DIREITO CIVIL
DIREITO CIVIL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxxxx, acalentando antigo sonho da família, decidiu adquirir imóvel na planta, apartamento de 90 metros quadrados em bairro da classe média do Rio de Janeiro. Ultimaram-se todos os detalhes contratuais, e restou estabelecido na avença que o imóvel seria entregue em dois anos, pronto para morar, com possibilidade de atraso de seis meses. O apartamento adquirido ficava no Bloco III de grande edificação a ser construída. Xxxxxxx sempre honrou o pagamento das prestações acordadas, e buscou acompanhar a evolução da obra, apesar de haver sido edificado no local de um muro de madeira de três metros de altura a impedir a visão do canteiro de obras por parte de quem estivesse do lado de fora. Ao solicitar ingresso no canteiro de obras, Xxxxxxx foi impedido de entrar ao argumento de que construções são inseguras. O comprador desconfiou da situação e contratou um advogado a fim de melhor estudar o caso à luz do direito. O causídico conseguiu entrar no canteiro de obras dizendo-se interessado em adquirir um apartamento, e fotografou o local “para que as fotos convencessem a esposa a firmar o negócio, diante do tamanho do terreno”, que ocupava um quarteirão. Estarrecido,
o causídico verificou que não havia sequer uma parede construída, o terreno fora apenas desbastado. No local não havia material de construção ou operários a indicar que o trabalho começara. Decorria então um ano desde que Xxxxxxx assinara o contrato e começara a pagar as parcelas correspondentes. O advogado notificou a construtora, vendedora no contrato, para que explicasse a inusitada situação. A empresa não respondeu. Xxxxxxx, então, ingressou em juízo com ação de conhecimento a fim de obter a rescisão do contrato, com a consequente devolução dos valores pagos, além de condenação por danos morais. O autor também postulou a consignação em juízo das prestações futuras até a solução do litígio. A empresa, em contestação, afirmou que o prazo para a entrega do bem não se vencera, de forma a inexistir possibilidade de rescisão contratual. Esclareça como você decidiria a lide, levando em conta que os fatos acima expostos se encontram comprovados nos autos.
O candidato deve julgar procedente o pedido do comprador do imóvel na planta, com a menção expressa da TEORIA DO INADIMPLEMENTO ANTECIPADO DO CONTRATO. Da mesma forma, deve julgar procedente o pedido de danos morais.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxx, homem dissoluto, de natureza libertina, inclinado a todos os vícios, após passar uma noite de esbórnia com amigos de mesma índole, retorna de madrugada para casa, na direção da sua Ferrari F8, com claros sintomas de intoxicação alcoólica. Ao passar por um cruzamento, por não se dar conta de que
o sinal estava fechado para ele ou por simples irresponsabilidade, o atravessa em
alta velocidade, é abalroado por um ônibus e morre no local. 3 O falecido instituíra um seguro de vida em favor de sua mãe, a única que o aturava. Acionado o seguro, a empresa recusou-se a honrá-lo, ao argumento de que Xxxxx, por estar embriagado no momento do acidente, teria elevado sobremaneira o risco, de modo a afetar o equilíbrio contratual e, assim, comprometer a moldura do contrato. A beneficiária vai à justiça a fim de condenar a seguradora a cumprir a avença. Você é o juiz. A enlutada genitora tem razão? Justifique sua opinião. Considere que os fatos acima narrados estão comprovados nos autos.
O candidato deve dizer que a mãe do instituidor do seguro merece receber a indenização, porque no contrato de seguro de vida a embriaguez do condutor do veículo é irrelevante. O candidato deve frisar expressamente a Súmula 620, do STJ.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL, LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL EM VIGOR E ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Tício propôs ação de conhecimento perante o Juízo da Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital/RJ, objetivando a condenação do Município do Rio de Janeiro e da empresa Reparos de Engenharia Ltda na reparação de seus prejuízos, ao fundamento de que teve o vidro de seu automóvel trincado, quando atingido por uma pedra que fora arremessada pela máquina de recapeamento asfáltico operada pela empresa contratada pela Municipalidade para realização do serviço. O Juízo da Vara da Fazenda Pública, verificando o baixo valor envolvido na pretensão indenizatória (inferior a quatro salários mínimos), declinou da competência para o Juizado Especial da Fazenda Pública, haja vista a presença do ente municipal no polo passivo da relação processual. Ao apreciar os autos do processo que lhe fora redistribuído, como deve proceder o Magistrado em atuação no Juizado Especial da Fazenda Pública ? Fundamente.
De início, temos que a solução completa do problema exposto na primeira questão, segundo os critérios desta Banca Examinadora, envolve necessariamente o enfrentamento de alguns pontos fundamentais, como se pode inferir da resposta padrão a seguir apresentada.
ANÁLISE DA QUESTÃO
O sistema processual dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, composto pelas Leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/09, estabelece critérios definidores de sua competência, ratione valoris, materiae et personae.
É importante ressaltar que a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública é exclusiva, isto é, não se cuida de competência concorrente, como ocorre no sistema geral da Lei 9.099/95.
In casu, o Juízo da Vara de Fazenda Pública visualizou hipótese de competência funcional exclusiva do Juizado Especial da Fazenda Pública, tendo em vista o valor econômico envolvido na demanda e a presença do Município do Rio de Janeiro no polo passivo.
Trata-se de típica hipótese de litisconsórcio passivo facultativo, diante da responsabilidade civil solidária que é atribuída pela parte autora ao Município do Rio de Janeiro e à empresa privada.
A questão mais relevante a ser enfrentada reside na presença de pessoa jurídica de direito privado, como litisconsorte passivo, na ação distribuída ao Juízo da Vara de Fazenda Pública.
Essa matéria foi enfrentada pela Seção Cível do TJRJ, nos autos do IAC n° 0053667 – 03.2017.8.19.0000, tendo sido adotado, por unanimidade, o entendimento de que, estando a ação proposta submetida à competência do Juizado Especial da Fazenda Pública pelos critérios em razão do valor e da matéria, a presença do ente público (Município do Rio de Janeiro) justifica a fixação de sua competência ratione personae, ainda que exista litisconsorte passivo que não se enquadre na previsão legal.
O que é a regra em nossa organização judiciária nacional, salvo quando houver disposição legal expressa em sentido diverso. Ou seja, nas hipóteses de competência do órgão julgador ratione personae, a eventual presença de litisconsorte (que não tenha o chamado foro privilegiado) não é suficiente para afastar a competência do órgão judicial, desde que a relação material envolvida na ação esteja submetida à sua competência ratione materiae. É o que ocorre, por exemplo, nas ações movidas em face da União Federal e de pessoa jurídica de direito privado, atraindo a competência ratione personae da Justiça Federal.
Vale registrar que não há, no universo das Leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/09, nenhuma regra legal em sentido diverso, de modo que, sendo o Juizado Especial da Fazenda Pública competente para conhecer da ação proposta em face do Município do Rio de Janeiro (em razão do valor, da matéria e da pessoa), a simples presença de litisconsorte passivo (sociedade empresarial) não é suficiente para afastar a sua competência ou impor o desmembramento em duas ações em separado.
De modo que, independentemente da natureza facultativa da formação litisconsorcial na hipótese em exame, deve o Juizado Especial Cível reconhecer sua competência e determinar o regular prosseguimento do processo.
GABARITO
Competência exclusiva do Juizado Especial da Fazenda Pública, observados os critérios em razão da pessoa, do valor e da matéria. (0,1)
Hipótese retratada na questão que envolve litisconsórcio facultativo (atribuição de responsabilidade solidária pela reparação dos prejuízos sofridos pelo autor). (0,1)
Irrelevância da natureza do litisconsórcio (facultativo ou necessário) para afastar a competência ratione personae do Juizado Especial da Fazenda Pública, prevalecendo a atração de foro provocada pela presença do ente público, uma vez que a causa se encontra abrangida na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública em razão do valor e da matéria. (0,1)
Decisão proferida pela Seção Cível do TJRJ, definindo a tese de que a natureza facultativa do litisconsórcio não afasta a competência exclusiva do Juizado Especial da Fazenda Pública, cuja aplicação tem força vinculante. (0,1)
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxxxxxxxx propõe ação de revisão do valor do seu benefício de aposentadoria em face da Xxxxxxxxx previdenciária estadual. Na sua inicial, acompanhada de documentos, afirma que seus proventos estão defasados e, em sede de antecipação da tutela, pleiteia a imediata majoração do seu valor, adequando-o aos parâmetros legais que entende aplicáveis. Determinada a citação da Xxxxxxxxx previdenciária, a mesma apresenta defesa contestando a pretensão autoral e sustenta, de todo modo, o descabimento da antecipação da tutela contra a Fazenda Pública, consoante a legislação pertinente em vigor. Como deve o Juízo resolver essa questão do cabimento ou não da antecipação da tutela no caso em análise?
A solução completa do problema exposto nessa segunda questão, de acordo com os critérios desta Banca Examinadora, envolve necessariamente o enfrentamento de alguns pontos fundamentais, como se pode inferir da resposta padrão a seguir apresentada.
ANÁLISE DA QUESTÃO
Realmente, a legislação infraconstitucional prevê hipóteses em que se restringe o cabimento da medida de antecipação da tutela contra a Fazenda Pública. É o caso, por exemplo, do impedimento legal para a concessão de medidas de antecipação da tutela em face da Fazenda Pública que importem em aumento do valor da remuneração de servidores públicos.
É o que se infere do artigo 7º da Lei 12.016/09:
Art. 7º: (...) § 2º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.
§ 5o As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei no 5.869, de 11 janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.
O que foi ratificado pelo atual CPC, nos termos do art. 1059 que dispõe que: “à tutela provisória requerida contra a Fazenda Pública aplica-se o disposto nos arts. 1º a 4º da Lei 8437, de 30 da junho de 1992, e no art.7º, §2º, da Lei 12016, de 7 de agosto de 2009”.
O Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 1º da Lei 9494/97 na ADC nº 04, consolidando o entendimento de que essas limitações são constitucionais.
Parte-se da premissa, pois, de que não fere a garantia constitucional de acesso ao Poder Judiciário que limita a concessão de medida de antecipação da tutela contra a Fazenda Pública em determinadas situações.
Contudo, na esteira da firme orientação jurisprudencial construída a partir de então, essas regrais legais têm caráter de excepcionalidade e devem ser aplicadas mediante interpretação restritiva, de modo que poderá ser concedida a tutela provisória de urgência nas hipóteses não tipificadas nos artigos supracitados.
Desse modo, a restrição legal – embora constitucional - não abrange ações de natureza previdenciária, cuja matéria não estaria alcançada pela vedação legal, conforme o enunciado da Súmula 729 do STF: “A decisão na Ação Direta de Constitucionalidade 04 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária.”
O que tem reflexo na jurisprudência dos nossos Tribunais, como o Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. TUTELA ANTECIPADA. CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME DOS SEUS PRESSUPOSTOS. SÚMULA Nº 7/STJ. COMPROVAÇÃO DE RENDA PER CAPITA NÃO SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. DESNECESSIDADE. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 83 DA SÚMULA DESTA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA.
1. O Supremo Tribunal Federal, no enunciado nº 729 da sua Súmula, decidiu que a decisão proferida na ADC-4, que veda a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública, não se aplica em causa de natureza previdenciária, aí incluídos os benefícios de natureza assistencial.
2. A análise da comprovação do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da tutela antecipada, tal como postulada na insurgência especial, em que se alega a inexistência de prejuízo irreparável, implicaria o reexame do acervo fático-probatório dos autos, vedado pelo enunciado nº 7 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça.
3. "A impossibilidade da própria manutenção, por parte dos portadores de deficiência e dos idosos, que autoriza e determina o benefício assistencial de prestação continuada, não se restringe à hipótese da renda familiar per capita mensal inferior a 1/4 do salário mínimo, podendo caracterizar-se por concretas circunstâncias outras, que é certo, devem ser demonstradas." (REsp 464.774/SC, da minha Relatoria, in DJ 4/8/2003).
4. Recurso especial improvido.
(REsp 539.621/PR, Rel. Ministro XXXXXXXX XXXXXXXXXX, SEXTA TURMA,
julgado em 26/05/2004, DJ 02/08/2004, p. 592)
Portanto, não procede a tese da Xxxxxxxxx previdenciária estadual no tocante ao descabimento da medida, impondo-se ao Juízo competente a apreciação do requerimento de antecipação da tutela, no intuito de verificar a presença ou não dos pressupostos para a sua concessão.
Podemos acrescentar ainda que, recentemente, foi noticiado o julgamento da ADI 4296 pelo Supremo Tribunal Federal, reconhecendo-se a inconstitucionalidade do artigo 7°, § 2° da Lei 12.016/2009.
Trata-se de julgamento cuja decisão ainda não foi publicada, não se podendo conhecer oficialmente os fundamentos utilizados pela Corte Suprema.
De qualquer modo, o referido julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal não interfere no panorama jurídico em vigor na data da resposta (quando aplicada a prova), uma vez que já era pacífico o entendimento no sentido da inaplicabilidade das restrições ao poder de conceder medidas de antecipação da tutela em matéria previdenciária (Súmula 729 do STF).
Em suma, não fora o julgamento em questão realizado no âmbito do Supremo Tribunal Federal, cujo acórdão ainda não havia sido oficialmente publicado, que tornou cabível a antecipação da tutela em detrimento da Autarquia previdenciária. Assim já era o firme posicionamento dos nossos Tribunais.
GABARITO
Restrições legais previstas no ordenamento infraconstitucional impedindo o deferimento de medidas de antecipação da tutela contra a Fazenda Pública, como no caso da decisão que implique aumento ou extensão de remuneração de servidor (0,1)
Compatibilidade dessas limitações legais com o texto constitucional, conforme julgamento do STF proferido no ADC-04 (0,1)
Interpretação restritiva dessas hipóteses excepcionais, não alcançando situações que não estejam expressamente previstas no texto da lei, consoante a firme orientação jurisprudencial dos nossos Tribunais (0,1).
Não aplicação das limitações nas hipóteses de ações previdenciárias. Súmula 729 do STF. Apreciação do requerimento de antecipação da tutela pelo Juízo competente, verificando a presença ou não dos pressupostos para a sua concessão (0,1).
DIREITO DO CONSUMIDOR
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxx, pessoa de modestas posses, porém exímia artesã na arte pintar porcelanas, por sugestão de amigas resolve ofertar seus trabalhos através do site Mercado Rápido que intermedia compras e vendas do gênero. Entusiasmada com o sucesso causado por seu pequeno anúncio e a mensagem veiculada por terceiro manifestando interesse na aquisição das peças exibidas, fecha a venda das mesmas, cuida de proceder à entrega da encomenda conforme orientação do site intermediador, mas infelizmente o 4 comprador não paga pelas peças entregues, escusando-se o site de ressarci-la do prejuízo sofrido, ao argumento que a venda tinha sido feita pelo site, porém por sua conta e risco e que sua responsabilidade só existiria no caso dela fornecedora não entregar o produto. Indaga-se, quanto à existência de relação de consumo e a justificativa para tal conclusão.
Entende-se que há relação de consumo e o candidato deverá discorrer sobre o conceito de consumidor e as teorias que tratam do tema, assim como a posição do STJ, apontando as razões pelas quais concluiu pela responsabilidade do site, citando os dispositivos legais pertinentes, demonstrando assim que conhece a legislação a ser aplicada.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxx, professora aposentada que já conta com 78 anos de idade, vendo minguar cada vez mais seus parcos proventos, comparece mensalmente ao banco depositário para sacar o saldo de sua aposentadoria, a esta altura já comprometida em praticamente 50%, com empréstimos consignados descontados em seu contracheque e no cartão de crédito, que lhe foi gentilmente oferecido pelo banco. Vendo crescer cada vez mais a dívida, sem outros recursos para saldá-la, entra em desespero, dirige-se à gerência do banco, na busca de uma solução para o seu problema, quando lhe é oferecido novo empréstimo, disponibilizado um crédito em montante suficiente para quitar todos os empréstimos anteriores, reduzindo-se o valor da prestação mensal, diluído o pagamento da nova dívida em 60 meses. Indaga-se: a) em que situação jurídica se enquadra Xxxxx; b) estabeleça um paralelo entre os princípios vetores do CDC e o novel Diploma Legal que regulamenta, em tese, hipóteses assemelhadas.
Deverá ser reconhecida situação e superendividamento da consumidora, que é idosa, citar o novel diploma legal – Lei 14181/2021 – falar dos princípios vetores do CDC e do novel Diploma legal, devendo, preferencialmente, dar destaque ao princípio da dignidade da pessoa humana, que tem assento constitucional, princípio da concessão do crédito responsável, da cooperação e transparência nas relações entre o credor e o consumidor, preservação do mínimo existencial, destacando que em conformidade com a nova lei será possível ao superendividado requerer ao juiz a convocação dos credores para
uma tentativa de recuperação do devedor mediante elaboração de plano de quitação das dívidas com maior ou menor prazo, tudo para o fim de evitar a sua exclusão social.
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): O Direito da Criança e do Adolescente é ramo da ciência jurídica, dotado de princípios próprios, os quais influenciam outros ramos do Direito. Objetivamente, o Direito da Criança e do Adolescente disciplina as relações jurídicas entre Crianças e Adolescentes, de um lado, e Família, Sociedade e Estado, de outro. Visando a concretude dos Valores, Princípios e Regras do Direito da Criança e do Adolescente, foram preceituados diversos dispositivos. Inclusive, foi adotado um sistema interpretativo axiológico e com esteio, ainda, na densidade de conteúdo das orientações de destaque dentro dos Princípios Gerais do Direito da Criança e do Adolescente. PERGUNTA-SE: Como intérprete, conforme o Sistema Valorativo dos Direitos da Criança e do Adolescente, elenque e indique se está(ão) positivado(s) e em qual(ais) diploma(s) legal(ais): 1-Norma(s) Supralegal(ais); 2- Metaprincípio(s); 3-Princípios Derivados (ao menos 7).
A questão visou aferir conhecimentos do candidato sobre aspectos gerais do Direito da Criança e do Adolescente, principalmente sobre seu conhecimento do sistema valorativo e do contexto de aplicação dos Princípios próprios da matéria. Para tanto, fizemos os três questionamentos.
1- NORMA(S) SUPRALEGAL(AIS): A indagação pressupunha o conhecimento sobre essa Norma de cumprimento obrigatório, também classificado como postulado normativo (segundo a Doutrina de Xxxxxxxx Xxxxx) e também do próprio contexto Constitucional e infra Legal.
RESPOSTA: INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, é a
resposta esperada, pois trata-se DO MAIOR VALOR da disciplina, tendo espectro amplo de incidência para todo e qualquer Direito envolvendo criança e adolescente. Atualmente, encontra-se expressamente no art. 100, IV, do ECA, do capítulo das Medidas Protetivas, mas não limitadas a essas. Para efeitos de correção das provas, também foi considerada eventual resposta que mencionou sobre Tratados de Direitos Humanos aprovados no Brasil, antes da inserção do § 3º do art. 5º da CF, por ocasião da edição da E.C. 45/2004, vez que o próprio E. STF realizou uma relação de hierarquia sobre essas Normas Supralegais. Lei nº 12.010/2009, art. 100, IV - interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e
direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;
2- METAPRINCÍPIOS: Esperava-se do candidato que elencasse os dois Metaprincípios nucleares, contidos, expressamente, na própria CF e no ECA. Valendo ressaltar que a aplicação dos mesmos está norteada pelo postulado normativo de maior valor, o Interesse Superior da Criança e do Adolescente. RESPOSTA: PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORIDADE ABSOLUTA. Caput Art.
227 da CF, que afirma ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação exploração, violência, crueldade e opressão.
(Lei nº 12.010/2009, art. 100, II): a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contidas nessa Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares.
3- PRINCÍPIOS DERIVADOS: foram pedidos aos candidatos que elencassem, ao menos, sete dos princípios derivados dos dois metaprincípios nucleares e que constam, expressamente, no art. 100 do ECA. Conforme os exemplos a seguir:
RESPOSTA: 1) CONDIÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE COMO SUJEITOS DE DIREITOS: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, I) – crianças e
adolescentes são os titulares dos direitos previstos nesta e em outras Leis, bem como na CF. 2) RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SOLIDÁRIA DO PODER
PÚBLICO: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, III) – a plena efetivação dos direitos assegurados a crianças e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição Federal, salvo nos casos por esta expressamente ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das 3 esferas de governo, sem prejuízo da municipalização do atendimento e da possibilidade da execução de programas por entidades não governamentais; 3) PRIVACIDADE: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, V) – a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; 4) INTERVENÇÃO PRECOCE: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, VI) – a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida; 5) INTERVENÇÃO MÍNIMA: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, VII) – a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do adolescente; 6) PROPORCIONALIDADE E ATUALIDADE: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, VIII) – a
intervenção deve ser a necessária e adequada à situação de perigo em que a
criança ou o adolescente se encontram no momento em que a decisão é tomada. 7) RESPONSABILIDADE PARENTAL: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, IX)
– a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente. ALIADO AO ART. 229 DA CF. 8) PREVALÊNCIA DA FAMÍLIA: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, X) - na promoção de direitos e na proteção da criança e do adolescente deve ser dada prevalência às medidas que os mantenham ou reintegrem na sua família natural ou extensa ou, se isto não for possível, que promovam a sua integração em família substituta; 9) OBRIGATORIEDADE DE INFORMAÇÃO: (Lei nº 12.010/2009, art.
100, XI) - a criança e o adolescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, seus pais ou responsável devem ser informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa; 10) OITIVA OBRIGATÓRIA E PARTICIPAÇÃO: (Lei nº 12.010/2009, art. 100, XII) – a criança e o adolescente, em separado ou na companhia dos pais, de responsável ou de pessoa por si indicada, bem como os seus pais ou responsável, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, sendo sua opinião devidamente considerada pela autoridade judiciária competente, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 28 desta Lei.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Os brasileiros, Xxxxx e Xxxx, se tornaram “pais de primeira viagem” do casal de gêmeos, Xxxxxx e Xxxxx, cujo nascimento do primeiro deles se deu 6(seis) minutos antes da segunda, em 28/02/2002, às 23.56h. Xxxxx nasceu com Síndrome de Down. Mais tarde, tiveram o terceiro filho, Xxxx, em 2015. Lamentavelmente, no início do ano de 2020, Xxxx veio a falecer, possivelmente vítima da Covid-19, após ter ido visitar parentes no norte da Itália. O falecido Xxxx era pessoa influenciadora e de convicções arraigadas e próprias. Inclusive, convenceu Xxxxx da desnecessidade de vacinar os filhos do casal para algumas 5 doenças, ao longo dos anos, por entender que afetaria a boa saúde deles, ao invés de evitar o mal. A situação dos filhos de Xxxxx chegou ao conhecimento do Ministério Público e, consequentemente, do Juiz da Infância e Juventude. Dos requerimentos formulados ao Juízo, entre outros, constavam sanções pecuniárias aplicáveis à Maria, na base de 20(vinte) salários-mínimos, bem como a medida de suspensão da guarda e poder familiar para a providência de busca e apreensão dos três filhos, com o encaminhamento dos mesmos à sala de imunização do Posto Sanitário próximo ao Juízo, visando a atualização vacinal. E, para isso, o dia 29/02/2020 foi designado. Indaga-se: 1- Como o Juiz da Infância e Juventude deve decidir sobre os pedidos do Ministério Público? 2- Quais os fundamentos de fato e de Direito em relação a cada filho? 3- Acaso poderá o Juiz se utilizar de outras fontes normativas, em diálogo? 4- Ainda que os fatos em análise sejam anteriores a recente decisão do Egrégio Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral sobre a temática, justifique suas respostas com apoio dessa jurisprudência.
A segunda questão visou aferir do candidato, diante de caso prático hipotético formulado, conhecimentos básicos sobre Direito fundamental à saúde da criança e do adolescente, bem como sobre as eventuais responsabilidades e medidas pertinentes aos pais e responsáveis em caso de descumprimento dos deveres inerentes.
RESPOSTA: O caso apresentado guardou bastante similitude com o que foi julgado pelo E. STF, RE Agravo 1.267.879-SP, em repercussão geral, em 17/12/2020, cujo TEMA ganhou o nº 1103, da relatoria do Exmo. Ministro Xxxxxxx Xxxxxxx, cuja ementa foi a seguinte: Direito Constitucional. Recurso Extraordinário. Repercussão Geral. Vacinação obrigatória de crianças e adolescentes. Ilegitimidade da recusa dos pais em vacinarem os filhos por motivo de convicção filosófica. Também foi fixada a seguinte TESE: “É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja, objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar.” Desse modo, esperava-se que o candidato aplicasse as sanções pertinentes à genitora, valendo ressaltar que o próprio ECA já dispõe das normativas. Sendo possível o deferimento da medida de suspensão da guarda e do poder familiar dos filhos crianças e adolescentes, bem como a busca e apreensão dos mesmos para o efeito de regularização da vacinação obrigatória, nos termos do art. 14, § 1º, do art. 11, parágrafos 1º a 3º (para crianças e adolescentes com deficiência), combinados com o art. 249 (que dispõe sobre as sanções aplicáveis) e do Título IV, art. 129 e seguintes, que tratam das medidas aplicáveis aos genitores e responsáveis. Dos três filhos mencionados na questão, Xxxx ainda era criança e apenas um era maior de 18 anos completos na data de 29/02/2020 (Designada judicialmente para as medidas de regularização da vacinação do PNI – Plano Nacional de Imunização). Xxxxxx, então, não sofreria as medidas de busca e apreensão, suspensão da guarda e do poder familiar com vacinação obrigatória. Ao contrário, sua gêmea Xxxxx, com síndrome de Down, ainda era adolescente, com 17 anos de idade, visto que completaria a maioridade apenas no dia seguinte, 01/03/2020. Sem embargos, como Xxxxx é pessoa com deficiência, merecem aplicação, ainda, os diversos diplomas Legais pertinentes, como a Lei Brasileira de Inclusão, que determina, a partir da CF, a Proteção Integral contra qualquer negligência em desfavor de Adolescente com deficiência. Outras fontes normativas, que podem aplicadas em diálogo, principalmente com o ECA: - Estatuto da pessoa com deficiência (Lei. 13.146/2015), que menciona que a criança e o adolescente com deficiência são
considerados especialmente vulneráveis, além de garantir proteção contra negligência. - Código Civil Brasileiro, principalmente quanto às Normas e Regras que dizem da capacidade.
DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Morador do Rio de Janeiro propôs em 2020 ação individual pleiteando a devolução de tarifas de água pagas a certa concessionária desde 2005, quando, segundo alega, teria sido o serviço interrompido. Diz ter ficado cansado de aguardar o desenlace de ação civil pública proposta pela associação de moradores de seu bairro, em tramitação desde 2011, quando se deu, ao seu ver, a interrupção do prazo prescricional da pretensão restitutória. Regularmente citada, a ré ofereceu contestação, noventa dias depois da propositura da ação individual, arguindo a prescrição de todas as parcelas vencidas há mais de cinco anos (artigo 27 do CDC) e sustentando que a propositura da ação não interrompeu o prazo prescricional para o autor individual, até porque não é ele filiado à associação autora da ação coletiva. Decida as questões propostas.
O enunciado indagava ao candidato sobre o prazo prescricional da pretensão de repetição de tarifas de água; se não filiados a uma associação poderiam se aproveitar da coisa julgada por esta proposta e se, tendo proposto ação individual, ao particular aproveita a interrupção da prescrição obtida na ação coletiva.
Como critério de correção a banca atribuiu os pontos da seguinte forma:
A) 0,1 para quem explicasse que não se aplica à espécie o prazo quinquenal do artigo 27 do CDC, visto que não se cuida de responsabilidade civil. E na falta do outro prazo, prevalece o prazo residual, decenal, do Código Civil. Referências genéricas “ ao entendimento do STJ” foram pontuadas com parte do grau.
B) 0,1 foi atribuído a quem distinguisse representação processual de substituição processual, deixando claro que no caso da segunda a coisa julgada beneficiaria mesmo o não-associado.
C) 0,15 foi atribuído a quem, na forma do Tema Repetitivo 1005 do STJ, explicasse que para se beneficiar da interrupção na ação coletiva deveria o particular requerer a suspensão de ação individual.
D) 0,05 foi atribuído consoante a correção do Português, e a coordenação do raciocínio.
DIREITO PENAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): No dia 20/02/2021, por volta das 12:00 horas, na Rua X, no bairro do Flamengo, nesta cidade, ROBERTO, TÉRCIO e CAETANO, agindo em comunhão de ações e desígnios, abordam um veículo onde estão TERTULIANO (motorista) e PETÚNIA, anunciando o roubo e os ameaçando mediante um simulacro de arma de fogo. Conseguem, assim, subtrair o veículo, um relógio de TERTULIANO e o telefone móvel de PETÚNIA. Ingressam no carro e se afastam, mas são obrigados a parar cerca de 100 metros à frente, em um semáforo que está fechado, com outros veículos bloqueando a sua passagem. Aproxima-se uma viatura e os lesados fazem sinal e narram o que ocorreu, mostrando o veículo que ainda está parado no sinal de trânsito. Os policiais conseguem abordar e prender os roubadores. Quando fazem a revista, além do simulacro que estava embaixo do banco do carona, encontram em poder de XXXXXXX, na sua cintura, uma pistola 9 mm, municiada. Decidir quanto ao (s) crime (s) ocorrido (s) e aplicar as penas. Não é necessário fazer o relatório.
Pela descrição do fato, temos em relação a XXXXXXX e TÉRCIO, a prática de dois crimes de roubo consumados, circunstanciados pelo concurso de agentes, em concurso formal.
No que tange a Xxxxxxx, além desses crimes, temos ainda a infração penal prevista no art. 14 da Lei 10.826/03.
Os candidatos devem comentar rapidamente quanto à consumação e posicionamento das Cortes Superiores, porte de arma não estendido aos demais agentes, pois o enunciado não diz que tivessem conhecimento da existência do artefato bélico e ao fato da pistola 9 mm, não ser mais considerada arma de uso restrito.
Dosimetria: não há nenhuma indicação de que as penas tenham que extrapolar o mínimo legal. Logo, teríamos quantos aos roubos, pena-base no menor patamar, mais 1/3 e mais 1/6, resultado final 06 (seis) anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime semiaberto e 26 (vinte e seis) dias-multa, no menor valor unitário (art. 72 do CP). Isto se aplica a XXXXXXX e TÉRCIO.
No que tange a CAETANO, além dessas penas, teríamos mais 02 (dois anos de reclusão) pelo crime descrito no artigo 14, da Lei 10.826/03. O regime de prisão seria o fechado, face ao montante da reprimenda. Resposta penal de 08 (oito) anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, sob o regime fechado e 36 (trinta e seis) dias-multa, na menor fração legal.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): No dia 21/04/2021, por volta das 23:00 horas, na Rua X, no Bairro de Botafogo, nesta cidade, FRANCISCO, WALLACE, MAYCON e XXXX XXXXX XXX XXXXXX, nascido em 19/04/2000, agindo em comunhão de ações, na posse de gazuas, martelos e alicates, arrombam uma porta e conseguem entrar no interior de uma loja de departamentos pretendendo subtrair bens. Nesse momento ouvem uma sirene usada em veículo e pensando tratar-se de uma viatura policial, resolvem sair da loja e fogem do local. Responder: a) quanto ao (s) crime (s) ocorridos e qual seria a dosimetria penal. b) tecer comentários quanto à tipicidade do fato e iter criminis. Não é necessário lavrar uma decisão.
Em conformidade com a narrativa da questão, os quatro (04) agentes pretendiam subtrair bens do estabelecimento comercial. Munidos de ferramentas próprias para isto, arrombaram a porta e chegaram a ingressar no estabelecimento, mas ouvindo uma sirene, desistiram de sua empreitada e empreenderam fuga.
Seria necessário decidir quanto à existência de uma tentativa ou de desistência voluntária. Necessário esclarecer quanto à diferença entre desistência espontânea e voluntaria, lembrando-se que o Código Penal, exige o início da execução. Qual o ato inicial de um furto?
Houve desistência voluntária, respondendo os agentes pelos fatos praticados. Xxxxxxxxxx decidir quanto aos crimes subsistentes. Teríamos um dano e uma violação de domicilio, cometida durante à noite e por quatro agentes.
Necessário dizer se o dano remanesceria, examinando se ocorreu, ou não, a decadência, ou a sua consumção, por se tratar de crime-meio.
Xxxx quanto à violação de domicilio. Examinar e justificar se havendo duas circunstâncias que integram a qualificadora, crime durante à noite e mediante quatro agentes, a pena deveria ainda assim permanecer no mínimo legal ou se deveria incidir um aumento, que não poderia ser maior de 1/6.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Após receberem denúncia anônima de que em determinado imóvel no interior da Comunidade do Jacarezinho, Rio de Janeiro, haveria material entorpecente guardado, policiais militares diligenciaram e localizaram o referido imóvel, nele ingressando sob a alegação de que a porta não estava trancada com chave. Já no interior do imóvel, avistaram, sentados, Xxxx e Xxxx, ambos imputáveis penalmente, e ao lado do sofá duas armas de fogo calibre 38, municiadas e em perfeitas condições de uso, além de uma balança e grande quantidade de pequenos sacos plásticos, bem como apreenderam um aparelho celular, o qual acessaram e afirmaram conter fotos de Xxxx e Xxxx ao lado de conhecidos traficantes da Comunidade. O Ministério Público denunciou João e Xxxx pelos crimes do art. 35, da Lei n.º 11.343/2006, e do art. 14, da Lei n.º 10.826/2003.
As FAC’s não possuem qualquer anotação e Xxxx e Xxxx xxxxxxxxxx-se em silêncio em sede policial e em juízo. Encerrada a oitiva as testemunhas, o Ministério Público, em alegações finais orais, requereu a condenação de ambos pelo crime de associação para o tráfico ilícito de entorpecente, com a causa especial do emprego de arma de fogo (art. 35 c/c art. 40, IV, da Lei n.º 11.343/2006), argumentando que ninguém pratica o tráfico de entorpecentes naquela Comunidade sem estar associado à facção criminosa que a domina. A Defesa dos acusados requereu, em preliminar, a conversão do julgamento em diligência para realização da perícia no aparelho celular – requerida na defesa prévia e ainda não atendida –, a fim de provar a inexistência de qualquer fotografia, e, no mérito, requereu a absolvição por dupla ilicitude a contaminar todas as provas produzidas, isto é, o ingresso na residência sem autorização dos moradores e o acesso sem autorização ao conteúdo das mensagens e fotos do aparelho celular apreendido, ambos violadores da privacidade constitucionalmente assegurada. Considerando que as teses defensivas – preliminar e mérito – são prejudiciais ao pedido condenatório formulado pelo Parquet, como o Juiz deve decidi-las?
Por se tratar de exame da disciplina Processo Penal, evidente que não se está a questionar tipicidade em sede penal, apenas havendo referência às condutas imputadas. A questão posta objetiva saber o domínio e conhecimento do candidato sobre a fase das alegações finais, em particular as defensivas, notadamente após a reforma introduzida pela Lei nº 11.719/2008. O entendimento do arrazoado final como ato essencial a caracterizar o princípio do Due Process of Law. A integração das alegações à instrução criminal, gênero que tem a instrução postulatória como espécie ao lado da instrução probatória.
Destarte, fundamental ser afirmada a correta postulação que já fora requerida na defesa prévia e ainda não atendida, gize-se, não havendo falar em preclusão eis que reiterada no momento processual oportuno (DEMORO, 1995; RANGEL, 2012; PACELLI, 2012; STF: RHC 104261; HC 88868; HC 104462; STJ: HC
160.384/SP; RHC 30817/MG; HC 154945/RJ).
A relevância do conteúdo do requerimento – a perícia no aparelho celular- é de caráter subjetivo, não se exigindo enfrentamento, no ponto, mas sim pertinência processual, uma vez que o candidato poderá reconhecer que a postulação deve ser superada caso entenda que, no mérito, há ilicitude(s) e/ou ilegalidade(s) a indicar a absolvição dos acusados.
O que se pretende é constatar a atualização e manejo pelo candidato quanto à jurisprudência dos Tribunais Superiores que afirmam os vícios apontados, não obstante a existência de flagrante delito no interior da residência ingressada sem autorização (STF: RE 613.616/RO – tese com repercussão geral; STJ: HC
561329; HC 586474; HC 609072; HC 630369; HC 588445; HC 616584; HC 566818;
RHC 126092; RESP 1871856), assim como o acesso desautorizado ao conteúdo das mensagens e fotos existentes no aparelho celular (STJ: HC609221/RJ; AgRg no RESP 1912303/PR).
Será merecedora de especial consideração a observação que à hipótese não haveria incidência de recente julgado do STJ (RESP 1782386/RJ) que excepciona o acesso aos dados contidos na agenda de contatos telefônicos.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): No dia 21 de janeiro de 2021, Xxxxx e Xxxxx, o primeiro armado com um revólver calibre 32, gravemente ameaçaram Mariana, que caminhava pelo calçadão da Praia de Copacabana, e subtraíram o seu aparelho celular. Alertados, policiais militares 7 detiveram os roubadores a três quarteirões do local, apreendendo a arma, a qual foi devidamente periciada e comprovada a potencialidade lesiva, e o celular subtraído. Denunciados pelo crime do art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do Código Penal, Xxxxx e Xxxxx confessaram, quando interrogados, a subtração. Ao proferir a sentença condenatória, as penas-base de reclusão e de multa foram fixadas nos mínimos legalmente previstos e, embora reconhecida a atenuante da confissão, foi ela desconsiderada na segunda fase do processo dosimétrico. Como o Juiz deve calcular a pena na terceira fase, considerando que o Ministério Público pediu a aplicação autônoma das duas causas especiais de aumento, enquanto a Defesa dos réus requereu a aplicação de uma única circunstanciadora de aumento para não incidir em bis in idem e, no ponto, aquela mais favorável aos acusados?
A questão pretende verificar o manejo pelo candidato na aplicação no Processo Penal das regras referentes à dosimetria da pena, em especial o disposto no artigo 68 e parágrafo único do Código Penal.
Veja-se que não está em discussão o recente julgado do Superior Tribunal de Justiça (HC 463.434-MT) sobre critérios distintos e relativos às chamadas majorantes sobejantes, e que estaria autorizada a sua utilização pelo juiz na aplicação da pena em outra fase do processo dosimétrico.
No caso apresentado, para facilitar o candidato, foi descrita idêntica situação fática e jurídica em relação aos dois denunciados e, o que importa, a questão expressa que o juiz já fixou as penas-base nos respectivos mínimos legais e reconheceu a confissão sem qualquer reflexo no cálculo da pena (confira-se conteúdo do verbete sumular nº 231 do colendo STJ). Em outras palavras, quer-se saber como o juiz realizaria a aplicação da pena na terceira fase, frise- se, sendo certo que a pena está até aquele momento dosimétrico em 04 anos de reclusão e 10 dias-multa.
Caso a opção seja pela aplicação sancionatória das duas circunstâncias especiais de aumento como pugna o Ministério Público, deverá o candidato justificar a razão da utilização, ou não, do disposto no parágrafo único do art. 68 do CP e, se for o caso, justificar o aumento por cada circunstanciadora calculado independentemente sobre as penas então já fixadas na segunda fase
– tese que, alternativamente, se afigura favorável aos acusados – ou cumulativamente.
Na hipótese de entender pela aplicação pelo disposto no parágrafo único do art. 68 do CP, deverá, fundamentadamente, justificar, diante do caso concreto, a opção, observando serem somente dois os agentes criminosos, emprego de uma única arma de fogo de pequeno calibre e a fixação das penas-base nos respectivos mínimos legais.
A resposta ao que se expôs já incluirá, natural e implicitamente, a tese sobre o bis in idem sustentada pela defesa.
DIREITO CONSTITUCIONAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Dois dispositivos de leis municipais foram submetidos a controle de constitucionalidade no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. O primeiro dispositivo teve por parâmetro de conformidade uma norma constitucional de reprodução obrigatória. O segundo teve por parâmetro de conformidade uma norma constante da Constituição Estadual que fora reproduzida por mera imitação da Constituição Federal. Tendo em consideração este enunciado, responda as indagações que seguem, indicando as soluções constitucionais aplicáveis à espécie: a) estas duas situações podem ser objeto de controle na Corte estadual pela via de representação de inconstitucionalidade? b) as duas hipóteses mencionadas, autorizam, ou não, interposição de recurso extraordinário para conhecimento da questão constitucional pelo Supremo Tribunal Federal?
O desenvolvimento da resposta deve observar os seguintes fatores: quando uma norma estadual ou municipal é contestada quanto à sua compatibilidade com Constituições Estaduais, ela pode sê-lo em face de preceitos (a) criados originariamente pela Assembleia Constituinte estadual, no exercício de sua autonomia (normas constitucionais genuinamente estaduais); ou (b) cujo conteúdo repete, por um princípio de absorção federativamente obrigatória, normas da Constituição Federal ( normas de reprodução obrigatória); ou (c) cujo conteúdo repete, por um processo puramente mimético, normas da Constituição Federal ( normas de imitação ou de reprodução ociosa).
Destarte, as duas situações em destaque podiam ser submetidas ao controle na Corte estadual pela via de representação de inconstitucionalidade, nos termos do artigo 125, § 2º, da Constituição Federal.
A primeira situação tem sua adequação delineada porque a norma constitucional integra a Constituição Estadual, ainda que repetindo norma obrigatória da Constituição Federal.
A segunda situação também tem sua adequação delineada porque o controle se contém na norma constitucional estadual, pouco importando se reproduziu a Constituição Federal de maneira ociosa, ou por mera imitação.
É de se levar em consideração ainda que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal autoriza interposição de recurso extraordinário na hipótese de declaração de inconstitucionalidade por Tribunal estadual em se tratando de norma constitucional de reprodução obrigatória pelas Constituições Estaduais.
Não cabe tal recurso no caso de norma constitucional de reprodução facultativa, como é o caso de mera imitação, uma vez que o controle de constitucionalidade no caso não confronta norma constitucional federal propriamente dita.
Por fim, na atribuição de grau, será considerada adequada correção vernacular na elaboração da resposta e realização de redação com absoluta observância da terminologia constitucional aplicável à temática vertida na pergunta.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Como é realizado controle judicial de invalidade (ilegalidade ou inconstitucionalidade) de dispositivo de lei ordinária que se contraponha a disposição de tratado internacional sobre direitos humanos aprovado em procedimento legislativo qualificado (CF, art. 5º, § 3º)? Idêntica pergunta na hipótese de tratado de mesma natureza aprovado em procedimento legislativo simples (art. 47 CF). Indique e justifique os tipos de efeitos normativos (erga omnes e entre partes) resultantes das declarações de invalidade em ambos os casos.
O desenvolvimento da resposta deve observar os seguintes fatores: a primeira pergunta versa o denominado controle de convencionalidade, que se pode realizar pela via da ação direta de inconvencionalidade (utilizando por simetria a ADIN) nos casos de convenções aprovadas na forma do parágrafo terceiro do artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal, pois passam a ostentar status de emenda constitucional. Idêntica modalidade de tratado, aprovada em procedimento simples é considerada por decisão do STF como norma supralegal e, nessa qualidade, pode ser declarada inválida pela via incidental. A declaração na via direta tem eficácia erga omnes, enquanto a realizada na via indireta tem eficácia entre as partes, podendo chegar ao conhecimento do STF mediante interposição de recurso extraordinário.
Por fim, na atribuição de grau, será considerada adequada correção vernacular na elaboração da resposta e realização de redação com absoluta observância da terminologia constitucional aplicável à temática vertida na pergunta.
DIREITO ELEITORAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Candidato que na data da análise da candidatura se encontra dentro do prazo de inelegibilidade, prazo esse que se encerrará 1 dia antes da data da eleição. Diante do momento da análise, tal candidatura deve ser deferida ou indeferida? Qual a base legal para tal decisão?
Resposta objetivamente fundamentada.
R- A base da questão encontra previsão na Súmula 70 do TSE Que assim se expressa:
“O encerramento do prazo de inelegibilidade antes do dia da eleição constitui fato superveniente que afasta a inelegibilidade nos termos do artigo 11, § 10 da Lei 9.504/97”
Essa súmula decorreu do julgamento do P.A. 32.345 do TSE em 10-05-2016
Logicamente a resposta correta seria o deferimento da candidatura com base no artigo 11, § 10 da Lei 9.504 com a interpretação consolidada pela Súmula 70 do TSE.
DIREITO EMPRESARIAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Determinada sociedade limitada estabelecida por prazo indeterminado e constituída por quatro sócios. Um dos sócios se afastou da vida societária e, exercendo seu direito de retirada, no mesmo dia, ajuizou ação para recebimento dos valores referentes às suas cotas. Transcorridos 24 (vinte e quatro) meses, foi prolatada a sentença, julgando procedente a demanda e determinando a dissolução parcial da sociedade e apuração de haveres. O sócio nada recebeu durante o tempo da ação judicial. Qual a data base da apuração de haveres? O balanço especial de apuração de haveres deve considerar a mutação patrimonial gerada no período da ação judicial? Justifique
Trata-se de hipótese de dissolução parcial de sociedade empresária, sendo que, em se tratando de sociedade por prazo indeterminado, possível o desligamento do sócio retirante de maneira imotivada. Entretanto, o sócio
retirante deveria ter notificado os demais sócios, com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias, tendo em vista o que dispõe expressamente o art. 1.029, caput, do Código Civil. A notificação prévia ainda se faz necessária para que haja tempo hábil à preparação do balanço de determinação, a que a lei denomina balanço especialmente “levantado à data da resolução”, nos termos do art. 1.031, caput, do Código Civil.
Porém, como o sócio retirante preferiu o ajuizamento da ação para apuração de seus haveres, a jurisprudência tem buscado suprir a lacuna legal, ao estabelecer como parâmetro para a fixação da data do balanço de determinação a data do ajuizamento da ação judicial, pois, nesta o retirante especificou formalmente o seu desejo de se retirar do empreendimento.
Há precedentes considerando razoável a data de citação válida.
Ainda que a formalização da retirada do sócio se opere somente com o trânsito em julgado da sentença, certo é que os efeitos do provimento judicial deverão alcançar situação anterior (efeitos ex tunc), momento em que, faticamente, houve o rompimento do vínculo societário.
No caso, sem que o sócio retirante tenha concorrido para os resultados experimentados pela sociedade depois de sua retirada, não poderia colher o que não semeou, caso contrário isso denotaria enriquecimento sem causa.
Contudo, uma ressalva deve ser feita. Na eventualidade da existência de contratos pendentes em favor da sociedade, quando do desligamento fático do sócio retirante do empreendimento, tem o mesmo direito à inclusão dos respectivos resultados patrimoniais no balanço. Há que se considerar, outrossim, a capacidade de lucros futuros (o goodwil). Assim, a mutação patrimonial posterior ao desligamento fático do sócio retirante poderá sim ser considerada, para fins de haveres.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Após decretada a quebra da companhia Ticio S.A., o administrador judicial, transcorridos 30 (trinta) dias do termo de nomeação, apresentou o plano detalhado de realização dos ativos. Consta do auto de arrecadação apenas um prédio localizado no bairro de Ipanema, avaliado em R$100 milhões. O juiz determinou a alienação do bem na modalidade de leilão eletrônico. O ativo foi arrematado em terceira chamada por R$ 40 milhões. Um credor impugnou a alienação, arguindo o conceito de preço vil, embora reconheça que as formalidades do certame foram respeitadas. O credor não apresentou outra oferta superior, nem terceiros, apenas o argumento de que os credores poderiam ser prejudicados. Analise o pleito do credor, apresentando os fundamentos.
A lei nº. 11.101/05, com as alterações promovidas pela lei n°. 14.112/20, disciplina a matéria.
Em qualquer das modalidades de alienação referidas no art. 142, poderão ser apresentadas impugnações por quaisquer credores, pelo devedor ou pelo Ministério Público, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas de arrematação,
hipótese em que os autos serão conclusos ao juiz, que, no prazo de 5 (cinco) dias, decidirá sobre as impugnações e, julgando-as improcedentes, ordenará a entrega dos bens ao arrematante, respeitadas as condições estabelecidas no edital.
Conforme disposto no parágrafo 1º, do dispositivo legal citado, as impugnações baseadas no valor de venda do bem somente serão recebidas se acompanhadas de oferta firme do impugnante ou de terceiro para a aquisição do bem, respeitados os termos do edital, por valor presente superior ao valor de venda, e de depósito caucionário equivalente a 10% (dez por cento) do valor oferecido.
Nos termos do art. 142, parágrafo 3º-A, da lei nº. 11.101/05, a alienação por leilão eletrônico, presencial ou híbrido, dar-se-á:
III – em terceira chamada, dentro de 15 (quinze) dias, contados da segunda chamada, por qualquer preço.
O art. 142, parágrafo 2º-A, inciso V, reza que não estará a questão sujeita à aplicação do conceito de preço vil.
Finalmente, na forma do art. 142, parágrafo 2º-A, inciso I, a alienação dar-se-á independentemente de a conjuntura do mercado no momento da venda ser favorável ou desfavorável, dado o caráter forçado da venda.
DIREITO TRIBUTÁRIO
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Determinado Município editou lei prevendo a incidência do Imposto sobre Serviços (ISS) sobre as operações com seguros de qualquer natureza, e fixando a respectiva alíquota em 1,8% sobre o faturamento decorrente da venda de seguros, incidente não só apenas no caso das seguradoras com sede no próprio Município, mas também na hipótese de outras que venham a no seu território operar. Qual a sua opinião acerca da constitucionalidade da exigência?
A norma é inconstitucional, visto que os seguros não se sujeitam ao ISSQN, eis que estão submetidos ao IOF, nos termos do art. 153, V, da Constituição Federal, que atribuiu à União Federal a competência exclusiva para instituir impostos sobre seguros, ficando prejudicada, portanto, a ilegalidade da fixação de alíquota do ISS inferior a 2%, nos termos do art. 8º-A, da LC 116/2003, com redação da LC 157/2016 [0,20].
Além disso, ao prever a incidência do imposto municipal sobre seguros de qualquer natureza, a norma diverge do entendimento firmado pelo plenário do STF no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 651.703, com repercussão geral, que estabeleceu que o regime jurídico tributário das empresas operadoras de planos de saúde, tributadas pelo ISS,
não se aplica às seguradoras de saúde, posto estarem submetidas ao IOF, [0,20].
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): O contribuinte XYZ se dedica ao comércio de bebidas. Após dar saída de mercadorias no valor de um milhão de reais de seu estabelecimento matriz, para transferi-las para uma filial no mesmo Estado, houve, durante o trajeto, furto de metade das mercadorias. Assim, só chegaram ao outro estabelecimento quinhentos mil reais em mercadorias. Considerado a alíquota de 18%, qual seria o ICMS nessa operação?
Não haveria ICMS na operação por se tratar de transferência entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, situação que escapa à incidência do imposto estadual, nos termos da Súmula 166, do STJ, visto que a hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de sua titularidade ao consumidor final. Portanto, o elemento furto não é relevante para a operação, eis que não traz qualquer impacto tributário no caso concreto [0,20].
Ao apreciar a matéria, nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, o plenário do STF declarou a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, §4º, da Lei Complementar nº 87/1996, consagrando o entendimento de que o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS [0,20].
DIREITO AMBIENTAL
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxxxx Xxxxxxx (AA), sitiante em Campos dos Goytacazes, querendo fazer um roçado de diversas culturas, removeu a vegetação nativa de uma área aproximada de 8000m2 às margens do Rio Paraíba do Sul as quais distavam, uma da outra, cerca de 70m. Nas proximidades do local do desmatamento há um ancoradouro onde são guardados os barcos usados para o transporte de material de construção para um dos bairros do Município, assim como as canoas usadas pelos pescadores. Para o abate das árvores AA usou um motosserra à gasolina, adquirida no dia anterior e ainda não legalizada perante a autoridade competente. Com base no enunciado, responda: a) – que ilícitos administrativos, 9 civis e penais foram cometidos por AA? b) – quais as consequências dos ilícitos cometidos? c) – de quem é a competência para fiscalizar as ações praticadas por AA? d) – cabe indenização por dano moral e, em caso afirmativo, a quem seria destinada a indenização; e) – quais seriam os legitimados para propor eventuais ações?
a) – que ilícitos administrativos, civis e penais foram cometidos por AA?
Ilícitos administrativos – supressão da vegetação sem licença ambiental (arts. 1º e 26, da Lei 12651/12). Ilícitos civis – dano causado ao meio ambiente (art. 225, da Constituição Federal e 186/187, do Código Civil)1. Ilícitos penais – violação dos artigos 38 e 51, da Lei nº 9605/98, em concurso material (art. 69, do CP), não se admitindo a consunção , eis que ambos são ilícitos autônomos.
b) – quais as consequências dos ilícitos cometidos?
consequência administrativas – advertência, multa simples e multa diária (art. 72, da Lei nº 9.605/98), observado o art. 6º (gravidade do fato, antecedentes e situação econômica do infrator)2. Consequências civis – indenização individual e coletiva e reparação do dano causado3. Consequências penais – pena privativa da liberdade, pena restritiva de direito e multa.
1 Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados e c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado (REsp 1374284/MG, Rel. Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, Segunda Seção, julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014).
2 Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu poder de polícia.
3 […] para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem. […]“ (REsp 650.728/SC, Rel. Ministro Xxxxxx Xxxxxxxx, Segunda Turma, julgado em 23/10/2007, DJe 02/12/2009). Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
c) – de quem é a competência para fiscalizar as ações praticadas por AA?
A competência fiscalizatória é comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. O ilícito pode ser fiscalizado pelo Município, em razão da prevalência do
interesse local (art. 23, inc. VI c/c 30, inc. I, da CF); pelos órgãos estaduais responsáveis pelo licenciamento (art. 17, da LC 140/11) e pelos órgãos federais. A competência para lavrar o auto de infração ambiental é de todas as autoridades do SISNAMA, responsáveis pela PNMA.
d) – cabe indenização por dano moral e, em caso afirmativo, a quem seria destinada a indenização?
Xxx, cabe a indenização por dano moral coletivo, em ação civil pública a ser proposta pelo Ministério Público e por outros legitimados pela Lei nº 7347/85, visto que o Código Civil, no artigo 186, declara que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. E, no artigo 927, afirma que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. A Constituição Federal, no artigo 5º, inc. X, dispõe que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
e) – quais seriam os legitimados para propor eventuais ações?
Os legitimados para a propositura da ação seriam aqueles previstos no artigo 5º, da Lei nº 7347/85, ou seja, o Ministério Público e os outros aos quais a lei atribuem o direito de demandar a reparação do dano moral coletivo ou individual, dado que o dano pode ter sido causado a todos os titulares desse direito difuso e que foram prejudicados pela supressão da vegetação. Também seriam legitimados aqueles que, individualmente, sofreram prejuízos em decorrência da diminuição das espécies da piscicultura local, por exemplo. No
§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu poder de polícia.
caso do dano moral coletivo, eventual condenação seria destinada a um fundo de proteção ao meio ambiente.
DIREITO ADMINISTRATIVO
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): É possível a alienação de controle acionário de sociedade de economia mista? E de subsidiária de sociedade de economia mista? Nos dois casos, sendo possível, quais seriam os requisitos?
A pergunta foi retirada do seguinte julgado do STF, tomado em ação direta de inconstitucionalidade:
“i) a alienação do controle acionário de empresas públicas e sociedades de economia mista exige autorização legislativa e licitação; ii) a exigência de autorização legislativa, todavia, não se aplica à alienação do controle de suas subsidiárias e controladas. Nesse caso, a operação pode ser realizada sem a necessidade de licitação, desde que siga procedimentos que observem os princípios da administração pública inscritos no art. 37 da Constituição, respeitada, sempre, a exigência de necessária competitividade.” (STF, ADI nº 5624)
Logo, o candidato deveria abordar em sua resposta os seguintes pontos obrigatórios:
- Distinguir sociedade de economia mista e sua subsidiária, indicando o modo de criação de cada uma;
- Falar sobre o paralelismo das formas, ou princípio da simetria;
- Mencionar a necessidade de lei para a alienação de controle acionário da sociedade de economia mista e a desnecessidade para a subsidiária;
- Mencionar a necessidade de licitação para a alienação do controle acionário da sociedade de economia mista e a desnecessidade para a subsidiária;
- Mencionar que para a alienação do controle da subsidiária é dispensada a licitação;
- Indicar o art. 29, caput, inciso XVIII, da Lei 13.303/16;
- Mencionar a decisão do STF no julgamento conjunto das ADI nº 5624, MC ADI nº 5846, 5924 e 6029.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): XXXXX XXXXX, inconformada com a nota que lhe foi atribuída em específica prova do concurso do Estado X, ajuíza ação objetivando obter nota integral e, assim, ser aprovada. Devidamente citado, o Estado X menciona que o tema perguntado é controverso, sendo certo que a Banca adotou uma dentre as possíveis correntes doutrinárias. Ainda no âmbito da contestação o Estado X concorda que XXXXX XXXXX tenha respondido conforme corrente que tem respeitáveis doutrinadores, entretanto não é aquela que a Administração Pública entende como a mais adequada para o desempenho das funções do cargo. Em réplica, XXXXX XXXXX postula pelo julgamento antecipado, haja vista não existir controvérsia fática. Aberta vista ao Estado X, a referida parte menciona que a questão se coloca dentro do conteúdo programático do concurso, não cabendo discutir o gabarito adotado pela Banca. Indo ao Ministério Público, este frisa que a questão se coloca dentro do conteúdo programático do concurso, mas se pronuncia favorável à parte autora. Sendo você o juiz da causa, ciente de que não há controvérsia fática, como decidiria? Observação: dispensado o relatório e o formato de sentença, responda de forma objetiva, expondo os fundamentos para a conclusão.
A pergunta foi retirada do seguinte julgado do STF, tomado em repercussão geral:
“Recurso extraordinário com repercussão geral. 2. Concurso público. Correção de prova. Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. Precedentes. 3. Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame. Precedentes. 4. Recurso extraordinário provido”.
(RE 632853, Relator(a): XXXXXX XXXXXX, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-125 DIVULG 26-06-2015 PUBLIC 29-06-2015 RTJ VOL- 00235-01 PP-00249)
Logo, candidato deveria abordar em sua resposta os seguintes pontos obrigatórios:
- A diferença entre controle de mérito e de legalidade;
- O Judiciário apenas pode exercer o controle de legalidade, nos atos discricionários, como o posto;
- A pergunta se coloca dentro do conteúdo programático, por isto dentro da legalidade;
- O gabarito segue a corrente doutrinária que melhor se coaduna com as funções do cargo. Ou seja, guarda adequação com as atribuições do cargo, mostrando-se proporcional à discriminação de outras respostas, mesmo que pautadas em orientação de doutrinadores;
- O Judiciário não pode controlar o mérito, “aceitando” outras respostas sob pena de se substituir à Administração;
- Fazer menção ao RE nº 632853 do STF, tomado em repercussão geral:
NOÇÕES GERAIS DE DIREITO E FORMAÇÃO HUMANÍSTICA
1ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Disserte sobre o papel contramajoritário conferido ao Supremo Tribunal Federal.
O Supremo Tribunal Federal, como as demais Cortes Constitucionais em geral, exerce o controle de constitucionalidade dos atos normativos, inclusive aqueles emanados do Poder Legislativo e da chefia do Poder Executivo. No desempenho de tal função/atribuição, pode invalidar atos do Congresso Nacional, composto por representantes eleitos pelo provo brasileiro, e do Presidente da República , eleito com centena de milhares de votos. Vale dizer, 11 ministros do Supremo Tribunal Federal, que sequer receberam um voto popular, podem sobrepor sua interpretação da Constituição Federal àquela que foi feita por agentes políticos investidos de mandato representativo e legitimidade democrática. Essa circunstância é a geratriz de uma aparente contradição numa sociedade que se intitula democrática, sendo certo que foi apelidada de dificuldade contramajoritária.
Esse papel das Cortes Constitucionais passou a ser amplamente aceito na comunidade jurídica, assentado em dois fundamentos principais: i) proteção dos direitos fundamentais (mínimo ético e reserva de Justiça) a uma comunidade política, que não podem ser atropelados por uma simples deliberação majoritária; ii) proteção às regras do jogo democrático e dos canais de participação política de todos os cidadãos. Na visão do Ministro e emérito professor Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx – seria um status de “sentinela contra
o risco da tirania das maiorias”. Com isso, evita-se a deturpação do processo democrático ou mesmo a opressão das minorias. Tudo isso é um consenso nos dias atuais.
Um dos valores fundamentais é o direito de cada indivíduo ser tratado com dignidade, respeito e consideração exatamente igual aos demais. Trata-se de uma dimensão substantiva da democracia que inclui a igualdade, liberdade e a justiça. Vale dizer, as minorias, mesmo vencidas no jogo político não ficam ao desamparo, conservando seus respectivos papéis de membros dignos de uma comunidade política. Em quase todo mundo esse papel é exercido pela Suprema corte que tem a capacidade de funcionar como um fórum de princípios, isto é, de valores indispensáveis de uma comunidade e não de política. Usa-se neste fórum a razão política, possibilitando um amplo debate. Seus membros não dependem de processo eleitoral e as decisões devem ser dotadas de argumentos racionais que as sustentem. O candidato poderia ainda complementar a resposta com exemplos práticos da atuação do Supremo Tribunal Federal no papel contramajoritário.
2ª QUESTÃO (VALOR 0,40): Xxxxxxx, médico, primário e de bons antecedentes, promoveu, em 2020 uma ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de danos morais, em face de uma Provedora de Hospedagem de Vídeos/Notícias na Internet. Sustentou o autor na petição inicial que, em 2010, uma rede de televisão realizou uma reportagem a respeito de uma operação policial que investigava a comercialização, por médicos, de produtos estéticos com validade vencida, fazendo menção a vários personagens que integravam a suposta quadrilha. Todavia, a matéria veiculada apenas divulgava imagens do autor sendo preso e encaminhado para a delegacia de polícia. A matéria ficou hospedada no sítio da Ré, que, mesmo instada pelo autor a retirar o conteúdo da mesma, quedou-se inerte. O juiz competente julgou procedente apenas em parte os pedidos, condenando a Ré, com fundamento no direito ao esquecimento, a suspender a exibição de qualquer vídeo que fizesse referência à aludida matéria jornalística exibida pela rede de televisão, bem como de qualquer vídeo que ofendesse a honra e a imagem do autor. À luz do direito brasileiro, comente os fundamentos da decisão proferida.
A questão jurídica a ser dirimida põe frente a frente, em aparente colisão, direitos fundamentais. De um lado a liberdade de imprensa e o acesso à informação e, de outro, o direito à honra e à imagem.
Não se vislumbra ilicitude apta a ensejar a reparação por dano moral, tendo em vista que a matéria jornalística divulgada se limitou a narrar a notícia de que o autor foi preso e investigado por suposto envolvimento em prática delituosa, conforme veiculado. Logo, ausente da matéria o intuito de deturpar a realidade e, consequentemente, o animus de ofender a honra da pessoa citada, a
dignidade humana não foi maculada a ponto de justificar o pedido indenizatório.
Como houve apenas reprodução das informações fornecidas pelos órgãos estatais , o cunho foi meramente informativo. Portanto, não caracterizado qualquer abuso.
A liberdade de informação na atual quadra constitucional foi uma reação eloquente à prática histórica de censura política, ideológica e artística no país. Daí a razão pela qual a Constituição Federal consagra o direito à informação como um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, ao garantir a plena liberdade de informar, independentemente de censura ou licença. Vide artigo 220 da Lei Maior.
A liberdade de expressão, assim como qualquer outro direito não apresenta caráter absoluto, na medida em que encontra limite em outros direitos fundamentais. Daí o motivo pelo qual a Constituição deve preocupar-se com o equilíbrio de valores que adota, prevalecendo a possibilidade de sanção em caso de abuso com a indenização por dano moral e o direito de resposta proporcional ao agravo.
Portanto, nas demandas que envolvem colisão de direitos fundamentais, o julgador deve examinar as especificidades do caso concreto com vistas a aferir qual prerrogativa constitucional deve preponderar.
O Provedor da Internet é apenas uma ferramenta de busca/pesquisa que agrupa informações disponibilizadas em sites divulgados na Internet e indica os links, locais em que o conteúdo está hospedado.
Importante destacar que a empresa Ré, na qualidade de provedora de hospedagem de vídeos/notícias não produziu a reportagem, mas tão somente hospedou-a em seu site.
Neste passo, se a reportagem não teve um conteúdo difamatório, o que dizer de um site que apenas disponibiliza o serviço de busca solicitado pelo usuário. A jurisprudência caminha por afastar a responsabilidade dos Provedores nas hipóteses semelhantes (os Provedores de hospedagem e conteúdo da Internet funcionam como meros hospedeiros de informações produzidas pelos usuários. Logo respondem apenas subjetivamente pelos abusos cometidos em nome da liberdade de Expressão.)
Os argumentos tracejados pelo juiz não estão corretos.
Segundo os fundamentos da decisão, a divulgação de fatos pretéritos fere mais a privacidade do indivíduo do que o interesse público. Daí a invocação do
denominado direito ao esquecimento como supedâneo para corrigir a desproporção entre o tempo e os direitos individuais.
O polêmico tema do direito ao esquecimento teve origem no Brasil a partir de decisões proferidas pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento de recursos especiais. (casos da Chacina da Candelária e de Vigário Geral)
Em ambos os casos, uma notória rede de televisão nacional foi condenada a pagar indenização a título de danos morais, a uma pessoa denunciada e absolvida pelo Tribunal do Júri e aos familiares da vítima, respectivamente, por veiculação de programa que procurou reavivar a história dos dois delitos que tiveram ampla repercussão nacional. Na ocasião, o Superior Tribunal de Justiça, embora reconhecendo a importância histórica dos episódios, bem como o conteúdo fidedigno das reportagens, houve por bem dar maior prevalência aos direitos da personalidade sobre as liberdades comunicativas, pontuando que a passagem do tempo teria tornado ilícita a veiculação da matéria sobre os delitos de outrora. Destarte, o d. Relator, invocando precedente da Corte espanhola, mencionou o direito ao esquecimento como um direto de não ser lembrado contra sua vontade, especificamente no que diz respeito a fatos desabonadores.
O que se pode extrair de tudo o que foi abordado a respeito do tema, são 3 as principais posições assim resumidas:
a) Não existe um direito ao esquecimento. Tem por base a ausência de previsão legislativa no Brasil, não podendo, pois, ser extraído de qualquer direito fundamental, nem mesmo do direito à privacidade e à intimidade. Cuida-se de um direito contrário a história de uma sociedade e a memória de um povo. Daí que, a liberdade de informação deve prevalecer sempre, nos moldes do que acontece nos EUA. São invocados precedentes da Suprema Corte Americana (New York Times Co vs Xxxxxxxx entre outros) e do STF (caso das biografias não autorizadas - ADIN 4815)
b) O direito ao esquecimento não apenas existe, como deve sempre preponderar como reflexo do direito da pessoa humana à reserva, a intimidade e à privacidade, tudo ancorado na dignidade da pessoa humana como vetor fundamental do sistema de valores da Lei Maior. O argumento principal dos que defendem essa tese é o da aplicação de pena perpétuas, por via oblíqua,
através das mídias e da internet. Os precedentes citados são os que acima foram mencionados.
c) A posição intermediária traduz-se na aplicação do método da ponderação de direitos fundamentais, haja vista que reconhece ambos os direitos e que os mesmos têm precisão constitucional e não podem ser hierarquizados. Logo, o que precisa ser verificado no caso concreto é qual o menor sacrifício possível para caso um dos interesses em conflito.
Com efeito, em decisão recente, no julgamento do RE1010606 o Supremo Tribunal Federal, julgando a temática sobre o direito ao esquecimento, pôs uma pá de cal na questão ao aprovar a tese, com repercussão geral, no sentido de que: “ é incompatível com a Constituição Federal a ideia de um Direito ao Esquecimento assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais no âmbitos civil e penal”.
Assim sendo, a despeito da posição que se adote, agora marcada por um julgamento definitivo do tema pela decisão proferida pela Suprema Corte, no caso concreto sequer penso caber a invocação ao denominado direito ao esquecimento. É que além de verdadeiras as informações divulgadas, o autor foi denunciado pela prática criminosa e o processo ainda está em andamento, sendo inviável a invocação de tal direito.
Importante deixar sublinhado que os conteúdos que o autor pretende ocultar não são disponibilizados pelo buscador da Ré, que apenas promove uma indexação de conteúdo dos sites existentes na internet e que revela o que está disponível, dependendo dos critérios de busca escolhidos pelo usuário. Logo a medida pleiteada, não impede o acesso à informação diretamente da fonte, não evitando a ocorrência de eventuais danos à imagem e à honra, que não restaram evidenciados.
No dizer de Xxxxxx Xxxxxxxx: “ críticas lançadas nestas manifestações, ainda que duras e contundentes, não dão azo à responsabilidade civil, uma vez que crítica, como já salientado, é faculdade inerente ao exercício das liberdades comunicativas. Tampouco erros fáticos devem ensejar a responsabilização, desde que não tenha havido má-fé, nem falta de diligência na apuração do
ocorrido. É que também em relação às informações sobre fatos passados subsiste uma exigência de veracidade, mas esta deve sempre ser compreendida sob o ângulo subjetivo – como exigência de lealdade e de diligência de que informa – e não sob o enfoque objetivo. O contrário, seria chancelar um regime de responsabilidade civil inibidor do exercício das liberdades comunicativas, em contrariedade aos valores constitucionais”.