A LIVRE NEGOCIAÇÃO NO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO CONCEDIDA PELA REFORMA TRABALHISTA
A LIVRE NEGOCIAÇÃO NO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO CONCEDIDA PELA REFORMA TRABALHISTA
Xxxx Xxxxxxxx XXXXXx
RESUMO: O presente trabalho tem como escopo o estudo crítico dos artigos 444 parágrafo único, e 507-A, ambos da CLT, alterados pela Lei n° 13.467/2017 (reforma trabalhista), a qual concede as partes, a possibilidade de livre negociação das cláusulas contratuais, sobrepondo-se, inclusive, à convenção coletiva e a lei, em paralelo aos princípios do direito do trabalho e das garantias Constitucionais.
Palavras-chave: Princípios. Garantias Constitucionais. Direito do Trabalho. Livre Negociação. Inconstitucionalidade.
1 INTRODUÇÃO
O direito do trabalho surge, no mundo, com a revolução industrial, quando a sociedade que era até então tipicamente rural se transformou em uma sociedade urbana, emergindo as grandes metrópoles.
A população trabalhava em troca de pequenos valores de dinheiro ou alguns alimentos ao final do dia, onde não existia proteção do Estado aos operários das fábricas, que submetiam-se a todas as regras, então, impostas pelos donos das fábricas.
Assim, foram criadas as primeiras leis trabalhistas que vedavam as explorações e conferiram mínimas condições de proteção ao menor, a mulher e a limitação da duração do trabalho. Posteriormente com o avanço da sociedade moderna, e as grandes lutas por melhores condições de trabalho, os empregados conquistaram, enfim, um conjunto de direitos de proteção, perante o preponente poder do capitalismo.
Mais tarde, houve uma ascensão dessas normas, por meio da constitucionalização do direito do trabalho, implementado, primeiramente, na Constituição Mexicana de 1917, e, posteriormente, na Constituição alemã de Weimar de 1919.
No Brasil, existiam, apenas, algumas leis esparsas sobre a matéria, que somente ganharam destaque após o surgimento, em 1943, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que reuniu as principais legislações que vigoravam à época, a qual trouxe um numeroso rol de benefícios aos empregados, proporcionando-os uma equiparação jurídica ao empregador.
A CLT trouxe segurança aos empregados, determinando ao Estado uma maior proteção à classe, afastando os abusos cometidos pela exploração da mão de obra pelo capitalismo.
Na medida em que a sociedade evoluiu, modificaram-se os costumes, a política, a economia e aumentaram-se os ramos empresariais e surgiram novas modalidades de trabalho, exigindo também que a legislação trabalhista acompanhasse o desenvolvimento da sociedade.
Atualmente é indiscutível que havia a necessidade de se realizar uma atualização e modificação nas normas trabalhistas, para poderem se enquadrar melhor as atuais demandas da sociedade moderna.
Aliado a isso, observa-se que o Brasil vivencia um turbulento período de fragilidade e inseguranças, em meio a um cenário político instável, onde a disputa pelo poder e capital estão acima do interesse comum, refletindo diretamente no controle financeiro do país.
O setor econômico foi o ponto de maior afetação, desencadeado, principalmente, pela aumento progressivo das taxas de desemprego, e consequente enfraquecimento do ramo empresarial.
Desta forma, foi promulgada a Lei n° 13.467/17, em 13 de julho de 2017, a qual altera cerca de 100 dispositivos da CLT, com a promessa de proporcionar uma melhoria à classe, uma maior flexibilização das normas, trazendo liberdade as partes, onde supostamente iria favorecer o empregado, e, principalmente iria fortalecer o mercado de trabalho com novas contratações em massa.
No entanto, apesar de que as alterações ainda não foram bem exploradas e praticadas, pode-se notar um em alguns dispositivos do novo texto, se chocam com alguns princípios do direito do trabalho.
Assim, o intuito do presente trabalho é demonstrar as “falhas” que cercam a reforma trabalhista, em especial, aos artigos 444, parágrafo único, e o 507- A, ambos da CLT, trazendo uma crítica à reforma trabalhista, que deixou o empregado em maior estado de desigualdade em relação ao empregador, o qual detém o controle do poder econômico.
2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO
Antes de se definir quais são os princípios do direito do trabalho, cumpre- nos mencionar, inicialmente, acerca de sua definição, valor, importância, interpretação e aplicabilidade no direito em geral, com foco no direito do trabalho.
Os princípios, é classificado como sendo uma norma jurídica, podendo ser definidos por um conjunto de padrões presentes no ordenamento, seja de forma explicita ou implícita.
O princípio define o sentido em que devem ser interpretadas as regras, os dispositivos de lei, as relações jurídicas, determinando qual o intuito de proteção a ser adotado.
Existem diversos pesos ou importâncias que são concedidas a cada princípio no direito, que dentre os que podem ser aplicados no caso sob análise, devendo ser eleito o que apresenta maior peso relativo aos demais, ou o mais relevante.
Em caso de conflito entre dispositivos de lei, deve ser aplicado a que melhor se adequa, segundo a análise do caso concreto juntamente com os princípios do direito do trabalho.
Assim, após estudo da definição dos princípios, elencaremos quais são os mais relevantes, e com maior importância interpretativa do direito do trabalho.
No entendimento de Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, os princípios orientam a construção do ordenamento jurídico, norteiam a elaboração da regra, embasando-a e servindo de forma para sua interpretação. Ainda, nivelam valores e interesses conforme o seu peso e a ponderação de outros princípios conflitantes. (Xxxxxxx, 2014)
2.1 Princípios Constitucionais
A Constituição Federal traz um numeroso rol de princípios relacionados ao direito do trabalho dispersas ao longo de seu texto, destacando-se, inicialmente, pelo artigo 1° incisos III e IV, os quais mencionam a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.
Apesar de tais princípios terem uma interpretação ampla e sustentarem os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, não é admissível que quaisquer normas trabalhistas se opõem a estes valores.
Da mesma forma, aplicam-se, também, ao direito do trabalho alguns dos princípios constantes no artigo 5° da Constituição Federal, os quais se observam, o princípio da isonomia (art. 5°, caput e I), a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem (art. 5°, X), a liberdade do trabalho e da associação (art. 5°, XIII e XVII a XX), e a vedação às práticas discriminatórias (art. 5°, XLI e XLII).
Neste contexto, alicerçado pelos princípios da isonomia e da vedação à discriminação, destaca-se o artigo 7° da Constituição Federal que enumera o maior número de direitos e princípios, os quais se verificam, proibição de distinção entre os trabalhos com mesma aptidão técnica, diferença de salário e também a vedação à admissão discriminatória.
Ademais, apresentam-se alguns últimos princípios constitucionais, dispersos no texto, onde podemos encontrar no artigo 170, os princípios da valorização do trabalho humano e a justiça social. Por fim, o artigo 193, traz um princípio amplo do bem estar e da justiça social nas relações de emprego.
2.2 Princípios Específicos do Direito do Trabalho
2.2.1 Princípio da Proteção
O empregado se mostra a parte economicamente mais vulnerável da relação de trabalho, assim, com o objetivo de proporcionar uma igualdade jurídica entre as partes, surge, então, o princípio da proteção.
Este princípio se destaca, principalmente, de forma fundamental na aplicação, interpretação e na elaboração de toda a legislação trabalhistas.
Seu propósito consiste em tentar corrigir desigualdades, criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante da sua condição de hipossuficiente. (Xxxxxx, 2009, p. 181)
A concepção protecionista adotada pelo Direito do Trabalho remonta à própria formação histórica deste ramo do Direito e tem como fundamento a constatação de que a liberdade contratual assegurada aos particulares não poderia prevalecer em situações nas quais se revelasse uma desigualdade econômica entre as partes contratantes, por isso significaria, sem dúvida nenhuma, a exploração do mais fraco pelo mais forte. (Romar, 2017, p. 53)
Além disso, de acordo com a Doutora Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, a doutrina se manifesta no sentido de que este o princípio, pode se subdividir em três regras, as quais vejamos, a regra do in dubio pro operario; da norma mais favorável; e a condição mais benéfica.
Dentre as três mencionadas regras, se destaca a regra da condição mais benéfica, pois garante que na relação de emprego jamais poderá ser aplicado dispositivo que importe em diminuição ou perda de direitos aos empregados.
Situações pessoais mais vantajosas incorporam-se ao patrimônio do empregado, por força do próprio contrato de trabalho, e não podem ser retiradas, sob pena de violação ao art. 468 da CLT. A cláusula contratual mais vantajosa reveste-se de caráter de direito adquirido (CF, 5°, XXXVI). (Romar, 2017, p. 55/56)
2.2.2 Princípio da Irrenunciabilidade
O princípio da Irrenunciabilidade é aceito de forma unânime na doutrina como uma das principais bases do Direito do trabalho e constitui-se no reconhecimento da não validade do ato voluntário praticado pelo trabalhador no sentido de abrir mão de direito reconhecido em eu favor. (Romar, 2017, p. 56)
Observa-se que este princípio veda que o empregado decline, voluntariamente, seus direitos, seja em qualquer momento da relação contratual, afastando que o empregador possa se beneficiar da vulnerabilidade do empregado, criando assim, uma maior proteção jurídica.
Apesar da omissão legislativa acerca da possibilidade ou não de renúncia, de forma expressa, podemos extrair pela interpretação do artigo 9° da CLT, que dispõe que “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.”
2.2.3 Princípio da Continuidade da Relação de Emprego
Este princípio tem como escopo a proteção da continuidade do emprego, prezando pela maior duração do relação jurídica, evitando, inclusive, possíveis fraudes cometidas pelo empregador, quando efetua a dispensa com justa causa sem fundamento.
Assim, nas palavras de Xxx Xxxxxxxxx, este princípio é “tudo o que vise à conservação da fonte de trabalho, a dar segurança ao trabalhador, constitui não apensas um benefício para ele, enquanto lhe transmite um sensação de tranquilidade, mas também redunda em benefício d apropria empresa e, através dela, da sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e melhorar o clima social das relações entre as partes”. (Xxx Xxxxxxxxx, 2000, p. 240)
Além do mais, este princípio está atrelado também à matéria processual do trabalho, o qual beneficia o empregado, no caso do ajuizamento de uma demanda, onde o Juiz poderá determinar a inversão do ônus da prova, conforme entendimento da Súmula 212 do TST.
2.2.4 Princípio da Primazia da Realidade
O princípio da primazia da realidade, derivado da ideia de proteção, tem por objetivo fazer com que a realidade verificada na relação entre o trabalhador e o empregado prevaleça sobre qualquer documento que disponha em sentido contrário. (Romar, 2017, p. 57)
Portanto, este princípio, fundamenta-se na prevalência da verdade sobre quaisquer documentos, tendo em vista a fragilidade do empregado que visa, prioritariamente, a manutenção do vínculo, uma vez que este sofre constantemente pressão do empregador, induzindo-o a prática de determinados atos, no intento de eximir-se de suas responsabilidades.
2.2.5 Princípio da Razoabilidade
Este princípio é considerado uma das mais importantes estruturas, não apenas do direito do trabalho, mas em todo os ramos do direito, buscando garantir, a
razoabilidade em todas as relações jurídicas, a fim de obter o resultado mais justo possível.
Observa-se que a utilização deste princípio para fundamental na interpretação das normas trabalhistas, cláusulas contratuais, realidade fática e demais situações em que o empregado possa sofrer prejuízos.
2.2.6 Princípio da Boa-fé
Este princípio abrange tanto o empregado como o empregador. No primeiro caso, baseia-se na suposição de que o trabalhador deve cumprir seu contrato de boa-fé, que tem, entre suas exigências, a de que coloque todo o seu empenho no cumprimento de suas tarefas. Em relação ao empregador, supõe que deva cumprir lealmente suas obrigações para com o trabalhador. (Romar, 2017, p. 58)
Ademais, verifica-se que o princípio da boa-fé rege toda a sociedade, onde espera-se que todas as partes envolvidas nas mais variadas relações jurídicas.
3 CRÍTICA A LIVRE NEGOCIAÇÃO NO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO CONCEDIDA PELA REFORMA TRABALHISTA
Recentemente, a CLT foi alterada com a entrada em vigor da Lei n° 13.467/2017, chamada de “reforma trabalhista”, a qual trouxe importantes modificações à inúmeros dispositivos do texto.
Dentre as importantes mudanças, pode-se verificar a inclusão do parágrafo único ao artigo 444 da CLT, in verbis:
Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
Observa-se, assim, que o legislador autorizou, expressamente, a livre negociação das cláusulas do contrato de trabalho, acerca das disposições constantes no rol do artigo 611-A, entre empregado e empregador, prevalecendo-se sobre às negociações coletivas e a legislação, desde que o empregado tenha curso superior completo e perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios da Previdência Social.
A reforma trabalhista traz, na verdade, a confirmação da possibilidade, de forma legal, do chamado “o negociado sobre o legislado”, autorizando e ampliando de uma só vez as inúmeras hipóteses em que o empregador poderá negociar livremente com o empregado, prevalecendo as cláusulas contratuais estabelecidas em acordo individual sobre a lei.
Sobre este tema, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, alerta no sentido de que ocorrência destas “negociações” resultaram em prejuízos à parte mais vulnerável, mencionando que “Nesse contexto, avançaram os entendimentos sobre o alcance da negociação coletiva e surgiram, ao longo dos anos pós-1988, cláusulas as mais variadas nos acordos coletivos e convenções coletivas, para espanto de estudiosos do direito do trabalho. Muitas das cláusulas já nascem fadadas à contestação ou à inconstitucionalidade, pois prejudicam terceiros, sabotam impostos e encargos, adulteram natureza jurídica de parcelas incontroversamente salariais e retiram direitos previstos na CF.” (Silva, 2017, p. 113)
Não obstante, o assunto vem causando certo receio aos juristas, levantando preocupação sobre a eficácia do dispositivo, uma vez que ao se permitir que o empregado que possua ambos os requisitos, possa negociar as disposições do contrato de trabalho, não estará livre de possíveis abusos e fraudes que os empregadores venham a cometer.
Inegável a vulnerabilidade do empregado ao celebrar um contrato de trabalho, especialmente, em que será possível a negociação das cláusulas previstas no artigo 611-A da CLT, onde a coação, fraudes, vícios de consentimentos não serão incomuns.
Neste sentido, observa-se a existência de inúmeros fatores que poderão contribuir para que o empregado anua tais renúncias, onde a necessidade do emprego e do recebimento dos salários está acima do cumprimento de seus direitos e de sua qualidade de vida.
O artigo 611-A, que enumera os dispositivos que poderão ser objeto de negociação, traz itens que caso sejam inobservados, trarão consequências diretas na qualidade de vida dos empregados, como exemplo, citamos a possibilidade do empregado se submeter a jornadas de 10 (dez) horas diárias (inciso I); a redução do intervalo intrajornada para trinta minutos (inciso III); troca do dia de feriado (inciso XI); e prorrogação de jornada em locais insalubres (inciso XII).
Além das consequências na qualidade de vida, o empregado estará sujeito à uma verdadeira renúncia e disponibilidade de seus direitos, pois o mencionado artigo traz também a possibilidade de negociação da remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual (inciso IX); modalidade de registro de jornada de trabalho (inciso X); enquadramento do grau de insalubridade, afastada a licença prévia das autoridades competentes (inciso XII); e participação nos lucros ou resultados da empresa (inciso XV).
Observa-se que, em nenhum momento foi mencionado quaisquer parâmetros mínimos a serem respeitados, em total afronta aos princípios e garantias constitucionais.
Os direitos trabalhistas previstos em lei são indisponíveis, isto é, são irrenunciáveis e intransacionáveis pela sua característica pública. O valor do salário recebido pelo empregado não altera a natureza jurídica do direito. Entender que os empregados que recebem mais que R$11.063,00 podem livremente dispor sobre os direitos trabalhistas relacionados no artigo 611-A da do PL é negar a vulnerabilidade do trabalhador, que depende do emprego para sobreviver e, com relativa facilidade, concordaria com qualquer ajuste para manutenção do emprego. O valor do salário do empregado não exclui a relação de emprego e não diminui a subordinação do empregado ao patrão. O estado de vulnerabilidade permanece independentemente do valor auferido. O que muda é o nível social. Assim, o artigo deve ser suprimido. (Cassar, 2017, p. 22)
Não bastasse a excepcionalidade do mencionado dispositivo, a reforma trabalhista incluiu, ainda, o artigo 507-A, que autoriza a fixação de cláusula compromissória de arbitragem, em caso de demanda trabalhista, desde que por iniciativa do empregado ou com sua concordância expressa.
Importante ressaltar a existência de uma diferença “teórica” entre o artigo 444, parágrafo único, e o artigo 507-A, a qual, apenas o primeiro, exige que o
empregado seja possuidor de diploma de nível superior. Este fato pode ser interpretado como uma maior proteção pretendida pelo legislador para a negociação das disposições do contrato, pois o empregado teria maior discernimento.
Contudo, na prática certamente terá outra realidade, pois é difícil acreditar que o empregado que perceba duas vezes o limite máximo da Previdência Social não será portador de diploma de curso superior, ainda mais, com a crescente expansão do ensino pelo país.
Haverá grande controvérsia judicial a respeito, haja vista que, em casos análogos, a Justiça do Trabalho não aceitou essa forma alternativa de solução de conflitos por entender que os créditos trabalhistas se inserem no contexto dos direitos indisponíveis, matéria infensa à arbitragem conforme disposto na Lei 9.307/1996. (Silva, 2017, p. 70)
De plano, o legislador registra que a deflagração do procedimento arbitral deve ser feita por iniciativa do empregado, mas ninguém duvida da vulnerabilidade a que ele estará exposto durante e, sobretudo, após a vigência do contrato de trabalho. Dificuldades com a recolocação no mercado, pressa para o recebimento de seus haveres ou simplesmente pressão exercida pelo empregador evidentemente serão gatilhos simples para ele pedir a instalação do procedimento de arbitragem. Processos trabalhistas com alegação de vício de consentimento na fixação da cláusula ou, depois, no acionamento do procedimento, não causarão espanto. (Silva, 2017, p. 97)
Destarte, este dispositivo, novamente, afeta gravemente o conceito de direitos indisponíveis, uma vez que não se admite a exclusão do judiciário, como forma de solução dos conflitos, entendimento expressamente previsto pelo artigo 1° da Lei n° 9.307/96 (Lei de Arbitragem).
Pensamos que, na verdade, a discussão mais complexa residirá na definição do que sejam direitos indisponíveis. Como se sabe, esta classe de direitos não podem se submeter a formas alternativas de solução de conflitos, por entender que eles não são passiveis de negociação, renúncia ou transação. Essa ressalva não é apenas doutrinária como parece explícita no art. 1° da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996). O entendimento majoritário no âmbito trabalhista vai no sentido de que os créditos do empregado são irrenunciáveis –e, portanto, imunes a atos unilaterais dos empregados ou a acordos extrajudiciais não revestidos de formalidade –mas não chegam ao patamar do indisponível –pois, do contrário, nem ao menos poderia haver
prescrição trabalhista ou acordo judicial, com ou sem concessões recíprocas. É como se a irrenunciabilidade, tão estuda pelos tratadistas juslobaris, estivesse num degrau abaixo ou numa dimensão de menor densidade da indisponibilidade muito cara aos direitos da personalidade, por exemplo. (Silva, 2017, p. 98)
Por ora, não haveria tantos espaços adequados para a comunicação e o entendimento entre as partes espalhados pelo país, diante da demanda elevada que se projeta. A experiência traumática das Comissões de Conciliação Prévia deixa no ar a dúvida se nossa sociedade terá realmente terá condições de desenvolver câmaras de arbitragem idôneas e imparciais. O que se viu, à época da Lei 9.958/2000 (arts. 625-A e seguintes da CLT), foi um descalabro: acusações de cobranças excessivas e imposições de taxas, uso de textos com frases de duplo sentido, pressão por acordos fora ou além dos pedidos e assim por diante. O Ministério Público do Trabalho chegou a montar operações especiais de combater a fraudes de câmaras arbitrais, tendo obtido êxito no fechamento, via judicial, de várias delas. Até mesmo uso de brasão com as armas da República era flagrado em alguns espaços de arbitragem, além daqueles profissionais que se chamavam de juízes para tentar impressionar e se vestiam com trajes forenses. Aflige saber que pouca coisa mudou no país em termos de ética e de transparências nesses anos que se passaram desde o malogro das CCPs – Comissões de Conciliação Prévia, de sorte que afora os temas da aplicação da arbitragem sobre o direito individual do trabalho, também será importante acompanhar o grau de maturidade e de profissionalismo dos espaços abertos – e certamente muitos serão inaugurados – para o desenvolvimento da arbitragem trabalhista. (Silva, 2017, p. 99)
Ademais, em decorrência desta flexibilização das normas trabalhistas, há uma enorme discussão em que se chegou a afirmar, inclusive, um possível “sepultamento” do princípio protetor e da norma mais favorável.
Xxxxxxx Xx, referenciando Xxxxxxx Xxx, afirma que a proteção jurídica favorável é para compensar a desigualdade econômica. E, mencionando Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx, aduz que a igualdade, preconizada pelo Direito Comum para os sujeitos das relações jurídicas, tornar-se-ia utópica em virtude da deformação que o poder econômico de um provocaria na manifestação de vontade do outro. Assim, firmou-se o preceito fundamental que dá o traço mais vivo do Direito do Trabalho: o amparo da debilidade econômica do empregado com a proteção jurídica favorável. (Xxxxxxx Xxxxxx, 1999)
Desta forma, o princípio da proteção é corolário da isonomia, princípio constitucional, previsto no artigo 5º, caput, que se configura como pilar de sustentação de qualquer Estado Democrático de Direito, não podendo ser admitida a validade de uma norma que permita a ocorrência de prejuízos aos direitos dos empregados, estabelecendo de tal forma a perca da eficiência e razão de existir dos princípios do direito do trabalho, resultando, na verdade, em um retrocesso a proteção conquistada em décadas.
4 INCONSTITUCIONALIDADES
Os artigos 444, parágrafo único, e 507-A, ambos da CLT, trazem grandes inovações ao direito do trabalho, permitindo a livre negociação das cláusulas contratuais, entre empregado e empregador, em verdadeira autonomia de suas vontades.
Entretanto, na prática tal liberdade de negociação poderá ser facilmente fraudada, trazendo inúmeros prejuízos aos empregados e desrespeito aos princípios do direito do trabalho e direitos fundamentais constitucionais.
A proposta do art. 444, parágrafo único, é bem ambiciosa: objetiva autorizar que as partes, em contrato individual, possam fazer a mesma negociação estabelecida entre sindicatos ou sindicatos e empregadores. Daí por que o dispositivo refere expressamente o art. 611-A da CLT. Por exemplo, a prevalecer o art. 444, parágrafo único, o empregado pode assinar sozinho a cláusula de redução do intervalo para refeição, a alteração do grau de insalubridade e a prorrogação de jornada em ambiente insalubre, para ficar em alguns dos incisos da longa lista do art. 611-A. redução salarial, apesar de ser contemplada no art. 611-A, é matéria de uso restrito das negociações coletivas, segundo o art. 7°, VI, da CF, de modo que mesmo com a ênfase do legislador ordinário isso não será possível no âmbito do contrato individual. Também é de duvidosa constitucionalidade a redução do grau de adicional de insalubridade, dentre outros pontos vulneráveis do art. 444, parágrafo único. (Xxxxx, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx da, 2017, p. 70/71)
O direito adquirido, garantido pelo artigo 5°, XXXVI, da CF, também será atingido, tendo em vista que os artigos 444, parágrafo único, e 507-A já estão em vigor, inclusive, para os contratos celebrados anteriormente a reforma trabalhista, inteligência do artigo 2° da Medida Provisória 808/17.
Assim, o empregado com contrato em vigência, dispondo de inúmeros benefícios concedidos por negociação coletiva, poderá ter reduzidos seus direitos a partir da nova regra, que além da inconstitucionalidade, afronta o artigo 468 da CLT, que dispõe ser nula a alteração contratual em desfavor do empregado.
Além disso, o artigo 444, parágrafo único, se mostra inconstitucional, ao afrontar o princípio da norma mais favorável disposto pelo artigo 7° caput da CF, ao permitir que a negociação individual se sobrepõe à lei e as negociações coletivas de trabalho.
Outro princípio afetado pelo artigos 507-A da CLT, se verifica no princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5°, XXXV, da CF, pois se mostra inconstitucional a pacto de cláusula compromissória de arbitragem, outorgando à decisão obtida, status judicial.
O princípio da inafastabilidade da apreciação judicial, consagrado pelo art. 5°, XXXV, da CF, tende a ser, também ele, um obstáculo severo ao incremento da arbitragem no direito do trabalho. Ele já foi utilizado para combater as CCPs – Comissões de Conciliação Prévia e outros modelos extrajudiciais de solução de conflito. Mas o STF aos poucos o adaptou para dizer que comporta exceções, como no direito desportivo, e que, de toda sorte, também, a arbitragem fica sujeita ao crivo judicial, apesar de limitada a discussão a questões de forma e de consentimento, e não a questão de fundo. (Silva, 2017, p. 99/100)
Submetendo a solução do litígio a juízo arbitral, mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral, não se abre mão do direito de ação; apenas se autoriza a opção por uma jurisdição privada. (Lenza, 2016, p. 1219)
Além da manifesta inconstitucionalidade, esta solução alternativa dos litígios, se mostra mais onerosa em termos financeiros, onde os preço atualmente são muito além da justiça do trabalho, e o artigo não trata de quem será a responsabilidade deste pagamento.
Outrossim, observa-se uma defasagem aos direitos sociais, dispostos no art. 6° da CF, haja vista o desrespeito ao direito ao trabalho digno, a saúde, lazer, dentre outros, que garantem que o cidadão tenha o mínimo de qualidade de vida.
O direito ao trabalho “trata-se, sem dúvida, de relevante instrumento para implementar e assegurar a todos uma existência digna, como estabelece o art. 170, caput. O Estado deve fomentar uma política econômica não recessiva, tanto que,
dentre os princípios da ordem econômica, sobressai a busca do pleno emprego (art. 170, VIII). Aparece como fundamento da república (art. 1°, IV) e a ordem econômica, conforme os ditames da justiça social, funda-se na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa.” (Lenza, 2016, p. 1300)
Por conseguinte, nota-se que os artigos 444, parágrafo único, e 507-A, ambos da CLT, estão repletos de inconstitucionalidades e afrontas aos princípios do direito do trabalho, conforme exposto por todo o presente trabalho.
5 CONCLUSÃO
O estudo da reforma trabalhista ainda está longe de ser concluída, onde se tem muitas informações de sua ocorrência na prática, e litígios judiciais envolvendo as questões. O que se tem, até o momento, é um grande apoio pela doutrina e pelos juristas protecionistas, que se mostram preocupados com inúmeros pontos da reforma.
Por outro lado, é inegável a necessidade que a sociedade moderna tinha de uma reforma no âmbito trabalhista, no entanto, o legislador trouxe uma flexibilização das normas, e, consequentemente, uma desproteção do empregado pelo Estado.
A questão da vulnerabilidade se agrava pelo fato de que o país passa por uma da piores crises econômicas e políticas já vivenciadas, com uma instabilidade do mercado, e consequente aumento do número de desempregados.
Desta forma, com a desproteção do Estado, aumentam-se sa possibilidades do empregado “aceitar” as negociações realizadas, ou determinadas pelo empregador, que possui o controle do capital, em verdadeira renúncia de direitos.
Tal fato, poderá ocorrer por inúmeros fatores, seja a dificuldade de recolocação no mercado de trabalho, pressão por parte do empregador, e, principalmente, a necessidade de perceber renda, a fim de prover seu sustento e de sua família.
Por fim, diante das inúmeras inconstitucionalidades, não apenas aos artigos mencionados, mas como em toda a reforma trabalhista, esperamos sérias atitudes dos juízes ao depararem com tais situações, e, especialmente, do STF, que provavelmente irá enfrentar o tema em breve.
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