresarial para submeter-se a certos padrões organizativos (controle externo) exigidos pelo fabricante de todos integrantes da rede. Em contrapartida, poderá gozar de uma série de vantagens especiais (como preços diferenciados de compra, prazos ampliados, descontos, entre outras) e ainda valer-se, quando o caso, da notoriedade da marca comercializada e de eventual demanda consolidada do produto, o que, por si só, já representa grande atrativo. Tais incentivos constituem uma espécie de compensação pela perda da autonomia.
Acresça-se, por fim, que, uma vez integrado à rede com garantia de exclusividade territorial, não pode o fornecedor concorrer com o concessionário, direta ou indiretamente, sob pena de incorrer na prática de concorrência desleal, ensejando-se a devida reparação.
3.2.3.6. Autonomia x controle externo x dependência econômica
Nesse aspecto, cumpre fazer uma rápida análise da aparente incompatibilidade que, à primeira vista, parece envolver os elementos da “autonomia”, do “controle externo” e da “dependência econômica” presentes nos contratos de distribuição.
Como visto, ao integrar uma rede de distribuição o concessionário abre mão de parte de sua autonomia para submeter-se a certos padrões organizativos exigidos pelo fornecedor
(controle externo). Entretanto, essa ingerência do fabricante diz respeito essencialmente à política de atuação comercial adotada pelos concessionários da rede. É o chamado “controle empresarial externo” ou, ainda, “controle contratual”, que, nas palavras de Xxxxxxxxx de Melo127, “manifesta-se pela exclusividade de aprovisionamento, pela adoção, pelos distribuidores, dos métodos e condutas organizativas do fabricante e pela interferência deste na política comercial daqueles”.
Ou seja, a integração do distribuidor à rede não elimina sua autonomia jurídico- administrativa, de modo que ele permanece no controle de seus atos, recursos (financeiros, materiais e humanos) e investimentos. Em outras palavras, sua autonomia gerencial não é afetada.
Sem dúvida, o sucesso da rede de distribuição pressupõe a organização dos concessionários sob o mesmo padrão de condutas, a fim de se conferir unicidade e identidade à rede.
Como pondera Claudineu de Melo128, o controle empresarial externo “não ocasiona situação de dano aos distribuidores, ao contrário, tende a ajudá-los e fortalecê-los globalmente, pois dele decorrem comportamentos de interesse recíproco de todos os envolvidos na distribuição”, tornando possível, assim, manter a harmonia e a eficiência da rede de distribuição e, consequentemente, incrementar o lucro e o consumo.
Não se pode ignorar, é claro, que as diretrizes traçadas pelo fornecedor inevitavelmente acabam gerando certa dependência econômica dos concessionários, sobretudo por conta da exclusividade de abastecimento imposta e dos investimentos específicos e irrecuperáveis realizados pelo distribuidor, o que se justifica em face dos interesses maiores envolvidos na relação contratual.
Na realidade, a dependência econômica em si não é coibida pelo Direito. É o seu abuso que deve ser tolhido, e não a situação de sujeição propriamente dita.
Nesse contexto, a padronização de condutas, métodos e procedimentos comerciais afigura-se como forma legítima e jurídica para que o fabricante garanta o padrão de qualidade e proteja a imagem e a notoriedade da marca, assegurando, assim, o sucesso econômico de seu produto. Eventual estado de dependência econômica do distribuidor decorrente deste controle exercido pelo fabricante não pode ser repudiado à primeira vista, mas sim sua exploração oportunista.
127 XXXX, Xxxxxxxxx xx, 1987, p. 117.
128 Ibid., p. 109-110.
3.2.3.7. Generalidades
Uma vez delineada a figura jurídica, cumpre esclarecer que o contrato de distribuição é atípico, misto e complexo.
a) Atípico porque, não obstante o termo “da agência e distribuição” empregado pelo Código Civil de 2002 (em seu Capítulo XII do Título VI), o contrato de distribuição stricto sensu permanece sem regulamentação legal129, apesar de ser considerado “socialmente típico”. Como já realçado neste estudo130, o Código Civil de 2002, de maneira imprópria e infeliz, passa a falsa impressão de que o contrato de distribuição teria se tornado típico ao falar
em “contrato de agência e distribuição”.
Sucede, entretanto, que a distribuição regulada pelo art. 710 do Código Civil de 2002 não é aquela baseada na aquisição e revenda de mercadorias, também conhecida como concessão comercial. A distribuição ali prevista trata-se, na verdade, de “simples acessório do contrato de agência”, no qual “o agente é que pode ser simples agente ou agente- distribuidor”131.
Xxxxx X. Xxxxxxxx, enfrentando de forma crítica a polêmica terminológica gerada pelo legislador, esclarece que:
[a] despeito da confusa redação, é possível concluir que a hipótese normativa do art. 710 prevê dois tipos de contratos de agência (ou seja, de representação comercial) (i) o contrato de agência puro, em que o representante agencia as vendas em nome e por conta do representado e (ii) o contrato de agência-distribuição, contemplando as hipóteses em que o representante tem à sua disposição a coisa a ser negociada (por exemplo, é mandatário do representado ou tem em seu poder a coisa, para posterior tradição ao eventual adquirente). A distribuição, no sentido que lhe empresta o Código, é uma espécie de agência; a distribuição comercial, de que tratamos neste livro (=concessão comercial), permanece atípica132.
Em outras palavras, uma vez que o disposto no art. 710 do Código Civil de 2002 “[não tem] o condão de transformar a agência em distribuição”133, são inaplicáveis ao contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu as disposições do Capítulo XII do Título VI deste diploma legal.
129 De acordo com Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, “os [contratos] atípicos, embora possam ter um nome, carecem de disciplina particular, não podendo a regulamentação dos interesses dos contratantes contrariar a lei, a ordem pública, os bons costumes e os princípios gerais de direito”. XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Teoria geral dos contratos típicos e atípicos: curso de direito civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 121.
130 Cf. Item 2.2 e nota de rodapé 16.
131 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 337.
132 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 76, destaques no original.
133 XXXX, Xxxxxxxxx xx, 1987, p. 49. E prossegue o autor: “[S]e se admite a transferência de propriedade do produto, descaracteriza-se o contrato de agência, pois esta não tem por requisito a compra e venda do produto agenciado, mas tão-só a sua intermediação”. Ibid., loc. cit.
Do que se conclui, ademais, que a apontada figura contratual permanece atípica, devendo eventuais conflitos ser dirimidos com base nos princípios gerais do direito contratual e obrigacional e, excepcionalmente, por meio da aplicação analógica de normas relativas a outros tipos contratuais, contanto que presente o elemento de “identidade essencial” entre a situação regulada pela lei e a não regulada134.
b) Misto porque provém da combinação de vários tipos contratuais previstos em lei, como a agência, o fornecimento, a prestação de serviços e, em especial, a compra e venda, “mas que não se identifica totalmente com qualquer deles”135. Ou seja, reúne prestações típicas de vários contratos em um só136.
Conforme assinala Xxxxx X. Xxxxxxxx, citando o saudoso professor Honório Monteiro,
[...] os contratos mistos são ‘contratos que não coincidem exatamente com nenhum dos tipos contratuais disciplinados pela lei, mas cujo conteúdo, em rigor, perante a lei, não se poderia dizer novo. Não são contratos inominados, porque os seus elementos componentes não são estranhos à lei’137.
c) Complexo pois pode envolver também pactos acessórios, ou melhor, “uma teia de contratos relacionais que estão debaixo de um contrato ‘guarda-chuva’, ou contrato-mãe”138, que acabam integrando a relação jurídica propriamente dita.
Como sustenta Iso Chaitz Scherkerkewitz, apoiado na doutrina de Xxxxxxxx Xxxxxxx:
[...] ao redor do contrato de distribuição, podem existir outros pactos, como o empréstimo de numerário, o empréstimo de material, a licença de marca, a transmissão ou comunicação de know how, a assistência técnica, os pactos de não competitividade mesmo após encerrado o contrato, bem como a proibição de integrar uma rede de distribuição concorrente. Esses pactos podem aparecer como contratos acessórios ou constituir uma cláusula do contrato de distribuição comercial139.
3.2.3.7.1. A impossibilidade de aplicação analógica da Xxx Xxxxxxx (nº 6.729/79) aos contratos de distribuição
Aproveitando o gancho da atipicidade dos contratos de distribuição, cabe uma breve reflexão sobre a impossibilidade de aplicar-se analogicamente ao gênero, como um todo, o
134 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 328.
135 PINTO, Fernando A. Ferreira. Contratos de Distribuição. Da tutela do distribuidor integrado em face da cessação do vínculo. Lisboa: Universidade Católica, 2013, p. 62, apud XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 45.
136 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p.46
137 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Contrato mixto. Revista da Faculdade de Direito, v. XXXIII, fascículo I, jan./abr. 1937, apud XXXXXXXX, Xxxxx X. op. cit., loc. cit.
138 SCHERKERKEWITZ, Iso Chaitz, 2013, p. 265.
139 Ibid., loc. cit.
regramento jurídico criado pela Lei Ferrari para disciplinar especificamente a “distribuição de veículos automotores, de via terrestre”140, no país.
Com a finalidade precípua de regular as relações existentes entre montadoras e concessionárias de veículos, especialmente aquelas referentes à constituição das chamadas “redes de distribuidores” e aos aspectos concorrenciais do mercado automobilístico, foi promulgada, em 1979, a Lei nº 6.729, também conhecida como Xxx Xxxxxxx, que representou – e representa até hoje – única exceção à atipicidade dos contratos de distribuição.
Desde então, muitas foram as tentativas de invocar a sua aplicação analógica a contratos de concessão comercial com objetos distintos, tais como os contratos de distribuição de bebidas, remédios, derivados de petróleo, entre outros não disciplinados por lei141.
Sucede que, tendo disposições estritamente voltadas às peculiaridades e necessidades inerentes ao setor automobilístico, outra não foi a solução da jurisprudência pátria majoritária senão a de afastar, com razão, a aplicação analógica da Lei nº 6.729/79 a situações que não correspondam a seu objeto142.
Nas brilhantes palavras de Xxxxx X. Forgioni143:
Em se tratando de um diploma específico, talhado para determinado setor da economia, a Lei 6.729, de 1979, não admite interpretação extensiva, sob pena de, artificialmente, causar marcadas distorções, fazendo incidir sobre mercados com outras peculiaridades, regras concebidas exclusivamente para a distribuição de veículos automotores.
Posição divergente é a adotada por Xxxxxxx Xxxxxxxx000, que entende que:
A Lei nº 6.729/1979 não pode ser tomada como núcleo normativo destacado, expandindo-se, ao revés, às diversas espécies de contrato de distribuição, sempre que identificados os pressupostos essenciais que justificam e dão legitimidade à tutela dos contratantes.
Para o referido autor145:
[...] aplicam-se as indenizações previstas na Lei nº 6.729/1979 aos contratos de distribuição em geral, para tutelar o distribuidor toda vez que, estando em situação análoga à do concessionário de veículos automotores terrestres, venha a ser dispensado sem justa causa.
140 BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 6.729/1979, de 28 de novembro de 1979. Dispõe sobre a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre. Diário Oficial da União, Brasília-DF, 29 de novembro de 1990. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/XXXX/X0000.xxx>. Acesso em 20 de junho de 2020.
141 BULGARELLI, Waldirio. Contratos nominados – doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 476. 142 Cf. XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 333 e FORGIONI, Xxxxx X, 2014, p. 65.
143 Ibid., p. 66, destaques no original.
144 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Das várias espécies de contrato. Do mandato. Da comissão. Da agência e distribuição. Da corretagem. Do transporte. Arts. 653 a 756. In: XXXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxxxxx (coord.). Comentários ao Novo Código Civil. v. X. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 296.
145 Ibid., p. 360.
Sucede que, na prática, são raros, se não inexistentes, casos que se assemelhem concreta e substancialmente a ponto de justificar a pretendida analogia legal. Dessa forma, infelizmente, é muito comum que os distribuidores de um modo geral sejam “privados da devida tutela de seus interesses porque falta legislação específica que discipline a relação com os fornecedores”146.
A propósito, acrescenta Xxxxx X. Forgioni147 que:
O novo Código Civil, muito embora preveja regras que se prestam à proteção das partes em situação de dependência econômica (por exemplo, arts. 473 e 187), não deverá alcançar o mesmo grau de efetividade da Lei Ferrari, ou mesmo da Lei do Representante Comercial.
Em sendo assim, por se tratar de lei específica, de caráter excepcional, a Lei Ferrari deve ser interpretada restritivamente, limitando-se ao âmbito das relações entre fabricantes e distribuidores de veículos automotores de via terrestre.
Nesse contexto, quaisquer conflitos entre concedente e concessionário verificados nos contratos de distribuição em geral devem ser resolvidos com base nas regras comuns do direito das obrigações e do direito contratual.
3.2.3.7.2. A impossibilidade de aplicação analógica da Lei do Representante Comercial (nº 4.886/65) aos contratos de distribuição
Com relação à regulamentação específica destinada aos contratos de representação comercial, melhor sorte não socorre àqueles que buscam a aplicação analógica da Lei nº 4.886/65 aos contratos de concessão comercial ou distribuição stricto sensu.
Com a promulgação da Lei nº 4.886/65, procurou o legislador dirimir os constantes atritos entre representantes e representados, em especial aqueles concernentes à natureza jurídica do vínculo existente entre as partes, que, na prática, acabavam deslocados para o âmbito trabalhista, “com inevitáveis implicações de natureza previdenciária e fiscal”148.
Sob esse aspecto, a Lei nº 4.886/65 criou um regime jurídico novo e excepcional, voltado exclusivamente a um único tipo contratual (representação comercial), com características e elementos próprios que não encontram correspondência nos contratos de concessão comercial ou distribuição stricto sensu.
146 XXXXXXXX, Xxxxx X, 2014, p. 66.
147 Ibid., loc. cit.
000 XXXX, Xxxxxxx Xxxxx, 0000, p. 33.
Ainda que se apontem semelhanças e afinidades entre os dois institutos, não há, na essência, o elemento da “identidade real ou essencial” para fazer “incidir a força da analogia, como fonte de direito” 149.
Como será oportunamente abordado em capítulo próprio e de forma mais detalhada, são muitos os elementos que impedem essa “identificação real” entre os contratos de representação comercial e distribuição stricto sensu.
Em linhas gerais, enquanto na representação comercial o agente age em nome e por conta da empresa que representa, agenciando vendas e coletando pedidos em favor do representado, na distribuição stricto sensu o distribuidor adquire bens em nome próprio para posteriormente revendê-los no mercado, assumindo integralmente o risco da comercialização.
Ademais, a remuneração do representante consiste na comissão sobre os negócios úteis por ele promovidos em nome e a favor do preponente, enquanto para o distribuidor “equivale ao lucro decorrente da diferença entre o preço de aquisição da mercadoria e seu preço de revenda”150.
Note-se, nesse passo, que essas principais diferenças são suficientes, por si só, para justificar a interpretação restritiva da Lei nº 4.886/65, a fim de não “tornar regra geral o que o legislador houve por bem tratar apenas como regra especial”151.
3.3. Extinção do contrato de distribuição stricto sensu
Como realçado anteriormente152, o contrato de concessão comercial ou distribuição stricto sensu é figura atípica, não encontrando regulamentação legal em nosso ordenamento jurídico.
Por essa razão, e diante da impossibilidade de aplicação analógica da Lei nº 4.886/65 e da Lei nº 6.729/79 à espécie, eventuais conflitos devem ser resolvidos com base nas regras e nos princípios gerais do direito contratual e obrigacional (em especial, arts. 000, 000, 000, 000 a 480, 927 e 944 a 947 do CC/02153), submetendo-se as partes à “lei do contrato” (“pacta sunt servanda”).
149 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 328.
150 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 63.
151 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, op. cit., p. 335.
152 V. item 3.2.3.7. supra.
153 “In verbis”: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Assim, da criação à extinção do contrato de distribuição, devem ser observados pelas partes os princípios da lealdade e da boa-fé, bem como os deveres laterais de conduta (colaboração e cooperação) esperados no iter contratual.
Feitas essas primeiras observações, cabe agora analisar as formas de extinção do contrato de distribuição stricto sensu, a saber: (i) vencimento do prazo convencionado em contrato; (ii) resilição unilateral ou denúncia imotivada; (iii) resilição bilateral ou distrato; (iv) resolução motivada pelo inadimplemento de qualquer das partes (rescisão por justa causa); (v) caso fortuito ou força maior; e (vi) extinção do sistema de distribuição e adoção de outro método de comercialização.
“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
“Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte. Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos”.
“Art. 474. A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial”.
“Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”.
“Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro”.
“Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la”. “Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação”.
“Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato”.
“Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva”.
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”.
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo- se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.
“Art. 946. Se a obrigação for indeterminada, e não houver na lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a lei processual determinar.
Art. 947. Se o devedor não puder cumprir a prestação na espécie ajustada, substituir-se-á pelo seu valor, em moeda corrente”.
3.3.1. Decurso do prazo de duração
Apesar de não ser usual a celebração do contrato de concessão comercial por prazo determinado em razão do seu caráter duradouro, é lícito às partes convencionar de antemão o seu termo final.
Por se tratar de contrato interempresarial, celebrado entre empresários, subentende-se que fabricante e distribuidor estão em posição de igualdade para pactuar com segurança um prazo final razoável que possibilite o retorno econômico desejado. Assim, cumpridas as obrigações previstas no contrato e/ou decorrido o seu termo final, dar-se-á por extinto o negócio, podendo as partes prorrogá-lo ou não, visto que a renovação não é compulsória.
Acresça-se que, uma vez encerrado o contrato pelo decurso do termo convencionado, não é devido ao concessionário, em regra, qualquer tipo de indenização, pois presume-se que o prazo ajustado foi suficiente para justificar o investimento realizado154.
Anote-se, no mais, que a possibilidade de renovação pode vir desde logo prevista em contrato, inclusive com a imposição de condições, como, por exemplo, prazo mínimo de aviso prévio a ser concedido quando não houver intenção de renovar.
Podem as partes, inclusive, caso assim o desejem, afastar a possibilidade de renovação
– hipótese que, via de regra, não configura abuso de direito, eis que resulta da autonomia privada das partes. Entretanto, eventualmente a recusa pode ser considerada abusiva “se exceder manifestamente ‘os limites impostos por seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes’ (art. 187 do CC/02)”155, dando lugar à reparação por perdas e danos (cf. arts. 186, 187 e 927 do CC/02).
É certo, nesse passo, que compete exclusivamente às partes a decisão de renovar ou não o vínculo contratual, sendo repreensível o comportamento do contratante que, inconformado com o término, recorre ao Judiciário para fazer valer aquilo que no contrato não está acertado: a manutenção compulsória da relação.
Não se ignora, também, que ao Judiciário é vedado imiscuir-se no equilíbrio da relação contratual a fim de substituir a vontade das partes e impor a continuidade do vínculo.
154 Segundo Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, “extinguindo-se o contrato ao atingir o termo convencional, qualquer dano ou lucro cessante que uma das partes experimente é reflexo lícito do exercício de um direito subjetivo, que não gera para o seu titular nenhum dever de indenizar, pois têm justa causa econômica e jurídica para se desvencilhar do relacionamento contratual exaurido”. XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 339. No mesmo sentido: XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 323.
155 XXXXXXXX, Xxxxx X., op. cit., p. 324.
Todavia, há certas situações que merecem ser tratadas de forma excepcional, como a hipótese em que uma das partes é levada a acreditar legitimamente na prorrogação do contrato, em razão da prática de determinados atos e comportamentos pela contraparte que são interpretados, na práxis, como verdadeira intenção de renovação do vínculo156.
Cria-se assim a legítima expectativa de que a avença será renovada, levando a parte enganada a realizar investimentos consideráveis, os quais, uma vez demonstrados, autorizam a “renovação tácita” do contrato, nos termos do disposto no parágrafo único do art. 473 do Código Civil de 2002, ou seja, “a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos”. Para Xxxxx X. Forgioni, “[n]a prática, isso significa que o contrato continuará irradiando sua eficácia plena até o escoamento de tal prazo”157.
3.3.2. Resilição unilateral ou denúncia imotivada
Como é cediço, o vínculo contratual não pode ser perpétuo. Destarte, às partes é assegurado o direito de denunciar o contrato, a qualquer tempo, independentemente de violação ou descumprimento contratual por um dos contratantes, desde que o faça sem abuso e mediante aviso prévio razoável ou compatível com a natureza e o vulto dos investimentos, sob pena de ter de indenizar a parte prejudicada.
É o que resulta do disposto nos arts. 187, 473 e 927 do Código Civil de 2002, de total aplicação à espécie:
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.
Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
156 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 325-326.
157 Ibid., p. 312.
No caso de ruptura antecipada imotivada de contrato por prazo determinado, atribui-se à parte prejudicada o direito de pleitear as perdas e danos correspondentes pelos investimentos não amortizados158.
No que toca aos contratos pactuados por prazo indeterminado, a licitude da denúncia unilateral imotivada pressupõe a concessão de aviso prévio razoável previsto em contrato ou “compatível com a natureza e o vulto dos investimentos” (CC/02, art. 473, §único). Sua inobservância configura abuso de direito e gera para o denunciante a obrigação de indenizar a outra parte.
Por “prazo razoável” entende-se aquele que garante ao concessionário tempo suficiente para adaptar-se à nova realidade e evitar prejuízos, levando-se em consideração, ainda, a “duração do vínculo contratual e a relevância econômica maior ou menor da avença em relação à atividade negocial do distribuidor”159. A propósito, tem decidido a jurisprudência brasileira que “um mês para cada ano de vigência do contrato”160 seria um prazo razoável a ser adotado como parâmetro no cálculo do aviso prévio.
Segundo Xxxxx X. Forgioni161, quanto à “natureza e o vulto dos investimentos” devem ser compreendidos os denominados “custos idiossincráticos”, concernentes aos investimentos específicos e irrecuperáveis realizados pela parte para a execução daquele contrato específico, de modo que o lapso temporal prescrito no parágrafo único art. 473 do Código Civil de 2002 deve assegurar “ao distribuidor tempo de permanência no mercado que viabiliz[e] a recuperação/amortização dos investimentos realizados”162.
Acresça-se, de outro lado, que, em certas circunstâncias, “mesmo após amortizado o capital inicialmente investido, a ruptura unilateral pode se mostrar abusiva, quando tenha sido despertada no agente a confiança na manutenção do vínculo contratual”163, do que se conclui que a razoabilidade do pré-aviso concedido deve ser analisada caso a caso e envolve o exame de elementos de difícil demonstração e mensuração.
Assim, sobretudo para os distribuidores, a grande questão envolvendo a denúncia imotivada dos contratos de distribuição por prazo indeterminado reside em demonstrar a
158 Conforme estabelece o art. 402 do Código Civil de 2002, “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
159 TJSP. Ap. Civ. nº 104.281-4/4-00, 9ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. Xxxx Xxxxxxxxx, julg. em 24.10.2000. In: RT nº 786/263 apud XXXXXXXX, Xxxxxxx, 2008, p. 379.
160 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 315.
161 Ibid., p. 232-234 e 313.
162 Ibid., p. 315
163 XXXXXXXX, Xxxxxxx, op. cit., loc. cit.
ausência de razoabilidade do aviso prévio concedido pelo fornecedor, bem como a natureza e o vulto dos investimentos incorridos, muitas vezes intangíveis.
Isso ganha contornos ainda mais relevantes na apuração do valor efetivamente devido à título de indenização, que poderá abranger, além dos investimentos realizados e não amortizados pela parte denunciada (e.g., com instalações, reformas, aquisição de maquinário específico, treinamento de pessoal, publicidade etc.), eventuais prejuízos sofridos com a perda do estoque, indenizações trabalhistas, devolução antecipada de imóvel locado, lucros cessantes, e outros, podendo incidir, ocasionalmente, indenização pela clientela comprovadamente formada ou incrementada em decorrência do trabalho do distribuidor164.
A respeito do dever de indenizar nos casos de ruptura imotivada do contrato de distribuição, Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx000 esclarecem:
A responsabilidade civil do denunciante só nascerá se restar cabalmente comprovada a infringência aos deveres do contratante, segundo os ditames do contrato, da lei ou dos deveres laterais de conduta impostos pelo princípio da boa-fé. Tais inadimplementos podem ser aferidos pelo julgador no exame de práticas comerciais que se mostrem abusivas, desleais, incompatíveis com a conduta que se espera de um comerciante probo e honesto.
Nunca, porém, poderá ser imposta qualquer indenização objetiva, independente de culpa, ao fornecedor em prol do distribuidor, porque não há lei que assim o obrigue. A responsabilidade civil, no ordenamento jurídico pátrio, vem regulada em cláusula geral inscrita nos arts. 186 e 389 do Código Civil, que elencam como requisitos básicos o ato culposo contrário a dever preexistente, o dano e o nexo causal. Qualquer responsabilidade que prescinda de tais elementos há de vir prevista em lei, em face do princípio da legalidade consagrado na Carta Constitucional.
Em termos práticos e efetivos, a falta de previsão legal do instituto torna o caminho do distribuidor ainda mais tortuoso em situações como a aqui aventada, de denúncia imotivada do contrato por iniciativa do fornecedor, porquanto inexiste um norte, um parâmetro legal a guiar as partes ou o julgador no cálculo da reparação, como ocorre nos contratos de representação comercial, por exemplo (com a chamada “indenização tarifada”).
De toda forma, a denúncia unilateral imotivada é meio lícito e legítimo de extinção do contrato de distribuição pactuado por tempo indeterminado, contanto que, como realçado, seja exercida sem abuso e mediante aviso prévio razoável. Constatado o exercício abusivo e antiético desse direito, será devida a respectiva indenização à contraparte prejudicada.
164 Para Xxxxx X. Forgioni “não é juridicamente aceitável que, tendo [o agente econômico] transferido a totalidade ou parte dos custos inerentes à distribuição a outro agente econômico, aproprie-se do resultado (= mercado conquistado, aumento da força da marca e outros benefícios) ‘a custo zero’”, logo “a incorporação do fruto desse trabalho [...] há de ser devidamente compensada àquele que o realizou”. XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 320.
165 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 339.
3.3.3. Resilição bilateral ou distrato
É lícito às partes, de comum acordo, extinguir o vínculo contratual que as conecta – seja ele por tempo determinado ou não – por simples declaração de vontade.
Nesse caso, será firmado o distrato, orientado pelos mesmos princípios de lealdade e boa-fé que nortearam a criação e todo o iter contratual.
3.3.4. Resolução motivada pelo inadimplemento de qualquer das partes (rescisão por justa causa)
Na hipótese de inadimplemento ou de infração grave às obrigações contratuais pactuadas, surge para a parte lesada o direito de “pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos” (CC/02, art. 475).
Uma vez verificado o inadimplemento, pode o contratante prejudicado proceder à rescisão do vínculo contratual sem necessidade de pré-notificar a contraparte166, sendo-lhe devida a justa indenização pelos prejuízos suportados.
Ressalte-se, nesse passo, que somente a falta grave justifica a rescisão por justa causa. Em geral, ela envolve a violação dos deveres de lealdade, diligência e boa-fé impostos reciprocamente às partes.
Constituem motivos justos para a rescisão a pedido do distribuidor, por exemplo: a) a violação, direta ou indireta, da cláusula de exclusividade, quando prevista; b) o estímulo à concorrência predatória entre distribuidores integrantes da mesma rede; c) o não fornecimento tempestivo de mercadorias; d) a fixação de preços abusivos, se comparados aos preços praticados pelo concorrência, engessando a atividade do distribuidor; e) a venda direta de produtos ao mercado pelo mesmo preço de compra oferecido ao distribuidor; f) problemas graves ou recorrentes de qualidade do produto; g) alterações unilaterais e abusivas na forma de pagamento das faturas; h) a fixação de cota de venda inexequível; i) o abalo no bom nome e na reputação do produtor que acarrete antipatia do mercado com relação aos produtos por ele
166 Xxxxxxxxx xx Xxxx entende que mesmo na resolução por justa causa impõe-se a obrigação de conceder aviso prévio à contraparte, afastando-se apenas a exigência de que referido prazo seja compatível com a natureza e o vulto dos investimentos realizados pelo inadimplente. Ademais, para o referido autor, “a resolução só se operará se em prazo compatível não for reposta a situação jurídica contratual”. XXXX, Xxxxxxxxx de, 1987, p. 95. Contudo, deve-se ter em mente que, uma vez abalada a confiança das partes – e, às vezes, do próprio mercado –, a recomposição da situação jurídica contratual revela-se incompatível com a manutenção do vínculo.
fabricados (e.g., uso de trabalho escravo); e j) a prática de conduta predatória por parte do produtor visando à redução da atuação ou à exclusão do distribuidor do mercado167.
Em contrapartida, representam motivos justos para a rescisão por iniciativa do produtor quaisquer violações aos padrões organizativos e às diretrizes comerciais por ele traçadas, tais como: a) não adquirir a cota mínima estabelecida, b) não prestar assistência técnica, c) não fazer publicidade do produto, d) usar indevidamente a marca; bem como e) violar a zona de atuação,
f) comercializar produtos concorrentes, g) não pagar as faturas e/ou os royalties, h) praticar atos que importem no descrédito comercial do produtor, i) infringir o dever de informação, entre outros.
Acresça-se, outrossim, que o inadimplemento do distribuidor não afasta seu direito de ser compensado por eventual “acréscimo patrimonial experimentado pelo fornecedor com o término do contrato”168. Em outras palavras, não se deve confundir a ausência de direito à indenização em virtude de resolução do contrato por justa causa com o direito do distribuidor de ser ressarcido por eventual enriquecimento sem causa do produtor (como ocorre na prática com a apropriação de clientela, por exemplo).
No mais, com relação à aferição da indenização devida, presente o justo motivo para rescisão do vínculo contratual devem ser compensados, em tese, além dos investimentos realizados e não amortizados pela parte denunciada (e.g., com instalações, reformas, aquisição de maquinário específico, treinamento de pessoal, publicidade etc.), eventuais prejuízos sofridos com a perda do estoque, indenizações trabalhistas, devolução antecipada de imóvel locado, lucros cessantes etc. Na hipótese de rescisão por inadimplemento do produtor, será devida, ainda, indenização pela clientela comprovadamente formada ou incrementada em decorrência do trabalho executado pelo distribuidor.
3.3.4.1. Inadimplemento recíproco
Convém abordar brevemente o estudo de Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Dearo Xxxxxxx a respeito do inadimplemento recíproco no contrato de distribuição, no qual se discute outra possibilidade de extinção do vínculo contratual entre fornecedor e distribuidor.
000 XXXXXXXXXXXXXX, Xxx Xxxxxx, 0000, p. 294-295.
168 Ibid., loc. cit.
Segundo a autora, nos contratos de distribuição é possível que ambas as partes deixem de cumprir mutuamente com suas obrigações, incorrendo no chamado “inadimplemento recíproco”.
Sucede que “nos contratos em que há multiplicidade de prestações e contraprestações, tal qual o contrato de distribuição, o inadimplemento recíproco, todavia, não se caracteriza apenas em virtude do descumprimento de obrigações interdependentes” 169. Para ela, é possível também o descumprimento de obrigações autônomas e diversas, verificando-se, assim, dois inadimplementos unilaterais.
Nessa situação, não será possível a nenhum contratante utilizar-se da exceção do contrato não cumprido, prevista no art. 476 do Código Civil de 2002, restando duas soluções cabíveis para os casos de inadimplemento unilateral: “i) a caracterização de mora, com a preservação do contrato; e ii) o inadimplemento absoluto”170.
Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx000, apoiados no mencionado estudo de Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, esclarecem que, “em havendo a mora recíproca, cada contratante deverá purgá-la, cumprindo a obrigação em atraso, podendo a parte lesada exigir a reparação dos prejuízos suportados”.
Acrescentam, ainda, que:
Se o descumprimento for absoluto, a solução será: i) a resolução do contrato ou, se possível, ii) a execução pelo equivalente, hipótese em que se ‘mantém o vínculo entre as partes e substitui a prestação que se tornou irrealizável por uma equivalente de natureza pecuniária’.
Como se vê, o inadimplemento recíproco também pode ensejar a extinção do contrato de distribuição nas situações em que seja relevante a ponto de justificar a ruptura, e não a manutenção, do contrato.
3.3.5. Caso fortuito ou força maior
O contrato de concessão comercial também pode ser extinto por qualquer das partes, sem justa causa, quando verificada situação de caso fortuito ou força maior.
O Código Civil de 2002, nas regras gerais atinentes ao direito das obrigações, assim dispõe acerca da matéria:
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
169 XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx, 2015, p. 72.
170 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 313.
171 Ibid., loc. cit.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Como se extrai do apontado dispositivo legal, o dever de indenizar eventuais prejuízos sofridos pela parte contrária surgirá somente se o contratante afetado pelo evento de caso fortuito ou força maior tiver por eles expressamente se responsabilizado. Caso contrário, não será devida indenização alguma, ressalvado à parte apenas o direito ao recebimento, em momento oportuno, de valores já devidos e pendentes de pagamento (e.g., o direito do produtor ao recebimento de royalties pela exploração e comercialização do produto e/ou da marca até a data do evento fortuito).
São exemplos de situações de caso fortuito ou de força maior: a morte, a interdição ou o decreto de falência de qualquer das partes, bem como atos governamentais supervenientes e situações de calamidade pública.
3.3.6. Extinção do sistema de distribuição e adoção de outro método de comercialização
Uma última hipótese de resolução do contrato de distribuição, suscitada por Claudineu de Melo172, é a extinção do sistema de distribuição adotado pelo fabricante com a consequente adoção de outra modalidade de comercialização.
Durante a vigência do contrato, seja ele por prazo determinado ou indeterminado, pode ser que mudanças de estratégia ocorram ou modernizações se façam necessárias, levando o fabricante a abandonar o sistema de concessão até então adotado e a buscar novas técnicas comerciais que melhor se adéquem ao novo negócio.
Disso decorre a situação aqui ilustrada, a qual afeta toda a rede de distribuição, cabendo ao fabricante notificar individualmente todos os seus integrantes com antecedência razoável ou compatível com a natureza e o vulto dos investimentos por eles realizados.
172 XXXX, Xxxxxxxxx xx, 1987, p. 95.
4. DISTINÇÕES E SIMILITUDES ENTRE OS CONTRATOS DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL (AGÊNCIA) E DE DISTRIBUIÇÃO STRICTO SENSU (CONCESSÃO COMERCIAL)
4.1. Similitudes
Os contratos de representação comercial e de distribuição stricto sensu são figuras contratuais absolutamente distintas na sua essência, mas que guardam entre si certas semelhanças estruturais, que decorrem de alguns elementos que lhes são comuns.
Ambos os tipos contratuais exercem papel fundamental no escoamento da produção e estão inseridos entre os chamados “contratos colaborativos”, gênero marcado pelo compromisso recíproco de colaboração e cooperação assumido pelas partes, visando à consecução de um objetivo comum. Como tal, envolvem relações duradouras, que tendem a se protrair no tempo, sendo frequente a sua celebração por prazo indeterminado.
Assim como na agência, o sistema de comercialização por concessão comercial pressupõe a existência de uma rede integrada de intermediários partilhando do mesmo propósito de promover a colocação e a venda de determinado produto do fabricante ou comerciante no mercado, o qual encontra-se dividido em áreas geográficas ou setores que podem ou não lhes ser atribuídos, com ou sem exclusividade173.
Acresça-se, ademais, que em ambos os casos existe a figura dominante do produtor ou fabricante, “que impõe condutas comerciais, fiscaliza e estabelece metas”174, o que denota certa ingerência na atuação comercial tanto dos agentes quanto dos concessionários.
Para a autora portuguesa Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, a afinidade entre os dois institutos resulta não só da atividade desenvolvida pelos agentes e concessionários, mas ainda “quanto à situação de dependência económica em que se encontram relativamente à outra parte as duas categorias de intermediários comerciais”175.
Não à toa, essas similaridades confundiram até mesmo o legislador brasileiro, que, como já realçado176, de maneira imprópria e equivocada classificou o contrato de distribuição como
173 XXXX, Xxxxxxxxx xx, 1987, p. 44.
174 SCHERKERKEWITZ, Iso Chaitz, 2013, p. 286.
175 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. O Contrato de Agência. In: Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa/Centro de Estudos Judiciários (orgs.). Novas perspectivas do Direito Comercial. Coimbra: Almedina, 1990, p. 124-125, apud NETO, Xxxxxx. Contratos comerciais – legislação, doutrina e jurisprudência. Lisboa: Ediforum, 2002, p. 156-157.
176 V. capítulo 3.2.3.7 supra.
uma espécie do contrato de agência, regulando conjuntamente no art. 710 do Código Civil de 2002 os dois modelos de agência acolhidos (agência “lato sensu” e “agência distribuição”)177.
4.2. Distinções
Não obstante compartilhem o mesmo objetivo final – sucesso e eficiência do negócio, com consequente incremento das vendas –, as duas figuras contratuais aqui estudadas apresentam um modus operandi muito diverso, o que torna patente sua distinção.
Ao contrário da representação comercial, na qual o agente atua em nome e por conta da empresa que representa, coletando pedidos e agenciando vendas em favor do representado, na distribuição stricto sensu o distribuidor adquire bens em nome próprio para depois revendê-los no mercado.
Em linhas gerais, a aquisição da mercadoria pelo concessionário para posterior revenda constitui o principal elemento distintivo entre os dois institutos: na representação o agente não adquire a mercadoria, agindo como mero mediador do negócio178, enquanto na distribuição há necessariamente a transferência de titularidade do bem do patrimônio do fornecedor para o do distribuidor e, posteriormente, do distribuidor para o do adquirente final.
Daí resulta outro diferencial: na agência, a venda é realizada diretamente pelo fornecedor, competindo-lhe exclusivamente o risco do negócio; na distribuição, o distribuidor assume integralmente o risco da comercialização179, do que se conclui também que “o agenciamento supõe representação; a distribuição é incompatível com esta”180.
Por sua vez, a forma de remuneração representa outra particularidade desses tipos contratuais: enquanto a remuneração do representante consiste na comissão sobre os negócios úteis por ele promovidos em nome e a favor do preponente, para o distribuidor ela “equivale ao lucro decorrente da diferença entre o preço de aquisição da mercadoria e seu preço de revenda”181.
177 XXXX, Claudineu de, 1987, p. 44.
178 REQUIÃO, Xxxxxx, 2005, p. 43.
179 Para Xxxxx X. Forgioni, “a distinção entre as vendas efetuadas por um sujeito enquanto representante e distribuidor é clara: como distribuidor, adquire bens em nome próprio, que são em seu nome faturados. Com a revenda posterior, seu proveito econômico é a diferença entre o preço de venda ao adquirente. O valor da venda é determinado pelo distribuidor (proprietário do bem alienado), a não ser que haja acordo em sentido contrário. Na representação, a venda é diretamente realizada pelo fornecedor aos adquirentes. A remuneração consiste na comissão previamente ajustada. O preço do bem é estabelecido pelo proprietário, ou seja, pelo fornecedor representado, cabendo ao representante apenas segui-lo”. XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 67-68.
180 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 420.
181 XXXXXXXX, Xxxxx X., op. cit., p. 63.
Diversamente do contrato de representação comercial, que é regulado por legislação própria e especial (Lei nº 4.886/65), o contrato de distribuição é atípico e, portanto, sujeito aos princípios comuns do direito obrigacional e contratual.
Para Xxxxx X. Forgioni182, a distinção mais relevante entre os contratos de distribuição stricto sensu e de representação comercial é aquela que decorre do valor devido a título de indenização nos casos de denúncia unilateral imotivada do contrato pelo fabricante.
Isso porque, na hipótese de denúncia unilateral imotivada do contrato de distribuição, a determinação do valor da compensação enfrenta dificuldades fáticas acentuadas, principalmente em razão da atipicidade do instituto e, consequentemente, da falta de um parâmetro normativo para guiar as partes e o julgador na apuração da indenização.
Sem dúvida, em situações de ruptura como essa, a ausência de previsão legal do contrato de distribuição torna o cômputo da indenização uma tarefa muito mais complexa e ingrata ao distribuidor, na medida em que ele poderá recorrer apenas às regras gerais do direito das obrigações e dos contratos, em especial ao art. 473 do Código Civil de 2002.
Em contrapartida, no caso da agência, o agente dispensado está amparado pela Lei nº 4.886/1965, que prevê, em seus arts. 27, alínea “j” e §1º, e 34, “uma ‘fórmula’ a ser aplicada no cálculo da reparação”183, proporcionando ao agente uma “indenização tarifada”, independentemente de comprovação de dano efetivo. Esses critérios visam resguardar os interesses dos representantes e mitigar os prejuízos por eles sofridos com a dispensa abrupta e imotivada do contrato, o que não se vê nos contratos de distribuição.
A respeito, acrescentam Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xx. e Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx que “o principal elemento de tutela ao representante comercial, outorgado pela Lei nº 4.886/65, está na garantia de valores mínimos de ressarcimento a que o representante se sujeitará nos casos de rompimento do ajuste sem justa causa”184.
Como se vê, apesar de a forma de extinção ser a mesma, as consequências práticas são completamente distintas, o que só reforça a discrepância dos institutos contratuais analisados neste estudo.
182 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 66.
183 Ibid., loc.cit.
184 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 331.
5. CONCLUSÃO
O presente estudo dedicou-se à análise perfunctória, porém crítica, dos principais elementos e questões que envolvem os contratos de representação comercial (ou agência) e de distribuição stricto sensu (ou concessão comercial).
De início, procurou-se esclarecer a acirrada polêmica terminológica que circunda os dois institutos e gera inúmeras confusões de ordem prática e legal.
Nesse aspecto, restou elucidado que os termos representação comercial e agência são sinônimos, assim como os termos distribuição stricto sensu e concessão comercial.
Delimitou-se, também, que o contrato de distribuição lato sensu representa um gênero “a que pertencem os mais variados negócios jurídicos, todos voltados para o objetivo final de alcançar e ampliar a clientela”185, dentre os quais se inserem os contratos de agência e de concessão comercial aqui estudados.
Tal distinção foi fundamental para compreensão da impropriedade na qual incorreu o Código Civil de 2002 ao nomear como distribuição uma simples espécie acessória do contrato de agência (agência-distribuição) em que o agente recebe os produtos – sem, contudo, adquiri- los – e “assume os riscos de sua guarda e conservação”186 até sua comercialização e entrega ao comprador. Acrescentou-se, a propósito, que a apontada figura disciplinada no art. 710 do Código Civil de 2002 não se confunde com a distribuição stricto sensu, também denominada concessão comercial, que permanece atípica.
Uma vez sanada a questão terminológica e definidos os conceitos legais, passou-se à delimitação e identificação das principais características e elementos desses dois institutos, trazendo à tona algumas questões controvertidas.
Com relação à representação comercial, foram abordados os seguintes assuntos polêmicos: (i) a delimitação das zonas de atuação e as cláusulas de exclusividade; (ii) a remuneração dos agentes; (iii) o direito de recusa dos preponentes; e (iv) os deveres das partes. As formas de extinção do contrato foram tratadas com destaque, mormente a denúncia unilateral imotivada, que gera ao denunciante o dever de indenizar a parte lesada nos termos tarifados pela Lei nº 4.886/65 (arts. 27, alínea “j” e §1º, e 34). A indenização tarifada foi esquematizada ao final para tornar mais fácil sua compreensão.
185 XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx, 2019, p. 169.
186 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx de; XXXXXX, Xxxxxxx X. Monteiro de, 2006, p. 216.
No que tange à concessão comercial, após o enquadramento da espécie segundo as categorias dos contratos de colaboração, de duração, relacionais e por adesão, foram realçados os seguintes pontos controvertidos: (i) as redes de distribuição; (ii) a autonomia, o controle externo e a dependência econômica; (iii) a atipicidade do instituto; e (iv) a impossibilidade de aplicação analógica da Lei nº 4.886/65 e da Lei nº 6.729/79 (Lei dos Representantes Comerciais e Xxx Xxxxxxx, respectivamente).
Também mereceram destaque as formas de extinção do contrato, sobretudo a denúncia unilateral imotivada, porque impõe aos distribuidores sérios conflitos de ordem prática, na medida em que, à míngua de previsão legal, inexiste uma fórmula a ser aplicada no cálculo da indenização devida.
Por fim, despretensiosamente, procedeu-se à comparação entre ambas as figuras contratuais, analisando-se suas principais semelhanças e diferenças. Concluiu-se que os contratos de agência e de concessão comercial , apesar de guardarem certas afinidades entre si, são figuras completamente distintas, em especial pelo fato de que na distribuição há necessariamente a aquisição da mercadoria pelo distribuidor para posterior revenda no mercado por sua conta e risco, enquanto na representação o agente atua em nome e por conta da empresa que representa, coletando pedidos e agenciando vendas em favor do representado.
Apontou-se que outra importante distinção está relacionada à tipicidade dos institutos, porquanto a Lei nº 4.886/86, que regula a atividade dos representantes comerciais, longe de ser perfeita, ao menos protege os interesses da categoria, conferindo-lhes certas vantagens que não se aplicam aos distribuidores, os quais permanecem em zona nebulosa, sobretudo após a desastrosa tentativa do Código Civil de 2002 de regulamentar o contrato de distribuição.
E essa característica assume contornos ainda mais relevantes quando há a denúncia unilateral e imotivada pelo fabricante, pois os distribuidores, na ausência de legislação própria que discipline sua relação com os fornecedores, “veem-se privados da devida tutela de seus interesses”187, ao passo que aos representantes são assegurados valores mínimos de ressarcimento pela lei especial, a chamada “indenização tributada”.
Em suma, a realidade é que os distribuidores permanecem num limbo jurídico, socorrendo-se apenas e tão somente das praxes de mercado, bem como das regras gerais do direito das obrigações e dos contratos.
187 XXXXXXXX, Xxxxx X., 2014, p. 66.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx; XXXXXX, Xxxxxxx X. Monteiro de. O contrato de distribuição do art. 710, caput, parte final, do Código Civil de 2002. p. 243-285. In: XXXXX, X. Xxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx X. (coords.). Representação Comercial e Distribuição: 40 anos da Lei nº 4.886/65 e as novidades do CC/02 (arts. 710 a 721). EC 45/04: estudos em homenagem ao prof. Xxxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Saraiva, 2006.
XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Teoria geral dos contratos típicos e atípicos: curso de direito civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
BULGARELLI, Waldirio. Contratos nominados – doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1995.
XXXXXX XX., Xxx Xxxxxxx. Contrato de distribuição ou concessão mercantil. p. 451-466. In: XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXX XX., Xxxxxxx Xxxxx (coords.). Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006
XXXX XXXXX, Xxxxxx. Contratos Mercantiles. 7. ed. México: Xxxxxx, 0000.
XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Tratado teórico e prático dos contratos. v. 3. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996.
XXXXXXXX, Xxxxx X. Contrato de distribuição. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986.
XXXXXX, Xxxxxxxxxx. Contrato de Distribuição. In: XXXXXXXXX, Xxxxxxxxx (coord.); XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx et al. Contratos empresariais: contratos de organização da atividade econômica. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
XXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. As similitudes entre os contratos de agência e representação comercial. p. 467-495. In: XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx, XXXXXXX XX., Xxxxxxx Xxxxx (coords.). Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
XXXXXXX, Xxxx. Contratos e obrigações comerciais. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. XXXX, Xxxxxxxxx xx. Contrato de Distribuição. São Paulo: Saraiva, 1987.
XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Contrato de agência. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000.
XXXX, Xxxxxx. Contratos comerciais – legislação, doutrina e jurisprudência. Lisboa: Ediforum, 2002.
XXXXXXX, Xxxxxx. Do representante comercial: Comentários à Lei n. 4.886, de 9 de dezembro de 1965, à Lei n. 8.420, de 8 de maio de 1992, e ao Código Civil de 2002. 9. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Nova regulamentação da representação comercial autônoma. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
XXXXX, Xxxxxxxxx Xxxx. Do representante comercial autônomo. 1. ed. São Paulo: Ícone, 2011.
. Aspectos modernos de Direito Comercial: estudos e pareceres. v. 3. São Paulo: Saraiva, 1986.
XXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Representação comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
SCHERKERKEWITZ, Iso Chaitz. Contratos: (teoria e prática). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
XXXXXXX, Xxxxxx. Direito Civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. v. 3. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
XXXXXXXX, Xxxxxxx. Das várias espécies de contrato. Do mandato. Da comissão. Da agência e distribuição. Da corretagem. Do transporte. Arts. 653 a 756. In: XXXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxxxxx (coord.). Comentários ao Novo Código Civil. v. X. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
XXXXXXXX XX., Xxxxxxxx; XXXXXXXX XX XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx. Contratos de Colaboração Empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 2019.
XXXXXXX, Xxx Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. Contrato de distribuição: o inadimplemento recíproco. São Paulo: Atlas, 2015.
I) Obras complementares
XXXXX, Xxxxxx de. Contratos nominados: mandato, comissão, agência e distribuição, corretagem, transporte. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Contratos comerciais. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.
(coord.). Novos contratos empresariais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.
XXXXX, X. Xxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx X. (coords.). Representação Comercial e Distribuição: 40 anos da Lei nº 4.886/65 e as novidades do CC/02 (arts. 710 a 721). EC 45/04: estudos em homenagem ao prof. Xxxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Saraiva, 2006.
BULGARELLI, Waldirio. Contratos mercantis. 11. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
. Contratos e títulos empresariais: as novas perspectivas. São Paulo: Atlas, 2001.
XXXXXX, Xxxxxxx Xxxx (coord.). Contratos Nominados: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1995.
XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx. Contratos de representação comercial: controvérsias e peculiaridades à luz da legislação brasileira. 1. ed. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000.
XXXXXXXX, Xxxxx X. Contratos empresariais – Teoria geral e Aplicação. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx, XXXXXXX XX., Xxxxxxx Xxxxx (coords.). Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
XXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxxxx; XXXX XX., Xxxxxx. Instituições de Direito Civil: Contratos. v.
3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
REBOUÇAS, Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Autonomia privada e análise econômica do contrato. 1. ed. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000.
XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Os contratos de agência, de representação comercial e o contrato de distribuição. O art. 710 do Código Civil. p. 179-199. In: XXXXX, X. Xxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx X (coords.). Representação Comercial e Distribuição: estudos em homenagem ao prof. Xxxxxx Xxxxxxx. São Paulo: Saraiva, 2006.
XXXXX, Xxxx. O Contrato. Coimbra: Xxxxxxxx, 0000.
XXXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxx de. Contratos Atípicos. Coimbra: Almedina, 1995.
XXXX, Xxxxxxx. Direito civil: contratos em espécie. v. 3. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
. Obrigações e contratos. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
II) Leis
BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 4.886/1965, de 09 de dezembro de 1965. Regula as atividades dos representantes comerciais autônomos. Diário Oficial da União, Brasília-DF, 10 de dezembro de 1965. Disponível em: <http:
//xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/XXXX/X0000.xxx>. Acesso em 19 de maio de 2020.
BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 10.406/2002, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília-DF, 11 de janeiro de 2002. Disponível em: < xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxXx_00/Xxxx/0000/X00000.xxx>. Acesso em 20 de junho de 2020.
BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 6.729/1979, de 28 de novembro de 1979. Dispõe sobre a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre. Diário Oficial da União, Brasília-DF, 29 de novembro de 1990. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/XXXX/X0000.xxx>. Acesso em 20 de junho de 2020.