The Real Estate Brokerage Contract – (In) admissibility of unilateral termination
O Contrato de Mediação Imobiliária – Da (In) Admissibilidade da Revogação Unilateral Pelo Cliente
The Real Estate Brokerage Contract – (In) admissibility of unilateral termination
by the customer.
Xxxx da Conceição Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx
Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no âmbito do 2.º Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre), na Área de Especialização em Ciências Jurídico-Civilísticas
/Menção em Direito Civil, sob orientação da Senhora Professora Doutora Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx Xxxxx Xxxxxx
Coimbra, 2017
Resumo: O presente trabalho pretende abordar o regime do contrato de mediação imobiliária, regulado pela Lei 15/2013 de 8 de fevereiro, caraterizando-o e distinguindo-o dos regimes jurídicos similares para depois abordar as formas de cessação deste contrato, em particular a admissibilidade da revogação unilateral. A posição adotada de admissibilidade ou inadmissibilidade de tal revogação por parte do cliente terá repercussões ao nível da prestação devida pelo cliente ao mediador (remuneração), sendo, também esta repercussão objeto de análise.
Palavras-chave: contrato de mediação imobiliária; regime simples e regime com cláusula de exclusividade; (in) admissibilidade de revogação unilateral; efeitos da (in) admissibilidade da revogação unilateral.
Abstract: The present paper seeks to address the regime of the real estate agency agreement, governed by Law 15/2013 of February 8, characterizing and distinguishing it from similar legal systems, followed by a look into forms of terminating this contract, in particular the admissibility of unilateral termination. Customer’s stance on the admissibility or inadmissibility of such termination has implications for the consideration made to the mediator (remuneration) by the customer, which will also be addressed.
Keywords: Real estate brokerage contract; Simple regime and regime with exclusivity clause; (In) admissibility of unilateral termination; Effects of the (in) admissibility of unilateral termination.
SIGLAS E ABREVIATURAS
A.A.F.D.L. | – Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa |
BMJ | - Boletim Ministério da Justiça |
BOMJ | - Boletim Oficial do Ministério da Justiça |
CJ | - Coletânea de Jurisprudência |
DL | - Decreto-lei |
DR | - Diário da República |
IMOPPI | - Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário |
InCI | - Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P. |
nº | - Número |
p. | - Página |
pp. | - Páginas |
Pº | - Processo número |
Ref. | - Referência |
RLJ | - Revista de Legislação e Jurisprudência |
RJ | - Revista de Justiça |
RJAMI | - Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária |
Segs. | - Seguintes |
STJ | - Supremo Tribunal de Justiça |
v.g. | - verbi gratia |
Vol. | - Volume |
ÍNDICE
Lista de siglas e abreviaturas 3
Índice 4
Propósito do trabalho e Enquadramento legal 7
Introdução 12
Noções gerais 13
Contrato de mediação imobiliária simples 13
Contrato de mediação em regime de exclusividade 15
Caraterização jurídica do contrato de mediação (imobiliária) 16
Elementos caraterizadores do contrato de mediação imobiliária 22
i. a atividade de mediação: obrigação ou ónus de aproximar sujeitos?
………......................................................................................... 23
ii) atividade tendente à celebração de negócio: obrigação de meios ou de resultado? 24
iii) imparcialidade; 27
iv) ocasionalidade; 28
v) onerosidade 29
Distinção de figuras afins (contrato de agência, de concessão, de franquia e de mandato) 29
Parte I
Celebração do contrato de mediação imobiliária: 34
A forma do contrato 34
Menções obrigatórias do contrato 35
O regime da exclusividade e os seus efeitos 35
O prazo do contrato 38
A inobservância do disposto nos n º1, 2 e 4 do artigo 16º da Lei 15/2013 40
Os sujeitos do contrato de mediação imobiliária: 45
a. Empresa de mediação imobiliária 45
i. Colaboradores de empresas de mediação imobiliária: técnicos e angariadores 49
b. Destinatários 50
c. Clientes 50
O objeto do contrato de mediação imobiliária… 51
O conteúdo da prestação da mediadora 53
O conteúdo da prestação do cliente: a remuneração 54
A remuneração dependente da conclusão do contrato pretendido 55
Do nexo de causalidade entre a atividade de mediação e o contrato celebrado 59
Despesas efetuadas no exercício da atividade de mediação 61
A remuneração no contrato em regime de exclusividade 63
i. Exigibilidade da remuneração no caso de não concretização do contrato por causa imputável ao cliente 64
ii. Incumprimento da cláusula de exclusividade, pelo cliente 66
Recebimento da remuneração de ambos os clientes 67
Quantias prestadas pelos destinatários 68
Da celebração do contrato visado com o titular do direito de preferência 69
Celebração do negócio visado mas por preço inferior ao inicialmente contratado 70
A responsabilidade do mediador pelos danos causados a terceiros… 70
Parte II
A cessação do contrato de mediação imobiliária 74
A resolução 74
A caducidade 76
A denúncia 76
A revogação… 77
– Da admissibilidade da revogação unilateral no contrato de mediação 79
– Efeitos da (in) admissibilidade da revogação unilateral 86
Conclusão 88
Bibliografia 93
Jurisprudência consultada 96
Propósito do trabalho
O cerne da análise deste trabalho prende-se com a abordagem da (in) admissibilidade da revogação unilateral no contrato de mediação imobiliária, estabelecendo a conexão entre esta e os efeitos em termos de remuneração devida ou não pelo cliente ao mediador. Procurar-se-á explicitar as posições existentes quer na doutrina, quer na jurisprudência, culminando-se com a adoção de uma posição relativamente a tal questão expondo os argumentos que a sustentem.
Enquadramento legal
A mediação como refere Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx “deve ser tão antiga quanto o comércio”1.
Em Portugal no início do século XX, começaram a surgir nos tribunais situações em que o autor reclamava uma remuneração em virtude de, a pedido do réu, ter encontrado contraparte para a compra e venda de determinado imóvel. Entre outros, podemos citar, os Acórdãos da Relação de Lisboa de 10/04/19352, e do Supremo Tribunal de Justiça de 09/02/19453 e de 04/11/19474.
O ramo imobiliário foi o primeiro a obter regulamentação especializada, no que se prende com a mediação.
Assim, em 1961, é publicado o primeiro diploma destinado a disciplinar a atividade de mediação imobiliária, o DL 43.767 de 30 de junho de 19615, o qual consagrou o exercício das atividades de mediação na compra e venda de imóveis e na realização de empréstimos hipotecários a pessoas singulares ou sociedades de reconhecida idoneidade, que tivessem obtido autorização prévia do Ministério das Finanças, mediante portaria (artigo 1º).
Não obstante a publicação do referido diploma, alguns acórdãos continuaram a qualificar relações contratuais que se reconduziam ao contrato de mediação ali tipificado, como mandatos6 7 ou sem a qualificação jurídica do mesmo8.
1 Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Do contrato de Mediação, O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 519.
2 RJ, ano XX (1935), pp 103-6.
3 BOMJ, ano V, n º 27, março 1945, pp. 53-5.
4 BMJ 4, pp. 193-5.
5 DG I Série, n º 150, de 30/06/1961, p. 774-5.
6 Neste sentido, veja-se entre outros, o Acórdão do STJ de 06/07/1962, in, BMJ, 119, pp. 420-8, o qual sumaria que “I- Encarregada uma agência de venda de propriedades de angariar comprador para determinada quinta e estipulando-se entre as partes uma remuneração de 3% sobre o preço, a pagar, uma
O referido diploma, não continha disposições reguladoras do contrato de mediação imobiliária, pelo que, tal figura jurídica manteve-se legalmente atípica, sendo o mesmo identificado a partir de alguma jurisprudência que o ia qualificando9.
Tal diploma veio a ser revogado pelo DL 285/92 de 19 de dezembro10, o qual passou a prever regras, pelas quais, a relação contratual aí tipificada, se passou a reger, deixando a partir de tal diploma de ser um contrato inominado.
O artigo 2º do citado diploma, sob a epígrafe “definição da atividade”, estabelecia “por mediação imobiliária a atividade comercial em que, por contrato, a entidade mediadora se obriga a conseguir interessado para a compra e venda de bens imobiliários ou para a constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos”.
Estipulou como exigência de forma, a forma escrita (artigo 10º, n º1), com a cominação, em caso de inobservância, da nulidade, não invocável pela entidade mediadora (n º 6 do citado normativo).
O DL 285/92 de 19 de dezembro foi revogado pelo DL 77/99 de 16 de março11, no qual se mantém a conceção da atividade de mediação imobiliária fundada num contrato de que emergem obrigações para ambas as partes.
Do regime instituído pelo DL 77/99 resultava, como bem refere Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx00 “uma clara finalidade de moralização do exercício da mediação imobiliária – nomeadamente combatendo o exercício clandestino -, visando, deste modo, uma mais eficaz tutela do consumidor, a par da defesa dos interesses dos próprios agentes económicos”.
parte aquando da entrega do sinal, e outra parte após a celebração da escritura. O que equivale à estipulação dum termo e não de uma condição, a mesma será devida após a descoberta de comprador e a negociação preliminar da venda, não obstante esta se não ter chegado a realizar (…) II – A comissão é devida por marido e mulher, não obstante esta não ter intervindo no contrato de mediação ou no contrato preliminar, se se puder concluir pela existência dum mandato verbal entre ambos para a celebração desses contratos (…)”.
7 Voto de vencido ao Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, in, RLJ Ano 100, n º 3355, p. 342-3.
8 Acórdão do STJ de 14/01/1964, BMJ 133, pp. 441-5.
9 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, RLJ, ano 100, pp. 342-3, o qual sumaria que “Qualifica-se como contrato inominado geralmente designado por mediação, e não como contrato de mandato comercial, aquele em que há um acordo estabelecido entre o proprietário de um prédio e uma sociedade, visando, apenas a atividade especifica desta como empresa mediadora, ou seja, a de procurar conseguir uma oportunidade para a venda do prédio, ficando ela a agir exclusivamente por si e não por mandato e em nome de outrem, e terminando a sua atuação quando, após as necessárias negociações, as partes se dispuseram a celebrar o contrato”.
10 DR I Série A, n º 292 de 19 de dezembro de 1992, p. 5858-61
11 DR I Série, n º 63 de 16 de março de 1999, 1434-41.
12 Estudos do Instituto de Direito do Consumo, Vol. I, Xxxxxxxx, 2001, p. 210-211.
Tal finalidade acarretou a consagração de várias exigências legais, no tocante a requisitos para o exercício da atividade, licenciamento, registo e modo de atuação. A par destas exigências acrescem ainda as respeitantes a responsabilidade, garantia e normas de fiscalização e sancionatórias.
Este diploma introduziu alterações no domínio da conceção da atividade de mediação imobiliária, entendendo-a, já não como uma “obrigação de resultado” (o de se obrigar a conseguir um interessado), mas antes como uma obrigação de meios (obrigação de diligenciar no sentido de conseguir um interessado – artigo 3º, n º1 do citado diploma).
Manteve como exigência de forma, a forma escrita (artigo 20º, n º1 do citado diploma), devendo o mesmo conter um conjunto de elementos que devem compor o conteúdo contratual (artigo 20º, n º2 do citado diploma), sob pena de nulidade do contrato, a qual não poderia ser invocada pelo mediador (nº8 do citado normativo).
A atividade de mediação imobiliária passa a ser desenvolvida apenas por sociedades comerciais ou outras formas de cooperação de sociedades (artigo 5º, n º1, al. a)), tendo como sujeito mediador uma pessoa coletiva.
Ao nível da remuneração o citado diploma clarificou que “só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação” (artigo 19º, n º1 do DL 77/99). Tal clarificação traduziu-se na consagração legal da prática jurisprudencial13.
Ainda no tocante à remuneração o citado diploma, estabeleceu a proibição do mediador receber a remuneração de ambos os interessados no contrato, uma vez que, só é devida por quem em primeiro lugar a contratou. Contudo, permitiu que tal regra fosse afastada por acordo expresso em contrário (artigo 18º, n º2, al. a) e 19º, n º4 ambos do citado diploma).
O DL 77/99 foi também inovador na consagração de especiais deveres a cargo do mediador, previstos no artigo 18º, entre os quais se destacam a obrigação do mediador, antes da celebração do contrato, se certificar da capacidade e legitimidade para contratar das pessoas intervenientes no negócio que irá promover, bem como a obrigação de aferir da conformidade das informações recebidas pelos interessados com as reais caraterísticas materiais e jurídicas do objeto do contrato.
13 Neste sentido, vejam-se entre outros, os Acórdãos do STJ de 17/03/1967, BMJ 165, pp.331-4 e de 09/03/1978, BMJ 275, pp. 183-90.
O diploma veio a ser alterado pelo DL 258/2001 de 25 de setembro, no tocante a aspetos relativos à forma de prestar caução e ainda ao seguro de responsabilidade civil.
Decorridos cinco anos de vigência do DL 77/99, veio este a ser revogado pelo DL 211/2004 de 20 de agosto14, tendo por base a necessidade de intensificar a fiscalização do combate ao exercício clandestino da atividade e reforçar a capacidade profissional para acesso e permanência na atividade, preocupações que estão na base da prestação de um serviço melhor ao consumidor, nesta área, como decorre da leitura do preâmbulo do diploma.
Importa salientar que tal diploma se revelou inovador na regulamentação da atividade de angariação imobiliária, distinguindo esta dos mediadores, bem como na introdução da obrigação dos outorgantes do negócio jurídico sobre bens imobiliários declararem e identificarem, no momento da escritura pública e na presença do notário, a intervenção de mediador na realização e formalização do negócio.
Face à necessidade de adaptação à Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de dezembro, transposta para a ordem jurídica interna pelo DL 92/2010 de 26 de julho, o diploma 211/2004 veio a ser alterado pelo DL 69/2011 de 15 de junho15.
Decorre do preambulo do citado diploma, que o mesmo visou, por um lado, desburocratizar os procedimentos, tornando-os mais céleres e de acesso mais fácil ao exercício da atividade, tornando o mercado mais competitivo e contribuindo para o crescimento económico e para a criação de emprego. Por outro lado, visou garantir aos consumidores uma maior transparência e informação, proporcionando-lhes uma oferta mais ampla, diversificada e de qualidade superior.
O DL 69/2011, ao nível da mediação imobiliária, introduziu diversas inovações, sendo de destacar a eliminação da proibição de exercício de outras atividades comerciais pelas empresas de mediação imobiliária, bem como a proibição do exercício de outras atividades comerciais e profissionais pelos angariadores imobiliários, permitindo-se que estas empresas se dediquem, por exemplo à gestão dos arrendamentos e de condomínio.
Além disso, a mediação imobiliária voltou a poder ser exercida por pessoa singular, à semelhança do que acontecia na vigência do DL 285/92 de 19 de dezembro.
14 DR I Série-A n º 196, 20 de agosto de 2004.
15 DR I Série, n º 114, 15 de junho de 2011, p. 3116 e seguintes.
O DL 211/2004, com as alterações introduzidas pelo DL 69/2011 veio a ser alterado pela Lei 15/2013 de 8 de fevereiro que estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a atividade de mediação imobiliária, conformando-se com a disciplina constante do DL 92/2010, de 26 de julho, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços do mercado interno16.
Nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, “a mediação imobiliária sofre um especial influxo europeu”17.
Esteve na base do surgimento da Diretiva n º 2006/123/CE, uma ideia de mercado único europeu, a qual só poderia ser alcançada ultrapassando os bloqueios resultantes dos múltiplos regimes restritivos, diferentes de país para país, criando entre estes uma harmonização.
16 DR I Série, n º 28, 8 de fevereiro de 2013, p. 760-69.
17 Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito Comercial, 4ª edição, Almedina, 2016, p. 713.
Introdução:
“O contrato em questão foi considerado, como um contrato de mediação, isto é, um contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte”.18
“Mediação, pois, é a interferência feliz de um terceiro, feita sob promessa de recompensa, entre duas ou mais pessoas, levando-as a concluir determinado negócio”19.
“Em sentido amplo, diz-se mediação, o ato ou efeito de aproximar voluntariamente duas ou mais pessoas, de modo a que, entre elas, se estabeleça uma relação de negociação eventualmente conducente à celebração de um contrato definitivo. Em sentido técnico ou estrito, a mediação exige ainda que o mediador não represente nenhuma das partes a aproximar e, ainda, que não esteja ligado a nenhuma delas por vínculos de subordinação” 20.
“A mediação costuma ser definida como um contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à conclusão de determinado negócio entre elas, mediante remuneração”.21
“A mediação é a atividade pela qual um sujeito (mediador), agindo de modo imparcial, aproxima duas (ou mais) partes, com vista à celebração de certo contrato”22.
18 Vaz Serra, Revista de Legislação e Jurisprudência, n º 3355, Ano 100, Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de março de 1967, p. 343.
19 Xxxxxxxx Xxxx, citado por Xxxxxx Xxxxxxxx, Contrato de Mediação, p. 31.
20 Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito Comercial, 4ª edição, Almedina, 2016, p. 689 e Do contrato de Mediação, O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 517-554.
21 Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, O contrato de Mediação e o direito do mediador à remuneração, Scientia Iuridica, nº 331, Tomo LXII, janeiro/abril, 2013, p. 77 -106.
22 Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, Vol. I, Xxxxxxxx, 2001, p. 186.
Noções gerais:
Contrato de mediação imobiliária simples.
Atualmente o regime jurídico do contrato de mediação imobiliária encontra-se regulado pela Lei 15/2013 de 8 de fevereiro.
A propósito da noção de contrato de mediação imobiliária consagrada no referido diploma refere Higina Orvalho Castelo que “Ao estilo dos anteriores regimes, o RJAMI não fornece uma noção de contrato de mediação imobiliária, concentrada numa só disposição, mas sugere-a na conjugação dos artigos 2º, n º1 (que define a atividade desenvolvida pelo mediador) e 16º, n º2 al. c) e 19º (que preveem a necessária remuneração do mediador e os pressupostos que a tornam devida). O artigo 3º diz-nos que a atividade só pode ser exercida mediante contrato”23.
Estabelece o artigo 2º, n º1 do citado diploma que “A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte de empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis”.
A noção de contrato de mediação imobiliária, tem vindo a sofrer algumas alterações, desde a sua primeira consagração legal, no DL 285/92 de 19 de dezembro, o qual estipulava que “a mediadora se obriga a conseguir interessado” para determinado negócio. A consagração de tal noção teve por base a doutrina e jurisprudência que nessa altura, já procedia à caraterização jurídica de tal contrato, face à ausência de regulamentação que se fazia sentir na vigência do DL 43.767 de 30 de junho de 196124.
Os diplomas subsequentes, o DL 77/99 de 16 de março (artigo 3º, n º1) e o DL 211/2004 de 20 de agosto (artigo 2º, n º1), passaram a considerar a atividade de mediação imobiliária como aquela pela qual a empresa de mediação “se obriga a diligenciar no
23 O Contrato de Mediação, Almedina, 2014, p. 377.
24 Neste sentido: o Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, in, RLJ, Ano 100, p. 343 e seguintes, o qual sumaria que “Qualifica-se como contrato inominado geralmente designado por mediação, e não como contrato de mandato comercial, aquele em que há um acordo estabelecido entre o proprietário de um prédio e uma sociedade, visando, apenas a atividade especifica desta como empresa mediadora, ou seja, a de procurar conseguir uma oportunidade para a venda do prédio, ficando ela a agir exclusivamente por si e não por mandato e em nome de outrem, e terminando a sua atuação quando, após as necessárias negociações, as partes se dispuseram a celebrar o contrato”; o Acórdão do STJ de 9 de março de 1978, in, BMJ, 275, p. 183, o qual sumaria que “Existe contrato de mediação quando uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e aproxima esse interessado da outra parte”.
sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos, a cessão de posição em contratos cujo objeto seja um bem imóvel”.
A Lei 15/2013 deixou de fazer referência a uma obrigação da mediadora passando a descrever tal atividade como “a procura de destinatários” para a realização de determinado negócio.
Esta mudança na descrição da atividade de mediação, acarreta, como bem refere Higina Orvalho Castelo “uma mudança de entendimento sobre a atividade que o mediador desenvolve no âmbito da relação contratual com o cliente e com vista a satisfação do interesse deste. Ao abandonar a referência a uma obrigação do mediador de efetuar dadas diligências, amplia o leque das ocorrências comportamentais a que se destina a sua aplicação direta. A vinculação contratual do mediador e a sua intensidade terão de procurar-se casuisticamente, sem que isso afete a qualificação como contrato de mediação imobiliária legalmente típico”25.
Seguindo a linha de pensamento da mesma autora, diremos que tal mudança permitiu “uma convergência com o ambiente internacional e indo ao encontro do que parece ser a lógica do modelo contratual em questão”26. Pois, tal noção veio fazer uma aproximação ao conceito de Obliegenheit existente no direito suíço e no direito alemão, cuja tradução tem sido levada a cabo por diversos autores portugueses para os termos ónus material, encargo e incumbência27.
A este propósito, diremos que o termo incumbência tem sido utilizado com frequência pela jurisprudência28, contudo o mesmo normalmente está acompanhado pela ideia de “obrigação do mediador”.
25 Obra citada, p. 401.
26 Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, Almedina, 2015, p. 38.
27 No sentido de entender tal termo como ónus material ou encargo, veja-se Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Tratado de direito civil I, pp. 918-9. No sentido, de entender tal termo como incumbência, veja-se Xxxxxxxx Xxxxxxx, A parte geral do Código Civil português, p. 234.
28 Entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de junho de 1993, XX XXXXX, Tomo III, p. 139 e seguintes, que refere “(…) O contrato de mediação pressupõe, essencialmente, a incumbência, a uma pessoa de conseguir interessado para certo negócio, bem como a aproximação, feita pelo mediador, entre o terceiro e o comitente e a conclusão do negócio, entre estes, como consequência adequada da atividade do mediador (…)”; Acórdão do STJ de 9 de dezembro de 1993, BMJ n º 432, p. 332 e seguintes, refere que “(…) é entendimento geral que o contrato de mediação é um negócio jurídico por via do qual uma pessoa incumbe outra de conseguir interessado para certo contrato, com vista à realização deste (…)”; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de junho de 1977, CJ II, Tomo III, p. 647 e seguintes, refere que “O contrato de mediação é um contrato inominado que supõe, na sua essência, a incumbência a uma pessoa de conseguir interessado para certo negócio (…)”.
Em suma, no contrato de mediação simples (sem cláusula de exclusividade) a mediadora tem a liberdade de desenvolver a atividade pretendida pelo cliente, não podendo ser obrigada a tal. Por sua vez, o cliente tem a liberdade de contratar outras mediadoras, bem como de celebrar o contrato com pessoa encontrada por outra mediadora.
Contrato de mediação em regime de exclusividade.
A Lei 15/2013 de 8 de fevereiro, prevê que as partes ao celebrarem um contrato de mediação imobiliária, e caso convencionem o regime de exclusividade, têm de o mencionar obrigatoriamente no contrato, bem com os efeitos que decorrem do mesmo para ambas as partes (artigo 16º, n º2 al. g) do citado diploma).
Contudo, o referido diploma não faz qualquer referência à noção de tal modalidade do contrato de mediação.
Diferentemente, o artigo 19º, n º 4 do DL 211/2004 de 20 de agosto estabelecia que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência”.
Não obstante a atual omissão, o certo é que não podemos deixar de entender que tal regime tem em vista consagrar uma obrigação (e não já uma incumbência) por parte da mediadora de desenvolver a sua atividade de obter interessado no contrato e, por parte do cliente de não poder recorrer a outra mediadora para tal desiderato.
Se, é pacífico tal entendimento, quanto ao impedimento do cliente, (que celebra contrato de mediação em regime de exclusividade), de recorrer a outras mediadoras, o mesmo não se pode dizer no tocante à iniciativa, por parte do próprio cliente de promover, por si, o negócio pretendido.
Relativamente a este regime de exclusividade e, no tocante ao alcance do mesmo, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx00 distingue duas modalidades de exclusividade: a exclusividade simples, pela qual, “o comitente não poderá celebrar com outro mediador um contrato que tenha por objeto o mesmo negócio”; e a exclusividade reforçada, pela qual, “ se prevê também que o comitente não poderá ele próprio procurar um terceiro interessado no negócio”.
29 Scientia Iuridica, nº 331, Tomo LXII, janeiro/abril, 2013, p. 104.
A autora, a fim de esclarecer a interpretação a dar, no caso de as partes nada dizerem a tal propósito no contrato que celebrarem, refere que “deve resultar claramente do contrato que o comitente se abstém de procurar ele próprio o melhor negócio”, caso tal não suceda estar-se-á perante uma exclusividade simples30.
Caraterização jurídica do contrato de mediação (imobiliária):
O contrato de mediação imobiliária não se confunde com outras figuras jurídicas, embora apresente algumas notas em comum com elas. A fim de se proceder à distinção entre o contrato de mediação e as demais figuras afins, necessário se torna proceder à sua caraterização jurídica, de modo a que se possa depois perceber o que o afasta e aproxima dessas figuras.
O contrato de mediação é em regra um contrato atípico, na medida em que não lhe corresponda um regime legal específico, mas também pode ser típico, quando o seu regime jurídico tenha consagração legal, como sucede com o contrato de mediação imobiliária, cujo regime jurídico se encontra regulado pela Lei 15/2013 de 8 de fevereiro.
É um contrato oneroso31, na medida em que “envolve vantagens e sacrifícios patrimoniais para ambas as partes”32, sendo, por regra, remunerado, se o negócio visado vier a ser celebrado, sendo, por isso, um contrato aleatório.
Trata-se de um contrato consensual (artigo 219º do Código Civil), embora algumas modalidades como o contrato de mediação imobiliária, exijam a forma escrita, gerando a sua inobservância uma nulidade não invocável pelo mediador (artigo 16º, n º 1 e 5 da Lei 15/2013).
30 No mesmo sentido, Higina Orvalho Castelo, O Contrato de Mediação, p. 428, refere que, “Em meu entender, e sem prejuízo de as partes poderem manifestar claramente o seu acordo noutro sentido, a melhor interpretação de uma cláusula de teor idêntico ao do artigo 19º, n º4, do revogado DL 211/2004 (só a empresa de mediação tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação) restringe a operacionalidade da cláusula ao afastamento da concorrência, não podendo ver-se como tal a iniciativa do próprio cliente”.
31 Sobre a classificação dos contratos onerosos e gratuitos, vejam-se entre outros, Xxxxxxx Xxxxxxx Leitão, Direito das Obrigações, I, p. 205 e seguintes, refere que “O contrato diz-se oneroso quando implica atribuições patrimoniais para ambas as partes e gratuito quando implica atribuições patrimoniais para apenas uma delas”; Xxxxxxx Xxxxxx, Das obrigações em geral, I, p. 415 e seguintes, refere que “Diz-se oneroso o contrato em que a atribuição patrimonial efetuada por cada um dos contraentes tem por correspetivo, compensação ou equivalente a atribuição da mesma natureza proveniente do outro. Para alcançar ou manter a atribuição patrimonial da contraparte, cada contraente tem de realizar uma contraprestação, É gratuito o contrato em que, segundo a comum intenção dos contraentes, um deles proporciona uma vantagem patrimonial ao outro, sem qualquer correspetivo ou contraprestação”.
32 Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, Vol. I, Xxxxxxxx, 2001, p. 209.
Outra classificação dentro do contrato de mediação é a mediação unilateral e a mediação bilateral. Na primeira o mediador celebra apenas um contrato com um dos interessados no negócio final e na segunda celebra com ambos os interessados.
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx00, aponta ainda outra distinção: mediação pura e mediação mista ou combinada. Na mediação pura o mediador obriga-se, simplesmente e numa situação de interdependência e de equidistância em relação às partes a conseguir a celebração de certo negócio definitivo. Na mediação mista ou combinada, o mediador, para além dos serviços de mediação propriamente dita, exerce ainda uma atuação por conta de outrem (mandato), podendo igualmente assumir outros serviços: desde a publicidade à prestação de apoio jurídico.
Podemos ainda distinguir entre a mediação civil e a mediação comercial, sendo que, como refere Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx00 “o contrato de mediação não é um contrato cuja natureza comercial ou civil decorra de uma específica norma legal”.
Contudo, na maioria das situações encontradas podemos afirmar maioritariamente a natureza comercial de tal contrato35, seja porque nele intervém um mediador no exercício da sua atividade comercial (comercialidade subjetiva), seja porque em causa está uma das modalidades de mediação tipificadas como a mediação imobiliária e a mediação de xxxxxxx00 (comercialidade objetiva).
A doutrina37 divide-se no sentido de admitir ou não como subsumível o contrato de mediação à atividade prevista no artigo 230º, 3º do Código Comercial38, por aplicação
33 Revista O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 541.
34 Scientia Iuridica, nº 331, Tomo LXII, janeiro/abril, 2013, p. 77 e seguintes.
35 Neste sentido, Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, Almedina, 2015, p. 52 e seguintes refere que “No nosso ordenamento, a atividade de mediação imobiliária regulada foi sempre uma atividade comercial”; Xxxxxx Xxxxx-Real e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, A atividade de Mediação Imobiliária – Anotações e Comentários ao DL 77/99, de 16/03 e à Legislação Complementar, Vida Económica, p. 11, referem que “Esta atividade do mediador imobiliário é uma atividade de cariz absolutamente comercial, uma vez que a entidade mediadora tem como escopo a prática de atos de comércio com vista à obtenção do lucro”.
36 DL 144/2006 de 31 de julho.
37 No sentido de admitir que o contrato de mediação se subsume à atividade de “agência negócio ou leilões por conta de outrem em escritório aberto ao público e mediante salário estipulado”, vejam-se entre outros, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, Curso de Direito Comercial, Vol. I, pp. 60, 78 e seguintes, p. 144; Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, Obra citada, p. 77 e seguintes; Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária, Anotado, Almedina, 2015, p. 53/54. Em sentido contrário, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 190 e seguintes; Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, in, Direito Comercial, 4ª Edição, Almedina, p. 690 e seguintes e Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, O contrato de concessão comercial, p. 116.
38 Estabelece o artigo 230º do Código Comercial que “Haver-se-ão por comerciais as empresas, singulares ou coletivas, que se propuserem: (…) 3º Agenciar negócios ou leilões por conta de outrem em escritório aberto ao público e mediante salário estipulado”.
direta ou por analogia, entendendo-se, também com este argumento, tal contrato como comercial.
Mas, para além das três situações enunciadas, como refere Xxxxx de Xxxxxx Xxxxxxx “pode não ficar completamente afastada a possibilidade de se entender que o contrato de mediação é um contrato comercial, uma vez que a atividade do mediador se destina, sempre, a colaborar na intermediação entre a oferta e a procura, sendo portanto jurídica e economicamente mercantil”39.
Esta classificação como contrato civil ou comercial, revela-se de grande interesse, ao nível das normas legais a aplicar, a título subsidiário, na falta ou insuficiência de estipulações contratuais ou quando o regime jurídico que prevê tal contrato seja omisso.
No caso do contrato de mediação, designadamente imobiliária, diremos que maioritariamente a doutrina40 e a jurisprudência41 vêm defendendo a aplicação subsidiária das regras do contrato de prestação de serviços e do mandato, nas situações em que haja lacunas a preencher, considerando mesmo o contrato de mediação como uma modalidade do contrato de prestação de serviços.
39 Obra citada, p. 77 e seguintes.
40 Neste sentido, Pires de Lima e Xxxxxxx Xxxxxx, Código Civil, Anotado, Volume II, 4ª edição, p. 785, referem que, “uma outra modalidade do contrato de prestação de serviço, que não tem regulamentação geral na nova lei, é a do contrato de mediação (…)”; Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, O Direito, 139º (2007) III,
p. 549, o qual refere que, “ Pela nossa parte, recordamos que a mediação é, antes do mais, uma prestação de serviço. Na falta de outras regras, haverá sempre que fazer apelo ao previsto para o mandato, por xxx xx xxxxxx 0000x do Código Civil”; Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, Contratos Privados das Noções à Prática Judicial, Vol. III, 2014, p. 73, os quais referem que “Quanto à natureza jurídica do contrato de mediação imobiliária, Pires de Lima e Xxxxxxx Xxxxxx, entendem que estamos perante uma modalidade do contrato de prestação de serviço (…)”; Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, O Contrato de Mediação Imobiliária na prática judicial, outubro 2016, p. 22, refere que “ o contrato de mediação imobiliária é regulado, em “primeira mão” pelo diploma específico que o prevê (a aludida Lei n º 15/2013 de 8 de fevereiro). À falta ou insuficiência do ali estatuído e bem assim das estipulações contratuais (das partes, ao abrigo da liberdade contratual), regem (subsidiariamente, portanto) as regras do contrato de prestação de serviços (a que são extensíveis as disposições sobre o mandato, com as necessárias adaptações
– artigo 1156º Código Civil)”; Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 209, “A ausência de uma regulamentação legal “imediata” é porém, atenuada pela inserção da mediação na categoria dos contratos de prestação de serviços (artigo 1154º CC), a par da sua irrecondutibilidade a qualquer dos tipos legais, permitindo, com as necessárias adaptações, do regime do mandato (artigo 1156º Código Civil)”; Xxxxxx Xxxxx-Real e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, A atividade de Mediação Imobiliária – Anotações e Comentários ao DL 77/99, de 16/03 e à Legislação Complementar, Vida Económica, p. 16, referem que “Ponto assente parece ser o de que o contrato de mediação, na sua essência, mais não é do que uma modalidade de contrato de prestação de serviços, nos termos do qual uma entidade se compromete a prestar determinados serviços à pessoa que a contrate, quais sejam serviços de mediação necessários à concretização de um qualquer distinto negócio de mediação que seja assegurada em cumprimento do celebrado contrato de mediação”; Higina Orvalho Castelo, O Contrato de Mediação, Almedina, 2014, p. 355 “Podemos concluir que, no ordenamento português, contratos de mediação pelos quais o mediador se vincule a uma prestação, constituem uma modalidade da categoria dos contratos de prestação de serviços”.
41 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de junho de 1977, CJ II, Tomo III, p. 647 e seguintes.
Contudo, alguma doutrina42 e jurisprudência43, têm-se demarcado de tal posição, defendendo que, a integração das lacunas tem de ser feita por recurso à analogia e, portanto, às regras legais previstas para os contratos análogos.
A este propósito diremos que, se se tratar de um contrato de mediação atípico, o regime que lhe é aplicável, em primeiro lugar é o que resultar da estipulação das partes, e na ausência desta é o regime previsto para os contratos análogos e ainda as regras gerais das obrigações44. Se se tratar de um contrato típico (como a mediação imobiliária), o regime aplicável é o que decorre do diploma que o prevê, das estipulações das partes e na falta delas ou no caso de o regime legal ser omisso, o regime previsto para os contratos análogos.
Estabelece o artigo 3º do Código Comercial que se “as questões sobre direitos e obrigações comerciais não puderem ser resolvidas, nem pelo texto da lei comercial nem pelo seu espirito, nem pelos casos análogos nela prevenidos, serão decididos pelo direito civil”.
Por sua vez, o artigo 10º do Código Civil também estabelece que “1- Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos. 2- Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei. 3- (…)”45.
Face ao disposto nos citados normativos, e segundo os argumentos de quem defende esta posição, tal significa que, mesmo estando em causa um contrato comercial,
42 Neste sentido, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 77 e seguintes.
43 Neste sentido, vejam-se, entre outros o Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, BMJ 165, p. 318 e seguintes (também em RLJ, Ano 100, p. 340 e seguintes), O Acórdão do STJ de 9 de março de 1978, BMJ 275, p. 183.
44 Neste sentido, Xxx Xxxxx em anotação ao Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, in, RLJ 100, p. 345, refere que “A lei é omissa, devendo, assim, a questão ser resolvida, sucessivamente, pelas estipulações das partes, pela aplicação analógica das disposições relativas a contratos afins, pelas regras gerais das obrigações e pela decisão judicial (integrativa do contrato)”.
45 A este propósito refere J. Xxxxxxx Xxxxxxx, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1995, p. 202, que “Nos termos do artigo 10º, n º1 do Código Civil o julgador deverá aplicar (por analogia) aos omissos as normas que diretamente contemplem casos análogos – e só na hipótese de não encontrar no sistema uma norma aplicável a casos análogos é que deverá proceder de acordo com o n º3 do mesmo artigo. Dois casos dizem-se análogos quando neles se verifique um conflito de interesses, paralelo, isomorfo ou semelhante – de modo a que o critério valorativo adotado pelo legislador para compor esse conflito de interesses num dos casos, seja por igual ou maioria de razão aplicável ao outro (n º2 do artigo 10º) (…) O recurso à analogia como primeiro meio de preenchimento das lacunas justifica-se por uma razão de coerência normativa ou de justiça relativa (principio da igualdade: casos semelhantes ou conflitos de interesses semelhantes devem ter um tratamento semelhante), a que acresce ainda uma razão de certeza do direito: é muito mais fácil obter a uniformidade de julgados pelo recurso à aplicação com as devidas adaptações, da norma aplicável a casos análogos do que remetendo o julgador para critérios de equidade ou para princípios gerais do Direito (…)”.
tendo subjacente relações comerciais, as mesmas não têm de ser resolvidas exclusivamente pelo direito comercial, podendo, sê-lo pelo direito civil, não existindo aqui sequer qualquer precedência formal a favor das normas mercantis46, devendo a solução a encontrar ser procurada de acordo com a maior adequação. A este propósito refere Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx: “(..) o intérprete estará autorizado a recorrer às normas de um ou do outro contrato, consoante o aspeto de regime que se apresente omisso: se, na situação a regular, o conflito de interesses apresentar maior similitude com aquele a que o legislador pretendeu dar resposta ao regular um destes outros contratos, o de mandato ou o de agência, é das regras desse outro que o intérprete deve socorrer-se para resolver a questão que lhe é colocada”47.
É interessante salientar que alguma jurisprudência vai ainda mais longe no sentido de afastar totalmente a aplicação a título subsidiário do regime de alguns contratos como a prestação de serviços e dentro desta, o mandato. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 4 de março de 198048, refere que “ a aproximação (do contrato de mediação) com o contrato de mandato é arredada porque se o mandatário é encarregado de cuidar dos interesses de um dos contraentes, tendo por meta a realização do negócio jurídico, o mediador no contrato é, quando muito, intermediário nas propostas contratuais, sendo alheio à conclusão do contrato”.
Do cotejo das diferentes posições assumidas na doutrina e na jurisprudência diremos que a posição que sufragamos é aquela que entende que o contrato de mediação imobiliária tem natureza comercial, mas permite, integrar as lacunas através do recurso aos diferentes regimes jurídicos similares, comerciais ou civis, consoante o conflito concreto a dirimir, pois, só desse modo se poderá procurar o equilíbrio na composição dos litígios.
Outras questões se levantam no âmbito da caraterização do contrato de mediação, o qual perante o ordenamento jurídico português49 e face à diversa jurisprudência deve ser reconhecida a sua natureza contratual. A este propósito refere Xxxxxx Xxxxxxx Barata50 que “a mediação é, em geral, uma figura atípica, no Direito português. A liberdade contratual
46 Neste sentido, Xxxxx xx Xxxx Xxxx Xxxxxx, Direito Comercial, Sumários, Xxxxxxx 0000-00, p. 17.
47 Obra citada, p. 85/86.
48 BMJ 295, p. 356 e seguintes.
49 Diferentemente tal questão da natureza contratual ou não contratual do contrato de mediação tem sido debatida noutros ordenamentos jurídicos, como o italiano onde a doutrina e jurisprudência se mantêm divididas, embora a opinião maioritária defenda a natureza comercial da mediação, conforme análise levada a cabo por Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 222 e seguintes.
50 Obra citada, p. 225.
(artigo 405º, n º 1 C.C.) explica e justifica o vínculo de mediação. Mas, no quadro dos factos voluntários constitutivos de relações obrigacionais, só ao contrato, neste caso, pode ser reconhecida aptidão para fundar a vinculação”. Ao contrário do que ocorre no negócio unilateral, sujeito ao princípio da tipicidade, estabelecido no artigo 457º do Código Civil.
Se tal entendimento já é defendido a propósito do contrato de mediação atípico, dúvidas não subsistem no tocante ao contrato de mediação imobiliária, pois o artigo 3º, n º1 do da Lei 15/2013 de 08/02 refere que “A atividade de mediação imobiliária só pode ser exercida em território nacional por empresas de mediação imobiliária e mediante contrato” e o artigo 16º n º1 do mesmo diploma refere “O contrato de mediação imobiliária (…)”, assumindo de forma expressa a natureza contratual de tal contrato51.
Além das diferentes classificações já assinaladas, podemos ainda salientar a que distingue a mediação simples da mediação profissional. Como refere Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx00 “na primeira, o ato ou efeito de mediar é levado a cabo por qualquer pessoa, sem especiais preparação ou condicionalismo, dentro do espaço jurídico. Na segunda, encontramos uma pessoa que, de modo organizado, lucrativo e tendencialmente exclusivo utiliza a mediação como modo de vida”.
Tendo por base esta classificação, diremos que, no âmbito da mediação imobiliária, o artigo 3º, n º1 da Lei 15/2013 de 08/02 prevê que, “a atividade de mediação imobiliária só pode ser exercida em território nacional por empresas de mediação imobiliária (…)”, afigurando-se-nos que a regra é que tais contratos sejam celebrados por “empresas”53 e, portanto, por profissionais.
Contudo, na prática pode uma pessoa singular (não empresa) celebrar ocasionalmente um contrato semelhante ao previsto na Lei 15/2013, importando saber se o mesmo se mostra ou não abrangido pelo referido regime jurídico. A este propósito Higina
51Desde o DL 285/92 de 19 de dezembro (artigo 2º) que tem sido esse o entendimento, o qual perdurou nos diplomas posteriores, artigo 3º, n º 1 do DL 77/99 de 16 de março e artigo 2º do DL 211/2004 de 20 de agosto, podendo ver-se a tal propósito Xxxxxx Xxxxx-Real e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, A atividade de Mediação Imobiliária – Anotações e Comentários ao DL 77/99, de 16/03 e à Legislação Complementar, Vida Económica, p. 13 referem que “(…) a atividade imobiliária é levada a cabo, obrigatoriamente , através de contrato de mediação (…)”.
52 O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 539/540.
53 Entendendo-se nas palavras de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, Curso de Direito Comercial, Vol I, 1998,p. 243, que “empresa em sentido objetivo é a unidade jurídica fundada em organização de meios que constitui um instrumento de exercício relativamente estável e autónomo de uma atividade de produção para troca”.
Orvalho Castelo, refere que “A qualidade de empresa apresenta-se como uma caraterística do tipo legal, ao qual o regime previsto no diploma se aplica em primeira linha. Logo, celebrado um contrato que em tudo o mais se assemelha ao de mediação imobiliária descrito no diploma, mas que não tem do lado do mediador uma empresa, esse contrato, necessariamente ocasional, constitui um contrato legalmente atípico de mediação imobiliária, válido ao abrigo do princípio da liberdade contratual, ao qual não se aplica de forma direta o regime previsto no diploma”54. Assim, e sendo um contrato atípico ao qual não é aplicável o regime previsto pela Lei 15/2013 de 08/02, também não estará tal contrato sujeito às exigências de licenciamento previstas no referido diploma55.
Elementos caraterizadores do contrato de mediação imobiliária:
A noção de contrato de mediação, designadamente do contrato de mediação imobiliária, tem conduzido à autonomização de elementos caraterizadores desse contrato.
Para podermos elencar os elementos caraterizadores, necessário se torna analisarmos as diversas noções formuladas na doutrina e jurisprudência.
Nas palavras de Xxx Xxxxx, o contrato de mediação “é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e aproximar esse interessado da outra parte”56.
Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, refere que “A mediação costuma ser definida como um contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à conclusão de determinado negócio entre elas, mediante remuneração”57.
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, refere que “Em sentido amplo, diz-se mediação, o ato ou efeito de aproximar voluntariamente duas ou mais pessoas, de modo a que, entre elas, se estabeleça uma relação de negociação eventualmente conducente à celebração de um contrato definitivo. Em sentido técnico ou estrito, a mediação exige ainda que o mediador não represente nenhuma das partes a aproximar e, ainda, que não esteja ligado a nenhuma delas por vínculos de subordinação”58.
54 Higina Orvalho Castelo, O Contrato de Mediação, Almedina, 2014, p.383.
55 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 05/11/1974, BMJ 241, pp.265-9.
56 Anotação ao Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, RLJ 100, p. 343.
57 Obra citada, p. 78.
58 Obra citada, p. 517.
Por sua vez, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, define o contrato de mediação, como o “contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição”59.
Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, insere o contrato de mediação, na sua obra, no capítulo destinado à análise dos contratos de distribuição, definindo-o como o “contrato pelo qual uma parte – o mediador- se vincula para com a outra – o comitente ou solicitante – a, de modo independente e mediante retribuição, preparar e estabelecer uma relação de negociação entre este último e terceiros – os solicitados – com vista à eventual conclusão definitiva de negócio jurídico”60.
Das diferentes noções elencadas é possível destacar os elementos presentes, sendo que, a maior divergência se prende com o facto de, para uma parte da doutrina o elemento da imparcialidade está presente na noção de contrato de mediação e para outra parte da doutrina tal elemento está excluído.
Assim, das noções apresentadas, são elementos do contrato de mediação: a) a atividade de mediação: obrigação ou ónus de aproximar sujeitos? b) atividade tendente à celebração de negócio: obrigação de meios ou de resultado? c) imparcialidade; d) ocasionalidade; e) onerosidade.
i) A atividade de mediação imobiliária: obrigação ou ónus de aproximar sujeitos?
Começando pela análise do primeiro elemento da definição de contrato de mediação imobiliária, diremos que, a jurisprudência utiliza maioritariamente o termo incumbência, mas com o significado de obrigação.
Estabelece o artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013 que “A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios (…)”.
A atividade a cargo do mediador consiste “ (…) em pôr em contacto dois ou mais sujeitos, futuros contraentes num eventual negócio, cuja celebração se procura”61.
59 Obra citada, p. 192.
60 Obra citada, p. 458.
61 Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 192.
Para promover tais contactos a atividade do mediador traduz-se “na procura” de destinatários para a realização do negócio pretendido que terá de ter por base a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.
Face à evolução na terminologia utilizada pelos diversos diplomas que regulam a mediação imobiliária, diremos à semelhança do acima referido, o legislador na Lei 15/2013 pretendeu deixar de encarar a prestação do mediador como uma obrigação, passando a designar antes tal atividade como uma incumbência. Tendo passado a aferir-se da maior ou menor vinculação do mediador através das cláusulas que as partes venham a estipular em cada contrato concreto, designadamente a cláusula de exclusividade.
A propósito da intensidade de vinculação do mediador refere Higina Orvalho Castelo que “por via de um concreto contrato de mediação, o mediador poderá assumir uma obrigação de atividade – poderá vincular-se a diligenciar no sentido de encontrar interessado para o seu cliente (como sucederá nos contratos em que o mediador aja com o beneficio da exclusividade) -, ou poderá exercer a sua atividade sem a esse exercício estar adstrito, fazendo-o simplesmente porque sem ele não corresponderá a uma obrigação, mas a uma espécie de ónus de direito material, cujo correspondente comportamento será exercício no interesse de ambas as partes, mediador e cliente sob pena de o mediador não ser remunerado (remuneração que, salvo alguns casos de regime de exclusividade, não depende apenas da atuação do mediador, mas também da celebração do contrato mediado)”62.
ii) A atividade tendente à celebração de negócio: obrigação de meios ou de resultado?
Antes de analisarmos se a atividade do mediador tendente à celebração do negócio constitui uma obrigação de meios ou de resultado, necessário se torna analisar o que entendemos por obrigação de meios ou de resultado.
A prestação debitória pode revestir diversas modalidades, sendo que, em regra tal prestação refere-se a um facto do devedor, mas pode suceder que se reporte a um facto de terceiro. Nesta situação, o “compromisso assumido pelo promitente, de conseguir o facto
62 Regime Jurídica da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015, p. 35.
de terceiro nem sempre reveste o mesmo sentido, de acordo com a intenção dos contraentes. Nuns casos, o promitente obriga-se apenas a despender os esforços razoavelmente necessários para que o terceiro pratique o facto, sem assumir qualquer responsabilidade na hipótese de este não querer ou não poder cumprir. Noutros, garantindo a verificação do facto, o promitente obriga-se a indemnizar a outra parte, se o terceiro, por qualquer razão não quiser ou não puder praticá-lo. E não se exclui a possibilidade de a promessa se situar numa zona intermediária, responsabilizando-se o promitente quanto aos casos em que o terceiro não queira, mas já não quanto àqueles em que ele não possa praticar o facto”63.
Assim, podemos “descrever as obrigações de resultado como sendo aquelas, em virtude das quais o devedor fica adstrito, em benefício do credor, à produção de um certo efeito útil, que atua satisfatoriamente o benefício creditório final ou primário, isto é, o interesse que em último termo o credor se propõe alcançar (…). No plano oposto, situam- se obrigações de meios, em que o devedor se obriga apenas a desenvolver uma atividade ou conduta diligente em direção ao resultado final (realização do interesse primário do credor), mas sem assegurar que o mesmo se produza (…)”64
Transpondo tal dicotomia para o âmbito do contrato de mediação imobiliária diremos que na vigência dos DL65 77/99 e 211/2004, a obrigação do mediador era descrita como aquela em que o mediador se obrigava a diligenciar no sentido de conseguir um interessado para certo negócio.
Contudo, alguma doutrina66 e jurisprudência67 entendiam que a prestação do mediador correspondia a uma obrigação de resultado.
63 Das Obrigações em geral, Vol. I, Xxxxxxx Xxxxxx, 9ª edição, p. 86 e seguintes.
64 Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, Obrigações de Meios e Obrigações de Resultado, 2010, p. 19-20.
65 Estabelecia o artigo 3º n º1 do DL 77/99 de 16/03 que “A atividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra e venda de bens imóveis (…)”. E, o artigo 2º, n 1 do DL 211/2004 de 20/08, estatuía que “A atividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio (…)”.
66 Neste sentido, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 93, refere que, “Pode qualificar-se a obrigação do mediador como uma obrigação de resultado: o mediador obriga-se a causar certo resultado, resultado esse que define a prestação, pelo que, apenas existe cumprimento se o resultado vier a ocorrer em consequência da atuação do mediador. Nas obrigações de meios, ao invés, o devedor obriga-se a tentar adequadamente (praticando os atos adequados) causar o resultado, pelo que existe cumprimento quando o tenha assim tentado, ainda que o resultado não se tenha produzido ou se tenha produzido devido a factos estranhos à sua atuação”. No mesmo sentido, Xxx Xxxxxxx Xxxxxxx, A mediação imobiliária – Anotação ao DL 211/2004 de 30 de agosto, p. 47, refere que “A obrigação em que se consubstancia a atividade de mediação é uma obrigação de resultado, sendo essa a razão que leva a que a remuneração da empresa que se dedique a essa atividade apenas seja devida com a conclusão e perfeição do negócio visado” e Xxxxxx Xxxxxxxx, Contrato de
No sentido oposto, encontramos, também doutrina68 e jurisprudência69 a entender que a atividade do mediador configura, não uma obrigação de resultado, mas de meios.
No regime atualmente em vigor (Lei 15/2013), como refere Higina Xxxxxxx Xxxxxxx00, “O RJAMI dá abertura a que um contrato de mediação imobiliária se considere legalmente típico independentemente de a empresa de mediação ter assumido ou não uma obrigação e, no primeiro caso, independentemente do conteúdo da mesma obrigação (diligenciar por encontrar destinatário – meios – ou, encontra-lo – resultado)”.
Tal significa que, por via de regra a obrigação assumida pelo mediador, no contrato de mediação imobiliária simples, será uma obrigação de meios (diligenciar por encontrar um destinatário). No contrato de mediação imobiliária com regime de exclusividade, poderá haver uma maior ou menor vinculação, conforme o acordado pelas partes e aqui pode encontra-se uma obrigação de meios ou de resultado. Esta posição encontra, desde logo, apoio na orientação assumida por Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx00, o qual tendo por base o princípio da liberdade das partes na conformação do conteúdo dos contratos, acaba por concluir que “em princípio as partes podem converter validamente obrigações de resultado em obrigações de meios e obrigações de meios em obrigações de resultado”72, sem transcenderem os limites impostos pela lei.
Mediação, p. 71, refere que “A principal obrigação do mediador é a de, como resulta da sua definição, alcançar a conclusão do negócio para o seu comitente”.
67 Neste sentido, vejam-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16/10/2007, Pº 408/05.5TBCTB.C1, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 03/03/2009, Pº 0827745, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15/07/2009, Pº 2187/07.2TBVRL.P1, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 15/09/2010, Pº 2439/07.1TBPTM.E1, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14/04/2011, Pº 761/07.6TCFUN.L1-2 e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02/06/2011, Pº 141/09.9TBMAI.P.1. 68Neste sentido, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 194-5, refere que “o mediador não se obriga a alcançar o fim celebração do negócio. Vincula-se, somente, a desenvolver a atividade necessária para que essa finalidade seja concretizada. Trata-se, portanto, neste sentido, de uma obrigação de meios ou de comportamento, e não de uma obrigação de resultado”. No mesmo sentido, Xxxxxx Xxxxx-Xxxx e Xxxxx Xxxxxx Xxxxx, obra citada, p. 23, referem que, “tem de dar-se por assente que o mediador só se pode obrigar a procurar interessado para o negócio e a levar a cabo todas as ações necessárias à conclusão desse negócio, mas não pode obrigar-se a mais do que isto e mormente a conseguir, de facto, um concreto interessado na definitivação do negócio pretendido, uma vez que isso não está, manifestamente, na dependência da sua vontade (…) o contrato de mediação mais parece ser um contrato de obrigação de meios e não de resultados, embora a remuneração/comissão só seja devida com a conclusão do negócio”.
69 Neste sentido, vejam-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23/04/2002,CJ, 2002, II, p. 30, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 29/03/2007, Pº 2824/06-3, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 03/12/2008, CJ, 2008, V, 254, Xxxxxxx do STJ de 28/04/2009, Pº 29/09.3XXXXX e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02/11/2009, Pº 1913/08.7TJPRT.P1
70 Obra citada, pp. 44-5.
71 Obra citada pp. 76-8.
72 Tal possibilidade tem implicações, como o mesmo autor refere, nas regras do ónus da prova, modificando- as, em prejuízo do devedor, pois a assunção de uma obrigação de resultado faz recair sobre o devedor uma presunção de culpa alargada à ilicitude e ao nexo de causalidade.
iii) Imparcialidade:
Este elemento tem dividido a doutrina e a jurisprudência73, pois, alguns entendem a imparcialidade como um elemento integrante da noção de contrato de mediação.
Assim, Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx00, refere que “o contrato de mediação é caraterizado por um conjunto de elementos distintivos: são eles a convenção expressa ou tácita de mediação, a atividade pontual e independente de intermediação e a onerosidade (…) o mediador é tipicamente um profissional que atua na base de operações de intermediação para negócios concretos e de forma equidistante relativamente aos interesses das respetivas partes”.
Na mesma senda, Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, distingue entre mediação pura e mediação mista ou combinada. Considerando estarmos perante a primeira modalidade quando o mediador se obriga, “numa situação de independência e de equidistância em relação às partes a conseguir a celebração de certo negócio definitivo” e, perante a segunda, quando o mediador, “para além dos serviços de mediação, propriamente dita, exerce ainda uma atuação por conta de outrem (mandato), podendo igualmente assumir outros serviços, desde a publicidade à prestação de apoio jurídico”75.
Como se referiu, parte da doutrina e jurisprudência defendem entendimento contrário. Neste sentido, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx00, sustenta que, “sobretudo na mediação contratada unilateral (ou seja, quando o mediador tenha celebrado um contrato de mediação apenas com uma das partes interessada no negócio), a atuação do mediador não abstrai, nem pode abstrair, dos interesses do comitente, agindo ele frequentemente, no interesse exclusivo duma das partes – e, por conseguinte, o mediador há de, naturalmente, salientar vantagens do negócio e procurar influenciar a vontade do solicitado (…)”. E, ainda Higina Xxxxxxx Xxxxxxx,00 refere a tal propósito que “ a imparcialidade é caraterística que nunca esteve presente na disciplina legal da mediação imobiliária em Portugal, nem na prática deste contrato, No que à mediação imobiliária respeita, o RJAMI
73 Neste sentido, vejam-se, entre outros, o Acórdão da Relação do Porto de 29/05/2003, CJ, XXVIII, (2003) III, p. 177-182 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16/10/2007, CJ, XXXII, (2007) IV, p. 33- 36.
74 Obra citada, pp. 460-1.
75 O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 541.
76 Obra citada, p. 89-90.
77 Obra citada, p. 55.
acaba com o mito, ainda que de modo infeliz, ao determinar que a atividade é exercida em nome dos clientes (…)”.
Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, sustenta que “A atividade de mediação, em sentido próprio, é desenvolvida de modo imparcial, pelo mediador”78. Entendendo tal autor que, “na sua tarefa de aproximação dos contraentes, o mediador deve agir com neutralidade, não procurando a satisfação de interesses de um dos sujeitos (máxime do comitente), em detrimento dos interesses do outro (…) O mediador deverá comportar-se, perante ambos em termos não discriminatórios e de modo a evitar danos para os potenciais futuros contratantes; nomeadamente deverá avisar (ambas) as partes, quando conheça alguma circunstância, relativa ao negócio, capaz de influenciar a decisão de contratar (ou não) (…) A imparcialidade do mediador deve, portanto, ser aferida em relação aos sujeitos potenciais contraentes (comitente e terceiro) e aos seus interesses. E não relativamente ao interesse do próprio mediador: este não será “parcial” quando aja, primacialmente, em ordem à prossecução dos seus interesses”79. Xxx, tal autor embora defenda o elemento da imparcialidade como integrante da noção de contrato de mediação, acaba por atribuir a tal caraterística o sentido de que o mediador tem o dever de não prejudicar um dos contraentes com o intuito de beneficiar o outro, reconduzindo-se tal imparcialidade ao dever de agir de boa fé, nos termos do disposto no artigo 762º, n º2 do Código Civil, imperativo que impende sobre qualquer contraente num contrato.
Em suma, ressalvado o dever da boa fé que impende sobre todos os contraentes em qualquer contrato em que intervenham, a imparcialidade não se nos afigura que faça parte integrante da noção de contrato de mediação imobiliária.
iv) Ocasionalidade:
O contrato de mediação, por via de regra é celebrado para um certo negócio, não se caracterizando “pela estabilidade do vínculo, mas antes pela sua ocasionalidade”80. Tal não significa que a mediação em certas circunstâncias não possa assumir tal vínculo de estabilidade.
78 Obra citada, p. 196.
79 Obra citada, p. 198-9.
80 Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 200; No mesmo sentido Vaz Serra, RLJ Ano 100, p. 343; Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 92 e Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Direito Comercial, p. 699.
v) Onerosidade:
A propósito da caraterização da natureza jurídica do contrato de mediação, como já salientado o contrato de mediação é um contrato oneroso, na medida em que “envolve vantagens e sacrifícios patrimoniais para ambas as partes”81.
No âmbito do contrato de mediação imobiliária a remuneração, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, têm de constar do contrato, sob pena de nulidade, ainda que invocável pela empresa de mediação, nos termos do disposto no artigo 16º, n º2 al. c) e n º5 da Lei 15/2013.
Por sua vez, o artigo 19º, n º1 do citado diploma estabelece que “A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra”.
Tal significa que o direito à remuneração no contrato de mediação, “depende de uma circunstância futura, incerta e externa à prestação da mediadora, ainda que com esta relacionada”82.
Distinção de figuras afins (contrato de agência, de concessão, de franquia e de mandato).
Contrato de agência:
O regime jurídico do contrato de agência encontra-se regulado pelo DL 178/86 de 3 de julho83, alterado pelo DL 118/93 de 13 de abril84.
Estabelece o artigo 1º, n º1 do citado diploma que “Agência é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes”.
Este contrato integra-se nos chamados contratos de distribuição comercial85, e apresenta vários elementos essenciais que o caraterizam. Desde logo, a obrigação de o
81 Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, Vol. I, Xxxxxxxx, 2001, p. 209.
82 Higina Orvalho Castelo, Contrato de mediação imobiliária, Verbo Jurídico, p. 6.
83 Publicado no DR n º 150, Série I, de 3 de julho de 1986.
84 Publicado no DR n º 86, Série I de 14 de abril de 1993, o qual procedeu à transposição da Diretiva 86/653/CEE, do Conselho de 18 de dezembro de 1986.
agente promover a celebração de contratos. A este propósito refere Xxxxx Xxxxxxxx que “Não se trata, assim, de modo, algum, de uma simples atividade publicitária, antes a obrigação de promover a celebração de contratos compreende um vasto e diversificado leque de atos com o objetivo último de conquista e/ou desenvolvimento do mercado”86.
Outro elemento é a atuação do agente por conta da outra parte, pois, o agente atua sempre por conta do principal, repercutindo-se os efeitos dos atos que pratica na esfera jurídica do principal.
Acresce que, o agente age com autonomia, sem qualquer vínculo de autoridade ou subordinação, como existe numa relação de contrato de trabalho, conformando-se contudo com as orientações que lhe sejam dadas, devendo prestar contas da sua atividade.
A estabilidade é outro elemento que carateriza o contrato de agência, pois, “o agente é um colaborador da empresa e exerce a sua atividade de modo estável, tendo em vista, não uma operação isolada, antes um número indefinido de operações”87.
A retribuição é outro elemento essencial do contrato de agência, pois, trata-se de um contrato oneroso (artigos 15º a 18º do DL 178/86 de 3 de julho com as alterações introduzidas pelo DL 118/93 de 13 de abril).
O contrato de agência não se confunde com o contrato de mediação, pois, enquanto o agente atua por conta do principal, o mediador é independente atua por conta própria relativamente aos contraentes que aproxima.
Alguns autores88, salientam como nota distintiva destas duas figuras jurídicas a imparcialidade caraterizadora do contrato de mediação, que a distingue do contrato de agência, no âmbito do qual o agente zela pelos interesses do principal.
Contudo, como já referido a propósito da análise dos elementos caracterizadores do contrato de mediação, a doutrina e jurisprudência não têm um entendimento unânime a
85 A este propósito refere Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 435, “Por contratos de distribuição comercial entendemos aqui genericamente aqueles contratos, típicos ou atípicos, que disciplinam, as relações jurídicas entre o produtor e o distribuidor “lato sensu” com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro”.
86 Contrato de Agência, Anotação, 4ª Edição atualizada, p. 38.
87 Xxxxx Xxxxxxxx, obra citada, p. 43.
88 Neste sentido, Xxxxx Xxxxxxxx, obra citada, p. 43, refere que “Não se confunde, assim, a agência com o contrato de mediação, visto que, apesar de em ambos alguém atuar como intermediário, aproximando os contraentes e preparando a conclusão do contrato, o mediador, ao contrário do agente, atua com imparcialidade (…)”. No mesmo sentido, Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, O contrato de Mediação Imobiliária na Prática Judicial, pp. 22-3.
respeito do elemento de “imparcialidade”, pelo que, este elemento não será o bastante para a diferenciação entre os dois contratos congéneres em análise.
Outra nota distintiva é a ocasionalidade/estabilidade, pois o contrato de mediação é normalmente solicitado para determinado ato concreto, enquanto o contrato de agência tem em vista o exercício de uma atividade de modo estável, tendo por base um número indefinido de operações89.
Contrato de concessão:
Á semelhança do contrato de agência, o contrato de concessão comercial insere-se na categoria dos contratos de distribuição.
O contrato de concessão comercial tem sido entendido como “um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”, “contrato-quadre”), que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações – mormente no que concerne à sua organização, à politica comercial e à assistência a prestar a clientes – sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente”90.
Têm sido apontadas quatro caraterísticas essenciais desta figura contratual: obrigações recíprocas de compra e venda, atuação em nome e por conta próprios, autonomia e estabilidade91.
No tocante à primeira caraterística apontada, diremos que, o concedente se obriga a vender ao concessionário os seus produtos, ficando este obrigado a adquiri-los, para revenda.
O concessionário na sua atuação de revenda, assume inteiramente os riscos da comercialização, pelo que, atua em nome e por conta própria, suportando quaisquer vicissitudes decorrentes dessa sua atuação, diferentemente do que sucede no contrato de agência (pois o agente atua por conta xxxxxx).
89 Xxxxx Xxxxxxxx, obra citada, p. 43, salienta ainda que, “entre outras diferenças, que a remuneração do mediador, é independente do cumprimento do contrato, diversamente do que sucede com o agente, nos termos do artigo 18º (…)”.
90 Xxxxx Xxxxxxxx, Denúncia de um contrato de concessão comercial, 1998, p. 39-40.
91 Veja-se, neste sentido Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, pp. 448 e segs.
O concessionário não deve confundir-se com o concedente, sendo distinto e autónomo deste, não deixando, contudo de se sujeitar às obrigações decorrentes da integração na rede de distribuição do concedente.
Por último, diremos que, o contrato de concessão comercial é caraterizado por uma relação de estabilidade, duradoura, não sendo celebrado apenas para uma situação pontual de revenda.
Assim, feita a análise das quatro notas essenciais que caraterizam o contrato de concessão comercial, diremos que, este contrato distingue-se claramente do contrato de mediação, desde logo, pelo facto de este ter como nota caraterizadora a ocasionalidade, enquanto aquele se carateriza por uma relação contratual estável e duradoura.
Acresce que, como se disse a propósito dos contratos de mediação e de agência, também o contrato de concessão comercial é um contrato oneroso.
Contudo, ao contrário do contrato de mediação, no âmbito do contrato de concessão comercial o concessionário adquire os produtos que depois revende, sendo a sua contrapartida económica a diferença entre o preço por que compra os produtos e o preço por que os revende.
Contrato de franquia:
O contrato de franquia tem sido definido como “o contrato pelo qual um empresário – o franquiador – concede a outro empresário – o franquiado – o direito de exploração e fruição da sua imagem empresarial e respetivos bens imateriais (mormente a marca), no âmbito da rede de distribuição integrada do primeiro, de forma estável e a troco de uma retribuição”92.
Têm sido apontadas quatro caraterísticas essenciais desta figura contratual: a fruição da imagem empresarial do franquiador, a transmissão do “Know-how” e assistência técnica, o controlo e fiscalização do franquiado e a onerosidade93.
A propósito das referidas caraterísticas, o franquiado tem um direito/dever de utilizar a imagem empresarial externa do franquiador, como estando integrado numa rede deste, sendo para tal necessário que o franquiador transmita ao franquiado o seu “saber- fazer”, bem como que lhe forneça assistência técnica. Como forma de proteger e conservar
92 Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 452-3.
93 Xxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 454.
a imagem comercial do franquiador, o franquiado tem de se sujeitar ao controlo e fiscalização por parte do franquiador da sua atividade.
Á semelhança dos demais contratos congéneres já analisados o contrato de franquia é um contrato oneroso, pois em contrapartida das prestações do franquiador, o franquiado fica vinculado ao pagamento de uma prestação inicial e fixa e prestações periódicas proporcionais ao volume de negócios (chamadas “royalties”).
Ora, tal como se disse a propósito da concessão comercial, o contrato de franquia distingue-se claramente do contrato de mediação, desde logo, porque no primeiro se estabelece uma relação orgânica e duradoura entre as partes, pois, o franquiado está sujeito à fiscalização do franquiador, sendo a relação duradoura. Diferentemente, no contrato de mediação imobiliária a nota caraterística é a ocasionalidade.
Contrato de mandato:
O mandato é o “contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais atos jurídicos, por conta da outra” (artigo 1157º do Código Civil).
São essencialmente dois os elementos que caraterizam o contrato de mandato: a obrigação de praticar um ou mais atos jurídicos e a atuação do mandatário por conta do mandante.
Diremos que só os atos jurídicos podem ser objeto deste tipo contratual, e não os atos materiais ou intelectuais, sendo que, os mesmos são praticados pelo mandatário que atua por conta do mandante.
O artigo 1158º, n º 1 do Código Civil estabelece uma presunção de gratuitidade do mandato. Contudo, nas situações em que o mandante pratique atos próprios da sua profissão no exercício desse mandato, tal presunção cede perante uma presunção de onerosidade.
Face aos elementos caraterizadores do contrato de mandato diremos que o mesmo se afasta do contrato de mediação, desde logo, pelo facto de no contrato de mandato o mandatário atuar por conta do mandante e no contrato de mediação o mediador atuar, embora no interesse do cliente, por conta própria.
Parte I
Celebração do contrato de mediação imobiliária.
A forma do contrato:
Desde o DL 285/92 de 19 de dezembro, que passou a existir uma imposição legal de forma escrita, para o contrato de mediação imobiliária. Tal imposição passou para os regimes jurídicos subsequentes (DL 77/99 DL 211/2004 e 69/2011), mantendo-se no regime jurídico em vigor, no seu artigo 16º, n º1 o qual refere que “O contrato de mediação imobiliária é obrigatoriamente reduzido a escrito”. É um requisito ad substantiam.
Afigura-se-nos que tal exigência de forma é requisito de validade do contrato, tanto mais que a inobservância da mesma determina a nulidade do contrato nos termos do artigo 16º, n º 5 da Lei 15/2013, nulidade esta, não invocável pelo mediador.
Além da forma escrita, o contrato de mediação é muitas vezes elaborado, com recurso a cláusulas contratuais gerais, cuja legitimidade da sua utilização se mostra dependente da validação dos respetivos projetos pela Direção Geral do Consumidor (artigo 16º, n º4 da lei 15/2013).
Sem dúvida que, a maioria dos contratos de mediação imobiliária que se celebram no dia a dia, são contratos de adesão, pré-elaborados por empresas de mediação, estando, por isso, sujeitos, além do mais à Lei das cláusulas contratuais gerais.
Os regimes anteriores, designadamente os DL 285/9294, DL 77/9995 e DL 211/000000, não continham a exigência de validação, introduzida pela Lei 15/2013, limitando-se a exigir que a mediadora enviasse cópia dos projetos de contratos com uso de tais cláusulas à Direção Geral do Consumidor ou organismos de tutela dos interesses dos consumidores.
A validação abstrata agora introduzida pela Lei 15/2013, não afasta ainda a eventual necessidade de apreciar judicialmente a validade dessas cláusulas, seja através de uma ação inibitória, seja após a sua inserção em contratos, passando tais cláusulas a estar sujeitas ao regime dos contratos de adesão e cláusulas contratuais gerais, previsto pelo DL
94 Dispunha o artigo 10º, n º4 que “Tratando-se de contratos com uso de cláusulas contratuais gerais, o mediador imobiliário deve enviar cópia dos respetivos projetos ao CMOPP e ao Instituto Nacional de Defesa do Consumidor”.
95 Dispunha o artigo 20º, n º 6 que “Tratando-se de contratos com uso de cláusulas contratuais gerais, a empresa de mediação deve enviar cópia dos respetivos projetos ao IMOPPI e ao Instituto do Consumidor”.
96 Dispunha o artigo 19º, n º 7 “Tratando-se de contratos com uso de cláusulas contratuais gerais, a empresa de mediação deve enviar a cópia dos respetivos projetos ao Instituto do Consumidor”.
446/85 de 25 de outubro, alterado pelos DL 220/95 de 31 de agosto, 249/99 de 7 de julho e 323/2001 de 17 de dezembro.
Menções obrigatórias do contrato:
A exigência de forma escrita a partir do DL 285/92, acarretou também a exigência de que do contrato constem determinados elementos, sendo que, tais elementos têm vindo a sofrer alterações consoante os regimes jurídicos que foram sendo introduzidos.
A Lei 15/2013, no seu artigo 16º, n º2 elenca as diversas menções obrigatórias:
“a) A identificação das caraterísticas do bem imóvel que constitui objeto material do contrato, com especificação de todos os ónus e encargos que sobre ele recaiam;
b) A identificação do negócio visado pelo exercício da mediação;
c) As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável;
d) A identificação do seguro de responsabilidade civil ou da garantia financeira ou instrumento equivalente previsto no artigo 7º com indicação da apólice e entidade seguradora ou, quando aplicável, do capital garantido;
e) A identificação do angariador imobiliário que, eventualmente, tenha colaborado na preparação do contrato;
f) A identificação discriminada de eventuais serviços acessórios a prestar pela empresa;
g) A referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente”.
As quatro primeiras alíneas respeitam a elementos obrigatórios do contrato de mediação imobiliária e as três últimas, são elementos eventuais, pois só devem constar do contrato, na eventualidade de ter havido a colaboração de angariador e de terem sido acordados serviços acessórios a prestar ou regime de exclusividade.
O regime da exclusividade e os seus efeitos:
O regime de exclusividade quando acordado, tem de constar obrigatoriamente do contrato de mediação, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem para ambas as partes do contrato de mediação (alínea g) do artigo 16º da Lei 15/2013).
O atual regime de exclusividade aproxima-se dos anteriores regimes na parte respeitante à obrigatoriedade de o mesmo constar do contrato de mediação (artigo 20º, n º4 do DL 77/99 e 19º, n º 5 do DL 211/2004), mas distancia-se do previsto pelos anteriores diplomas, designadamente, pelo DL 77/99, DL 211/2004 e alterações introduzidas pelo DL 69/2011, no tocante ao âmbito desse regime.
O DL 77/99 introduziu o regime de exclusividade, no artigo 20º n º 3, prevendo que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação, durante o respetivo período de vigência”.
Os regimes jurídicos subsequentes97 até à Lei 15/2013 mantiveram tal redação.
Durante a vigência dos referidos diplomas, a questão que se começou a levantar, foi a de saber se tal cláusula de exclusividade apenas visava afastar a concorrência de outras mediadoras ou se também visava impedir o cliente de celebrar o contrato visado com um interessado por si diretamente encontrado.
Quanto à suscitada questão é possível encontrar duas posições que têm sido sufragadas.
Uma posição98 que defende que a cláusula de exclusividade impede a contratação de outras mediadoras e também a promoção direta do cliente, mas não impede o cliente de aceitar propostas que espontaneamente lhe sejam feitas por clientes.
97 DL 211/2004 de 20 de agosto e DL 69/2011 de 15 de junho.
98 Neste sentido, vejam-se entre outros os seguintes arestos: O Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20/04/2010, proferido no âmbito do Pº 7180/08.5TBBRG.G1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual sumaria “1. No contrato de mediação imobiliária, o regime de exclusividade visa proteger o interesse da empresa mediadora em só ela diligenciar no sentido de realização do negócio intencionado, de modo a garantir a correspondente remuneração. 2. Essa exclusividade visa, antes de mais, afastar a intermediação de qualquer outra mediadora. 3. Sempre que essa exclusividade se reporta apenas ao direito de promover o negócio intencionado, a mesma tem de ser interpretada restritivamente, no sentido de mediação exclusiva ou intermediação exclusiva. 4. Nesse caso, o comitente não pode diligenciar no sentido de angariar por si, interessados no negócio, mas não fica inibido de aceitar qualquer proposta que lhe seja apresentada por alguém que espontaneamente se lhe dirija”; Xxxxxxx do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/02/2014, proferido, no âmbito do Pº 704/12.5T20BR.C1, disponível, in, www.dgsi, o qual além de citar na sua fundamentação o Acórdão da Relação de Guimarães acima referido, sumaria que “A previsão contida no n º 4 do artigo 18º do DL 211/2004 de 20/08 não afasta a possibilidade do comitente negociar diretamente com o interessado que o “descobre” e que lhe apresenta uma proposta negocial, exceto se existir estipulação contratual em contrário”; e o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 05/11/2015, proferido no âmbito do Pº 7120/13.0TBSTB.E1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual sumaria que “No contrato de mediação imobiliária o alcance da norma do n º4 do artigo 19º do DL 211/2004 de 20/08 em conjugação com a norma do artigo 18º, n º2 al. a) do mesmo diploma não afasta a possibilidade do comitente aceitar negócio que diretamente lhe for proposto por interessado não angariado pela mediadora”.
Outra posição99, que sustenta que a cláusula de exclusividade impede a contratação de outras mediadoras, mas não impede o próprio cliente de procurar interessados no negócio pretendido. A este propósito Menezes Cordeiro100 refere que, “A cláusula de exclusividade poderá ainda ser reforçada quando, além de não recorrer a outros intermediários, o comitente se obrigue também a não descobrir, ele próprio, um terceiro interessado. Nada disso se presume: deverá ser clausulado e, havendo dúvidas, provado por quem tenha interesse na situação considerada”101.
Tendo por base as duas posições elencadas, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx distingue dentro do regime da exclusividade dois tipos de exclusividade: a simples e a reforçada. Assim, a referida autora refere que “são cláusulas de exclusividade, aquelas pelas quais as partes estabelecem que o comitente não poderá celebrar com outro mediador um contrato que tenha por objeto o mesmo negócio (exclusividade simples), ou ainda aquelas pelas quais se prevê também que o comitente não poderá ele próprio procurar um terceiro interessado no negócio (exclusividade reforçada)”102.
A mesma autora, à semelhança de Xxxxxxx Cordeiro, entende que quando do teor do contrato não resulte o alcance da cláusula de exclusividade estipulada, na dúvida devemos entender que se está perante uma exclusividade simples.
A Lei 15/2013 afastou-se da referida redação passando a estabelecer que os efeitos da cláusula de exclusividade devem ser previstos pelas partes no contrato, sob pena de ser
99 Neste sentido vejam-se, entre outros, os seguintes arestos: Acórdão da Relação do Porto de 01/07/2014, proferido no âmbito do Pº 19005/12.2YIPRT, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual sumaria que “A celebração de um contrato de mediação em regime de exclusividade só impede o cliente de proceder diretamente por si próprio e sem intermediação daquele à venda do imóvel, se tal for acordado pelas partes”; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 03/04/2014, proferido no âmbito do processo 247773/11.9YIPRT, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual sumaria que “Sendo esse contrato de exclusividade, o cliente fica impedido de contratar outra mediadora para promoção do mesmo negócio durante o período em que vigora o exclusivo, mas não de negociar diretamente com algum interessado que se lhe apresente sem ser por intermédio da mediadora, nem obrigada a contratar apenas com interessados indicados por esta” e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 04/06/2013, proferido no âmbito do Pº 1264/12.2 TBBCL.G1, o qual sumaria que “O regime de exclusividade, sendo inequívoco que visa afastar a concorrência impedindo a celebração de contrato de mediação com outra mediadora, durante o período de vigência do contrato, não deve ser entendido em termos tão absolutos que limite a liberdade do próprio comitente procurar interessados no negócio pretendido (…)”.
100 O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 549.
101 No mesmo sentido, parece integrar-se a posição de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, obra citada, p. 212, o qual refere que “A estipulação de uma cláusula de exclusividade deverá constar expressamente do texto contratual, tendo por efeito excluir o recurso a outro(s) mediador(s), para o negócio visado, durante a vigência do contrato”.
102 Obra citada, p. 104.
considerado nulo tal contrato, sem prejuízo da sua conversão num contrato de mediação simples nos termos do disposto no artigo 293º103 do Código Civil.
Não obstante, esta alteração introduzida pela Lei 15/2013, tal não afasta a possibilidade de as partes na concretização de tal regime incluírem uma cláusula com redação semelhante à prevista no anterior artigo 19º n º 4 do DL 211/2004 de 20 de agosto, mantendo inteira validade as posições acima elencadas, no tocante à interpretação dessa cláusula.
Relativamente às referidas posições, a posição aqui sufragada vai de encontro à possibilidade de o cliente poder procurar interessado, a coberto da liberdade contratual, sem contudo afastar a possibilidade de as partes poderem acordar em sentido contrário.
Contudo, tal possibilidade não afasta a necessidade “do cumprimento pelo cliente do seu dever de informar previamente a mediadora exclusiva da sua intenção de celebrar contrato com pessoa por si diretamente encontrada e de se assegurar que tal pessoa não chegou a si graças à atividade da mediadora”104.
O prazo do contrato:
O artigo 16º, n º 3 da Lei 15/2013 estabelece que “Quando o contrato for omisso quanto ao respetivo prazo de duração, considera-se celebrado por um período de seis meses”.
Diferentemente da falta de forma prevista no n º1, das menções obrigatórias previstas no nº 2 e da utilização de cláusulas contratuais gerais não validadas, a omissão das partes no tocante ao prazo de duração do contrato, não acarreta a nulidade do contrato, em termos semelhantes aos previstos no n º5 do artigo 16º, tendo o legislador criado uma regra supletiva, para a omissão das partes.
O DL 211/2004 já previa tal omissão do mesmo modo do atual artigo 16º, n º3 no anterior artigo 19º, n º3 daquele diploma.
103 Estabelece o artigo 293º do Código Civil que “O negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade”.
104 Higina Orvalho Castelo, RJAMI Anotado, 2015, p. 99.
Contudo, na vigência dos diplomas anteriores a estes, designadamente do DL 285/92105 e 77/99106, a estipulação do prazo era um elemento obrigatório do contrato, gerando a sua omissão uma nulidade do contrato.
Relativamente às consequências da estipulação de um prazo contratual diremos que existem divergências, as quais se prendem, desde logo, com o objetivo proposto neste trabalho de saber se o contrato de mediação pode ou não ser livremente revogável por uma das partes.
Assim, há quem defenda que, “a existência de um prazo contratual tem como consequência que não possa ser posto termo ao contrato antecipadamente por declaração discricionária de uma das partes”107. Os defensores desta posição, argumentam que tal decorre do princípio basilar pacta sunt servanda, positivado no artigo 406º do Código Civil.
Contudo, também há quem defenda que o contrato de mediação imobiliária é livremente revogável, entendendo-se tal faculdade em moldes semelhantes à possibilidade de cessação por declaração unilateral e discricionária prevista no regime jurídico do contrato de mandato. Os defensores desta posição, baseiam-se, por um lado, na liberdade do cliente de celebrar ou não o contrato visado, sendo livre de desistir dessa celebração, sem que tal lhe possa acarretar qualquer responsabilidade; por outro lado, na aplicação extensiva do regime do mandato ao contrato de mediação, na medida em que a este será aplicável a título subsidiário, no que, não esteja expressamente previsto o regime previsto para os contratos análogos, como a prestação de serviços, sendo que este remete para o regime do mandato.
Este tema será objeto de maior desenvolvimento a propósito da revogação unilateral do contrato.
000 Xxxxxxxxxx o artigo 10º, n º2 al. d) que “Do contrato constam obrigatoriamente as seguintes menções: (…)
d) Prazo de duração do contrato” e o n º 6 que “A omissão da forma legalmente prescrita, bem como do disposto no n º 4, gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela entidade mediadora”.
000 Xxxxxxxxxx o artigo 00x, x x0 xx. x) que “Do contrato constam obrigatoriamente os seguintes elementos: (…) g) O prazo de duração do contrato;” e o n º 8 que “O incumprimento do disposto nos n º 1, 2 e 6 do presente artigo gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela entidade mediadora.
107 Higina Orvalho Castelo, RJAMI, Xxxxxxx, p. 102.
A inobservância do disposto nos n º1, 2 e 4 do artigo 16º da Lei 15/2013:
O artigo 16º, n 5 da lei 15/2013, estabelece que “O incumprimento do disposto nos n º 1, 2 e 4 do presente artigo determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação”.
Depois de prever a exigência de forma, as menções obrigatórias e as condições de recurso a cláusulas contratuais gerais, o legislador estabeleceu consequências para a inobservância de tais exigências, sendo a mesma geradora da nulidade do contrato, mas não invocável pela empresa de mediação.
Os regimes anteriores, designadamente o DL 285/92, DL 77/99 e DL 211/2004 já previam uma consequência semelhante, à do atual regime, a qual foi mantida na Lei 15/2013.
Desde o DL 285/92 que a jurisprudência de forma unânime tem reconhecido esta nulidade como atípica ou sui generis, à qual não corresponde na íntegra o regime geral previsto no Código Civil, para o negócio jurídico nulo.
A invulgaridade deste regime levanta algumas questões, desde logo, a de saber quem pode invocar tal nulidade, pois o normativo que prevê a mesma, afasta a possibilidade de invocação pela empresa de mediação.
Há quem defenda que pode ser invocada por qualquer interessado com exceção da empresa de mediação e deve também ser conhecida oficiosamente pelo tribunal. Sufragam este entendimento, entre outros, Higina Xxxxxxx Xxxxxxx, a qual refere que “O teor literal da norma e a sua conjugação com a regra do artigo 286º do Código Civil conduzem a que a nulidade possa ser invocada por qualquer interessado, com exceção da empresa de mediação, e a que deva também ser conhecida oficiosamente pelo tribunal”108. Também, neste sentido, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx, o qual refere que se está perante uma invalidade mista, cuja “ratio legis aponta claramente, para a defesa dos interesses do comitente/consumidor, embora – na ausência de indicação legal em contrário – a invalidade possa ser invocada por terceiros ou conhecida oficiosamente”109.
Contudo, a maioria das decisões judiciais, defendem que apenas o cliente pode invocar tal invalidade. Neste sentido, vejam-se entre outros, o Acórdão do STJ de 03/04/2008, proferido no âmbito do Pº 07B4498110, o qual sumaria que “(…) A
108 RJAMI, p. 108.
109 Obra citada, p. 211.
110 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
inobservância da forma escrita ou a não inserção dessas menções fere de nulidade o contrato – uma nulidade atípica, que só pode ser invocada pelo cliente da entidade mediadora, não o podendo ser por esta nem conhecida oficiosamente (…)”111. Como refere Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx “A não possibilidade da nulidade ser declarada ex officio visa evitar que a parte mais forte, presumivelmente causadora da nulidade (a empresa mediadora), pudesse beneficiar com essa declaração (o prejudicado seria a parte em cujo favor a nulidade é estabelecida)”112.
Acrescente-se que, para quem defende esta posição de que tal nulidade só é invocável, não podendo ser conhecida oficiosamente, o contrato manter-se-á válido enquanto tal nulidade não for invocada por quem o possa ser, mesmo que ferido de vício formal. A este propósito o Acórdão do STJ de 31/03/2004, Revista 647/04, 6ª Secção, refere que, “O contrato de mediação imobiliária tem de ser reduzido à forma escrita, sem o que enferma de nulidade. Esta não pode ser invocada pelo mediador nem conhecida oficiosamente, pelo que, se o comitente também não a invocar, o contrato, embora meramente verbal, permanece válido”113.
Dúvidas não existem, quanto ao facto de, seja qual for a posição que se assuma (de conhecimento oficioso do tribunal ou de conhecimento por invocação de terceiros) a mesma não poderá conduzir a que haja um aproveitamento dessa invocação por parte da empresa de mediação, sob pena de tal situação se poder reconduzir a um abuso na sua invocação, sendo contrária à boa fé, sendo necessário, nesse caso a afirmação da validade do contrato114.
Outra questão que este regime levanta é a de saber que consequência tem esta nulidade na contraprestação quando o contrato visado seja efetivamente celebrado na sequência da atividade do mediador.
Também no tocante a esta questão não existe unanimidade, pois, há quem defenda que tal compensação, deve corresponder ao valor dos serviços que em concreto o mediador
111 No mesmo sentido, vejam-se ainda, os seguintes arestos: o Acórdão do STJ de 10/04/2008, proferido no Pº 52/2008, 2ª Secção, disponível, in, xxx.xxxx.xx; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27/02/2007, proferido no Pº 10818/2006-7, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/03/2014, proferido no Pº 292391/11.7YIPRT.C1, todos disponíveis, in, xxx.xxxx.xx e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16/10/2007, proferido no Pº 408/05.5TBCTB.C1, in, XX 2007, IV, p. 33.
112 O contrato de mediação imobiliária na prática judicial, p. 29.
113 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
tiver prestado, nos termos do disposto no artigo 289º do Código Civil. Situam-se nesta posição, Xxxxxx Xxxxx Xxxx e Xxxxx Xxxxxx Xxxxx000, os quais referem que “no caso de haver celebração de um contrato de mediação imobiliária sem sujeição à forma escrita e de cuja execução resultem vantagens para o cliente da sociedade de mediação (interessado), vantagens que decorram do integral cumprimento, por esta, do contrato celebrado, apesar da sua nulidade, nesta especifica hipótese, é certo, que através do próprio instituto do enriquecimento sem causa, sempre a sociedade prestadora de tais serviços deverá ser ressarcida pela sua prestação. Milita decisivamente neste sentido o disposto no artigo 289º do C.C.”116.
Outros defendem que a compensação deve corresponder à remuneração acordada117. Sufraga este entendimento Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, o qual refere que, “Parece-nos que esta última posição é a mais correta: afinal não sendo possível restituir a prestação de facto positiva (“tudo o que tiver sido prestado”), o critério para encontrar o
115 Obra citada, p. 84.
116 No mesmo sentido, vejam-se, entre outros: o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 06/03/2012, proferido no Pº 2372/10.0TJCBR.C1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, refere que “Tendo o contrato de mediação imobiliária celebrado entre as partes sido declarado nulo, a ré tem que restituir ao autor os € 8 000 000,00 que dele recebeu a título de remuneração pelos serviços que lhe prestou e este que restituir àquela o valor dos serviços de mediação imobiliária que, de facto, foram prestados”; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09/06/2005, proferido no Pº 4801/2005-6, disponível, in, xxx.xxxx.xx, refere que “o contrato de mediação deve obrigatoriamente ser reduzido a escrito, devendo dele constar os atos a praticar pelo mediador, bem como a contrapartida. Se o contrato não tiver sido escrito é nulo por falta de forma. Porém, quando a falta de forma não for imputável ao mediador, este tem direito a receber em contrapartida, o valor correspondente ao trabalho desenvolvido pela mediação. Estando provado que a mediadora prestou serviços de mediação, aproximando o promitente comprador do promitente vendedor, interessado e beneficiário da mediação, serviços ou tarefas que não lhe podem ser devolvidos, como consequência da declaração de nulidade do contrato, ter-lhe-á de ser pago o valor correspondente calculado equitativamente de forma justa e equilibrada. Se assim não fosse, estava estabelecido um convite ao incumprimento e à fraude generalizada neste tipo de contratos; e o Acórdão da Relação de Lisboa de 07/10/2003, proferido no Pº 2165/2003-7, disponível in, xxx.xxxx.xx.
117 Neste sentido, vejam-se entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/11/2011, proferido no Pº 1634/05.2TCSNT.L1-7, disponível in xxx.xxxx.xx, refere que “É nulo o contrato de mediação em que as partes omitiram a identificação determinada pelo artigo 20º, n º2 al. h) do DL 77/99 de 16 de março devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente, nos termos do artigo 289º, n º1 do Código Civil. Tratando-se de uma prestação de atividade, a sua restituição in natura não é possível devendo ser restituído o valor correspondente. Tendo a mediadora desenvolvido toda a atividade a que se tinha obrigado, fazendo-o com sucesso uma vez que a mesma conduziu à celebração de um contrato-promessa com entrega, efetiva, de uma quantia a título de sinal, a remuneração acordada entre as partes é a única quantia que, de forma objetiva, se pode reconduzir ao conceito de valor correspondente”; o Acórdão do STJ de 19/04/2012, Revista n º 1634/05.2TCSNT.L1.S1-2ª Secção, disponível, in, xxx.xxxx.xx , refere que “Tendo o mediador prestado toda a atividade a que se obrigou e sendo declarada a nulidade do contrato, nos termos do artigo 289º, n º1 do CC, não sendo possível restituir a prestação de facto positiva, o critério para encontrar o valor a restituir é o da retribuição que foi acordada pelas partes”. No mesmo sentido, vejam-se ainda, entre outros, o Acórdão do STJ de 20/04/2004, proferido no Pº 04A800, disponível, in, xxx.xxxx.xx e o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 03/12/2008, in, XX, 2008, V, p. 254.
valor a restituir deverá ser o da retribuição/comissão que foi acordada pelas partes contratantes, pois parece ser a única quantia que, de forma objetiva, se poderá reconduzir ao conceito de valor correspondente”.
Não se pode deixar de referir que, a declaração de nulidade do contrato de mediação imobiliária, não poderá acarretar o recebimento de qualquer quantia por parte da empresa mediadora, se a mesma não tivesse direito a ela caso o contrato fosse válido. A tal propósito refere o Acórdão do STJ de 03/04/2008, Revista n º 4498/07, 2ª Secção118, que “Sendo nulo o contrato de mediação imobiliária, não há lugar a qualquer pagamento à mediadora se for de concluir que, ainda que não tivesse ocorrido a causa de nulidade, não havia lugar a remuneração, em consequência de a atividade desenvolvida pela mediadora no âmbito do contrato, não ter tido, para o comitente, no caso concreto qualquer significado ou valor económico”119.
Anote-se que se a atividade da mediadora conduzir à celebração do negócio visado e este ulteriormente vier a ser declarado nulo, esta declaração de nulidade do negócio visado não pode afetar a validade do contrato de mediação, nem o direito à remuneração pela mediadora. Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20/01/2011, proferido no âmbito do Pº 5237/04 YXLSB.L1-8120, refere que, “(…) tendo a mediadora desenvolvido todos os atos necessários à celebração do negócio e vindo este a ser celebrado, sem que contudo os respetivos contraentes tenham observado os requisitos formais do mesmo (reconhecimento notarial das assinaturas) a subsequente declaração de nulidade do negócio não pode afetar o direito da mediadora à comissão. A mediadora não tem de intervir na celebração do negócio nem lhe compete definir os termos acordados pelos contraentes, incluindo a observância de requisitos formais”.
Já no tocante ao contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade ainda se levantam outras questões, pois o artigo 16º, n º 5 da Lei 15/2013 comina com a nulidade do contrato o incumprimento do disposto no artigo 16º, n º 2, al. g) do mesmo diploma, o qual estabelece que do contrato deve constar obrigatoriamente “a referência ao
118 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
120 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente”.
Ora, da aludida alínea g) resultam duas menções obrigatórias: por um lado a referência ao regime de exclusividade, quando acordado; por outro lado, a especificação dos efeitos que desse regime decorrem para as partes.
Os regimes anteriores, previstos pelo DL 77/99121 e pelo DL 211/0000000, previam, por um lado a abrangência do regime de exclusividade e por outro lado, exigência de que, quando o mesmo fosse estipulado constasse expressamente do contrato de mediação.
Diferentemente a Lei 15/2013 deixou de fazer referência à abrangência do regime de exclusividade, deixando assim de referir que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência”.
Certamente com tal alteração o que o legislador pretendeu foi deixar às partes a inteira responsabilidade de definir tal abrangência. Contudo, quando as partes sejam omissas a tal propósito as questões já tratadas a propósito do regime de exclusividade mantêm aqui inteira validade.
Assim, de entre as várias questões que se podem suscitar a propósito das invalidades do contrato de mediação com regime de exclusividade, uma que, se levanta é a de saber se o contrato de mediação reduzido a escrito, sem conter cláusula de exclusividade escrita, mas apenas verbal se o mesmo é inválido. O que parece fazer sentido, através do recurso ao artigo 221º do Código Civil é a conversão (ao abrigo do disposto no artigo 293º do Código Civil) do contrato, num contrato de mediação imobiliária simples, valendo, sem a cláusula de exclusividade, atenta a sua nulidade por inobservância de forma.
Contudo, tal entendimento já não será válido no caso de constar do contrato de mediação uma cláusula relativa ao regime de exclusividade, sendo o mesmo omisso quanto
121 Estabelecia o artigo 20º, n º 3 que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação, durante o respetivo período de vigência” e o n º 4 que “A consagração do regime de exclusividade, quando exista, terá de constar de expressamente do contrato de mediação imobiliária”.
122 Estabelecia o artigo 19º, n º 4 que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação, durante o respetivo período de vigência” e o n º 5 que “A consagração do regime de exclusividade, quando exista, terá de constar de expressamente do contrato de mediação imobiliária”.
aos efeitos do mesmo para as partes, pois neste caso terá de se considerar nulo nos termos do n º 5 do artigo 16º.
Por último, pode ainda acontecer que tal regime tenha sido previsto no contrato, mas de forma deficiente, sendo que, nesta situação, não haverá lugar à nulidade do contrato, mas antes à interpretação da vontade das partes.
Os sujeitos do contrato de mediação imobiliária:
a. Empresa de mediação imobiliária:
Antes de analisar o conteúdo da prestação da mediadora, necessário se torna saber quem pode desenvolver a atividade de mediação imobiliária, figurando no contrato como sujeito.
O artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013 define a atividade de mediação imobiliária referindo-se ao exercício da mesma por “empresas”. O n º3 do citado normativo refere que “Considera-se empresa de mediação imobiliária a pessoa singular ou coletiva cujo domicílio ou sede se situe em qualquer Estado do Espaço Económico Europeu e, sendo pessoa coletiva, tenha sido constituída ao abrigo da lei de qualquer desses Estados e se dedique à atividade de mediação imobiliária.
Por sua vez, o artigo 3º, n º1 do mesmo diploma estabelece que “A atividade de mediação imobiliária só pode ser exercida em território nacional por empresas de mediação imobiliária (…)”.
O termo “empresa” poderia inculcar a ideia de que em causa estaria apenas uma pessoa coletiva à semelhança do que sucedia nos regimes estabelecidos pelos DL 77/99123 e 211/0000000, pois tal termo é utilizado ao longo de todo o diploma.
Contudo, como esclarece o n º3 do artigo 2º “empresa” significa, tão somente uma pessoa jurídica que tanto pode ser singular como coletiva, mas com determinadas caraterísticas.
Anote-se que, o conceito de empresa tem sido objeto de diversos estudos jurídicos, nos quais, além do mais se visa encontrar uma definição para tal conceito. Assim,
123 Da conjugação dos artigos 2º, 3º, n º1 e 5º, n º1 alínea a) todos do DL 77/99 resultava que as empresas de mediação imobiliária tinham de assumir obrigatoriamente a forma societária ou outra forma de cooperação de sociedades.
124 Da conjugação dos artigos 2º, n º 1, 3º, n º 1 e 6º, n º 1, al. a) todos do DL 211/2004 resultava que as empresas de mediação imobiliária tinham de assumir obrigatoriamente a forma societária ou outra forma de agrupamento de sociedades.
Xxxxxxxx xx Xxxxx, refere que “(…) a empresa ou estabelecimento comercial é uma unidade jurídica fundada em organização de meios que constitui um instrumento de exercício relativamente estável e autónomo de uma atividade comercial”125. O mesmo autor refere ainda que, “Se não é possível um conceito genérico de empresa, já um conceito geral de empresa em sentido objetivo – compreendendo empresas comerciais e não comerciais, de pessoas ou grupos de pessoas singulares e de pessoas coletivas públicas, privadas, etc – é possível (…) podemos, então dizer que empresa em sentido objetivo é a unidade jurídica fundada em organização de meios que constitui um instrumento de exercício relativamente estável e autónomo de uma atividade de produção para a troca”126.
Também Menezes Cordeiro refere que “A comercialística de diversos quadrantes aceita hoje que a empresa não é nem uma pessoal coletiva, nem um conjunto de elementos materiais. Podemos entendê-la como um conjunto concatenado de meios materiais e humanos, dotados de uma especial organização e de uma direção, de modo a desenvolver uma atividade segundo regras de racionalidade económica”127.
Dúvidas não restam que, a atividade de mediação deve ser desenvolvida por uma empresa de mediação imobiliária nos termos acima expostos. Quid júris, se a atividade for desenvolvida por uma pessoa-não empresa? A esta questão tem sido respondido que “a qualidade de um dos sujeitos como pessoa, singular ou coletiva, qualificável como empresa é, no âmbito do RJAMI, um elemento conformador do tipo legal de contrato de mediação imobiliária. O RJAMI visa regular a atividade de mediação imobiliária exercida empresarialmente e contém um conjunto de regras que regulam os contratos que suportam essa atividade, mas não proíbe a celebração de contratos, necessariamente excecionais e ocasionais, nos quais as prestações das partes são idênticas às dos contratos que regula, quando praticados por pessoas que não são empresas. Tais contratos são legalmente atípicos, podendo justificar-se a aplicação analógica entre o caso concreto e o caso genérico para o qual foi ditada a regra do RJAMI que se pense aplicar-lhe”128 129.
125 Obra citada, p. 217-8.
126 Obra citada, p. 243.
127 Direito Comercial, 4ª edição, p. 324.
128 Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015, p. 60.
129 No mesmo sentido, Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, O contrato de Mediação Imobiliária na prática judicial,
p. 35, o qual refere que “Ora, atendendo, de facto, à definição de atividade de mediação que o artigo 2º da Lei n º 15/2013 nos dá (… consiste na procura, por parte das empresas…), a um contrato celebrado por quem não seja … empresa sempre faltaria um elemento essencial à qualificação do contrato. É que a qualificação do
Acresce que, a Lei 15/2013 estabelece várias exigências no tocante ao exercício da atividade de mediação pelas empresas mediadoras, as quais se prendem, desde logo, com questões de licenciamento necessárias ao exercício de tal atividade.
Estabelece ainda, o artigo 4º, n º 1, da Lei 15/2013 o exercício da atividade de mediação imobiliária por prestador individual ou coletivo estabelecido em território nacional depende de licença a conceder pelo InCI130.
Para que tal licenciamento ocorra torna-se necessário que estejam preenchidos os seguintes requisitos: a) que a empresa tenha idoneidade comercial e, b) que seja detentora de seguro de responsabilidade civil (artigos 5º, 6º e 7º todos da Lei 15/2013).
A licença para o exercício da atividade de mediação imobiliária tem eficácia ilimitada no tempo, sem prejuízo da caducidade das licenças por incumprimento dos requisitos exigidos no artigo 5º, nos termos do artigo 9º, da sua suspensão ou cancelamento nos termos dos artigos 10º e 11º (artigo 4º, n º 3 do mesmo diploma).
Por sua vez, o artigo 12º do mesmo diploma estabelece que “1 – As empresas de mediação imobiliária cujas licenças ou registos tenham caducado, sido objeto de suspensão ou cancelamento ficam impedidas do exercício da respetiva atividade. 2- A caducidade, a suspensão ou o cancelamento das licenças ou registos determinam: a) O encerramento dos estabelecimentos e postos provisórios afetos à atividade de mediação imobiliária da empresa em território nacional, sob pena de encerramento coercivo pelas autoridades competentes, ficando vedado o exercício da atividade nos respetivos estabelecimentos e postos a partir da data da receção da pertinente notificação; b) A entrega ao InCI dos cartões de identificação dos respetivos representantes legais por este emitidos, no prazo máximo de oito dias a contar da data da notificação da decisão pertinente, sob pena de apreensão imediata pelas autoridades competentes; c) A caducidade dos contratos de mediação imobiliária em vigor celebrados pela empresa relativos ao exercício da atividade em território nacional”.
sujeito mediador como empresa é um elemento que conforma o tipo legal neste contrato de mediação imobiliária. E, então, teríamos um contrato atípico de mediação imobiliária, mas válido por (livremente) celebrado no âmbito da liberdade contratual (artigo 405º C. Civ), a que se aplicaria, por analogia, o regime previsto para a mediação imobiliária “em tudo quanto tenha a ver com a semelhança em termos de conteúdo”.
130 Os procedimentos administrativos relativos ao licenciamento, ao registo e ao controlo da validade do título detido pelas empresas que se dediquem ao exercício da atividade de mediação imobiliária encontram-se previstos no Regulamento 16/2014, do InCI, publicado no Diário da República, 2ª Série, de 15 de janeiro de 2014.
Da conjugação dos citados normativos, levantam-se outras questões: Quid júris se a atividade for exercida por empresa que não seja de mediação imobiliária? Quid júris se a atividade for exercida por empresa não licenciada ou autorizada?
A resposta às duas questões está intimamente ligada, na medida em que a atividade exercida por empresa que não seja de mediação imobiliária, carecerá também ela de licença ou autorização para o exercício de tal atividade.
Anote-se que, maioritariamente a resposta a estas questões, quer na doutrina, quer na jurisprudência131, tem sido no sentido de que, não obstante a falta de licenciamento e as sanções a que as empresas se possam sujeitar (artigo 32º da Lei 15/2013), o contrato de mediação imobiliária é válido. Xxxxxx Xxxxxxxx, pronuncia-se neste sentido, referindo que “No plano do direito privado, da validade dos atos jurídicos, dos direitos e das obrigações das partes, não interessa esta distinção, nem o facto de terem ou não cumprido os ditames do Dec Lei 43 767 (…) Está em causa, apenas, o aspeto – penal sob o ângulo repressivo (…) A sanção legal está, aliás, de harmonia com os princípios jurídicos, segundo os quais nem toda a infração à lei produz nulidade”132.Também Xxxxxxx Xxxxxxxx, se pronuncia neste sentido, referindo que “na hipótese de surgir um profissional não autorizado: poderá haver sanções contra este mas o contrato de mediação, em si, não é nulo”133. No mesmo sentido, Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, refere que “Anote-se que não é nulo o contrato celebrado por um mediador não autorizado”134.
Diversamente Higina Orvalho Castelo, partindo da análise dos efeitos da caducidade, suspensão e cancelamento das licenças e registos, previstos no artigo 12º da Lei 15/2013, que impõem a cessação do contrato de mediação, conclui que “Ora, se o legislador impõe o termo automático de contratos de mediação imobiliária a partir do momento em que a empresa mediadora fica sem a respetiva licença por caducidade, suspensão ou cancelamento, não me parece que possam celebrar-se contratos de mediação imobiliária válidos por empresas mediadoras não licenciadas. Se os contratos válidos e eficazes, celebrados por empresa licenciada, perdem a sua eficácia a partir do momento em que a empresa perde a licença, por maioria de razão não podem surtir efeitos contratos de
131 Neste sentido, vejam-se, entre outros: o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16/11/1989, proferido no âmbito do Pº 2656, CJ, 1989, V, 116; Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16/10/2007, proferido no Pº 408/05.5TBCTB.C1, CJ 2007, IV, 33 e Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/03/2014, proferido no Pº 292391/11.7YIPRT.C1, disponível, in, xxx.xxxx.xx.
132 Contrato de Mediação, 1964, pp. 82-3.
133O Direito, Ano 139, 2007, III, p. 547.
134 Obra citada, p. 33.
mediação celebrados por empresa não licenciada. A ineficácia total inicial, num contrato celebrado, como começamos por ver, contra disposição legal de caráter imperativo, apenas se compagina com a nulidade”135. Também neste sentido, Xxx Xxxxx, defendeu, no tocante às “leis que regulam o exercício de certas profissões com o fim de garantir o público contra a inidoneidade de quem as exerce”, dizendo que “são nulos os contratos que proporcionam ou favorecem o exercício delas com violação dessas leis”136.
i. Colaboradores de empresas de mediação imobiliária: técnicos e angariadores:
Com a entrada em vigor da Lei 15/2013137, os colaboradores da empresa de mediação passaram a ser designados por técnicos ou angariadores, distinguindo-se uns dos outros pelo conteúdo das suas funções.
Assim, de acordo com o artigo 23º do citado diploma, “são designados por técnicos de mediação imobiliária os colaboradores das empresas de imobiliária que desempenham, em nome destas, as funções de mediação imobiliária referidas nos n º 1, 2 e 4º do artigo 2º”.
Por sua vez, o artigo 24º do mesmo diploma estabelece que “são designados por angariadores imobiliários os colaboradores das empresas de mediação imobiliária que coadjuvam os técnicos referidos no artigo anterior, executando tarefas necessárias à preparação e ao cumprimento dos contratos de mediação imobiliária celebrados pelas mesmas”.
Na vigência do DL 211/2004 o angariador imobiliário tinha que ser um empresário em nome individual, conforme resultava da letra do n º 1 do artigo 4º, que estabelecia que “A atividade de angariação imobiliária é aquela em que, por contrato de prestação de serviços, uma pessoa singular se obriga a desenvolver as ações e a prestar os serviços previstos, respetivamente, nos n º 2 e 3 do artigo 2º, necessários à preparação e ao cumprimento dos contratos de mediação imobiliária, celebrados pelas empresas de mediação imobiliária”.
135 Obra citada, pp. 73-4.
136 Objeto da obrigação – a prestação: suas espécies, conteúdo e requisitos, BMJ 74 (1958) p. 142.
137 Na vigência do DL 211/2004 o artigo 2º, n º 5 e 6 estabeleciam que “5- No âmbito da preparação e do cumprimento dos contratos de mediação imobiliária celerados, as empresas de mediação imobiliária podem ser coadjuvadas por angariadores imobiliários. 6- É expressamente vedado às empresas de mediação celebrar contratos de prestação de serviços com angariadores imobiliários não inscritos no Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário, doravante designado IMOPPI”.
Atualmente a Lei 15/2013, não contempla tal exigência, podendo estabelecer-se uma prestação de serviços ou um contrato de trabalho entre estes colaboradores e a empresa mediadora (artigo 20º, n º1 al. e)).
b. Destinatários:
O artigo 2º, n º 5 da Lei 15/2013, estabelece que “Considera-se destinatário do serviço, para efeitos do número anterior, a pessoa ou entidade que celebra com o cliente da empresa de mediação imobiliária qualquer negócio por esta mediado”.
A referida expressão é utilizada ao longo do diploma, e substituiu a utilizada no diploma anterior138, que consistia na terminologia de interessado.
Como bem refere Higina Orvalho Castelo “a expressão destinatário do serviço designa os terceiros angariados pela empresa de mediação, para o contrato mediado, ou os terceiros que, por alguma forma entram em contato com a empresa de mediação, interessados no contrato que o cliente desta deseja celebrar, mesmo na fase anterior a essa celebração”139.
c. Clientes:
Como resulta da definição prevista no artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013, “A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes (…)”.
O cliente é assim a contraparte no contrato de mediação celebrado entre este a empresa de mediação imobiliária.
O uso do léxico “em nome dos clientes” nas palavras de Higina Orvalho Castelo140 “ (…) não pode ser entendido em sentido jurídico, mas num sentido corrente, ou talvez económico, significando que a atividade se destina à satisfação do interesse do cliente, não sendo, portanto neutra ou imparcial”.
A corroborar o facto de a referida expressão não poder assumir nesta sede um sentido jurídico, temos a distinção acima tratada entre mediação pura e mediação mista. Pois, Xxxxxxx Xxxxxxxx, autor de tal distinção, acaba por referir que, a mediação mista “pode ser uma atuação interessada, no sentido do solicitador ao qual, inclusive, o
138 Artigo 2º, n º 4 al. a) do DL 211/2004 de 20 de agosto.
139 Obra citada, p. 56.
140 Obra citada, pp. 45-9.
mediador poderá estar ligado, institucionalmente ou por contrato, incluindo, até, poderes de representação. Já não será uma verdadeira mediação: podemos falar em mediação imprópria”141.
Também a jurisprudência vai neste sentido, sendo de salientar o Acórdão do STJ de 11/02/2016, proferido no Pº 8727/06.7TBCSC.L1.S1142, o qual sumaria que “I – No âmbito de um contrato de mediação imobiliária, não representando o mediador a parte que o contratou, a conduta por si assumida apenas vinculará o vendedor nos casos em que este lhe tenha atribuído poderes de representação (…)”. No mesmo sentido, o Acórdão do STJ de 15 de fevereiro de 2012, proferido no Pº 5223/05.3TBOER.L1.S1143, refere que “ a sociedade ré, na qualidade de mediadora, nunca pode ser considerada, como sustentam os autores/recorrentes, representante das rés-promitentes vendedoras e não poderia de modo algum, mesmo que houvesse lugar à anulação do contrato-promessa, ser-lhe imposta corresponsabilidade solidária pela restituição do sinal pago”.
Anote-se que, pela caraterização acima levada a cabo do contrato de mediação teremos de concluir que a expressão, apenas poderá ter um significado corrente nos termos descritos por Higina Orvalho Castelo.
O objeto do contrato de mediação imobiliária:
O contrato de mediação tem subjacente a “procura de destinatários” para a realização de negócios que visem a “constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis” (artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013).
O objeto do contrato de mediação imobiliária ao abranger qualquer contrato sobre imóvel tem uma ampla extensão, devendo a mesma constar obrigatoriamente do contrato. Pois, como estabelece o artigo 16º, n º2, al. a) e b) do citado diploma, “do contrato constam obrigatoriamente: a) A identificação das caraterísticas do bem imóvel que constitui o objeto material do contrato, com especificação de todos os ónus e encargos que sobre ele recaiam; b) A identificação do negócio visado pelo exercício da mediação”.
141 Obra citada, p. 541.
142 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
143 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
Face à evolução legislativa da noção de contrato de mediação, também o seu objeto, ou melhor a concretização do mesmo, foi sofrendo desde 1992 até 2013 diversas alterações.
No diploma de 1992144 além dos negócios destinados à compra e venda de bens imobiliários, ou à constituição de quaisquer direitos reais sobre imóveis ainda contemplava o arrendamento.
Com as alterações introduzidas pelo diploma de 1999145, foi aditado ao objeto do contrato de mediação o trespasse.
E, com as alterações introduzidas pelo diploma de 2004146, foram introduzidas ao objeto do contrato de mediação, a permuta e a cessão de posição em contratos cujo objeto seja um bem imóvel.
No tocante ao trespasse, como constata Higina Orvalho Castelo, “a expressão não será a mais feliz, pois o trespasse no direito português, é pacificamente entendido como a transferência definitiva e por ato entre vivos da titularidade de um estabelecimento comercial, paradigmaticamente a sua compra e venda. Por certo, ter-se-á querido contemplar a compra e venda de um estabelecimento que inclua um direito real ou de arrendamento sobre um bem imóvel”147.
A mesma autora defende ainda a possibilidade de ampliação do referido objeto a contratos análogos aos elencados no artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013148.
144 Estabelecia o artigo 2º do DL 285/92 de 19/12 que “Para efeitos do presente diploma entende-se por mediação imobiliária a atividade comercial em que, por contrato, a entidade mediadora se obriga a conseguir interessado para a compra e venda de bens imobiliários ou para a constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos”.
145 Estabelecia o artigo 3º, n º1 do DL 77/99 de 16/03 que “A atividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra ou na venda de bens imóveis ou na constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, bem como para o seu arrendamento e trespasse (…)”.
146 Estabelecia o artigo 2º, n º1 do DL 211/2004 de 20/08 que “A atividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objeto seja um bem imóvel”.
147 Obra citada, p. 50.
148 A propósito, desta possibilidade, diremos que há quem defenda, como Higina Xxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 50, e Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, obra citada, p. 36, a possibilidade de o contrato de mediação imobiliária ter por objeto a cessão da totalidade ou da maioridade das participações sociais de uma sociedade titular de um estabelecimento comercial instalado em imóvel próprio ou arrendado, ou de uma sociedade cujo património seja essencialmente composto por imóveis. Em sentido contrário, veja-se, entre outros, o Acórdão da Relação do Porto de 21/03/2013, Pº 582/12.4TJPRT.P1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, refere que “a cessão de quotas está fora do âmbito da atividade de mediação imobiliária, donde não poder fundamentar um pedido de remuneração por parte do mediador”.
O conteúdo da prestação da mediadora.
A prestação da mediadora é distinta consoante esteja em causa um contrato de mediação imobiliária simples ou um contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade.
Como já salientado a propósito da distinção das duas modalidades de contratos, no caso do contrato de mediação imobiliária simples a mediadora desenvolverá a atividade pretendida pelo cliente, sabendo que só será remunerada se for bem sucedida, isto é, se o cliente vier a celebrar o contrato pretendido. Nesta modalidade, a mediadora não se vincula à prestação, sendo do seu interesse (e do interesse também do cliente) o desenvolvimento da mesma, pois, sem ela o mediador não poderá auferir a almejada remuneração.
Diversamente, no contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, o mediador compromete-se a realizar a prestação, estando obrigado a tal atividade com o propósito de obter interessado no contrato.
No tocante à extensão desta obrigação, a mesma depende da vinculação assumida pela mediadora, designadamente se a mesma se vincula a diligenciar no sentido de encontrar interessado para o negócio (obrigação de meios) ou se se obriga a encontrar esse mesmo interessado (obrigação de resultado).
Só a obtenção de interessado pode constituir o conteúdo da obrigação do mediador, não integrando tal conteúdo a celebração do contrato visado (sendo que, este poderá é ter repercussões na prestação do cliente- remuneração do mediador).
Para o exercício da prestação, a empresa mediadora tem de cumprir deveres para com os clientes e destinatários, os quais se encontram previstos no artigo 17º, n º1 da Lei 15/2013. A empresa de mediação é obrigada a: “a) certificar-se, no momento da celebração do contrato de mediação, que os seus clientes têm capacidade e legitimidade para contratar nos negócios que irá promover; b) certificar-se da correspondência entre as características do imóvel objeto do contrato de mediação e as fornecidas pelos clientes;
c) Propor aos destinatários os negócios de que for encarregada, fazendo uso da maior exatidão e clareza quanto às características, preço e condições de pagamento do imóvel em causa, de modo a não os induzir em erro; d) comunicar imediatamente aos destinatários qualquer facto que possa pôr em causa a concretização do negócio visado”.
Tais deveres como refere Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000 visam, sobretudo proteger, os destinatários, são, por isso, normas de proteção, disposições legais que impõem ou proíbem comportamentos com destino à proteção de interesses alheios à empresa de mediação. O incumprimento de tais deveres, além da responsabilidade civil em que possam incorrer as empresas de mediação imobiliária, nos termos do disposto no artigo 483º e seguintes do Código Civil, também constituem contraordenação, nos termos do disposto no artigo 32º, n º1 al. b) da lei 15/2013.
O conteúdo da prestação do cliente: a remuneração.
A remuneração consiste na contraprestação do cliente, pelos serviços acordados com a empresa de mediação, sendo este elemento essencial do contrato considerando, como já salientado, que o mesmo é oneroso.
Estabelece o artigo 16º, n º2 al. c) da lei 15/2013150 que “Do contrato constam, obrigatoriamente, os seguintes elementos: (…) c) As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da de IVA aplicável (…)”.
Tal como já referido, tal menção é obrigatória e, no caso da sua inobservância o contrato é nulo (artigo 16º, n º5 da Lei 15/2013), apesar de tal nulidade ter as especificidades acima elencadas.
Significa isto, que a retribuição do mediador dependerá das estipulações das partes no tocante ao quantum e ao modo de pagamento.
Alguma jurisprudência tem considerado que a forma de remuneração é um elemento essencial do contrato e não uma cláusula acessória, pelo que, a alteração à forma de remuneração inicialmente acordada ficará sujeita à forma escrita, sob pena de nulidade. Neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ de 31/01/2002, Revista n º 4083/01-7ª Secção151.
Acresce que, a remuneração em princípio é devida pelo cliente, contraparte no contrato de mediação. Contudo, não fica precludida a possibilidade de a empresa mediadora, o cliente e o destinatário, acordarem conjuntamente que a remuneração seja
149 Obra citada, p. 112-3.
150 A este propósito diremos que já na vigência do DL 285/92 de 19/12 o artigo 10º, n º2 al. c) previa como menção obrigatória a “forma de remuneração”. Os diplomas seguintes introduziram as concretizações atualmente correspondentes às do artigo 16º, n º2 al. c) da Lei 15/2013, no artigo 00x, x x0 xx. f) do DL 77/99 de 16/03 e artigo 19º, n º 2 al. c) do DL 211/2004 de 20/08.
151 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
(total ou parcialmente) devida pelo destinatário do negócio. Nessa eventualidade, teremos, como refere Xxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx “uma assunção cumulativa de divida (que era do cliente da mediador) por banda do destinatário”152.
Todavia, já não será admissível a empresa mediadora receber tal remuneração duas vezes, por parte do cliente e do destinatário do negócio visado (artigo 17º, n º2 al. a) da Lei 15/2013).
A remuneração dependente da conclusão do contrato pretendido.
A questão que se levanta, é desde logo, a de saber quando é que é devida a remuneração pelo cliente à empresa mediadora.
A tal propósito estabelece o artigo 19º, n º1 da Lei 15/2013 que “A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra”.
Desde o DL 77/99 de 16/03153 que o momento em que passa a ser devida a remuneração foi fixado “na conclusão e perfeição do negócio visado”, tendo os diplomas posteriores mantido tal definição.
Significa isto, que a remuneração é devida, não apenas pelo exercício da atividade de mediação, designadamente pelas diligências levadas a cabo pela empresa mediadora com o propósito de encontrar destinatário para o negócio visado, nem pela obtenção de tal destinatário, mas com a celebração do negócio visado (seja o contrato definitivo ou o contrato-promessa na eventualidade de ser este o negócio estipulado).
Poder-se-á afirmar que a consagração legal de tal critério teve por base o que a jurisprudência já vinha entendendo a tal propósito. Pois, encontramos inúmeros arestos a preconizarem tal entendimento. Neste sentido, vejam-se, entre outros: o Acórdão do STJ
152 Obra citada, p. 46-7; Refere o mesmo autor a tal propósito que “Tal assunção de dívida é perfeitamente admissível. Com efeito, diz o n º 1 do artigo 595º do Código Civil que pode verificar-se a transmissão a título singular de uma divida por contrato entre o antigo e o novo devedor, ratificado pelo credor (al. a) ou por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do antigo devedor (al. b). Mas em qualquer dos casos, a transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado”.
153 Estabelecia o artigo 19º, n º1 do citado diploma que “A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação”. Também o DL 211/2004 de 20/08, manteve tal redação no artigo 18º, n º 1.
de 9 de março de 1978154, que refere “(…) V- No contrato de mediação, o direito à remuneração nasce da conclusão dos negócios objeto da mediação. VI – Para o mediador, tal conclusão surge quando os negócios se consideram aproximados entre o comitente e terceiros, e ele consegue a adesão destes, haja ou não execução posterior”; O Acórdão do STJ de 31 de março de 1998155, que refere “(…) III – A remuneração do mediador depende da celebração do contrato promovido, por efeito, em termos de causalidade adequada da sua intervenção, sendo, em principio insuficiente o desenvolvimento, pelo mediador, de mais ou menos diligências no sentido de conseguir o fim em vista”.
É verdade, que é pacífico na doutrina e na jurisprudência156 que no contrato de mediação imobiliária a remuneração, em regra, só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
No entanto, a qualificação jurídica do direito à remuneração no contrato de mediação não é unânime, havendo divergências na doutrina e na jurisprudência as quais estão diretamente ligadas à qualificação do contrato de mediação como sujeito a condição157 e aleatório158.
Alguns autores, como Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx000 referem que “O direito à retribuição depende da celebração do contrato promovido, embora seja independente do cumprimento do mesmo. Só com a verificação de um resultado útil - a realização do negócio – da atuação do mediador, este ganha o direito à retribuição. Está em causa mais do que a mera
154 BMJ, 278, p. 183 e segs.
155 BMJ 475, p. 680 e segs.
156 Neste sentido, vejam-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10/07/2007, Pº 3631/05.9TBAVR.C1; Acórdão do STJ de 29/09/2011, Revista n º 6067/07.3TCLRS.L1.S1-7ª Secção; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/07/2012, Pº 1187/11.2TBPDL.L1-7; Acórdão do STJ de 22/01/2009, Revista n º 976/08-2ª Secção; Acórdão do STJ de 23/04/2009, Revista n º 204/07.5TVPRT.S1-7ª Secção; Acórdão do STJ de 03/04/2008, Revista n º 4498/07-2ª Secção; Acórdão da relação de Lisboa de 08/03/2012, Pº 1724/09.2T2AMD.L1-2.
157 Como refere Xxxx Xxxxx, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, p. 561, “As noções de condição suspensiva e condição resolutiva constam do artigo 270º: subordinação pelas partes a um acontecimento futuro e incerto, ou da produção dos efeitos do negócio jurídico (condição suspensiva) ou da resolução dos mesmos efeitos (condição resolutiva)”.
158 Como refere Xxxx Xxxxx, obra citada, p. 403, “Nos contratos aleatórios as partes submetem-se a uma álea, a uma possibilidade de ganhar ou perder. A onerosidade consiste na circunstância de ambas estarem sujeitas ao risco de perder, embora, no final de contas, só uma venha a ganhar. Pode haver uma só prestação, dependendo de um facto incerto a determinação de quem a realizará (aposta, certos tipos de jogo), pode haver uma prestação certa e outra incerta, de maior montante do que aquele (seguro de responsabilidade civil, de incêndio, etc), pode haver duas prestações certas na sua existência sendo uma delas incerta no seu quantum (seguro de vida)”.
159 Obra citada, p. 202-3.
exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata. Pode-se assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio”160.
Xxxxxx Xxxxxxxx000, entendia-a como uma condição potestativa, sendo também uma condição essencial.
Também Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000 refere que “(…) para que se torne devida a remuneração acordada, não basta que o mediador tenha desenvolvido todos os esforços para a produção desse resultado, sendo ao invés necessário que esses esforços tenham conduzido à celebração do negócio visado e que o negócio assim celebrado tenha resultado diretamente dessa atividade do mediador (…) Por outro lado, se o mediador conseguir interessar um terceiro no negócio, mas o comitente decidir que não quer celebrar o contrato assim promovido, deve entender-se que o mediador não tem direito à remuneração (…) Daqui decorre que este contrato costuma ser qualificado como aleatório, pois o direito à remuneração depende da verificação de um facto eventual: ele depende não apenas do facto de o mediador conseguir interessar um terceiro no negócio pretendido, mas também da vontade do comitente de celebrar o contrato proposto ou indicado pelo mediador, pelo que, este corre o risco de não ser remunerado pela atividade desenvolvida – aliás, este risco é caraterístico do contrato de mediação e é ele que justifica, economicamente, os elevados montantes fixados como remuneração na generalidade dos contratos”. No mesmo sentido, Menezes Cordeiro163, refere que “Trata-se fundamentalmente, de uma prestação de serviços materiais, onerosa, aleatória e intuitu personae”.
A propósito de tal qualificação jurídica Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000 refere que “A conclusão do contrato visado perfeito não marca apenas o momento em que a remuneração é devida, sendo, mais que isso, uma circunstância sem a qual não nasce para o mediador o direito à remuneração”. Todavia, a mesma autora, considera que se atendermos ao sentido técnico-jurídico da condição, o contrato de mediação não pode ser entendido como condicional, pois o mesmo “é plenamente eficaz desde o momento da celebração e não tem
160 No mesmo sentido, vejam-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 19/01/2004, CJSTJ, 2004, I, p. 27; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11/11/2004, proferido no Pº 5439/2004-8, disponível, in, xxx.xxxx.xx. E Acórdão da Relação de Coimbra de 23/03/2004, proferido no Pº 102/04, disponível, in, xxx.xxxx.xx.
161 Obra citada, pp. 91, 135, 157 e nota 181.
162 Obra citada, p. 93-99.
163 Direito Comercial, 4ª edição, p. 732.
164 Obra citada, p. 122.
a sua eficácia ameaçada por qualquer ocorrência futura e incerta”165. Acrescenta ainda, a mesma autora que “o que nele se passa é que um dos seus efeitos, o nascimento do direito a uma das prestações, concretamente, a remuneração do mediador está dependente de um evento futuro e incerto: a celebração do contrato visado”. A autora considera também que o contrato de mediação se separa dos contratos aleatórios, desde logo, porque “nestes últimos, a prestação aleatória é sempre a prestação caraterística e nunca a prestação de pagamento ou retribuição” ao contrário do que sucede no contrato de mediação. Anota ainda que, “a função económico-social dos contratos aleatórios reconduz-se, portanto, a uma das indicadas: cobertura de um risco exógeno e preexistente, ou criação de um risco novo. No contrato de mediação, por sua vez, a sua finalidade económico-social é a da troca de um serviço por um preço. O risco adveniente de o direito à remuneração estar dependente de um evento futuro e incerto não constitui a finalidade do contrato, mas apenas uma forma de o cliente se assegurar facilmente, sem custos, de que apenas paga se a parte contrária tiver cumprido satisfatoriamente a sua obrigação”166.
Além da conclusão do contrato visado, necessário se torna a sua perfeição167, para que seja exigível a remuneração ao cliente. O termo perfeição pode ser entendido como eficácia, pois, o direito à remuneração nasce se, e quando o contrato visado for eficaz. Tal significa que não poderá enfermar ab initio de qualquer invalidade absoluta, não poderá estar dependente de condição suspensiva nem se poderá verificar a condição resolutiva de que estava dependente. Todavia, o direito à remuneração já não é afetado por ulteriores incumprimentos do negócio visado, na medida em que os mesmos, já não atingem tal direito da mediadora.
Esta é a regra, no tocante à prestação do cliente, a qual não afasta a possibilidade de as partes, querendo, poderem acordar em sentido contrário, designadamente prevendo uma indemnização, mesmo na eventualidade de o negócio não se chegar a concretizar.
165 Obra citada, p. 126.
166 Obra citada, p. 128.
167 Nos termos do disposto nos artigos 224º a 226º do Código Civil, a perfeição da declaração negocial, corresponde ao momento da sua eficácia, pois, aquela torna-se perfeita quando alcança a sua plena eficácia.
Do nexo de causalidade entre a atividade de mediação e o contrato celebrado.
Além da conclusão e perfeição do negócio visado para que nasça o direito à remuneração, necessário se torna a verificação de um nexo de causalidade entre a atividade da mediadora e o contrato a final celebrado.
A este propósito refere Xxxxxx Xxxxxxx Barata que “A prestação do mediador terá de ser causal, em relação ao negócio celebrado entre o comitente e o terceiro”168. No mesmo sentido, Menezes Cordeiro, refere que “a atividade do mediador deve ser causa adequada ao fecho do contrato definitivo; ou então: este deve alcançar-se como efeito de intervenção do mediador”169.
Contudo, se dúvidas não existem na doutrina, nem na jurisprudência quanto à necessidade de existir nexo de causalidade entre a atividade da mediadora e a celebração do negócio visado, já o difícil consiste em determinar a amplitude de tal nexo de causalidade.
Para alguns autores, como Xxxxxx Xxxxxxxx000, a mera indicação de um terceiro interessado na celebração do negócio visado, pode justificar o direito à remuneração, por se entender que influi sobre a conclusão do negócio.
Contudo, como refere Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000, tal não será assim, no caso de o mediador se ter obrigado a negociar o contrato pretendido pelo comitente, pois nesse caso deverá estabelecer o contato entre o cliente o terceiro interessado. Neste sentido, veja-se, o Xxxxxxx do STJ de 09/12/1993, no qual não foi reconhecido o direito do mediador à remuneração, por não ter sido este “a estabelecer o contato entre a vendedora e os interessados na compra – uma diligência indispensável à prossecução do resultado pretendido”.
Outra questão que se coloca, nesta sede e que se prende com o propósito deste trabalho (a (in) admissibilidade da revogação unilateral do contrato de mediação) é a situação em que o cliente revoga o contrato de mediação e vem mais tarde celebrar o contrato visado com um terceiro, que se interessou pelo negócio por força da atividade do mediador, na vigência do contrato de mediação.
168 Obra citada, p. 203.
169 Obra citada, p. 729.
170 Obra citada, p. 104.
171 Obra citada, p. 101-102.
Aqui as respostas dependem, desde logo, da posição que se assuma quanto à admissibilidade ou não da revogação unilateral.
No caso de se adotar a posição da inadmissibilidade da revogação unilateral, a remuneração é sempre devida, pois, tudo se passa como se o contrato ainda estivesse em vigor, pois a forma de cessação não e válida. Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12/06/2014, proferido no Pº 1218/10.3TBBCL.G1172 o qual refere que “A remuneração do mediador imobiliário é devida mesmo que a sua atuação apenas concorra para o resultado tido em vista no contrato de mediação, contanto que seja causa adequada (ainda que não única) da conclusão e perfeição do negócio visado. Concorre para a conclusão e perfeição da compra e venda a mediadora que, tendo sido contratada para prestar serviços com esse fim, conduz o interessado na compra à subscrição do contrato-promessa de compra e venda e vê depois, unilateral e indevidamente ser revogado o contrato de mediação pelo seu cliente que, afinal, com uma nova mediação, vem a celebrar a escritura pública de compra e venda com o mesmo promitente-comprador”.
Caso contrário, isto é, adotando a posição da admissibilidade da revogação unilateral, ainda assim, podem encontrar-se duas respostas, como refere a tal propósito Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx.
A primeira, pode entender-se que o direito à remuneração pode ser afastado com o argumento de que o contrato visado foi celebrado já depois de extinto o contrato de mediação. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 19/01/2004, o qual refere que, “não tem o mediador direito a qualquer remuneração, pois que o nexo de causalidade só tem de colocar-se perante um contrato ainda válido ou subsistente e (no caso) se trata de um novo negócio sem interferência do mediador, efetuado após a revogação do acordo de mediação”.
A segunda resposta, passa por entender que o direito à remuneração existe sempre que se verifica o nexo de causalidade entre a atividade exercida, na vigência do contrato de mediação, pelo mediador e a celebração do negócio visado entre o cliente e um terceiro, mesmo que tais efeitos só se produzam após a cessação do contrato de mediação. Parece sufragar este último entendimento Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000, a qual na sequência da
172 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
173 Obra citada, p. 103, nota 94.
exposição do Acórdão do STJ de 19/01/2004 refere que, “De facto, a afirmação do direito do mediador à comissão, nestas circunstâncias, acresce de fundamentação mais rigorosa, a qual pode assentar, nomeadamente, na pós-eficácia das obrigações contratuais e no disposto no artigo 422º do Código Civil. Mas também o recurso à aplicação analógica das regras do contrato de agência poderia ser, aqui, de grande utilidade, permitindo evitar um enriquecimento injustificado do comitente: nos termos do disposto no n º3 do artigo 16º do DL 178/86 de 3/7 “O agente só tem direito à comissão pelos contratos celebrados após o termo da relação de agência provando ter sido ele a negociá-los ou, tendo-os preparado, ficar a sua conclusão a dever-se principalmente, à atividade por si desenvolvida, contanto que em ambos os casos sejam celebrados num prazo razoável subsequente ao termo da agência”.
Outra situação que se prende com a existência de nexo causal para que nasça o direito à remuneração é aquela em que o negocio visado é celebrado com pessoa diferente da angariada pelo mediador. Á primeira vista, seria de afastar nestas situações o direito à remuneração, pela falta de nexo de causalidade entre a atuação do mediador e o negócio celebrado. Todavia, como refere Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000, pode suceder que, apesar de celebrado com pessoa diferente da angariada pelo mediador, exista um nexo causal entre a atividade do mediador e a celebração do contrato por o novo interessado ter, graças a uma qualquer relação com o angariado, celebrado o contrato apenas para frustrar o direito do mediador à remuneração, beneficiando o angariado do contrato a final celebrado de modo semelhante ao que beneficiaria se o tivesse celebrado pessoalmente. Neste caso, a celebração com pessoa diversa da angariada pelo mediador não é impeditiva do nascimento do direito à remuneração”175.
Despesas efetuadas no exercício da atividade de mediação.
A Lei 15/2013 à semelhança dos regimes anteriores não contém qualquer estipulação no tocante ao pagamento das despesas suportadas pela empresa de mediação, no exercício da sua atividade.
174 O Contrato de Mediação, p. 301-2.
O certo é que a ausência de estipulação, possibilita, desde logo, que as partes possam prever o regime a aplicar às mesmas no contrato que venham a celebrar.
Na ausência de estipulação das partes, o entendimento maioritário da doutrina e da jurisprudência176 é no sentido, de que as despesas efetuadas pela empresa mediadora, na prossecução do seu escopo de procura de destinatários correm por conta da mediadora. Neste sentido, refere Xxxxxx Xxxxxxxx000 que “(…) no direito português, porque não há disposição, porque às regras do mandato só se pode recorrer naquilo que não contrarie a natureza e disciplina própria do contrato de mediação e porque os usos são realmente no sentido de não apresentar tais despesas, ainda que o negócio final não se realize, o comitente não é onerado com elas”. Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx000, refere que “(…) parece de concluir que o mediador não terá direito ao reembolso das despesas. É o que melhor se compatibiliza com a imparcialidade, que caracteriza a mediação, e, muito especialmente, com a autonomia do mediador. Este exerce a sua função por sua conta, assumindo, consequentemente os riscos”. Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000, a propósito do reembolso de despesas realizadas, refere que, não impende sobre o cliente a obrigação de reembolsar e, sustenta tal resposta negativa “com base na natureza aleatória do contrato e na sua economia (pois a remuneração do mediador já é, em regra, suficientemente alta para que não se justifique que seja pago ainda pelas despesas que fez): o mediador corre este risco, a menos que o contrário resulte do contrato de mediação”. Acrescenta a mesma autora que “ na mediação imobiliária também os tribunais superiores seguem esta orientação, com fundamento no risco, na álea negocial, próprios do contrato de mediação”. No mesmo sentido, Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000, refere, desde logo, que, a ausência de estipulação legal, no tocante a tal matéria, não é uma lacuna, afastando a aplicação do disposto no artigo 1167º, al. c) do Código Civil181 ao contrato de mediação, quer por via da analogia, quer por interpretação extensiva.
176 Neste sentido, vejam-se, entre outros o Acórdão do STJ de 28/04/2009, Pº 29/09.3YFLSB e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/07/2012, Pº 1187/11.2tBPDL.L1.7, ambos disponíveis, in, xxx.xxxx.xx. 177 Obra citada, p. 112.
178 Obra citada, p. 207
179 Obra citada, p. 99-100.
180 Obra citada, p. 138-9, nota 185.
181 Estabelece o artigo 1167º, al. c) do Código Civil que “O mandante é obrigado: (…) c) A reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efetuadas”.
Em sentido contrário, ao assumido pela maioria da doutrina e da jurisprudência, Xxxxxx Xxxxx Xxxx e Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxx000xxxxxxx estar em causa uma lacuna que carece de integração e que a mesma deve ser feita com recurso às regras da prestação de serviços, designadamente ao artigo 1167º, al. c) e d) do Código Civil. Concluem que “tudo leva a considerar que efetivamente a entidade mediadora pode fazer-se reembolsar das despesas que tenha feito com a gorada mediação”.
A remuneração no contrato em regime de exclusividade.
Também o direito à prestação do cliente, isto é, à remuneração no contrato de mediação imobiliária celebrado em regime de exclusividade, exige a conclusão e perfeição do negócio, valendo aqui as considerações já expendidas sobre tal definição.
Todavia, tal regime contempla especificidades, designadamente no tocante ao nexo de causalidade entre a atividade do mediador e a conclusão do negócio visado. A tal propósito refere Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000, que “A função da cláusula de exclusividade é, em qualquer caso, tão-só a de afastar a necessidade de demonstração do nexo de causalidade entre a atividade do mediador e a conclusão desse negócio. Por outras palavras, também na presença de uma cláusula de exclusividade, o mediador só adquire o direito à comissão quando estejam presentes todos os requisitos necessários para a sua constituição. Nomeadamente, o mediador deve ter desenvolvido a atividade a que se obrigou; simplesmente, a existência desta cláusula autoriza a presunção (de facto) de que a atividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio”184.
Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000, faz a seguinte distinção: - nos casos em que há incumprimento da cláusula de exclusividade reforçada pelo cliente que celebra o contrato visado com interessado angariado por outra mediadora ou angariado por si (exclusividade reforçada), tal cláusula prescinde do estabelecimento do nexo causal; - nos casos em que em causa está o incumprimento de uma cláusula de exclusividade simples (que visa afastar
182 Obra citada, p. 80-2.
184 Em sentido contrário, veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/02/2014, proferido no Pº 704/12.5T2OBR.C1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual refere que “Mesmo em regime de exclusividade é a mediadora quem tem de demonstrar o nexo causal entre a atividade que por si foi desenvolvida e a concretização do negócio visado pela mediação”.
185 Obra citada, p. 134-5.
apenas a concorrência) necessário se torna apurar o cumprimento da prestação pelo mediador, só depois se fazendo presumir o nexo de causalidade.
Para além desta especificidade, a cláusula de exclusividade pressupõe a análise de duas situações que afastam a aplicação do regime geral que vigora no âmbito do contrato de mediação simples, no tocante ao direito à remuneração. São as seguintes: a) quando o negócio visado não se concretiza por causa imputável ao cliente da mediadora; b) quando o cliente da mediadora infringe a cláusula de exclusividade e celebra o contrato com interessado que chegou até si por seu intermédio (no caso da exclusividade reforçada) ou por intermédio de outra mediadora (no caso da exclusividade simples).
Assim, e dada a importância de tais especificidades, importa analisar o regime a aplicar às mesmas.
i. Exigibilidade da remuneração no caso de não concretização do contrato por causa imputável ao cliente.
O artigo 19º n º2 da Lei 15/2013 estabelece que “É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel”186.
Tal regime já se mostrava previsto nos diplomas anteriores, embora, com ausência de algumas concretizações que foram feitas neste último diploma.
Assim, já o DL 77/99 no seu artigo 19º, n º2, al. a) estabelecia que “Excetuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração”. E, posteriormente o DL 211/2004 no seu artigo 18º, n º2 al. a) estabeleceu que “Excetuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração”.
186 As palavras a itálico como refere Xxxxxx Xxxxxxx Castelo, obra citada, p. 130, “estão manifestamente a mais”, pois, “está em causa o contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade e não o contrato visado celebrado em regime de exclusividade”.
O DL 211/2004 manteve a exceção prevista no diploma de 1999, com a concretização de que o cliente em causa no referido normativo “é o proprietário do bem imóvel”.
Tal regime manteve-se no diploma atual, com o alargamento do mesmo ao arrendatário trespassante.
A exceção em apreciação, afasta o regime regra previsto para o contrato de mediação simples, deixando aqui a remuneração de depender de um evento futuro e incerto constituído pela celebração do contrato visado, desde que, a empresa mediadora faça prova da efetiva obtenção de alguém verdadeiramente interessado em celebrar o contrato visado187.
Ainda que a mediadora consiga fazer a prova da prestação, como lhe compete, nos termos do disposto no artigo 342º, n º1 do Código Civil, tal não obsta a que o cliente demonstre que o negócio visado não se concretizou por causa que não lhe é imputável (nos termos do artigo 342º, n º2 do Código Civil).
O âmbito desta exceção prende-se com a questão da admissibilidade ou não da revogação unilateral do contrato de mediação pelo cliente, a qual será objeto de mais desenvolvimentos a propósito das formas de cessação do contrato de mediação.
Pois, os autores188 que entendem ser inadmissível tal forma de extinção do contrato de mediação, defendem que no caso de tal ocorrer será devida a remuneração, pois a não concretização do negócio ficará, nestes casos, a dever-se a culpa do cliente, integrando-se tal situação no n º2 do artigo 19º da Lei 15/2013.
Diferente da revogação unilateral do contrato é a desistência do cliente do contrato inicialmente pretendido, sendo que, tal situação poderá também integrar-se na previsão do artigo 19º, n º2 citado, e nesse caso o mediador terá direito à remuneração acordada.
187 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão da Relação de Lisboa de 22/11/2012, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual sumaria que “I- Num contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, o direito à remuneração do mediador existe mesmo que não se concretize o negócio desde que a não concretização se deva a causa imputável ao cliente. II – Mas o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, ou seja, a prática dos atos adequados a conseguir a concretização do negócio visado com a mediação. III – Em suma, tem de ficar demonstrado que a mediadora praticou os atos necessários à concretização do negócio entre o seu cliente e o terceiro interessado e que, só por culpa do cliente, o negócio não se concretizou por intermédio da mediadora”.
188 Neste sentido, Higina Orvalho Castelo, obra citada, p. 132 refere que “Ao contrato de mediação exclusivo não pode, ser posto termo unilateralmente e sem causa justificativa”. Em sentido contrário, Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 106, refere que, “nada impede que o contrato de mediação possa ser denunciado pelo comitente durante a vigência de uma cláusula de exclusividade (…)”.
ii. Incumprimento da cláusula de exclusividade, pelo cliente.
A questão da exigibilidade da remuneração no contrato de mediação com cláusula de exclusividade, em caso de não concretização do negócio visado, por causa imputável ao cliente, prende-se com a questão do incumprimento da referida cláusula de exclusividade, celebrando o contrato visado com interessado angariado por outra mediadora (exclusividade simples) ou pelo próprio (exclusividade reforçada).
Enquanto no âmbito do artigo 19º, n º2 da Lei 15/2013 está em causa a recusa ou desistência do negócio visado por parte do cliente, no incumprimento está em causa a celebração do contrato visado com interessado não angariado pela mediadora.
Nestas situações o cliente ao celebrar o negócio, por si diretamente angariado ou angariado por outra mediadora, gera a impossibilidade de a mediadora exclusiva poder concretizar a sua prestação.
Estando em causa um contrato bilateral, tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao credor, não fica este desonerado da contraprestação, nos termos do disposto no artigo 795º, n º2 do Código Civil.
Tal significa que, o cliente terá de pagar à mediadora exclusiva a remuneração acordada189.
Esta solução encontra-se prevista para o contrato de agência exclusivo, nos termos do artigo 16º do DL 178/86 de 3 de julho, com as alterações introduzidas pelo DL 118/93 de 13 de abril190. Em anotação ao citado normativo, Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx000 refere que “O artigo 16º, n º2 mantém o direito do agente exclusivo à comissão, mesmo que se trate de contratos em cuja negociação ele não interveio, uma vez concluídos com pessoas pertencentes à zona ou ao círculo de clientes reservado ao agente”. Acrescenta o mesmo autor que, “pretende o legislador, sobretudo, desencorajar atitudes contrárias ao sentido do direito de exclusivo, não impedindo, contudo a realização de contratos sem a intervenção
190 Estabelece o artigo 16º, n º1 e 2 do referido diploma que “1- O agente tem direito a uma comissão pelos contratos que promoveu e, bem assim, pelos contratos concluídos com clientes por si angariados, desde que concluídos antes do termo da relação de agência. 2- O agente tem igualmente direito à comissão por atos concluídos durante a vigência do contrato se gozar de um direito de exclusivo para uma zona geográfica ou um círculo de clientes e os mesmos tenham sido concluídos com um cliente pertencente a essa zona ou círculo”
191 Obra citada, p. 78-9.
do agente, desde que isso se justifique, e sem prejuízo do direito do agente à respetiva comissão (…) o direito à comissão do agente exclusivo, consagrado no n º 2, não está dependente do facto de os contratos serem concluídos com clientes por si angariados: basta que se trate de pessoas pertencentes à zona ou ao circulo de clientes que lhe fora reservado (…)”.
Recebimento da remuneração de ambos os clientes.
No tocante ao recebimento da remuneração, por parte da empresa mediadora, quando ambas as partes no negócio são seus clientes, não será admissível a empresa mediadora receber tal remuneração duas vezes, por parte do cliente e do destinatário do negócio visado (artigo 17º, n º2 al. a) da Lei 15/2013).
Importa referir que a remuneração, via de regra é a prestação que incumbe ao
cliente.
Contudo, tal regra pode comportar exceções.
Uma delas prende-se com o facto de em causa poderem estar dois contratos de
mediação imobiliária com clientes distintos, levados a cabo pela mesma mediadora, mas que se cruzam em virtude do mesmo interesse (v.g. um pretende alienar e o outro adquirir o mesmo imóvel). Se o negócio visado por ambos for concluído, a questão que se coloca é a de saber, qual delas deve pagar a remuneração? O regime previsto pelo artigo 18º, n º 6 do DL 211/2004, estipulava que “caso a empresa de mediação tenha celebrado contratos de mediação com ambas as partes no mesmo negócio, cujo objeto material seja o mesmo bem imóvel, a remuneração só é devida por quem primeiro a contratou, exceto se houver acordo expresso de todas as partes na respetiva divisão”. Tal normativo não teve acolhimento na Lei 15/2013 que apenas passou a proibir o recebimento da remuneração duas vezes por parte de “clientes e destinatários do mesmo negócio” (artigo 00x, x x0, xx. a)). Face ao atual normativo propõe Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000, que, “na falta de acordo sobre qual delas pagará ou sobre a medida da divisão, a melhor solução será a de cada uma pagar metade do valor acordado no seu contrato”.
Outra questão que se coloca é a propósito do acordo entre as partes, posterior à celebração do contrato de mediação, pelo qual, o destinatário assume cumulativa ou individualmente a obrigação de satisfação da remuneração da mediadora. Neste caso, estar
192 Obra citada, p. 115.
em causa uma novação objetiva e parcialmente subjetiva193 (artigos 857º e 858º do Código Civil), uma adesão à divida, assunção cumulativa ou coassunção de divida, podendo ainda haver uma assunção liberatória da divida194 (artigo 595º do Código Civil). Também nestas situações, o limite será apenas o da dupla remuneração previsto no artigo 17º, n º2 al. a) da Lei 15/2013.
Quantias prestadas pelos destinatários:
O artigo 18º da Lei 15/2013, estipula que quaisquer quantias recebidas pela empresa de mediação do destinatário, seja a que titulo for, mesmo que a título de preço, confiadas antes da celebração do contrato mediado ou do respetivo-contrato-promessa, consideram-se depositadas à ordem da empresa de mediação.
Esta possibilidade surgiu pela primeira vez no diploma de 2004195, passando quase na íntegra para o atual diploma.
O citado normativo prevê as seguintes regras: - a empresa de mediação deve restituir as quantias a quem as prestou, logo que para tal solicitada (artigo 18º, n º1, última parte); - a empresa de mediação não pode fazer qualquer utilização dessas quantias em proveito próprio (artigo 18º, n º2); - o depósito é necessariamente gratuito (artigo 18º, n º 3, 1ª parte); aplicam-se, com as necessárias adaptações, as disposições previstas no Código Civil para o contrato de depósito (artigo 18º, n º 3, 2ª parte).
Aqui importa referir que a aplicação do regime do contrato de depósito, previsto no Código Civil, acaba por comportar inúmeras exceções ao mesmo, configurando, nas palavras de Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000, “um regime sui generis”, ao qual são aplicáveis as disposições do contrato de depósito, e não as do depósito irregular, com o desvio no tocante ao facto de ser gratuito.
193 A tal propósito veja-se Higina Orvalho Castelo, obra citada, p. 115, nota 153, refere que” Novação objetiva da obrigação do devedor originário (o cliente da empresa de mediação) extinguindo-se a sua obrigação inicial e surgindo uma nova de valor inferior; e novação parcialmente subjetiva na medida em que o novo devedor (destinatário) substitui parcialmente o antigo devedor, contraindo uma nova obrigação de valor correspondente a uma parte do valor anterior”.
194 A tal propósito veja-se Higina Xxxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 116, nota 154, a qual refere que “a assunção liberatória de divida por via da qual o cliente da empresa de mediação fica exonerado do pagamento ficando este exclusivamente a cargo do destinatário”.
195 No artigo 17º do DL 211/2004 encontrava-se prevista tal regulamentação, a qual tem correspondência aos n º 1 a 3 do artigo 18º da Lei 15/2013.
196 Obra citada, p. 118-9.
Anote-se que, via de regra, a entrega de quantias pelo destinatário ocorre com o propósito de reserva do imóvel. Entendendo-se aqui a reserva de modo diferente de um contrato de opção, e antes como um ato que “não gera obrigações contratuais, constituindo apenas passos do iter negocial conducente ao contrato visado”197.
No caso, de o negócio visado não chegar a ser concluído, sem prejuízo da eventual da responsabilidade pré-contratual em que possam incorrer os sujeitos da relação jurídica, às quantias entregues, será aplicável o regime previsto no artigo 18º da Lei 15/2013.
Da celebração do contrato visado com o titular do direito de preferência.
A questão que aqui se coloca é a de saber quais as consequências, no tocante ao direito à remuneração, da apresentação do preferente (legal ou convencional), a exercer o seu direito de preferência, aquando da celebração do contrato visado, vindo o contrato a ser com ele celebrado.
No âmbito do DL 77/99198 o artigo 19º, n º5 estabelecia que “A alteração subjetiva numa das partes do negócio visado, por exercício do direito legal de preferência, não afasta o direito à remuneração da empresa de mediação”.
Atualmente a resposta a tal questão é dada pelo artigo 19º, n º4 da Lei 15/2013 que estabelece que “O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário do imóvel objeto do contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel”.
Tal normativo veio explicitar que, não é a alteração subjetiva de qualquer das partes no negócio visado que acarreta a manutenção do direito à remuneração.
Significa isto que, o direito à remuneração, no caso de o cliente ser o alienante se mantém, pois, não deixou de existir o nexo causal entre a atividade da mediadora e a celebração do negócio.
No caso, de o cliente ser o adquirente que fica preterido pelo exercício de tal direito de preferência, não há lugar à remuneração, pois, nesse caso o cliente não vê realizado o negócio por si visado.
197 Higina Orvalho Castelo, obra citada, p. 120.
198 No âmbito do DL 211/2004 correspondia ao artigo 18º, n º7.
Celebração do contrato visado mas por preço inferior ao inicialmente contratado. A questão que aqui se coloca é a de saber se, sofrendo alterações o preço do contrato desejado, no decurso das negociações, se a remuneração acordada é ou não
devida.
Debruçando-se sobre tal questão, Xxxxxx Xxxxxxxx000 refere que “nós pensamos que, se o preço fixado pelo mandante não foi considerado condição sine qua non da atribuição da percentagem ou remuneração ao mediador, é seguro que a conclusão do negócio por preço inferior não faz perder àquele o seu direito, pela razão de ser opinião comum que não é necessária perfeita coincidência entre o contrato desejado e o efetivamente realizado; o mediador conseguira já a adesão do terceiro à celebração do negócio, daí a sua participação no nexo causal”.
Também Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000 refere que “conseguido um interessado, se o cliente vem a celebrar com ele contrato por valor diferente do perspetivado no contrato de mediação, em princípio, não poderá usar essa diferença para se escusar ao pagamento da remuneração do mediador. A decisão poderá ser outra se claramente resultar do contrato de mediação que o direito à remuneração está absolutamente dependente da obtenção de um interessado naquele preço, e não noutro, e se o contrato não tiver sido celebrado por diferente preço com o fito de frustrar a remuneração do mediador”.
A responsabilidade do mediador pelos danos causados a terceiros.
Como já destacado a propósito da análise do conteúdo da prestação da empresa mediadora, esta encontra-se sujeita ao cumprimento de deveres, nos termos elencados no artigo 17º, n º1 da Lei 15/2013 e adstrita à observância das proibições previstas no n º2 do mesmo normativo. Tais deveres e proibições destinam-se a proteger os clientes e os destinatários que entram em contato com a empresa mediadora.
A violação de tais deveres por parte da empresa mediadora poderá conduzir à sua responsabilização civil, nos termos do disposto no artigo 483º, n º1, 2ª parte do Código Civil.
Tal violação poderá, desde logo, assentar na violação culposa, por parte da mediadora, dos deveres de informação. Vários arestos se pronunciaram neste sentido.
199 Obra citada, p. 98.
200 O Contrato de Mediação, p. 302-3.
Entre, outros, vejam-se os seguintes: - o Acórdão do STJ de 27/01/2011, Revista n º 3141/04.1TVLSB.L1.S1, 2ª Secção, refere que “A violação do dever de informação referido e a subsequente não celebração do contrato-prometido podem determinar a responsabilização do mediador na reparação dos danos não patrimoniais decorrentes da sua conduta, designadamente, a intranquilidade, stress e desgaste psicológico sofridos com a inesperada privação daquilo que os autores viam como a sua casa de habitação “; - o Acórdão da Relação de Lisboa de 23/04/2015, Pº 3311/10.3TBBRR.L2-6, refere que “A violação culposa do dever de informação a cargo do mediador imobiliário, no âmbito da atividade de mediação perante terceiro interessado, é fonte de obrigação indemnizatória pelo dano causado a esse terceiro”; Acórdão da Relação do Porto de 21/05/2013, refere que, “O mediador responde pelos danos causados a qualquer uma das partes, em virtude da violação dos deveres de cuidado e de informação previstos no artigo 16º, n º1 do DL 211/2004 de 20/08”; - O Acórdão da Relação do Porto de 01/07/2013, Pº 2764/11.7TBVNG.P1, refere que, “I - O mediador imobiliário é civilmente responsável pelo ressarcimento dos danos patrimoniais causados a terceiro (adquirente de imóvel compreendido no contrato de mediação) em consequência da violação do dever de informação e/ou do incumprimento doutras obrigações resultantes do exercício da atividade de mediação. II – A medida da indemnização deverá traduzir o dano/prejuízo causado pela dita atuação da mediadora imobiliária, causalmente ligado ao incumprimento dos deveres que sobre si recaiam enquanto mediadora imobiliária”.
No âmbito do dever de informação, é frequente a responsabilização da mediadora pela ausência de cumprimento do dever de informação do comprador sobre as caraterísticas do imóvel e os ónus e encargos que sobre o mesmo recaem. Este dever prende-se com o previsto no artigo 17º, n º1 al. b) da Lei 15/2013, sendo que, em anotação a tal preceito, refere Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000 que “a empresa de mediação terá, pelo menos, de visitar o imóvel e conferir a descrição do mesmo no Registo Predial”. A mesma autora acrescenta ainda que “sobretudo se o imóvel não estiver descrito no Registo Predial, será importante o acesso à informação matricial das Finanças, que contém a descrição do imóvel e a identificação das pessoas que pagam os impostos por ele devidos”. A propósito dos documentos que a empresa de mediação deve pedir ao cliente refere ainda a autora que “deve pedir ao cliente com quem se prepara para celebrar o contrato de mediação são,
201 Obra citada, p. 113.
então, os seguintes: Cartão de Cidadão (na sua falta Bilhete de identidade e cartão de identificação fiscal, ou, sendo estrangeiro, cartão de cidadão europeu ou passaporte); certidão predial do imóvel, com a descrição e inscrições em vigor (Registo Predial); certidão matricial do imóvel (Finanças)”. Já na posse de tais documentos a empresa mediadora, deverá proceder à sua análise de modo a saber o que vai propor aos destinatários, observando assim o integral cumprimento do dever previsto no artigo 17º, n º 2 al. c) do citado diploma202.
Anote-se que, tal violação também pode assentar na violação culposa, por parte da mediadora, dos deveres de lealdade e colaboração. Neste sentido, veja-se, entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29/06/2010, o qual refere que “I- Resulta da lei que a função do mediador é basicamente uma função de angariação de interessados e que os deveres que lhe impõe são deveres de informação, de lealdade e de colaboração (os artigos 2º e 16º, n º1 do DL 211/2004). II – É entendimento da jurisprudência que, para o mediador ter direito à comissão, é suficiente ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a realizar o negócio, pondo o comprador em contacto com o vendedor, e que isso tenha influído na realização do negócio”.
A responsabilidade da empresa mediadora pode prender-se com a prática de atos ilícitos por parte dos seus agentes, colaboradores ou auxiliares. A tal propósito, veja-se o Acórdão do STJ de 10/04/2014, Pº 8476/03.8TBCSC.L1.S1203, o qual sumaria que “1. A responsabilidade objetiva dos auxiliares do devedor – artigo 800º, n º1 do Código Civil – havendo incumprimento da obrigação, superada a construção jurídica que radicava tal responsabilidade na teoria da culpa in elegendo ou na culpa in vigilando, inscreve-se, hoje, com mais propriedade nos princípios tutela da aparência e da confiança, segundo os quais,
202 Neste sentido o Acórdão da Relação de Lisboa de 25/10/2012, Pº 6686/07.8TBCSC.L1-8, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual refere que “1. Uma empresa de mediação imobiliária que, no seguimento de contrato de mediação imobiliário celebrado com o dono de um imóvel, promove junte de um terceiro interessado a venda do mesmo, ajustando com ele as condições do negócio e levando-o a celebrar um contrato promessa com entrega de uma quantia a titulo de sinal ao proprietário/vendedor, tem o dever de informar o comprador da situação do mesmo imóvel, nomeadamente em termos de ónus e encargos que sobre o mesmo recaem. 2. Verificando-se que afinal o imóvel estava onerado por hipoteca, além de ter sido alvo de penhora e arresto, tornando inviável a celebração da escritura de compra e venda, a mediadora responde pelos prejuízos que a sua omissão tenha causado ao promitente/comprador”. No mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/04/2009, Pº 1157/2002.L1-1, disponível, in, xxx.xxxx.xx, o qual refere que, “1- As mediadores estão obrigadas a, além do mais, certificar-se, antes da celebração do contrato de mediação, por todos os meios ao seu alcance, se as caraterísticas do imóvel objeto do contrato de mediação correspondem às fornecidas pelos interessados contratantes e se sobre o mesmo recaem quaisquer ónus ou encargos (artigo 18º do DL 77/99 de 16 de março) (…)”.
203 Disponível, in, xxx.xxxx.xx.
quem incute, pela sua atividade e comportamento nas relações jurídicas expectativas de confiabilidade e segurança, deve arcar com as consequências da frustração desses valores.
2. No contrato de mediação, a relação de confiança entre o mediador e os seus auxiliares dependentes ou independentes é particularmente estimulada pelos contactos existentes entre alguém que tem por objeto aproximar os interessados num certo negócio. 3- Não pode a mediadora imobiliária pretender exonerar-se de responsabilidade, por prática de atos ilícitos, praticados pelos seus agentes, colaboradores ou auxiliares, desde que tais atos se emoldurem no quadro do exercício profissional da sua atividade e exprimam atuação ilícita. 4- Esse risco corre, objetivamente, por conta do comitente, desde que a atuação do comitido/auxiliar se inscreva no quadro funcional daquele e exista atuação ilícita, culposa, bem como dano resultante da atuação ilícita e danosa. 5 – Tendo o funcionário de empresa mediadora imobiliária recebido, com autorização desta, uma quantia a titulo de sinal no contexto de contrato promessa de compra e venda de três frações prediais, quantia que descaminhou, desconhecendo-se até o seu paradeiro, é a sociedade mediadora imobiliária responsável objetivamente pelo prejuízo que, no caso, é a perda do sinal pelos promitentes- compradores. 6 – Sendo as sociedades mediadoras imobiliárias obrigadas por lei a prestar caução e a celebrar contrato de seguro obrigatório como garantia do ressarcimento dos danos patrimoniais causados aos interessados decorrentes de ações ou omissões, quer das empresas, quer dos seus representantes, ou do incumprimento de outras obrigações decorrentes do exercício da sua atividade, os lesados podem lançar, mão do seguro obrigatório, sem terem que, previamente acionar a caução”.
No tocante à responsabilidade civil da empresa mediadora é importante referir que, é obrigatório a transferência de responsabilidade para empresa de seguros, nos termos do disposto no artigo 7º da Lei 15/2013 o qual estabelece, no seu n º1 que “Para garantia da responsabilidade emergente da sua atividade, as empresas de mediação imobiliária estabelecidas em território nacional devem ser titulares de seguro de responsabilidade civil, no montante mínimo de € 150.000” e o n º 4 que “O seguro de responsabilidade civil destina-se ao ressarcimento dos danos patrimoniais causados a terceiros, decorrentes de ações ou omissões das empresas, dos seus representantes e dos seus colaboradores”. Por sua vez, o n º5 esclarece que “para efeitos do presente artigo, consideram-se terceiros todos os que, em resultado de um ato de mediação imobiliária, venham a sofrer danos patrimoniais, ainda que não tenham sido parte no contrato de mediação imobiliária”.
Poderá também ocorrer uma situação que se integre na responsabilidade pré- contratual, nos termos do disposto no artigo 227º do Código Civil. Exemplo de tal situação é a que ocorre quando a mediadora exige ao interessado angariado que faça uma reserva do imóvel, entregando-lhe este, para o efeito, determinada quantia em dinheiro e, caso o negócio não se venha a concretizar, poderão verificar-se os pressupostos da responsabilidade pré-contratual, incorrendo a mediadora na obrigação de indemnizar.
Parte II
A cessação do contrato de mediação imobiliária:
Por via de regra, o contrato de mediação imobiliária, à semelhança de qualquer outro contrato, cessa com o cumprimento da obrigação, sendo esta uma causa natural de cessação dos contratos. Tal causa é um afloramento do princípio pacta sunt servanda que norteia as relações contratuais e que se encontra positivado no artigo 406º do Código Civil.
Pode ainda suceder, que o contrato cesse por se tornar definitivamente impossível o seu cumprimento.
Contudo, se o contrato não cessar por nenhuma dessas duas situações, em princípio cessará pelas razões que as partes tenham convencionado no contrato celebrado.
Na ausência de estipulação das partes quanto a tal matéria, será necessário o recurso às regras gerais.
A relação jurídica emergente do contrato de mediação imobiliária válida e eficazmente celebrado, à semelhança de outros contratos, pode cessar por uma das seguintes formas por resolução, caducidade, denuncia ou revogação. Importa referir que, tais formas de cessação do contrato, têm por base factos posteriores ou supervenientes à celebração do contrato, diferentemente das invalidades (nulidade ou anulabilidade).
A resolução:
A resolução consiste “na destruição da relação contratual (validamente constituída), operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato”204.
204 Xxxxxxx Xxxxxx, Direito das Obrigações, Vol. II, 7ª edição, p. 275.
Nas palavras de Xxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxx000, traduz-se no “ ato de um dos contraentes dirigido à dissolução do vínculo contratual, em plena vigência deste, e que tende a colocar as partes na situação que teriam se o contrato não se houvesse celebrado”.
Esta forma de cessação do contrato é comum aos contratos de prestações instantâneas e aos contratos duradouros.
A resolução pode ser legal ou convencional, nos termos do disposto no artigo 432º, n º1 do Código Civil.
Por via de regra, nesta modalidade de cessação do contrato, exige-se que o autor alegue e prove o fundamento da resolução (artigo 801º, n º2 e 802º, n º1 ambos do Código Civil), consistindo, por isso, num poder vinculado. Contudo, tal regra comporta exceções, podendo a resolução ficar confiada ao poder discricionário do contraente, designadamente na situação prevista no artigo 927º e seguintes do Código Civil.
No tocante aos efeitos, a resolução, em princípio produz os mesmos da nulidade ou anulabilidade do negócio (artigo 433º do Código Civil).
Contudo, os efeitos da resolução distinguem-se da invalidade, nalguns aspetos que se passam a enunciar.
Assim, enquanto a invalidade, como a nulidade ou opera automaticamente ou envolve o recurso a uma ação judicial, a resolução pode operar extrajudicialmente mediante a declaração feita por uma das partes à outra, nos termos do disposto no artigo 436º do Código Civil.
Acresce que, a resolução só terá efeito retroativo entre as partes se tal não contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução (artigos 434º, n º1 e 435º, n º2 ambos do Código Civil). Diferentemente, a invalidade tem efeito retroativo entre as partes, sem quaisquer restrições.
A invalidade opera os seus efeitos em relação a terceiros, sem prejuízo da situação prevista no artigo 291º do Código Civil. Diferentemente a resolução não prejudica os direitos adquiridos por terceiro, nos termos do disposto no artigo 435º do Código Civil, ressalvando-se a situação em que o terceiro tenha adquirido o seu direito posteriormente ao registo da ação de resolução.
205Direito das Obrigações, 9ª edição, p. 285.
A caducidade:
A caducidade é uma forma de cessação das “relações jurídicas duradouras de tipo obrigacional criadas pelo contrato ou pelo negócio (formando no seu conjunto a relação contratual) se extinguem para futuro por força do decurso do prazo estipulado, da consecução do fim visado ou de qualquer outro facto ou evento superveniente a que a lei atribui o efeito extintivo”206.
Nas palavras de Xxxx Xxxxx, são traços específicos da caducidade, “a sua causa é algo de objetivo; atua automaticamente ou de pleno direito (ipso jure); não tem carater retroativo”207.
Vertendo ao contrato de mediação imobiliária importa referir que, sendo um contrato com prazo determinado, decorrido esse período, o contrato caduca, no termo do prazo, caso não tenha sido convencionada a sua renovação automática208.
A denúncia:
A denúncia, nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxxx consiste “na declaração feita por um dos contraentes, em regra com certa antecedência sobre o termo do período negocial em curso, de que não quer a renovação ou a continuação do contrato renovável ou fixado por tempo indeterminado”209. O mesmo autor refere que “Tal como a resolução e a revogação, também a denúncia extingue a relação obrigacional complexa210 derivada do contrato cuja renovação ou continuação ela impede” 211.
É uma forma de extinção própria dos contratos de duração indeterminada ou de prestações duradouras212. Esta forma de cessação, nas palavras de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx,
206 Xxxx Xxxxx, obra citada, p. 630.
207 Obra citada, p. 630.
208 O mesmo acontece no âmbito do contrato de agência, atento o disposto no artigo 26º, alínea a) do DL 178/86 com as respetivas alterações.
209 Obra citada, p. 281.
210 A propósito da distinção entre obrigações obrigacionais simples e complexas, Xxxxxxx Xxxxxx, Direito das Obrigações, Vol I, 9ª edição, p. 65, refere que “A relação jurídica em geral diz-se una ou simples, quando compreende o direito subjetivo atribuído a uma pessoa e o dever jurídico ou estado de sujeição correspondente, que recai sobre a outra; e complexa ou múltipla, quando abrange o conjunto de direitos e de deveres ou estados de sujeição nascidos do mesmo facto jurídico”.
211 Obra citada, p. 281.
212 A este propósito Xxxxxxx Xxxxxx, Direito das Obrigações, Vol. I, p. 94, refere que “Quanto ao tempo da sua realização, as prestações podem ser instantâneas, fracionadas ou repartidas, e duradouras. Dizem-se instantâneas as prestações em que o comportamento exigível do devedor se esgota num só momento ou num período de tempo de duração praticamente irrelevante (…)” e acrescenta, a propósito das prestações duradouras que “Nestas relações, a prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória influência decisiva na conformação global da prestação”. Dentro das prestações duradouras “umas,
“aplica-se exclusivamente a contratos cuja execução se protela no tempo, tanto para impedir a prossecução da vigência de um negócio jurídico continuado, como obstando à não renovação do acordo por outro período”213.
Tal figura jurídica214 numas situações traduz um exercício dum poder discricionário e outras vezes vinculado.
Os efeitos da denúncia produzem-se para o futuro (ex nunc), salvaguardando-se os efeitos já produzidos.
Alguns autores, como Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, na caraterização desta figura jurídica, autonomizam três tipos de denúncia215. Um primeiro tipo denominado “denúncia em sentido técnico”, incluindo neste as formas de cessação de relações contratuais estabelecidas por tempo indeterminado”. Num segundo tipo denominado oposição à renovação, inserem-se as situações a que “corresponde uma declaração negocial por via da qual se obsta à renovação automática do contrato”. Estes dois tipos de denúncia têm em vista impedir a subsistência de um vínculo contratual que se prolonga por um período de tempo incerto. Por último, o mesmo autor alude a um terceiro tipo, no qual se incluem as situações de desvinculação por desistência, por parte de um dos contraentes da execução do contrato”.
A revogação
Nas palavras de Xxxxxxx Xxxxxxx a revogação consiste “numa destruição voluntária da relação contratual pelos próprios autores do contrato” tendo por base “o acordo dos contraentes, posterior à celebração do contrato, com sinal oposto ao primitivo”216. Tal figura jurídica distingue-se da resolução, na medida em que os efeitos da revogação projetam-se apenas para o futuro (ex nunc).
A revogação pode ocorrer por vontade de ambas as partes217 (revogação bilateral/mútuo acordo), mas também de uma só delas (revogação unilateral218).
as prestações de execução continuada, são aquelas cujo cumprimento se prolonga ininterruptamente no tempo; outras, as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, são as que se renovam, em prestações singulares sucessivas, por via de regra ao fim de períodos consecutivos”.
213 Obra citada, p. 61.
214 Obra citada, p. 281.
215 Obra citada, pp. 61 e segs.
216 Obra citada, p. 279.
217 Como refere Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, Da cessação do contrato, 3ª edição, Almedina, 2015, p. 55, “Nada impede que as partes recorram à revogação para fazer cessar um contrato que, não fora esta atitude das partes, poderia cessar por resolução ou denúncia. Frequentemente, verificados os pressupostos de outra forma
A revogação por regra traduz-se num poder discricionário, (ao contrário da resolução), não necessitando as partes de alegar qualquer fundamento para a revogação219.
A este propósito refere Menezes Cordeiro220 que “a revogação unilateral ou denúncia anómala constitui uma exceção aos princípios gerais, já que, através dele, uma das partes, livre e discricionariamente, põe termo à relação contratual, em pelo menos, aparente contradição com o princípio da força vinculativa do contrato – pacta sunt servanda – consagrado no n º 1 do artigo 406º do Código Civil”.
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx, refere que, a revogação unilateral se move “fora da relação contratual (o que a distancia, desde logo, da resolução e da denúncia) não invalida que seja determinada por um escopo extintivo (ou negativo) normalmente vinculado (porque excecional) a certos pressupostos legais”221. Acrescenta o mesmo autor que, “ a revogação unilateral é motivada por interesses (pessoais ou ligados à contraparte e como tal erigidos em justa causa) diferentemente dos que determinaram o ato (máxime negócios jurídicos) que se revoga. Tendo por objeto principal declarações negociais de eficácia contida (…) ou certos atos considerados como não negociais (…), a revogação atinge o próprio ato revogado e só reflexamente a relação dele derivada, mas não se consome numa forma de cessação própria dos negócios gratuitos, nem visa romper com um desequilíbrio contratual imputado a um dos contraentes ou devido a fatores objetivos, resolutivamente relevantes”222
No tocante à revogação bilateral, pode ser convencionada uma eficácia retroativa inter partes, estando-se assim, como refere Xxxx Xxxxx perante um “contrato extintivo ou abolitivo ou contrarius consensos”223, nos termos do disposto no artigo 406º, n º1 do Código Civil.
de cessação do contrato, em vez de este ser denunciado ou resolvido, as partes chegam a acordo quanto à extinção, revogando o contrato”.
218 A revogação unilateral de negócios bilaterais, nas palavras de Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx, obra citada, p. 55 “só se admite nos casos especialmente previstos na lei ou acordados pelas partes”.
219 Contudo, em determinadas situações a revogação resulta de um poder vinculado, como sucede com a situação do artigo 970º e seguintes, podendo ainda
220 Direito das Obrigações, 3º volume, AAFDL, 1991, p. 376.
221 A resolução do Contrato no Direito Civil – Do enquadramento e do regime – reimpressão, Coimbra Editora, 2006, p. 48.
222 Obra citada, p. 49.
223 Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, p. 629.
A revogação, tal como a resolução, pode acarretar obrigações para os contraentes (como a obrigação de restituição das coisas recebidas) ou mesmo impedir o nascimento de outras ou extinguir obrigações já constituídas.
O Acórdão do STJ de 08 de junho de 1978, refere que “a revogação se situa a meio termo entre a resolução e a denúncia, operando com eficácia ex nunc e que são os próprios sujeitos do contrato que destroem livremente a sua eficácia”224.
No tocante ao contrato de mediação imobiliária, dúvidas não existem de que pode cessar por revogação bilateral das partes (mútuo acordo).
Já no tocante à admissibilidade da revogação unilateral não é pacífico o entendimento sobre tal possibilidade, quer na doutrina, quer na jurisprudência.
iii. – Da admissibilidade da revogação unilateral no contrato de mediação.
A propósito deste tema é possível encontrar duas orientações distintas.
Anote-se que, uma parte da doutrina e da jurisprudência225 entendem que é admissível a revogação unilateral do contrato de mediação. Neste sentido, Manuel
224 BMJ n º 278, p. 169.
225 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão da Relação de Lisboa de 3 de junho de 1977, CJ, II tomo 3,
p. 647 e segs; Xxxxxxx do STJ de 9 de março de 1978, BMJ 275, pp. 183 e segs; o Acórdão do STJ de 4 de março de 1980, BMJ, 295, p. 356 e segs; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17 de março de 2014, proferido no Pº 137/11.0TBPVZ.P1, CJ n º 253, Tomo II, 2014, Ref. 5854/2014, refere que “o contrato de mediação deve considerar-se revogável”, concluindo que, no caso “em que o cliente acorda com uma empresa comercial de mediação a angariação da venda de um imóvel, a partir do momento em que se desinteressa deste negócio, pode desvincular-se do contrato celebrado com aquela, atenta a própria natureza e os fins visados com o mesmo, sem prejuízo de, na falta de fundamento objetivo, a revogação poder dar lugar à obrigação de indemnizar”. Contudo, não podemos deixar de constatar como Higina Xxxxxxx Castelo que tal aresto, acaba por confundir a revogação com a desistência do negócio visado por parte do cliente. Também o Acórdão da Relação do Porto de 15 de novembro de 2015, proferido no âmbito do Pº 131275/14.0YIPRT, CJ n º 266, Tomo V 2015, Ref. 9080/2015, o qual referindo o termo “denúncia” acaba por considerar admissível a revogação unilateral do contrato. Contudo, à semelhança do anterior aresto, em causa está uma desistência do contrato visado por parte do cliente, confundindo o citado aresto ambas as situações. Ainda no mesmo sentido padecendo do mesmo equívoco dos arestos citados, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 3 de novembro de 2015, proferido no âmbito do Pº 115257/14.5YIPRT.C1, CJ, n º 266, Tomo V, 2015, Ref. 684/2015, o qual refere que “I- No contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade, a que não foi aposta a cláusula de irrevogabilidade, o comitente tem a faculdade de desistir do negócio inicialmente querido e de se desvincular unilateralmente do contrato, em face do princípio da liberdade contratual. II- Tendo o comitente desistido da venda e revogado o contrato de mediação, antes de lhe ser dado conhecimento de um interessado na compra do imóvel, o mediador não tem direito à remuneração convencionada; apenas poderá ter direito à indemnização pelos danos sofridos pela revogação ou denúncia antecipada”. Ainda no mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02/06/2016, Pº 266/14.9TJLSB.L1-2, que sumaria, “É de admitir a revogação unilateral ou a denúncia antecipada do contrato de mediação imobiliária, ainda que em regime de exclusividade, mas sem que seja estipulada qualquer cláusula de irrevogabilidade, por ser de presumir que o cliente não quer privar-se do direito de desistir do propósito de concluir o negócio promovido. Sendo a mediação, antes de mais uma prestação de
Xxxxxxxx, 226 cita a tal propósito Xxxxxxx e Xxxxxxxx Xxxx e conclui que “Quanto à liberdade de revogação, não é mais do que uma consequência da contextura do contrato de mediação; pois, se o comitente, não obstante o encargo conferido ao mediador, tem a mais ampla liberdade de concluir ou não o negócio, de não esperar pelo resultado da atividade do mediador, de atribuir o encargo a outro mediador não seria compreensível que não pudesse revogar em qualquer altura, mesmo que fosse pactuado prazo. No tocante à indemnização por perdas e danos, quando foi estipulado prazo, a solução é igual e isto porque assim é entendido quanto ao mandato (…)”. Pronuncia-se em igual sentido Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx000, a qual refere que “ (…) na ausência de cláusula em sentido diverso, o contrato de mediação é revogável por qualquer das partes (…)”.
Desde a anotação de Xxx Xxxxx ao Acórdão do STJ de 07/03/1967228 tem-se entendido possível a revogação unilateral e discricionária, mesmo em contratos celebrados por tempo determinado229. Tal interpretação é feita a partir do seguinte excerto do referido texto “(…) salvo estipulação em contrário, o contrato de mediação deve considerar-se revogável. Não se trata de uma aplicação analógica das regras do mandato e da comissão, mas de uma consequência da própria natureza do contrato, tal como ela é de presumir ser querida pelos contraentes, pois parece de presumir que o autor do encargo, ao celebrar o contrato de mediação, não quer privar-se da faculdade de prescindir dos serviços do mediador, já que pode oferecer-se-lhe oportunidade de realizar o negócio sem intermediário, ou aparecer-lhe outro intermediário mais conveniente, ou perder a confiança que depositara no primeiro ou desistir do propósito de concluir o negócio; por outro lado, desde que o mediador só adquire direito à remuneração quando o negócio é concluído por efeito da sua intervenção (…) e a conclusão depende do autor do encargo, tem este o direito de revogação”230.
serviços, haverá que fazer apelo às regras do mandato, com as necessárias adaptações, por força do preceituado no artigo 1156º Código Civil, se as regras daquela não regularem especificamente alguma situação”.
226 Contrato de Mediação, p. 254 e segs.
227 Obra citada, p. 102-3.
000 XXX, 000, p. 345-6.
229 A tal propósito, importa referir que se encontra a referência nesse sentido, desde logo, na citação feita por Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, na obra citada, p. 102-3, nota 92.
230 Como refere Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015, p. 103, nota 140, a referida anotação “não esclarece se se deve considerar que há estipulação em contrário da livre revogabilidade quando o contrato é celebrado por determinado prazo”, chamando a atenção para o facto de “à data, todos os contratos de mediação eram legalmente atípicos no nosso ordenamento e os contratos de mediação tipificados em ordenamentos estrangeiros não tinham o prazo como elemento
Xxxxxxx Xxxxxxxx, considera que nas situações em que o contrato de mediação tenha duração determinada apenas será revogável por justa causa, referindo que, “por xxx xx xxxxxx 0000x do Código Civil, haverá que recorrer às regras do mandato: o solicitante poderá revogar o contrato mas, uma vez que ele também foi celebrado no interesse do mediador, terá de haver justa causa para a revogação (artigo 1170º, n º2)”231. Refere ainda a admissibilidade da denúncia com a antecedência nas normas do regime do contrato de agência, “por aplicação analógica do artigo 28º do DL 178/86 de 3 de julho”232.
Os defensores deste entendimento, baseiam-se, desde logo, na liberdade do cliente de celebrar ou não o contrato inicialmente desejado, significando, isto que, a mesma não pode ser beliscada. Ancoram esta possibilidade na aplicação extensiva do regime do mandato às modalidades do contrato de prestação de serviço que a lei não regule, onde incluem o contrato de mediação.
Em sentido contrário, situa-se outra parte da doutrina e da jurisprudência233. Neste sentido, Higina Orvalho Castelo, defende que “A existência de um prazo contratual tem como consequência que não possa ser posto termo ao contrato antecipadamente por declaração discricionária de uma das partes”234. A mesma autora distingue a possibilidade de desistência do negócio por parte do cliente da possibilidade de este revogar unilateralmente o contrato de mediação imobiliária. Considerando ainda afastada a possibilidade de aplicação extensiva do regime do mandato a aspetos não regulados pelo regime do contrato de mediação imobiliária, admite o recurso à aplicação analógica, o que exige “um juízo sobre a verificação, no concreto contrato de mediação, das razões que estão na base da livre revogabilidade do mandato”, concluindo, depois de feito tal juízo
essencial, nem natural. Ou seja, em regra, os contratos de mediação eram celebrados por tempo indeterminado, pelo que, seriam esses que os autores tinham em vista quando se referiam à livre revogabilidade do contrato”.
231 Direito Comercial, 4ª edição, p. 732.
232 Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015, p. 103, nota 140 afasta a possibilidade de tal aplicação ao contrato de mediação imobiliária, porquanto a possibilidade de denúncia pressupõe a existência de um contrato de duração indeterminada e esse nunca será o caso do contrato de mediação imobiliária, o qual, na ausência de convenção das partes será sempre considerado celebrado pelo prazo supletivo previsto no artigo 16º n º3 da Lei 15/2013.
233 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, RLJ 100, p. 340 e segs. refere que, “O principio estabelecido na lei, da revogação unilateral dos contratos de mandato e de comissão não pode aplicar-se por analogia ao contrato de mediação, não só porque são profundamente diversos os contratos de mediação e os de mandato e comissão, mas também porque as disposições excecionais não podem aplicar-se analogicamente”; o Acórdão da Relação do Porto de 2 de junho de 2011, proferido no âmbito do Pº 141/09.9TBMAI.P1, CJ n º 231, Tomo III, 2011, Ref. 3116/2011, a propósito da celebração do negócio pelo cliente com terceiros, acaba por proceder à análise das formas de cessação do contrato de mediação imobiliária, concluindo pela inadmissibilidade da revogação unilateral.
234 Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Xxxxxxx, 2015, p. 103.
que “não se verificam na mediação as razões que levam a que o mandato seja sempre revogável”.
Uma vez expostas as posições jurídicas assumidas pela doutrina e jurisprudência a propósito da (in) admissibilidade da revogação unilateral do contrato de mediação imobiliária, importa agora assumir uma posição e apresentar os fundamentos para a mesma.
Importa, desde logo, referir que o contrato de mediação imobiliária apesar de ser um contrato típico, na medida em que o seu regime se encontra previsto na Lei 15/2013, o certo é que o mesmo é omisso no tocante às formas de cessação do mesmo.
Na falta de estipulação das partes, (pois as mesmas podem estipular a irrevogabilidade do contrato ou, pelo contrário, a possibilidade de revogação), sendo omisso o regime legal, importa recorrer à analogia, convocando aqui o que deixámos dito, a propósito da caraterização do contrato de mediação imobiliária.
Reforça-se aqui a posição já assumida de que o contrato de mediação imobiliária tem natureza comercial, mas tal permite integrar as lacunas através do recurso aos diferentes regimes jurídicos similares, comerciais ou civis, consoante o conflito a dirimir, por analogia.
Em causa está o recurso à analogia, pois, existe uma “incompletude, uma falta ou falha” do RJAMI, nas palavras de J. Xxxxxxx Xxxxxxx, na medida em que nada prevê no tocante às formas de cessação, estando, por isso, afastado o recurso à interpretação extensiva235.
Tendo por base o artigo 10º, n 1 do Código Civil236, diremos que, para preenchimento da lacuna dever-se-á recorrer a normas que diretamente contemplem casos análogos237.
235 Como refere J. Xxxxxxx Xxxxxxx, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, p. 185, “Segundo a doutrina tradicional, o intérprete, socorrendo-se dos elementos ou subsídios interpretativos acabados de referir, acabará por chegar a um dos seguintes resultados ou modalidades de interpretação (…) Interpretação extensiva: o intérprete chega à conclusão de que a letra do texto fica aquém do espirito da lei, que a fórmula verbal adotada peca por xxxxxxx, pois diz menos do que aquilo que se pretendia dizer. Xxxxxx ou estende então o texto, dando-lhe alcance conforme ao pensamento legislativo, isto é, fazendo corresponder a letra da lei ao espirito da lei. Não se tratará de uma lacuna da lei, porque os casos não diretamente abrangidos pela letra são indubitavelmente abrangidos pelo espirito da lei”.
236 Em anotação a este preceito Xxxxxxx Xxxxxx e Pires de Lima, Código Civil Anotado, Vol. I, p. 59, referem que “A analogia das situações mede-se em função das razões justificativas da solução fixada na lei, e não por obediência à mera semelhança formal das situações”.
237 Veja-se, a propósito do conceito de casos análogos a nota 45.
Estando em causa saber se a cessação unilateral do contrato de mediação imobiliária de forma discricionária é admissível, importa analisar os regimes jurídicos similares, a fim tomarmos posição.
Assim, começando pelo contrato de mandato, aplicável aos contratos de prestação de serviços, no qual, o contrato de mediação imobiliária parece inserir-se, diremos que, estabelece o artigo 1170º do Código Civil que “1- O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário, ou renúncia ao direito de revogação. 2- Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa”.
Em anotação ao citado preceito, referem Xxxxxxx Xxxxxx e Pires de Lima que “A revogação unilateral de um contrato só é admitida, nos termos do artigo 406º, nos casos excecionais previstos na lei. Este, da revogação do mandato, quer gratuito, quer oneroso, é um deles (…) A revogabilidade do mandato vale tanto para o mandato de execução reiterada, por tempo determinado ou indeterminado, como para o mandato relativo a um ato isolado”.
Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx refere que “ A revogação unilateral do mandato, segundo os conceitos comuns, aproxima-se da denúncia, pois confere-se a ambas as partes a faculdade de, por declaração unilateral e sem necessidade de invocar um motivo justificativo, fazer cessar o contrato. Contudo, enquanto a denúncia é exclusiva de contratos com duração indeterminada ou de prazo certo com renovação automática, a revogação unilateral pode ser exercida em relação a mandato com termo fixo (antes do decurso do prazo) ou de execução instantânea e, por outro lado, de forma diversa da denúncia, em que impera a autonomia das partes, a revogação do mandato tem natureza imperativa, embora limitada, não podendo ser totalmente excluída por convenção ou renúncia ao direito (artigo 1170º, n º 1 do Código Civil)”238.
A estipulação de tal forma de cessação no âmbito do contrato de mandato encontra a sua justificação no facto de o mandatário praticar atos por conta e no interesse do mandante, produzindo-se os efeitos de tais atos diretamente na esfera jurídica do mandante, diferentemente do que sucede no contrato de mediação imobiliária, em que, o mediador
238 Obra citada, p. 504.
atua por sua conta, embora no interesse do cliente, sendo este livre de celebrar ou não o contrato visado com o cliente angariado.
A este propósito refere Higina Xxxxxxx Xxxxxxx000 que “o mandante é que sabe se o ato continua a interessar-lhe e não pode ficar nesse aspeto dependente da vontade do mandatário”.
Ao invés, no âmbito do contrato de mediação imobiliária a prestação do mediador consiste em diligenciar pela obtenção de interessado ou em obrigar-se a tal desiderato, sendo que, uma vez alcançado tal objetivo, não fica o cliente “obrigado” à celebração do contrato visado, podendo desistir do mesmo, sem prejuízo do disposto no artigo 19º, n º 2 da Lei 15/2013.
Anote-se que, como defende Higina Orvalho Castelo, não se confunde a desistência do negócio visado por parte do cliente, com a revogação do contrato de mediação imobiliária, pois, a primeira está na disponibilidade do cliente, não ficando prejudicada, mesmo que se entenda não ser admissível a revogação unilateral de tal contrato.
Face à diferente natureza das prestações em causa no contrato de mandato e no contrato de mediação imobiliária, diremos que, não se nos afigura ser este regime similar para efeitos de integração da lacuna em causa.
Afastada a aplicação do regime do mandato, importa recorrer ainda ao regime previsto para o contrato de agência, a fim de apreciar se o mesmo pode ser aplicado por analogia.
O contrato de agência tal como o contrato de mediação imobiliária, insere-se, na classificação apresentada por Engrácia Antunes240, nos contratos de distribuição.
Tal como o contrato de mediação imobiliária, o contrato de agência tem por objeto promover a celebração de contratos, sendo este o traço mais relevante da noção de contrato de agência. À semelhança do contrato de mediação imobiliária, os contratos visados, não são celebrados pelo agente com os clientes, limitando-se aquele a promover e preparar a sua celebração futura pelo principal.
239 O contrato de mediação, p. 424.
240 Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, 2009, p. 435, refere que “Por contratos de distribuição comercial entendemos aqui genericamente aqueles contratos, típicos ou atípicos, que disciplinam as relações jurídicas entre o produtor e o distribuídos “lato sensu” com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro”. Tal autor acrescenta que “com o advento da produção industrial em série e do consumo em massa, o produtor foi confiando progressivamente a sujeitos especializados a tarefa de fazer chegar os seus bens e serviços às mãos do consumidor final, mormente a empresas especializadas na sua distribuição em mercado”.
Distingue-se o contrato de agência do contrato de mediação, desde logo, pelo facto de o mediador atuar por conta própria relativamente aos contraentes que aproxima, enquanto no contrato de agência o agente atua por conta do principal.
Ora, o contrato de agência aproxima-se do mandato no tocante à atuação por conta de outrem, e ainda assim, tal nota não conduziu à previsão da revogação unilateral no âmbito do regime do contrato de agência.
Não obstante as notas distintivas dos dois regimes (mediação imobiliária e agência) afigura-se-nos que, o traço relevante da caraterização das prestações de ambos os contratos se aproxima, ou seja, ambos têm por base “promover a celebração de contratos”, não sendo nem o mediador nem o agente que intervêm na celebração desses contratos, mas antes o cliente e o principal, respetivamente.
Considerando esta aproximação no tocante à “prestação” no âmbito dos dois regimes, diremos que, o contrato de agência se revela o regime similar do contrato de mediação imobiliária, pelo que, dever-se-á recorrer ao regime daquele, para integração, por analogia, no tocante às formas de cessação do contrato de mediação imobiliária.
Esta solução, de recurso à aplicação analógica do regime do contrato de agência, tem sido proposta para outros contratos de distribuição comercial, como o contrato de concessão comercial. A tal propósito, refere Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxx em anotação ao artigo 24º do DL 178/86 de 3 de julho, alterado pelo DL 118/93 de 13 de abril que “Embora consagradas a respeito da agência, estas formas de cessação do contrato, e respetivo regime, poderão vir a aplicar-se, por analogia, a outros contratos, como os de concessão e de franquia, por exemplo (…)”.
Vertendo ao regime do contrato de agência, diremos que, estabelece o artigo 24º do DL 178/86 de 3 de julho, alterado pelo DL 118/93 de 13 de abril que “O contrato de agência pode cessar por: a) acordo das partes; b) caducidade; c) denúncia; d) resolução”.
Ora, da leitura do citado normativo decorre que no âmbito do contrato de agência fica afastada a admissibilidade da revogação unilateral, sendo a denúncia apenas admissível no tocante aos contratos de duração indeterminada, nos termos do disposto no artigo 28º, n º1 do mesmo diploma241.
241 Estabelece o artigo 28º, x x0 xx XX 000/00 xx 0 xx xxxxx xxxxxxxx xxxx XX 118/93 de 13 de abril que “A denúncia só é permitida nos contratos celebrados por tempo indeterminado (…)”.
Contudo, quando referimos ser o regime mais similar não significa que o mesmo deve ser aplicado de forma acrítica, pois, o mesmo terá de ser compatibilizado com as especificidades de cada um dos regimes.
Nesta medida, diremos que, no tocante à denúncia prevista para o contrato de agência a mesma terá apenas aplicação quando o contrato seja de duração indeterminada (artigo 28º do citado diploma), o que significa que, a mesma não poderá ser aplicada ao contrato de mediação que tem sempre prazo, nos termos do artigo 16º, n º3 da Lei 15/2013, afastando-se aqui a possibilidade denúncia com pré-aviso prevista no contrato de agência, (mas não a possibilidade de denúncia para o termo do prazo entendida esta como oposição à renovação do contrato, no caso de ter sido convencionada a sua renovação automática, ou ainda no caso de não ter sido convencionada e o contrato continuar depois do decurso do prazo a ser executado, podendo entender-se que o mesmo a ter duração indeterminada, como sucede no contrato de agência).
Acresce que, no âmbito do contrato de agência em que o agente atua por conta do principal não é admissível a revogação unilateral, por maioria de razão também não será admissível no contrato de mediação em que a atuação do mediador é por conta própria relativamente aos contraentes que aproxima.
Tendo, em consideração a exposição que antecede, entendemos que ficará afastada a possibilidade de recorrer à revogação unilateral, no contrato de mediação imobiliária, seja na mediação simples ou em regime de exclusividade, tanto mais que tal forma de cessação só é aplicável nos casos expressamente previstos na lei242.
– Efeitos da (in) admissibilidade da revogação unilateral:
Os efeitos da posição que se adote de inadmissibilidade ou admissibilidade da revogação unilateral do contrato de mediação imobiliária, terão repercussões essencialmente ao nível do direito à remuneração por parte do mediador.
Os defensores da admissibilidade da revogação unilateral sustentam que tal significa que o cliente pode desistir livremente da celebração do contrato definitivo, ainda que já tenha sido angariado destinatário, ou de celebrar o contrato com outro interessado
242 Diremos ainda que, nessa medida, e caso tal regime se mostrasse previsto para o contrato de agência (o que não sucede), sempre estaria em causa uma norma excecional que não admitiria aplicação analógica.
(no caso da exclusividade simples), sem que lhe possa ser exigido o cumprimento da sua contraprestação (remuneração)243.
Por sua vez, os defensores da inadmissibilidade da revogação unilateral, distinguem diversas situações, consoante esteja em causa um contrato de mediação simples ou com cláusula de exclusividade244.
Assim, no caso de estarmos perante um contrato de mediação simples, se o cliente vier a celebrar o contrato visado, devido à atividade desenvolvida pela mediadora no período contratual e ainda que o mesmo, seja celebrado já depois de decorrido tal período (considerando até a revogação unilateral levada a cabo), o cliente terá de pagar a remuneração.
243 Neste sentido, vejam-se entre outros, o Acórdão da Relação de Lisboa de 3 de junho de 1977, CJ, II, tomo 3, p. 647 e segs.; Acórdão do STJ de 9 de março de 1978, BMJ 275, pp. 183 e segs. o Acórdão do STJ de 4 de março de 1980, BMJ, 295, p. 356 e segs; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17 de março de 2014, proferido no Pº 137/11.0TBPVZ.P1, CJ n º 253, Tomo II, 2014, Ref. 5854/2014, refere que “o contrato de mediação deve considerar-se revogável”, concluindo que, no caso “em que o cliente acorda com uma empresa comercial de mediação a angariação da venda de um imóvel, a partir do momento em que se desinteressa deste negócio, pode desvincular-se do contrato celebrado com aquela, atenta a própria natureza e os fins visados com o mesmo, sem prejuízo de, na falta de fundamento objetivo, a revogação poder dar lugar à obrigação de indemnizar”. Também o Acórdão da Relação do Porto de 15 de novembro de 2015, proferido no âmbito do Pº 131275/14.0YIPRT, CJ n º 266, Tomo V 2015, Ref. 9080/2015, o qual referindo o termo “denúncia” acaba por considerar admissível a revogação unilateral do contrato. Ainda no mesmo sentido dos arestos citados, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 3 de novembro de 2015, proferido no âmbito do Pº 115257/14.5YIPRT.C1, CJ, n º 266, Tomo V, 2015, Ref. 684/2015, o qual refere que “I- No contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade, a que não foi aposta a cláusula de irrevogabilidade, o comitente tem a faculdade de desistir do negócio inicialmente querido e de se desvincular unilateralmente do contrato, em face do princípio da liberdade contratual. II- Tendo o comitente desistido da venda e revogado o contrato de mediação, antes de lhe ser dado conhecimento de um interessado na compra do imóvel, o mediador não tem direito à remuneração convencionada; apenas poderá ter direito à indemnização pelos danos sofridos pela revogação ou denúncia antecipada”. Ainda no mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02/06/2016, Pº 266/14.9TJLSB.L1-2, que sumaria, “É de admitir a revogação unilateral ou a denúncia antecipada do contrato de mediação imobiliária, ainda que em regime de exclusividade, mas sem que seja estipulada qualquer cláusula de irrevogabilidade, por ser de presumir que o cliente não quer privar-se do direito de desistir do propósito de concluir o negócio promovido. Sendo a mediação, antes de mais uma prestação de serviços, haverá que fazer apelo às regras do mandato, com as necessárias adaptações, por força do preceituado no artigo 1156º Código Civil, se as regras daquela não regularem especificamente alguma situação”. Ao nível da doutrina, como já acima foi referido, são defensores da admissibilidade da revogação unilateral, entre outros, Xxxxxx Xxxxxxxx, Contrato de Mediação,
p. 254 e segs.; Xxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxx, obra citada, p. 102-3; Vaz Serra em anotação ao Acórdão do STJ de 07/03/1967, RLJ, 100, p. 345-6.
244 Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 7 de março de 1967, RLJ 100, p. 340 e segs. refere que, “O principio estabelecido na lei, da revogação unilateral dos contratos de mandato e de comissão não pode aplicar-se por analogia ao contrato de mediação, não só porque são profundamente diversos os contratos de mediação e os de mandato e comissão, mas também porque as disposições excecionais não podem aplicar-se analogicamente”; o Acórdão da Relação do Porto de 2 de junho de 2011, proferido no âmbito do Pº 141/09.9TBMAI.P1, CJ n º 231, Tomo III, 2011, Ref. 3116/2011, a propósito da celebração do negócio pelo cliente com terceiros, acaba por proceder à análise das formas de cessação do contrato de mediação imobiliária, concluindo pela inadmissibilidade da revogação unilateral. Ao nível da doutrina Higina Orvalho Castelo, Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado, 2015, p. 103 e 130 e segs.; O Contrato de Mediação, p. 423-424 e 430 e segs.
Já no caso de estarmos perante um contrato de mediação com cláusula de exclusividade, além de ser devida a remuneração na situação prevista para o contrato de mediação simples, a mesma será ainda devida no caso de o cliente celebrar contrato de mediação com outra mediadora e vier a celebrar o contrato visado com terceiro apresentado pela mediadora com quem celebrou o contrato de mediação inicial e durante a vigência deste (artigo 795º, n º2 do Código Civil).
Considerando a posição que acima adotámos (de inadmissibilidade de revogação unilateral do contrato de mediação imobiliária) ao nível dos efeitos decorrentes desta posição, diremos que, subscrevemos os salientados pela posição que sufraga o mesmo entendimento, ou seja, no caso de o cliente lançar mão da revogação unilateral, sem aceitação por parte do mediador (sem que esteja em causa a desistência do contrato visado, com a qual não se confunde) terá de remunerar o mediador, sempre que chegue a celebrar o contrato visado com o destinatário angariado no decurso do prazo do contrato, no caso da mediação simples.
No caso de estarmos perante um contrato de mediação com cláusula de exclusividade, além de ser devida a remuneração na situação prevista para o contrato de mediação simples, a mesma será ainda devida no caso de o cliente celebrar contrato de mediação com outra mediadora e vier a celebrar o contrato visado com terceiro apresentado pela mediadora com quem celebrou o contrato de mediação inicial e durante a vigência deste (artigo 795º, n º2 do Código Civil), na medida em que em virtude da celebração deste segundo contrato, tornou impossível a prestação por parte da mediadora com quem celebrou o contrato inicial.
Em suma, no tocante aos efeitos eles coincidem com os identificados pelos defensores desta posição de inadmissibilidade da revogação unilateral, ainda que, os argumentos que expendemos para concluir pela inadmissibilidade sejam diversos.
Conclusão.
O contrato de mediação imobiliária, desde o DL 285/92 de 19/12, passou a ser um contrato típico (ao contrário do contrato de mediação em geral o qual mantém a sua atipicidade), na medida em que o seu regime passou a estar previsto na lei, sendo o mesmo atualmente regulado pela Lei 15/2013.
Tal contrato pode assumir uma de duas modalidades: mediação simples ou em regime de exclusividade. No âmbito do contrato de mediação simples (sem cláusula de exclusividade) a mediadora tem a liberdade de desenvolver a atividade pretendida pelo cliente, não podendo ser obrigada a tal, mantendo, o cliente a liberdade de contratar outras mediadoras, bem como de celebrar o contrato com pessoa encontrada por outra mediadora. Diferentemente, no âmbito do contrato de mediação em regime de exclusividade a mediadora tem a obrigação de obter interessado no contrato e, o cliente assume a obrigação de não poder recorrer a outra mediadora para tal desiderato (exclusividade simples) ou mesmo de não poder celebrar o contrato visado com terceiro por si angariado (exclusividade reforçada).
O contrato de mediação imobiliária é um contrato oneroso, podendo ser unilateral ou bilateral, tendo natureza essencialmente comercial.
São notas caraterizadoras do contrato de mediação imobiliária: a incumbência de aproximar sujeitos para a realização do negócio visado; sendo, por regra, assumida pelo mediador uma obrigação de meios, podendo ser uma obrigação de resultado (obrigação de obter interessado); o contrato de mediação por via de regra é celebrado para um certo negócio (ocasionalidade) e é oneroso.
O contrato de mediação imobiliária apesar de ter notas em comum com outros regimes jurídicos distingue-se dos mesmos, designadamente do contrato de agência, concessão, franquia e de mandato.
Desde o DL 285/92 que passou a existir uma imposição legal de forma escrita, para o contrato de mediação imobiliária, sendo a mesma condição de validade, sendo a sua inobservância geradora de nulidade atípica do contrato, uma vez que não é invocável pela empresa mediadora.
O contrato de mediação imobiliária está sempre sujeita a prazo certo, mesmo na falta de estipulação das partes, nos termos do disposto no artigo 16º, n º3 da Lei 15/2013.
São sujeitos do contrato de mediação imobiliária, a empresa (pessoa singular ou coletiva) de mediação imobiliária (podendo esta ser auxiliada por colaboradores – técnicos e angariadores), os destinatários e os clientes.
A prestação a cargo da mediadora consiste “na procura de destinatários” para a realização de negócios que visem a “constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de
posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis” (artigo 2º, n º1 da Lei 15/2013).
Por sua vez, a prestação do cliente consiste na remuneração pelos serviços acordados com a empresa de mediação, a qual, depende da conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação nos termos do artigo 19º, n º1 da Lei 15/2013.
Além da conclusão e perfeição do negócio visado para que nasça o direito à remuneração, necessário se torna a verificação de um nexo de causalidade entre a atividade da mediadora e o contrato a final celebrado.
Não obstante a tipicidade deste regime, o certo é que o mesmo é omisso no tocante às formas de cessação do mesmo, as quais não se confundem com a possibilidade de o cliente desistir do negócio pretendido, sem prejuízo do disposto no artigo 19º, n º2 da Lei 15/2013.
Partindo da posição já assumida de que o contrato de mediação imobiliária tem natureza comercial, diremos que tal permite integrar as lacunas através do recurso aos diferentes regimes jurídicos similares, comerciais ou civis, consoante o conflito a dirimir, por analogia.
Em causa está o recurso à analogia, tendo por base o artigo 10º, n 1 do Código Civil, diremos que, para preenchimento da lacuna dever-se-á recorrer a normas que diretamente contemplem casos análogos245.
Sendo o propósito principal deste trabalho saber se a cessação unilateral do contrato de mediação imobiliária de forma discricionária é admissível, procedeu-se à análise do contrato de mandato, aplicável aos contratos de prestação de serviços, no qual o contrato de mediação imobiliária parece inserir-se. Estabelece o artigo 1170º do Código Civil que “1- O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário, ou renúncia ao direito de revogação. 2- Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa”.
A estipulação de tal forma de cessação no âmbito do contrato de mandato encontra a sua justificação no facto de o mandatário praticar atos por conta e no interesse do mandante, produzindo-se os efeitos de tais atos diretamente na esfera jurídica do mandante, diferentemente do que sucede no contrato de mediação imobiliária, em que, o mediador
245 Veja-se, a propósito do conceito de casos análogos a nota 45.
atua por sua conta, embora no interesse do cliente, sendo este livre de celebrar ou não o contrato visado com o cliente angariado.
Ao invés, no âmbito do contrato de mediação imobiliária a prestação do mediador consiste em diligenciar pela obtenção de interessado ou em obrigar-se a tal desiderato, sendo que, uma vez alcançado tal objetivo, não fica o cliente “obrigado” à celebração do contrato visado, podendo desistir do mesmo, sem prejuízo do disposto no artigo 19º, n º 2 da Lei 15/2013.
Face à diferente natureza das prestações em causa no contrato de mandato e no contrato de mediação imobiliária, diremos que, não se nos afigura ser este regime similar para efeitos de integração da lacuna em causa.
Afastada a aplicação do regime do mandato, passou-se à análise do regime previsto para o contrato de agência, a fim de apreciar se o mesmo pode ser aplicado por analogia.
Tal como o contrato de mediação imobiliária, o contrato de agência tem por objeto promover a celebração de contratos, sendo este o traço mais relevante da noção de contrato de agência. À semelhança do contrato de mediação imobiliária os contratos visados não são celebrados pelo agente com os clientes, limitando-se aquele a promover e preparar a sua celebração futura pelo principal.
Distingue-se o contrato de agência do contrato de mediação, desde logo, pelo facto de o mediador atuar por conta própria relativamente aos contraentes que aproxima, enquanto no contrato de agência o agente atua por conta do principal.
Ora, o contrato de agência aproxima-se do mandato no tocante à atuação por conta de outrem, e ainda assim, tal nota não conduziu à previsão da revogação unilateral no âmbito do regime do contrato de agência.
Não obstante as notas distintivas dos dois regimes afigura-se-nos que, o traço relevante da caracterização das prestações de ambos os contratos se aproxima, ou seja, ambos têm por base “promover a celebração de contratos”, não sendo nem o mediador nem o agente que intervêm na celebração desses contratos, mas antes o cliente e o principal, respetivamente. Considerando esta aproximação dos dois regimes, diremos que, ao nível das formas de cessação, o contrato de agência revela-se o regime similar do contrato de mediação imobiliária.
Acresce que, no âmbito do contrato de agência em que agente atua por conta do principal não é admissível a revogação unilateral, por maioria de razão também não será
admissível no contrato de mediação em que a atuação do mediador é por conta própria relativamente aos contraentes que aproxima.
Assim, diremos que, se nos afigura ser de recorrer ao contrato de agência, por analogia, no que diz respeito às formas de cessação do contrato de mediação imobiliária, considerando ser este regime o mais similar.
Contudo, quando referimos ser o regime mais similar não significa que o mesmo deve ser aplicado de forma acrítica, pois, o mesmo terá de ser compatibilizado com as especificidades de cada um dos regimes.
Nesta medida, concluímos que, no tocante à denúncia prevista para o contrato de agência a mesma terá apenas aplicação quando o contrato seja de duração indeterminada (artigo 28º do citado diploma), o que significa que, a mesma não poderá ser aplicada ao contrato de mediação que tem sempre prazo, nos termos do artigo 16º, n º3 da Lei 15/2013, afastando-se aqui a possibilidade denúncia com pré-aviso prevista no contrato de agência, mas não a possibilidade de denúncia para o termo do prazo.
Tendo, em consideração a exposição que antecede, entendemos que ficará afastada a possibilidade de recorrer à revogação unilateral, no contrato de mediação imobiliária (quer no seu regime simples, quer no regime de exclusividade), tanto mais que tal forma de cessação só é aplicável nos casos expressamente previstos na lei.
Considerando a posição adotada, no caso de o cliente lançar mão da revogação unilateral, sem aceitação por parte do mediador (sem que esteja em causa a desistência do contrato visado, com a qual não se confunde) terá de remunerar o mediador, sempre que chegue a celebrar o contrato visado com o destinatário angariado no decurso do prazo do contrato, no caso da mediação simples.
No caso de estarmos perante um contrato de mediação com cláusula de exclusividade, além de ser devida a remuneração na situação prevista para o contrato de mediação simples, a mesma será ainda devida no caso de o cliente celebrar contrato de mediação com outra mediadora e vier a celebrar o contrato visado com terceiro apresentado pela mediadora com quem celebrou o contrato de mediação inicial e durante a vigência deste (artigo 795º, n º2 do Código Civil), em virtude de, com tal comportamento, ter tornado impossível a realização da prestação por parte da mediadora inicial.
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