UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE DIREITO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
LIMITES ENTRE O DESCUMPRIMENTO DE UM CONTRATO VERBAL E A
RUPTURA IMOTIVADA DAS NEGOCIAÇÕES: tutela da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
LIMITES ENTRE O DESCUMPRIMENTO DE UM CONTRATO VERBAL E A
RUPTURA IMOTIVADA DAS NEGOCIAÇÕES: tutela da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção de grau de Mestre em Direito pelo Programa de Pós- Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Xxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx.
Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
LIMITES ENTRE O DESCUMPRIMENTO DE UM CONTRATO VERBAL E A
RUPTURA IMOTIVADA DAS NEGOCIAÇÕES: tutela da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos
Dissertação apresentada como requisito parcial de grau de Mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
BANCA EXAMINADORA:
Professor Doutor Xxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx (orientador) Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Professor
Professor
Professor
Conceito:
Porto Alegre, de de 2019.
AGRADECIMENTOS
O Mestrado foi, desde o primeiro dia, a ressignificação do que eu entendia por luta, persistência e enfrentar os próprios medos. Então aproveito esse espaço, em que a terceira pessoa dá espaço à primeira, para agradecer a tudo e a todos e, principalmente, enaltecer alguns nomes que foram indispensáveis para que completasse a jornada do Mestrado na tão sonhada Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Quando se busca alcançar um sonho tão longe do lugar onde você foi criada, muitos nomes vem à mente e espero não esquecer de nenhum.
Primeiramente, agradeço à minha amada família. À minha mãe, meu anjo na Terra, por ser meu ponto de equilíbrio e por repetir todos os dias que tudo ia dar certo quando eu me desesperava e não via uma saída. Ao meu pai, por acreditar incondicionalmente na minha capacidade, obrigada por ser minha inspiração e fonte de sabedoria e caráter. Ao meu irmão, o ser humano mais lindo que eu conheço e que tanto me ensina com seu coração puro, obrigada por ser sempre meu porto-seguro.
Aos meus amigos de Uberlândia, não há palavras suficientes para agradecer. Minha amiga Xxxxx, muito obrigada. A sua capacidade de confiar em mim e seus conselhos certeiros, de só quem conhece o outro saber dar, me fizeram chegar longe. Obrigada por ter sido a mão que me guiou até esse Mestrado. Obrigada por ser minha dose diária de humor, minha guia, mentora e por ser minha irmã de alma. Agradeço à minha amiga Xxxx por tanta torcida em cada novo projeto que eu embarco, por acreditar fielmente que eles vão dar certo e por ter me ensinado a ser guerreira e dedicada aos nossos sonhos. Ao meu amigo Xxxxxx, obrigada por ser um ser humano fantástico e por se dobrar em mil para ajudar aqueles que você ama. Obrigada pela sua ajuda nas longas horas que passamos na revisão desse trabalho, sem você eu não teria conseguido. Às minhas amadas Xxxxx, Xxxxx, Xxxxxxx e Xxxxxxx, obrigada pelo amor e carinho de tantos anos. A todas as pessoas e amigos de Uberlândia que tanto torceram por mim, o meu muito obrigada.
Porto Alegre me presentou com tantas pessoas incríveis. Minhas meninas, Xxxxxxx e Xxxxxxx, por serem as melhores companhias que eu poderia ter encontrado para começar minha jornada no Sul. Xxxxxxxx à Lauri, Xxxxx e todo o carinho recebido durante o estágio no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, pela Paula, Xxxxx, Xxxxxxxx, Xxxxxx e Desembargadora Xxx Xxxx.
Agradeço aos meus amigos Xxxx e Xxxx pelo companheirismo, pela força e pelo apoio nas longas de biblioteca durante esse último semestre decisivo. Vocês foram indispensáveis para que esse trabalho fosse concluído.
Xxxxxxxx os colegas que fiz no Mestrado e na UFRGS, pessoas que levarei sempre no coração. Obrigada pelas risadas, por me permitir aprender com vocês e por ter sido recebida com tanto carinho. Xxxxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxxxx, Xxxxxxxxx, Xxxxx, Xxxxxxxx, Xxxxx, Xxxxxxx, Xxxxxxx, Xxxxxxx, Xxxxxx, Xxxxxx, Xxxxxxxxx, Xxxxxxxx, Xxxxxxx e todos os colegas do NEF.
Meu agradecimento, em especial, ao Dr. Xxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx, meu orientador de monografia da Universidade Federal de Uberlândia, por ter me guiado durante todo o processo seletivo da UFRGS e por ter sido certeiro nas indicações bibliográficas e nos conselhos acadêmicos.
Ainda, agradeço aos apontamentos feitos pela banca de qualificação, composta pelos professores Xxxxxxx Xxxxx, Xxxx Xxxxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxxx, cujas contribuições foram indispensáveis para a versão final deste trabalho.
Por fim, agradeço ao meu orientador Xxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx. Obrigada pela paciência, pela humildade científica, por conduzir a profissão da docência com maestria e por sempre encontrar disponibilidade para compartilhar seus ensinamentos e reflexões. É uma honra e um sonho realizado carregar o seu nome no meu trabalho.
“I trust you, and trust becomes a powerful tool for our working our mutual wills in the world.”
XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation. Harvard University Press. Cambridge, Massachussets and London, England.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo analisar os limites entre o descumprimento de um contrato verbal e a ruptura imotivada das negociações ante a perspectiva da tutela da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos. A pesquisa justifica-se na dificuldade encontrada pela doutrina e jurisprudência para identificar em quais casos seria hipótese de descumprimento de contrato não solene ou rompimento imotivado das negociações. Nesse contexto, o primeiro capítulo analisa historicamente o instituto da proteção da confiança na formação dos contratos, traçando o renascimento do contrato como fonte de obrigações, desde o contractus aos nuda pacta. Ainda, buscam-se examinar os limites da Teoria Geral dos Contratos para proteção dos contratantes nos contratos não solenes, destacando a tradição moral tomista-aristotélica, os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé e a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação. Já o segundo capítulo tem por objeto a análise da ruptura imotivada das negociações a partir da compreensão dos aspectos históricos da responsabilidade pré-contratual e dos critérios para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento do contrato verbal. Ao final, apresentam-se como possíveis conclusões o fato de que a relação jurídica pré-contratual faz surgir deveres de conduta para as partes, decorrentes do princípio da boa-fé, a serem observados durante as negociações e que é possível no ordenamento brasileiro, mediante certos elementos de configuração, a responsabilização civil do contraente que rompe imotivadamente as negociações contratuais.
Palavras-chave: Ruptura imotivada das negociações; Descumprimento de contrato verbal; Proteção da confiança; Responsabilidade pré-contratual; Teoria Geral dos Contratos.
ABSTRACT
This essay deals with the limits between the breach of a verbal contract and the break off of negotiations in the perspective of trust protection in precontractual phase and in contract formation. The research is justified by the difficulty found in doctrine and jurisprudence to identify in which cases it would be a hypothesis of a non-solemn contract breach or a break off of negotiations. In this context, the first chapter historically analyzes the institute of trust protection in contract formation, outlining the resurgence of the contract as a source of obligations, from the contractus to the nuda pacta. In addition, this study seeks to examine the limits of the General Theory of Contracts for contractor’s protection in non- solemn contracts, highlighting the Thomist-Aristotelian moral tradition, good faith’s lateral duties of behavior and binding legal relationship as a cooperative duty. The second chapter aims to analyze the breaking off of negotiations by understanding the historical aspects of precontractual liability and the criteria to distinguish the breaking off of negotiations from the breach of verbal contract. At the end, it is possible to conclude that the precontractual legal relationship raises behavioral duties for the parties, arising from the principle of good faith, to be observed during the negotiation period and that it is possible in Brazilian law, through certain elements of configuration, the civil liability of the contractor who breaks off of negotiations.
Keywords: Breaking off of negotiations; Breach of verbal contract; Protection of trust; Precontractual liability; General Theory of Contracts.
SUMÁRIO
1 PROTEÇÃO DA CONFIANÇA NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS 15
1.1 Do contractus aos nuda pacta: renascimento do contrato como fonte de obrigações 16
1.1.1 Conceito de contrato no direito moderno e no direito romano 16
1.1.2 Stipulatio: contrato verbal por excelência 21
1.1.3 A evolução do conceito de pactum: nuda pacta e pacta uestita 22
1.2.1 A tradição moral tomista-aristotélica e a eficácia vinculativa das promessas 28
1.2.2 Deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé 39
1.2.3 Relação jurídica obrigacional como relação de cooperação 47
2 RUPTURA IMOTIVADA DAS NEGOCIAÇÕES: no limbo entre direito contratual e responsabilidade civil 52
2.1 A ruptura imotivada das negociações no quadro da responsabilidade pré-contratual 53
2.1.1 Ruptura imotivada vs ruptura motivada 56
2.1.3 Responsabilidade contratual ou extracontratual: prescrição 68
2.2.1 Tratativas ou negociações preliminares 72
2.2.2 Contrato preliminar ou contrato-promessa 79
INTRODUÇÃO
A pesquisa propõe-se a analisar os limites entre o descumprimento de um contrato verbal e a ruptura imotivada das negociações. As dificuldades encontradas pela doutrina em identificar em quais casos seria hipótese de descumprimento de contrato não solene ou rompimento imotivado das negociações, por si só, justifica a relevância desta investigação jurídica.
Diante disso, o estudo busca examinar a proteção da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos. A noção de confiança em questão remete a um certo padrão de conduta que devem seguir os candidatos a contratante, assim como também é observado quando as partes se encontram adstritas ao contrato.
A ideia de que o instituto contrato não conseguiria manter forma e conteúdo rígidos, uma vez que deve se adaptar à realidade do corpo social em que está inserido, foi fomentada por doutrinadores norte-americanos, tal como o autor Xxxxx Xxxxxxx, um dos líderes do Contract is Dead movement1.
Xxxxxxx sustenta ao criticar a chamada teoria clássica norte-americana, que tinha dificuldade em identificar que as transformações sociais provocavam alterações no Direito Contratual exprimiu discurso até certo ponto provocativo de que os juristas contemporâneos devem analisar o contrato sob uma ótima sociológica, ao invés de se preocuparem com as análises históricas e filosóficas:
[...] o contrato, por estar morto, não é mais um assunto que vale a pena ser estudado. Estudantes de direito deveriam ser dispensados da realização de exercícios ultrapassados sobre a teoria da consideration. Juristas deveriam, pelo fato de a morte já ter sido registrada, direcionar suas atenções para outro lugar. Eles deveriam, como é dito, observar o cenário atual e descrever sobre o que eles estão vendo. Eles deveriam se empenhar em análises sociológicas mais do que em sínteses históricas ou filosóficas.2
1 Xxxxx Xxxxxxx foi um dos mais relevantes nomes a escrever sobre o fenômeno da “morte” do instituto contrato e fazia parte do Contract is Dead movement, algo como Movimento Contrato está Morto (tradução livre). Ver em: XXXXXXX, Xxxxx. The Death of contract. 2 ed. Columbus: The Ohio State University Press, 1995.
2 XXXXXXX, Xxxxx. The Death of contract. 2 ed. Columbus: The Ohio State University Press, 1995, p. 1. Tradução livre. No original: “Contract, being dead, is no longer a fit or worth while subject of study. Law studentes should be dispensed from the accomplishment of antiquarian exercises in and about the theory of consideration. Legal scholars should, the fact of death having been recorded, turn their attention elsewhere. They should, it is said, observe the current
Diante deste cenário, situa-se a pesquisa acerca do rompimento preliminar de contratos e obrigações sob uma ótica adaptada à realidade social e às relações negociais contemporâneas, apresentando-se de modo crítico uma situação dúbia da realidade, porém apresentada de um modo geral pela doutrina como se fosse clara e imune a dúvidas.
De fato, há a necessidade de estudar a formação dos contratos, passando por todos os seus modelos, conteúdos e formas, a fim de encontrar um parâmetro em que a problemática da pesquisa possa ser inserida e compreendida.
Conexo à sistemática da formação dos contratos, o estudo preocupa-se em analisar a proteção da confiança, relacionando o surgimento do instituto com a influência do princípio da boa-fé objetiva. Insta salientar que o princípio da boa-fé será objeto de análise neste estudo na primeira parte do trabalho, mister no que se refere aos deveres laterais de conduta decorrentes do princípio. Este, então, servirá como um dos referenciais teóricos da pesquisa e sua aplicação como fonte de deveres jurídicos secundários e anexos ou instrumentais,3 visto que é cânone de interpretação dos negócios jurídicos e limite ao exercício dos direitos subjetivos.
O princípio da boa-fé será, então, norteador para apontamentos do primeiro capítulo, o qual abordará a proteção da confiança na formação dos contratos e das relações obrigacionais. Além disso, o princípio da boa-fé objetiva é também analisado na segunda parte do estudo, no que diz respeito à responsabilidade civil pré-contratual, em que um motivo considerado justo para o rompimento das negociações seria aquele em consonância com a boa-fé objetiva4.
scene and write down a description of what they see. They should engage in sociological analysis rather than in historical or philosophical synthesis.”
3 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. Boa fé no direito privado. São Paulo: XX, 0000, p. 437.
4 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 299. Importante destacar o que a autora Xxxxxx Xxxxx Xxxxx salienta sobre o assunto: “Em sede de responsabilidade pré-contratual, entende-se como motivo justo aquele em harmonia com a boa-fé objetiva e, em tese, apto a justificar o abandono das negociações, ainda quando a certeza de que o contrato seria concluído surgiu para uma das partes que, em função disso realizou despesas buscando a concretização do negócio.”
Importante ressaltar que a responsabilidade pré-contratual foi reconhecida na jurisprudência de âmbito nacional no início do século XX, quando o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou o primeiro caso de responsabilidade decorrente de rompimento injustificado das negociações5. Contudo, o primeiro caso de grande relevância para a doutrina é o caso dos tomates, julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em 1991, tendo como relator o Desembargador Xxxxxx xx Xxxxxx Xxxxxx.
Trata-se o referido caso de uma ação de indenização movida por agricultores em face da Companhia Industrial de Conservas Alimentícias (CICA), a qual realizava a doação de sementes para a posterior aquisição de tomates e industrialização. Todavia, em 1988, sob a alegação de mudança na política da empresa, a CICA não adquiriu a produção dos agricultores mesmo após a doação das sementes, como era de costume. Assim, colaciona-se a ementa do julgado
591.028.295 – Rel. Des. Xxxxxx xx Xxxxxx Xx. Julgado em: 06.06.1991)6
O caso foi então aclamado pela doutrina por verificar, de modo pioneiro, a incidência do princípio da boa-fé objetiva na fase pré-contratual.7 Desse
5 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, x. 000.
0 XXX XXXXXX XX XXX. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 591.028.295. 2 ª Câmara Cível. Relator Des. Xxxxxx xx Xxxxxx Xx. Porto Alegre, em 06 de junho 1991. Disponível em:
<xxxxx://xx-xx.xxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxxx/0000000/xxxxxxxx-xxxxx-xx-000000000-xx-xxxx>. Acesso em: 25 nov. 2018.
0 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 254. Importante destacar que, com o caso em questão, “reconhece-se pela primeira vez na jurisprudência o
modo, o princípio da boa-fé o dever de lealdade é capaz de suscitar na outra parte a justa expectativa de celebração de um certo em negócio. Além disso, devem ser observadas as condutas realizadas nos períodos antecedentes à formalização ou conclusão do contrato para que, no caso de comportamento ilícito, seja possível mensurar a responsabilidade pelos danos causados a outra parte.
Desse modo, o estudo busca verificar se a proteção da confiança imputa deveres no período que antecede ao contrato e estabelecer os limites capazes de identificar o descumprimento de um contrato não solene ou ruptura imotivada das negociações.
A questão envolvendo os contratos não solenes, que são aqueles que possuem forma livre, tangencia o tema da pesquisa no ponto em que a ausência de forma fixa também gera obrigações. Isso porque, o artigo 107 do Código Civil brasileiro de 2002 dispõe que: “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.”8. Assim, se a ausência de forma especial não impede que princípios e institutos direcionem o comportamento das partes, o mesmo pode ocorrer no período em que há apenas as negociações preliminares.
Ante a perspectiva de que o período preliminar ao contrato gera obrigações, surge a problemática entre segurança jurídica e justiça, tangenciando o conflito entre a aplicação de um entendimento estável dentro da sistemática do ordenamento jurídico e o que é considerado a solução mais justa ao caso concreto.
De um lado, a segurança jurídica, instituto ungido de formalidade e estabilidade encontrada nas normas e princípios que regem o ordenamento, a fim de trazem o caráter imutável às relações; e do outro, ideais de justiça, com sua visão, por muitas vezes, mais condizente à realidade social no qual está a decisão inserida.
Assim, a pesquisa tem por escopo suprir lacunas contratuais existentes na doutrina atual brasileira e construir uma reflexão teórica-prática acerca da
princípio da boa-fé objetiva como fundamento da responsabilidade pré-contratual em época sequer positivado como princípio geral no direito brasileiro.”
8 “Artigo 107 - A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.” Em: BRASIL. Lei 10.406, de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxx/0000/x00000.xxx Acesso em: 20 dez. 2018.
proteção da confiança9, a fim de criar noções reguladoras nas relações em que as partes estão adstritas.
Para tanto, almeja-se dividir o trabalho em duas partes, uma relacionada à construção da proteção da confiança na formação dos contratos e outra relacionada a realizar um estudo sobre a ruptura imotivada das negociações, no limbo entre o Direito contratual e a responsabilidade civil, elencando os limites entre o descumprimento de um contrato verbal e o rompimento injustificado das negociações.
A primeira parte busca analisar historicamente o instituto da proteção da confiança na formação dos contratos. Para tanto, far-se-á uma breve diferenciação entre os conceitos de contrato no direito moderno e no Direito Romano. Ainda, procura examinar quando o acordo de vontade gera obrigações, analisando a figura do contractus, dos contratos verbais e consensuais e por fim, dos pactos (nuda pacta).
Em um segundo ponto, o estudo se pautará na análise dos limites da teoria geral dos contratos para a proteção dos contratantes nos contratos não solenes. Busca-se analisar esses limites dentro da noção da tradição moral tomista-aristotélica e a eficácia vinculativa das promessas, destacando os elementos constitutivos da proteção da confiança, os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé objetiva, a proteção das expectativas legítimas das partes que pretendem contratar e, por fim, a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação.
A segunda parte tem por objeto o aprofundamento nos aspectos históricos da responsabilidade pré-contratual, com fulcro na estreita relação que este instituto guarda com o pensamento do direito germânico. A ruptura imotivada das negociações será tratada sob a ótica da responsabilidade pré- contratual, destacando as diferenças e os efeitos encontrados na ruptura motivada e na ruptura imotivada, ou seja, sem motivo justo. Adiante, procura-se examinar o dano e indenização sob a ótica da ruptura imotivada das negociações e, por último, a figura da prescrição será analisada na ótica da responsabilidade contratual ou extracontratual.
9 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002.
Para tanto, será necessário traçar a importância das construções jurídicas elaboradas por Xxxxxx Xxx Xxxxxxx, em sua teoria da culpa in contrahendo e após, pelas ideias modificadas pelo jurista Xxxxxxxx Xxxxxxxx, este sendo o autor pioneiro a considerar o período das tratativas negociais como juridicamente relevante.
Após a compreensão de tais premissas teóricas, passa-se a analisar o rompimento imotivado das negociações no âmbito dos elementos que circunscrevem as proposições sobre a responsabilidade pré-contratual.
Por fim, o último tópico preocupa-se em elencar critérios para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento do contrato verbal. Para tanto, os referidos critérios a serem examinados são aqueles que guardam similitudes em suas descrições e geram dificuldade de delimitação pela doutrina e jurisprudência, que são as tratativas ou negociações preliminares, contrato preliminar ou contrato-promessa.
Assim, o presente estudo pretende contribuir para caracterizar a responsabilidade pela ruptura imotivada das negociações no ordenamento jurídico brasileiro, permitindo que os institutos dialoguem com a evolução da ciência jurídica e com a realidade social na qual estão inseridos.
A fim de que a pesquisa se realize com sucesso, alguns padrões metodológicos deverão ser seguidos. O estudo será baseado na análise de artigos, publicações de revistas jurídicas e livros de diversos autores, além da pesquisa jurisprudencial, a qual se torna indispensável ao justificar o estado da discussão em Tribunais brasileiros.
Para melhor compreender os conceitos abordados nos textos a serem estudados, técnicas interpretativas-sistemática e teleológica serão utilizadas. No que se refere à doutrina, serão também analisadas fontes secundárias por meio da análise interpretativa de textos. Além disso, o trabalho será desenvolvido utilizando-se do método dedutivo e hipotético-dedutivo, por intermédio da pesquisa técnico-bibliográfica.10
10 FINCATO, Xxxxxx Xxxxx. A pesquisa jurídica sem mistérios: do projeto de pesquisa à banca.
Porto Alegre: Notadez, 2008, p.184.
1 PROTEÇÃO DA CONFIANÇA NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS
Durante o desenrolar das negociações, as partes estabelecem entre si uma relação contratual, a qual se estreita com a troca de informações e pelo contato pessoal mais intenso. Por consequência, as partes, após determinado lapso temporal e ultrapassada a fase inicial das tratativas, acabam por depositar confiança e expectativa de que o contrato entre elas será celebrado. Assim, observa-se que a presença da confiança na conclusão do contrato está diretamente relacionada com o maior emprego de tempo de dinheiro nas negociações preliminares11.
Desse modo, este capítulo busca analisar historicamente o instituto da proteção da confiança na formação dos contratos. Para tanto, far-se-á uma breve diferenciação entre os conceitos de contrato no direito moderno e na tradição derivada do Direito Romano. Ainda, procura examinar quando o “acordo de vontades” gera obrigações, analisando a figura do contractus, dos contratos verbais e consensuais e por fim, os pactos (nuda pacta).
Em um segundo ponto, o estudo pautará os limites da Teoria Geral dos Contratos para a proteção dos contratantes nos contratos não solenes. Busca- se analisar esses limites dentro da noção da tradição moral tomista-aristotélica e a eficácia vinculativa das promessas, ressaltando a ideia de fidelidade à palavra empenhada diante das propostas e promessas realizadas pelos candidatos a contratante no período das negociações. Ainda, busca-se estabelecer os limites para a proteção dos contratantes nos contratos não solenes, serão realizados apontamentos evolutivos e históricos da teoria geral dos contratos, desde os primeiros apontamentos realizados pelo direito romano, passando pelos juristas medievais e pela Escolástica tardia, até a teoria contratual moderna.
Por fim, como último ponto da primeira parte deste trabalho, faz-se um estudo sobre os elementos constitutivos da proteção da confiança, abordando os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé objetiva, a proteção das expectativas legítimas das partes que pretendem contratar e, também, uma
11 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 285.
análise sobre relação jurídica obrigacional como relação de cooperação entre as partes, destacando ideias de Xxxx Xxxxxx, Xxxxxx xx Xxxxx e Xxxxx, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx e Judith Martins-Costa.
Esse ponto do estudo busca padronizar as relações que se perfazem no período das negociações, garantir a confiança entre as partes e estabelecer as expectativas.
1.1 Do contractus aos nuda pacta: renascimento do contrato como fonte de obrigações
Busca-se, neste ponto, elencar alguns elementos que marcam as diferenças entre o conceito de contrato no direito moderno e na tradição do Direito Romano. Ao conceituar o contrato pelas duas propostas, propõe-se ao leitor identificar se o direito moderno guarda relação com o Romano e quando o acordo de vontade gera obrigações.
Ainda, analisam-se as figuras do contractus, da stipulatio, como sendo contrato verbal por excelências e por fim, os pactos (nuda pacta), destacando a evolução de seu conceito e retratando as figuras do nuda pacta e do pacta uestita.
Por fim, busca-se compreender que no Direito Romano nem todo acordo de vontade lícito gera obrigações, que é o que ocorre, diferente do contrato (contractus), com o pacto (pactum). Ainda, a máxima nuda pactio obligationem non parit, sed parit exceptionem12 será também objeto de análise, uma vez que uma maior compreensão sobre os “pactos nus” ajudará a responder a problemática da pesquisa.
1.1.1 Conceito de contrato no direito moderno e no direito romano
Propõe-se esse subtópico a diferenciar os conceitos de contrato no direito moderno e no Direito Romano, a fim de que se compreenda se a ótica
12 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 465.
dada pela Teoria Contratual Moderna guarda relação com os conceitos estudados pelo Direito Romano.
Diante da ideia de que o contrato é polissêmico, cabe destacar que o núcleo central é a existência de um elemento voluntário que cria obrigações, desse modo, autores clássicos possuem diferentes significações para a definição de contrato no direito moderno. Para Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, o contrato no direito moderno “é o acordo de vontade de duas ou mais pessoas que visa a constituir, a regular, ou a extinguir uma relação jurídica.13” O contrato é, na visão de Xxxx Xxxxx, “a veste jurídico-formal de operações econômicas14”, em que operação econômica é a substância real capaz de regular os interesses e situações de qualquer contrato. Xxxxxxx Xxxxx, por sua vez, identifica a moderna concepção de contrato como “acordo de vontades por meio do qual as pessoas formam um vínculo jurídico a que se prendem15.”
De fato, todo acordo de vontade tem a capacidade de alterar, criar ou extinguir obrigações. Segundo Xxxxxxx Xxxxx, no direito moderno o contrato é uma espécie de contrato em sentido amplo16, não se simplificam a serem meramente acordos de vontade que se destinam a criar relações jurídicas que se enquadram tipicamente, como categoria geral e que contrato e convenção (acordo de vontades) se confudem.
Enquanto isso, o Direito Romano não conheceu o contrato como categoria geral e abstrata uma vez que o direito subjetivo, como os modernos desenvolveram, não existia. De fato, “a tipicidade romana das actiones não comportava uma figura genérica a que se conduzissem, por subsunção, as espécies contratuais. Se o magistrado não admitia a actio para determinadas
13 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 469.
14 XXXXX, XXXX. O contrato. Tradução de Xxx Xxxxxxx e M. Januário C. Xxxxx. Coimbra: Almedina, 2009, p. 11.
15 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 7.
16 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, pp.
469.-70. O autor, quando se refere ao termo contrato está se referindo ao contrato obrigatório. Ele identifica que há contrato em sentido amplo (acordo de vontade de duas ou mais pessoas que visa a constituir, a regular, ou a extinguir uma relação jurídica em geral), e há o contrato obrigatório, que é o acordo de vontade de duas ou mais pessoas que se destina a criar, modificar ou extinguir uma relação jurídica obrigacional.
convenções, elas simplesmente não existiam como contratos; eram pactos nus (nuda pacta).17”
O elemento essencial capaz de distinguir as concepções de contrato no direito moderno e no Direito Romano é o consentimento, o qual é elemento nuclear do contrato moderno e apenas foi admitido nos tempos romanos em certos tipos de contrato celebrados por estrangeiros, pelo ius gentium, mediante ação concedida pelo pretor peregrino18.
Xxxxxxx Xxxxx salienta que a ideia de que todo acordo de vontade lícito pode gerar, modificar ou extinguir obrigações não ocorre no Direito Romano, uma vez que a noção de contrato (contractus) é considerada mais restrita19. O autor então identifica duas justificativas para a consideração: primeiro porque, no direito romano, só se enquadram nos contratos os acordos de vontade que visam a gerar relações jurídicas obrigacionais, e não a criar, regular ou extinguir como se observa no direito moderno. Segundo porque nem todo acordo de vontade lícito gera obrigações no direito romano; tanto o contrato (contractus) tanto o pacto (pactum, conuentio) eram acordos de vontade, todavia, aquele gerava obrigações e este não.
Xxxxx Xxxxxx, sobre a figura de contractus, declara que “sem dúvida, esta é uma classificação que abrange todas as obrigações possíveis. Por conseguinte, o contrato é qualquer ato jurídico do qual derivam as obrigações, excluindo os delitos.20”
O que se verificou, em razão disso, foi um “alargamento gradativo do círculo de acordos de vontade a que a ordem jurídica concede a eficácia de gerar obrigações”, sendo que dois exemplos bem demonstram esse fenômeno: os pacta, operações típicas celebradas paralelas aos contratos e que, por isso mesmo, eram destituídas de tutela processual, e, posteriormente, os contratos ditos inominados.
17 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 19.
18 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 19.
19 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, pp. 469.-70.
20 XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Barcelona: Casa Editorial Bosch, 1960, p, 446.
Tradução livre. No original: “Indudablement es ésta uma classificación que abarca todas la sobligaciones posibles. Coniguientemente, el contractus es todos acto jurídico del que derivan obligaciones, excluy én dose de el los delitos.”
Neste ponto, importante uma breve análise dos vocábulos contrahere e contractus21. O autor Xxx Xxxxxx identifica que contrahere “não se limita ao contrato, mas significa inicialmente toda a conduta geradora de responsabilidade ou – contraponde-se ao delito – toda a conduta permitida.22”
Xxxxxx, segundo Xxxxx Xxxxxx, contrahere faz referência, por regra geral, aos vocábulos de realizar e perpetrar e que “os autores devem ter cuidado ao acreditar que, em latim, a palavra contrahere significa principalmente ‘celebrar um contrato’.23” O autor identifica que alguns juristas clássicos usavam o termo em seu sentido amplo e que muitas vezes não abarcavam todas as situações suscetíveis à celebração de um contrato, como por exemplo as obrigações exdelicto24.
Xxxxxx, ao tratar das espécies de contractus, destaca a figura de contrahere como uma abordagem mais ampla das obrigações e contractus como um acordo capaz de criar uma obrigação:
Chegamos à conclusão de que embora a palavra contrahere ainda fosse usada em seu sentido mais amplo, contractus entre os juristas mais destacados do período clássico, significa por si só "contrato", isto é, um acordo reconhecido pelo ius civile e celebrado pelo partes para criar uma obrigação.25
21 Xxxxxxx Xxxxx cita o jurista italiano Xxxx (La Dottrina Del Contratto Nei Giuristi Romani dell’ Età Classica, in Scrittidi Diritto Romano in onore di Xxxxxxxx Xxxxxxx, p. 387, Milano, 1946) que bem analisou os vocábulos contrahere e contractus. Para ele, contrahere não significa concluir contrato, mas vir a ser parte de uma relação jurídica; enquanto que contractus indica negócios, que não são acordos de vontade, ou relações que não nascem de acordos de vontade; e que em alguns textos clássicos contractus designa relações jurídicas tuteladas por ações in factum, isto é pretorianas. Ver em: XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 470.
22 A figura de contrahere pode ser aplicada a delictum e crimen, à gestão de negócios sem mandato, à tutela e ao pagamento do indevido, todos esses diferem dos contratos obrigacionais. Sobre isso ver em: XXXXX, XXX. Direito Privado Romano. Trad. Xxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxxx. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p. 225.
23 Tradução livre. No original: “Les autores deben guardar se mucho de creer que em la lengua latina, la palabra contrahere significa primariamente ‘celebrar un contrato’”. XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Barcelona: Casa Editorial Bosch, 1960, p. 445.
24 O autor Xxxxx Xxxxxx faz referência ao fragmento 2, 14 do jurisconsulto Xxxx, que disse
:“Incorporales res sunt quae tangi non possunt qualia sunt... obligationes qu oquo modo contractae.” Ver em XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Barcelona: Casa Editorial Bosch, 1960, p. 445. Tradução livre. No original: “Incorpóreas são as que não podem ser tocadas, tais como são aquelas que consistem em direitos, como a herança o usufruto, as obrigações por qualquer modo contraídas.” Ver mais sobre em: CANDIDO, Austréia Magalhães. Da pessoa jurídica no direito romano. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 105, jan/dez 2010, p, 1029.
25 XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Casa Editorial Bosch: Barcelona, 1960, p. 448.
Tradução livre. No original: “Llegamospues a la conclusión de que aunquela palabra contrahere era usada todavia em suacepción amplia, contractus entre los juristas más destacados de la
Xxxxx Xxxxxxx menciona que, no direito justinianeu, se apontava uma nova tendência sobre fragmentos que visavam a diferenciar pacta legitima e nuda pacta, “nos quais eram contrapostos os verbos contrahere e distrahere e os substantivos contractue distractu, para acentuar-se que o contrato seria sempre produtivo (ou fonte) de obrigações.26
Diante da exposição de que o contrato (contractus) era um acordo de vontade capaz de gerar obrigações, Xxxxxxx Xxxxx possui visão crítica a essa concepção, tendo em vista que o contrato moderno contrapõe-se fortemente a noção de contrato do Direito Romano, marcado pela presença pública do pretor e pelo formalismo exacerbado.
A posição de Xxxxxxx Xxxxx, ainda no curso do século XX, quando predominava o discurso segundo o qual o contrato deriva do Direito Romano, tinha uma direção distinta, com se pode ver do trecho abaixo, no qual justifica a escolha de não buscar a origem histórica do contrato no direito romano:
Não é no direito romano que se deve buscar a origem histórica da categoria jurídica que hoje se denomina contrato, pois, segundo Xxxxxxxx, era um especial vínculo jurídico (vinculum juris) em que consistia a obrigação (obligatio), dependendo esta, para ser criada, de atos solenes (nexum, sponsio, stipulatio). É certo que o conceito sofreu alterações, e outros romanistas como Riccobono, sustentam que o contrato era o acordo de vontade, gerador de obrigações e ações, ou que na fase pós-clássica já se admitia que a origem das obrigações se encontrava na declaração da vontade das partes.27
Pelo menos até o tempo de Xxxxxxxxxx, o direito romano não considerou que todo acordo de vontade lícito pode gerar relações jurídicas obrigacionais e apenas esteve diante de contratos obrigatórios que criam obrigações. Confirma-se, assim, que o sistema contratual romano sofreu modificações e que houve um “alargamento gradativo do círculo de acordos de vontade a que a ordem jurídica concede a eficácia de gerar obrigações.28”
época clásica, significa propriamente “contrato”, o sea, um acordo reconocido por el ius civile y celebrado por las partes com elfin de crear uma obligación.”
26 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 8.
27 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 7.
28 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 471.
Adiante, passa-se a analisar o período clássico, em que os juristas conheciam apenas alguns tipos de contrato (contractus), ao invés de analisarem o contrato como uma categoria geral e abstrata.
1.1.2 Stipulatio: contrato verbal por excelência
Os contratos verbais são considerados “aqueles que se constituem mediante a prolação de palavras solenes29”, assim como explica Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx.
Segundo o autor, Xxxx salienta que as obrigações verbais30 são a que se celebram mediante um pergunta e uma reposta, o que pode ser verificado com stipulatio. A esse respeito, retira-se um fragmento do que foi explanado por Xxxxxxx Xxxxx:
Gaio alude a outras obrigações que podem contrair-se sem pergunta precedente (aliae obligationes quae nulla praecedente interrogatione contra hipossunt), isto é, que surgem apenas da declaração daquela das partes que quer obrigar-se (uno loquente): são elas a dotis dictio e a promissio iurata liberti, a respeito das quais muito pouco sabemos.31
Diante da afirmação de que as obrigações surgem apenas da declaração daquela das partes que quer se obrigar, Xxxxxxx Xxxxx diz que não há acordo de vontade (conuentio) e que, portanto, não se pode dizer que elas são verdadeiramente contratos (contractus)32.
De acordo com Xxx Xxxxx, na antiga concepção de contrato verbal (principalmente no que se refere à stipulatio) “vê como causa da obrigação exclusivamente a forma verbal ritual, que gera um efeito obrigacional mesmo se a obrigação não for verbal33.”
Segundo Xxxxx Xxxxxxx, o acordo de vontade poderia gerar obrigações caso estivesse aliado a uma causa civil34. Essa causa era vista por alguns
29 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497. 30 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497. Xxxxxxx Xxxxx refere-se a uerbis obligationes como obrigações verbais.
31 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497.
32 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497.
33 XXXXX, XXX. Direito Privado Romano. Trad. Xxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxxx. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p. 226.
34 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
romanistas como uma formalidade exterior, em que a stipulatio era considerada
“uma promessa feita em público, com o uso de palavras solenes.”35
1.1.3 A evolução do conceito de pactum: nuda pacta e pacta uestita
Neste ponto, busca-se analisar a figura de pacto (pactum, conuentio), mediante a noção de que o simples acordo de vontade não gera obrigação.
Nas palavras de Xxxxxxxx Xxxxxxxxxx, “uma obrigação poderia nascer tanto na base de certas estipulações formais entre as partes quanto da virtude de um ato real de entregar em mãos um objeto”.36 Com efeito, os juristas romanos eram capazes de conceder uma ação até para casos em que nada mais que um mero acordo era realizado. O referido acordo foi então denominado de contrato consensual37.
Diante da ausência de conceituação de contrato e de seu elemento essencial, a causa civil - a qual seria aliada do elemento vontade para que produzisse obrigações civis-, Xxxxx Xxxxxxx atesta uma crítica aos romanos que, segundo ele, “não dispuseram de uma noção genérica e abstrata de contrato, como esquema capaz de abraçar todas as variedades porventura ocorrentes.38” Todavia, segundo o autor, não se pode deixar de destacar que os romanos conheciam certas figuras contratuais e ofereciam a elas contornos bem estabelecidos, o que resultava em convenções não contratuais numerosas, chamadas pacta39.
Segundo Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, a compreensão dos pactos permite que se afirme “a insuficiência da manifestação de vontade como fonte geradora de obrigação. Ou bem havia um ato formal ou bem um contrato típico. Se a simples manifestação fosse suficiente, então os nuda pacta acarretariam
35 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
36 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxx. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradition. Oxford: Clarendon Press, 1996, p. 508. Tradução Livre. No original: “We have seen that an obligation could arise either on the basis of certain formal arrangements between the parties or by virtue of the real act of handing over an object.”
37 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxx. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradition. Oxford: Clarendon Press, 1996, p. 508.
38 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
39 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 8.
conseqüências diversas.40” Desse modo, o motivo para que se percebesse o surgimento de obrigações e a restrição de efeitos positivos estaria ligada diretamente à ausência de uma razão de juridicidade formal e típica, e também, a insuficiência de manifestação de vontade sem a existência de uma causa41.
Os pacta eram operações típicas celebradas paralelas aos contratos e que, por isso mesmo, eram destituídas de tutela processual, e, posteriormente, os contratos ditos inominados42. E, ainda, por não terem uma forma típica os pactos nus (nuda pacta) não geravam obrigações.
Com efeito, a figura dos nuda pacta, ainda que cumprissem funções próprias do contractus, “permite a conclusão de que a manifestação de vontade, no Direito Romano, era insuficiente como fonte geradora de obrigações: ou bem havia um ato formal ou bem um contrato típico.43”
Os nuda pacta não, portanto, eram revestidos da estrutura necessária para a produção de efeitos. Judith Martins-Costa diz que “em razão do extremado formalismo, característico do direito romano, não eram idôneos para constituir vínculo jurídico obrigatório, porque carentes do revestimento das formalidades prescritas.44” Conexa à ideia da ausência de força obrigatória dos pactos, destaca Xxxxxxx Xxxxxxx que
Assim como o contractus, a figura dos pacta estava estruturada, no Direito Romano, sob o gênero conventio, mas possuía efeitos jurídicos diversos: enquanto o contrato era dotado de força obrigatória e tutelado por uma actio, os pactos possuíam apenas uma eficácia
40 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx da. Reciprocidade e contrato: a teoria da causa e sua aplicação nos contratos e nas relações “paracontratuais”. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p. 36.
41 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 8.
41 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx da. Reciprocidade e contrato: a teoria da causa e sua aplicação nos contratos e nas relações “paracontratuais”. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p. 36.
42 CANTALI, Xxxxxxx Xxxxxxxx. Da forma ao contexto: a importância dos elementos contextuais na evolução histórica da categoria do contrato. Dissertação (Mestrado em Direito Privado) - Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito, UFRGS, Porto Alegre, 2018, p. 39.
43 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx. Da forma ao contexto: a importância dos elementos contextuais na evolução histórica da categoria do contrato. Dissertação (Mestrado em Direito Privado) - Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito, UFRGS, Porto Alegre, 2018, p. 39.
44 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. A noção de contrato na história dos pactos. In Uma vida dedicada ao direito: homenagem a Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxxxxx, o editor dos juristas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 499.
negativa: tratavam-se de atos consensuais com o objetivo único de extinguir, e não de formar, vínculos jurídicos entre as partes.45
As convenções não contratuais chamadas de pacta eram, segundo o conceito de Xxxxxxxx Xxxxxx, um “acordo de vontades que visa extinguir um vínculo jurídico entre as partes, para eliminar a pretensão de uma delas contra a outra.46” A afirmação pode ser desenhada por um exemplo de Xxxxxxxx Xxxxxx em que, na hipótese de membrum ruptum47, e “se, entre a vítima e o ofensor, houvesse um pactum, o ofensor, indenizando a vítima, afasta de si a aplicação da pena de talião.48
Importante ressaltar que a problemática do Direito Romano reforça a ideia de que até meados do século XI os acordos não solenes, os nuda pacta, não eram fonte de obrigações49, exceto obrigações naturais. Ou seja, a confiança e a vontade não eram elementos tão importantes quanto era a forma no processo de criação de obrigações.
De fato, o que se apresenta é o fato de o pactum não possuir eficácia positiva, a qual determina o surgimento de uma relação obrigacional entre as partes, mas, sim, eficácia negativa que, em outras palavras, é quando se extingue um vínculo jurídico que existia entre essas partes.50
Percebe-se a relação entre a eficácia negativa do pactum e a figura do pretor, descrita por Xxxxxxx Xxxxx:
No direito clássico, o pretor, de início, e coerente com o princípio que vinha da Lei das XII Tábuas, continuou a reconhecer apenas eficácia negativa ao pactum: por ele, as partes não podiam criar, entre si, relação obrigacional nova, mas, sim, acordar na renúncia, total ou parcial, de uma delas mover contra a outra a actio (ação) decorrente de relação jurídica anterior.51
45 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx. Da forma ao contexto: a importância dos elementos contextuais na evolução histórica da categoria do contrato. Dissertação (Mestrado em Direito Privado) - Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito, UFRGS, Porto Alegre, 2018, p. 39.
46 XXXXXX, Xxxxxxxx. Il Sistema Romano dei Contratti. 2. Ed. Torino: G. Xxxxxxxxxxxx Editori, 1949, p. 187.
47 Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx faz referência à hipótese de membrum ruptum quando fala sobre
como a Lei das XII Tábuas punia o delito de iniuria (ato praticado sem que se tenha direito) com as penas de composição legal e de talião. Esta última, representada pela faculdade de a vítima produzir no ofensor a mesma lesão que este fez: olho por olho, dente por dente, que se verifica quando ocorre membrum ruptum. Ver em: XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 587.
48 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 551. 49 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 587. 50 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 551. 51 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 552.
Caso uma das partes, mesmo que ambas tivessem renunciado, intentar a actio, deve o pretor conceder a exceptio pacti conuenti (exceção de pacto), que impedia fosse ela condenada pelo juiz popular. Assim, a fim de “sancionar o pactum – alcançando-se o fim a que se visara com a celebração dele -, bastava a concessão desse meio de defesa indireta que era a exceptio.52”
Pactum significava, na visão de Xxxxx Xxxxxx, compromisso. O compromisso realizado pela figura do pretor por meio de uma declaração53, cujo fim “refere-se apenas ao compromisso e aos pactos adicionais que têm por objeto limitar ou suprimir uma obrigação e o pretor, por meio da cláusula transcrita, prometeu proteger os referidos pactos ao outorgar os chamados de exceptiopacti.54”
Contudo, necessário afirmar que na época do direito clássico, não se atribui ao pactum somente a eficácia negativa, mas também a eficácia positiva. De tal modo, a atribuição ao pactum uma eficácia positiva era realizada por meio da inserção de uma cláusula adjecta, com o objetivo de que os efeitos do pacto pudessem ser modificados. A referida cláusula era então denominada pelos glosadores como pacta adiecta (pactos adjectos)55.
Todavia, não é o que se identifica quando se analisam as concepções abordadas pelos juristas do período clássico. Nesse período e segundo a ótica romana “não é o acordo de vontade (elemento subjetivo pressuposto no contrato) que faz surgir a obrigação, mas sim, um elemento objetivo (observância de formalidades, ou entrega de coisa: forma ou datio rei).56” Explica Xxxxxxx Xxxxx que:
52 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 552.
53 XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Barcelona: Casa Editorial Bosch, 1960, p. 450. Segundo o autor, a declaração era chamada de pactis conventis, que consistia na declaração, pelo pretor, dos seguintes dizeres: “Pacta conventa, quaeneque dolo malo ne que adversus leges plebisscita, senatus consulta, edicta decreta principum ne que quo frauscuieorum fiat facterunt, servabo.”
54 XXXXXX, Xxxxx. Derecho Romano Clássico. Barcelona: Casa Editorial Bosch, 1960, p. 450. Tradução livre. No original: “Se refiere únicamente al compromiso y a los pactos adicionales que tienen por objeto limitar o suprimir uns obligación y el pretor, mediantela clausula transcrita, prometia proteger dichos pactos concediendo al efectola llamada exceptio pacti.”
55 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 552.
56 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 471.
Nos contratos, diante do elemento objetivo, o acordo de vontade (elemento subjetivo) é mero pressuposto de fato, colocado em segundo plano. A explicação disso é simples: a tipicidade rígida implica o desconhecimento do princípio de que todo acordo de vontade lícito gera obrigação, uma vez que dela decorre que o acordo de vontade somente cria obrigações entre as partes se orientar no sentido da formação de um negócio jurídico que o direito objetivo reconheça especificamente.57
No direito romano, segundo Xxxxx Xxxxxxx, no direito romano, a convenção era considerada gênero e suas espécies eram o pacto e o contrato58. Para o autor “o pacto era convenção produtiva apenas de obrigações naturais. O contrato era a convenção, que engendrava obrigações civis.”59
O acordo de vontade lícito, assim como foi referido no tópico anterior, a distinção entre pacto e contrato “deitava raízes no direito mais antigo, pelo qual o simples acordo de vontade não era suficiente para gerar obrigações dotadas de eficácia civil.60” De tal modo era entendido que a vontade das partes era característica fundamental das convenções e para que o elemento subjetivo da vontade produzisse obrigações era necessário que fosse aliado a alguma causa civilis61.
As estipulações informais realizadas entre as partes e passíveis de serem exequíveis eram classificadas como emptio venditio, locatio conductio, mandatum ou societas62. Todavia, existia um grande número de casos que não se encaixavam nas possibilidades e requisitos das classificações acima nomeadas e que os contratos eram concluídos sem consentimento.
Destarte, um acordo que não se encaixava nas categorias em questão não era exequível e era considerado um mero pacto – mere pactum63.
57 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 471.
58BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7. 59 XXXXXXX, Xxxxx. Do contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7. 60 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
61 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7. O autor Xxxxx Xxxxxxx salienta que os textos romanos não estabeleceram a definição da causa civil. Para alguns romanistas a ideia de causa civil estava relacionada à essência do contrato; já para outros, eram questões de formalidades exteriores, como por exemplo a stipulatio, “promessa feita em público, com o uso de palavras solenes.”
62 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
63 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
De um lado existia a figura do “nuda paction obligatio nem non parit”64e do outro, uma variedade de acordos que se tornaram reconhecidos legalmente. Os contratos eram as transações obrigatórias que possuíam um nome próprio.
Para os juristas da época, utilizando-se da definição dada por Ulpianus65, o pacto “era o termo geral capaz de sintetizar todos os acordos entre duas ou mais partes que almejavam a criação de obrigações”66.
Ao verificar se tais obrigações eram meramente naturais ou se eram exequíveis, surgem duas figuras distintas: pacta nuda e pacta vestita. Esta última remete ao próprio teor da nomenclatura e faz referência a um “pacto vestido”. É, ainda, a figura na qual estão inseridos os contratos romanos.
Apesar da autoridade durante considerável período de tempo do princípio romano “nuda pactio obligatio nem non parit”, a figura pacta vestita tornou-se forte e o nuda pacta aparentou ser uma anomalia67. Gradativamente,
o pacta vestita trouxe uma certa “segurança jurídica” aos contratantes da época
– importante salientar que o termo segurança jurídica, in casu, refere-se à legalidade e certo formalismo que até então os contratantes não tinham presenciado e não à ideia de um sistema jurídico complexo, revestido de normas, leis e princípios.
1.2 Limites da Teoria Geral dos Contratos para proteção dos contratantes nos contratos não solenes
64 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 537.
65 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxx. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradition. Oxford: Clarendon Press, 1996, p. 538. “Pactum est pactio duorum pluriumve in idem placitum et consensus”.
66 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxx. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradition. Oxford: Clarendon Press, 1996, p. 538. Tradução Livre. No original: “for them ‘pactum’ was the general term comprising all agreements between two or more parties aimed creating obligations”.
67 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxx. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradition. Oxford: Clarendon Press, 1996, p. 539. Tradução Livre. No original: “the few remaining unenforceable pacta nuda appeared as something of ananomaly.”
Pauta o estudo do ponto na análise dos limites da teoria geral dos contratos para a proteção dos contratantes nos contratos não solenes, ante a perspectiva da tutela da confiança na formação dos contratos.
Busca-se relacionar esses limites dentro da noção da tradição moral tomista-aristotélica e a eficácia vinculativa das promessas, ressaltando a ideia de fidelidade à palavra empenhada. Ainda, indispensável destacar o deveres laterais de conduta decorrentes do princípio da boa-fé objetiva, uma vez que este é fundamento da responsabilidade civil pré-contratual e, por último, examina-se a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação.
1.2.1 A tradição moral tomista-aristotélica e a eficácia vinculativa das promessas
O objetivo deste ponto é o de analisar quais são os elementos considerados essenciais para a fase pré-contratual e de formação dos contratos a partir da contribuição da tradição moral tomista-aristotélica. Por meio da Teoria Geral dos Contratos relacionada a essa abordagem filosófica, pretende-se demonstrar que as virtudes aristotélicas de justiça comutativa, manutenção das promessas e liberalidade refletem na tradição moral à palavra empenhada e à confiança entre os contratantes durante as negociações.
Inicialmente, busca-se compreender brevemente a Teoria Geral dos Contratos sob a ótica filosófica. A esse respeito, Xxxxx Xxxxxxx demonstra que, em que pese guardem doutrinas e conceitos muitas vezes antagônicos, a common law e a civil law possuem uma estrutura doutrinária baseada em conceitos legais similares. Neste sentido, são suas palavras
Por exemplo, hoje, no mundo todo, advogados organizam muitas de suas discussões sobre teoria contratual em torno do princípio de que os contratos são formados por consentimento. Geralmente importava aos juízes Ingleses e aos juristas Romanos, claro, que a parte tivesse consentido. No direito Xxxxxx, uma pessoa que quebrasse uma promessa era responsabilizada em uma ação. No direito romano, consentir em um objeto ou preço constituía um contrato de venda. Pode-se, portanto, considerar as regras inglesas sobre o pressuposto e as regras romanas sobre a venda como exemplos do princípio de
que as partes devem consentir para estarem vinculadas a um contrato.68
Destarte, verifica-se de fato as similitudes entre a common law e a civil law,visto que ambos os institutos empregam a necessidade do consentimento para que uma parte esteja vinculado a um contrato.
À baila desta noção de consentimento, encontra-se uma possível resposta para uma das problemáticas da pesquisa, qual seja: se as partes estão em fase de negociação, elas consentiram, mesmo que de modo parcial, para que o contrato seja firmado. Existente o vínculo, se consentiram, os candidatos a contratante estão vinculadas a um contrato, de modo que, mediante a observância de elementos de configuração, é possível a aplicação de princípios e reparação.
Visto que a referida pergunta tentará ser respondida mais adiante, necessário é o enquadramento histórico acerca da doutrina contratual formulada por Xxxxx Xxxxxxx.
Eis a relevância da referida obra, segundo palavras de seu próprio autor
Esse estudo promoverá uma reposta apesar de não se encaixar facilmente em muitas noções populares sobre história legal. Nos séculos XVI e XVII, um pequeno grupo de teólogos e juristas centrados na Espanha conscientemente tentaram sintetizar os textos legais romanos com a teologia moral de Xxxxx xx Xxxxxx. Os conceitos fundamentais e as doutrinas do Direito Privado que hoje conhecemos é uma simplificação da síntese que eles alcançaram.69
68 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series. Oxford University Press, 1991, p. 02. Tradução livre. No original: “For example, today, the world over, lawyers organize much of their discussion on contract law around the principle that contracts are formed by consent. It often mattered to the English judges and Roman jurists, of course, whether a party had consented. In English law, a person who broke a promise was liable in an action of assumpsit. In Roman law, consented to an object and price constituted a contract of sale. One can therefore regard English rules about assumpsit and Roman rules about sale as instances of the principle that the parties must consent to be bound to a contract.”
69 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 02. Tradução livre. No original: “This study will provide an answer, although not that fits easily with many popular notions about legal history. In the sixteenth and early seventeenth centuries, a fairly small group of theologians and jurists centred in Spain self-consciously attempted to synthesize the Roman legal texts with the moral theology of Xxxxxx Xxxxxxx. The fundamental concepts and doctrines of private Law with which we are familiar are a simplification of the synthesis they achieved.”
A fim de que se alcance uma melhor compreensão da tradição moral tomista-aristotélica, faz-se necessário um breve relato sobre a vida de Xxxxx xx Xxxxxx e Xxxxxxxxxxx e como as duas figuras se interligaram a ponto de se examinar a referida abordagem filosófica. Xxxxx xx Xxxxxx foi um frade Dominical do século XIII e é comumente referido como aquele que batizou Xxxxxxxxxxx. Os textos e estudos deste sobre metafísica e ética estiveram disponíveis no ocidente antes do nascimento de Xxxxx. Este, por sua vez, foi capaz de alcançar a síntese entre a tradição filosófica Xxxxx que Xxxxxxxxxxx representou e a tradição religiosa do Cristianismo70.
Em que pese tenha o Corpus iuris civilis sido redescoberto duzentos anos antes do nascimento de Xxxxx xx Xxxxxx, o renascimento do direito romano influenciou aspectos da vida medieval política e religiosa, contribuindo, assim, para uma preocupação com o direito que é aparente no trabalho de Xxxxx.
Mais adiante, nos séculos XVI e XVII, a síntese desenvolvida por Xxxxx, utilizando-se dos preceitos aristotélicos e do direito romano, foi alcançada por juristas, os quais ficaram conhecidos pela Escolástica Tardia71.
Os escolásticos tardios “construíram um sistema de doutrina tomista e aristotélica em um terreno plano e o direito romano em seus detalhes. Eles então deram ao direito romano uma organização sistemática doutrinária que anteriormente estava ausente.”72
A filosofia grega e o Direito Romano contribuíram em diferentes partes para a síntese dos escolásticos tardios alcançaram no século XVI. O direito romano proveu uma rica gama de detalhes legais. Porém, eles enfrentaram
70 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 33.
71 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 2. Xxxxxxx faz referência aos juristas da Xxxxxxxxxxx Xxxxxx (late scholastics) também como Escola Espanhola de direito natural (“Spanish natural Law school”).
72 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 04. Tradução livre. No original: “The ybuilt a system of doctrines Thomistic and Aristotelian in ground plan and Roman in much of its detail. They thus gave Roman law a systematic doctrinal organization which it had previously lacked.”
alguns problemas com os quais os escolásticos tentaram resolver aplicando as ideias filosóficas de Xxxxxxxxxxx e Xxxxx.
Xxxxxxxxxxx discutiu a virtude. Os escolásticos tardios construíram suas doutrinas contratuais em três virtudes que ele descreveu: manter promessas, justiça comutativa e liberalidade (promise-keeping, commutative justice eliberality73).
Com efeito, utilizando-se dos ensinamentos de Xxxxx xx Xxxxxx, os escolásticos demonstraram como os princípios de Xxxxxxxxxxx poderiam ser usados para considerar não somente a virtude, mas o direito moral. Xxxxx discutiu os requisitos para que uma promessa se tornasse vinculativa, mostrando que uma parte pode realizar um ato de liberalidade ou de justiça comutativa.
Assim, a ideia tomista-aristotélica de que as promessas são vinculativas relaciona-se com o objeto desta pesquisa, forte quando as promessas realizadas nas negociações devem ter a mesma dimensão daquelas realizadas na conclusão de um contrato.
Ainda, nos séculos XVII e XVIII, as estudos desenvolvidos pela escolástica tardia se tornaram populares por meio da escola de direito natural e do trabalho de autores como Xxxx Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxx Xxxxxxxxx, que acabaram por influenciar Xxxx Xxxxx e Xxxxxx Xxxxxxx, cujas doutrinas fundamentaram a civil law e a common law modernas74.
Os rascunhos do Código Civil Francês, por exemplo, continham mais da metade de seus documentos advindos das provisões contratuais e estudos realizados por Domat e Xxxxxxx.
Sobre o cenário Francês da época e das contribuições deixadas pelos juristas Domat e Xxxxxxx
Por quase um século, a formação do contrato foi considerada de acordo com um regime coerente, e fiel à letra do Código Napoleão. Vamos tentar desenhar os contornos, retornando às fontes. Assim,
73 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. O fundacionalismo epistêmico de Xxxxxxxxxxx nos segundos analíticos – Uma análise da interpretação de Xxxxx xx Xxxxxx na Suma de Teologia. Tese (Graduação em Filosofia) – UFRGS, Xxxxx Xxxxxx, 0000, p. 235.
74 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 72.
iniciaremos o trabalho preparatório do Código e os escritos de Domat e Xxxxxxx, considerados por muitos como os pais do Código Civil. Pothier especialmente brilhante divulgador das obras de seus predecessores, é de fato o último estado da doutrina jurídica antes do Código, e os editores dos tírulos das obrigações parecem ter se baseou fortemente em suas obras. [...] Este último é, de certo modo, o autor central, numa época em que o regime tradicional da formação do contrato começa a revelar seus próprios limites, sob a influência da revolução industrial. Vamos olhar então como este regime teve de se adaptar para a diversificação dos modos de formação do contrato, estabelecendo as tendências do grande movimento jurisprudencial e legislativo que desenvolveram para além do código, mesmo à margem deste.75
As disposições contratuais de Xxxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxxxx foram declaradas como “the will of the legislator” (as vontades do legislador) e todos os esforços dos juristas franceses do século XIX foram para interpretá-las76.
No século XVIII, a influência exercida no Código Civil francês pela filosofia individualista e a doutrina econômica liberal refletiu para que os homens fossem livres e iguais, podendo se vincular contratualmente de modo voluntário77.
Esta liberdade que tem os homens de regular suas próprias atividades é, portanto, considerada o melhor meio de estabelecer entre eles as relações mais justas e socialmente mais úteis.
O postulado de liberdade e de igualdade das partes contratantes domina toda a formação do contrato, através dos famosos princípios da liberdade
75 XXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxx. La formation Du contrat depuis Le Code Civil de 1804: um régime em mouvement sous une lettr efigée. Bruxelles: Xx Xxxxxx, 0000, p. 61. Tradução livre. No original: “Pendant près d’un siècle, la formation Du contrat a été envisagée selon un régime cohérent, et fidèle à la lettre Du Cod eNapoléon. Nous tâcherons d’endessiner Le scontours, enretournant aux sources. Ainsi, nous partirons dês travaux préparatoires Du Code et desécrits de Domat et de Pothier, considérés par beaucoup commeles Peres Du Code civil. Pothier surtout, brillant vulgarisateur des travaux de sés prédécesseurs, représente bel et bien Le dernier état de la doctrine juridique avant le Code, et lês rédacteurs du titre dês Obligations semblent avoir puisé abondamment dans ses oeuvres. [...] Ce dernier constitue en quelque sorte l’auteur charnière, à une époque oùle régime traditionnel de la formation Du contrat commence à révéler sés propres limites, sous l’influence de la révolution industrielle. Nous examineron salors comment ce régime a dûs’ajuster à ladiversification dês modes de formation Du contrat, endégage antlestendances de l’important mouvement jurisprudentiel et législatif quis’xxx xxxxxxxxxxx-xx xx xx Xxxx, xxxxx xx xxxxx xx xxxxx-xx.”
00 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 42.
77 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 85.
contratual e do consensualismo, reunidos sob o dogma da autonomia da vontade.
Neste sentido, a respeito do cenário em que a liberdade e igualdade entre as partes contratantes está inserido, é o que expõe as autoras Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxxx
O mais justo, porque é o contrato livremente concedido por uma parte necessariamente protege seus interesses. De fato, nenhum homem razoável consentiria com um vínculo que seria prejudicial a ele. O mais socialmente útil se refere a lei da oferta e demanda, que responde ao interesse geral, garantindo espontaneamente prosperidade e equilíbrio econômico.78
Na mesma época, os juristas alemães se dedicaram a construir um sistema de doutrina perfeito, herdando certas concepções do século anterior. O autor Xxxxxxx, em seu artigo The Innovation in Nineteenth Century Contract Law79, mostrou que os advogados da common Law nesse século estavam pegando emprestado ideias e influências dos séculos XVII e XVIII, o mesmo aconteceu com os juristas franceses e alemães.
É surpreendente que, no século XXI, as doutrinas que governam a maior parte do mundo tenham se baseado em preceitos filosóficos de séculos atrás80. De fato, em sua forma original essas doutrinas dependeram diretamente das concepções morais de Xxxxxxxxxxx e Xxxxx xx Xxxxxx sobre virtude e metafísica sobre a natureza e essência das coisas81.
78 XXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxx. La formation Du contrat depuis Le Code Civil de 1804: um régime em mouvement sous une lettr efigée. Bruxelles: Xx Xxxxxx, 0000, p. 03. Tradução livre. No original: “Les plus justes, car le contrat librement consenti par une partie sauve garde nécessairement ses intérêts. Em effet, nul homme raisonnable ne consentirait à unengagement qui lui serait préjudiciable. Les plus utiles socialement, car la loi de l’offre et de la demande répond à l’intérêt général, enassurant spontanément la prospérité et l’équilibre économique.”
79 XXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxx. La formation Du contrat depuis Le Code Civil de 1804: um régime em mouvement sous une lettr efigée. Bruxelles: Xx Xxxxxx, 0000, p. 05.
80 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 13.
81 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, Tradução livre. No original: “Its most surprising feature is that doctrines which, in modified form, now govern most of the world were founded on philosophical ideas that fell from favour centuries ago. Indeed, in their original form these doctrines depended directly on Aristotelian and Thomistic moral conceptions about virtue and metaphysical conceptions about the nature essence of things. Making a contract, for
Assim, realizar um contrato, por exemplo, era um exercício de virtude de liberalidade, com a qual um enriquecia o outro, ou pela virtude da justiça comutativa, com a qual as partes trocavam entre si coisas de valor igual. Cada tipo de contrato tinha uma certa essência que guiava as obrigações.
Mais adiante, era esperado que as doutrinas legais baseadas na filosofia deveriam ter sido reformuladas sob a influência de ideias filosóficas mais modernas. Mas não foi isso que aconteceu.
No ramo do direito contratual, o resultado foi a chamada “will theories” (teorias da vontade) dos contratos82. Nesta teoria, a vontade das partes se tornou uma grande norma, de outra todas as regras do direito contratual deveriam ser referidas. Os escolásticos tardios e os juristas naturais reconheceram como fundamental o princípio de que os contratos devem ser estabelecidos pela vontade ou consentimento das partes.
A inovação oferecida pelo século XIX era a de rejeitar os conceitos de Xxxxxxxxxxx que previamente figurava a doutrina contratual. Assim, realizar um contrato era levar em consideração o ato de vontade das partes, e não mais o exercício da virtude moral.
Com efeito, as partes eram vinculadas simplesmente pelos que eles tinham vontade de firmar, e não por obrigações que seguiam a essência ou a natureza do contrato.
Sem dúvida, a filosofia moderna criou um ambiente intelectual no qual o conceito de vontade aparentou perfeitamente aceitável onde outros conceitos não o eram. Essa, entretanto, pareceu ser o limite do que a filosofia moderna contribuiu para a reformulação da doutrina no século XIX. Assim, a instabilidade e a ausência de consenso entre os filósofos fizeram com que os juristas ficassem cautelosos e exercessem seu trabalho sem se comprometer com nenhuma filosofia. Eles reclamavam que não estavam pedindo respostas filosóficas mas apenas interpretando sua própria lei positiva: a lei dos casos americanos, o código civil Francês e os textos romanos.
example, was an exercise of the virtue of liberality by which one enriched another, or of the virtue of commutative justice by which one exchanged things of equal value.”
82 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 23.
No século XX, uma crise doutrinária começou e ainda está presente conosco. Por mais que a lei ocidental tenha se espalhado pelo mundo, os juristas legais se questionavam se era possível uma doutrina legal coerente. No ramo do direito contratual, o problema foi que os juristas do século XIX usaram parte do sistema doutrinário anterior e não conseguiram fazer com que essa parte funcionasse sozinha83.
As críticas realizadas no século XX apontavam que a teoria da vontade não conseguiria explicar alguns aspectos do direito contratual e que os juristas se encontravam impossibilitados de reedificar a doutrina que eles desmontaram.
O autor Xxxxx Xxxxxxx, como foi mencionada na introdução desta pesquisa, sintetizou o atual estado do direito contratual, apontando com propriedade que os sistemas foram descolados e não há maneiras de colá-los novamente84.
Os tribunais americanos tutelam as promessas de duas formas85: baseados nas doutrinas de consideration, promissory reliance e oferta e aceitação; e por meio de enforcing promises: resgatando, neste ponto, as ideias de reliance e meeting of minds. Eles estão apenas preocupados com a ideia de riqueza das partes.
Entretanto, as promessas que não condicionam nenhum custo ao promissor são livremente cumpridas e as promessas que envolvem trocas são
83 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. The Philosophical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, p. 09. Tradução livre. No original: “No doubt, modern philosophy created an intelectual environment in which the concept of will seemed perfectly acceptable wheras these other concepts did not. That, however, seems to be the limit of what modern philosophy has contributed to the reformulation of doctrine in the ninettenth century. No school of jurists formulated doctrine by applying the principles of Xxxxxx, and the attempts of Xxxx and Xxxxxxx themselves to do so were generally ignored. Indeed, in the absence of consensus among philosophers, jurists became wary: they tried to do their job without commitment to any philosophy. They claimed they were not asking philosophical questions but were simply interpreting their own positive law: the law of the Anglo- American cases, of the French Civil Code, of the Roman Texts that remainded in force in Germany.
84 XXXXXXX, Xxxxx. The Death of contract. 2 ed. Columbus: The Ohio State University Press, 1995, p. 28.
85 XXXXXXX, Xxxxx X. Enforcing Promises. California Law Review, 1995, p. 548. A dicotomia no tratamento das promessas pode ser observada nas obras do autor de “Enforcing Promises” e “The Enforceability of Promises in European Contract Law”. Na primeira obra, Xxxxxxx relata que quando os tribunais americanos palicam as doutrinas de consideration, promissoryreliance, oferta e aceitação eles não estão preocupados com a confiança e com o encontro de mentes.
mecanismos que salvaguardam uma parte de ser injustamente enriquecida em relação à outra86.
As preocupações identificadas pelo direito americano atual guardam relação com as preocupações acerca da eficácia vinculativa das promessas na realidade brasileira. Uma diferença marcante está na ideia de como aquele direito tenta solucionar as questões.
Nota-se um apego – principalmente na visão de Xxxxxxx – às tradições filosóficas. As ideias de Xxxxxxxxxxx de justiça comutativa e liberalidade, que há um bom tempo foram descartadas, ganham novo enfoque e seriam responsáveis pelas melhores explicações acerca da formação dos contratos.
Neste ponto, importante salientar ser indispensável o estudo da obra de Xxxxxxx sobre as origens filosóficas da doutrina moderna contratual87. Isso porque, além de traçar um aparto histórico-filosófico desde o redescobrimento dos textos romanos justinianos por Xxxxx xx Xxxxxx, passando pelos juristas medievais, escolásticos tardios, até chegar nos teóricos da vontade, a obra por muitas vezes aborda o modo como as promessas eram tratadas em cada uma dessas épocas.
Principalmente no século XIX, os common lawyers encontraram duas maneiras adicionais de limitar a aplicabilidade de promessas que pareciam mais compatíveis com as teorias da vontade. Uma delas era insistir que as partes deveriam ter pretendido que sua promessa fosse juridicamente vinculativa88.
86 XXXXXXX, Xxxxx X. Enforcing Promises. California Law Review, 1995, p. 548. Tradução livre. No original: “Promises to exchange resources are enforced subject to safeguards that prevent onde party from being enriched at the other’s expense.”
87 XXXXXXX, Xxxxx X. The Philosofical Origins of Modern Contract Doctrine. Clarendon Law Series: Oxford University Press, 1991, pp. 2-11.
88 XXXXXXX, Xxxxx X. The Enforceability of Promises in European Contract Law. Cambridge University Press , 2004, p. 13. Ver em: “In the nineteenth century, moreover, common lawyers found two additional ways to limit the enforceability of promises that seemed more compatible with will theories. One was to insist that the parties must have intended their promise to be legally binding.”
Há um resgate tanto da tradição moral aristotélica quanto da ideia de confiança (reliance), já em uma perspectiva mais atual no direito americano, retratada no Restatment First e Restatment Second89.
O Xxxxx Xxxxxxx ressalta que a principal base, historicamente falando, para a obrigatoriedade de contratos informais e, consequentemente, para a vinculabilidade das promessas reside exatamente no princípio da confiança90.
Está-se diante da perspectiva de que a promessa perfaz-se na busca pelo mesmo fim. Em que pese os contratantes, promitentes e promissores tenham interesses antagônicos, ensina Orlando Gomes91 que a busca pelo mesmo fim é causa para que eles ajam com ética, lealdade e boa-fé.
As promessas estão correlacionadas com a ideia de fidelidade da palavra empenhada. Ao prometer, as partes estão adstritas aquilo que emitiram, seja verbalmente ou de forma escrita – salientando-se que o estudo preocupa-se apenas com promessas verbais.
O professor Xxxxxxx Xxxxx examina as bases morais do direito contratual, as quais são encontradas pelo princípio da promessa. Por meio das promessas pode-se impor obrigações às pessoas e encontrar uma mútua vantagem92. Ele salienta que o princípio da promessa representa o princípio pelo qual as partes podem impor nelas mesmas obrigações que não existiam antes93.
89 XXXXXXX, Xxxxx. The Death of contract. 2 ed. Columbus: The Ohio State University Press, 1995, p. 77.
90 XXXXXXX, Xxxxx. Death of the contract. Columbus: The Ohio State University Press, 1995, p.
79. Tradução livre. No original: “The reliance principle, we are told, may have been, historically, the basis for “the enforcement of informal contracts in the action of assumption.”
91 XXXXX, Xxxxxxx. A Constituição e seus reflexos no direito das obrigações. Novos temas de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p, 64-75. Segundo o autor "nos contratos, há sempre interesses opostos das partes contratantes, mas sua harmonização constitui o objetivo mesmo da relação jurídica contratual. Assim, há uma imposição ética que domina a matéria contratual, vedando o emprego da astúcia e da deslealdade e impondo a observância da boa- fé e lealdade, tanto na manifestação da vontade (criação do negócio jurídico) como, principalmente, na interpretação e execução do contrato.”
92 A ideia de mutual advantage está em consonância com “a concepção de vontade que vincula por si mesma” da linguagem kantiana
93 XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation. Cambridge, Massachussets and London, England: Harvard University Press, 1935, p. 01. Tradução livre. No original: “The promise principle, which in this book I argue is the moral basis of contract law, is that principle by which persons may impose on themselves obligations where none existed before.”
Ao fazer promessas, coloca-se na mão da parte o poder de concretizar a vontade do outro, por meio de um aspecto moral94 e, ainda, transforma uma escolha que seria meramente neutra em uma que é moralmente compelida. A moralidade serve, então, como modelo para permitir que se melhore o trabalho mais do que uma vontade particular.
Xxxxxxx Xxxxx evidencia a obrigação moral das promessas com um exemplo claro, o qual merece ser transcrito:
Se eu te vendo uma casa, retendo um terreno adjacente vacante. No momento de nossas negociações, eu digo que pretendo construir uma casa para mim naquele loteamento. E se em vários anos depois eu vender o loteamento para uma pessoa que constrói um posto de gasolina nele? E se eu vendê-lo somente um mês depois? E se eu já estiver negociando a venda par um posto de gasolina no momento que eu vendo a casa para você?95
Retratando o exemplo, Xxxxx faz alusão ao fato de que estaria enganando a outra parte96 caso, ao mesmo tempo que negociasse com ela, estivesse também negociando para vender o terreno para um posto de gasolina. Entretanto, não se trataria de erro se tivesse vendido o terreno para o posto anos depois.
Trata-se, aqui, de um ponto chave do estudo. Isso porque a promessa representa uma obrigação moral a ser seguida pelas partes enquanto negociam. A execução do contrato, por si só, representa a imposição de regras de conduta e, paralelamente, tais regras também devem ser observadas quando da fase das negociações.
Se uma das partes mente ou se beneficia injustamente em relação à outra pautada em uma promessa errônea, deve haver restituição relativa ao que foi despendido pelo promissor. Por si só, o fato de enganar alguém por
94 XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation. Cambridge, Massachussets and London, England: Harvard University Press, 1935, p. 08. Tradução livre. No original: “By promising we put in another man’s hands a new Power to accomplish his Will, though only a moral Power: What he sought to do alone he may now expect to do with our promised help, and to give him this new facility was our very purpose in promising. By promising we transform a choice that was morally neutral into one that is morally compelled.”
95 XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation. Cambridge, Massachussets and London, England: Harvard University Press, 1935, p. 08.
96 XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation. Cambridge,
Massachussets and London, England: Harvard University Press, 1935, p. 9.
meio de promessas a fim de obter vantagem, seja ela econômica ou não, reflete um apego à imoralidade nas relações97.
Desse modo, o objetivo do próximo tópico é identificar os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé, relacionando-os com o fundamento para a responsabilidade pré-contratual.
1.2.2 Deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé
Por fim, como último ponto da primeira parte deste trabalho, faz-se um estudo sobre os elementos constitutivos da proteção da confiança, abordando os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé objetiva e a proteção das expectativas legítimas das partes que pretendem contratar para que, depois, uma analise-se a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação entre as partes.
Com efeito, desde o tempo em que os homens realizaram suas primeiras trocas e promessas de entrega de mercadorias e serviços, nota-se a importância da confiança gerada entre uma e outra pessoa que pretendem efetuar a troca econômica.
Em outras palavras a relação entre a confiança e o crédito é essencial, pois qualquer troca para que seja socialmente viável depende de que as partes acreditem na possibilidade real da entrega da coisa prometida ou do pagamento do preço.
Mesmo diante da ausência de um ordenamento superior ou de formalidades, as partes que realizavam trocas rudimentares acreditavam no agir com lisura e no valor vinculativo da entrega e pagamento. Sobre a troca de mercadorias, a permuta, é o que explicita Xxxxxx Xxxxx:
É inegável que a vemos universalmente praticada, até por tribos selvagens, entre as quais não há quaisquer vestígios de um estado, tanto nas relações entre elas, como nas relações com os povos civilizados. Vemos que, não obstante a falta de um ordenamento superior, as negociações que antecedem à conclusão do contrato são conduzidas com escrupulosa correção, e que, obtido o acordo, ambas
97 XXXXX, Xxxxxxx. Contract as promise: A theory of contractual obligation Cambridge, Massachussets and London, England: Harvard University Press, 1935, p. 23.
as partes mostram, ao concluir o contrato, plena consciência do seu valor vinculativo.98
Xxxxx faz referência ao surgimento de contratos próprios da vida social, sem que haja qualquer tutela por parte do direito. Apenas após terem suportado a prática e o desenvolvimento a certo grau, os contratos obtém valorações específicas e determinação de seus efeitos.
Segundo o referido autor, “só a boa-fé, ao observar na prática dos negócios, impõe, de início, o respeito pela palavra dada, atribuindo a esta um valor vinculativo da consideração social.”99
O caráter vinculativo da palavra dada posiciona o contrato sob palavra ao mesmo nível de negócio jurídico, uma vez que no vínculo há uma função socialmente relevante e que as partes, antes mesmo da regulação, já admitiam a existência da relação.
Esta auto-regulamentação capaz de determinar a vinculação social entre as partes transfere-se para uma “regra de conduta, que tem de ser observada e que, no caso de inobservância, é acompanhada, na vida social, por sanções, mais ou menos enérgicas e seguras, tanto de caráter específico (ex: medidas de retorsão e de autotutela) como de caráter genérico (ex: perda ou diminuição do crédito social, com a consequente impossibilidade, ou dificuldade de realizar novos negócios).”100
Assim, o vínculo entre as partes, mesmo que não haja um contrato solene, firma-se como relação de cooperação. A respeito de obrigação e cooperação, são as palavras de Clóvis do Couto e Xxxxx:
Todos os deveres anexos podem ser considerados deveres de cooperação. Alguns autores, porém, costumam dar significado restrito a esses deveres, de modo a abranger somente os deveres de auxílio, entendidos aqui como aquelas hipóteses em que o fim somente pode ser obtido com a cooperação mútua. Não se quer com isso dizer que esses deveres se confundam com o próprio escambo, o qual obviamente só pode ser obtido se cada uma das partes cumprirem as suas obrigações.101
98 XXXXX, Xxxxxx. Teoria Geral do negócio jurídico. Trad. Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx. Campinas: XXX Xxxxxxx, 0000, pp. 64-65.
99 XXXXX, Xxxxxx. Teoria Geral do negócio jurídico. Trad. Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx. Campinas:
LZN Editora, 2003, p. 66.
100 XXXXX, Xxxxxx. Teoria Geral do negócio jurídico. Trad. Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxx. Campinas: LZN Editora, 2003, p. 67.
101 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. Reimpressão. Rio de
Janeiro: FGV Editora, 2006, p. 96.
Com efeito, os deveres anexos e a ordem de cooperação entre as partes tangenciam para a manutenção do vínculo obrigacional. E, de fato, é essencial para a cooperação que exista no vínculo a preservação das situações de confiança.
Assim, de modo a servir de marco teórico para pontos de análise, faz-se necessário o delineamento acerca do princípio da boa-fé, uma vez que ramifica na noção de confiança, cuja proteção sobre os candidatos a contratante é um dos centros desta pesquisa.
Em razão da revisão por que passou a teoria geral das obrigações e dos contratos e devido a novas posições doutrinárias e jurisprudenciais, os estudos envolvendo o princípio da boa-fé ganharam grande destaque, visto que foram motivados, em grande parte, por uma vigorosa reação às concepções do positivismo jurídico.102
O princípio da boa-fé objetiva é dentre os limites estabelecidos no artigo 187 do Código Civil, o que observa tratamento mais aprofundado na doutrina brasileira atual. Trata-se de um dos mais importantes limites para o exercício de direitos subjetivos.
Para Clóvis do Couto e Xxxxx, a boa-fé e os deveres de lealdade e cuidado encontram-se vinculados a valores morais indispensáveis ao convívio social, sendo dependentes da convicção popular. E constituindo limite à autonomia da vontade no plano negocial, a boa-fé seria caracterizada pelo “agir concreto das partes em uma determinada relação jurídico-contratual”.103
O recurso à confiança ou ao princípio da boa-fé é visto de maneira crítica por conta da generalidade de seu conceito. A referida crítica pode ser então retratada, com ressalvas, por Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx
Isto é facilmente perceptível na jurisprudência onde a invocação da boa-fé deixou de ser um recurso genérico para “fazer justiça” no caso concreto. Longe de se estar querendo negar o valor da boa-fé. O uso deste princípio, porém, não pode degenerar em apanágio a todos os fatos e situações de relevância jurídica para os quais não se encontre, facilmente, outra explicação. Muitas vezes há outro fundamento jurídico, mas a boa-fé é invocada, quase com um caráter moral. Assim, o que se propugna é que o recurso ao princípio da boa-
102 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. Reimpressão. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006, p. 23.
103 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. Reimpressão. Rio de
Janeiro: FGV Editora, 2006, pp. 32-33.
fé seja feito quando for o caso e não como uma espécie de “reserva técnica” das motivações judiciais.104
De fato, estudar e entender se há certo dever de agir vinculado a valores morais entre as partes vinculadas nas negociações contribuirá para possíveis respostas acerca do problema de pesquisa.
Ainda, segundo o doutrinador Xxxxxxxx Xxxxxxx, pode-se dizer que o princípio da boa-fé é norteado pelas palavras-chaves “confiança legítima”, ou “expectativas legítimas”105. Escusado seria acrescentar que essa confiança e essas expectativas são aquelas depositadas na outra parte vinculante.
A confiança também dialoga com o enquadramento dogmático da proibição do comportamento contraditório ou, em outras palavras, do brocado do verine contra factum proprium106. Destaca Xxxxxx Xxxxx Xxxxx que parte da doutrina alça a boa-fé à fonte da confiança e que, de certa maneira, “considera boa-fé e confiança mera substituição de sinônimos, sem qualquer modificação ontológica, encontrando conforto à proibição do venire numa referência superficial à boa-fé e à confiança, como se fossem funcionalmente equivalentes ou complementares.107” Assim, a conferência da boa-fé como fundamento da proibição do comportamento contraditório vem da compreensão de que seu verdadeiro fundamento está ligado à proteção da confiança.
Com efeito, o princípio da boa-fé é determinante quando se fala em vínculo obrigacional e contratual.
Segundo esse princípio, a parte deve agir de acordo com certos padrões mínimos de conduta socialmente recomendados, sempre observando os deveres de lealdade, correção ou lisura, aos quais por isso correspondem expectativas legítimas de outras pessoas.
Este dever de agir com lisura impõe-se na medida em que as próprias relações obrigacionais não são possíveis sem um mínimo de confiança entre
104 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 8.
104 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx da. Reciprocidade e contrato: a teoria da causa e sua aplicação nos contratos e nas relações “paracontratuais”. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p. 126.
105 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Direito das obrigações. 4. ed., ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 470.
106 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Confiança e contradição: a proibição do comportamento contraditório
no Direito Privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015, p.142.
107 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Confiança e contradição: a proibição do comportamento contraditório no Direito Privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015, p.142.
as partes. Diante da existência de deveres principais e secundários decorrentes do princípio da boa-fé, Xxxxxxx Xxxxxx destaca que
Ao lado destes deveres principais, primários ou típicos, podem surgir, porém, na vida da relação obrigacional, outros a que, por contraste, podem chamar deveres secundários (ou acidentais) de prestação. Dentro desta categoria cabem não só os deveres acessórios da prestação principal (destinados a preparar o cumprimento ou a assegurar a perfeita execução da prestação), mas principalmente os deveres relativos às prestações substitutivas ou complementares da prestação principal (o dever de indenizar os danos moratórios ou o prejuízo resultante do cumprimento defeituoso da obrigação).” P. 122 “Diferentemente dos deveres primários ou secundários de prestação são os deveres de conduta, que, não interessando diretamente à prestação principal, nem dando origem a qualquer ação autônoma de cumprimento, são todavia essenciais ao correto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra.108
De tal forma, para que não se frustrem as expectativas legítimas da outra parte do vínculo, faz-se necessário observar certas regras de conduta delineadas pelo dever de lealdade e pela tutela da confiança.
Assim, faz-se necessário o estudo da proteção da confiança de modo a disciplinar as incidências de tal instituto quando existir, ou não, o rompimento das negociações preliminares.
Acerca das referências iniciais da proteção da confiança, o autor Xxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx diz que, no âmbito do direito civil, guardam importante relação com a teoria do negócio jurídico, na discussão entre a teoria da vontade e a teoria da declaração ocorrida no final do século XIX e no início do século XX.
A teoria da declaração, tendo como uma de suas ramificações a teoria da confiança, perfaz-se na noção de que a produção dos efeitos da declaração de vontade somente seria possível caso as partes guardassem entre si a confiança para realizar o que era pretendido. Segundo o autor referido:
a teoria da confiança consistia em uma das variantes da teoria da declaração, pois afirmava que a declaração de vontade produziria efeitos, ainda que não houvesse correspondência exata com a vontade e desde que gerasse confiança na parte contrária ou em terceiros.109
108 XXXXXXX XXXXXX, Xxxx xx Xxxxx. Das obrigações em geral. Xxx. X. 00. xx. Xxxxxxx: Almedina, 2017, p. 123.
109 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002, p. 170.
Cada pessoa deve agir como homem reto: com honestidade, lealdade e probidade. Levam-se em conta os fatores concretos do caso, não sendo preponderante a intenção das partes, a consciência individual da lesão ao direito alheio ou da regra jurídica. O importante é o padrão objetivo de conduta. Tal é o conceito advindo Código Civil Alemão, que, em seu parágrafo §242, já determinava um modelo de conduta.
Assim, a boa-fé objetiva constitui um preceito de conduta a ser observado nas relações obrigacionais e, portanto, ajusta-se à ideia de que o contrato é uma forma pela qual as partes buscam a consecução de fins previamente estabelecidos.
Em que pese os contratantes tenham interesses antagônicos, a busca pelo mesmo fim é causa para que eles ajam com ética, lealdade e boa-fé. Assim ensina Xxxxxxx Xxxxx que:
nos contratos, há sempre interesses opostos das partes contratantes, mas sua harmonização constitui o objetivo mesmo da relação jurídica contratual. Assim, há uma imposição ética que domina a matéria contratual, vedando o emprego da astúcia e da deslealdade e impondo a observância da boa-fé e lealdade, tanto na manifestação da vontade (criação do negócio jurídico) como, principalmente, na interpretação e execução do contrato.110
A imposição de uma ética contratual situa-se tanto na execução do contrato quanto nas negociações. De fato, observa-se que quando uma das partes possui comportamentos opostos à ideia de lisura, a relação obrigacional ou contratual se perfaz com solidez.
O mandamento de lisura, ou regra de conduta, regido pelo princípio da boa-fé objetiva engloba todos os que participam do vínculo obrigacional e estabelece, entre eles, um elo de cooperação, em face do fim a que visam.
A boa-fé possui múltiplas significações dentro do direito. Com relação ao das obrigações, manifesta-se como máxima objetiva que determina aumento de deveres, além daqueles que a convenção explicitamente constitui. Segundo Xxxxxx Xxxxx e Xxxxx, a boa fé “endereça-se a todos os partícipes do vínculo e
110GOMES, Orlando. A Constituição e seus reflexos no direito das obrigações. Novos temas de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p, 64-75.
pode, inclusive, criar deveres para o credor, o qual, tradicionalmente era apenas considerado titular de direitos.”111
No âmbito do ordenamento jurídico brasileiro, o legislador somente reconheceu na lei a necessidade de preservação da confiança através de uma regra geral no art. 422, do Código Civil de 2002, que o dever de lealdade e boa conduta devem pautar o comportamento das partes desde o início do planejamento, das negociações, até o momento final prolongado no tempo, do pós contrato.
Quando a sociedade é massificada, com padronização das relações sociais com consequências sociais e econômicas conhecidas, as situações de proximidade que geram confiança precisam de tutela especial, que leve em conta a necessidade de preservação de previsibilidade e certezas mínimas.112
De tal forma, é necessário que o ordenamento jurídico atribua eficácia para aquelas situações de confiança, tal qual atribui eficácia ao ato de vontade dirigido a uma finalidade, sob pena de instabilidade e segurança de um modelo negocial cada dia mais comum, baseado na estandardização de comportamentos.
Segundo o autor Xxxxxx Xxxx Xxxxxx Xxxxxx, “a proteção da confiança está presente em muitas normas legais do direito privado, mediante a disciplina de fatos que justificam o nascimento de direitos e deveres”.113
Porém, existem algumas situações em que o próprio instituto da confiança está em questão e não um bem a ser tutelado ou um conflito a ser solucionado no caso concreto. Nessas situações, o princípio da confiança ganha atenção, uma vez que será da sua aplicação direta que resultarão os efeitos jurídicos.
Existem alguns casos nos quais a confiança tem uma importância maior, justamente porque não é possível identificar a proteção legal de uma conduta. E, mesmo havendo proteção legal, nem sempre a simples análise da lei
111 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. Reimpressão. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006, p. 24.
112 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das
situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002, p. 174.
113 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das
situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002, p. 169.
permite a avaliação de qual é a conduta correta no caso concreto, como ocorre nos casos de incidência com cláusulas gerais.
Ao passo que a doutrina exerce grande relevância quanto a suas referências à confiança e à boa-fé, são escassos os estudos no direito brasileiro sobre tais casos, como também é raro a delimitação de circunstâncias que preconizam a invocação do princípio da confiança.
Somente com uma visão social do contrato e dinâmica das relações sociais é que se poderá identificar uma função e um papel para a confiança no ordenamento. Isso pressupõe a compreensão do ordenamento jurídico como uma estrutura normativa flexível, cuja flexibilidade é determinada pelos princípios jurídicos, cujos efeitos podem configurar uma relação cooperativa, determinando a proteção das expectativas legítimas que são criadas em razão do relacionamento contratual.114
Ainda de acordo com o autor Gerson Branco, “sem a confiança de uma parte sobre qualquer outra, o comportamento desta será mera esperança.”115 A quebra da confiança, por outro lado, segundo Xxxxxxx Xxxxxxxx, gera mais danos do que benefícios que podem advir de sua manutenção.116
Passando para uma ótica concreta dos fatos, a aplicação da proteção da confiança nos casos concretos transfere-se para a realidade do ordenamento brasileiro. Nas palavras de Xxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx: “A proteção da confiança cresce em importância e utilização na solução de conflitos, sendo, não raras vezes, inserida no âmbito da responsabilidade civil a fim de dar uma resposta adequada aos ‘novos’ litígios.”117
Quando a questão posta em discussão é uma expectativa, a consequência lógica imediata é a de que um sujeito espera a constituição de um direito em razão de estarem presentes vários fatos que conduzem à formação de um direito subjetivo.
114 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxx. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: XX, 0000, p.102.
115 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das
situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002, p. 169.
116 XXXXXXX XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx x. Xx xxx xx xx xxxxxxx xxxxx. Xxxxxxx: Xxxxxxxx, 0000, p 1.242.
117 XXXXXXX XXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxx. Responsabilidade civil e proteção jurídica da
confiança: a tutela da confiança como vetor de solução de conflitos na responsabilidade civil.
Curitiba: Juruá, 2016, p. 18.
Do mesmo modo, temos que a expectativa é uma questão de fato. Porém, quando há uma expectativa qualificada por uma norma ou princípio tutelado dita situação, o resultado é uma relação jurídica, com direitos e deveres, caracterizando uma expectativa legítima.118
Vinculada à boa-fé e à noção de confiança encontra-se o dever de lealdade. Acerca desse assunto, escreve Xxx Xxxxxx que o dever de lealdade, a partir do século XX, sob esforços da doutrina alemã, ocupou um papel fundamental na doutrina e que, juntamente com o princípio da boa-fé e aos bons costumes, foi capaz de regular e limitar as relações contratuais.119 De tal modo, o dever de lealdade assume a função de parâmetro de conduta.
Xxxxxxx Xxxxxxxx, em seu artigo sobre “A lealdade no direito das sociedades”, diz que a lealdade se traduz na característica do indivíduo de agir de modo correto e previsível. Para o referido autor, devido a confiança depositada, o beneficiário irá baixar as suas defesas naturais, deixará de tomar precauções que, de outro modo, seriam encaradas.120 O dever de lealdade, portanto, mantém uma relação direta com a tutela da confiança.
Como acima reportado, torna-se indispensável o presente estudo. Ao analisar a proteção das situações de confiança, busca-se a manutenção uma justiça contratual, cujos vínculos obrigacionais se fundamentam na proteção desconfiança entre as partes e no princípio da boa-fé.
1.2.3 Relação jurídica obrigacional como relação de cooperação
Neste ponto, abordar-se-á o vínculo obrigacional vinculado à uma ordem de cooperação entre as partes. De fato, observa-se que quando uma das partes possui comportamentos opostos à ideia de lisura, a relação obrigacional ou contratual se perfaz com solidez. Assim, a imposição de uma ética
118 XXXXXX, Xxxxxx Xxxx Xxxxxx. A proteção das expectativas legítimas derivadas das situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de Direito Privado. Vol. 12/2002, p. 174.
119FRAZÃO, Ana. Função social da empresa: repercussões sobre a responsabilidade civil de controladores e administradores de S/As. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 332.
120 XXXXXXX XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx e. A lealdade no direito das sociedades.
ROA, ano 66, volume III. Dezembro de 2006, p.1.
contratual está ligada diretamente ao dever de cooperação dentro da relação jurídica obrigacional.
Destarte, o princípio da boa-fé é determinante quando se fala em vínculo obrigacional. Segundo esse princípio, a parte deve agir de acordo com certos padrões mínimos de conduta socialmente recomendados, sempre observando os deveres de lealdade, correção ou lisura, aos quais por isso correspondem expectativas legítimas de outras pessoas.
Este dever de agir de acordo com a boa-fé impõe-se na medida em que as próprias relações obrigacionais não são possíveis sem um mínimo de confiança entre as pessoas. De tal forma, para que não se frustrem as expectativas legítimas da outra parte do vínculo, faz-se necessário observar certas regras de conduta delineadas pelo dever de lealdade e pela tutela da confiança.
O autor Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx, em consonância com que é dito por autores como Xxxxxx xx Xxxxx e Xxxxx, faz referência à amplitude da relação obrigacional121. Sendo a relação obrigacional algo que se desdobra em direção ao adimplemento e à satisfação dos interesses do credor, pode-se entender que as negociações dialogam com os institutos que caracterizam tais relações.
A compreensão da relação jurídica como processo está intimamente ligada ao reconhecimento do vínculo entre as partes enquanto ordem de cooperação. No que diz respeito à relação jurídica obrigacional e cooperação, Xxxxxx Xxxxxxx salienta que “não basta afirmar que, pela relação jurídica obrigacional, tem o credor direito de exigir do devedor o cumprimento da obrigação; antes se compreenda que o vínculo se estabelece entre as duas partes, ambas com direitos e deveres de prestação e cooperação em relação à outra.”122 Importa destacar que, diante da problemática da pesquisa, observa- se como vínculo obrigacional como ordem de cooperação também nas negociações preliminares.
Desse modo, Xxxxxx Xxxxxxx-Xxxxx explicita que a relevância dogmática da compreensão da relação de obrigação como um organismo complexo ao
121 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Direito das Obrigações. 12. ed. Coimbra: Almedina, 2018, p. 59.
122 XXXXXXX, Xxxxxx X. Descumprimento contratual: boa-fé e violação positiva do contrato.
São Paulo: Editora Quartier Latin do Brasil, 2014, pp. 78-79.
“evidenciar o fenômeno obrigacional pelo ângulo da complexidade, abrangendo a totalidade dos direitos, deveres, estados de sujeição, direitos formativos, direitos de exceção, pretensões, exceções e ônus jurídicos resultantes de um mesmo fato jurídico obrigacional.”123
Por esse motivo, Clóvis do Couto e Xxxxx conceituou vínculo como uma “ordem de cooperação, formadora de uma unidade que não se esgota na soma dos elementos que a compõem.”124 A doutrina passou, então, a considerar o vínculo obrigacional como um todo, o qual, muitas vezes, não se altera ou modifica com certas alterações e modificações sofridas pelas partes.
Dentro dessa ordem de cooperação, credor e devedor não ocupam mais posições antagônicas, mas sim, são mutuamente responsáveis pelo fim social obtido pelo contrato125.
Diante da perspectiva de que a relação jurídica obrigacional, seja ela no âmbito contratual ou no período de tratativas, está em consonância com o princípio da fidelidade à palavra dada, Xxxx Xxxxxx destaca que
Isso não significa, no entanto, que a relação obrigatória esteja esgotada com esse dever. Para qualquer relação jurídica, seja qual for a sua estrutura, rege o princípio do cumprimento prestar com fidelidade à palavra dada ou à obrigação fundamentada de qualquer Enfim, sem decepcionar a confiança da outra parte, isto é, cumprir o benefício de acordo com a boa fé.126
Ainda segundo Xxxxx Xxxxx, importante ressaltar sua opinião sobre a anunciação do tema sobre relação obrigacional e seus elementos. Para ele, “num sentido amplo, se entende por relação jurídica toda a situação ou relação da vida social disciplinada pelo direito, ou seja, produtora de consequências jurídicas.”127 Por outro lado, a relação obrigacional em sentido restrito refere-se
123 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. A boa-fé no Direito Privado: critérios para a sua aplicação. 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 231.
124 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. reimpressão. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006, p.19.
125 XXXXX X XXXXX, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 1. ed. 5. reimpressão. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2006, p. 33.
126 XXXXXX, Xxxx. Derecho de obligaciones. Versión española y notas de Xxxxx Xxxxxx Xxxx. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1958, p. 20. Tradução livre. No original: “Ello no significa, sin embargo, que la relación obligatoria se agote con ese deber. Para toda relación jurídica, cualquiera que sea su estructura, rige el principio de cumplir la prestación con fidelidad a la palabra dada o a la obligación fundamentada de cualquier modo que sea, sin defraudar la confianza de la otra parte, es decir cumplir la prestación según la buena fe.”
127 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx. Noções de Direito Civil. 3. Ed., remodelada e actualizada. Coimbra: Livraria Almedina,1991, p. 26.
“apenas as relações da vida social disciplinadas pela ordem jurídica mediante a atribuição a uma pessoa de um direito subjectivo e a correspondente imposição a uma pessoa de um dever ou de um sujeição.”
E é exatamente esse dever de cooperação que impera nas relações obrigacionais e que, no ponto que importa a esse estudo, influencia no dever de cooperar que os contratantes precisam se importar.
Xxxxxx Xxxxxxx-Xxxxx relaciona o entendimento da relação de obrigação com sua trajetória histórica, destacando que, somente por meio da referida abordagem, seria possível compreender a complexidade do todo formado pela relação e pelo dinamismo da relação obrigacional. A autora salienta que
A concepção exposta pelos autores germânicos desde a segunda metade do século XX também permitiu compreender, paralelamente à complexidade do ‘todo’ formado pela relação, o dinamismo da relação obrigacional. A expressão traduz a ideia de a relação de obrigação no transcorrer de sua existência, e de seu percurso em direção ao adimplemento poder gerar outros direitos e deveres que não os expressados na relação de subsunção entre a situação fática e a hipótese legal; ou, ainda, poderes e deveres não indicados no título (contrato), ou ainda, poderes formativos geradores, modificativos ou extintivos, e os correlatos estados de sujeição não vislumbrados na relação original; pode, por igual, importar na criação de ônus jurídicos e deveres laterais (‘deveres de proteção’) correspondentes a interesses de proteção que convivem a latere do interesse à prestação.”128
Xxxx Xxxxxx fala sobre a designação da relação jurídica como um nexo jurídico entre as pessoas, em que o termo nexo significa que toda relação jurídica representa uma vinculação.129 Destaca Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx que os “elementos se coligam em atenção a uma identidade de fim e constituem o conteúdo de uma relação de carácter unitário e funcional: a relação obrigacional complexa, ainda designada relação obrigacional em sentido amplo ou, nos contratos, relação contratual.”130
128 XXXXXXX-XXXXX, Xxxxxx. A boa-fé no Direito Privado: critérios para a sua aplicação. 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 232.
129 XXXXXX, Xxxx. Derecho Civil: Parte General. Traducción y notas de Xxxxxx Xxxxxxxxx y
Macías-Picavea. Edersa: Editorial Revista de Derecho Privado,1978, p. 248. Tradução livre. No original: “Hemos designado la ‘relación jurídica’ como um ‘nexo jurídico’ entre personas. El término ‘nexo’ indica que toda relación jurídica significa uma ‘vinculación’ – de uno o vários participantes, o de todos los demás em relación com el único titular.”
130 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Direito das Obrigações. 12. ed. Coimbra: Almedina, 2018, p. 74.
Ao lado do princípio da boa-fé, há os chamados deveres anexos ou laterais131, aos quais elucida Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx
(...) já não interessam directamente ao cumprimento da prestação ou dos deveres principais, antes ao exacto processamento da relação obrigacional, ou, dizendo de outra maneira, à exacta satisfação dos interesses globais envolvidos na relação obrigacional complexa132
Dentre os chamados deveres anexos, é de relevância para a doutrina os deveres de cuidado, de proteção, de informação, de cooperação, de colaboração, de assistência, de esclarecimento e de guarda.
Na esfera contratual, esses deveres são expressivos na manutenção do equilíbrio e consideráveis no auxílio do cumprimento da tarefa contratual pelos contratantes133. Dessa forma, para o presente estudo, ganha proeminência ensejadora de maior destaque o dever anexo de cooperação.
São as palavras de Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx acerca da compreensão da relação jurídica obrigacional e os vínculos essenciais que a constitui
“Há, portanto, uma compreensão de que toda a relação obrigacional, mesmo quando compreendida didaticamente pela separação de planos, deve sempre ser vista em sua dimensão complexa, a abarcar não apenas os vínculos essenciais que a constituem, mas igualmente os deveres acessórios que derivam da própria relação obrigacional.134
O verbo “cooperar” tem o sentido de operar simultaneamente, trabalhar em comum, colaborar. Em termos contratuais, o dever de cooperação se reflete em uma ideia de sempre colaborar para que o contrato atinja o fim para qual foi firmado. Será contrária ao dever de cooperação a ação que inviabilize a atuação da outra parte quando esta tentar cumprir sua obrigação.
Neste sentido, ressalta Menezes Cordeiro que
131 ITURRASPE, Xxxxx Xxxxxx. Interpretación económica de los contratos. Santa Fé: Xxxxxxxx- Xxxxxxx, 0000, p. 185.
132 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Direito das Obrigações. 12. ed. Coimbra:
Almedina, 2018, p. 66.
133 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxxxx. Princípio da Justiça Contratual. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 375.
134 CACHAPUZ, Xxxxx Xxxxxxx. A obrigação pelo discurso jurídico: a argumentação em temas
de Direito Privado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2018, p. 77.
a análise atenta da ideia possibilitar o cumprimento cedo revelou que estava em jogo, não apenas a abstenção de atitudes impedidtivas, mas ainda a necessidade de, por formas activas, facultar a actuação do devedor. Chegou-se assim aos devedores de colaboração por parte do credor. (...) manda que o devedor realize a prestação como o exija a boa-fé, com consideração pelos costumes do tráfego. Esta disposição também joga a seu favor: deve desenvolver o esforço requerido pela boa-fé, mas não mais do que isso ou, se se quiser, não lhe pode ser exigido nada que, da boa-fé, ultrapasse os limites135
Por fim, cumpre destacar que a noção técnica da relação obrigacional como relação de cooperação compreende também a fase das negociações. Isso porque, ao tratar a relação obrigacional como um organismo de totalidade complexa, não se pode retirar do âmbito de apreciação e de tutela a fase em que as partes estão já adstritas à relação. Portanto, há de se entender que a conduta dos sujeitos não deve ser apenas observada a partir da conclusão do contrato, mas também na fase pré-contratual.
2 RUPTURA IMOTIVADA DAS NEGOCIAÇÕES: no limbo entre direito contratual e responsabilidade civil
Este capítulo tem por objeto o aprofundamento nos aspectos históricos da responsabilidade pré-contratual, com fulcro na estreita relação que este instituto guarda com o pensamento do direito germânico. A ruptura imotivada das negociações será tratada sob a ótica da responsabilidade pré-contratual, destacando as diferenças e os efeitos encontrados na ruptura motivada e na ruptura imotivada, ou seja, sem motivo justo. Adiante, procura-se examinar o dano e indenização sob a ótica da ruptura imotivada das negociações e, por último, a figura da prescrição será analisada na ótica da responsabilidade contratual ou extracontratual.
Para tanto, será necessário traçar a importância das construções jurídicas elaboradas por Xxxxxx Xxx Xxxxxxx, em sua teoria da culpa in contrahendo e após, pelas ideias modificadas pelo jurista Xxxxxxxx Xxxxxxxx, este sendo o autor pioneiro a considerar o período das tratativas negociais como juridicamente relevante.
135 XXXXXXX XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001, p. 594.
Após a compreensão de tais premissas teóricas, passa-se a analisar o rompimento imotivado das negociações no âmbito dos elementos que circunscrevem as proposições sobre a responsabilidade pré-contratual.
Por fim, o último tópico preocupa-se em elencar critérios para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento do contrato verbal. Para tanto, os referidos critérios a serem examinados são aqueles que guardam similitudes em suas descrições e geram dificuldade de delimitação pela doutrina e jurisprudência, que são as tratativas ou negociações preliminares, contrato preliminar ou contrato-promessa.
Assim, o presente estudo pretende contribuir para caracterizar a responsabilidade pela ruptura imotivada das negociações no ordenamento jurídico brasileiro, permitindo que os institutos dialoguem com a evolução da ciência jurídica e com a realidade social na qual estão inseridos.
2.1 A ruptura imotivada das negociações no quadro da responsabilidade pré-contratual
A preocupação acerca da ruptura antecipada das negociações teve seus primeiros delineamentos com o jurista alemão Xxxxxx Xxx Xxxxxx, que se preocupava em traçar parâmetros comportamentais anteriores ao contrato, os quais serão objeto de estudo deste capítulo. Assim, a análise de aspectos históricos da responsabilidade pré-contratual, com fulcro na estreita relação que este instituto guarda com o pensamento do direito germânico. A ruptura imotivada das negociações será tratada sob a ótica da responsabilidade pré- contratual, destacando as diferenças e os efeitos encontrados na ruptura motivada e na ruptura imotivada, ou seja, sem motivo justo. Adiante, procura-se examinar o dano e indenização sob a ótica da ruptura imotivada das negociações e, por último, a figura da prescrição será analisada na ótica da responsabilidade contratual ou extracontratual.
De fato, Xxxxxxx, em sua obra Oeuvres choises, foi responsável por estimular as primeiras pesquisas acerca dos termos de responsabilidade
decorrente de condutas ocorridas durante as negociações dirigidas à conclusão de um contrato.
Com efeito, Xxxxxxx abriu caminhos para o estudo da formação dos contratos – e também sobre o período anterior às suas formalizações136 – sendo responsável por “estabelecer limites à autonomia privada no período das negociações, considerando-se não apenas o próprio interesse, mas também o da outra parte.”137
Após Xxxxxxx, o responsável pela dissipação de ideias sobre a ruptura das negociações foi o italiano Xxxxxxxx Xxxxxxxx.
Sustenta o referido jurista que
[...] até seu trabalho os estudiosos haviam apenas se ocupado da conclusão dos contratos, deixando de lado todo o período anterior, muitas vezes longo e trabalhoso, caracterizado pela realização de estudos, projetos e pesquisas complicadas e custosas. A doutrina de então entendia que todo o período das negociações não tinha relevância para o direito, ficando inteiramente ao arbítrio dos candidatos a contratante, que assim podiam romper as tratativas sem que houvesse qualquer conseqüência ou dever de esclarecer o porquê dessa atitude.138
As ideias de Xxxxxxx e Xxxxxxxx guardam similitudes entre si. Ambos são “movidos por um sentimento de justiça, não lhe sendo possível aceitar que uma das partes, após ter consentido à realização de tratativas, possa delas se retirar sem, ao menos, indenizar os danos causados ao outro candidato a contratante.”139
Todavia, Xxxxxxxx revela-se ainda mais importante para o assunto, quando comparado à Xxxxxxx, pois foi o primeiro a considerar o período das tratativas como juridicamente relevante. Segundo ele, o dever de reparar a outra parte não está condicionado à existência de um contrato. Nesse diapasão, são os apontamentos referidos por Xxxxxxx
136 XXXXXXX XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx x. Xx xxx-xx xx xxxxxxx xxxxx. Xxxxxxx: Almedina, 2001, p. 532.
137 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo:
Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 40.
138 XXXXXXXX, Xxxxxxxx. Fondamento giuridico dela responsabilità in tema di trattative contrattuali. In Archivo Giuridico Xxxxxxx Xxxxxxxx, Terza serie, v. XI. Roma, 1909, pp. 128-129. Xxxx XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 40.
139 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 40.
XXXXXXXX não nega a existência do direito do candidato a contratante dar por encerradas as negociações. Para o jurista italiano, todavia, a titularidade desse direito não o eximiria do dever de indenizar os danos causados à outra parte em função da mudança de sua vontade, que, inicialmente, visava concluir o contrato.
Note-se que XXXXXXXX não fundamentava essa responsabilidade na existência de um contrato, na culpa in contrahendo, numa eventual garantia, ou nas figuras do mandato ou da gestão de negócios, mas sim nas próprias negociações. Analisando o período anterior à conclusão do contrato, FAGGELLA conclui que, caso não seja atingido seu fim normal, qual seja, o êxito positivo ou negativo em função do esgotamento das negociações, a responsabilidade será de rigor, dado o caráter arbitrário e intempestivo da ruptura.140
Com efeito, as construções doutrinárias trazidas por Xxxxxx xxx Xxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxxxxxxx se confundem com a própria história do surgimento da responsabilidade pré-contratual.
Em que pese as referidas construções tenham sido muito criticadas, acabaram fundamentando a jurisprudência italiana do século XX141, principalmente no ponto em que a proteção dos candidatos a contratantes, cujas expectativas foram frustradas pelo agir contrário da outra parte.
Tais críticas proferidas à teoria de Xxxxxxx, quanto à garantia que as partes ofereciam em razões dos danos causados caso a celebração do contrato fosse inválida, foram bem delineadas por Xxxxxxx:
A teoria de Xxxxxxx foi duramente criticada pela doutrina posterior, que a acusou de ficcionista, na medida em que nenhuma das partes pretenderia garantir à outra com relação aos prejuízos havidos em decorrência da celebração inválida do contrato, não se podendo, por conseguinte, cogitar do encontro de declarações que caracteriza o negócio jurídico contratual. Além disso, Xxxxxxx teria alterado arbitrariamente o conceito de nulidade, atribuindo-lhe efeitos, quando, em regra, o nulo não pode gerá-los.142
De acordo com o jurista alemão, o fundamento da responsabilidade encontra-se no contrato. Assim, mesmo que o contrato seja celebrado de modo inválido, não há como estender a responsabilidade no caso da ruptura das negociações por se tratar de hipóteses em que não há contrato.
140 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 42.
141 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo:
Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 43.
142 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 44.
Por sua vez, o jurista italiano Xxxxxxx sustenta o caráter contratual da responsabilidade pré-contratual143. Neste entendimento, Xxxxxxx sustenta que
a boa-fé objetiva seria a fonte das obrigações a serem cumpridas no período contratual, ficando autorizado concluir, assim, que a responsabilidade pré-contratual teria natureza contratual no direito italiano, pois decorre do descumprimento de obrigações específicas, e não do dever genérico de não prejudicar terceiros.144
Após a compreensão das construções jurídicas elaboradas por Xxxxxx Xxx Xxxxxxx, em sua teoria da culpa in contrahendo e após, pelas ideias modificadas pelo jurista Xxxxxxxx Xxxxxxxx, passa-se a analisar o rompimento imotivado das negociações no âmbito dos elementos que circunscrevem as proposições sobre a responsabilidade pré-contratual, identificando, primeiramente, as hipóteses de ruptura das negociações sem motivo justo e de ruptura motivada. Adiante, será realizada a compreensão do dano e indenização em caso de responsabilidade pré-contratual e, por último, ainda nesta subdivisão, a abordagem será no ponto de verificar a prescrição em caso de responsabilidade contratual ou extracontratual.
2.1.1 Ruptura imotivada vs ruptura motivada
A fim de que se compreenda mais acerca da ruptura imotivada da negociação, o ponto traçará as diferenças entre ruptura imotivada e ruptura motivada. Ao realizar a referida distinção, objetiva-se a entender se a ausência ou presença de motivação no rompimento das negociações gera efeitos e indenização distintos. Para tanto, analisar-se-ão algumas jurisprudências de tribunais estaduais sobre o tema.
Inicialmente cumpre ressaltar que, conforme já superada a noção de que os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé também estão presentes na fase pré-contratual, Xxxxxx Xxxxx conceitua a responsabilidade pré-contratual
143 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 47.
144 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo:
Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 48.
“como aquela decorrente da violação dos deveres da boa-fé objetiva durante o amplo período de preparação do negócio jurídico.”145
A Alemanha, conforme previsão em seu Código em §242 do BGB, caracteriza a responsabilidade pré-contratual a partir da extensão do dever de agir conforme a boa-fé, que deve ser observado tanto no período anterior à conclusão do contrato quanto em sua execução. A este respeito:
O bem jurídico protegido, por meio do recurso à boa-fé objetiva, seria a confiança, o que autorizou até mesmo a afirmar-se que haveria uma nova categoria da responsabilidade contratual e extracontratual. Diante dos quadros mais restritivos da responsabilidade extracontratual, o intérprete do direito alemão, procurando ampliar as hipóteses de dano ressarcíveis, tende a refugiar-se no esquema contratual, sendo possível falar, com Dário Xxxxx Xxxxxxx, de uma verdadeira fuga para o contrato.146
No ordenamento jurídico brasileiro, o princípio da boa-fé objetiva foi positivado no artigo 422 do Código Civil, segundo o qual “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé”.
No período que antecede e no que sucede a conclusão do contrato, a boa-fé exerce papéis diferentes. No primeiro, é responsável por direcionar certos padrões de conduta nas negociações, enquanto que no segundo é aplicada visando a satisfação total dos interesses contratualmente ajustados.
Nesse ponto, destaca-se uma ação de indenização julgada pelo Tribunal de São Paulo, em que houve a configuração de responsabilidade civil por ofensa aos deveres da boa-fé objetiva na fase pré-contratual
Ação de indenização por danos morais e materiais Sentença de procedência em parte Insurgência do réu Responsabilidade civil pela ofensa aos deveres da boa-fé objetiva na fase pré-contratual (puntuação) Fase de tratativas avançadas geraram a justa expectativa nos autores em acreditar que o negócio seria firmado Realização de uma série de diligências por parte dos autores para a formalização do negócio Prejuízos materiais configurados Dever de indenizar Danos morais Inocorrência Dissabores enfrentados pelos
145 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. A responsabilidade pré-contratual por ruptura injustificada das negociações. Revista a 1, n. 2, 2012, p. 2. A autora reitera que a afirmação certa do conceito de responsabilidade pré-contratual “põe em relevo que o fundamento teórico da responsabilidade repousa na boa-fé objetiva, correspondente à Treu und Glauben do direito alemão, posto que a categoria geral dos deveres de consideração decorre substancialmente do mandamento da lealdade, ínsito ao princípio.”
146 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 51.
autores que não são suficientes para ensejar abalo moral Sucumbência recíproca Recurso provido em parte.147
O Magistrado entendeu que a fase das tratativas mais avançada gerou a justa expectativa nos autores em acreditar que o negócio seria realizado. Importante destacar alguns argumentos enunciados pelo Magistrado a fim de justificar seu entendimento
Desta forma, conclui-se que as partes avançaram de forma profunda nas tratativas, tendo os autores, confiando no desejo do réu de firmar o negócio, realizando inúmeras despesas antecipatórias para concretizar o negócio.
Como é cediço, as partes devem guardar, tanto na conclusão do contrato como na sua execução, a boa-fé objetiva, garantindo-se a segurança das relações negociais, devendo os contratantes zelar pela confiança recíproca, além de prestarem todos os esclarecimentos e informações acerca dos termos do negócio e das expectativas envolvidas, deixando claro suas intenções a fim de não gerar falsa ilusão no outro contratante. Tais deveres possuem especial relevância na fase de tratativas.
Não obstante não se negue que a fase de negociações preliminares não vincule as partes quanto à celebração do contrato definitivo, não há dúvidas de que é perfeitamente possível a responsabilização civil nessa fase do negócio jurídico pela aplicação do princípio da boa- fé.148
Importa ressaltar, contudo, que os comportamentos de lisura observados no período das negociações também são de imensa importância no período que sucede a conclusão do contrato.
Traz-se uma ótima da boa fé e sua influência na responsabilidade civil. Xxxxxxxx Xxxxxxxxx demonstra uma concepção objetiva de boa-fé como um comportamento baseado na lealdade, independentemente de considerações subjetivistas e que veio para atribuir “coercividade ao propósito de construção
147 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0000320-86.2013.8.26.0069. 3ª Câmara de Direito Privado. Bastos, em 12 de março de 2018. Disponível em: < xxxxx://xxxx.xxxx.xxx.xx/xxxx/xxxXxxxxxx.xx?xxxxxxxxxxxxxxx&xxXxxxxxxx00000000&xxXxxxx0&xx dCaptcha=sajcaptcha_3a5ca5461da943c3a3591279fe27008a&vlCaptcha=xrr&novoVlCaptcha=
>. Acesso em: 03 dez. 2018.
148 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 0000320-86.2013.8.26.0069. 3ª Câmara de Direito Privado. Bastos, em 12 de março de 2018. Disponível em: < xxxxx://xxxx.xxxx.xxx.xx/xxxx/xxxXxxxxxx.xx?xxxxxxxxxxxxxxx&xxXxxxxxxx00000000&xxXxxxx0&xx dCaptcha=sajcaptcha_3a5ca5461da943c3a3591279fe27008a&vlCaptcha=xrr&novoVlCaptcha=
>. Acesso em: 03 dez. 2018.
de um ambiente relacional marcado pela confiança recíproca e pelo respeito aos interesses alheios.149”
Ante a ideia de que geraria instabilidade ao ordenamento jurídico caso o princípio da boa-fé fosse observado apenas na execução dos contratos, relevantes são as palavras de Xxxxxxxxx Xxxxxxx:
Não se pode pinçar a boa-fé do direito contratual, desconsiderando que praticamente todas as demais disposições do direito dos contratos não encontram aplicação possível no período das negociações para sustentar o caráter contratual da responsabilidade contratual serve para demonstrar que a recondução da responsabilidade pela ruptura das negociações a um esquema contratual é equivocada.150
A parte que, nas negociações preliminares, procede deslealmente ferindo a tutela da confiança viola deveres que são impostos pelo princípio da boa-fé objetiva e que impõem a não interrupção injustificada das tratativas, a informação leal, o sigilo quanto a informações recebidas da contraparte e, em geral, a não indução desta a erro.
No cenário do direito das obrigações, são os deveres fiduciários (ou anexos) os responsáveis pela noção de agir de modo desleal. Tais deveres são capazes de direcionar o relacionamento obrigacional, seja ele contratual, pré- contratual, pós-contratual ou até supracontratual, de modo a apontar o que é legítimo esperar da outra parte.
Desse modo, todas as fases da negociação devem ser pautadas de acordo com os padrões socialmente recomendados, de lisura e lealdade, baseando-se na tutela da confiança, que caracterizam o chamado princípio da boa-fé contratual.
Assim, segundo Xxxxxx Xxxxx, o indivíduo que encerrar as tratativas em consonância com a boa-fé e seus deveres laterais, age de modo legítimo e não se responsabiliza pelos danos causados, podendo “afirmar que, em princípio, em função da liberdade contratual, as partes são livres para iniciar e abandonar as negociações preliminares sem estarem sujeitas a indenizar os gastos
149 XXXXXXXXX, Xxxxxxxx. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 54.
150 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 58.
dispendidos na preparação do futuro contrato, os quais devem ser suportados por cada uma.151” Desse modo, verifica-se que o comportamento pautado na lealdade e na lisura sobrepõe-se à liberdade de contratar quando um candidato a contratante resolve abandonar as negociações preliminares.
Assim, nas palavras de Xxxxxxxx Xxxxxxx, os deveres laterais de conduta decorrentes do princípio da boa-fé objetiva são também nomeados como deveres fiduciários e traduzem-se em “deveres de cooperação com a contraparte.”152, como também já foi compreendido por um dos tópicos explorados na primeira parte desta pesquisa.
Assim, por ser o princípio da boa fé contratual um alicerce da relação obrigacional, a violação dos deveres por ele impostos implica obrigação de reparar o dano.
Na hipótese de responsabilidade pré-contratual há um vínculo voltado para a formação de um futuro contrato queimpõe aos indivíduos o dever de não frustrar as expectativas legitimamente criadas pelos seus próprios atos.
Acerca da responsabilidade pré-contratual, Noronha dispõe que
a parte que nas negociações preliminares procede deslealmente viola deveres que são impostos pelo princípio da boa-fé objetiva e que impõe a não interrupção injustificada das tratativas, a informação leal, o sigilo quanto a informações recebidas da contraparte e, em geral, a não indução desta em erro.153
Inicialmente, importa ressaltar que no Código Civil de 2002, um ato ilícito pode ser caracterizado por abuso de direito independente da noção de culpa, uma vez que decorre da violação da boa-fé objetiva, conforme demonstrado no primeiro capítulo.
Em que pese seja um ato ilícito caracterizado por abuso de direito independente de culpa, não seria a ruptura das negociações objeto de aferição de culpa, conforme examina Xxxxxxx:
151 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 279.
152 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Direito das obrigações. 4. ed., ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 101.
153 XXXXXXX, Xxxxxxxx. Direito das obrigações. 4. ed., ver. e atual. São Paulo: Saraiva,
2013, p.456.
[...] decorrendo a responsabilidade pela ruptura das negociações do exercício abusivo de um direito, não seria relevante, em princípio, a aferição de culpa. Ocorre, entretanto, que o parágrafo único do art. 927 estabelece que somente haverá obrigação de reparar em caso de ato ilícito quando o dano for causado culposamente, salvo as exceções legais, ou quando a atividade desenvolvida implicar, por sua natureza, risco para terceiros. Assim, continua vigendo no direito civil brasileiro o princípio de que a caracterização da responsabilidade civil reclama a presença de culpa, ao menos como regra.154
Assim, cumpre examinar qual o papel da culpa na rompimento preliminar das negociações, caso fosse considerada como elemento necessário à configuração do dever de indenizar.
Desta forma, quando um sujeito, através de sua conduta, desperta expectativas em outro, ele se autovincula àquela e, caso modifique-a, causando danos ao sujeito que pautou seus atos na expectativa gerada, pode ser.
De maneira geral, a palavra imotivada refere-se à ausência de motivo, de justificação e que, em conseqüência, é termo chave para a compreensão do objeto de pesquisa e para responder a problemática desta. Relevante ressaltar que o termo ruptura imotivada também é costumeiro para fazer referência à ruptura injustificada das tratativas155. Xxxxxxx Xxxxx conceitua a ruptura da injustificada como aquela “ilegítima, arbitrária, intempestiva, sem justa causa, como um comportamento desleal.”156
A fim de conceituar e estabelecer o conceito de ruptura injustificada ou imotivada, Xxxxxx Xxxxx propõe ao leitor a reflexão acerca de um exemplo prático cotidiano
Pense-se, por exemplo, na hipótese em que alguém inicia e, em seguida, rompe as negociações por se encontrar em dificuldades financeiras impeditivas da assunção de obrigações ou ainda a situação na qual a parte rompe as negociações por descobrir aspectos pessoais da contraparte, os quais abalaram a confiança
154 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 56.
155 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx. Responsabilidade civil pela ruptura das negociações
preparatórias de um contrato. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 60. O autor diz que ruptura injustificada é aquela ilegítima e de comportamento desleal, o que se relaciona com a ideia de ruptura imotivada das negociações, uma vez que esta se refere à ausência de motivo justo.
156 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx. Responsabilidade civil pela ruptura das negociações preparatórias de um contrato. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 60.
nela depositada e que, se revelados, podem lesar seus bens, direitos ou interesses. Seria extremamente constrangedor e prejudicial se a parte fosse obrigada, pelo simples fato de ter entrado em negociação, a divulgar tal situação. Por outro lado, a contraparte precisa também ser protegida no seu interesse em não ser envolvida em negociações inúteis e despendiosas.157
Diante do exposto, importante ressaltar que as partes são livres para abandonar as negociações de modo que não precisam ficar adstritas a elas. Todavia o equilíbrio desse conflito de interesses está em as partes serem livre para realizar a ruptura das negociações, ao mesmo tempo em que o rompimento gera danos à outra parte.
Assim, é esperado daquela parte que rompe as negociações um agir em conformidade com os deveres laterais de conduta, conforme a lisura, a boa-fé, destacando a fidelidade da palavra empenhada, de modo que “quem pretende romper as negociações deve apresentar para a outra um motivo justificável, pois essa é a conduta leal e honesta exigida pela boa-fé observada e esperada no comércio jurídico.158“
Quando uma parte transfere-se à outra expectativa e confiança legítimas de que vão concluir e celebrar o contrato, ela não pode, a partir desse momento abandonar as negociações sem um justo motivo, pautado no princípio da boa-fé objetiva, uma vez que, em o fazendo, a referida parte deve ressarcir os danos e prejuízos causados pela outra159. Isso é devido porque se caracteriza como comportamento desleal, conforme Menezes Cordeiro:
Os deveres de lealdade vinculam os negociadores a não assumir comportamentos que se desviem de uma negociação correcta e honesta. Ficam incluídos os deveres de sigilo (...) de cuidado (...) e de actuação conseqüente – não se deve, de modo injustificado e arbitrário, interromper-se uma negociação em curso, salva, como é natural, a hipótese de a contraparte, por forma expressa ou por comportamento concludente, ter sido avisada da natureza precária dos preliminares a decorrer.160
157 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 298.
158 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 298.
159 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 280.
160 XXXXXXX XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx x. Xx xxx-xx xx xxxxxxx xxxxx. Xxxxxxx: Almedina, 2001, p. 583.
As informações trazidas à baila pro Menezes Cordeiro corroboram para justificar o entendimento do julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, realizado pelo Desembargador Relator Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, em que não restou configurada a responsabilidade civil pré-contratual pela ruptura imotivada das negociações e, por consequência, não teve o dever de indenizar a outra parte por danos materiais e lucros cessantes.
RESPONSABILIDADE CIVIL PRÉ- CONTRATUAL. NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES A CONTRATO DE PERMUTA DE IMÓVEL POR ÁREA CONSTRUÍDA NO LOCAL. INTERESSE NA EDIFICAÇÃO DE UNIDADES COMERCIAIS. PROJETO NÃO APROVADO NA PREFEITURA. PROVA INSUFICIENTE QUANTO À ANUÊNCIA DO PROPRIETÁRIO COM ELABORAÇÃO DE PROJETO DE PRÉDIO RESIDENCIAL. AUSÊNCIA DE RUPTURA INJUSTIFICADA DAS TRATATIVAS. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR DANOS MATERIAIS E LUCROS
CESSANTES NÃO CONFIGURADA. Conforme a teoria da responsabilidade civil pré-contratual, a ruptura injustificada de tratativas, ao lesar legítimas expectativas, gera a obrigação de indenizar os prejuízos decorrentes da não conclusão do negócio. Hipótese em que as negociações preliminares a contrato de permuta de imóvel por área construída no local restou frustrada porque não aprovado na Prefeitura o projeto para construção de unidades comerciais. Prova insuficiente para demonstrar que o réu tenha anuído com a elaboração de projeto para construção de prédio residencial no terreno. Inocorrência de ruptura injustificada e arbitrária das tratativas. Obrigação de indenizar danos materiais e lucros cessantes decorrentes da não conclusão do negócio descaracterizada. Improcedência da ação mantida. A contratação de profissional para patrocinar ação judicial decorre de liberalidade do litigante, não podendo ser imputada à parte contrária. Não há respaldo legal para a cobrança de honorários contratuais a título de danos materiais. Ausente prova de que o reconvinte tenha sofrido abalo moral por ocasião da propositura da ação, tem-se que a situação vivenciada configurou-se como mera irritação, mágoa e sensibilidade exacerbada, as quais estão fora da órbita do indenizável. Reconvenção improcedente. RECURSOS DESPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70068354216, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx, Julgado em 26/07/2017)161
Superadas as questões envolvendo a ruptura imotivada das negociações e ruptura motivada, passa-se para o próximo ponto, o qual tem
161 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70068354216. 9ª Câmara Cível. Relator Des. Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxx. Porto Alegre, em 26 de julho 2017. Disponível em:
<xxxx://xxx0.xxxx.xxx.xx/xxxx_xxx/xxxxxxxx/xxxxxxxx_xxxxxxxx.xxx?xxxx_xxxxxxxxXxxxxxxxxxx
+Justi%E7a&versao=&versao_fonetica=1&tipo=1&id_comarca=700&num_processo_mask=700 68354216&num_processo=70068354216&codEmenta=7379887&temIntTeor=true>. Acesso em: 01 dez. 2018.
como objetivo de a compreensão do dano e indenização no campo da responsabilidade pré-contratual por rompimento injustificado das negociações.
O ponto tem por objetivo a compreensão dos elementos dano e indenização no que diz respeito a responsabilidade pré-contratual, na hipótese de ruptura imotivada das negociações. Para tanto, será necessário conceituar os estudos realizados inicialmente por Xxxxxx xxx Xxxxxxx acerca de dano positivo e dano negativo (que também pode ser nomeado como interesse negativo e interesse positivo162).
Visto que o elemento central do ressarcimento aos danos na fase pré- contratual pauta-se no princípio do neminem laedere, as partes que agem com culpa ou dolo e violando o princípio da boa-fé cometem ato ilícito. Assim é a visão de Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
O fundamento para a reparação nas situações de danos ocorridos na fase pré-contratual estaria no princípio geral do neminem laedere, ou seja, no dever geral de não causar dano a outrem imposto pelo ordenamento jurídico. Assim, aqueles que, agindo com dolo ou culpa, não cumpram com os deveres emanados da boa-fé objetiva, causando dano a alguém no período das tratativas, estariam incorrendo em um ato ilícito, seguindo, em nosso ordenamento, o previsto no art. 186 do Código Civil.163
A respeito da compreensão do ato ilícito na fase pré-contratual, Xxxxxxx Xxxxxxx sustenta que “o delito, ato ilícito absoluto, cria relação jurídica obrigacional, sendo, nesse sentido, “fonte” de obrigações.”164 Assim, o rompimento das tratativas de modo injustificado é considerada fonte obrigacional em razão do ato ilícito.
Doutrina e jurisprudência, segundo Xxxxxxxxx Xxxxxxx, sustentam que
“em caso de violação de um dever pré-contratual deve ser ressarcido o
162 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx. O ressarcimento do dano pré-contratual. São Paulo: Almeidina, 2017, p. 23.
163 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx. O Ressarcimento do Dano Pré-Contratual. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000, p. 133-134.
164 XXXXXXX, Xxxxxxx xx X. Do neminem laedere à visão concreta da responsabilidade civil: a
natureza contratual da responsabilidade pela ruptura imotivada das negociações. RIDB, Ano 2 (2013), nº 2, p. 1515.
interesse contratual negativo, embora quando se pretende precisar esta afirmação, surjam dúvidas e incertezas.165”
Conexa à ideia de que o interesse contratual negativo deve ser reparado na hipótese de violação dos deveres de conduta decorrentes do princípio da boa-fé na fase pré-contratual, Xxxxx Xxxxxxx adiante que a responsabilidade pré-contratual como tipologia de responsabilidade contratual resultou na tutela jurídica do ressarcimento dos danos causados.
A qualificação da responsabilidade pré-contratual como tipologia de responsabilidade contratual remete-se originariamente ao pensamento de Xxxxxxx. Ao elaborar sua teorização em torno da culpa in contrahendo, o autor buscou fundamentar as consequências jurídicas do problema exposto na existência de uma hipótese de responsabilidade contratual. Como observado anteriormente, a construção teórica de Xxxxxxx estava apoiada nos institutos de direito romano até então vigentes. A natureza jurídica, nesse contexto, era demasiadamente importante, pois era a essência do instituto o elemento definidor da ação que seria concedida ao lesado para requerer a tutela jurídica e o consequente ressarcimento dos danos ocasionados.166
A questão da acerca do ressarcimento apenas do dano emergente ou também de lucros cessantes, o dano previsível ou dano imprevisível167, em caso de responsabilidade pré-contratual e pela ruptura das negociações, é questão polêmica entre a doutrina e jurisprudência. Isso porque, a maioria dos casos concretos trazem expressões vagas ou de difícil comprovação, não oferecendo elemento algum suficiente para determinar os limites quantitativos do interesse negativo.
Xxxxxxx descreve críticas acerca das teorias ecléticas, que são aquelas que “consideram a culpa in contrahendo ora de natureza contratual, ora de natureza extra-contratual”168. O autor destaca, ainda, que as opiniões isoladas
165 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 135.
166PEREIRA, Xxxxx Xxxxxxx. O Ressarcimento do Dano Pré-Contratual. São Paulo: Xxxxxxxx,
0000, p. 137-138.
167 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 135.
168 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 136. O autor identifica três dos mais comuns casos analisados pela teoria eclética da culpa in contrahendo: “a) Primeiramente, sustentou-se que, se um sujeito foi dolosa ou culposamente causa da nulidade de um contrato, a sua respnsabilidade seria de natureza aquliana; enquanto que no caso de anulabilidade a originária culpa in contrahnedo é ssubstituída pela culpa contratual comum com as suas
trazidas tem pouca aceitação pela doutrina, sendo uma maior rejeição observada na Itália uma vez que nesse país “prevalece a ideia de que a violação do dever de boa-fé, imposto pelo artigo 1337 às partes em negociações, é fonte de responsabilidade extra-contratual.169”
A fim de justificar que a violação do dever de boa fé, para o direito italiano, é fonte de responsabilidade extracontratual, Benatti evidencia cinco argumentos
I) O art. 1337 é uma aplicação do princípio do neminem laedere. De facto, no comportamento de quem transgride o dever de correcção são reconhecíveis os caracteres próprios do chamado facto ilícito; isto é, trata-se de um comportamento doloso ou culposo, que produz a outrem um dano e que gera uma obrigação de ressarcimento; II) O art. 1337 é uma norma desprovida de sanções e, portanto, deve enocntrar a sua integração na disposição de carácter geral do art. 2043; III) A responsabilidade pré-contratual apresenta-se como uma manifestação da culpa extra-contratual comum, pois nas negociações não se estabeleceu um vínculo contratual; IV) Não se pode falar em responsabilidade contratual desde que na fase das negociações falta um vínculo obrigatório; V) Se da violação do art. 1337 derivasse uma responsabilidade contratual, caberia ao demandado afastar a presunção de culpa sua – e como segundo o art. 1337 culpa equivale a má fé, quereria isso dizer que ele se presumiria de má fé, o que constituiria uma singular excepção ao princípio geral pelo qual a má fé nunca se presume (Cfr. 1147)170
O que se depreende das explanações de Xxxxxxx acerca da fonte de responsabilidade extracontratual é que, a partir de um exame crítico de cada uma das opiniões expostas, questiona-se “se é exacta a premissa de que elas partem, isto é, que o contacto social, que se inicia entre as partes nas
normais conseqüências; b) Escreveu-se depois que, em caso de estipulação de um negócio válido, a culpa na formação do contrato reflectir-se-ia sobre sua a sua execução e transformar- se-ia, por isso, em culpa no cumprimento. Esta posição não tem em conta a elementar consideração de que os deveres pré-contratuais surgem na fase anterior à conclusão do contrato, e, assim, a construção destas obrigações e da responsabilidade correspondente à sua violação, como efeito negocial, constitui uma evidente inversão lógica; c) Tem-se, finalmente, afirmado que a natureza da culpa in contrahendo não pode ser identica porque, ao lado dos deveres de informação, etc existiria, no período que antecede a estipulação do negócio, um dever geral de comportar-se segundo a boa fé. Daí derivaria que, enquanto a violação dos primeiros daria sempre lugar a responsabilidade contratual, a violação dos primeiros daria sempre lugar a responsabilidade contratual, a violação do segundo determinaria uma responsabilidade aquiliana.”
169 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 137.
170 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade pré-contratual. Tradução de Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx
e Xxxxxx Xxxxxx. Coimbra: Livraria Xxxxxxxx, 0000, pp. 139-140.
negociações, não pode ser considerado fonte de uma relação de obrigações.”171
Antes a já referida explanação acerca do interesse contratual negativo na hipótese de responsabilidade pré-contratual, Xxxx Xxxxxxx delimita a quebra positiva do contrato, destacando que “de um modo bastante genérico, podemos definir a quebra positiva do contrato como sendo uma lesão culposa da obrigação, que não tenha como fundamento a impossibilidade ou a mora.172”
Além de conceituar a violação positiva do contrato, a autora destaca a sua influência com o princípio da boa-fé, a qual também corresponde à violação de deveres secundários
Na violação positiva do contrato, a boa-fé é chamada a depor em dois níveis: no campo da determinação de deveres secundários e no campo de delimitação da própria prestação principal. A violação positiva do contrato, assim como a culpa in contrahendo, tem sido considerada uma importante descoberta da doutrina posterior à publicação do BGB, destacando-se, neste mister, a obra de Xxxxxxx Xxxxx, publicada em 1902, sob a denominação de Die positive Vertragsverletzunger. Na verdade, a origem dessas novas concepções é mais recuada, tendo seu início com os estudos de Xxxxxx xxx Xxxxxxx sobre a responsabilidade pré-contratual, em que ele afirmava ser relevante a consideração da boa-fé na celebração dos contratos nulos ou anuláveis.173
Assim, algumas referências e elementos acerca da violação positiva dos contratos podem ser trazidos para relacionar o rompimento imotivado das negociações, uma vez que a hipótese de ressarcimento desta está diretamente vinculada ao agir conforme a conduta de lisura, em consonância com os deveres laterais decorrentes da boa-fé e pautada, ainda, na proteção da confiança legítima das partes que aguardam a celebração do contrato.
O tópico seguinte tem por escopo definir o que se entende pela responsabilidade contratual e extracontratual e definir se a dicotomia entre suas significações foi superada.
171 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 140.
172 XXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxx de. A quebra positiva do contrato. In: Revista da AJURIS, n.
44, Ano XV, nov. 1988, p. 144.
173 XXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxx de. A quebra positiva do contrato. In: Revista da AJURIS, n. 44, Ano XV, nov. 1988, p. 144-152.
2.1.3 Responsabilidade contratual ou extracontratual: prescrição
O ponto propõe-se a examinar a responsabilidade contratual e a extracontratual no que se refere à prescrição, com o objetivo de compreender esta figura quando do descumprimento de um contrato verbal ou no caso de ruptura das negociações.
O contato entre os indivíduos é causa potencial para o surgimento de conflitos e que é tarefa do Direito definir em que situações os danos que uma parte causa a outra são relevantes sob a ótica jurídica, de maneira que o lesado possa exigir do ofensor a reintegração do status quo ante ou a reparação do que a pessoa sofreu174.
Inicialmente cumpre ressaltar que a divisão na esfera da responsabilidade decorre de fenômenos como o contrato e a responsabilidade civil em sentido estrito. Desse modo, a responsabilidade contratual refere-se a violação de uma obrigação preexistente, enquanto que a responsabilidade extracontratual cuida da violação de um dever intrinsecamente jurídico de causar dano ao outrem. Assim,
A distinção entre a responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual decorre das duas grandes classes da obrigação moderna, ou seja, o contrato e a responsabilidade civil em sentido estrito. A responsabilidade contratual, como espécie do gênero responsabilidade negocial (pois há responsabilidade decorrentes de outros negócios jurídicos não contratuais), constitui uma sanção, entre outras, para o inadimplemento da obrigação pelo devedor. A responsabilidade contratual trata da violação de uma obrigação preexistente, entendida em seu sentido técnico; enquanto que em matéria extracontratual, cuida-se da violação de um dever jurídico geral de não causar dano a ninguém, o que leva, por seu turno, à distinção conceitual entre inadimplemento e fato ilícito.175
No sistema de Direito romano-germânico176, há dois grandes modelos de responsabilidade civil extracontratual, quais sejam, o francês e o alemão.
174 PEREIRA, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 7.
175 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos.1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 26.
176 Xxxx Xxxxx. Os Grandes Sistemas
Segundo Xxxxx Xxxxxxxx “o modelo moderno francês surgiu com o Código de Xxxxxxxx, que previu em seu art. 1.382 uma cláusula geral de responsabilidade civil extracontratual.177” Segundo o referido artigo, a interpretação da norma leva a crer que, em razão de seu conteúdo indefinido, quase nenhuma limitação é imposta ao dever de reparar o dano178.
Há, portanto, uma dificuldade enfrentada pelo aplicador da norma do sistema francês uma vez que a norma explicita uma grande liberdade na tipificação ou não do dever de indenizar. Pouca indicação é dada no que se refere aos bens jurídicos que são passíveis de proteção pelo sistema regedor dessa responsabilidade e dos três elementos que configuram a responsabilidade extracontratual: a culpa (faute), o dano (dommage) e o nexo de causalidade (lien de causalité).179
De certa forma, o segundo grande modelo de responsabilidade civil existente no sistema romano-germânico, o alemão, guarda referências com o Código Civil Francês180. Contudo, a diferença entre a redação dos artigos do modelo francês e do alemão acerca da responsabilidade civil extracontratual era que, no primeiro, tratava de “grande regra geral de responsabilidade civil extracontratual” enquanto que, no segundo, era um “sistema das três primeiras regras gerais de responsabilidade civil extracontratual”181
177 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 9.
178 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 9.
179 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 10.
180 PEREIRA, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, pp. 10-11. Xxxxxxxx diz que é “interessante observar que a primeira redação do Projeto do Código Civil alemão (BGB) também continha, em seu parágrafo 704, I, por influência do Código Civil francês, uma norma geral de responsabilidade civil extracontratual, muito semelhante à do art.
1.382 do Código de Napoleão. Durante as discussões do projeto, contudo, saiu vencedora a tese de que uma norma geral sobre responsabilidade civil iria deixar excessivamente abertas as hipóteses em que teria alguém direito de exigir de outrem a reparação do dano sofrido. Diante disso, na segunda redação do projeto do BGB, já não constou uma cláusula geral de responsabilidade civil, conforme o modelo francês.”
181 PEREIRA, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 11.
Assim, verifica-se, que a aplicação das normas nos dois grandes modelos obteve resultados quase semelhantes, conforme a visão apresentada por Xxxxx Xxxxxxxx
Na prática, visualizada a aplicação que os Tribunais franceses e alemães dão às suas respectivas regras de responsabilidade civil, verifica-se, conforme constatado pelo comparativista XXXXXXX XXXXX, que os resultados acabam sendo muito semelhantes, na medida em que o sistema alemão funciona por adição, ou seja, torna indenizável toda lesão a direitos definidos na lei, mais os casos a eles equiparados; enquanto o sistema francês funciona por subtração, ou seja, todos os danos são indenizáveis, menos aqueles para os quais haja uma causa excludente.182
Assim, o legislador brasileiro optou, conforme artigo 159183 do Código Civil brasileiro, pelo modelo francês de responsabilidade civil. Em que pese tenha o Código Civil brasileiro sido esquematizado segundo o modelo alemão do BGB, a regra de responsabilidade civil foi claramente inspirada pelo artigo
1.382 do Código Civil francês184.
Assim como visto no ponto anterior, quem viola um dever pré- contratual de é obrigada a ressarcir o dano causado. Diante do fato, faz-se necessário conceituar as normas em que a responsabilidade é configurada.
A distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual é referida, por alguns autores por já superada e uma que sua linha divisória de elementos é quase imperceptível. Assim, Xxxxx Xxxx diz que a unificação das figuras da responsabilidade é capaz de refletir em uma noção complementar denominada obrigação
No direito privado, a distinção configurou quase um dogma, isto é, uma aparente verdade aceita como tal, sem grandes discussões. Porém, as transformações ocorridas em ambas tornaram imprecisa a linha divisória, tendo alguns autores cogitado de sua superação, em prol da unificação dos sistemas de responsabilidade civil, em virtude do reconhecimento de funções comuns e de nova concepção de responsabilidade, como noção complementar de uma noção maior,
182 PEREIRA, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, pp. 13-14.
183 “Artigo 159 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.” Em:BRASIL. Lei 10.406, de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxx/0000/x00000.xxxx> Acesso em: 20 dez. 2018.
184 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. A responsabilidade civil pré-contratual: Teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Xxxxxxx, 0000, p. 14.
denominada obrigação, entendida esta como estrutura complexa, caracterizada pela existência de deveres gerais, coligados ao dever central, em “um nexo funcional unitário” (Xxxxxxxxx Xxxx, 2004: 291). O Código Civil de Québec, de 1991, definiu como um de seus objetivos essenciais a unificação dos dois ramos de responsabilidade, notadamente no art. 99.185
Com efeito, “as expressões responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual não são mais que fórmulas que traduzem uma determinada disciplina normativa.186” Portanto, conforme Xxxxxxxxx Xxxxxxx, sustenta que a culpa in contrahendo está sujeita às próprias e autônoma, com a ressalva de que tão afirmação não é completamente exata187.
Diante da perspectiva marcada pelo momento anterior à formação do contrato, Xxxxxxx faz uma crítica destacando que não se pode aplicar o regime de responsabilidade contratual ante a inexistência de um negócio jurídico
Para os adeptos da tese extracontratualista, como a responsabilidade pré-contratual materializa-se em momento anterior à formação do próprio negócio jurídico, não se poderia cogitar de um contrato e, portanto, não haveria que se aplicar o regime da responsabilidade contratual. Trata-se de uma construção teórica que consagra o emprego do regime jurídico da responsabilidade aquiliana às hipóteses de responsabilidade pré-contratual, fazendo, para tanto, uma interpretação de ordem negativa: as situações em que não se verifica um contrato devem ser tuteladas pelas normas de responsabilidade extracontratual.188
Ante a hipótese de que a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual não mais resultam de uma disciplina normativa e que a culpa in contrahendo é considerada uma figura autônoma, Xxxxx Xxxx destaca que a definição e distinção entre contratual e
185 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos.1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 26.
186 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 134.
187 XXXXXXX, Xxxxxxxxx. A responsabilidade xxx-xxxxxxxxxx. Xxxxxxxx xx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx x Xxxxxx Xxxxxx. Xxxxxxx: Livraria Almedina, 1970, p. 134. Assim, a referida ressalva de Xxxxxxx é justificada sob a hipótese de “se queremos individualizar as pessoas que, além dos sujeitos que intervem nas negociações, são chamadas a responder por conduta incorreta in contrahendo, e isto a fim de se estabelecer se responde o representante ou o representado ou ambos, é sempre necessário aplicar, na falta de disposições específicas na matéria, as normas prescritas para um dos dois tipos tradicionais de responsabilidade.”
188 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. A Conservação dos Contratos Nulos por Defeito de Forma. São Paulo: Editora QuartierLatin do Brasil, 2013, p.89.
extracontratual não mais tem relevância para o ordenamento jurídico brasileiro, visto que a unificação do conceito reflete nas fontes das obrigações, sendo que
No processo unificador do direito das obrigações, que ora ocorre, prevalece a transubjetivação da causa da responsabilidade, pouco importando se é contratual ou extracontratual. Exemplifiquemos com a vedação ao enriquecimento sem causa, que assume uma dimensão objetiva e superadora dos limites contratuais, a ampliação do conceito de dano, a universalização do ressarcimento, a proteção das expectativas normais de quem adquire ou utiliza bens e serviços e, acima de tudo, a equivalência objetiva das prestações, trabalhando- se com tipos subjetivos com tipos subjetivos abstratos, como o contratante consumidor.189
No próximo ponto, serão examinados critérios para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento do contrato verbal, ressaltando a conceituação das tratativas e das negociações preliminares, o contrato preliminar e o contrato-promessa e, por fim, o contrato verbal.
2.2 Critério para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento do contrato verbal
Neste ponto, serão abordados critérios a fim de que se estabeleça uma distinção entre a ruptura imotivada das negociações do descumprimento de um contrato verbal. O tópico tem como escopo auxiliar na determinação dos elementos de cada uma das figuras referidas a fim de identificar os limites entre o descumprimento de um contrato verbal da ruptura imotivadas das negociações.
Em um primeiro momento, conceituar-se-á a figura das tratativas. Adiante, propõe-se a analisar o contrato preliminar ou contrato-promessa. E, por fim, irá se analisar o contrato verbal e seus elementos.
2.2.1 Tratativas ou negociações preliminares
189 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos.1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 26.
O primeiro critério para distinguir a ruptura imotivada das negociações do descumprimento pauta-se na compreensão das tratativas ou negociações preliminares190.
Segundo Xxxxxx Xxxxx Xxxxx, as negociações preliminares “são a fase na qual os interessados debatem e discutem o conteúdo do futuro contrato com a finalidade de formar o juízo de conveniência do negócio, ou seja, concluir se vale a pena para ambos celebrar o contrato, ou não, quando, então, põem fim às conversações.191” As negociações preliminares, nas palavras de Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx, são formadas de duas fases, quais sejam, a negocial e a decisória192. A primeira é marcada pelo início das conversações até o ponto de formulação da proposta definitiva, enquanto a fase decisória é relativa ao encontro de duas declarações de vontade vinculantes, acrescidos de proposta e aceitação, firmando-se, então, um contrato ou acordo193.
A análise da fase negocial é relevante uma vez que é onde se inicia a problemática da responsabilidade pré-contratual, principalmente no que se refere à hipótese de ruptura injustificada das negociações, objeto da pesquisa.
Na abordagem da fase negociatória, há uma preocupação acerca do momento em que se deve considerar a subordinação das partes à boa fé, ou seja, “a partir de que momento, na relação intervinda entre os sujeitos que negociam, se pode dizer que eles se encontram já vinculados a recíprocas obrigações decorrentes da boa fé.194” Trata-se a referida questão de matéria já abordada pela primeira parte da pesquisa, uma vez que se observa que a relação de confiança entre as partes também está presente na fase negociatória, ou seja, antes da conclusão do contrato.
Destacando a distinção entre as negociações e os contratos preliminares, Xxx Xxxxx salienta que “enquanto as primeiras se caracterizariam pela bilateralidade, os segundos, compreendendo, por exemplo, sondagens,
190 A autora Xxxxxx Xxxxx Xxxxx quando aborda os requisitos da culpa in contrahendo por ruptura das negociações, utiliza-se da expressão negociações preliminares. Ver em: XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré-contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 287.
191 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 287.
192 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx. Responsabilidade civil pela ruptura das negociações preparatórias de um contrato. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 49.
193 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx. Responsabilidade civil pela ruptura das negociações preparatórias de um contrato. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 49.
194 PRATA, Ana. Notas sobre responsabilidade pré-contratual. Coimbra: Almedina, 2005, p. 40.
declarações de estar na disposição de negociar, publicações de listagens de bens, elogio comercial das mercadorias próprias, não implicariam contactos intersubjetivos tendo em vista a ulterior conclusão de um contrato.195” Adiante, no próximo ponto, propõe-se compreender sobre os contratos preliminares.
Ainda, é possível ressaltar que a forma como a responsabilidade in contrahendo é concebida e pelo valor tutelado pela perspectiva de sua ratio seriam capazes de fixar critérios a fim de identificar o surgimento dos deveres pré-contratuais196. Xxx Xxxxx então explica o valor da confiança como sendo determinante para estabelecer o momento do nascimento dos deveres pré- contratuais
Isto é, os deveres pré-contratuais surgem quando – e na medida em que – os contactos pré-contratuais entre as partes façam surgir numa delas ou em cada uma delas, a confiança na conduta leal, honesta, responsável e íntegra da contraparte, sendo o apuramento do surgimento dessa confiança resultado da análise dos actos e comportamentos das partes e da sua apreciação objectiva no quadro do ambiente econômico-social em que o processo formativo do contrato tem lugar.197
O contrato é acordo de vontades e que, diante do consentimento, tais vontades se transformam em vontade contratual, a qual não é somente uma soma de vontades individuais, mas sim uma entidade nova capaz de produzir efeito jurídico desejado198. Ademais, antes que se constate o fenômeno do encontro das vontades dos contratantes, há a negociação preliminar.
As negociações preliminares são, na visão de Xxxxxxx Xxxxxx, “propostas e contra-propostas que as partes elaboram, cada uma no próprio interesse, para tirar as maiores vantagens da convenção futura na discussão que se antepõe à conclusão do contrato.199” Em outras palavras, as negociações são propostas que antecedem a convenção a ser definida pelas partes, de modo que, sem se obrigarem, elas comunicam a intenção de contratar.
As negociações, ao mesmo tempo que pressupõem uma situação imatura, refletem uma vontade de contratar. Os instrumentos e etapas visando
195 PRATA, Ana. Notas sobre responsabilidade pré-contratual. Coimbra: Almedina, 2005, p. 42.
196 PRATA, Ana. Notas sobre responsabilidade pré-contratual. Coimbra: Almedina, 2005, p. 42
197 PRATA, Ana. Notas sobre responsabilidade pré-contratual. Coimbra: Almedina, 2005, p. 43.
198 XXXXXX, Xxxxxxx. Responsabilidade pré-contratual. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 55.
199 XXXXXX, Xxxxxxx. Responsabilidade pré-contratual. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959,
p. 56.
a documentar as negociações e fixar os pontos já em acordo com o que as partes se propõem ganham relevância, uma vez que contribuem para a formação da confiança na conclusão e celebração do contrato.200
Cabe ressaltar que, inicialmente, esses acordos iniciais eram destituídos de conseqüência jurídica, ou seja, de qualquer força vinculante existente no período de formação do contrato, refletido, assim, para ser um período de não obrigatoriedade.201 Ainda nas palavras de Xxxxxx Xxxxx, os acordos parciais são capazes de gerar efeitos jurídicos “face à concepção das negociações como uma situação jurídica dotada de normatividade, na medida em que nela incide o princípio da boa-fé objetiva, gerando para as partes um complexo de deveres de consideração.202”
Todavia, não tratam os efeitos jurídicos de efeitos obrigacionais, uma vez que eles não são considerados um negócio jurídico propriamente dito. Os referidos acordos parciais ou negociações preliminares tem outros efeitos: produzem como conseqüência primeira a prova da existência das negociações e, além disso, podem provar ainda que a confiança surgida na fase das negociações impõe deveres de conduta203.
Conexo com a problemática da boa-fé e preservação da confiança está a identificação e incidência desses princípios na fase de formação dos contratos, que precisa ser analisada tendo em vista ser essa fase a de maior incidência de casos de responsabilidade por conta de condutas praticadas em razão do contrato, porém com forte dúvida sobre ele ter sido celebrado ou não.
A esse respeito Xxxxxxxxx xx Xxxxx Xxxxxxx apresenta a dificuldade de identificação entre as fases de negociações e formação, embora também indique critério distintivo entre ambos:
“O período de formação do contrato pode ser qualificado como um estágio mais avançado das negociações, no qual as partes praticam atos relevantes que, por si só, podem produzir efeitos jurídicos, como as declarações de oferta e de aceitação, a opção, o contrato de
200 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 288.
201 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 288.
202 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 288.
203 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pré- contratual por ruptura das negociações. Curitiba: Juruá Editora, 2008, p. 288.
preferência, o contrato preliminar, entre outros. A fase de formação do contrato difere da fase das tratativas precisamente por contemplar atos com eficácia jurídica própria, ou seja, vinculantes.”204
As tratativas, por outro lado, são negociações e contornos já explorados e discutidos pelas partes visando à celebração do contrato.
Xxxxxxx Xxxxx denomina as tratativas como negociações preliminares.
Em suas palavras
“Sejam quais forem, porém, as conseqüências que se vinculem à frustração das negociações preliminares, não devem ser confundidas com a proposta e a aceitação. Estas não são meros atos preparatórios do contrato sem caráter vinculante, mas, sim, declarações de vontade capazes de formar a relação contratual.”205
Destarte, o período de formação dos contratos pode ser caracterizado por reuniões, cálculos, viagens, troca de emails, delimitações acerca do programa contratual, discussões sobre cláusulas, memorandos, entre outras estipulações negociais.
O longo processo de negociação, por envolver gastos com procedimentos e força produtiva, não pode ser tratado com irrelevância. Muito pelo contrário. Assim dispõe o autor Xxxxxxxxx Xxxxxxx
Na realidade negocial, entretanto, não se pode contestar serem cada vez mais frequentes os contratos que implicam, para sua conclusão, longo processo de negociação, no qual há grande dispêndio de riquezas e de forças produtivas, podendo-se pensar, a título meramente exemplificativo, nas transferências acionárias, nas compras de imóveis e nas alienações de estabelecimentos comerciais. Nesse contexto, os danos decorrentes da ruptura das negociações podem assumir grande importância para o futuro de uma pessoa física ou jurídica, havendo fundado interesse por parte dos jurisdicionados em precisar se e em quais casos o outro candidato a contratante pode ser responsabilizado por tais prejuízos.206
A partir deste ponto, analisa-se a formação dos contratos e o meio de ligação entre o instituto e a ruptura das negociações, para que, posteriormente,
204 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 11.
205 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx x Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx. Xxx xx Xxxxxxx: Forense, 2008, p. 61-62.
206 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo:
Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 02.
se identifique os limites entre o descumprimento de contratos não solenes e o rompimento das negociações.
No processo clássico da formação de qualquer contrato, nota-se que ocorrem sucessivos atos e procedimentos antes que os candidatos a contratante, de fato, realizem a sua conclusão.
Esses procedimentos são definidos pelos autores como negociações preliminares ou tratativas negociais e que, muitas vezes, podem se formalizar por meio do instrumento denominado de minuta, conforme explica o autor Xxxxxxx Xxxxx:
Os atos preparatórios tendentes direta e imediatamente à constituição do vínculo contratual apetecido começam pelas negociações preliminares, ou tratativas frequentemente reduzidas a escrito em um instrumento particular chamado minuta, que pode, ou não ser assinada pelos negociadores. A minuta não passa de simples projeto de contrato, sem eficácia vinculante, como é sabido.207
Em que pesa tenha o referido autor negado a eficácia vinculante do instituto minuta e, consequentemente, das negociações preliminares, será demonstrado na pesquisa o posicionamento da doutrina contratual contemporânea, a qual entende ser o período que antecede a conclusão do contrato um ato de vinculação entre as partes.
Com efeito, à luz das concepções trazidas por Xxxxxxx Xxxxx, no período de tratativas não há o contrato. Todavia, não se pode negar a existência do caráter vinculante das negociações, uma vez que existe confiança entre as partes de que aqueles atos sucessivos realizados durante as negociações serão para obter o mesmo fim, o objetivo final do contrato.
Na formação de um contrato, realizam-se certos compromissos preparatórios e figuras negociais de vinculação. Esses elementos vinculantes são, nas palavras do referido autor, a opção, o contrato preliminar e o acordo provisório. O estudo desses elementos faz-se necessário de modo a delinear os aspectos contratuais contido nas negociações preliminares.
A opção é um negócio jurídico em que uma das partes confere à outra a possibilidade de criar a relação obrigacional, reservando-lhe a liberdade de
207 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 58.
aceitar a proposta da outra de modo completo e sem alterações. Neste sentido, Xxxxxxx Xxxxx define o instituto:
Para haver opção, a proposta da outra parte tem de ser em tais termos que a aceitação do optante – isto é, daquele que tem o direito potestativo de formar, com a sua aceitação, o contrato – baste à conclusão imediata do vínculo contratual de que foi compromisso preparatório. Deve, por conseguinte, ser completa, precisa, inequívoca e determinada, quer nos pontos principais quer nos secundários que forem importantes, pois um contrato só se tem por celebrado quando as partes houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo, como disse excelentemente o legislador português.208
A vinculação preliminar de partes interessadas na estipulação de contratos é admitida expressamente por alguns ordenamentos jurídicos por meio do pacto de contrahendo, no qual uma dessas partes oferece seu consentimento de modo a realizar a conclusão deste contrato. Tal procedimento é denominado de contrato preliminar unilateral.209
Busca-se relacionar os efeitos e princípio do contrato preliminar com o âmbito da ruptura das negociações. Em que pesa seja o contrato preliminar uma figura dotada de forma própria, uma vez que tem sua causa a preparação para o contrato definitivo, propõe-se dialogar a responsabilização da parte que rompe injustificadamente com as negociações do mesmo que a parte que descumpre um contrato preliminar.
No ordenamento brasileiro, a disciplina da formação dos contratos está contida no artigo 427 do Código Civil brasileiro de 2002, o qual dispõe que “a proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.”210
Esclarecendo a ideia trazida pelo legislador brasileiro de que a oferta vincula o proponente, Xxxxxxxxx Xxxxxxx expõe que “toda oferta deve conter os
208 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 58.
209 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 26. ed. atualizada por Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxx e
Xxxxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxxxx Xxxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 59.
210 “Art. 427 - A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.” Em:BRASIL. Lei 10.406, de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxx/0000/x00000.xxxx> Acesso em: 20 dez. 2018.
elementos essenciais do tipo contratual, permitindo a formação do contrato caso haja aceitação pura e simples.”211
Insta salientar que a oferta pode ser retirada antes ou durante à aceitação. Todavia, deve a parte ter a ciência que a revogação acarretará em obrigação reparatória para o ofertante em razão dos prejuízos causados ao destinatário.212
2.2.2 Contrato preliminar ou contrato-promessa
O contrato preliminar ou contrato-promessa213 é definido pelo artigo 410 do Código Civil brasileiro como sendo “a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato214.
Sobre o artigo 410, Xxxxxxx Xxxxxx identifica a hipótese de contrato- promessa bilateral, demonstrando que
A inexistência de qualquer problema sério (necessitado de intervenção legislativa) na interpretação ou aplicação da lei relativamente à forma externa do contrato-promessa unilateral levaria naturalmente o intéprete a supor que o fim da alteração introduzida no texto do nº 2 do artigo 410 do Código Civil tivesse sido o de reoslver a dúvida suscitada na doutrina e na jurisprudência quanto à validade dos contratos-promessa bilaterais ou recíprocos que, necessitando de ser reduzidos a escrito assinado por ambos os contrataentes, de acordo com a determinação expressa da lei, constem de documento subscrito apenas por um dos promitentes.215
211 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. Responsabilidade pela ruptura das negociações. São Paulo: Editora Xxxxxx xx Xxxxxxxx, 2005, p. 12.
212 XXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Curso de direito civil brasileiro. 17ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 3, p. 57.
213 XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Contrato-promessa: uma síntese do regime actual.
Coimbra: Almedina, 1998, p. 11. O autor discute a nomenclatura do contrato-promessa ou promessa de contrato futuro. Segundo ele, a “literatura alemã utiliza,em regra, a denominação de contrato anterior, antecontrato ou pré-contrato (Vorvertrag), mas também não é inédita a de contrato de conclusão (Abschliessungsvertrag). No mesmo sentido, usam os franceses ‘avant- contrat’ e os italianos ‘contratto preliminare’ (cfr. os arts. 1351 e 2932 do Cód. Civ. Italiano). Talvez preferível, se não fosse muito extensa, apresentar-se-ia a designação de contrato para fazer um contrato futuro (correspondente ao inglês ‘the contract to make future contract’). Nomes não menos completos se mostram os de contrato-promessa de contrato, contrato- promessa de contratar ou, inclusive, o de contrato-promessa de negócio. Registram-se ainda as expressões latinas ‘pactum e contrahendo’ e ‘pactum de ineundo contractu’. No direito brasileiro, são correntes as designações de pré-contrato e de contrato preliminar.
214 “Art. 410 - Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.” Em:BRASIL. Lei 10.406, de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxx/0000/x00000.xxx Acesso em: 20 dez. 2018.
215 XXXXXXX XXXXXX, Xxxx xx Xxxxx. Sobre o contrato-promessa. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1989, p.18.
O contrato-promessa “distingue-se com nitidez dos meros actos de negociação que frequentemente integram o processo formativo dos negócios jurídicos e que, às vezes, fundamentam a responsabilidade pré-contratual.216” Esses meros atos de negociação, embora sejam trâmites dotados de relevância jurídica, são ausentes de eficácia contratual específica, ao contrário do que se verifica com os negócios preparatórios e com o contrato promessa217.
A expressão ‘contrato preliminar’, igualmente adotada na Itália218, prevalece nas doutrinas estrangeiras uma vez que remete, de maneira mais indicativa, o propósito do negócio jurídico. Confunde-se quem considera que a promessa de contratar e o contrato preliminar são figuras destituídas de eficácia, por precederem a conclusão de um contrato. Não lhe seria igualmente claro o sentido do chamado contrato-promessa, dado o caráter redundante da expressão; uma vez que “afinal, todo contrato encerra uma promessa. Nesse último caso, a possibilidade de confusão torna-se manifesta quando se tem presente o longo percurso seguido para que a generalidade das promessas fosse tutelada como contrato.219
Diante da proteção dada pela lei ao que se deseja obter com a promessa, a fim de garantir a celebração do contrato, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx explica que
Afigura-se que, em nossos dias, mercê das circunstâncias econômicas e financeiras, só muito raro o contrato-promessa encontrará justificação no facto de as partes ainda não terem uma última decisão quanto à conveniência do contrato prometido, quer dizer, não pretenderem comprometer-se definitivamente. Na verdade, ao menos do lado que, entre nós, a lei protege de modo especial, o que se deseja com a obtenção da promessa é, por sistema, garantir a celebração do contrato visado.220
216 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Contrato-promessa: uma síntese do regime actual. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, p. 14.
217 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Contrato-promessa: uma síntese do regime actual. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, p. 14.
218 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. A Conservação dos Contratos Nulos por Defeito de Forma. São Paulo: Editora QuartierLatin do Brasil, 2013, p.89.
219 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. A Conservação dos Contratos Nulos por Defeito de Forma.
São Paulo: Editora QuartierLatin do Brasil, 2013, p.89.
220 XXXXXXX XXXXX, Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx. Contrato-promessa: uma síntese do regime actual. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, p. 14.
Quando se trata de contrato, importa salientar questões acerca da forma. Quanto à forma do contrato-promessa, deve-se diferenciar o regime geral do contrato-promessa do regime próprio do contrato promessa relativo “à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre edifício, ou fraccção autônoma dele, já construído, em construção ou a construir.”221
Importante referir que o contrato preliminar é uma figura que tem como elemento a capacidade de conduzir à contratação de praticamente todas as operações econômicas, uma vez que ele é o ponto de partida para a definição das cláusulas que podem, ou não, a acompanhar o contrato principal. Além disso, o contrato preliminar “pode, por exemplo ser concluído para propiciar a introdução paulatina de uma compra e venda, de uma locação, de uma empreitada, de uma fiança, de uma distribuição e assim por diante.”222
Uma das principais diferenças entre os efeitos causados pelo descumprimento do contrato-promessa e da ruptura imotivada das negociações pauta-se no sentido de que o primeiro é permeado de uma estrutura previamente delimitada, dotada de generalidade, enquanto o rompimento das tratativas, referindo-se ao termo em questão que é o da negociação, não é pautado em generalidades.
Desse modo, Xxxxxxx identifica como característica jurídica peculiar do contrato preliminar a conteúdo de seu contrato, o que não se pode ser observado na hipótese de ruptura das negociações
De fato, a categoria do contrato preliminar é dotada de generalidade. Seu propósito é o de cindir o processo de contratação, por meio do diferimento da celebração do negócio final, a cuja conclusão, entretanto, as partes encontram-se vinculadas desde logo. O conteúdo do contrato preliminar, como se nota, é a celebração de outro contrato, qualificado como definitivo, cujos elementos desde logo define. Essa é a sua característica jurídica peculiar, o objeto determinante da categoria. De maneira bastante técnica, pode-se
221 XXXXXXX XXXXXX, Xxxx xx Xxxxx. Sobre o contrato-promessa. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1989, p. 21-22.
222 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. A Conservação dos Contratos Nulos por Defeito de Forma.
São Paulo: Editora QuartierLatin do Brasil, 2013, p.87.
afirmar que o elemento categorial do contrato preliminar é a conclusão do contrato definitivo.223
Assim, por fim, o último tópico do estudo propõe-se a identificar os elementos do contrato verbal de modo que a destacar seus efeitos e distinguir o descumprimento da ruptura imotivada das negociações.
Destarte, o contrato verbal é o último critério para distinguir o descumprimento do contrato verbal e a ruptura imotivada das negociações e, o propósito desse tópico é identificar os elementos e efeitos de ambas as figuras a partir de sua diferenciação.
Inicialmente, cumpre destacar que o contrato verbal é, assim como o contrato escrito, definido e regido por lei brasileira. O artigo 107 do Código Civil brasileiro de 2002 dispõe que “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.” 224 Assim, um contrato que possua agente capaz, objeto lícito e possível, determinado ou determinável é um contrato válido.
O contrato verbal relaciona-se diretamente com a integralização da vontade das partes encaminhada à pactuação de obrigações mediante a prolação de palavras, ou seja, sem qualquer forma especial ou esmiuçado em documento escrito225.
Importante salientar, conforme o tópico que tratou do contrato verbal por excelência, que, segundo Xxxxxxx Xxxxx, Xxxx salienta que as obrigações verbais226 são a que se celebram mediante um pergunta e uma reposta, o que pode ser verificado com stipulatio.227
223 XXXXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxxx. A Conservação dos Contratos Nulos por Defeito de Forma. São Paulo: Editora Quartier Latin do Brasil, 2013, p.87.
224 “Artigo 107 - A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.” Em: BRASIL. Lei 10.406, de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 2002. Disponível em: xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx_00/xxxx/0000/x00000.xxxx>. Acesso em: 20 dez. 2018.
225 XXXX, Xxxxx. Direito civil: contratos.1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 55.
226 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p.
497. Xxxxxxx Xxxxx refere-se a uerbisobligationes como obrigações verbais.
227 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497.
Diante da afirmação de que as obrigações surgem apenas da declaração daquela das partes que quer se obrigar, Xxxxxxx Xxxxx diz que não há acordo de vontade (conuentio) e que, portanto, não se pode dizer que elas são verdadeiramente contratos (contractus)228.
De acordo com Xxx Xxxxx, na antiga concepção de contrato verbal (principalmente no que se refere à stipulatio) “vê como causa da obrigação exclusivamente a forma verbal ritual, que gera um efeito obrigacional mesmo se a obrigação não for verbal229.”
Segundo Xxxxx Xxxxxxx, o acordo de vontade poderia gerar obrigações caso estivesse aliado a uma causa civil230. Essa causa era vista por alguns romanistas como uma formalidade exterior, em que a stipulatio era considerada “uma promessa feita em público, com o uso de palavras solenes.”231
Desse modo, importa destacar que, quando se analisa brevemente os julgados dos tribunais superiores e dos tribunais estaduais brasileiros, nota-se que há uma dificuldade em identificar a comprovação do descumprimento de um contrato verbal, uma vez que as cláusulas e os termos não há comprovação de forma escrita.
Assim, destaca o pronto da dificuldade da prova também baseada na confiança da outra parte, seja na manutenção da obrigação, seja no adimplemento da relação.
A fim de exemplificar que a dificuldade em comprovar os fatos apenas baseado naquilo que foi acordado pela partes, segue um julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, relatado pelo Desembargador Xxxxxxxxx Xxxxxx, em que não houve ressarcimento pelos prejuízos sofridos devido a ausência de comprovação do descumprimento de contrato verbal.
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E EMERGENTES. EXISTENCIA DE CONTRATO VERBAL ENTRE AS PARTES. NÃO COMPROVADA. ÔNUS DE PROVA. Em momento
anterior a existência efetiva de um contrato, há as chamadas negociações preliminares, em que ocorrem as
228 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito Romano. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 497, p. 497.
229KASER KASER, Max. Direito Privado Romano. Tradução de Xxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxxxxxxx
Hämmerle. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p. 226.
230 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoriageral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
231 BESSONE, Darcy. Do Contrato: teoriageral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 7.
primeiras tratativas, exposições de ideias, debates prévios. É nesse momento que nasce a expectativa de contratação. Nessa fase pré- contratual, ainda que não haja vínculo entre as partes, pois estas têm autonomia para decidir sobre a contratação, a relação já está pautada pelo princípio da boa-fé objetiva. Assim, havendo ruptura abrupta do possível negócio, é plenamente possível a responsabilização civil. Ocorre que a autora não trouxe aos autos prova robusta que demonstrasse essa efetiva expectativa que gerou todos os gastos que acarretaram nos danos materiais em razão da contratação de funcionários, compra de equipamento e a produção de 14.923 (quatorze mil novecentos e vinte e três) pares de sapatos. Assim, a demandante não se desincumbiu do ônus de comprovar a alegada contratação, no termos do art. 373, I, do CPC. Não havendo ilícito contratual, não há que se falar nas indenizações pleiteadas. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação
Cível Nº 70074545831, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Xxxxxxxxx Xxxxxx, Julgado em 21/06/2018)232
Com efeito, o julgado acima referido buscou destacar a dificuldade na identificação das hipóteses de descumprimento de um contrato verbal e da ruptura imotivada das negociações. O próprio entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entra em contradição porquanto fala em descumprimento de contrato verbal no espelho da ementa da Apelação Cível, enquanto no próprio corpo da ementa suscita a ideia de ruptura abrupta das negociações.
Assim como identificado na introdução desse trabalho, observa-se que alguns entendimentos de tribunais estatuais ainda não estão completamente consolidados. Uma das hipóteses para essa afirmação seria o fato de que, em se tratando de situações pautadas na confiança da palavra dada pela outra parte e sem um documento escrito, há uma dificuldade em encontrar comprovação do descumprimento de contrato não solenes.
Conexa à ideia de que é difícil a configuração do dano a ser indenizável em caso de ruptura injustificada das negociações, a configuração do dano para ressarcir os prejuízos causados em razão do descumprimento de contrato verbal também ocorre.
Por fim, cumpre ressaltar que o posicionamento dos tribunais nas hipóteses de falta de prova de descumprimento de contrato verbal resulta na
232 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70074545831. 11ª Câmara Cível. Relator Des. Xxxxxxxxx Xxxxxx. Porto Alegre, em 21 de junho 2018. Disponível em:
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também dificuldade dos mesmos tribunais em identificar o dano indenizável em caso de ruptura imotivada das negociações. Todavia, observa-se que a doutrina estabelece critérios a serem identificados no rompimento das negociações para ressarcir os danos daquela parte que foi prejudicada pela saída abrupta da outra. E, assim como foi referido nos três últimos tópicos, a solução para a problemática está na melhor delimitação dos elementos envolvendo os conceitos de tratativas ou negociações preliminares, contrato preliminar ou contrato-promessa e de contrato verbal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho teve como escopo a análise dos limites entre o descumprimento de um contrato verbal e a ruptura imotivada das negociações ante a perspectiva da tutela da confiança na fase pré-contratual e na formação dos contratos. A preferência pela temática da pesquisa justifica-se na dificuldade encontrada pela doutrina e jurisprudência para identificar em quais casos seria hipótese de descumprimento de contrato não solene ou rompimento imotivado das negociações.
No primeiro ponto, buscou-se examinar historicamente o instituto da proteção da confiança na formação dos contratos, traçando o renascimento do contrato como fonte de obrigações, desde o contractus aos nuda pacta. Assim, conclui-se que a problemática do Direito Romano reforça a ideia de que até meados do século XI os acordos não solenes, os nuda pacta, não eram fonte de obrigações, exceto obrigações naturais. Ou seja, a confiança e a vontade não eram elementos tão importantes quanto era a forma no processo de criação de obrigações.
E, que, pelo menos até o tempo de Xxxxxxxxxx, o Direito Romano não considerou que todo acordo de vontade lícito pode gerar relações jurídicas obrigacionais e apenas esteve diante de contratos obrigatórios que criam obrigações.
O tópico que analisou os limites da Teoria Geral dos Contratos para proteção dos contratantes nos contratos não solenes, destacando a tradição moral tomista-aristotélica, os deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé e a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação, resultou em conclusões relevantes para a problemática da pesquisa.
A primeira dessas conclusões é que o fundamento da responsabilidade pré-contratual está pautado no princípio da boa-fé, reconhecido como incidente sobre todas as situações jurídicas no Direito brasileiro. Segundo, conclui-se também que são impostos às partes no período das negociações deveres decorrentes do princípio da boa-fé, tais como os deveres de lealdade ou correção, o dever de segredo ou sigilo,o dever de informar e os deveres de
proteção e de cuidado.Assim, a boa-fé objetiva impõe-se atualmente como princípio regulador da conduta das partes na fase das tratativas.
Ainda, importante destacar que a proteção da confiança e das expectativas legítimas, além de serem padrões de conduta a seguir, está também presente no período que antecede a conclusão do contrato. A confiança também dialoga com o enquadramento dogmático da proibição do comportamento contraditório ou, em outras palavras, do brocado do verine contra factum proprium. Desse modo, a conferência da boa-fé como fundamento da proibição do comportamento contraditório vem da compreensão de que seu verdadeiro fundamento está ligado à proteção da confiança.
No que se refere ao tópico sobre a relação jurídica obrigacional como relação de cooperação, pode-se concluir que, quando uma das partes possui comportamentos opostos à ideia de lisura, a relação obrigacional ou contratual se perfaz com solidez. Assim, a imposição de uma ética contratual está ligada diretamente ao dever de cooperação dentro da relação jurídica obrigacional.
O segundo capítulo examinou a ruptura imotivada das negociações no quadro do direito contratual e no da responsabilidade civil. Ao tratar da distinção entre ruptura motivada e imotivada, conclui-se que é esperado daquela parte que rompe as negociações um agir em conformidade com os deveres laterais de conduta, conforme a lisura, a boa-fé, destacando a fidelidade da palavra empenhada, de modo que a parte que pretende romper com as negociações preliminares deve apresentar para a outra um motivo justificável, pois essa é a conduta leal e honesta exigida pela boa-fé observada e esperada no comércio jurídico.
Quando uma parte transfere à outra expectativa e confiança legítimas de que vão concluir e celebrar o contrato, ela não pode, a partir desse momento abandonar as negociações sem um justo motivo, pautado no princípio da boa- fé objetiva, uma vez que, em o fazendo, a referida parte deve ressarcir os danos e prejuízos causados pela outra.
No ponto do dano e indenização da ruptura imotivada das negociações, conclui-se que a existência de negociações, a culpa, qualificada como inobservância do princípio da boa-fé, o dano são os elementos necessários
para a configuração da responsabilidade civil pela ruptura imotivada das negociações.
Importante destacar que relação jurídica pré-contratual não tem como conteúdo a obrigação de uma parte de prestar alguma coisa em favor da outra. Essa relação faz surgir deveres de conduta para as partes, a serem observados durante o desenrolar das negociações, decorrentes da incidência do princípio da boa-fé.
Na fase pré-contratual, o princípio da boa-fé objetiva e a liberdade podem ser observados agindo de modo conjunto, todavia, percebe-se que o primeiro impõe certos limites ao segundo. Por meio da pesquisa, pode-se perceber que o período das negociações, antes ilimitada no quesito liberdade contratual, hoje é substituída por uma ação correta, em consonância também com os interesses da outra parte. Resulta o ponto trato na conclusão de que a boa-fé que é exigida das partes durante as negociações contratuais é a boa-fé objetiva.
Outra conclusão a ser destacada é o fato de que, devido à liberdade de contratar, as partes são livres para começar ou rejeitar as negociações preliminares, e que não precisariam, então, ressarcir os danos causados pela ruptura das negociações. Todavia, destaca-se que, somente o rompimento das negociações pautadas nos deveres laterais de conduta decorrentes da boa-fé é que não ensejaria o ressarcimento dos danos pela parte que abandonou antes da conclusão do contrato. O referimento comportamento que não viola a boa-fé é legítimo e de motivo justo, representando aqui a ruptura motivada.
As partes são livres para iniciar ou abandonar as negociações sem motivo legítimo, ao passo em que arcam, cada uma, na proporção das despesas realizadas no período das tratativas. Todavia, quando uma das partes expõe como certa a conclusão do contrato para a outra, criando a confiança legítima na celebração, quando, então, para se eximir da responsabilidade, precisa apresentar um motivo legítimo para o rompimento.
A responsabilidade pré-contratual encontra aplicação no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo que não exista, no direito positivo, uma regra geral expressa disciplinando esse tipo de responsabilidade.
É possível no Direito brasileiro, mediante certos elementos de configuração, a responsabilização civil do contraente que rompe, sem justificativa, as negociações contratuais.
O estabelecimento e a ruptura de negociações contratuais com a intenção de causar danos ao outro candidato a contratante, sujeita o contraente que agiu com dolo à responsabilidade pela ruptura das tratativas. A culpa na responsabilidade pela ruptura das negociações se configura quando uma parte incute na outra a confiança de que o contrato será estabelecido e não há motivo para a desistência de contratar.
Na responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais o dano considerado indenizável é normalmente decorrente do chamado interesse contratual negativo, chamado por alguns autores de dano negativo. A noção da indenização do interesse negativo vem sendo hoje em dia substituída pela ideia de dano decorrente da confiança no estabelecimento do contrato. A indenização do interesse contratual positivo se admite de modo excepcional na responsabilidade pela ruptura das tratativas, quando tal ruptura tornar inviável a celebração do contrato projetado com terceiro.
O dano passível de ser indenizado na responsabilidade civil pela ruptura das negociações contratuais aborda o dano emergente e os lucros cessantes, sem limitação ao que o candidato a contratante obteria caso o contrato tivesse sido estabelecido. Desse modo, conclui-se que o dano indenizável corresponde a tudo aquilo que a parte gastou (dano emergente), bem como às oportunidades perdidas (lucro cessante) a partir do momento em que surgiu a confiança e a expectativa legítima na celebração do contrato, uma vez que as despesas realizadas no período compreendido nas tratativas.
Por fim, conclui-se que há uma série de requisitos específicos com o escopo de caracterizar a responsabilidade pré-contratual por rompimento das negociações. O primeiro deles diz respeito à verificação da existência de negociações, podendo ser caracterizado por troca de e-mails, conversas, gastos com transporte, alimentação e estadia, além da proteção da confiança legítima na celebração do contrato e a violação do dever de lealdade por meio do rompimento ilegítimo. Além desses, devem ser acrescentados os requisitos
genéricos da responsabilidade civil: dano, culpa e nexo causal entre o rompimento e dano.
Desse modo, a ruptura imotivada das negociações tangencia-se na análise do comportamento daquela parte que rompe as negociações. Assim, não é apenas o motivo em si alegado para justificar o rompimento que deve ser considerado, mas sobretudo o comportamento da parte face a esse motivo, de forma que não correspondendo seu comportamento aos padrões exigidos pela boa-fé objetiva e seus deveres laterais de conduta, caracteriza-se a ilegitimidade do rompimento.
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