GIOVANNA MONTELLATO STORACE ROTA
XXXXXXXX XXXXXXXXXX STORACE ROTA
Anualidade orçamentária e contratos administrativos
Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós- Graduação em Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, na área de concentração Direito Econômico, Financeiro e Tributário, sob orientação do Professor Associado Dr. Xxxx Xxxxxxxx Xxxxx.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE DIREITO
São Paulo - SP 2018
3. ANUALIDADE E PLURIANUALIDADE ORÇAMENTÁRIA171
3.1. Anualidade orçamentária
A anualidade orçamentária determina que o orçamento público seja elaborado e aprovado anualmente, contendo a previsão das receitas que serão arrecadadas e das despesas que serão executadas no período de um ano, o exercício financeiro.
Dessa forma, a anualidade orçamentária está relacionada aos dois elementos essenciais do orçamento público: a limitação no tempo e a autorização legislativa. Ao determinar a periodicidade com a qual o orçamento público deve ser elaborado, aprovado e executado, a anualidade orçamentária concretiza sua limitação no tempo e torna efetiva a autorização legislativa, ao exigir que esta seja constantemente renovada.
Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx-Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxx-Xxxxxx Xxxxxxx fazem referência a uma dupla dimensão da anualidade orçamentária, pois determina a duração da autorização orçamentária e da execução do próprio orçamento.172
Xxxxxxx Xxxxxx xxxxxx que é com a anualidade orçamentária que os representantes parlamentares nacionais ou locais exercem suas competências em matéria de autorização orçamentária, mas também de controle e avaliação das finanças públicas.173
Ainda, a anualidade orçamentária é a concretização da natureza temporária da lei orçamentária, uma de suas características peculiares em relação às demais leis.174 - 175
No ordenamento jurídico brasileiro, a anualidade orçamentária é referida como princípio no artigo 2º, da Lei nº 4.320/64, que prescreve que “[a] Lei do
171 Parte das considerações desta seção são fruto de um desenvolvimento mais aprofundado de trabalho de Xxxx xx Xxxxxx intitulado Anualidade orçamentária e planejamento da Administração Pública, apresentado pela autora para obtenção do título de graduada em Direito na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no ano de 2014.
172 XXXXXXX, Xxxxxx; XXXXXXXXX, Xxxxx-Xxxxxxxxx; e XXXXXXX, Xxxx-Xxxxxx. Finances Publiques. 12ème ed. Paris: LGDJ, 2013, p. 284.
173 XXXXXX, Xxxxxxx. Les principes budgétaires et comptables publics. Paris: LGDJ, 2009, p. 83.
174 XXXXX, Xxxx Xxxxxxxx. Orçamento impositivo..., p. 157.
175 Cabe observar que as leis orçamentárias não são as únicas leis de natureza temporária no ordenamento jurídico. Existem outras leis temporárias – que tem seu prazo de vigência pré- estabelecido – e, ainda, as leis excepcionais – que regulam situações específicas e transitórias e também são consideradas como leis temporárias em sentido amplo. Contudo, para as leis orçamentárias, nota-se a particularidade de que a sua natureza temporária é imposta pela própria Constituição Federal.
Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar a política econômica financeira e o programa de trabalho do Govêrno, obedecidos os princípios de unidade, universalidade e anualidade”.
Já no nível constitucional, a anualidade não é referida nominalmente como princípio, mas como o próprio prazo de vigência do orçamento, veiculado por lei orçamentária anual, conforme se extrai do artigo 165, III, da Constituição Federal, segundo o qual “[l]eis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: [...] os orçamentos anuais”, e do parágrafo 5º desse mesmo artigo que prevê que a “lei orçamentária anual” compreenderá o orçamento fiscal, o orçamento de investimentos e o orçamento da seguridade social.
A doutrina jurídica brasileira elenca, de forma recorrente, a anualidade como um dos princípios que orientam os orçamentos públicos,176 embora as considerações sobre o tema sejam diversas entre os autores.
Xxxxxxxxx Xxxx’Xxxx x Xxxxx e Xxxxx Xxxxxxxxx remetem o surgimento da anualidade orçamentária à anualidade tributária, segundo a qual a autorização legislativa para a cobrança de tributos deveria ser renovada anualmente.177
Considerando essa origem e o fundamento para a existência da anualidade orçamentária, ou seja, a necessidade de autorização legislativa periódica para a cobrança de tributos e, posteriormente, para a realização de despesas públicas, diversos autores178 tratam a anualidade orçamentária como a periodicidade historicamente consagrada de modo anual.
Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx destaca que a anualidade orçamentária tem importância política, financeira e econômica. Do ponto de vista político, a
176 Cf. XXXXXXXX, Xxxxxxx. Uma Introdução à Ciência das Finanças..., pp. 419 – 420; XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 9ª ed. atual. e ampl. São Paulo: Xxxxx Xxxxxx Editor, 2002, pp. 46 – 47; XXXXXX, Xxxxxxx de. Direito financeiro e orçamentário. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, pp. 57 – 58; XXXXXXXX, Xxxxx xx Xxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxx. Orçamento público..., p. 74; XXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx de. O orçamento a partir de seus princípios..., pp. 87 – 90; XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx xx. Reflexão sobre o conflito entre princípios orçamentários. Interesse Público. Belo Horizonte, ano 12, n. 63, p. 95 – 102, set./ out. 2010; XXXXXX, Xxxxxxx. Direito financeiro e tributário..., pp. 67 – 68; XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx de. Curso de Direito Financeiro..., pp. 363 – 364; XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx. Orçamento-programa..., pp. 132 – 134; XXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxx’Xxxx e. Os princípios orçamentários. Rio de Janeiro: Fundação Xxxxxxx Xxxxxx, 1962, pp. 34 – 39; XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Direito constitucional financeiro: teoria da Constituição Financeira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, pp. 375 – 376; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxx. Tratado de Direito..., pp. 329 – 330.
177 XXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxx’Xxxx e. Op. cit., pp. 34 – 36 e XXXXXXXXX, Xxxxx. Op. cit., pp. 73 –
74.
178 Cf. CARVALHO, José Augusto Moreira de. Op. cit., p. 87; XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx. Op. cit., pp. 132 – 133; XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx de. Op. cit., p. 364; XXXXXX, Xxxxxxx. Op. cit., p. 67; XXXXX, Xxxxxxxxx xx Xxxx’Xxxx e. Op. cit., p. 34.
periodicidade permite a intervenção do Congresso Nacional na atividade financeira do Estado, o que é relevante tanto pela sua função de controle, quanto por configurar uma limitação ao Poder Executivo, se tornando um elemento democrático. Já do ponto de vista financeiro, a periodicidade permite marcar o período durante o qual são contabilizadas as receitas arrecadadas e estabelecidas as despesas autorizadas, visando uma execução orçamentária adequada e com os respectivos balanços e controles de resultados. Por fim, do ponto de vista econômico, a importância da periodicidade reside no fim de prever as flutuações cíclicas dos processos econômicos e adequar o orçamento público a essas variações, o que evidencia uma relação com a função de planejamento do orçamento público.179
O autor reconhece que a adoção da periodicidade anual se justifica pela conveniência do ponto de vista político e financeiro, o que levou à consagração da periodicidade como a própria anualidade. Um período mais longo prejudicaria a aprovação e o controle político, com maior discricionariedade do Poder Executivo na elaboração e na execução orçamentária e, por outro lado, um período mais curto seria insuficiente para arrecadar os tributos, contabilizar as receitas e executar as despesas.180
A consideração da anualidade como elemento para o exercício do controle político também é feita por Xxxxxxx Xxxxxxxx, segundo o qual “[t]odos eles [os princípios orçamentários], em sua essência, visam a resguardar a função política do orçamento como plano de governo que o Legislativo aprova para fiel execução pelo Executivo”181.
Para Xxxxxxx Xxxx Xxxxxx,
[o] princípio da anualidade orçamentária sinaliza no sentido de que o Legislativo deve exercer o controle político sobre o Executivo pela renovação anual da permissão para a cobrança dos tributos e a realização dos gastos, sendo inconcebível a perpetuidade ou a permanência da autorização para a gestão financeira.182
Para Xxxxxx Xxxxxx, Xxxxxx Xxxxx e Xxxxxx Xxxxx,
179 XXXXX, Xxxx Xxxxxx da. Orçamento-programa..., pp. 132 – 133.
180 Ibidem, pp. 133 – 134.
181 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Uma Introdução à Ciência das Finanças..., p. 420.
182 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxx. Tratado de Direito..., p. 329.
[a] separação entre quais são os recursos provenientes do exercício orçamentário que se finda e os recursos que integram o exercício orçamentário que se inicia é fundamental para que seja possível o processo de fiscalização da atividade financeira da Administração Pública, e que interessa não só àquele que fiscaliza como também àquele beneficiário de crédito constituído e reservado orçamentariamente em um determinado período de tempo.183
Por outro lado, alguns autores focam na importância financeira da anualidade orçamentária ao abordarem a temática. Segundo Xxxxx Xxxxxxxx, Xxxxxxx Xxxxxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxxx,
[a] anualidade prescreve que a dinâmica orçamentária deve ser cíclica em um ano, com gastos e arrecadação com começo e término dentro desse período contábil. Tal sistemática serve para facilitar o planejamento e a execução orçamentária, o que seria bem mais complicado se tivesse um prazo muito longo (cinco anos, por exemplo) ou muito curto.184
Outros elementos relacionados, pela doutrina jurídica brasileira, à anualidade orçamentária são a segurança jurídica e a possibilidade de revisão do orçamento.
Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxx nota que a anualidade orçamentária está ligada ao princípio da segurança jurídica pois estabelece limites temporais ao poder de intervenção do Estado.185
Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx destaca a importância da anualidade pois ela permite definir no tempo os efeitos do orçamento e gera a necessidade de elaboração do orçamento de forma antecipada à realização dos gastos públicos.186
183 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx; XXXXX, Xxxxxx. Princípio da anualidade orçamentária aplicado ao prazo dos contratos administrativos regidos pela Lei 8.666/93. In: Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, v. 17, n. 87, p. 11 – 65, jul./ ago. 2009, p. 44.
184 XXXXXXXX, Xxxxx xx Xxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx; SILVEIRA, Xxxxxxxxx Xxxxx.
Orçamento público..., p. 74.
185 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx. Curso de Direito Financeiro e Tributário..., p. 47.
186 XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Direito constitucional financeiro..., p. 375.
Já Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx e Xxxxxxx xx Xxxxxx observam que esse princípio pressupõe uma revisão periódica do conteúdo da lei orçamentária, permitindo seu ajuste às mudanças sociais e econômicas.187
Por fim, cabe colocar que diversos autores tratam, ao lado da anualidade orçamentária, de uma plurianualidade orçamentária, por vezes chamada de princípio e geralmente relacionada à previsão constitucional do PPA e à necessidade de planejamento, questões que serão abordadas posteriormente nesse trabalho.
3.2. Exercício financeiro
Exercício financeiro é o período definido para a contabilização das receitas arrecadadas e despesas realizadas. Em razão da adoção da anualidade orçamentária, o exercício financeiro no Brasil tem a duração de um ano.
A Constituição Federal remete à lei complementar dispor sobre o exercício financeiro.188 Na ausência dessa lei complementar, o assunto é regulado pelo artigo 34, da Lei nº 4.320/64189, que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de lei complementar e determina que o exercício financeiro coincidirá com o ano civil (1º de janeiro a 31 de dezembro).
Muitos países adotam a anualidade orçamentária, contudo, nem sempre o exercício financeiro coincide com o ano civil, a exemplo dos Estados Unidos, da Inglaterra e do Japão. Além do Brasil, países como França e Argentina, dentre outros, adotam a coincidência entre o exercício financeiro e o ano civil.190
3.3. Regimes de receitas e despesas
O regime contábil de receitas ou despesas determina a forma pela a qual essas serão contabilizadas. O ordenamento jurídico brasileiro adotou um regime
187 XXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx de. O orçamento a partir de seus princípios..., p. 87 e XXXXXX, Dejalma de. Direito financeiro e orçamentário..., pp. 57 – 58.
188 Constituição Federal. “Art. 165. [...] § 9º Cabe à lei complementar:
I - dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano
xxxxxxxxxx, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual”.
189 Lei nº 4.320/64. “Art. 34. O exercício financeiro coincidirá com o ano civil”.
190 Cf. CARVALHO, André de Castro; XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxx; SILVEIRA, Xxxxxxxxx Xxxxx. Orçamento público..., p. 74; XXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx de. Op. cit., p. 88; XXXXXXXXX, Xxxxx. Orçamento Público..., p. 74; XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx. Orçamento-programa..., pp. 134 – 135.
misto, que determina o regime de caixa para as receitas e o regime de competência para as despesas públicas.191
Isso significa que as receitas são “registradas levando-se em consideração o momento de entrada do numerário no caixa da entidade”192, ou seja, as receitas são contabilizadas no exercício financeiro em que foram efetivamente arrecadadas. Já as despesas são “imputadas ao correspondente período de apuração”193, ou seja, ao exercício financeiro em que são empenhadas, ainda que
o pagamento efetivo seja realizado em momento posterior.
3.4. Despesas plurianuais
Em sentido estrito, despesas plurianuais seriam aquelas que se prolongam por mais de um exercício financeiro. Ainda, existem despesas que, apesar de terem duração inferior a um ano, extrapolam o limite de um exercício financeiro, gerando consequências em face da anualidade orçamentária e compondo, em um sentido amplo, o que se considera por despesas plurianuais.
Sobre as despesas plurianuais em sentido amplo, o artigo 167, parágrafo 1º, da Constituição Federal estabelece que “[n]enhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade”.
A Lei de Responsabilidade Fiscal traz previsão no mesmo sentido, vedando que a LOA consigne dotação orçamentária para investimento com duração superior a um exercício financeiro que não esteja previsto no PPA ou em lei que autorize a sua inclusão.194
191 Lei nº 4.320/64. “Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I - as receitas nêle arrecadadas;
II - as despesas nêle legalmente empenhadas”.
192 XXXXXXX, Xxxx xx Xxxxxxx Xxxxxx. O regime de execução da despesa orçamentária. In: Fórum de Contratação e Gestão Pública, Belo Horizonte, ano 7, n. 84, p. 45 – 47, dez. 2008, p. 45.
193 Ibidem, p. 45.
194 Lei Complementar nº 101/00. “Art. 5º [...] § 5º A lei orçamentária não consignará dotação para investimento com duração superior a um exercício financeiro que não esteja previsto no plano plurianual ou em lei que autorize a sua inclusão, conforme disposto no § 1º do art. 167 da Constituição”.
Considerando que o PPA não tem força executória, essas despesas plurianuais, ainda que estejam previstas nessa lei orçamentária, dependem de inclusão em sucessivas LOAs para serem autorizadas e executadas.
Essa situação demonstra um ponto de conflito do sistema orçamentário brasileiro, como evidenciam Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx:
a cada ano o Congresso Nacional aprova uma dotação orçamentária correspondente a uma fração do necessário para concluir um projeto de execução plurianual, procedimento que precisa ser repetido até o término de sua execução.195
Os autores ainda relatam que essa é uma das causas para a ocorrência de obras inacabadas, pois as frações anuais das despesas dos projetos podem não ser inclusas na LOA, deixando-os sem os recursos necessários para a sua conclusão. Em diversos países, essa autorização legislativa é dada uma única vez, considerando-se o valor total do projeto – e não a cada fração anual –, de modo que a autorização para inclusão da fração da despesa nos anos subsequentes seja dispensada ou se torne quase automática. No Brasil, segundo os autores, seria necessária uma emenda constitucional para lidar com a questão, tendo em vista a previsão constitucional dos orçamentos anuais.196
Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx levanta outro ponto relacionado com a questão:
com as recentes transformações qualitativas e quantitativas das funções e responsabilidades do Estado, a flexibilização da anualidade orçamentária se mostrou mais atraente quando programações de longo prazo passaram a demandar garantias de financiamento seguro dos empreendimentos dessa natureza, deslindo, em consequência, tais programações da sujeição aos azares de uma concessão anual pelo Parlamento dos recursos correspondentes. Resumindo, o longo prazo na execução de determinadas programações tornou-se imperativo à administração pública como requisito essencial para o Estado exercer com
195 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx; XXXXXX, Xxxx Xxxxxxx. A Lei 4.320 e a responsabilidade orçamentária. In: XXXXX, Xxxx Xxxxxxxx; SCAFF, Xxxxxxxx Xxxxxx (coord.). Orçamentos Públicos e Direito Financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 501.
196 Ibidem, p. 501.
eficiência e segurança suas hodiernas funções e responsabilidades.197
Essas considerações serão melhor exploradas mais adiante.
Tendo em vista a relevância da situação para o escopo desse trabalho, pretende-se, nessa subseção, detalhar as disposições legislativas que fazem referências a despesas que extrapolam um exercício financeiro e representam, em alguma medida, exceções à anualidade orçamentária.198
3.4.1. Programas de duração continuada
A noção de programas de duração continuada foi incluída no ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição Federal de 1998, ao determinar que o PPA deve estabelecer as diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública para as despesas relativas aos programas de duração continuada.199
Para Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, essa previsão concretiza uma atuação governamental baseada no planejamento, vinculando recursos para projetos plurianuais, de modo a garantir a continuidade dessas ações estatais.200
Apesar de ser ponto essencial no conteúdo do PPA, o conceito de “programas de duração continuada” não é objeto de disposições normativas mais completas, notadamente em face da ausência de um tratamento normativo mais detalhado do PPA.201
Isto posto, cabe a observação de Xxxxxx Xxxxxxx:
197 RIBEIRO. Xxxxxxxx Xxxxx. Impactos da anualidade orçamentária na alocação de recursos públicos. 2010. 42 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Orçamentos Públicos) – Instituto Serzedello Corrêa, 2010, p.17.
198 Cabe observar que os artigos 23 a 26, da Lei nº 4.320/64, que tratavam das “previsões plurienais” e do “Quadro de Recursos e de Aplicação de Capital”, não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, tendo em vista sua substituição pelo PPA e pela LDO. Sobre o assunto, cf. XXXXX, Xxxx Xxxxxxxx (org.). Orçamentos públicos: a Lei 4.320/64 comentada. 2ª ed. atual. e rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 98 – 106.
199 Constituição Federal. “Art. 165. [...] § 1º A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada”.
200 XXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. Orçamento impositivo...pp. 313 – 314.
201 Lembra-se que o PPA, assim como a LDO, foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição Federal de 1988. Na ausência de nova lei complementar sobre orçamentos públicos, foi recepcionada a Lei nº 4.320/64 que, por ser anterior à Constituição, não traz previsões relativas ao PPA. Para agravar a situação, o artigo 3º, da LRF, que tratava do PPA, foi vetado, fazendo com que haja completa anomia legislativa infraconstitucional sobre essa lei orçamentária.
[n]a verdade, exceto os investimentos, que tem prazos de início e conclusão, boa parte das ações governamentais são continuadas, como, por exemplo, manutenção e conservação de obras, ações de natureza social. Como então colocar no plano governamental todo esse enorme contingente de despesas que têm uma natureza de se prolongarem no tempo. Sobre esse aspecto, o governo federal dá uma interpretação restritiva considerando ações de natureza continuada apenas aquelas despesas advindas de programas de natureza finalística, que correspondam a prestação de serviços à comunidade. É uma forma de tentar compreender o que quis dizer o legislador constituinte dando interpretação mais restritiva ao dispositivo.202
Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx também aponta que uma interpretação literal da previsão constitucional sobre o PPA faria com que praticamente todas as despesas, tanto correntes como de capital, constassem dessa lei orçamentária, retirando em grande parte os seus objetivos específicos e sua diferenciação perante a LOA, sugerindo o autor que o PPA deva se restringir ao planejamento estratégico.203
3.4.2. Despesas obrigatórias de caráter continuado
Apesar da semelhança no nome, as despesas obrigatórias de caráter continuado não se confundem com os programas de duração continuada.
Elas estão previstas no artigo 17, da LRF204, e consistem em despesas correntes derivadas de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que
202 XXXXXXX, Xxxxxx. Orçamento, eficiência e performance budget..., p. 704.
203 XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx de. PPA versus orçamento..., pp. 679 – 681.
204 Lei Complementar nº 101/00. “Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.
§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.
§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.
§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.
fixem a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios financeiros.
Desse modo, as despesas obrigatórias de caráter continuado diferenciam- se dos programas de duração continuada por i) serem efetivamente despesas, enquanto os programas de duração continuada, como o próprio nome caracteriza, são programas aos quais são referidas despesas; ii) serem sempre despesas correntes, enquanto os programas de duração continuada podem ser referentes também a despesas de capital; iii) derivarem de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo, enquanto as despesas dos programas de duração continuada podem ter outro fundamento.
No mais, se adotada a interpretação restritiva do conceito de programas de duração continuada, acima mencionada, esses só englobam despesas de natureza finalística, enquanto as despesas obrigatórias de caráter continuado podem fazer frente à atividades-meio.
Por fim, enquanto a previsão normativa dos programas de duração continuada, ao exigir sua inclusão no PPA, parece direcionar para um objetivo de planejamento da ação estatal, as previsões da LRF a respeito das despesas obrigatórias de caráter continuado têm por objetivo mapear a sua expansão, garantir receitas para o seu custeio e minimizar seus riscos ao equilíbrio fiscal.
3.4.3. Créditos especiais e extraordinários
O artigo 167, parágrafo 2º, da Constituição Federal205, prevê que os créditos especiais e extraordinários, já tratados nesse trabalho, têm vigência no exercício financeiro em que forem autorizados, contudo, prevê que, no caso do ato de autorização ser promulgado nos últimos quatro meses do exercício financeiro, esses créditos serão incorporados ao orçamento do exercício financeiro subsequente, sendo reabertos nos limites dos seus saldos.
§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.
§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.
§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado”.
205 Constituição Federal. “Art. 167 [...] § 2º Os créditos especiais e extraordinários terão vigência no exercício financeiro em que forem autorizados, salvo se o ato de autorização for promulgado nos últimos quatro meses daquele exercício, caso em que, reabertos nos limites de seus saldos, serão incorporados ao orçamento do exercício financeiro subsequente”.
Esse é o caso mais marcante de exceção à anualidade orçamentária no ordenamento jurídico brasileiro, vez que permite que a autorização legislativa para determinada dotação orçamentária, relativa a créditos especiais e extraordinários, seja, de fato, transposta para o exercício financeiro seguinte e incorporada ao seu orçamento.
Apesar do caso ser notável, deve-se observar sua excepcionalidade. A medida se justifica em face da natureza de imprevisão e imprevisibilidade, respectivamente, dos créditos especiais e extraordinários, e do fato de que a proposta da LOA para o exercício financeiro subsequente deve ser enviada até quatro meses antes do final do exercício financeiro, de modo que, surgindo a necessidade desses créditos após esse marco temporal, não seria fácil ou possível incluí-los na próxima LOA.206
3.4.4. Restos a pagar
Os restos a pagar consistem nas despesas empenhadas, mas não pagas até o final do exercício financeiro.207 Como são despesas que não foram totalmente executadas dentro de um exercício financeiro, encaixam-se, pelo menos, no conceito de despesas plurianuais em sentido amplo, mas também podem ser decorrentes de despesas plurianuais em sentido estrito.
Como se tratam de despesas orçamentárias previstas para um exercício financeiro, em determinada LOA, que serão em parte executadas somente no exercício financeiro seguinte, regido já por outra LOA, os restos a pagar representam uma exceção à anualidade orçamentária.
Os restos a pagar se classificam em processados, quando são liquidados no mesmo exercício financeiro do empenho, e não processados, quando não liquidados.
206 Isso porque, de acordo com o artigo 166, parágrafo 5º, da Constituição Federal, o Presidente da República só pode propor modificação nos projetos das leis orçamentárias enquanto não iniciada a votação, na CMO, da parte do projeto sobre o qual incide a alteração: Constituição Federal. “Art. 166 [...] § 5º O Presidente da República poderá enviar mensagem ao Congresso Nacional para propor modificação nos projetos a que se refere este artigo enquanto não iniciada a votação, na Comissão mista, da parte cuja alteração é proposta”.
207 Lei nº 4.320/64. “Art. 36. Consideram-se Restos a Pagar as despesas empenhadas, mas não pagas até o dia 31 de dezembro distinguindo-se as processadas das não processadas”.
A LRF também disciplina os restos a pagar, vedando que os titulares de Poder, Tribunal de Contas ou Ministério Público assumam, nos últimos dois quadrimestres de seus mandatos, despesas que não possam ser integralmente cumpridas dentro dele, ou que tenham parcelas a serem pagas no exercício financeiro seguinte sem que haja disponibilidade de caixa suficiente.208
Esse dispositivo reconhece que os restos a pagar podem representar um risco ao equilíbrio das contas públicas e limita-os, homenageando o princípio do equilíbrio orçamentário. Contudo, cabe a crítica de Michel Haber, Xxxxxx Xxxxxxxxxxxxx e Xxxxxxx Xxxxxx de que “a previsão deveria contemplar a análise do resultado ao final de cada período anual”209, vez que essa vedação não impede um descontrole dos restos a pagar no período do mandato anterior aos últimos dois quadrimestres.210
De fato, no início da década de 2010, observou-se um crescimento significativo das despesas inscritas em restos a pagar, chegando-se a falar na existência de um “orçamento paralelo” ao aprovado pelo Poder Legislativo para determinado exercício financeiro.211
Embora o volume dos restos a pagar tenha diminuído nos últimos anos,212 a recorrência desse expediente ainda não se mostra adequada à sua excepcionalidade jurídica, situação que está intimamente ligada aos vícios no manejo dos instrumentos de flexibilização da execução orçamentária.
O uso indiscriminado da limitação de empenho e movimentação financeira, ou seja, fora da hipótese justificadora trazida pela LRF, faz com que despesas orçamentárias fiquem “contingenciadas” pela maior parte do exercício financeiro,
208 Lei Complementar nº 101/00. “Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.
Parágrafo único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e
despesas compromissadas a pagar até o final do exercício”.
209 HABER, Xxxxxx; XXXXXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx.
Despesa Pública..., p. 53.
210 Sobre o assunto, ver também XXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxx. As despesas públicas na virada dos exercícios financeiros. In: Revista da Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 343 – 386, jan./ dez. 2013, pp. 376 – 380.
211 Cf. XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx. A transparência na inscrição dos restos a pagar. 2012. 37 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Orçamentos Públicos) – Instituto Serzedello Corrêa, 2012, p. 24 e MENEZES, Dyelle. Recorde: “Orçamento paralelo” deve somar R$ 240,1 bilhões em 2014. In: Contas Abertas, 04 jan. 2014.
212 BRASIL. Ministério da Fazenda; Secretaria do Tesouro Nacional. Avaliação dos Restos a pagar
– Ano 2017. Brasília, Ministério da Fazenda, 2017, p. 5.
sendo postergadas em descumprimento da programação financeira e do cronograma de execução mensal de desembolso.
Com a aproximação do final do exercício financeiro, tais despesas são “liberadas” e tem-se início uma “corrida” para realizar o empenho, a fim de não se perder a autorização legislativa contida na LOA para essas dotações orçamentárias.213 - 214
Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx também destaca o
abarrotamento no final do exercício de restos a pagar, fazendo com que a gestão de licitações e contratos/convênios seja temerária, por ter de ‘correr contra o tempo’ antes do encerramento da execução orçamentária e, por conseguinte, do exercício financeiro.215
Nesse cenário, é provável que essas despesas percam em qualidade, planejamento e eficiência por serem realizadas “às pressas” e, como não haverá tempo hábil para realizar sua liquidação e pagamento, serão acrescidas aos restos a pagar.216
Além de ser uma consequência dos contingenciamentos preventivos, a inscrição de despesas em restos a pagar é motivada por dois fatores.
Não obstante as despesas orçamentárias sejam contabilizadas pelo regime de competência, o superávit primário do governo federal é calculado pelo regime de caixa. Dessa forma, ao postergar despesas e o seu consequente pagamento, contribui-se para a formação de um (falso) resultado positivo de superávit primário e o cumprimento de metas macroeconômicas.217
Por outro lado, as despesas empenhadas, mesmo não pagas, são
consideradas como recursos públicos “investidos”, em especial para áreas como
213 Como constatado por Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx, em análise realizada sobre a execução orçamentária e financeira mensal federal entre os anos de 2004 e 2009, há uma grande concentração de empenhos e pagamentos no último trimestre do ano (XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx. Impactos da anualidade orçamentária..., p. 31). Esse diagnóstico não é exclusivo para o Brasil. Na Inglaterra, onde o exercício financeiro se encerra em março, o fenômeno é conhecido como “March Madness” (cf. XXXXXXX, Xxxx et al. Annuality in public budget – An explatory study. London: CIMA
- The Chartered Institute Of Management Accounts, 2005, p. 5).
214 XXXXX, Xxxx Xxxxxxxx. Natal é tempo de correr com a execução orçamentária..., p. 137 – 139.
215 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. Judicializar o orçamento aprimorará as políticas públicas...
216 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx. Impactos da anualidade orçamentária..., p. 13.
217 HABER, Xxxxxx; XXXXXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx.
Despesa Pública..., p. 52.
saúde e educação que possuem gastos mínimos obrigatórios e geram pressões políticas, apesar da possibilidade de posterior cancelamento dessas despesas inscritas em restos a pagar.218
De todo modo, Xxxxxx Xxxxxxxx lembra que a atividade da administração pública é contínua e não é simples dividi-la em partes anuais. Por isso, assevera que:
[e]xiste – e precisa existir – uma forma de flexibilizar a despesa pública na divisa dos exercícios financeiros. Há serviços contratados, contínuos ou não, como elaboração de um parecer, a prestação de serviços de fornecimento de água, luz e telefone, nos quais não se consegue dividir o que foi efetivamente prestado até 31 de dezembro.219
O autor ressalta a importância da possibilidade de inscrição de restos a pagar não processados, para conceder maior facilidade no trato das despesas em final de exercício financeiro. Contudo, detalha que se trata de exceção, que tem sido amplamente utilizada criando, para o exercício financeiro seguinte, um “orçamento paralelo” à LOA com montantes significativos, deturpando as prioridades estabelecidas pela LDO e prejudicando o equilíbrio das finanças públicas. E conclui, Xxxxxx Xxxxxxxx, que a conta de restos a pagar deveria se prestar apenas à resíduos de caixa, próprios da adoção do regime de competência, e não a uma programação transferida.220
Em suma, os restos a pagar são instrumentos essenciais na adequação da realidade da administração pública à anualidade orçamentária, contudo, seu uso deve ser criterioso, a fim de não depreciar o equilíbrio das finanças públicas, a qualidade dos gastos públicos e, em especial, o planejamento da ação estatal.
218 HABER, Xxxxxx; XXXXXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx.
Despesa Pública..., p. 52.
219 XXXXXXXX, Xxxxxx X. Restos a pagar. Orçamento. Lei de Responsabilidade Fiscal e seu art. 42. In: Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, ano 19, n. 97, p. 67 – 97, mar./ abr. 2011, p. 71.
220 Ibidem, pp. 71 – 73.
3.5. Plurianualidade orçamentária
Embora não seja referida como princípio pelo ordenamento jurídico ou pela doutrina brasileira majoritária, como ocorre de forma quase unânime com a anualidade orçamentária, alguns juristas já indicam a relevância da discussão acerca da plurianualidade orçamentária.
A consideração tem como ponto de partida a previsão constitucional do PPA e ganha força com o fato de que orçamento público tem se tornado cada vez mais um instrumento fundamental para o planejamento da ação governamental, com relevantes reflexos para a economia do país. Se a anualidade orçamentária já admite exceções no cotidiano da Administração Pública, isso se intensifica considerando esses fatores.
Entre os defensores da plurianualidade orçamentária, contrapondo-a à anualidade orçamentária, destaca-se Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx, para quem “já não se pode tratar a anualidade como princípio”, vez que a anualidade é a própria periodicidade do orçamento e, com a previsão do PPA, já estaria superada.221 Também merece menção Xxxxxxx Xxxxxx, que chega a se referir ao PPA como “orçamento plurianual”222.
Xxxx Xxxxxx xx Xxxxx, considerando o “orçamento plurianual de investimentos”, predecessor do PPA, já afirmava que “o sistema brasileiro, que integra orçamento e planejamento, concilia ambas as exigências [controle político e planejamento], ou seja, o princípio da anualidade e o princípio da plurianualidade cíclica”223.
Outro autor que trata do tema é Xxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx, para quem a anualidade orçamentária deve ser tratada como princípio, e não como regra, exatamente para ser sopesada e compatibilizada com o princípio da plurianualidade.224
Apesar dos posicionamentos em favor da plurianualidade apontados, especialmente o de Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx, não parece possível reconhecer uma superação da anualidade orçamentária pelo ordenamento jurídico brasileiro,
221 XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx de. Curso de Direito Financeiro..., p. 364.
222 XXXXXX, Xxxxxxx. Direito financeiro e tributário..., p. 96.
223 XXXXX, Xxxx Xxxxxx da. Orçamento-programa..., p. 314.
224 XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx de. Reflexão sobre o conflito entre princípios orçamentários..., p. 100.
seja pela expressa previsão de orçamentos anuais, seja pela ausência de força executória do instrumento orçamentário plurianual, o PPA.
Nesse sentido, se acompanha a ideia de Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxx, para quem a anualidade não é afastada pelo PPA “mesmo porque as previsões neste contidas somente podem ser concretizadas mediante cada orçamento anual”225.
Para uma avaliação mais completa desse aparente conflito entre anualidade e plurianualidade orçamentária, será necessário tratar da natureza jurídica daquela.
3.6. Anualidade orçamentária: princípio ou regra?
Para uma resumida distinção entre princípios e regras, recorre-se a Xxxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxx, que adota o referencial teórico de Xxxxxx Xxxxx.226
Regras são normas com uma estrutura que determina a sua aplicação total, desde que aplicáveis ao caso concreto. Dessa forma, regras apresentam exceções, que fazem parte da própria regra e determinam situações nas quais elas não serão aplicadas. Já princípios funcionam como “mandamentos de otimização”, a serem aplicados em maior ou menor grau em cada caso concreto, mediante sopesamento com outros princípios.227
Dessa forma, entende-se que a anualidade orçamentária conforme apresentada na Constituição Federal tem estrutura normativa de regra, já que não há o que se sopesar ou realizar em maior ou menor grau nos prazos de elaboração e aprovação da LOA e na validade anual das dotações orçamentárias.
Diante das dotações orçamentárias presentes na LOA, percebe-se que a aplicação da anualidade orçamentária é integral, observando-se exceções em que parte da execução dessas dotações orçamentárias pode ser concluída no exercício financeiro seguinte, como nos casos dos restos a pagar e dos créditos especiais e extraordinários abertos nos últimos quatro meses do exercício financeiro.
225 XXXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxx de. O orçamento a partir dos seus princípios..., p. 90.
226 Existem outros referenciais teóricos para a distinção e classificação entre princípios e regras. Para tanto, cf. XXXXX, Xxxxxxxx. Princípios e regras e a segurança jurídica. In: RDE – Revista de Direito do Estado, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 189 – 206, jan./ mar. 2006, pp. 190 – 196 e SILVA, Xxxxxxxx Xxxxxx xx. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, pp. 56 – 64.
227 XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx xx. Op. cit., pp. 45 – 46.
Nesse sentido, embora elencado quase unanimemente como princípio pela doutrina jurídica brasileira, parece que, na distinção entre princípios e regras, a anualidade orçamentária seria melhor caracterizada como regra.
Dessa forma, se acompanha Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx-Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxx-Xxxxxx Xxxxxxx, que elencam a anualidade orçamentária como uma regra técnica fundamental, assim como o fazem com a unidade e a universalidade, outros dois elementos normalmente considerados princípios.228
Contudo, embora essa classificação seja relevante para fins de interpretação, não afasta o conteúdo teórico atribuído pela doutrina ao princípio da anualidade orçamentária, tendo em vista a utilização desse termo como sinônimo da periodicidade orçamentária. Explica-se. Entende-se que a regra da anualidade orçamentária concretiza o princípio da periodicidade orçamentária, que tem por conteúdo a aprovação do orçamento público em periodicidade hábil a permitir a participação e o controle legislativos (caráter político) e o planejamento da execução orçamentária (caráter financeiro).
Para esse princípio da periodicidade orçamentária cabe sopesamento com os demais princípios do ordenamento jurídico, tais como os do planejamento, da eficiência ou do equilíbrio fiscal, adequando-se, desse modo, maior ou menor periodicidade a depender do caso concreto.229
Assim, entende-se que a doutrina jurídica, brasileira e estrangeira, tende a se referir à anualidade orçamentária como princípio por i) trata-la como sinônimo de periodicidade orçamentária; ii) no caso da doutrina brasileira, seguir a expressão consagrada na Lei nº 4.320/64, embora essa não tenha sido repetida pela Constituição Federal; e iii) usar outro referencial teórico para caracterizar princípios e regras, segundo o qual princípios seriam mandamentos nucleares ou estruturantes do sistema230.
Quanto a esse terceiro motivo, deve-se observar que o fato da anualidade orçamentária ser considerada uma regra não retira automaticamente a sua importância fundamental e estruturante para o sistema jurídico que rege as finanças
228 XXXXXXX, Xxxxxx; XXXXXXXXX, Xxxxx-Xxxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxx-Xxxxxx. Finances Publiques..., p. 263.
229 Para autores que defendem que a anualidade orçamentária deve ser considerada princípio para permitir seu sopesamento com outros princípios, cf. XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx. Impactos da anualidade orçamentária..., pp. 11 – 13 e XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx xx. Reflexão sobre o conflito entre princípios orçamentários..., pp. 99 – 102.
230 Cf. XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx xx. Direitos fundamentais..., p. 45.
e os orçamentos públicos, tanto que, como apontado acima, Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxx- Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx e Xxxx-Xxxxxx Xxxxxxx se referem a ela como “regra técnica fundamental”.
Considerando o princípio da periodicidade orçamentária, vislumbra-se maior adequação às disposições constitucionais que indicam instrumentos plurianuais de planejamento, vez que seu conteúdo pode ser realizado de forma anual ou plurianual, a depender do caso concreto, sem perder seu significado. De fato, para uma substituição total da noção de anualidade pela plurianualidade orçamentária, como sugere Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx, seria necessária uma alteração constitucional.
Na França, já se cogitou um alongamento da periodicidade orçamentária, seja para permitir a recondução de autorizações orçamentárias, seja para instituir orçamentos bienais, sob o argumento de que essas alterações poderiam diminuir a ineficácia administrativa nos finais de exercício financeiro e evitar desgastes políticos na aprovação legislativa dos orçamentos.231
Atualmente, acredita-se que as duas noções (anualidade e plurianualidade) coexistem em regras concretizadoras do princípio da periodicidade orçamentária. O orçamento público propriamente dito e executável ainda consiste na LOA e, portanto, resume a anualidade orçamentária. Por outro lado, o PPA contém previsões orçamentárias plurianuais e é necessário considerar que as leis orçamentárias compõem um sistema, para o qual o ordenamento jurídico exige um dever de compatibilidade das leis anuais (LDO e LOA) com a lei plurianual (PPA).
Dessa forma, tem-se a manutenção da anualidade orçamentária como ponto estruturante dos orçamentos públicos, mas com uma tendência de coordenação dos programas anuais com um planejamento plurianual. 232
231 XXXXXXX, Xxxxxx; XXXXXXXXX, Xxxxx-Xxxxxxxxx; XXXXXXX, Xxxx-Xxxxxx. Finances Publiques..., pp. 284 – 285.
232 XXXXXX, Xxxxxxx. Les principes budgétaires..., pp. 83 – 84.
6. PROPOSTAS DE ALTERAÇÕES NORMATIVAS
Nessa seção, serão analisadas algumas propostas de alterações normativas – presentes em textos doutrinários ou em projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional – que tangem ao problema da relação entre a anualidade orçamentária e os contratos administrativos.
A ideia não é defender ou criticar tais propostas, mas contribuir para a reflexão sobre alguns desafios do sistema jurídico brasileiro e para discussões que possam levar ao seu aprimoramento.
6.1. Carry-over
O carry-over, também chamado de carry-forward, é o direito de usar uma dotação orçamentária – ainda não executada – em um período de tempo posterior àquele para o qual ela foi originalmente concedida.326 No Brasil, isso equivaleria a permitir que uma dotação orçamentária relativa a determinado exercício financeiro pudesse ser usada no exercício financeiro seguinte.
Em termos práticos, o instrumento é muito similar à previsão do artigo 167, parágrafo 2º, da Constituição Federal, que permite que créditos especiais e extraordinários autorizados nos últimos quatro meses de um exercício financeiro sejam reabertos no exercício financeiro seguinte.
O objetivo do carry-over é evitar a concentração de empenhos de despesas no final do exercício financeiro, o que leva “a dispêndios muitas vezes ineficientes e de baixa qualidade, devido aos preços mais elevados pagos a fornecedores e à aquisição de bens ou serviços desnecessários ou não prioritários com o fito único de consumir dotações remanescentes”327.
Essa situação advém de uma lógica perversa. Como o orçamento público brasileiro é elaborado de forma incremental, se o administrador público não utiliza todas as dotações orçamentárias concedidas para sua unidade orçamentária, isso
326 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority. International Monetary Fund, 2009, p. 2.
327 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. Carry-over: a flexibilização do princípio da anualidade orçamentária como indutora da qualidade do gasto público e da transparência fiscal. In: Finanças Públicas – XVI Prêmio Tesouro Nacional, Tema II – Economia e Contabilidade do Setor Público, Brasília, 2011, p. 15.
se torna uma demonstração da necessidade de menos recursos orçamentários, o que fará com que ele tenha menos recursos disponíveis para os anos subsequentes. Ou seja, quanto mais o administrador público “economizar”, mais ele perde, de modo que, do seu ponto de vista, a mera utilização dos recursos passa a ser mais relevante do que sua destinação. 328
Contudo, se há a possibilidade de “carregar” as dotações orçamentárias não utilizadas de um exercício financeiro para o seguinte, como ocorre com o carry- over, o administrador público não tem a necessidade de utilizar “às pressas” suas dotações orçamentárias, tendo, portanto, mais tempo para realizar as despesas de forma mais eficiente e com maior qualidade e planejamento.329
Nesse sentido, Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx, destaca:
[o] carry-over, ao não incentivar o gestor público à prática do ‘use it or lose it’330, privilegia a gestão programada e parcimoniosa, pois os resultados financeiros positivos de sua gestão permanecerão à sua disposição no próximo exercício, podendo ser utilizados de forma mais coerente com os objetivos e os planos do órgão e com o macroplanejamento do governo em vez de serem, indiscriminadamente, desperdiçados ao fim de cada exercício financeiro.331
Aliás, essa concentração de empenhos de despesas no final do exercício financeiro é o principal motivo para o significativo volume de despesas inscritas em restos a pagar, de modo que o carry-over aparece como uma alternativa à essa situação.
O carry-over permite o carregamento da própria dotação orçamentária além do exercício financeiro para o qual ela foi concedida, já os restos a pagar são um instrumento apenas para concluir a execução da despesa orçamentária já empenhada no exercício financeiro para o qual houve a autorização orçamentária.
Assim, o carry-over, ao dar mais tempo para o administrador público
realizar as suas despesas e “desestimular o empenhamento desenfreado em fim
328 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx. Impactos da anualidade orçamentária..., pp. 17 – 18.
329 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority…, p. 3.
330 Em tradução livre para o português, “use ou perca”.
331 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. Carry-over: a flexibilização do princípio da anualidade orçamentária..., p. 17.
de exercício, tem o potencial também para reduzir gradativamente os restos a pagar”332.
Para além da questão dos restos a pagar, Xxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxxx levantam alguns argumentos favoráveis e contrários à implementação do instrumento. Dentre os argumentos favoráveis, estão:
i) promoção de ganhos de eficiência – ao evitar o uso, pelo administrador público, de dotações orçamentárias apenas para não perdê-las, estimula-se que os recursos públicos sejam usados de maneira eficiente e de acordo com as finalidades almejadas pela unidade orçamentária;
ii) demonstração das reais necessidades de recursos públicos – ao permitir o uso das dotações orçamentárias por um período maior de tempo, retira-se o prazo para que o administrador público as use apenas para não perdê-las e cria-se um cenário em que é possível identificar quais dotações orçamentárias são realmente necessárias para cada unidade orçamentária;
iii) facilitação da gestão de compromissos financeiros plurianuais – ao flexibilizar o uso das dotações orçamentárias entre os exercícios financeiros, o carry-over, facilita que projetos plurianuais sejam geridos na sua integralidade e não a partir de seus custos anuais; e
iv) compensação de procedimentos rígidos de execução orçamentária
– os procedimentos de execução orçamentária e os mecanismos de controle durante essa fase podem atrasar a execução das despesas, o que seria compensado pelo carry-over.333
Já os argumentos contrários ao carry-over sugerem que sua implementação se fundamenta em três premissas, que nem sempre são verdadeiras, e correspondem a três críticas ao instrumento.
A primeira premissa é a de que a alocação de recursos orçamentários é adequada às atividades a serem cumpridas por cada unidade orçamentária e apenas o tempo para executá-las é insuficiente. Segundo o argumento contrário ao carry-over, se as dotações orçamentárias não foram utilizadas, há um indicativo de
332 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. Carry-over: a flexibilização do princípio da anualidade orçamentária..., p. 39.
333 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority…, pp. 3 – 5.
excesso na alocação de recursos e, portanto, tais dotações deveriam ser canceladas e não carregadas para o próximo exercício financeiro.
A segunda premissa é a de que o volume de recursos carregados para o próximo exercício financeiro seria pequeno. Contudo, se o volume dos recursos carregados se tornar significativo, haveria enorme potencial de perda de controle sobre a execução dessas despesas e das prioridades governamentais.
Em razão disso, Xxx Xxxxxxx e Xxxxx Xxxxxxxx entendem como necessária uma limitação no volume de dotações orçamentárias que poderiam ser carregadas em relação ao total das despesas públicas previstas no orçamento. Desse modo, se manteria o objetivo de dar mais tempo para o planejamento e a execução dessas despesas orçamentárias, de modo que elas sejam realizadas com maior qualidade e em sintonia com o planejamento orçamentário e governamental.
A terceira premissa é a de que a autorização orçamentária é indiferente ao tempo da execução da despesa. O argumento contrário ao carry-over coloca que o tempo de realização do gasto público é relevante e, em muitos casos, a sua efetivação em determinado exercício financeiro é necessária para produzir impactos desejados e planejados na economia, de modo que o tempo da execução orçamentária não poderia ficar a cargo do ordenador de despesa.334
Considerando esses argumentos, os autores sugerem algumas limitações para a implementação do carry-over, como a aplicação a apenas determinados tipos de despesa, limitação do montante de recursos das dotações orçamentárias que podem ser carregadas, limitação do montante de recursos das dotações orçamentárias carregadas acumuladas e limitação do tempo pelo qual é aceito o carry-over.335
Para países em desenvolvimento, os autores sugerem introduzir o carry- over apenas para despesas de capital e avaliar posteriormente a pertinência de estender o mecanismo para despesas correntes.336 A mesma recomendação é feita por Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxx que ressalta, ainda, a vantagem para a particular situação brasileira, vez que as despesas com investimentos são as que mais contribuíram,
334 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority…, pp. 5 – 6.
335 Ibidem, p. 7.
336 Ibidem, p. 14.
na última década, com o crescimento dos restos a pagar nos últimos trimestres dos exercícios financeiros.337
A imposição e definição desses limites junto à implementação do carry-over parece ser fundamental para o sucesso do instrumento, prestigiando o seu potencial para solucionar questões pontuais, porém recorrentes na realidade orçamentária de diversos países, dentre eles o Brasil, sem permitir que essa exceção se torne a regra e distorça o sistema orçamentário e a autorização legislativa ou gere um cenário de irresponsabilidade fiscal, à semelhança do que já ocorreu com os restos a pagar.
Ainda, considerando-se a realidade brasileira outros limites podem ser pensados, tais como a permissão do carry-over apenas para dotações orçamentárias atingidas pela limitação de empenho e movimentação financeira.
Em razão disso, o carry-over terá resultados melhores em países com previsões orçamentárias acuradas, dotações orçamentárias adequadas, sistema contábil desenvolvido, meios de controles interno e externo funcionais, gestão orçamentária descentralizada e política fiscal de médio prazo.338
Algumas dessas condições não têm sido verificadas no Brasil, em especial o irrealismo das previsões orçamentárias, a inadequação das dotações orçamentárias – em parte, em razão da adoção do orçamento incremental – e o fato de que há uma política fiscal de curto prazo, com metas anuais. Embora esses fatores não impeçam a inclusão do carry-over no ordenamento jurídico brasileiro, certamente devem ser considerados.
Em relação aos contratos administrativos, é possível considerar a aplicação desse instrumento em duas frentes.
A primeira seria em grandes projetos plurianuais, viabilizados, por exemplo, por PPPs, vez que essa flexibilização da anualidade orçamentária permitiria considerar o contrato em sua integralidade, sem limitá-lo ao fator temporal do orçamento público.
A segunda seria para os contratos regidos pela Lei nº 8.666/93 que não se encaixam nas exceções do caput do artigo 57 e têm sua duração condicionada à vigência do respectivo crédito orçamentário. Dependendo da configuração
337 XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx. Carry-over: a flexibilização do princípio da anualidade orçamentária..., p. 39.
338 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority…, pp. 11 – 13.
normativa do carry-over, seria criada uma situação na qual tais créditos orçamentários teriam sua duração alargada, permitindo que esses contratos administrativos tenham prazo maior e possivelmente mais adequado à sua execução. No mais, considerando que a licitação tem por requisito a existência da dotação orçamentária, se evitaria a realização de licitações apressadas em final de exercício financeiro apenas para não perder as condições necessárias à sua realização.
6.2. Dotações orçamentárias plurianuais
Dotações orçamentárias plurianuais consistem em autorizações legislativas concedidas, de uma só vez, para despesas relativas a mais de um exercício financeiro.
O instrumento já é adotado por alguns países339 e teria o objetivo de retirar o risco de se obter anualmente a autorização legislativa necessária para cumprir o compromisso financeiro assumido com projetos plurianuais, dando maior segurança para as partes envolvidas e respaldando a expectativa dos futuros beneficiários. Portanto, seriam especialmente úteis aos contratos administrativos, pois eliminariam o entrave da futura autorização legislativa para realização dos compromissos financeiros já assumidos pela Administração Pública com a celebração do contrato.
Para tanto, duas modelagens são possíveis. A primeira consiste em uma única dotação orçamentária válida para múltiplos exercícios financeiros, correspondente ao valor global do projeto.
Nesse caso, “[a]s dotações correspondentes a parcelas desse custo seriam incorporadas à LOA dos exercícios subsequentes de acordo com previsão constante de cronograma de desembolso financeiro do projeto (anualmente revisto)”340, explicam Xxxxx Xxxxxxx e Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx.
A vantagem dessa modelagem seria a flexibilidade para adequar as despesas do projeto ao longo de sua execução, contudo, notadamente em projetos
339 XXXXXXX, Xxx; XXXXXXXX, Xxxxx. Carry-over and budget authority…, p. 3.
340 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx; XXXXXX, Xxxx Xxxxxxx X. A Lei 4.320 e a responsabilidade orçamentária..., p. 501.
com maior volume de despesas, essa flexibilidade dificultaria o controle e poderia, em casos extremos, comprometer o cumprimento de metas fiscais.
Uma segunda modelagem consiste em uma dotação orçamentária plurianual na qual, no momento da autorização legislativa, já se estabelecem os valores relativos a cada exercício financeiro futuro. Nesse caso, mantem-se a retirada do risco de obtenção da autorização legislativa futura, contudo, exige-se alto nível de planejamento, vez que os valores das frações anuais dessa dotação orçamentária plurianual têm que ser definidos de antemão, no momento de sua autorização, o que ainda pode gerar um engessamento do projeto.
Independente da modelagem adotada, ainda teriam de ser considerados e definidos outros contornos para esse instrumento, como eventuais limitações de valores, duração da dotação orçamentária plurianual e a possibilidade de sua posterior alteração.
Além disso, seria uma alteração normativa heterodoxa, tendo em vista a disseminação maciça do princípio da anualidade orçamentária.
Xxxxxx Xxxxx, partindo da premissa de que a anualidade orçamentária não prejudica os investimentos, é contrária à ideia, por considerá-la atentatória ao princípio da anualidade orçamentária e colocar em risco o equilíbrio orçamentário, vez que seriam autorizadas despesas sem as respectivas receitas.341
Considerando esse posicionamento e a previsão constitucional de orçamentos anuais, para evitar alegações de inconstitucionalidade, seria mais apropriado que a adoção desse instrumento no ordenamento jurídico fosse realizada por meio de emenda constitucional.
6.3. Despesas contratuais como despesas obrigatórias
Outra possibilidade para assegurar o cumprimento dos compromissos financeiros contratuais da Administração Pública mediante a execução das respectivas despesas orçamentárias seria considerá-las como despesas obrigatórias.
Tendo em vista a evolução da teoria do contrato administrativo para constatar a vinculação da Administração Pública aos contratos que celebra, há a
341 NUNES, Selene Peres. Os 10 anos da LRF e o Projeto de Lei da Qualidade Fiscal. In: Cadernos da Controladoria, Rio de Janeiro, ano x, n. 2, set. 2010, pp. 35 – 36.
obrigação de cumprir com esses compromissos financeiros e base para interpretar tais despesas como obrigatórias, incluindo-as naquelas alheias à discricionariedade do Poder Executivo na elaboração do projeto de LOA.
Contudo, tendo em vista que a definição positivada mais próxima do conceito de despesas obrigatórias seria a de despesas obrigatórias de caráter continuado da LRF, que não faz referência a contratos, tão somente a lei, medida provisória ou ato administrativo normativo, uma inclusão ou alteração legislativa poderia ser um meio mais seguro para a consideração das despesas decorrentes de contratos administrativos como obrigatórias.
6.4. Tratamento privilegiado das despesas contratuais
Ainda, diversas propostas de alteração legislativa pressupõem a atribuição de um tratamento privilegiado às despesas contratuais da Administração Pública, à semelhança do serviço da dívida pública ou das despesas oriundas de emendas parlamentares.
Nesse caso, poderia haver, na fase legislativa de elaboração da LOA, vedação de anulação de despesas contratuais por emenda parlamentar, o que demandaria emenda constitucional, e, na fase de execução orçamentária, vedação de incidência de limitação de empenho sobre tais despesas, o que dependeria de lei complementar para alterar a LRF ou inclusão nas sucessivas LDOs.342
Xxxxx Xxxxxx defende uma alteração na LRF, considerando que a extensão do tratamento aplicável ao serviço da dívida pública às obrigações pecuniárias decorrentes de contratos de PPP seria a solução mais racional e menos onerosa para resgatar a confiança no adimplemento dessas obrigações. Nesse sentido, a garantia de pagamento dessas obrigações viria por atribuir-lhe um caráter impositivo.343 - 344
342 Lei Complementar nº 101/00. “Art. 9º [...] § 2º Não serão objeto de limitação as despesas que constituam obrigações constitucionais e legais do ente, inclusive aquelas destinadas ao pagamento do serviço da dívida, e as ressalvadas pela lei de diretrizes orçamentárias”.
343 XXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. O processo orçamentário no setor público: risco de inadimplência e alternativas de mitigação. In: XXXXXX XXXXX, Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxxx (coord.). Parcerias público-privadas: reflexões sobre os 10 anos da Lei 11.079/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 457.
344 O autor faz essa consideração exclusivamente para os contratos de PPP, contudo, a proposição parece aplicável também a outros tipos de contratos administrativos.
Contudo, cabe observar que esse tratamento privilegiado do serviço da dívida pública ou das despesas oriundas de emendas parlamentares, no que tange à execução orçamentária, não deixa de ser criticado, vez que coloca essas despesas como prioritárias em detrimento de outras. Assim, para a extensão desse regime às despesas contratuais ou, ao menos, despesas de PPPs, seria necessário ponderar se a necessidade de agregar maior segurança ao adimplemento dessas relações é suficiente para conceder-lhes esse nível de prioridade orçamentária.
Além disso, seria importante considerar se eventual tratamento privilegiado deveria se estender a todas as despesas da Administração Pública de origem contratual ou apenas a determinados tipos e, ainda, se a própria previsão da LRF que permite a exclusão da limitação de empenho por previsão na LDO já não é suficiente para privilegiar projetos específicos que demandem esse tipo de segurança, sem a necessidade de alteração geral e abstrata no ordenamento jurídico.
6.5. Lei de Qualidade Fiscal
O Projeto de Lei nº 229/09 do Senado Federal, conhecido como projeto da Lei de Qualidade Fiscal, que atualmente tramita na Câmara dos Deputados como Projeto de Lei nº 295/16, é o principal projeto de lei complementar que visa regular os orçamentos públicos à luz da Constituição Federal e da LRF, revogando a Lei nº 4.320/64.
O texto original do PL nº 229/09 destacava alguns princípios que incidem sobre a LOA, mas não incluía dentre eles a anualidade. No texto atualmente em tramitação, a anualidade volta a figurar como princípio, espelhando a Lei nº 4.320/64.345
A coincidência do exercício financeiro com o ano civil e o regime de caixa para as receitas e o regime de competência para as despesas públicas também foram mantidos no projeto.346
345 Projeto de Lei nº 295/16. “Art. 16. O projeto de lei orçamentária, a lei orçamentária e sua execução se submetem ao conjunto de princípios que decorrem do sistema normativo, em especial a unidade, a universalidade, a anualidade, a fidedignidade, a exclusividade, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência, além de outros que vierem a ser definidos anualmente na lei de diretrizes orçamentárias”
346 Projeto de Lei nº 295/16. “Art. 3º O exercício financeiro coincidirá com o ano civil.
Um dos pontos mais importantes do projeto de lei é o detalhamento infraconstitucional do conteúdo do PPA, que passa a ter por base o plano de governo do candidato eleito para o cargo de chefe do Poder Executivo, e conter Anexo de Política Fiscal, que estabelece objetivos fiscais de longo prazo, com projeções que compreendem um período de dez exercícios financeiros.347
A vigência do PPA continua compreendendo o período entre o segundo ano de mandato do chefe do Poder Executivo e o primeiro ano do mandato subsequente, contudo, a data limite para envio do projeto de PPA será 30 de abril do primeiro ano de mandato,348 em conjunto com o projeto de LDO, sendo que, no primeiro ano de mandato, a LDO só pode ser votada depois de aprovado o PPA.349 Assim, no primeiro ano de mandato, o projeto de LOA só será encaminhado ao Poder Legislativo depois de já aprovados a LDO e o PPA.
À LDO foi atribuído papel fundamental no ciclo de planejamento, incluindo- se no seu Anexo de Metas Fiscais o montante anual a ser gasto com projetos de investimentos plurianuais aprovados em exercícios financeiros anteriores e o espaço fiscal disponível para novos projetos de investimentos plurianuais,350
Parágrafo único. Para fins de elaboração e execução da lei orçamentária, pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nele arrecadadas; e II – as despesas nele empenhadas”.
347 Projeto de Lei nº 295/16. “Art. 6º O plano plurianual tomará por base o plano de governo do candidato eleito chefe do Poder Executivo e será estruturado por programas, que deverão contemplar todas as despesas associadas ao atendimento de seus objetivos.
Art. 7º Além do disposto no art. 165, § 1º, da Constituição Federal, integrarão o plano plurianual:
I – diagnóstico regionalizado da situação socioeconômica, incluindo, no caso da União, a análise de cenários macroeconômicos; e
II – demonstrativo, para cada programa, de seus objetivos e indicadores.
Parágrafo único. O plano plurianual da União conterá Anexo de Política Fiscal, que estabelecerá os objetivos de longo prazo da estratégia fiscal, bem como cenário fiscal prospectivo compreendendo: I – para um período de 10 (dez) exercícios financeiros, projeções que indiquem como a estratégia de longo prazo se coaduna com os princípios da gestão fiscal responsável; e
II – para o período do plano plurianual, a especificação dos valores agregados previstos para as receitas, as despesas, os resultados primário e nominal, as dívidas e o patrimônio líquido”.
348 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 9º O plano plurianual compreenderá o período iniciado no exercício referente ao segundo ano do mandato do chefe do Poder Executivo e vigorará até o final do exercício financeiro do primeiro ano do mandato subsequente.
§ 1º O chefe do Poder Executivo encaminhará o projeto de plano plurianual ao Poder Legislativo até
o dia 30 de abril do primeiro ano de seu mandato”.
349 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 15 [...] § 1º No primeiro ano do mandato do chefe do Poder Executivo, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias somente poderá ser votado depois de aprovado o projeto de plano plurianual”.
350 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 12 [...] § 2º O demonstrativo referido no art. 4º, § 2º, inciso II, da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, deverá apresentar separadamente o montante anual a ser gasto com projetos de investimentos plurianuais já aprovados antes do exercício financeiro a que se refere e o espaço fiscal disponível para projetos de investimentos plurianuais
constituindo limite para a inclusão de novos projetos de investimentos plurianuais na LOA.351
Já no plano da LOA, propõe-se a criação de um anexo com os projetos de investimentos plurianuais,352 que discriminaria o desembolso previsto com a execução de cada projeto para cada um dos quatro exercícios financeiros subsequentes ao da LOA.353
Além disso, a mensagem do Poder Executivo que encaminhar o projeto de LOA ao Poder Legislativo deve conter especificação dos novos projetos de investimentos, destacando os projetos de investimentos plurianuais a serem iniciados no exercício.354
O texto original do projeto de lei criava uma dotação plurianual para obras e empreendimentos plurianuais, que seriam aprovados pelo seu custo total, incluindo-se na LOA o desembolso financeiro previsto para o respectivo exercício financeiro e no seu Anexo de obras e empreendimentos plurianuais – também sugestão do texto original do projeto de lei – os valores anuais correspondentes aos desembolsos previstos para cada um dos quatro exercícios financeiros subsequentes, com a inclusão da dotação nesses valores nas respectivas LOAs.
Essa dotação plurianual parece ter sido retirada do texto atualmente em tramitação, que prevê apenas a explicitação do custo total do projeto de investimento plurianual e dos valores anuais correspondentes aos desembolsos previstos para cada um dos exercícios financeiros subsequentes no Anexo de projetos de investimentos plurianuais, com a apropriação do valor correspondente
cuja execução financeira esteja prevista para iniciar-se a partir do exercício financeiro a que se
refere”.
351 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 26. Novos projetos de investimentos plurianuais somente poderão ser incluídos na lei orçamentária até o montante em que o somatório de seus desembolsos financeiros não ultrapasse, em cada exercício financeiro, o montante anual para novos projetos de investimentos indicados conforme o art. 12, § 2º”.
352 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 21. Sem prejuízo do disposto na Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, e nas leis de diretrizes orçamentárias de cada ente da Federação, integrarão o projeto de lei orçamentária e a lei orçamentária: [...]
III – anexo dos orçamentos fiscal e da seguridade social, discriminando as receitas e as despesas orçamentárias; [...]
VI – anexo discriminando os projetos de investimentos plurianuais”.
353 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 21. [...] § 3º O anexo previsto no inciso VI do caput discriminará, por órgão orçamentário, para cada um dos 4 (quatro) exercícios financeiros subsequentes àquele a que a lei orçamentária se refere, o desembolso financeiro previsto com a execução de cada projeto de investimento plurianual”.
354 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 18. A mensagem do Poder Executivo que encaminhar o projeto
de lei orçamentária ao Poder Legislativo conterá: [...]
III – especificação dos novos projetos de investimentos, destacando os projetos de investimentos plurianuais a serem iniciados no exercício”.
ao desembolso do exercício financeiro de referência da LOA na discriminação das receitas e despesas orçamentárias.355
Apesar disso, o projeto de lei determina que os projetos de LOA e as LOAs dos exercícios financeiros subsequentes devem obrigatoriamente incluir dotação para a continuidade da execução do projeto, de acordo com o valor previsto no cronograma de execução financeira aprovado no Anexo de projetos de investimentos plurianuais.356
Manteve-se o mandamento de que os projetos de investimentos plurianuais devem ser executados nos exercícios financeiros subsequentes até sua conclusão, exceto se impedimento de ordem técnica – o texto original incluía impedimentos de ordem econômica e ambiental – justificar o adiamento ou a suspensão da sua execução.357
Assim, o adiamento ou suspensão da execução de obras e empreendimentos plurianuais ficaria condicionada a justificativa individualizada para cada projeto a respeito desse impedimento na mensagem do Poder Executivo que encaminhar o projeto de LOA ao Poder Legislativo.358
Essas disposições estão, em sua maioria, orientadas com o objetivo da Lei de Qualidade Fiscal de “melhorar a qualidade do gasto público, de forma consistente com o equilíbrio fiscal para abrir espaço para investimentos e gastos
355 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 26. Novos projetos de investimentos plurianuais somente poderão ser incluídos na lei orçamentária até o montante em que o somatório de seus desembolsos financeiros não ultrapasse, em cada exercício financeiro, o montante anual para novos projetos de investimentos indicados conforme o art. 12, § 2º.
§ 1º Os projetos de investimentos referidos no caput terão o seu custo total explicitado no anexo referido no art. 21, inciso VI, registrando-se também nesse anexo os valores anuais correspondentes aos desembolsos previstos para cada um dos exercícios financeiros subsequentes, sendo o valor correspondente ao desembolso financeiro previsto para o exercício ao qual se refere a lei orçamentária apropriado no anexo referido no art. 21, inciso III”.
356 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 26 [...] § 3º Para fins do disposto no § 1º, os projetos de lei orçamentária e as leis orçamentárias dos exercícios subsequentes deverão obrigatoriamente incluir dotação para a continuidade da execução do projeto de investimento plurianual, de acordo com o valor previsto no cronograma de execução financeira aprovado no anexo a que se refere o art. 21, inciso VI”.
357 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 26 [...] § 2º Os projetos de investimentos plurianuais aprovados na lei orçamentária deverão ser executados nos exercícios subsequentes até a sua conclusão, exceto se impedimento de ordem técnica justificar o adiamento ou a suspensão da execução”.
358 Projeto de Lei nº 295/2016. “Art. 18. A mensagem do Poder Executivo que encaminhar o projeto de lei orçamentária ao Poder Legislativo conterá:
IV – justificativa, individualizada por projeto de investimento plurianual, dos fatores supervenientes
mencionados no art. 26, § 2º”.
sociais. Isso significa orientar toda a gestão pública, do planejamento até o controle,
para resultados”359.
É por isso que o projeto de lei incorpora a responsabilidade fiscal no processo orçamentário, especialmente quanto aos projetos de investimentos plurianuais, exigindo constantes previsões dos desembolsos financeiros que esses projetos demandarão nos exercícios financeiros futuros, mas sem estipular, a priori, limites percentuais da receita para esse comprometimento.
359 NUNES, Selene Peres. Os 10 anos da LRF e o Projeto de Lei da Qualidade Fiscal..., p. 24.