ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA CONSULTORIA JURÍDICA
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA CONSULTORIA JURÍDICA
Processo nº 8513993-06.2022.8.06.0000
Unidade Requisitante: Coordenadoria de Gestão Administrativa de TI Assunto: Contratação de consultoria individual especializada em automatização de atividades através de robôs (RPA/IPA)
Ref.: Programa de Modernização do Judiciário Cearense - PROMOJUD
PARECER
I – RELATÓRIO
Trata-se de processo administrativo, identificado em epígrafe, encaminhado a esta Consultoria Jurídica para análise e parecer quanto à contratação de Consultoria Individual especializada em automatização de atividades através de robôs (RPA/IPA).
Conforme consta na peça inicial, referida contratação está prevista no plano de aquisições do Programa de Modernização do Poder Judiciário do Estado do Ceará (PROMOJUD) e seu financiamento decorrerá de recursos do empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID.
Instruem os autos, no que interessa, os seguintes documentos:
a) classificação/dotação orçamentária e respectiva atualização (págs. 13-14; 118-119)
17; 121-122);
b) autorização da contratação e respectiva atualização (págs. 16-
c) documentos de págs. 20-66 sem efeito em razão da inserção de
forma equivocada (págs. 73-75);
d) estudo técnico preliminar (págs. 77- 93);
e) Termo de Referência (págs. 94-103);
f) estimativa de orçamento (págs. 104);
g) envio dos convites e publicação no DJe (págs. 126-133);
h) currículos apresentados pelos consultores (págs. 134-137 – arquivos comprimidos em pastas zipadas);
i) relatório de escolha do consultor individual (págs. 138-144);
j) ata da entrevista (págs. 145-146; 230-231);
k) ata da reunião de negociação (págs. 147-148);
l) comprovação de qualificação (págs. 150-168);
m) minuta de contrato (págs. 169-190);
n) certificado de elegibilidade e de integridade (pág. 191);
o) parecer técnico do Núcleo de Licitações com Financiamento Externo - NULFEX (p. 200-201).
É o relatório. Passamos ao parecer.
II – DELIMITAÇÃO DO PARECER JURÍDICO
De início, vale ter presente que o âmbito de análise deste parecer se restringe, única e tão somente, ao exame dos aspectos formais da contratação considerando o que prevê a política de contratação do BID, não se imiscuindo, pois, em aspectos técnicos, financeiros, de conveniência e oportunidade, que são próprios do Administrador Público.
Frise-se, ainda, a presunção de que as especificações técnicas e demais documentos, inclusive o detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente, com base em parâmetros técnicos objetivos, tudo visando melhor o interesse público.
Firmadas essas breves premissas, passamos ao exame da matéria.
III – DA NORMA APLICADA À CONTRATAÇÃO
Como se sabe, o Poder Judiciário do Estado do Ceará, dentro do seu planejamento de modernização, articulou, junto ao executivo estadual, operação de crédito externo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID para viabilizar o Programa de Modernização do Judiciário (Promojud).
O contrato de empréstimo nº 5248/OC-BR foi assinado em 29 de dezembro de 2021, e, em seu bojo, traz como condição para a liberação dos recursos a utilização das suas políticas de contratações.
Assim, para que haja o repasse financeiro, o Poder Judiciário Estadual terá que adotar métodos de contratação estabelecidos pelo Banco.
Sabe-se que a legislação pátria que versa sobre contratações públicas no Brasil (Lei nº 8.666/93 e Lei 14.133/2021) prevê a possibilidade de se utilizar procedimentos específicos do organismo internacional, ou seja, diferentes daqueles tradicionalmente consagrados (concorrência, pregão etc). Esta regra está consolidada no §5º, art. 42, da Lei n. 8.666/93, e no §3º, do art. 1º, da Lei n. 14.1333/2021.
LEI N. 8.666/93
“Art. 42. (...)
§ 5o Para a realização de obras, prestação de serviços ou aquisição de bens com recursos provenientes de financiamento ou doação oriundos de agência oficial de cooperação estrangeira ou organismo financeiro multilateral de que o Brasil seja parte, poderão ser admitidas, na respectiva licitação, as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades, inclusive quanto ao critério de seleção da proposta mais vantajosa para a administração, o qual poderá contemplar, além do preço, outros fatores de avaliação, desde que por elas exigidos para a obtenção do financiamento ou da doação, e que também não conflitem com o princípio do julgamento objetivo e sejam objeto de despacho motivado do órgão executor do contrato, despacho esse ratificado pela autoridade imediatamente superior.” (grifo nosso)
LEI N. 14.133/2021
“Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e abrange:
(...)
§ 3º Nas licitações e contratações que envolvam recursos provenientes de empréstimo ou doação oriundos de agência oficial de cooperação estrangeira ou de organismo financeiro de que o Brasil seja parte, podem ser admitidas:
I - condições decorrentes de acordos internacionais aprovados pelo Congresso Nacional e ratificados pelo Presidente da República; (grifo nosso)
II - condições peculiares à seleção e à contratação constantes de normas e procedimentos das agências ou dos organismos, desde que:
a) sejam exigidas para a obtenção do empréstimo ou doação;
b) não conflitem com os princípios constitucionais em vigor;
c) sejam indicadas no respectivo contrato de empréstimo ou doação e tenham sido objeto de parecer favorável do órgão jurídico do contratante do financiamento previamente à celebração do referido contrato;” (grifo nosso)
Então, conforme autorização legal, há, nestes casos, um afastamento pontual das leis de regência sobre contratações públicas, passando a prevalecer os procedimentos próprios dos entes externos, ressalvando, contudo, a obrigatoriedade de observância do julgamento objetivo e das disposições constitucionais.
Nesse contexto, é assente o entendimento do Tribunal de Contas da União – TCU no sentido de que as Leis n° 8.666/93 e n° 14.133/21 tenham sua aplicação afastada, caso seja incompatível com as regras estabelecidas por agência oficial de cooperação estrangeira ou de organismo financeiro de que o Brasil seja parte, exceto se tais regras implicarem em inobservância de princípios da Constituição Federal brasileira relativo a licitações públicas, senão vejamos:
CONSULTA FORMULADA POR MINISTRO DA FAZENDA. CONHECIMENTO. LICITAÇÕES INTERNACIONAIS. INCOMPATIBILIDADE DAS REGRAS LICITATÓRIAS DO BIRD COM O § 4º DO ART. 42 DA LEI 8.666/1993. PREVALÊNCIA DAS PRIMEIRAS, CONFORME § 5º DO ART. 42 DA LEI 8.666/1993. RESPOSTA AO INTERESSADO. ARQUIVAMENTO.
(ACÓRDÃO 1866/2015 – PLENÁRIO, relator Ministro Xxxx Xxxxx Xxxxxxxx, julgado em 29/07/2015.)
REPRESENTAÇÃO. LICITAÇÃO CUSTEADA COM RECURSOS FINANCIADOS POR INSTITUIÇÕES QUE COMPÕEM O GRUPO BANCO MUNDIAL. ENTENDIMENTO DO TCU. RESTRIÇÃO À COMPETITIVIDADE. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA A ANULAÇÃO DO CERTAME.
1. De acordo com o art. 42, § 5º, da Lei n. 8.666/1993, é possível a realização de processos licitatórios que obedeçam às condições previstas em contratos assinados com instituições financeiras multilaterais e, ainda, a adoção de procedimentos por elas exigidos.
2. Nada obstante, consoante a Decisão n. 1.640/2002 - Plenário, eventual contrato de empréstimo internacional não pode conter cláusulas conflitantes com a Constituição Federal, uma vez que os princípios constitucionais prevalecem em caso de divergência com as normas dos organismos de financiamento, sendo cabível, ainda, a aplicação subsidiária dos ditames da Lei n. 8.666/1993. (grifo nosso)
3. A exigência não justificada, do ponto de vista técnico-econômico, de experiência mínima de dez anos na prestação de serviços similar ao licitado consubstancia restrição ao caráter competitivo do certame.
4. Deve ser fixado prazo para a anulação de certame maculado do vício insanável da restrição à competitividade.
(ACÓRDÃO 645/2014 – PLENÁRIO, relator Ministro Xxxxx Xxxxxxxxx, julgado em 19/03/2014.)
Desse modo, considerando a presente situação de operação de crédito externo para financiamento do Programa de Modernização do Poder Judiciário do Estado do Ceará – PROMOJUD, materializada através do contrato de empréstimo nº 5248/OC-BR, está claro que os procedimentos de contratações que envolvam projetos do referido programa, como é o caso trazido no presente
processo, poderão obedecer rito especial indicado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, no caso, as políticas para aquisição de bens e contratação de obras prevista na GN-2349-15 e as políticas para seleção e contratação de consultores GN-2350-15.
IV – DA CONTRATAÇÃO ADOTANDO-SE A POLÍTICA DO BID
Firmado o entendimento sobre a utilização das políticas do BID para as contratações, analisa-se o método e procedimento adotado ao caso trazido no caderno administrativo.
Conforme Plano de Aquisições aprovado e publicado no site do Banco Interamericano de Desenvolvimento em 25/04/2022 (xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxxxx/XX-X0000), constata-se a previsão da contratação de consultores individuais especializados em automação (item 5,4, linha 95), através do método “Comparação de Qualificações (3 CV´s)”, disciplinado nas cláusulas 5.1 a 5.4 da GN-2350-15, vejamos:
“5.1 Consultores individuais são contratados para serviços em relação aos quais: a) equipes não são necessárias; b) não é necessário qualquer apoio profissional externo adicional (trabalho em casa); e c) a experiência e as qualificações do indivíduo são os requisitos principais. Quando a coordenação, administração ou responsabilidade coletiva forem dificultadas em virtude do número de pessoas, é aconselhável contratar uma empresa.
5.2 Consultores individuais são selecionados com base em suas qualificações para o serviço. Não se exige publicidade e os consultores não precisam submeter propostas. Os consultores devem ser selecionados mediante comparação das qualificações de, pelo menos, três candidatos dentre aqueles que manifestaram interesse na execução dos serviços ou que tenham sido diretamente identificados pelo Mutuário. Os indivíduos considerados para comparação de qualificações deverão preencher os requisitos mínimos relevantes, e os que forem selecionados para contratação pelo Mutuário deverão ser os mais bem qualificados e plenamente capacitados para o desempenho dos serviços. A capacidade é
aferida com base no histórico acadêmico, experiência e, quando apropriado, no conhecimento das condições locais, tais como idioma, cultura, sistema administrativo e organização do governo.
5.3 Periodicamente, funcionários permanentes ou associados de uma empresa de consultoria poderão estar disponíveis como consultores individuais. Nesses casos, se aplicarão as disposições relativas ao conflito de interesse integrantes destas Políticas à empresa matriz e suas afiliadas. Os consultores devem assinar as condições de elegibilidade e integridade no respectivo formulário individual.
5.4 Consultores individuais podem ser contratados diretamente com a devida justificativa em casos excepcionais, tais como: (a) tarefas que sejam continuação de serviço prévio que o consultor tenha executado e para o qual o consultor tenha sido selecionado competitivamente; (b) serviços de duração total estimada em menos de seis meses; (c) situações de emergência que decorram de desastres naturais; e (d) quando o indivíduo for o único consultor qualificado para o serviço.”
Na espécie, considerando que a natureza do serviço a ser desempenhado pelo consultor, o qual deverá, conforme dispõe o termo de referência: construir robôs (RPAs/IPAs) para suprir as demandas manuais e repetitivas executadas pelos servidores e magistrados do Poder Judiciário cearense; assessorar Serviço de Inovação em TI na definição de técnicas, metodologias, fluxos e ferramentas que serão utilizadas na construção de robôs; e transferir conhecimentos para os servidores do TJCE envolvidos nas atividades relacionadas à automatização de atividades através de robôs, considerando os fluxos dos processos estabelecidos, infere-se, pois, que estão caracterizados os requisitos previstos na cláusula 5.1 para seleção de consultores individuais.
V – DO MÉTODO DE SELEÇÃO E CONTRATAÇÃO DE CONSULTOR INDIVIDUAL (CI)
O procedimento do processo de aquisição/seleção e contratação, tanto da GN-2349-15 como da GN-2350-15, está consignado no Manual de Aquisições do Executor elaborado pelo próprio BID, sendo que, no tocante ao método de Seleção e Contratação de Consultor Individual, é imperioso observar o
cumprimento das seguintes etapas: 1- Elaboração dos Termos de Referência (TDR); 2- Preparação da estimativa de custo/orçamento; 3- Definição dos critérios da avaliação das qualificações e experiência dos Consultores (CVs); 4- Seleção dos CVs (no mínimo 3); 5- Elaboração de Relatório de Escolha do Consultor Individual; 6- Envio do TDR e da minuta do contrato ao Consultor selecionado; 7- Convocação do consultor para negociação e assinatura do contrato.
Compulsando os autos, infere-se que o processo de contratação seguiu o seguinte: Termo de Referência (págs. 94-103); a preparação de estimativa de custo foi realizada tendo como referência contratação do CNJ, convenção coletiva de Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados, Serviços de Informática e Similares do Estado do Ceará e contratação do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (págs. 77-93); a definição dos critérios da avaliação das qualificações e experiência foram contemplados no convite enviado aos profissionais, publicações no DJe (págs. 126-133) e no site xxxxx://xxx.xxxx.xxx/xx/xxxxxxx/XX-X0000 (arquivo: BR-L1560_P1035663_SP.pdf); na sequência, recebidos os currículos (págs. 134-137), elaborou-se o Relatório de Escolha do Consultor Individual (págs. 138-144), enviou-se o TDR e minuta do contrato ao Consultor selecionado e, por fim, convocou-se o consultor para
negociação e assinatura do contrato (págs. 147-148; 169-190); a denotar, portanto, que todas as etapas estabelecidas pelo Banco foram devidamente cumpridas.
Ressalte-se, ademais, em consonância com a cláusula 5.2 da GN- 2350-15, ao dispor que os consultores devem ser selecionados mediante comparação das qualificações de, pelo menos, três candidatos dentre aqueles que manifestaram interesse na execução dos serviços ou que tenham sido diretamente identificados pelo Mutuário, bem como que a capacidade é aferida com base no histórico acadêmico, experiência e, quando apropriado, no conhecimento das condições locais, tais como idioma, cultura, sistema administrativo e organização do governo; e com fundamento no princípio do julgamento objetivo, foram estabelecidos os seguintes critérios objetivos para aferição da qualificação do candidato (ver convite, publicações no DJe e site do BID):
“Qualificação técnica: cursos de qualificação na área de Tecnologia da Informação que atenda às seguintes exigências: a) obrigatoriamente nível superior ou pós- graduação na área de Tecnologia da Informação; b) obrigatoriamente experiência de no mínimo 01 (um) ano em: b.1) Python b.2) Tecnologias para testes automatizados ou automações em geral; b.3) Bancos de Dados (SQL ou NoSQL); b.4) Visão geral de Machine Learning / Deep Learning / Redes Neurais / PLN; e b.5) frameworks de Inteligência Artificial”.
Não obstante, o item 5 do relatório de escolha do consultor individual (págs. 138-144), indica a pontuação obtida por cada candidato, apresenta avaliação detalhada dos respectivos currículos, metodologia e apresenta qual o candidato com a melhor qualificação.
VI – DA MINUTA DO CONTRATO
Examinando a minuta do Contrato nº 15/2023 acuradamente, percebe-se que os seus termos se apresentam em perfeita harmonia com os
termos de referência. Nela também está corretamente indicado o nome do Consultor selecionado e os valores pactuados.
Por fim, é de se observar que, em seu cerne, estão expressas, em redação clara e precisa, cláusulas que dispõem sobre: objeto da contratação e seus elementos característicos; serviços a serem prestados e produtos esperados; preço e condições de pagamento; vigência, dentre outras; além da cláusula de práticas proibidas, que se trata de uma exigência do Banco.
Desse modo, a minuta do contrato apresenta as cláusulas necessárias à execução do serviço com segurança jurídica, o que não desnatura a faculdade do gestor em acrescentar pontos que sejam de interesse da unidade que gerenciará o pacto. Assim, caso seja necessário incluir aspectos ainda não contemplados, entende-se pela pertinência considerando a boa prática de gestão.
VII – CONCLUSÃO
Ante o exposto, ressalvando-se, mais uma vez, que os aspectos de conveniência e oportunidade não estão sob o crivo desta Consultoria Jurídica, opinamos, considerando que a contratação seguiu os fluxos/procedimentos da política do BID, pela possibilidade da celebração do contrato com o Sr. Xxxxx Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx, para a prestação de serviços de consultoria individual em automatização de atividades através de robôs (RPA/IPA), tendo por fundamento o tópico V, parágrafos 5.1 e 5.2, da política adotada na GN-2350-15, para a contratação de consultor individual.
É o parecer. À superior consideração. Fortaleza/CE, 20 de março de 2023.
Assinado de forma digital por XXXX
XXXX XXXXXXXXX XX XXXX XXXXXXXXX XX XXXX
MELO:78586593320
MELO:78586593320
Dados: 2023.03.21 14:37:02 -03'00'
Xxxx Xxxxxxxxx xx Xxxx Xxxx
Assessor Jurídico
De acordo.
XXXXXXXXX XXXXXXX
Assinado de forma digital por XXXXXXXXX XXXXXXX DA
XX XXXXX:61948039320
-03'00'
XXXXX:61948039320 Dados: 2023.03.21 14:43:27
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