As Cláusulas Contratuais Gerais na jurisprudência das Secções Cíveis
As Cláusulas Contratuais Gerais na jurisprudência das Secções Cíveis
do Supremo Tribunal de Justiça
(Sumários de Acórdãos de 1996 a Outubro de 2012)
Gabinete de Juízes Assessores do Supremo Tribunal de Justiça Assessoria Cível
Danos morais Morte
Lucro cessante Seguro
Cláusula contratual
Condução sob o efeito do álcool
I - O montante de reparação pecuniária dos danos não patrimoniais deve ser fixado ou calculado mediante o cômputo equitativo de uma compensação em que se atenderá, não só à própria extensão e gravidade dos danos, mas também ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, devendo, para tanto, o julgador ter em conta todas as regras da boa prudência, de bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida e não esquecendo que semelhante reparação tem natureza mista, dado que, por um lado, visa reparar o dano e, por outro, punir a conduta.
II - Os lucros cessantes são calculados segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, atendendo ao que aconteceria segundo o curso normal das coisas no caso concreto; não podendo ser apurado o seu valor exacto, julgar-se-á equitativamente.
III - As cláusulas da apólice de seguro, salvo quando proibidas por lei, são convenções negociais gerais pré formuladas que o julgador tem de aplicar, dado terem efeitos vinculativos, eficácia preceptiva.
IV - Não se tendo estabelecido, nas «Condições Particulares», a responsabilidade civil da seguradora no caso de condução sob a influência do álcool, aquela só responde dentro dos limites do seguro obrigatório.
V - Esta limitação da responsabilidade da seguradora só funciona perante o segurado e não perante o terceiro lesado.
VI - Não faz sentido limitar, em consequência de condução sob a influência do álcool, a responsabilidade civil da seguradora decorrente de um acidente de viação que se não ficou a dever a tal condução.
VII - Não é lícito presumir que um acidente provocado por um condutor sob a influência do álcool foi necessariamente devido a esta.
29-10-1996
Processo n.º 6/96 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxxx Xxxxxx
Contrato de adesão Cláusula contratual geral Invalidade
Boa fé Interpelação
I - Mesmo que se julgasse procedente a alegada invalidade das cláusulas de um contrato de adesão, a mesma não viciaria o contrato porque o seu conteúdo sempre deveria integrar-se de acordo com os princípios gerais que as mesmas cláusulas, a prevalecerem, afastariam.
II - Observar-se-ia então o estatuído no art. 9. do DL n.º 446/85, de 25-10, e só “a indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações
gravemente atentatório da boa fé”, como se prevê no n.º 2 desse preceito, conduziria à invocada nulidade.
III - Existindo uma só obrigação cujo objecto é dividido em fracções, com vencimentos escalonados, operado o vencimento automático nos termos do art. 781.º do CC, não é necessária a interpelação do devedor para que possam ser exigidas antecipadamente as prestações vincendas.
09-10-1997
Processo n.º 173/97 - 2.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxx xx Xxxxx
Indemnização
Liquidação em execução de sentença Negócio jurídico
Nulidade Conhecimento oficioso
Cláusula contratual geral
I - Para que se possa relegar a liquidação da indemnização para execução de sentença é necessário que a existência dos danos a que respeita esteja provada, mas que não existam elementos que os permitam determinar na acção declarativa, ou seja, que permitam fixar o seu objecto ou quantidade mesmo com o recurso à equidade. O juiz pode, no entanto, fixar desde logo a parte que considere provada.
II - Se é certo que a nulidade do negócio jurídico é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal, certo é, também, que para que isso suceda é necessário que estejam presentes na acção todos os interessados, ou seja, os sujeitos da relação jurídica que de algum modo possa ser afectada, na sua consistência jurídica ou mesmo só na sua consistência prática, pelos efeitos que o negócio tenderia a produzir.
III - A eventual cláusula contratual geral deve ser examinada do ponto de vista da formação do acordo negocial, sendo necessário alegar e provar factos demonstrativos de que o contrato possui tal cláusula e que esta viciou a formação do acordo.
25-11-1997
Processo n.º 318/97 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxx Xxxx *
Contrato de locação financeira Resolução de contrato Cláusula contratual
Cláusula penal Nulidade
Forma de processo Ónus da prova
Teoria da impressão do destinatário
I - O afastamento expresso, pela lei, dos fundamentos da resolução da locação no contrato de locação financeira é um elemento decisivo para o afastamento da acção de despejo como forma de processo quando se pede a resolução deste contrato.
II - As cláusulas contratuais indiciadoras de um certo desequilíbrio material entre as vantagens auferidas, graças ao contrato, pelas partes, são contrárias à boa fé.
III - A cláusula penal é nula quando exceder o valor dos prejuízos resultante do incumprimento da obrigação.
IV - Segundo os critérios gerais para a repartição do ónus da afirmação (e prova), enquanto ao autor cabe a afirmação dos factos que servem de pressuposto ao efeito jurídico pretendido, ao réu cabe a alegação (e prova) dos factos impeditivos ou extintivos da pretensão do autor.
V - As declarações negociais insertas em cláusulas contratuais terão, em princípio, o sentido que lhe foi dado por um declaratário, medianamente sagaz, diligente e prudente, colocado na posição do declaratário, com base em todos os elementos e coeficientes que puder dispor - “termos do negócio”, “a finalidade prosseguida pelo declarante”, “os interesses em jogo no negócio” e “os modos de conduta que posteriormente se prestou ao negócio concluído”.
05-11-1997
Processo n.º 607/1997 - 2.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxx Xxxxxx *
Venda a prestações Resolução
Cláusula contratual geral Cláusula penal
I - A disciplina do art. 934 do CC (falta de pagamento de uma prestação) é imperativa e não supletiva.
II - O DL 445/86, de 25 de Outubro, veio, seguindo basicamente a legislação alemã, dar um mínimo de protecção à parte que não tem o “lawmaking power”, que pode ser uma empresa, mas será sobretudo o consumidor individual, em boa medida indefeso, perante o poder económico da outra parte, para não se falar da influência arrasadora da publicidade e do estado de necessidade do comprador da sua ferramenta de trabalho.
III - O DL 445/86, que veio por em forma de lei o que resultava já do art. 81 e) e j) da CRP, procura proteger a parte que se submete às cláusulas contratuais gerais em dois momentos:
- no da celebração do contrato, para que este seja de facto negociado, isto é, querido, em todos os seus aspectos relevantes;
- depois, pretende que o convénio seja justo, isto é, que não contenha cláusulas abusivas.
IV - No caso de resolução de contrato de compra e venda a prestações, com reserva de propriedade, perante a invalidade da cláusula penal estabelecida haverá que recorrer às regras gerais, remetendo o art. 433 para o art. 289 do CC.
V - Indemnizar o autor significará atribuir-lhe o montante suficiente para que tudo se passe como se tivesse recebido a contado o preço na data da venda.
04-12-1997
Processo n.º 838/97 - 2.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxxxxx Xxxxx
Poderes do STJ Cláusula contratual
Cláusula geral Nulidade
I - Ao STJ cabe apenas, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 729 do CPC, aplicar o regime jurídico que repute adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, não podendo a decisão da segunda instância, quanto à matéria de facto, ser alterada, salvo no caso excepcional a que alude o art. 722 do CPC.
II - A cláusula contratual geral inserta no verso do documento, segundo a qual a resolução por incumprimento implicaria a obrigação para o locatário do pagamento de todos os alugueres, incluídos os que se vencessem até ao final do prazo do contrato, será, por absoluta desproporcionalidade e por contrariar os princípios que regem o instituto da resolução, nula e de nenhum efeito, nos termos dos arts. 12 e 19, al. c) do DL 446/85, de 25 de Outubro, e do art. 294 do CC, com referência aos arts. 432.º a 434.º do mesmo Código.
19-03-1998
Revista n.º 591/96 - 2.ª Secção Relator: Cons. Herculano Namora
Contrato de locação financeira Resolução do contrato Cláusula contratual
Nulidade Mútuo Juros
I - No contrato de locação financeira o locatário pode adquirir a coisa locada findo o contrato, pelo preço inicialmente estipulado - art. 22, al. e), do DL 171/79, de 6 de Junho - estando, por outro lado, adstrito ao pagamento da renda acordada - art. 24, al. a) daquele diploma legal -, podendo o contrato ser resolvido por qualquer das partes, com fundamento no incumprimento das obrigações que assistam à outra parte.
II - Se no caso concreto se verificar que a resolução do contrato traz mais vantagens à locadora do que o cumprimento do mesmo, é nula por excessivamente onerosa para o locatário (arts. 12.º, 19.º, al. c) e 23.º, todos do DL 446/85, de 25 de Outubro, e arts. 280.º, n.º 1 e 294.º, do CC) a cláusula segunda a qual em todos os casos de resolução por incumprimento do contrato por parte do locatário, este fica obrigado a restituir o equipamento locado, a pagar as rendas vencidas que ainda não tenham sido pagas e, a título de indemnização, por danos sofridos pelo locador, a pagar-lhe uma importância igual a 20% da soma das rendas ainda não vencidas, com o valor residual.
III - Embora o art. 1146, do CC, cuide apenas da usura no mútuo, contrato definido no art. 1142, certo é que, com a reforma introduzida pelo DL 262/83, de 16 de Julho, acrescentou-se àquele diploma o art. 559-A, segundo o qual o disposto no art. 1146 é aplicável a toda a estipulação de juros ou quaisquer outras vantagens em negócios ou actos de concessão, outorga, renovação, desconto ou prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros análogos.
IV - Parece, portanto, dever-se inferir deste normativo (art. 559-A) que ele quis abranger algo mais do que o contrato de mútuo, de outro modo não se compreendia que estendesse o campo de aplicação do art. 1146, que cuida, precisamente, do mútuo e, por outro lado, expressamente se referisse a outros actos e negócios análogos.
V - Assim, num contrato de locação financeira, face à limitação decorrente do n.º 3, do art. 1146, do CC, inexistindo garantia real os juros convencionados não poderão exceder os 20% até 1/10/95, e os 15% daí em diante.
23-04-1998
Revista n.º 11/97 - 2.ª Secção Relator: Cons. Herculano Namora
Interpretação do negócio jurídico Poderes do STJ
Cláusula contratual geral
I - A interpretação dos negócios jurídicos só é passível de ser apreciada pelo tribunal de revista quando as instâncias tenham violado as regras legais a que a mesma deve obedecer, designadamente as normas dos arts. 236.º a 238.º do CC.
II - Apurar a vontade real das partes é matéria de facto. Com uma restrição: o tribunal de revista terá uma palavra a dizer sempre que se trate de cláusulas gerais dos contratos, estatutos das pessoas jurídicas, cláusulas generalizadas do comércio jurídico e outras de
«semelhante amplitude». 29-04-1998
Revista n.º 330/98 - 2.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxxxxx Xxxxx
Recurso
Matéria de direito
Contrato de locação financeira Cláusula contratual
I - Quanto às questões que através de recurso são submetidas ao conhecimento do tribunal superior não podem as partes limitar as razões de direito que devem ser utilizadas na sua resolução. Os recursos podem ser providos com fundamento em razões jurídicas diferentes daquelas por que o recorrente pede a revogação da decisão recorrida, ao abrigo do disposto nos arts. 664.º, 713.º, n.º 2, 726.º, 749.º e 762.º, n.º 1, do CPC.
II - Não é desproporcionada aos danos a ressarcir, não caindo por isso na alçada do art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, a cláusula, inserta nas condições gerais de contrato de locação financeira, ao abrigo da qual o locador, perante a falta de pagamento pelo locatário de algumas prestações da renda, considera o contrato como não cumprido definitivamente pelo locatário, e exige deste o pagamento das prestações vencidas, acrescidas de juros, e do capital incluído nas prestações vincendas. Esta pretensão do locador revela-se conforme ao disposto nos arts. 798.º, 564.º e 810.º, n.º 1, do CC.
21-05-1998
Revista n.º 403/98 - 2.ª Secção Relator: Cons. Xxxxx Xxxx *
Âmbito do recurso Alegações de recurso
Contrato de locação financeira Cláusula contratual
Cláusula penal Nulidade
I - São as conclusões das alegações do recorrente que delimitam, em princípio, o âmbito e o objecto dos recursos, no quadro dos arts. 684.º, n.ºs. 3 e 4, e 690.º, n.º 1 do CPC, e não se tratando de matéria de índole de conhecimento oficioso.
II - Tal não significa, nem impõe, que haja de apreciar todos os argumentos produzidos nas alegações mas, somente, as questões suscitadas.
III - Sendo a cláusula em análise – cláusula que se integra nas cláusulas contratuais gerais de um contrato de locação financeira – uma cláusula penal de espécie, que fixa antecipadamente o montante da indemnização, não se afigura que a mesma possa ser considerada desproporcionada, já que a mesma representa tão somente um quinto das rendas vincendas.
IV - Mesmo que tal indemnização fosse considerada como desproporcionada, o que não é o caso, o que poderia pôr-se em causa, não seria uma declaração de nulidade da cláusula mas sim e antes, uma sua redução equitativa nos termos do art. 812 do CC.
V - Nos contratos de “leasing” em que, por definição, é elevado o volume de capital aplicado, são significativos os riscos assumidos; daí que importe ao locador dissuadir os contraentes do incumprimento quer mediante a previsão de cláusulas resolutivas, quer a título complementar, através da fixação de cláusulas de natureza penal.
06-10-1998
Revista n.º 855/98 - 1.ª Secção Relator: Cons. Lemos Triunfante
Cláusula contratual geral Interpretação
Ónus da prova
I - À interpretação das cláusulas gerais contratuais aplicam-se as regras de interpretação dos negócios jurídicos, dentro do contexto do contrato singular em que se incluem.
II - É racional ter em consideração o que as partes exprimiram no regulamento negocial para distribuir o ónus da prova.
05-11-1998
Revista n.º 749/98 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxx xx Xxxx
Aluguer de automóvel sem condutor Cláusula contratual geral
Cláusula penal Nulidade
I - A desvalorização do veículo pelo seu uso não é um dano típico do contrato de aluguer de veículos sem condutor, sendo inerente ao contrato de aluguer em geral e factor considerado pelo locatário na retribuição a pagar pelo utente.
II - Não se deve confundir a cláusula penal excessiva, que pode ser reduzida nos termos do art. 812 do CC, com a cláusula penal desproporcionada (alínea c) do art. 19 do DL 446/85, de 25/10), que conduz à nulidade e não a uma simples redução.
III - A cláusula que prevê que a A. pode pedir uma indemnização nunca inferior a 75% das rendas convencionadas, é uma cláusula insidiosa, que permite à locadora exigir do locatário a indemnização que entender, sem limites.
Expondo deste modo os locatários ao arbítrio da locadora, a cláusula é manifestamente desproporcionada.
03-12-1998
Revista n.º 952/98 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxx xx Xxxx
ALD
Cláusula contratual geral Cláusula penal
Danos
Ónus da prova
I - O locador não tem que provar os danos concretos a que corresponde a previsão da cláusula penal, a qual tem, justamente por escopo a fixação prévia, por acordo das partes, do montante indemnizatório.
II - Impende sobre o locatário o ónus de alegar e de provar factos dos quais se possa concluir pela desproporção entre o valor resultante da cláusula penal e os danos a ressarcir.
III - Ocorrendo resolução do contrato de ALD, por incumprimento do locatário na 8.ª prestação, e a recuperação do veículo automóvel pela locadora, a atribuição de uma indemnização na ordem dos 75% dos alugueres vincendos é excessiva, na medida em que irá atribuir à locadora uma indemnização de 2.735.073$00 e juros correspondentes, para além de 1.025.512$00 de alugueres vencidos e não pagos e respectivos juros, sendo o valor de cada aluguer de PTE 128.189,00 durante 48 meses.
15-12-1998
Revista n.º 1090/98 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxx Xxxxxxx
Transporte marítimo Seguro
Interpretação do negócio jurídico Cláusula contratual geral
I - As cláusulas contratuais gerais devem ser interpretadas segundo a impressão de um declaratário normal colocado na posição do real declaratário.
II - A cláusula contratual geral que fixa o termo do contrato de seguro com a entrega da mercadoria num local de armazenagem no porto de destino, deve valer com o sentido de abranger as situações em que o segurado em vez de, com normalidade, dar seguimento ao trânsito da carga a retém aguardando melhor oportunidade para a armazenar no local de destino.
12-01-1999
Revista n.º 363/98 - 1.ª Secção
Relator: Cons. Xxxxxxx Xxxxxxxx
Transporte marítimo Seguro
Interpretação do negócio jurídico Cláusula contratual geral
I - As cláusulas contratuais gerais devem ser interpretadas segundo a impressão de um declaratário normal colocado na posição do real declaratário.
II - A cláusula contratual geral que fixa o termo do contrato de seguro com a entrega da mercadoria num local de armazenagem no porto de destino, deve valer com o sentido de abranger as situações em que o segurado em vez de, com normalidade, dar seguimento ao trânsito da carga a retém aguardando melhor oportunidade para a armazenar no local de destino.
12-01-1999
Revista n.º 363/98 - 1.ª Secção Relator: Cons. Xxxxxxx Xxxxxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Cláusula contratual geral
Dever de comunicação Dever de informação
I - O STJ pode criticar o apuramento de factos quando tal crítica passa pela verificação de uma ofensa de disposição expressa da lei sobre a força de determinado meio de prova; seja o caso da mera aplicação de normas que, como é o caso do art. 490 do CPC, regem uma forma específica de confissão judicial feita em articulado.
II - Só das questões constantes das conclusões das alegações de recurso o tribunal ad quem deverá tratar, ressalvadas as que forem de conhecimento oficioso.
III - Posto que as cláusulas contratuais gerais não são fruto da livre negociação desenvolvida entre as partes, já que estão elaboradas de antemão e são objecto de simples subscrição ou aceitação pelo lado da parte a quem são propostas, a lei prescreve diversas cautelas tendentes a assegurar o seu efectivo conhecimento por essa parte e a defendê-la da sua irreflexão, natural em tais circunstâncias.
IV - Estas cautelas constam dos arts. 5.º e 6.º do DL n.º446/85, de 25/10, onde se faz recair sobre o proponente o dever de comunicação do teor das cláusulas, o dever de informação sobre os aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique, e o dever de prestar todos os esclarecimentos razoáveis solicitados.
V - Esse dever de comunicação tem duas vertentes: por um lado, o proponente deve comunicar na íntegra à outra parte as cláusulas contratuais gerais de que se sirva (art. 5, n.º 1), por outro lado, ao fazer esta comunicação, deve realizá-la de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência (art. 5, n.º 2); querendo-se estimular o proponente a bem cumprir esse dever, o n.º 3 desse artigo faz recair sobre ele o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva.
VI - O comando contido na al. a) do art. 8 desse DL, ao prescrever a exclusão das cláusulas não comunicadas nos termos do art. 5, tem que ser entendido - atenta a
referida norma sobre o ónus da prova - como prescrevendo a exclusão das cláusulas em relação às quais se não prove terem sido comunicadas.
01-02-2000
Revista n.º 877/99 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Seguro
Cláusula contratual geral Resolução do contrato Prémio de seguro
I - É proibida, face ao disposto na al. b) do n.º 1 do art. 22, do DL 446/85, de 25 de Outubro, a cláusula que permite a uma seguradora, por sua livre e exclusiva iniciativa, quando e como bem lhe aprouver, pôr termo à vigência do contrato de seguro independentemente da invocação de quaisquer fundamentos ou razões.
II - O DL 179/95, de 16 de Agosto, veio definir as regras sobre a informação que, em matéria de condições contratuais e tarifárias, deve ser prestada aos tomadores e subscritores de contratos de seguro e, como decorre do seu preâmbulo, visa a protecção do consumidor, não podendo, por isso, considerar-se lei especial relativamente ao DL 446/85, já que se limita a disciplinar e a tornar mais transparente a actividade seguradora e as disposições relativas ao contrato de seguro.
III - Por outro lado, visando igualmente o regime consagrado no DL 446/85 a protecção dos consumidores, não podia ser intenção do legislador do DL 176/95 afastar o regime estabelecido no primeiro, dada a finalidade de um e de outro desses diplomas.
IV - Não há também que estabelecer qualquer tipo de hierarquia ou de contradição entre as normas dos dois mencionados diplomas, nomeadamente para efeito do disposto nos arts. 7.º, n.º 3 e 11 do CC, porque têm campos de aplicação distintos, não obstante o objectivo comum, traduzido na salvaguarda do interesse do consumidor.
V - O facto de o n.º 1 do art. 18, do DL 176/95, permitir que qualquer das partes possa proceder à resolução do contrato de seguro, não exclui a aplicação do regime estatuído no art. 22, n.º 1, al. b) do DL 446/85, pois aquele normativo apenas veio definir o modus faciendi da comunicação inter partes no caso de resolução contratual, o que não permite concluir que a resolução possa ocorrer sem fundamento na lei ou no contrato.
VI - Com o disposto neste preceito quis o legislador assegurar que os motivos de resolução do contrato se encontrassem previamente tipificados, na lei ou no próprio contrato, de modo que, antes da celebração do mesmo, o outro contraente deles possa aperceber-se.
VII - Não existe qualquer semelhança entre o art. 19.º do DL 176/95 e a al. c), do art. 19, do DL 446/85, no tocante ao objecto da respectiva regulamentação. Enquanto o primeiro estabelece um critério supletivo no cálculo do estorno do prémio de seguro, o segundo proíbe, nos contratos de adesão, cláusulas penais excessivas ou desproporcionadas aos danos a ressarcir.
VIII - A circunstância de o primeiro permitir que se convencione critério diferente pro rata temporis no cálculo do estorno do prémio de seguro, em nada colide com a norma do segundo diploma, pois as partes são livres de convencionar o critério de devolução do prémio que bem entenderem, desde que, tratando-se de modelo convencional pré- estabelecido, neste se não fixe cláusula penal desproporcionada ou excessiva.
17-02-2000
Revista n.º 579/99 - 7.ª Secção Herculano Namora (Relator) Sousa Dinis
Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de locação financeira Cumprimento do contrato Cláusula contratual geral
I - São elementos do contrato de locação financeira: a) a cedência do gozo temporário de uma coisa pelo locador; b) a aquisição ou construção dessa coisa por indicação do locatário; a retribuição correspondente; d) a possibilidade de compra, total ou parcial por parte do locatário; e) o estabelecimento de prazo convencionado; f) a determinação ou determinabilidade do preço de cedência, nos termos fixados no contrato.
II - É nula por violar o art. 809, do CC, e absolutamente proibida pelo art. 18 al. c) do DL 446/85, de 25 de Outubro, a seguinte cláusula: “A não entrega do equipamento pelo fornecedor, bem como a documentação necessária a actos de registo, matrícula e licenciamento, quando o equipamento a tal estiver sujeito, ou a desconformidade do mesmo com o constante nas condições particulares, não exoneram o locatário das obrigações com a Locapor, nem lhe conferem qualquer direito face a esta, competindo- lhe exigir do fornecedor toda e qualquer indemnização a que se ache com direito, nos termos da lei e do n.º 3 deste artigo”.
III - Se o momento da celebração do contrato for também o do seu início, a partir daí o locador deve estar já em condições de proporcionar ao locatário o gozo da coisa; se são diferentes os momentos de celebração do contrato e o seu início, torna-se necessário que na data do início o locador esteja naquelas sobreditas condições.
IV - Num contrato de locação financeira incidindo sobre veículos, a cedência do gozo da coisa em que se traduz a obrigação contratual da locadora, abrange o assegurar da entrega dos veículos objecto do contrato e da documentação necessária para que o locatário possa proceder a todos os registos a seu cargo.
17-02-2000
Revista n.º 1174/99 - 7.ª Secção Sousa Dinis (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxx
Cláusula contratual geral Convenção arbitral Comunicação
I - Clausulado nas «condições gerais» de um contrato que, para resolução de eventuais litígios, surgidos entre as partes contratantes, seria competente a Câmara de Comércio Internacional de Paris, estamos em presença de uma convenção de arbitragem, pré- ordenada, não susceptível de modificação - a outra parte aceita, o contrato é celebrado; se não aceita, não chega a haver contrato.
II - Estas cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos incluem-se nos mesmos pela sua aceitação, devendo ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las – arts. 4.º e 5.º, n.º 1, do DL 446/85, de 25-10. III - Uma vez que a cláusula em apreço consta de documentos redigidos em francês, de compreensão fácil, auxiliada no processo por uma tradução, embora não autenticada, e não tendo sido posta em causa a assinatura, nem a existência de poderes do signatário para obrigar a sociedade aderente, tem-se como aceite por esta todo o conjunto de condições gerais propostas pela outra parte, incluindo a de arbitragem.
IV - Uma cláusula desta natureza não se encontra prevista como proibida, no DL 446/85, de 25-10.
24-02-2000
Agravo n.º 999/99 - 2.ª Secção Xxxxx Xxxxx (Relator)
Costa Soares Peixe Pelica
Cartão de crédito Risco
Cláusula contratual geral Ónus da prova
I - A emissão dum cartão (de débito ou crédito) por um Banco pressupõe um contrato (mútuo, depósito, abertura de conta) celebrado entre o mutuante (depositante), posterior titular/portador do cartão e o Banco (mutuário), proprietário/emissor do cartão.
II - Efectuados os depósitos adequados, o Banco passa a ser proprietário do dinheiro e, enquanto este não for levantado, suporta o risco inerente ao seu domínio sobre o mesmo, nos termos do art. 796 n.º 1, do CC.
III - Sendo princípio geral o de que o risco de perecimento ou deterioração de uma coisa ou perda de um direito é suportado pelo respectivo titular, ofende o art. 21, al. f) do DL 446/85, de 25 de Outubro, a cláusula segundo a qual “...serão sempre da responsabilidade do titular todas as operações efectuadas até à efectiva recepção do aludido aviso”, respeitando este aos casos de perda, falsificação, furto ou roubo do cartão.
IV - Ofende o art. 22 n.º 1, al. b), do mesmo diploma legal, a cláusula que permite ao Banco denunciar a todo o momento o contrato sem pré-aviso ou motivo justificativo.
V - O facto de o PIN só ser fornecido ao titular do cartão e para ser do seu conhecimento privativo, não viabiliza cláusulas que constituam inversões contratuais do ónus da prova, como a que faz presumir a utilização do cartão pelo seu legítimo portador ou titular.
VI - Uma cláusula estabelecendo que o silêncio do titular do cartão, perante o envio do extracto da conta cartão, tornará exacto o documento comprovativo da dívida, impõe uma ficção de recepção e uma ficção de aceitação da dívida, para além de alterar o critério de distribuição do ónus da prova (é ao Banco que incumbe provar que notificou e quando), assim violando os arts. 19.º, al. d) e 21.º, al. g), do DL 446/85.
16-03-2000
Revista n.º 1126/99 - 7.ª Secção Sousa Dinis (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxx Xxxx
Responsabilidade contratual Seguro
Cláusula contratual geral Nulidade
Comunicação
Facto culposo do lesado
I - A apólice há-de traduzir em si o contrato celebrado, entre este e aquela tem de haver conformidade.
II - Só em momento posterior ao da conclusão do contrato e quando ocorreu o sinistro é que os tribunais normalmente são chamados a conhecer do desrespeito das cláusulas contratuais em relação ao regime das cláusulas contratuais gerais, nomeadamente ao princípio da transparência e da conformidade do seu conteúdo à lei.
III - Um dos modos de alegar é a junção de documentos com o articulado respectivo.
IV - Provando-se nas instâncias que a queda de neve e a acumulação da mesma no telhado de um edifício, sendo esta última consequência de ventos fortes que sopraram o que, aliado às baixas temperaturas, levou a que ocorresse uma pressão sobre a cobertura do edifício muito superior ao normal, conduzindo ao desabamento do mesmo telhado, conclui-se que o sinistro foi fruto do concurso dos dois factores.
V - A seguradora deve comunicar, na íntegra, as cláusulas contratuais gerais ao aderente que se limite a subscrevê-las ou a aceitá-las e fica onerada com a respectiva prova da comunicação adequada e efectiva.
VI - A omissão desse dever (quando tenha sido alegada), quer a não satisfação desse ónus não tornam nula a cláusula, mas inexistente, na medida em que se deve considerar excluída daquele concreto contrato.
VII - Tomando os outorgantes como declaratários normais o uso, na contratação, do termo tempestades, foi querido no seu sentido vulgarmente corrente (violenta agitação atmosférica, muitas vezes acompanhada de chuvas, granizos, trovões, relâmpagos, ventos violentos que mudam mais ou menos subitamente).
VIII - No domínio do contrato de seguro o facto que constitui a causa dos danos não tem de ser um ilícito e, na espécie em questão e relativamente ao risco assumido não o é, mas, nem por isso, deixa de ser aplicável o disposto no art. 570, n.º 1 do CC., se, na produção ou no agravamento, concorrer facto culposo do lesado.
11-04-2000
Revista n.º 240/00 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx
Junção de documento Alegações
Cláusula contratual geral
I - Se se prova nas instâncias que o recorrente já possuía os documentos em causa antes do encerramento da discussão e de julgamento, devê-los-ia ter juntado ao processo antes do encerramento.
II - A hipótese prevista no art. 524 do CPC, limita-se às situações em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação se tornou necessário provar factos cuja relevância a parte não podia razoavelmente contara antes da decisão proferida e, então, a junção de documentos às alegações da apelação apenas e só poderá ocorrer se a decisão da 1.ª instância criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento.
III - Se o recorrente, na apelação, requer a junção de documento por se ter convencido de que a decisão da 1.ª instância lhe seria favorável, conclui-se que não foi pela fundamentação da sentença, nem pelo seu objecto que se tornou necessária a prova de factos com cuja relevância a recorrente não podia contar antes da decisão proferida.
IV - O critério de aferimento da proporcionalidade prevista na alínea c) do art. 19 do DL 446/85, deve ser estimado em abstracto e não casuisticamente.
20-06-2000
Revista n.º 1722/00 - 1.ª Secção Lemos Triunfante (Relator) Torres Paulo
Aragão Seia
Cláusula contratual geral Cartão de crédito Tribunal competente Isenção de custas
I - É nula, por relativamente proibida, por força do art. 19, alínea g), do DL n.º 446/85, de 25-10, na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 220/95, de 31-08, a cláusula constante das condições de utilização de cartão de crédito, em que se estipula “Para todas as questões emergentes das presentes condições gerais de utilização fica designado o foro da Comarca de Lisboa”.
II - No art. 29, n.º 1, do DL n.º 446/85, de 25-10, o que se estabelece é, claramente, uma isenção objectiva: o que se isenta é a acção de proibição de cláusulas contratuais gerais e não, apenas, os autores de tais acções.
23-11-2000
Revista n.º 3004/00 - 7.ª Secção Sousa Inês (Relator)
Xxxxxxxxxx Xxxxx (declaração de voto) Xxxxxxxx Xxxxxxx
Contrato de locação financeira Incumprimento
Cláusula contratual geral Nulidade
I - No contrato de locação financeira, por visar o financiamento de um bem, tendo ocorrido o incumprimento pelo locatário, assiste ao locador a sua resolução.
II - Na via, mediante a qual a autora se colocaria somente na posição em que se encontraria se não tivesse celebrado o contrato e revestindo o contrato natureza bilateral, ao credor seria ainda lícito a exigência ao devedor do pagamento de uma
indemnização conexa com os prejuízos sofridos com aquele incumprimento nas fronteiras dos arts. 798.º e 801.º, n.º 2 do CC.
III - Tratando-se de um contrato de execução continuada ou periódica a retroactividade que é conferida à resolução, no quadro dos arts. 433.º e 434.º, n.º 1 do CC, não afecta as prestações já efectuadas ao credor.
IV - A indemnização pelo interesse positivo e que é o do cumprimento não pode cumular-se com a indemnização pelo incumprimento.
V - Uma vez resolvido o contrato e devolvida a aeronave à autora, vendida que se mostra já aquela a terceiro, inexiste já justa causa ou motivo para a autora pretender a obtenção correspondente ao capital, às rendas vincendas, mais o valor residual.
VI - Existe uma desproporção da cláusula que, em caso de incumprimento, e consequente resolução do contrato, confere ao locador o direito a haver além do mais, as rendas vincendas e não pagas, desproporção essa que determina a nulidade no âmbito do art. 1, alínea c), do DL 446/85, de 25-10.
13-12-2000
Revista n.º 3135/00 - 1.ª Secção Lemos Triunfante (Relator) Reis Figueira
Torres Paulo
Cláusula contratual geral Cartão de crédito
É válida uma cláusula, constante das condições gerais de utilização de um cartão de crédito, com o seguinte teor: “Em caso de extravio, furto ou roubo do cartão, o titular obriga-se a comunicar tal facto a uma das entidades referidas nos impressos que lhe foram distribuídos juntamente com o cartão, pelo meio mais rápido ao seu dispor... o titular ficará, no entanto, obrigado a reembolsar a CEMG [Caixa Económica Montepio Geral] no que esta houver pago pelo uso indevido do cartão, dentro ou fora do país, até ao momento em que tenha sido recebida a referida comunicação”.
13-12-2000
Revista n.º 2583/00 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Simões Freire
Contrato de locação financeira Cláusula penal
Cláusula contratual geral
I - Não pode abstractamente considerar-se nula, por desproporcionada ao dano a ressarcir, a cláusula inserta em contrato de locação financeira, que estabelece que, resolvido o contrato, o locatário se constitui na obrigação de pagar indemnização igual a 20% da soma das rendas vincendas com o valor residual.
II - A cláusula penal que confere ao locador, quando o bem não for devolvido pelo locatário, no prazo fixado por aquele, por efeito da resolução do contrato, o direito a receber, por cada mês de mora ou fracção de mês que esta perdure, uma quantia igual ao dobro da renda mais alta praticada na vigência do contrato, sendo esse direito cumulável
com o referido em I, é proibida e portanto nula «consoante o quadro negocial padronizado», nos termos dos arts. 12.º e 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10, na redacção dada pelo DL n.º 220/95, de 31-08.
11-01-2001
Revista n.º 3622/00 - 7.ª Secção Xxxxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Contrato de locação financeira Cláusula contratual geral
Não é desproporcionada nem relativamente proibida, de acordo com o disposto no art. 19 do DL n.º 446/85, de 25-10, a cláusula de um contrato de locação financeira nos termos da qual, em caso de resolução por incumprimento do locatário, este ficará obrigado a restituir o equipamento ao locador, a pagar as rendas vencidas e não pagas, e uma importância igual a 20% do resultado da adição das rendas vincendas na data da resolução com o valor residual.
01-02-2001
Revista n.º 3137/00 - 7.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxxxx xx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
Seguro
Cláusula contratual geral Nulidade
I - É atribuição do Instituto de Seguros de Portugal (ISP) a verificação e fiscalização da conformidade técnico-legal do clausulado nos seguros obrigatórios, mas esse controlo prévio não subtrai actualmente esses contratos ao regime do DL n.º 446/85, nem actualmente colhe o argumento de se encontrarem cláusulas idênticas em apólices uniformes sujeitas a aprovação administrativa prévia.
II - O art. 22, n.º 1, do DL n.º 446/85, de 25-10, proíbe as cláusulas resolutivas que permitam a resolução ad nutum, ad libitum, discricionária, imotivada do contrato pelo predisponente, pois, de contrário, a seguradora estaria em condições de, a todo o tempo, pôr discricionariamente termo ao contrato, em prejuízo, mesmo, da função mutualista do seguro.
III - Os prejuízos decorrentes da resolução do contrato por iniciativa do tomador devem- se considerar a coberto do prémio competente em que se encontram já contempladas além do preço do seguro, as despesas de aquisição e administração do contrato e da gestão, cobrança e custo da emissão da apólice, actas adicionais e certificado de seguro, nada havendo que justifique indemnização autónoma em caso de resolução do contrato pelo tomador do seguro.
IV - Ocorrendo resolução por iniciativa do tomador do seguro, a cláusula geral que impõe o dever de indemnizar a cargo do segurado, para além do valor do prémio, consubstancia um enriquecimento sem causa da seguradora.
08-03-2001
Revista n.º 5/01 - 7.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxx
Sousa Inês
Cláusula contratual geral Publicidade Constitucionalidade
I - O n.º 2 do art. 30, do DL n.º 446/85, de 25-10, que permite a publicidade da proibição judicial de uma cláusula contratual geral, não tem qualquer carácter sancionatório, não é uma pena, nem regula em si mesmo a restrição de direitos, liberdades e garantias.
II - Consequentemente, tal norma não é nem orgânica nem materialmente inconstitucional.
05-04-2001
Revista n.º 414/01 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Simões Freire
Contrato de locação financeira Cláusula contratual geral
I - A locação financeira pode ser definida como o contrato a médio ou a longo prazo dirigido a financiar alguém, não através de uma prestação de uma quantia em dinheiro, mas através do uso de um bem.
II - Na relação locador-locatário encontram-se integrados os direitos e deveres caracterizantes do contrato, ou seja a obrigação do locador ceder o bem ao locatário para seu uso e o direito correspectivo do locatário e o dever do locatário de pagar renda e o correlativo direito do locador; o direito do locatário comprar a coisa no fim do contrato.
III - O locatário fica vinculado ao pagamento de uma renda que não corresponde ao valor locativo do bem, que não é a simples contrapartida da sua utilização, pois, deve permitir dentro do período da vigência do contrato a amortização do bem locado e cobrir os encargos e a margem de lucro da locadora, por forma a facultar ao locatário, findo o prazo do contrato, a aquisição do bem pelo seu valor residual.
IV - Não se tendo feito prova da inexistência de danos, as cláusulas contratuais que fixam, a título de indemnização, um montante igual a trinta por cento do capital financeiro em dívida no momento da resolução e que estabelecem a indemnização pelo atraso na entrega do locado, não são nulas, nos termos do art. 19, alínea c), do DL n.º 446/85, de 25-10, alterado pelo DL n.º 220/95, de 31-08.
08-05-2001
Revista n.º 543/01 - 1.ª Secção Pinto Monteiro (Relator) Lemos Triunfante
Reis Figueira
Seguro
Sub-rogação
Cláusula contratual geral Interpretação
I - O art. 441 do CCom tem de ser interpretado no sentido de conceder ao sub-rogado que paga a indemnização o direito de accionar quaisquer responsáveis para com o segurado, ainda que simples responsáveis civis, e não apenas o causador do sinistro.
II - A metodologia a seguir na interpretação de cláusulas contratuais gerais é homóloga à prevista no CC, nos arts. 236.º e ss., por força do art. 10 do DL n.º 446/85, de 25-10, atendendo ainda a que, nos termos do art. 11, n.º 1, deste diploma, as cláusulas ambíguas têm o sentido que lhes daria o contraente indeterminado normal que se limitasse a subscrevê-las ou a aceitá-las, quando colocado na posição de aderente real e a que, nos termos do n.º 2 desse artigo, na dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente.
III - O seguro de mercadorias transportadas pode abranger riscos subsumíveis a um seguro de responsabilidade civil.
15-05-2001
Revista n.º 897/01 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxxx
Cláusula contratual geral Proibição
Publicidade Constitucionalidade Seguro
Resolução Cláusula penal
I - A norma do DL n.º 446/85, que permite ao tribunal mandar publicar a sentença de proibição de uma cláusula contratual geral, não é inconstitucional, nem orgânica, nem materialmente.
II - O DL n.º 446/85 tem por objectivo a defesa do consumidor em relação a cláusulas contratuais gerais, o DL n.º 176/95 tem por objectivo a transparência na actividade seguradora.
III - Por isso, o DL n.º 176/95 não contém regime jurídico especial em relação ao do DL n.º 446/85, pelo que as suas disposições não prejudicam nem afastam as deste.
IV - Uma cláusula geral que, num contrato de seguro obrigatório, permita ao predisponente resolver livremente o contrato, sem motivo justificado, fundado na lei ou em convenção, deve considerar-se proibida (art. 22, n.º 1, al. b), do DL n.º 446/85).
V - Uma cláusula penal, estabelecida num contrato de seguro para o caso de resolução unilateral pelo segurado, que não se relaciona com o risco nem com os custos, deve considerar-se desproporcionada ao dano a ressarcir (art. 19, al. c), do DL n.º 446/85).
15-05-2001
Revista n.º 3156/00 - 1.ª Secção Reis Figueira (Relator) *
Xxxxxx Xxxxx Xxxxx Xxxxx
Cartão de débito Cartão de crédito
Cartão de garantia de cheque Contrato de utilização Cláusula contratual geral Risco
Meios de prova Resolução
Modificação do contrato Silêncio
I - O cartão de débito, encontrando-se associado a uma conta bancária, é um cartão de pagamento, ou seja, um instrumento que permite mobilizar directamente os fundos depositados.
II - O cartão de crédito, não se encontrando em princípio em relação directa com os fundos depositados, é essencialmente um cartão de pagamento diferido.
III - O cartão de garantia de cheque não constitui, em si mesmo, um meio autónomo de pagamento, funcionando em estreita conexão com outro meio de pagamento - o cheque
-, cuja utilização cauciona.
IV - Subjacente à operação de levantamento de numerário numa máquina automática de caixa e à operação de pagamento automático, está um contrato, designado «contrato de utilização» do cartão.
V - Trata-se de um contrato acessório, instrumental, em relação ao contrato de depósito bancário ou ao de abertura de crédito em conta corrente; revelando-se a acessoriedade não apenas pela função do próprio contrato, mas também pelo seu destino, dependente das vicissitudes daqueles tipos contratuais – p.ex., o cancelamento do depósito à ordem importará a caducidade do contrato de utilização.
VI - A cláusula (contratual geral) que determina que o titular do cartão, no caso do seu extravio, perda ou deterioração, é responsável por todas as transacções efectuadas até ao momento do aviso que está obrigado a efectuar ao banco, na medida em que não lhe possibilita a prova da ausência de culpa na respectiva utilização, está a subverter o regime respeitante à distribuição do risco vertido no art. 796, n.º 1, do CC, sendo absolutamente proibida e, em consequência, nula, nos termos dos arts. 21.º, al. f) e 12.º do DL n.º 446/85, de 25-10, na redacção dada pelo DL n.º 220/95, de 31-08.
VII - A cláusula (contratual geral) que estabelece que, em caso de divergência entre o montante indicado pelo titular do cartão e o apurado pelo banco, prevalece este último, implica uma indevida restrição aos meios probatórios admitidos por lei, sendo absolutamente proibida, nos termos do art. 21, al. g), do mesmo diploma.
VIII - A cláusula (contratual geral) que atribui ao banco o direito de exigir a devolução do cartão, bem como o de o reter, sempre que se verifique inadequada utilização, sem que a empresa possa reclamar qualquer indemnização, na medida em que estabelece uma verdadeira cláusula de resolução ad nutum, é proibida, nos termos do art. 22.º, n.º 1, al. b), do mesmo DL.
IX - A cláusula (contratual geral) que estabelece que as alterações das condições do clausulado, unilateralmente fixadas pelo banco, se consideram aceites pelo titular do cartão se este não as contestar no prazo de 15 dias a contar da data do envio do
respectivo aviso, na medida em que retira do silêncio do titular, subsequente ao envio do aviso – e não à sua recepção – uma manifestação tácita de aceitação, é proibida, nos termos do art. 19.º, al. d), do mesmo diploma.
11-10-2001
Revista n.º 2593/01 - 6.ª Secção Silva Paixão (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de transporte Perda das mercadorias Deterioração Reclamação Caducidade
Cláusula contratual geral
I - No regime do CCom, o direito de reclamação contra o transportador é regulamentado no § 2º, do art. 385, com respeito, apenas, à deterioração nas fazendas durante o transporte, e, como não podia deixar de ser, o prazo de oito dias aí cominado, que é um prazo de caducidade (art. 298, n.º 2, do CC), tem como termo inicial a data da entrega ao destinatário.
II - Sobre a perda das coisas entregues para transporte, e responsabilidade daí decorrente, regem os arts. 383.º e o § 3º, do citado 385.º, onde não está previsto qualquer prazo de reclamação prévio ao exercício do direito de indemnização, e dele condicionante.
III - Ainda que seja indubitável a intenção comum das partes de criar um caso especial de caducidade relativamente ao direito de indemnização por perda dos objectos transportados, de nada vale a cláusula, cuja função, na economia do negócio, é a de criar um prazo especial de prescrição daquele direito, ou, mesmo, a de facilitar, de maneira escandalosa, as condições em que a prescrição opera os seus efeitos, em total desrespeito da proibição contida no art. 300 do CC, que comina, para tais negócios, a sanção da nulidade.
IV - Se a lei (citado art. 300) não permite que se reduza convencionalmente o prazo de prescrição de um qualquer direito, não pode permitir, também, que convencionalmente se estabeleçam prazos pequenos de caducidade para o cumprimento de formalidades (como a dita reclamação) condicionantes do exercício do mesmo direito.
V - As condições gerais de um contrato não são, necessariamente, cláusulas contratuais gerais, podendo muito bem resultar de negociações preliminares, ainda que abreviadas. 06-12-2001
Revista n.º 3784/01 - 7.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Cartão de débito
I - Uma cláusula do contrato de utilização dum cartão de débito que prevê que “provando o titular o extravio, furto, roubo ou falsificação do cartão, correm por sua conta os prejuízos sofridos em virtude da utilização abusiva do cartão, no período anterior a comunicação desses factos ao banco emissor até ao montante correspondente ao contravalor em escudos de 150 ECU por ocorrência...”, para além de ter em conta as recomendações emanadas da Comissão Europeia, não vinculativas - recomendações 88/590/CEE e 97/489/CEE - opera uma distribuição equitativa de responsabilidades e é conforme aos ditames da boa fé, não sendo proibida nos termos da al. f) do art. 21.º do DL n.º 446/85, de 25-10.
II - A imputação da responsabilidade ao titular do cartão, pelo período decorrido até à notificação ou comunicação à entidade emitente, mais não representa que a concretização prática da exigência de um dever geral de diligência.
III - Face à al. d) do art. 19.º do mesmo diploma legal, é válida uma cláusula estabelecendo um prazo de 15 dias para o titular do cartão rescindir o contrato após a comunicação, por parte do Banco, de alteração de cláusulas das condições gerais do contrato.
14-02-2002
Revista n.º 4301/01 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator) Xxxxx Xxxx
Barata Figueira
Cartão de crédito Cláusula contratual geral Responsabilidade solidária
I - Reveste-se de certa ambiguidade a cláusula, constante das condições gerais de utilização de um cartão de crédito, que estabelece: “O Titular do cartão é a pessoa singular ou colectiva que contrata com a UNICRE a emissão de um ou mais cartões. No caso das pessoas singulares (cartão individual), pode ser emitido, com o mesmo número, um segundo cartão destinado ao Titular-2, ficando o Titular-1 solidariamente responsável pela sua utilização. No caso das pessoas colectivas (cartão empresa), o seu utilizador responde solidariamente com o respectivo Titular. São também solidariamente responsáveis com os Titulares do cartão, os subscritores dos respectivos pedidos de adesão."
II - Tal ambiguidade suscita-se quanto à responsabilidade solidária dos “subscritores” com os “Titulares do cartão”, já que a cláusula, ao referir-se ao "cartão individual" menciona apenas a responsabilidade solidária do Titular-1 e só depois de definir o regime aplicável ao "cartão empresa" estabelece a responsabilidade solidária dos "subscritores" com os "Titulares do cartão," podendo, assim, entender-se que esta solidariedade abrangeria apenas aqueles casos em que o subscritor não é titular do cartão: por exemplo, o subscritor do pedido de cartão para filho menor.
III - Face à ambiguidade referida, bem como às consequências da “responsabilidade solidária” destinada a perdurar sem limite de tempo dado o princípio da renovação automática clausulado, impunha-se à emitente do cartão dar cumprimento ao disposto no art. 6.º, n.º 1, do DL n.º 446/85, de 25-10.
19-03-2002
Revista n.º 449/02 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator)
Xxxxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Acção inibitória
Inutilidade superveniente da lide
I - No domínio da acção inibitória impõe-se a existência de cláusulas contratuais gerais “elaboradas para utilização futura” e será intentada contra quem “predispondo cláusulas contratuais gerais” proponha contratos que as incluam ou aceite propostas feitas nos seus termos ou contra quem, independentemente da sua predisposta utilização em concreto, as recomende a terceiros.
II - Provando-se nas instâncias que a ré seguradora e após a instauração contra si da acção inibitória por o Instituto de Seguros de Portugal ter emitido a norma regulamentar n.º 10/97, procedeu à alteração dos contratos a celebrar onde se incluíam as cláusulas contratuais gerais cuja abstenção de utilização se requeria, o mesmo acontecendo em relação aos contratos já celebrados, em ambos os casos até final de 1997, inexiste o uso a que a acção inibitória se destina e mesmo o uso em termos de contratos já celebrados, sendo certo que a acção inibitória não é o meio adequado para decidir da nulidade de cláusulas incluídas em contratos celebrados antes da decisão da acção inibitória.
III - Consistindo o objecto da acção inibitória na proibição de utilização futura de cláusulas proibidas, tendo a ré, no decurso da acção retirado essas cláusulas dos contratos a celebrar bem como dos contratos celebrados, cumpriu antecipadamente aquilo a que a acção se destinava, desaparecendo o seu objecto, quer no sentido intencional quer no sentido material, o que traduz a inutilidade da lide.
IV - A extensão dos efeitos específicos do caso julgado a terceiros, como a publicidade da proibição, são efeitos ou consequências da decisão inibitória, pelo que inexistindo esta não há que falar naquelas, mesmo que sejam para fundamentar o prosseguimento da acção.
23-04-2002
Revista n.º 3417/01 - 6.ª Secção Alípio Calheiros (Relator) Xxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de aluguer de longa duração Falta de entrega
Indemnização
Cláusula contratual geral Nulidade
I - O regime previsto no art. 1045.º do CC quanto à indemnização pelo atraso na restituição da coisa locada mostra-se totalmente desajustado no caso de alugueres de longa duração, no decurso dos quais o valor da coisa locada é amortizado, subsistindo no termo do contrato um valor residual.
II - Neste caso, o prejuízo sofrido pelo locador, consequência do atraso na restituição, traduz-se na diferença entre o valor residual previsto no contrato e o valor venal no momento da entrega.
III - É nula (arts. 12.º e 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10), por ser manifestamente exagerada a indemnização nela prevista, a cláusula contratual que, em contrato de aluguer de longa duração, estabelece: “a restituição do veículo em data posterior à acordada, fará incorrer o locatário numa indemnização de valor igual ao dobro do aluguer, calculado relativamente a cada dia de atraso”.
IV - Sendo o valor residual de 82.303$00 e o obtido na venda do veículo em causa o de 200.000$00, não é devida qualquer indemnização resultante do atraso na entrega.
11-04-2002
Revista n.º 812/01 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Acção de apreciação negativa Cláusula contratual geral Telecomunicações
As disposições dos arts. 16.º, n.º 2, e 21.º, n.º 5, do Regulamento Anexo ao DL n.º 199/87, de 30-04 (Regulamento do Serviço Telefónico Público), não são cláusulas contratuais gerais a que se deva aplicar o regime do DL n.º 446/85, de 25-10, antes verdadeiras disposições legais, aplicáveis a todos os operadores de telecomunicações em termos de plena paridade legislativa.
28-01-2003
Revista n.º 3471/02 - 6.ª Secção Ponce de Leão (Relator) Xxxxxx xx Xxxx
Xxxxxx Xxxxxxx
Contrato de locação financeira Resolução
Cláusula contratual geral Nulidade
I - A parte inocente no contrato pode, numa só declaração dirigida à outra parte, fixar um prazo para esta cumprir e, desde logo, resolver o contrato, se tal injunção não for respeitada.
II - Tendo a locadora financeira resolvido o contrato de locação com fundamento no n.º 4, da cláusula 10.ª, a condenação da locatária no pagamento da renda vencida e das rendas vincendas que seriam devidas até ao termo do contrato, tudo com juros, bem como a restituição do equipamento objecto da locação, não sendo a resolução do contrato compatível com a recepção das rendas vincendas, sendo o conjunto do peticionado desproporcionado ao prejuízo sofrido, é nula a cláusula contratual em causa, atentas as disposições dos arts. 12.º e 19.º, alínea c), do DL n.º 446/85, de 25-10, e 28.º, n.º 1, do CC, no segmento do direito às rendas vincendas, no caso de resolução contratual.
18-03-2003
Revista n.º 654/03 - 6.ª Secção Xxxxxx xx Xxxx (Relator)
Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Conta bancária
Ordem de transferência Cláusula contratual geral
Não sendo a ordem de transferência um contrato mas um acto de execução de contrato (nomeadamente dum contrato de giro bancário), não contém cláusulas contratuais gerais e, por isso, não está sujeita ao respectivo regime jurídico, nomeadamente o art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25-10.
13-03-2003
Revista n.º 215/03 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Contrato de locação financeira Cláusula contratual geral Cláusula penal
Não é desproporcionada aos danos a ressarcir, e por isso nula, a cláusula (contratual geral) penal que, num contrato de locação financeira, fixa a título de indemnização o valor de 20% da soma das rendas vencidas e do valor residual.
03-06-2003
Revista n.º 2973/02 - 1.ª Secção Pinto Monteiro (Relator)
Reis Figueira Barros Caldeira
Contrato de transporte Transitário
Cláusula CAD
Cláusula contratual geral Boa fé
I - O contrato de transporte integra, por norma, três entidades: aquele que pretende ver as coisas transportadas (expedidor); o que se encarrega de fazer o transporte, isto é, a mudança das mercadorias de um lugar para outro (transportador) e aquele a quem as mercadorias são consignadas (destinatário). Sendo que, atenta a sua natureza continuada, ele se inicia no momento em que o transportador toma conta das mercadorias e só termina no momento em que as entrega ao destinatário.
II - E, apesar de as actividades de transitário (prestação de serviços a terceiro, no âmbito da planificação, controlo, coordenação e direcção das operações necessárias à execução das formalidades e trâmites exigidos na expedição, recepção e circulação de bens ou mercadorias) e de transportador (realização das operações necessárias para transferir uma coisa de um local para outro) serem diferenciadas, nada impede que o primeiro
actue também como transportador. É situação que, usualmente, ocorre no nosso circuito comercial.
III - A obrigação, assumida pela transportadora, de proceder à deslocação das mercadorias da autora, bem como de as entregar ao destinatário nos termos convencionados, não é descaracterizada pela cláusula CAD convencionada, porquanto esta cláusula, inserível no conteúdo do próprio contrato de transporte, se refere a uma prestação acessória do transportador, não o transformando em contrato misto de transporte e de mandato, de modo que à violação da mesma sejam de aplicar as regras deste último.
IV - Consequentemente, quando o transportador recorre a terceiro para cumprir as obrigações advindas do contrato celebrado, ou o faz no âmbito da celebração de um subcontrato ou, de outro modo, sem cobertura contratual, serve-se de quaisquer pessoas ou entidades que o auxiliem no cumprimento dessas obrigações (art. 800, n.º 1, do CC), não se enquadrando a situação no âmbito da representação voluntária.
V - Em qualquer dos casos, o transportador continua obrigado ao cumprimento, pois, tanto numa como noutra das situações, é ele o sujeito da relação contratual de transporte que estabeleceu com o expedidor.
VI - Esta obrigação existe apesar do disposto no n.º 1 do art. 26 das “Condições Gerais de Prestação de Serviços pelo Transitário”, aprovadas pela APAT em 1985. Em primeiro lugar, por ser inaceitável a sua aplicação aos casos em que o transitário é simultaneamente o transportador. Depois, porque teria o valor de cláusula contratual geral - em contrato de adesão, considerando-se proibida quer por ser contrária à boa fé quer por se traduzir numa cláusula de irresponsabilidade.
VII - À recorrente, na medida em que não cumpriu a cláusula CAD estipulada (não obstante esse incumprimento se ter ficado a dever à actuação de um terceiro a que recorreu), é imputável o incumprimento do contrato que celebrou com a recorrida, daí advindo a legal consequência de ter que a indemnizar pelos prejuízos sofridos (art. 798 do CC).
08-07-2003
Revista n.º 1832/03 - 7.ª Secção Xxxxxx xx Xxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxx
Cláusula contratual geral Nulidade
Publicação
I - São nulas, por violação dos arts. 22.º, n.º 1, alínea b), e 19.º, alínea c), do DL 446/85, de 25 de Outubro, as cláusulas inseridas pela Companhia de Seguros nos contratos-tipo que lhe permitem resolver o contrato de seguro sem motivo justificativo previamente conhecido pelo outro contraente e que lhe conferem, se a resolução ocorrer por iniciativa do tomador de seguro, o direito a reter, a título de cláusula penal, 50% do prémio correspondente ao período de tempo não decorrido.
II - É de manter (o acórdão da Relação) a declaração de tal nulidade e a proibição de uso das cláusulas em quaisquer apólices que titulem contratos que a seguradora celebre e, bem assim, a publicação da sentença em dois números seguidos dos jornais diários de âmbito nacional com maior tiragem, em cumprimento do disposto no art. 34, do citado DL.
Revista n.º 2357/03 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Omissão de pronúncia Erro de julgamento Contrato misto Contratos múltiplos Declaração negocial Interpretação
Cláusula contratual geral
Teoria da impressão do destinatário Dever de comunicação
Dever de informação Ónus da prova
I - Um acórdão da Relação que considera que a apreciação de determinadas questões, a que aludiu, nessa medida a elas atendendo, está prejudicada pela solução dada a outras, não enferma de omissão de pronúncia; quando muito, a verificar-se que não ocorre o nexo de prejudicialidade invocado, incorrerá em erro de julgamento, insusceptível de ser qualificado como nulidade.
II - Pode qualificar-se determinado contrato como contrato misto restrito, nos termos do art. 405, n.° 2, do CC, quando os contraentes reúnem em um só negócio regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei; em contrapartida, sempre que sejam celebrados dois ou mais contratos que desempenham, pela sobreposição de elementos vários, uma multiplicidade de funções, correspondentes a contratos distintos, estaremos perante a figura de contratos múltiplos, que se apresentam como distintos e autónomos entre si.
III - Todavia, mesmo no caso de contratos múltiplos, se entre eles existe uma determinada conexão, designadamente pela relação de motivação que os afecta, constituindo até certo ponto contratos complementares um do outro, a interpretação das declarações negociais neles insertas deve ser efectuada em conjunto.
IV - A nossa lei consagrou, em matéria de interpretação das declarações negociais, a teoria da impressão do destinatário, sendo certo que o sentido interpretativo e, antes ainda, a própria actividade de interpretação, não sofrem qualquer sensível modificação pelo facto de as declarações negociais se reportarem a cláusulas contratuais gerais, excepto se o resultado da interpretação conduzir a um resultado ambíguo ou duvidoso, caso em que se optará pelo sentido mais favorável ao aderente.
V - O ónus da prova do cumprimento dos deveres de comunicação e de informação constantes, no que respeita às cláusulas contratuais gerais, nos art. 5 e 6 do DL n.° 446/85, de 25-10, incumbe à parte que submeteu a outrem as cláusulas contratuais gerais.
XX - Xxxxxxx, é ao contraente que pretende prevalecer-se da omissão desses deveres que incumbe o ónus de alegação, pelo que o contratante que apresentou as cláusulas contratuais gerais só terá que fazer a prova de que cumpriu adequadamente os deveres de comunicação e de informação, se o outro contratante invocou, em sede alegatória, que tais deveres não foram cumpridos.
09-10-2003
Revista n.º 1384/03 - 7.x Xxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxxx
Salvador da Costa Ferreira de Sousa
Neves Ribeiro (vencido)
Contrato de seguro de acidentes pessoais Cartão de crédito
Contrato de adesão Interpretação do negócio jurídico
I - Um contrato celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos e uma seguradora com o objectivo de proporcionar aos titulares do seu cartão VISA GOLD, seguros de vida ou de acidentes pessoais, não configura um contrato de adesão, uma vez que os beneficiários não são parte nesse contrato.
II - Por isso não lhe é aplicável a norma do n.º 2 do art. 11 do DL 446/85 de 25-10 que estabelece a prevalência do sentido mais favorável ao aderente em caso de dúvidas quanto ao sentido de determinada cláusula contratual.
III - Por aplicação dos critérios normativos dos arts. 236 e 238 do CC deve entender-se coberto pelo contrato de seguro o falecimento de um dos titulares do Cartão Visa Gold num acidente de aviação ocorrido dentro de um raio de 50 Kms da sua residência por dever interpretar-se a cláusula que estabelece para "além de 50 kms", como referida à extensão da viagem projectada e não à distância efectivamente percorrida.
19-02-2004
Revista n.º 4155/03 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Contrato de seguro Equídeo
Vigilante Terceiro
Exclusão da responsabilidade Interpretação da declaração negocial Cláusula contratual geral
Poderes da Relação
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I - O proprietário do equídeo, mediante a celebração de um contrato de seguro, transferiu para a ré a responsabilidade pelo pagamento das indemnizações devidas pelos danos causados a terceiros pelo animal, com exclusão dos causados ao proprietário, vigilante ou utilizador.
II - Compete ao STJ determinar o sentido relevante para o direito que terá de ser atribuído à declaração negocial constante da cláusula contratual aqui em causa, sendo
certo que qualquer das interpretações efectuadas pelas instâncias, encontra um mínimo de correspondência no texto.
III - Perante a ambiguidade da cláusula que nos prende, um aderente normal ao contrato de seguro, colocado na posição do dono do cavalo que subscreveu o contrato de adesão, não deixaria certamente de pensar que o vigilante teria de ser uma pessoa por ele encarregada de fazer a vigilância do equídeo e o utilizador a pessoa por ele autorizada a montar o cavalo.
IV - Como os danos foram supostamente causados ao autor quando segurava os arreios do animal a pedido do utilizador autorizado pelo dono, deve o demandante ser encarado como um terceiro, e não como um vigilante, abrangido portanto pela responsabilidade da ré/seguradora, caso, obviamente a matéria de facto impugnada venha a provar-se.
V - Seria este o sentido que uma pessoa normalmente sagaz, colocada na posição do dono do cavalo, captaria, ao celebrar com a ré o aflorado contrato de seguro por simples adesão, por corresponder à interpretação da cláusula que melhor defendia os seus interesses, visto alargar mais o campo da responsabilidade da ré/seguradora.
VI - De resto, a ambiguidade da cláusula sempre teria de ser desfeita a favor do dono do animal, já que se limitou a subscrever um contrato de adesão cujos termos foram elaborados exclusivamente pela ré/seguradora, sobre quem impendia a obrigação de estabelecer cláusulas perfeitamente claras, por serem por ela elaboradas e ser exigência do princípio da boa fé, que, segundo a doutrina moderna, dispensa uma protecção especial ao contraente fraco ou em posição desfavorecida.
VII - A decisão da Relação é por conseguinte a correcta, enquanto interpreta a cláusula em referência no sentido normativamente prevalecente e ordena que os autos prossigam os seus regulares termos com a elaboração da especificação e da base instrutória.
VIII - A relação exorbitou contudo dos poderes atribuídos pela lei à 2.ª instância na medida em que quis vincular a 1.ª instância a interpretar a cláusula em referência, na decisão que a final vier a proferir, no sentido que indicou no acórdão recorrido, já que é ao STJ, e não à Relação, que incumbe ditar às instâncias o direito neste processo.
27-05-2004
Revista n.º 1563/04 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Obrigação Novação Modificação
Extinção das obrigações Cláusula contratual geral Erro na declaração
I - Questão particularmente difícil pode ser a distinção, na prática, entre novação e simples modificação ou alteração da obrigação. «O que importa saber é se as partes quiseram ou não, com a modificação operada, extinguir a obrigação, designadamente as suas garantias ou acessórios».
II - Extinta a obrigação antiga, extintas devem ficar as obrigações acessórias e, portanto, as garantias do crédito, pessoais ou reais, quer tenham sido prestadas pelo originário devedor, quer por terceiro.
III - Admite-se, no entanto, quanto a elas, uma reserva de conservação ou manutenção que tem de ser expressa (cfr. art. 217, do CC) e não apenas clara, como propunha Vaz Serra. Essa reserva, tratando-se de garantia prestada por terceiro, tem de ser consentida, também expressamente, por este (n.º 2).
IV - A cláusula contratual onde o respectivo redactor escreveu “O presente contrato substitui, para todos os efeitos legais o anterior contrato assinado entre essa empresa e o Banco”, não pode ser desconsiderada porque tal não seria interpretação mas constituiria revogação pura e simples de clara expressão de vontade.
V - Nem pode admitir-se erro na declaração quando um dos declarantes e redactor do texto é o Banco que comunicou à outra parte ter “aceite alterar as cláusulas (...)”.
VI - Extintas as obrigações emergentes do primeiro contrato pela sua substituição pelas resultantes do segundo contrato (arts. 857 e 859) extintas ficaram as suas garantias, designadamente o aval (art. 861) que constituía a causa de pedir na execução contra si instaurada, já que a respectiva manutenção exigiria reserva expressa que não existiu.
06-07-2004
Revista n.º 1826/04 - 6.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxx
Nuno Cameira
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Acção inibitória
Cláusula contratual geral Inutilidade superveniente da lide
I - Não enferma de nulidade por excesso de pronuncia o acórdão do Tribunal da Relação no qual se procedeu ao aditamento à matéria de facto assente do conteúdo de documentos particulares não impugnados pelas partes e que foram reputados de relevantes para a decisão da causa.
II - Tal faculdade de fixação de factos materiais da causa é insindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que não ocorre ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência dos factos ou que fixe a força de determinados meios de prova.
III - O facto de a ré ter deixado de proceder à comercialização de produtos acompanhados de certificados de garantia que comportavam cláusulas proibidas nos termos do disposto nos arts. 18 al. c) e 21 al. d) do XX x.x 000/00, xx 00-00 (xx redacção dada pelo DL n.º 220/95, de 31-08) não gera por si só a inutilidade superveniente da lide da acção inibitória.
IV - A extinção da instância com base em tal fundamento apenas poderá ocorrer caso se demonstre que os ainda existentes produtos acompanhados de tais certificados de garantia não serão utilizados em contratações futuras com quaisquer interessados.
07-10-2004
Revista n.º 2752/04 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contrato de locação financeira
Cláusula contratual geral Nulidade do contrato Recurso de revista Âmbito do recurso
I - Não deve ser conhecida em revista para o Supremo a alegada nulidade de cláusula de contrato de locação financeira reguladora da resolução do contrato e seus efeitos, emergente de violação dos arts. 12 e 19 al. c) do DL n.º 446/85, de 25-10, quando o contrato ajuizado não fora objecto de resolução, fundando-se os pedidos, ao invés, no termo do contrato, regido por cláusula diferente, e no incumprimento de obrigações contratuais de todo estranhas à resolução.
II - Na verdade, desacompanhado de factos conducentes à invalidade total do negócio, o aludido meio de defesa implicaria tão-somente - utile per inutile non vitiatur - mera nulidade restrita à cláusula sindicada (art. 292 do CC; cfr. também o art. 14 do citado DL), alheia ao objecto material da acção definido pela causa de pedir e o pedido.
07-10-2004
Revista n.º 1302/03 - 2.ª Secção Xxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxx Xxxxxxxxxx
Bettencourt de Faria
Contrato de locação financeira Nulidade do contrato
Objecto negocial Fim contratual Seguro-caução Garantia autónoma
Cláusula contratual geral
I - A improcedência da nulidade de contrato de locação financeira por alegada contraditoriedade à lei e à ordem pública do objecto e fim do negócio, nos termos dos arts. 280 e 281 do CC, prejudica o conhecimento da invocada nulidade do contrato de seguro-caução das obrigações da locatária, conexamente arguida com fundamento no princípio da acessoriedade aflorado a propósito da garantia fidejussória no art. 632 n.º 1 do mesmo corpo de leis.
II - Não sendo imputado ao seguro-caução vício algum afora a aludida acessoriedade relativamente a um contrato nulo, a solução sumariada em I não depende da natureza, autónoma ou acessória, da garantia consubstanciada no contrato de seguro.
III - Pedida como vincenda determinada renda do contrato de locação financeira objecto de resolução ao abrigo da cláusula contratual respectiva, deve a mesma ser juridicamente qualificada como renda vencida - na aferição da nulidade da cláusula por violação dos arts. 12 e 19 al. c) do DL n.º 446/85, de 25-10 -, uma vez que a data do vencimento, conquanto posterior à data da declaração de resolução, é, todavia, anterior à data da produção dos seus efeitos.
07-10-2004
Revista n.º 3558/02 - .2ª Secção Xxxxx Xxxxxx (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Dívida de cônjuges Proveito comum do casal Bens comuns do casal Questão de facto Questão de direito
Contrato de crédito ao consumo Perda do benefício do prazo Juros compensatórios
Cláusula contratual geral Assinatura
Interpretação
I - Determinar se uma dívida, assumida por um dos cônjuges, foi contraída em proveito comum do casal, significa averiguar se o dinheiro ou os bens em cuja aquisição foi aplicado se destinaram a satisfazer interesses comuns do casal.
II - A questão de apurar o proveito comum apresenta-se como uma questão mista ou complexa envolvendo uma questão de facto - averiguar o destino dado ao dinheiro representado pela dívida - e outra de direito - saber se, perante o destino apurado, a dívida foi contraída em proveito comum, preenchendo o conceito legal.
III - A expressão legal "proveito comum" traduz-se num conceito de natureza jurídica a preencher através dos factos materiais indicadores daquele destino, a alegar na petição inicial, pelo que não se trata de matéria de facto passível de ser adquirida por confissão ficta (art. 484 n.º 1 do CPC).
IV - Não releva igualmente a alegação de que o automóvel destinou-se ao património comum do casal, pois o problema é o mesmo: o conceito de património comum é jurídico, dado que está associado ao conhecimento da data do casamento e respectivo regime de bens, não dispensando o silogismo judiciário e o recurso a actividade interpretativa.
V - Tendo o autor omitido o ónus de alegar, para provar, os factos de que pudesse concluir-se pelo "proveito comum", enquanto pressuposto constitutivo da responsabilização de ambos os cônjuges, tal incumprimento determina a improcedência da sua pretensão relativamente ao cônjuge não contraente.
VI - No contrato de crédito ao consumo, na modalidade de mútuo oneroso, o não pagamento de uma das prestações fraccionadas do capital importa o vencimento das restantes nos termos do art. 781 do CC.
VII - No entanto, este preceito não se aplica à falta de pagamento de uma prestação de juros, pois não é concebível a perda do benefício do prazo se não existem um prazo nem uma inerente obrigação constituída.
VIII - Nos contratos de adesão, as cláusulas apostas após as assinaturas dos outorgantes do contrato não fazem parte do contrato (art. 8 al. d) do DL n.º 446/85, de 25-10).
IX - A cláusula contratual que determina que “a falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes”, interpretada nos termos estabelecidos pelos arts. 236 do CC e 11 do DL n.º 446/85, deve ser entendida com o sentido de que a falta de pagamento de uma mensalidade implicará a perda do benefício do pagamento escalonado do capital emprestado e não também o dos juros que nasceriam até ao fim do contrato.
02-11-2004
Revista n.º 2982/04 - 1.ª Secção
Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxx
Acção inibitória Defesa do consumidor
Cláusula contratual geral Custas
Serviços públicos essenciais
I - É objectiva a isenção de custas da acção inibitória destinada a prevenir, corrigir ou fazer cessar práticas lesivas dos direitos do consumidor consignados na Lei 24/96, de 31-07 (Lei de Defesa do Consumidor).
II - As regras consagradas na Lei 23/96, de 26-07 (Lei dos serviços públicos essenciais) são aplicáveis ao serviço de fornecimento de gás, independentemente da natureza pública ou privada do prestador.
III - É nula, porque proibida (art. 21 al. a) do DL 446/85, de 25-10, e art. 5 n.º 2 da Lei 23/96), a clausula inserida nas condições gerais de um contrato de fornecimento de gás canalizado que prevê a possibilidade de interrupção do fornecimento de gás como imediata consequência do não pagamento da respectiva factura no tempo e lugar devidos.
02-11-2004
Revista n.º 2905/04 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Nulidade da decisão Contrato de seguro Direito de regresso Acidente de trabalho Acidente de viação Contrato de adesão Cláusula contratual geral Interpretação
I - A enumeração pelo art. 668 n.º 1 do CPC dos casos de nulidade da sentença (aplicável aos acórdãos das Relações exarados em sede de apelação por força do disposto no art. 716 n.º 1 do mesmo Código) é taxativa, não abrangendo qualquer outra nulidade processual a que a lei faça corresponder uma invalidade mais ou menos extensa.
II - O art. 441 do CCom deve ser interpretado extensivamente abrangendo também os seguros de responsabilidade sempre que exista um direito de regresso do segurado contra terceiro.
III - Consagra, por isso, o princípio de o segurador se subrogar ao segurado contra terceiros responsáveis pelo dano, concedendo ao sub-rogado que paga a indemnização o direito de accionar qualquer dos responsáveis para com o segurado.
IV - A Base XXXVII da Lei n.º 2127, de 03-01-1965, no seu n.º 4, confere à entidade patronal ou à seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente de trabalho o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.º 1, se a vítima não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano, a contar da data do acidente. V - As situações previstas nesta Base, mais frequentemente associadas aos casos de acidente de trabalho que são simultaneamente acidentes de viação, abrangem porém, todas aquelas em que o sinistrado fica constituído no direito de pedir indemnização ao empregador (ou sua seguradora) no processo próprio por acidente de trabalho e, pelos mesmos factos, ou por factos conexos, pedir, noutro processo, ou extrajudicialmente, indemnização de terceiro com fundamento na lei geral civil.
VI - A diversidade de interesses protegidos pela Lei n.º 2127 (designadamente pela Base XXXVII) e pelo CC (art. 503) não obsta a que aquele que, por força do contrato de seguro de acidentes de trabalho que celebrara com a entidade patronal do lesado, pagou a este a indemnização decorrente de acidente de trabalho intente acção contra o terceiro causador do acidente pedindo o pagamento das quantias que pagou ao lesado e que, nesta acção, sejam tomadas em consideração todas as presunções de culpa que a lei civil estabelece no domínio da responsabilidade civil extracontratual.
VII - Caso de força maior (na definição de Enneccerus-Nipperdey) é o acontecimento cognoscível, imprevisível e que não deriva da actividade em curso, e que, por isso mesmo, lhe é exterior, e cujo efeito danoso não pode evitar-se com as medidas de precaução que racionalmente seriam de esperar. Desta sorte, para se poder dizer que há uma causa de força maior é necessário que o acontecimento causal seja exterior à pessoa do detentor e da própria coisa que provoca ou produz o risco.
VIII - As cláusulas contratuais inseridas em contrato de adesão, elaboradas sem prévia negociação individual, que a segurada se limitou a subscrever - cláusulas contratuais gerais - devem subordinar-se ao princípio da boa fé e são interpretadas de harmonia com as regras relativas à interpretação dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam.
IX - O CC, nos arts. 236 a 238, define o tipo de sentido negocial decisivo para a interpretação nos termos da doutrina objectivista denominada teoria da impressão do destinatário, segundo a qual a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria.
X - Uma cláusula aposta num contrato de seguro de responsabilidade civil geral (contrato de adesão) - no qual a seguradora declarou assumir a cobertura do risco da actividade de construção civil e obras públicas, incluindo abertura de estradas, terraplanagens e escavações exercidas pela segurada - em cujos termos "não ficam garantidos, em caso algum, ainda que o Segurado possa ser civilmente responsável, as indemnizações devidas nos termos da legislação do trabalho" deve ser interpretada com o sentido de que as partes pretenderam apenas e tão só excluir da cobertura do seguro de responsabilidade civil geral as situações em que o fundamento da indemnização devida pela segurada e exigida à seguradora, já com fundamento na responsabilidade civil extracontratual, fosse, em concreto, advinda de um acidente de trabalho sofrido por um dos trabalhadores daquela (relativamente ao qual a segurada estava vinculada por um dever de indemnizar nos termos da legislação de acidentes de trabalho).
XI - A razão essencial da cláusula bem como o seu significado assentam na vontade de, nos casos em que os trabalhadores da segurada, lesados em acidente de trabalho, tendo ou não sido indemnizados pela sua entidade patronal, vierem peticionar contra a seguradora indemnização baseada na responsabilidade civil extracontratual daquela (objecto do contrato de seguro) possa sempre esta opor-lhes a excepção de exclusão da cobertura pelo seguro.
04-11-2004
Revista n.º 3062/04 - 7.ª Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxx
Seguro de créditos Facto notório
Cláusula contratual geral Enriquecimento sem causa Princípio nominalista
I - É questão nova, de que o tribunal de revista não pode conhecer, a relativa à resolução do contrato de seguro ou à sua modificação por alteração das circunstâncias, que não invocada no tribunal da 1ª instância e, por isso, não conhecida no âmbito do recurso de apelação.
II - Não é facto envolvido de notoriedade geral para efeito do disposto no art. 514, n.º 1, do CPC, o caos económico e político na República da Rússia em razão da desagregação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
III - As cláusulas contratuais gerais desresponsabilizantes da seguradora a que se reportam os artigos 6.º e 20.º, n.º 2, do clausulado geral do contrato de seguro de crédito em situação de risco político e extraordinário são inaplicáveis depois do termo do contrato de seguro por via do pagamento do prémio e da indemnização do dano derivado do sinistro.
IV - Indemnizada a segurada pela seguradora em razão da falta de pagamento do preço relativo ao contrato de compra e venda pela compradora estrangeira, inscreve-se na titularidade da segunda, nos termos do artigo 18.º, n.º 1, do clausulado geral do contrato de seguro de crédito, o direito de sub-rogação correspondente ao montante indemnizatório por ela despendido.
V - Os normativos relativos à imputação do cumprimento, a que se reportam os arts. 783.º a 785.º do CC, pressupõem a espontânea acção de cumprimento pelo devedor, ou seja, a entrega da prestação num quadro de débito plural a que está vinculado perante o credor.
VI - O credor que obteve a condenação do devedor no pagamento de duas dívidas relativas a dois contratos de compra e venda, uma correspondente ao seu direito de crédito e a outra apenas a dez por cento dele em virtude do direito de sub-rogação da seguradora quanto ao restante, em relação às quais, em violação do direito da última, celebrou com o devedor contrato de remissão de metade de ambas, não pode invocar o instituto da imputação do cumprimento para reduzir o montante do que deve devolver à seguradora por virtude do seu direito de sub-rogação.
VII - O instituto do enriquecimento sem causa caracteriza-se pela inexistência de qualquer negócio ou facto justificativo da apropriação de valores cuja restituição é pedida, e, dada a sua natureza subsidiária, a causa de pedir que o integra cede perante a causa de pedir relativa ao incumprimento contratual e derivada responsabilidade civil obrigacional.
VIII - O instituto do enriquecimento sem causa, por um lado, não pode fundar a restituição da indemnização prestada pela seguradora na medida em que a sua prestação constituiu o cumprimento do contrato de seguro, e, por outro, é estruturalmente
incompatível com qualquer tipo de defesa da segurada na posição passiva da causa que não seja veiculada por via de reconvenção.
IX - Tendo a segurada, beneficiária do contrato de seguro de crédito, depois da indemnização do prejuízo decorrente do sinistro pela seguradora, sem autorização ou consentimento da última, recebido do devedor, depois de convencionar com ele a redução a metade, determinada quantia abrangente do preço de dois contratos de compra e venda, um deles coberto pelo seguro na proporção de noventa por cento, deve devolver à referida seguradora a parte proporcional ao direito de crédito sub-rogado.
X - No que concerne ao excesso da indemnização paga pela seguradora à segurada, no cumprimento do contrato de seguro, em relação à quantia mencionada na parte final do número anterior, a primeira podia exigir da última a indemnização respectiva no quadro da violação do seu direito de crédito derivado da sub-rogação em razão do acordo de remissão de dívida acima referido desde que causal fosse em relação à impossibilidade da efectivação do seu direito de sub-rogação.
XI - A estrutura da causa de pedir no direito processual civil português caracteriza-se essencialmente pelas vertentes de facticidade e de concretização, envolvendo os factos concretos correspondentes à previsão das normas substantivas concedentes da situação jurídica invocada pelo autor ou pelo reconvinte, independentemente da respectiva valoração jurídica.
XII - A expressão “após o referido acordo não se mostra possível a recuperação do remanescente do crédito” não passa de mera conclusão que, só por si, é inidónea, no quadro da responsabilidade civil contratual, para integrar o segmento da causa de pedir relativo à causalidade adequada entre a celebração do mencionado acordo de remissão de dívida e a impossibilidade da efectivação do direito de sub-rogação da seguradora no confronto do devedor que deu causa ao sinistro.
XIII - Com vista à indemnização moratória, a mora da segurada em relação à sua obrigação de devolução à seguradora da quantia mencionada sob IX ocorre na data em que a primeira a recebeu do devedor do preço relativo aos contratos de compra e venda. XIV - Utilizado no contrato de compra e venda o dólar americano, operada a indemnização do sinistro em escudos por referência cambial àquela moeda, não obstante o clausulado geral do contrato de seguro expressar o pagamento em escudos de qualquer valor dele emergente, apesar do princípio nominalista, a devolução à seguradora do montante mencionado no número anterior deve operar em euros por referência cambial ao dólar americano na data do respectivo recebimento pela segurada.
25-11-2004
Revista n.º 3806/04 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Acidente de viação Morte
Contrato de seguro facultativo Condução sob o efeito de álcool Cláusula contratual geral
Nexo de causalidade Ónus da prova
I - Proibindo a lei a condução sob influência do álcool (nos termos previstos no Código da Estrada), por óbvias razões de segurança rodoviária e por isso de ordem pública, a unidade do sistema jurídico impõe que as seguradoras possam legitimamente excluir, no âmbito do seguro facultativo, o dever de pagar o capital seguro quando se trate de uma tal condução do segurado contrária à lei.
II - Uma cláusula contratual constante das Condições Gerais do contrato que assim disponha encontra-se em sintonia com as normas legais prescritivas e de ordem pública do direito português, pelo que não tem que ser comunicada ao segurado, nem este tem que ser informado de aspectos cuja aclaração se justifique nos termos do regime geral das cláusulas contratuais gerais do DL 446/85, visto que se trata apenas de cumprir a lei, a qual, além de obrigatória, se presume de conhecimento universal.
III - Na acção intentada pelo beneficiário de contrato de seguro de vida contra a respectiva seguradora a fim de obter a condenação desta no pagamento do capital seguro, com fundamento na morte do segurado, temos que:
a) o autor (beneficiário do seguro) tem o ónus de alegar e provar a existência do seguro, o falecimento do segurado e a sua qualidade de beneficiário, porque são estes os (únicos) factos constitutivos do seu direito (art. 342.º, n.º 1, do CC);
b) a ré (seguradora) tem o ónus de alegar e provar que o segurado conduzia sob o efeito do álcool, porque se trata, contratualmente, de um facto impeditivo do direito do autor (art. 342.º, n.º 2, do CC): a excepção à cobertura do risco seguro é o condutor do veículo conduzir sob o efeito do álcool.
IV - Provada pela ré a condução sob influência do álcool, o autor, para poder mesmo assim ter direito ao capital seguro, considerando-se o evento morte coberto, tem de provar que o acidente não se deveu a essa causa, mas a outra, ficando então o autor com o ónus de alegar e provar que a taxa excessiva de álcool no sangue não foi a causa do acidente e da morte, porque, por exemplo, o acidente se deu por culpa exclusiva de terceiro, o que constitui facto impeditivo do funcionamento da excepção (a causa de exclusão do risco), cujo ónus de alegação e prova cabe ao autor (art. 342, n.º 1, ou art. 342, n.º 3, ambos do CC).
V - Ao caso em apreço (acção de condenação da seguradora a pagar o capital do seguro de vida) não é aplicável a doutrina do acórdão uniformizador n.º 6/02 (DR 1.ª Série, A, de 18-07-2002), porque respeita a uma situação distinta, a da acção de regresso da seguradora que pagou uma indemnização ao abrigo de um seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
14-12-2004
Revista n.º 4064/04 - 1.ª Secção Reis Figueira (Relator)
Barros Caldeira Faria Antunes
Empréstimo público Cláusula contratual geral Prazo
Dever de informar
I - São aplicáveis ao contrato de empréstimo público as normas disciplinadoras das cláusulas contratuais gerais (DL 446/85, de 25-10).
II - Ainda que o prazo seja um elemento essencial do contrato de empréstimo público, é lícita a cláusula que preveja a possibilidade de antecipação de reembolso a partir de
certa data, correspondendo a uma readequação geral dos mecanismos de financiamento do Estado que tem como contrapartida o desenvolvimento de modalidades de empréstimo em que o momento do reembolso é colocado na disponibilidade do credor. III - Estando previsto no contrato de empréstimo obrigacionista celebrado entre a Brisa e a Autora que aquela se obrigava a reembolsar a emissão de obrigações e juros devidos até à data em que se efectuasse o reembolso se o Estado Português deixasse de deter directamente mais de 51% do capital da Brisa, não assiste à sociedade Autora o direito a indemnização - correspondente ao não recebimento dos juros que, face ao capital investido, o empréstimo lhe proporcionaria - por ter visto interrompido a meio o seu prazo de vigência.
11-01-2005
Revista n.º 4171/04 - 6.ª Secção Ponce de Leão (Relator) Xxxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Contrato de compra e venda Nulidade
I - É nula, porque absolutamente proibida nos termos dos arts. 17 e 18, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10, a cláusula contratual geral utilizada pela recorrida nos contratos celebrados com os seus clientes (no exercício da sua actividade de importação de peças de vestuário e acessórios para revenda) que lhe concede a possibilidade de não entregar a totalidade dos artigos encomendados, sem prévia notificação do comprador, ou a faculdade de cancelar a encomenda no prazo de 60 dias após a recepção da nota correspondente, sem necessidade de fornecer explicações nem possibilidade de ser penalizada ou ter de indemnizar a outra parte.
II - Padece do mesmo vício a cláusula contratual geral aposta nos sobreditos contratos que, depois de prever a fixação do prazo de entrega das mercadorias e a sua contagem, estabelece que o comprador pode cancelar a nota de encomenda se esse prazo for inobservado, não lhe assistindo, porém, o direito a qualquer indemnização ou compensação.
13-01-2005
Revista n.º 3930/04 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Cláusula contratual geral Assinatura
Nulidade
Contrato de crédito ao consumo Prazo certo
Mora do devedor
I - Nos termos do art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10, com as alterações introduzidas pelos XX x.x 000/00, xx 00-00, x XX n.º 249/99, de 07-07, devem
considerar-se excluídas as cláusulas contratuais gerais constantes da segunda página do documento formalizador de um contrato de mútuo, assinado pelos contratantes só na primeira página do mesmo documento, aplicando-se, nessa parte, o regime legal supletivo, nos termos do art. 9 do mesmo diploma.
II - O art. 781 do CC deve ser interpretado no sentido de o credor ficar com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes cujo prazo ainda se não tenha vencido, e não no sentido de que, vencendo-se imediatamente, ex vi legis, as prestações restantes, o devedor comece desde esse momento a responder pelos danos moratórios.
13-01-2005
Revista n.º 3874/04 - 2.ª Secção Ferreira Girão (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Xxxxx Xxxxxx
Contrato de seguro Cláusula contratual geral Nulidade
I - Em matéria de contratação de seguros o que importa é proteger o consumidor de seguros, seja ele pessoa singular ou empresa, de eventuais abusos do predisponente.
II - Assim, são nulas, por força do que dispõe o art. 22.º, n.º 1, al. b) do DL n.º 446/85, na redacção do DL n.º 220/95, de 31-08, as cláusulas insertas em contrato de seguro que permitam à seguradora a resolução ad nutum do contrato.
III - Não obsta a esta nulidade o facto de a possibilidade de resolução ad nutum ser também atribuída ao tomador do seguro.
IV - São nulas também, por força do disposto nos arts. 19.º, al. c), e 20 do DL n.º 446/85, as cláusulas que predisponham, para as situações em que a resolução ocorre por iniciativa do tomador, designadamente uma cláusula penal que possibilita à seguradora reter 50%, ou a totalidade, do prémio correspondente ao período de tempo não decorrido.
V - O preceituado no DL n.º 176/95, de 26 de Julho, em especial nos seus arts. 18.º e 19.º, não altera minimamente esta visão das coisas - este diploma legal, que quer garantir «regras mínimas de transparência nas relações pré e pós contratuais» na actividade seguradora, não posterga, antes exige, a aplicação (ainda) mais rigorosa e cuidada dos normativos do DL n.º 446/85.
13-01-2005
Revista n.º 196/04 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) * Xxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
Contrato de locação financeira União de contratos
Cláusula contratual geral Nulidade
Incumprimento definitivo
I - Da definição legal do contrato de locação financeira (art. 1.º, do DL 149/95, de 24- 6), logo se depreende que o referenciado contrato implica a intervenção de três sujeitos, ou seja, o fornecedor do bem, o locador e o locatário, o que, para além de envolver uma realidade complexa de união de contratos, confere à locação financeira a natureza de um negócio misto onde se detectam elementos da locação, da compra e venda e do mútuo, estes últimos em função da vertente financeira, pois que, na realidade, se trata de um negócio de crédito “ainda que vestido nos moldes da velha locação”.
II - Resulta da sua configuração própria que o fornecedor do bem é estranho à relação criada entre locador e locatário, surgindo uma relação autónoma entre o locador e o fornecedor, consubstanciada no contrato de compra e venda, embora entre ambos os contratos exista uma relação funcional.
III - Porém, apesar das suas especialidades, mantém-se a regra comum à locação, devendo o locador assegurar a entrega da coisa ao locatário, isto é, ceder-lhe o gozo do bem para o fim a que se destina (art. 9, n.º 1, al. b), do DL 149/95).
IV - Do contrato consta uma cláusula que estipula, no que interessa considerar, que “A não entrega do bem pelo fornecedor … não exonera o locatário das suas obrigações para com o locador nem lhe confere qualquer direito contra este”.
V - Tal cláusula implica a exclusão da responsabilidade contratual da locadora pelo não cumprimento do contrato, quando ele se funde na não disponibilidade do bem locado por parte do locatário, a quem a fornecedora não o entregou, e implica igualmente que o locatário ficará privado de, na referida situação de incumprimento, exercitar a excepção de não cumprimento do contrato perante a locadora, em relação à qual também não poderá resolver o contrato de leasing por incumprimento, renunciando, pois, antecipadamente a tais direitos.
VI - Uma tal cláusula contraria directamente o disposto nos arts. 9, n.º 1, b) e 17 do DL 149/95 e o art. 809, do CC, além de que é contrária à boa fé contratual e por isso proibida nos termos do arts. 15.º e 18.º c) e f), do DL 446/85, sendo, por isso, nula (art. 12.º, do DL citado e art. 809, do CC).
VII - Afastada a aludida cláusula geral, competia à locadora obter do fornecedor a entrega da coisa que lhe comprou, para a poder ceder à locatária, não sendo esta, que nem sequer é parte no negócio de compra e venda, que tinha obrigação de accionar o fornecedor para dele obter a coisa locada.
VIII - Provando-se que a 1.ª ré, quando pagou o preço à fornecedora (em 15-1-99), ignorava que o veículo não tinha sido entregue à A., fazendo fé no auto de recepção, como, de resto, fora convencionado, o facto é que, posteriormente, veio a ter disso pleno conhecimento, por intermédio da A que lho comunicou, tendo até tido intervenção junto da 2.ª ré, insistindo pela entrega do veículo.
IX - Como tal entrega não se verificou, apesar das insistências da 1.ª ré e da A, aquela instaurou processo crime por falsificação e burla contra o representante legal da fornecedora, no âmbito do qual veio a deduzir pedido cível.
X - No âmbito do pedido cível, veio a ser lavrada transacção, que foi homologada por sentença transitada, nos termos da qual o arguido se obrigou a pagar à 1.ª ré o preço do veículo que lhe vendera, mas que jamais entregara, acrescido dos juros de mora respectivos, assim revogando claramente o contrato de compra e venda.
XI - Portanto, a 1.ª ré, ao destruir o contrato de compra e venda que celebrara com a fornecedora (2.ª ré), não obstante a relativa autonomia deste contrato em relação ao contrato de locação financeira celebrado com a A (apesar de tudo encontram-se ligados funcionalmente), tornou impossível definitivamente o cumprimento do contrato de
leasing, visto que se colocou em situação de não poder ceder à A o veículo locado e essa cedência era uma das suas principais obrigações decorrentes do contrato.
XII - Tal impossibilidade equivale ao não cumprimento culposo responsabilizando a ré e permitindo à autora resolver o contrato e exigir a restituição da sua prestação bem como uma indemnização pelos prejuízos sofridos (art. 801, do CC).
XIII - É essa a relevância da dita transacção e é por isso que, independentemente de o arguido cumprir ou não o acordado que a ré está constituída na obrigação de restituir tudo quanto recebeu do autor, as despesas com os seguros e os juros de mora, tudo em consequência da resolução do contrato peticionada pela A.
18-01-2005
Revista n.º 307104 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de adesão Cláusula contratual geral Seguro de acidentes pessoais Ambiguidade
Interpretação
I - A interpretação das cláusulas dos contratos de adesão rege-se pelo quadro da interpretação geral dos negócios jurídicos (art. 10 do DL n.º 446/85, de 25-10), reconduzindo-se assim às regras inscritas nos arts. 236.º e 238.º do CC.
II - Porém, a cláusula contratual que carregue consigo uma ambiguidade genética (imputável, afinal, ao utilizador que a elabora e a oferece publicamente) deve ser interpretada com o sentido que lhe daria o contraente médio colocado na situação do aderente real (art. 11, n.º 1, do DL n.º 446/85), prevalecendo, em caso de dúvida, o sentido mais favorável ao aderente (art. 11, n.º 2, do mesmo diploma legal).
III - A cláusula aposta nas condições gerais de um contrato de seguro facultativo de acidentes pessoais, nos termos da qual estão excluídos da cobertura concedida pela apólice os “acidentes devidos a acção da pessoa segura originados por alcoolismo e uso de estupefacientes fora de prescrição médica” dos quais sobrevenha a morte deve ser interpretada no sentido de que apenas o alcoolismo (enquanto estado constante ou crónico criado pela utilização frequente do álcool e que se reconduz a uma habituação que o abuso e o vício da bebida vai potenciando) está abrangido pelo âmbito de tal previsão convencional, não sendo o mesmo equiparável à ingestão acidental de álcool.
IV - Assim sendo, e provando-se que o marido da recorrente não tinha o vício da ingerir bebidas alcoólicas nem padecia de qualquer patologia devida ao abuso do álcool, deve concluir-se que a morte daquele não está excluída pela sobredita cláusula por força da taxa de alcoolémia de 3,3 g/l com que o mesmo conduzia aquando do acidente de viação que o vitimou.
17-02-2005
Revista n.º 4788/04 - 2.ª Secção Noronha Nascimento (Relator) Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxxx
Contrato de adesão Cláusula contratual geral Seguro de acidentes pessoais Ambiguidade
Interpretação
I - A interpretação das cláusulas dos contratos de adesão rege-se pelo quadro da interpretação geral dos negócios jurídicos (art. 10 do DL n.º 446/85, de 25-10), reconduzindo-se assim às regras inscritas nos arts. 236.º e 238.º do CC.
II - Porém, a cláusula contratual que carregue consigo uma ambiguidade genética (imputável, afinal, ao utilizador que a elabora e a oferece publicamente) deve ser interpretada com o sentido que lhe daria o contraente médio colocado na situação do aderente real (art. 11.º, n.º 1, do DL n.º 446/85), prevalecendo, em caso de dúvida, o sentido mais favorável ao aderente (art. 11.º, n.º 2, do mesmo diploma legal).
III - A cláusula aposta nas condições gerais de um contrato de seguro facultativo de acidentes pessoais, nos termos da qual estão excluídos da cobertura concedida pela apólice os “acidentes devidos a acção da pessoa segura originados por alcoolismo e uso de estupefacientes fora de prescrição médica” dos quais sobrevenha a morte deve ser interpretada no sentido de que apenas o alcoolismo (enquanto estado constante ou crónico criado pela utilização frequente do álcool e que se reconduz a uma habituação que o abuso e o vício da bebida vai potenciando) está abrangido pelo âmbito de tal previsão convencional, não sendo o mesmo equiparável à ingestão acidental de álcool.
IV - Assim sendo, e provando-se que o marido da recorrente não tinha o vício da ingerir bebidas alcoólicas nem padecia de qualquer patologia devida ao abuso do álcool, deve concluir-se que a morte daquele não está excluída pela sobredita cláusula por força da taxa de alcoolémia de 3,3 g/l com que o mesmo conduzia aquando do acidente de viação que o vitimou.
17-02-2005
Revista n.º 4788/04 - 2.ª Secção Noronha Nascimento (Relator) Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxxx
Respostas aos quesitos Cláusula contratual geral Contrato de adesão
Xxxx da prova Ónus de afirmação Ónus da alegação
I - A resposta negativa a um quesito não permite a conclusão de que está provado o facto contrário.
II - Incumbe à parte o ónus de produzir no processo as afirmações necessárias à defesa da sua posição, sendo que a prova pressupõe a alegação do facto que se pretende provar. III - A prova da comunicação efectiva, adequada e esclarecedora ao contraente aderente do conteúdo de uma cláusula contratual geral cabe, nos termos dos arts. 5.º, n.º 3, e 6 do DL n.º 446/85, de 25-10, ao contratante que submete àquele a respectiva cláusula.
IV - Todavia, previamente à prova de que a comunicação e a informação existiram e foram adequadas, subsiste o ónus, para aquele que se quer fazer valer da violação desses
deveres, de alegar a respectiva facticidade, nomeadamente que aderiu ao texto das cláusulas sem que o proponente lhas tivesse comunicado ou prestado os devidos esclarecimentos.
24-02-2005
Revista n.º 4826/04 - 7.x Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxx
Sociedade comercial Vinculação Representação voluntária Procuração aparente Cláusula contratual geral Contrato de agência
I - Mostrando-se apenas provado que o X era vendedor da A, ignorando-se o regime sob o qual desempenhava tal actividade, é certo que podia exercê-la como simples empregado da A, designadamente como seu agente comercial, ligado a ela por um contrato de trabalho ou na qualidade de seu agente, ligado à autora por um contrato de agência.
II - No caso de se tratar de um simples empregado, agente comercial ou agente de vendas, actuando subordinadamente à sombra de um contrato de trabalho, parece que agiria sempre a coberto de poderes representativos atribuídos pela A, tratando-se de representação voluntária que derivará de uma declaração negocial – a procuração – que pode ser expressa ou tácita.
III - Quer dizer que, se alguém é designado por uma sociedade para o desempenho de certas funções há-de entender-se que, ao menos tacitamente, lhe foram conferidos poderes de representação para a prática de actos materiais, negócios ou actos jurídicos próprios ou necessários ao desempenho dessas funções. Portanto, tais actos realizados pelo designado (representante) repercutem-se na esfera jurídica da empresa (representada) obrigando-a para com a contraparte.
IV - O princípio geral será o de que, presumindo-se que o mandato ou os poderes de representação de quem actua ao serviço de uma empresa no desempenho de determinadas funções para que foi designado, abrangem todo e qualquer acto conexionado objectivamente com as funções atribuídas ao mandatário/representante, sem qualquer limitação, a representada fica vinculada pela actividade do seu agente sem que possa opor a terceiros qualquer limitação daqueles poderes, a menos que a contraparte tivesse conhecimento da existência dessas limitações no acto de contratar. Caberá, pois, à representada o ónus da prova de tal conhecimento.
V - Mas, a vinculação das sociedades comerciais em nome da protecção de terceiros contra a falta ou limitação de poderes de quem contrata em nome de uma empresa, pode mesmo prescindir da verificação de poderes representativos (ainda que xxxxxx). Tal ocorre no domínio da procuração aparente que responderá à necessidade prática de fazer correr sobre o detentor de uma empresa comercial, seja ela uma sociedade, pessoa singular ou empresa pública, “o risco da organização interna da empresa e da observância efectiva da divisão interna de funções por parte das pessoas e departamentos de acordo com as suas instruções”.
VI - Esta ideia da representação aparente veio a ser acolhida no art. 23.º, do DL 178/86, de 3-7 que regulamenta o contrato de agência.
VII - Trata-se de uma cláusula geral que o legislador estabeleceu em termos prudentes que “visa tutelar a boa fé de terceiros, desde que a confiança do cliente na representatividade do agente, ou na legitimidade deste para efectuar a cobrança de créditos (por força do n.º 2), se funde em razões objectivas e ponderosas, associadas ao próprio comportamento (por acção ou omissão), do principal”.
VIII - Tal cláusula geral, embora expressamente prevista para o contrato de agência, deve ser aplicada extensivamente à generalidade dos casos em que esteja presente a mesma razão de ser, isto é, em todos os casos em que se justifique a tutela da confiança de terceiros que contratem com empresas cuja moderna organização interna, regra geral complexa, foge, de todo, ao conhecimento e controle desses terceiros, posto que verificado o condicionalismo nela previsto.
IX - No caso dos autos, provou-se que os pagamentos eram normalmente feitos por intermédio do dito vendedor, mas não se provou que eram feitos a ele directa e pessoalmente através de cheques emitidos em seu próprio nome.
X - Emitir os cheques à ordem do próprio vendedor ou de terceiro, comporta um risco acrescido (representa, no fundo, efectuar o pagamento a quem se sabe que não é credor), que não pode ter-se por tacitamente compreendido nos poderes representativos de um qualquer vendedor a agir em nome e por conta da fornecedora dos produtos vendidos.
XX - Xxxxxxxx, ao não tomar as cautelas que a mais elementar prudência lhe exigiria, a Ré não merece a protecção baseada na tutela da confiança e na boa fé que lhe proporcionaria a teoria da protecção tácita.
XII - E, por outro lado, como nada se provou no sentido de a própria A. ter concorrido, com a sua conduta ou omissão, para criar na Ré a confiança de que podia efectuar o pagamento nos termos referidos em X, não pode beneficiar, também, da protecção que lhe concederia o instituto da procuração aparente. Não se desonerou, consequentemente, para com a A.
15-03-2005
Revista n.º 23/05 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator) Xxxxx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Pagamento em prestações Vencimento
Perda do benefício do prazo Exigibilidade da obrigação Cláusula contratual geral Assinatura
Nulidade Conhecimento oficioso
I - O art. 781 do CC deve ser interpretado no sentido de que não dispensa a interpelação do devedor para que a mora se verifique.
II - O art. 8, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10, é aplicável a cláusula inserida no contrato depois da assinatura do contraente que a ele adere, mesmo quando, na introdução desse contrato tenha sido inserida uma cláusula segundo a qual ao contrato
são aplicáveis as condições específicas e gerais que se seguem, figurando entre estas últimas a cláusula controvertida.
III - Esta última disposição é aplicável oficiosamente. 15-03-2005
Revista n.º 282/05 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxxxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Consumidor
Nulidade atípica Fiança
I - A invalidade que o DL 359/91, de 21-09, liga ao incumprimento do dever de entrega de um exemplar do contrato é uma nulidade atípica, já que, segundo o n.º 4, do art. 7 do citado diploma legal, apenas é invocável pelo consumidor.
II - Não se trata de uma verdadeira nulidade, pois não é de conhecimento oficioso e apenas é invocável por um dos interessados ( art. 286.º do CC).
III - Dado que o consumidor não invocou a nulidade, a sua obrigação mantém-se válida, como válida se mantém a fiança prestada pelo recorrente.
07-04-2005
Revista n.º 509/05 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Acção inibitória Cartão de débito Cartão de crédito
Cláusula contratual geral Risco
Meios de prova Publicação
I - O cartão de débito anda associado a um contrato de depósito bancário, sob a forma de uma conta de depósitos à ordem, que constitui o suporte financeiro viabilizador do seu emprego para os fins a que concretamente se destina traduzidos nos levantamentos ou pagamentos efectuados nos terminais ATM ou, quanto aos últimos, nos terminais POS existentes em locais de fornecimento de bens e/ou serviços.
II - Todavia, há a considerar que a causa próxima da sua emissão assenta num contrato que a doutrina comummente designa como contrato de utilização, cuja celebração não decorre automaticamente de abertura de uma conta de depósitos à ordem, mas depende da iniciativa do respectivo depositante perante a entidade emitente, e que assume natureza instrumental em relação ao contrato de depósito bancário.
III - Já no que respeita aos cartões de crédito, a sua atribuição determina a abertura simultânea de uma “conta-cartão” na entidade emitente e em nome do respectivo titular,
cujo saldo activo traduz, em cada momento, o limite máximo de endividamento consentido, ou seja, o crédito disponível.
IV - Beneficiando o titular do cartão de débito das vantagens resultantes da sua utilização, afigura-se razoável que suporte, em certa medida, os riscos inerentes, mormente a possibilidade da sua utilização não autorizada por terceiro, justificando-se que a responsabilidade pelos prejuízos causados pela utilização fraudulenta de um cartão por terceiro sejam equitativamente repartidos entre o titular do cartão e o banco emissor.
V - Essa distribuição de responsabilidade deve assentar num critério temporal, tomando-se como decisivo o momento em que o titular do cartão cumpre o dever contratualmente imposto, e que sempre decorre do princípio geral da boa fé contratual, de comunicar ao banco a sua perda ou extravio, contribuindo-se dessa forma para incentivar a diligência dos contraentes e para a simplificação dos problemas resultantes da efectivação de operações automáticas.
VI - No que respeita aos cartões de crédito mostra-se consagrada de jure constituto a responsabilidade do titular do cartão pelo risco decorrente do seu furto, perda ou falsificação, até à comunicação de tais ocorrências ao emitente do mesmo, pelo que tal estatuição, pela sua natureza de norma específica do direito bancário, prevalece sobre o regime geral quanto à transferência do risco no domínio da responsabilidade civil contratual.
VII - Ainda que tal estatuição haja sido consagrada apenas no âmbito da regulamentação legal aplicável aos cartões de crédito, pela similitude das situações de igual natureza que se podem verificar relativamente aos cartões de débito, parece-nos que, de acordo com os princípios da desformalização e da rapidez do giro bancário, igual regra deve vigorar relativamente aos mesmos.
VIII - Assim, as cláusulas insertas nas condições de utilização dos cartões electrónicos emitidos pelo Banco-Réu, relativas à distribuição do risco pela sua utilização por terceiro, em consequência da sua perda ou furto, cláusulas essas nas quais se faz impender tal risco sobre o respectivo titular até à comunicação ao emitente daquelas indicadas ocorrências, não se mostram violadoras do conteúdo da al. f) do art. 21.º do DL n.º 446/85, de 25-10.
IX - São nulas, por constituírem uma violação dos critérios legalmente estabelecidos quanto ao regime de repartição do ónus da prova, mostrando-se em oposição ao preceituado na al. g) do art. 21.º do diploma instituidor das cláusulas contratuais gerais as condições de utilização que dispõem considerar-se aceite e validado o conteúdo dos extractos de conta das operações realizadas com o cartão, desde que o mesmo não haja sido objecto de reclamação pelo seu titular, no prazo máximo de 30 dias, contados do respectivo conhecimento.
X - Considerando que a entidade bancária emitente dos cartões em causa já não tem existência legal (o primitivo Banco Réu foi incorporado noutro Banco, actual Réu) e que os cartões foram todos recolhidos, deixando de poder ser utilizados para os fins a que se destinavam, encontramo-nos perante a impossibilidade prática da entidade bancária emitente persistir no seu emprego em novos contratos, situação esta conducente a que a efectivação da publicação da sentença proferida nos autos (nos dois órgãos de comunicação social escrita diária de maior tiragem de Lisboa e Porto) se transforme num acto inútil e obsoleto, cuja prática seria sancionável nos termos do art. 137.º do CPC.
12-04-2005
Revista n.º 105/05 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx
Cláusula contratual geral Cartão de crédito
Cartão de débito Reconhecimento de dívida Ónus da prova
I - A cláusula inserta em contratos de emissão e de utilização de cartões de débito e de crédito, onde se estipula que “O titular compromete-se a, após a sua adesão ao serviço de pagamento MBNet, utilizar esses serviço de pagamento em todas e quaisquer transacções que venha a efectuar em ambientes abertos (internet, WAP, televisão interactiva, etc.) e, ao fazê-lo, reconhece-se devedor ao Bano dos valores registados electronicamente”, modifica os critérios de repartição do ónus da prova, pelo que se trata de uma cláusula absolutamente proibida, nos termos da alínea g) do artigo 21, do DL 446/85, de 25 de Outubro, na redacção dada pelo DL 220/95, de 31 de Agosto.
II - Como pode ler-se no acórdão ora impugnado “A mencionada cláusula, ao estabelecer uma presunção de dívida do titular do cartão nos termos apontados e ao conceder um valor absoluto ao registo electrónico, está a alterar os critérios de repartição do ónus da prova e a subtrair ao juiz a livre apreciação de um documento particular, o que a torna absolutamente proibida”.
III - Por seu turno, a cláusula que estabelece que, salvo actuação com dolo ou negligência grosseira do Titular, o Banco garante: “No caso dos cartões de débito, o reembolso dos pagamentos que, por utilização fraudulenta ou não autorizada do cartão, aplicando uma franquia de € 249,00. Antes do período das 48 horas imediatamente anteriores à comunicação ao Banco, garante o reembolso das transacções que excedam
€ 2.493,00”, não é suficientemente explícita, prestando-se a confusões de interpretação. IV - A fim de evitar divergentes interpretações, afigura-se-nos que será necessário alterar o texto que passará a ter a seguinte redacção: “Antes do período das 48 horas imediatamente anteriores à comunicação ao Banco, garante o reembolso das transacções que, no seu conjunto, excedam € 2.493,00”.
27-04-2005
Revista n.º 821/05 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxxx
Seguro de acidentes pessoais Contrato de adesão Cláusula contratual geral
Interpretação do negócio jurídico
I - O contrato de seguro facultativo “de acidentes pessoais” pode ser definido como sendo aquele em que uma das partes - o segurador -, compensando segundo as leis da estatística um conjunto de riscos por ele assumidos, se obriga, mediante o pagamento de uma soma determinada, a, no caso de realização de um risco, indemnizar o segurado pelos prejuízos sofridos, ou tratando-se de evento ligado à pessoa humana, entregar um
capital ou uma renda ao segurado ou a terceiro, dentro dos limites contratualmente estabelecidos, ou a dispensar o pagamento de prémios tratando-se de pretensão a realizar em data determinada.
II - Tal contrato tem de ser reduzido a escrito, constituindo a apólice uma formalidade ad substantiam, e o mesmo regula-se pelas estipulações daquela não proibidas pela lei e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições do Código Comercial (arts. 364.º, n.º 1, do CC e 426.º e 427.º do CCom).
III - É também pacífica a qualificação deste contrato como de adesão, com cláusulas contratuais gerais cuja interpretação deve ser feita de harmonia com as regras de interpretação dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto do contrato singular em que se incluam, prevalecendo na dúvida o sentido mais favorável ao aderente (arts. 10.º e 11.º, n.º 2, do DL n.º 446/85, de 25-10).
IV - Os conceitos de “invalidez permanente” e “morte” inseridos na apólice de um contrato de seguro (facultativo) de acidentes pessoais (que cobre o risco de morte ou invalidez permanente com o capital seguro de Esc. 5.000.000$00), perante a inexistência de factos apurados quanto à vontade hipotética ou concreta das partes ou sobre as cláusulas de tal negócio, não podem ser interpretados no sentido de se reportarem a duas situações equiparadas para efeito de recebimento da totalidade do capital.
V - Dever-se-á, antes, fazer uso dos ditames da boa-fé (art. 239.º do CC) e concluir que a indemnização a fixar pela seguradora no caso de se verificar o risco da “invalidez permanente” ajustar-se-á ao grau de incapacidade que ficar a padecer o segurado. VI - Assim, sendo o capital seguro de Esc. 5.000.000$00 e a incapacidade permanente de que o Autor-segurado ficou a padecer de 15%, deverá a indemnização ser fixada na respectiva proporção, ou seja, em Esc. 750.000$00.
19-05-2005
Revista n.º 1191/05 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Contrato de crédito ao consumo Pagamento em prestações Vencimento
Perda do benefício do prazo Exigibilidade da obrigação Cláusula contratual geral Interpretação do negócio jurídico Assinatura
Nulidade Conhecimento oficioso
I - Nos termos do art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10 (com as alterações introduzidas pelos DL n.º 220/95, de 31-08, e DL n.º 249/99, de 07-07), norma aplicável oficiosamente, devem considerar-se excluídas as cláusulas contratuais gerais constantes da segunda página do documento formalizador de um contrato de crédito ao consumo (na modalidade de mútuo), assinado pelos contratantes só na primeira página do mesmo documento, ainda que no intróito deste tenha sido inserida uma cláusula segundo a qual são aplicáveis ao contrato as condições específicas e gerais que se seguem.
II - A cláusula aposta no contrato em apreço, nos termos da qual “a falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes”, interpretada nos termos dos arts. 236.º do CC e 11.º do DL n.º 446/85, de 25-10, deve ser entendida com o sentido de que a falta de pagamento de uma mensalidade implicará a perda do benefício escalonado do capital emprestado e não também o dos juros que nasceriam até ao fim do contrato.
III - O art. 781.º do CC não determina o vencimento antecipado de prestações de juros, pois o crédito de juros não nasce num só momento, antes vai nascendo à medida que o tempo decorre, não sendo assim possível o vencimento antecipado de prestações (de juros remuneratórios) que nunca terão a sua génese, que nunca serão constituídas.
06-07-2005
Revista n.º 272/05 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Bettencourt de Faria
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Interpretação do negócio jurídico
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I - A divergência sobre a assunção ou não, pelo revendedor, da obrigação de compra de quantidade determinada de produtos da autora, tem de ser superada por via de interpretação negocial, havendo que ter em conta os seguintes princípios, mesmo que se esteja perante cláusulas contratuais gerais, face ao disposto no art. 10.º do DL 446/85, de 25-10: a declaração negocial valerá de acordo com a vontade real do declarante, se ela for conhecida do declaratário (art. 236.º, n.º 2, do CC); não o sendo, valerá com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (n.º 1 daquele art. 236.º); nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha no texto um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (art. 238.º, n.º 1, do mesmo Código).
II - A interpretação das declarações ou cláusulas negociais constitui matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias, só cabendo ao STJ exercer censura sobre o resultado interpretativo quando, tratando-se da situação prevista no n.º 1 do citado art. 236.º, tal resultado não coincida com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do comportamento do declarante, ou, tratando-se da situação contemplada no dito art. 238.º, n.º 1, não tenha no texto do documento de que consta o contrato um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso.
III - Conjugando todas as provas e analisando as ditas cláusulas sem as desintegrar do conteúdo global do contrato, a Relação concluiu que delas resultava ter o ora recorrente assumido a obrigação de comprar à autora 65.000 litros dos produtos que esta vendia, e, partindo do pressuposto da validade de todas essas cláusulas, tal resultado interpretativo, não merece censura.
04-10-2005
Revista n.º 2489/05 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxxx xx Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx
Acção inibitória
Acção de apreciação negativa Cláusula contratual geral Contrato de seguro
Inutilidade superveniente da lide
I - É nula a cláusula contratual geral constante das apólices de seguros facultativos comercializados pela ré referidas nos autos - assim concebida: «Qualquer das partes pode, a todo o tempo, reduzir ou resolver o contrato, mediante aviso registado, ou por outro meio do qual fique registo escrito, à outra parte, com antecedência mínima de 30 dias em relação à data em que a redução ou resolução produz efeitos.» -, por verificar uma das hipóteses desenhadas na al. b) do n.º 1 do art. 22.º do DL n.º 446/85, de 25-10, ao permitir à predisponente a resolução do contrato independentemente de qualquer violação do mesmo pelo segurado.
II - É igualmente nula, por consubstanciar uma cláusula penal desproporcionada na acepção da al. c) do art. 19.º do citado diploma, a cláusula contratual geral incluída nas mesmas apólices do seguinte teor: «Quando a redução ou resolução se operar por iniciativa do tomador de seguro, a seguradora poderá reter, para fazer face aos custos fixos, 50% do prémio correspondente ao tempo não decorrido, excepto se a resolução derivar da não aceitação das condições exigidas pela seguradora, face ao agravamento do risco, caso em que o tomador de seguro será reembolsado da totalidade do prémio correspondente ao período de tempo não decorrido.» Com efeito, a retenção de 50% do prémio apresenta-se na situação hipotizada manifestamente excessiva para fazer face a custos fixos da apólice, quando estes representam segundo a experiência comum uma pequena percentagem do prémio total, cuja parte mais substancial se destina à cobertura do risco de sinistro.
III - A acção inibitória assume neste aspecto feição de declaração negativa, mercê da qual incumbe ao réu o ónus probatório dos factos constitutivos do direito que se arroga (art. 343.º, n.º 1, do CC), ou seja, no caso sub iudicio, a prova dos factos reveladores ou integradores da proporcionalidade da cláusula, a saber, custos acrescidos relativamente aos apontados pelo autor como abrangidos no prémio do seguro, os quais exactamente não foram provados pela ré, em termos de possibilitarem qualquer quantificação que lhe seja favorável.
IV - A alteração introduzida motu proprio pela ré seguradora na redacção das cláusulas contratuais abusivas, de forma a expurgá-las dos vícios arguidos, não determina a inutilidade superveniente da lide, posto que, conforme o art. 32.º, n.º 1, do DL n.º 446/85 - redacção do DL n.º 220/95, de 31-08 -, apenas da decisão inibitória com trânsito resulta a tutela cautelar definitiva dos interesses a proteger.
11-10-2005
Revista n.º 1685/04 - 2.ª Secção Xxxxx Xxxxxx (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Título executivo Livrança
Pacto de preenchimento
Aval
Cláusula contratual geral
I - Constando expressamente do pacto de preenchimento, que o vencimento da livrança foi colocado na total e absoluta disponibilidade da vontade da entidade bancária, e traduzindo-se o aval numa obrigação autónoma de garantia das responsabilidades assumidas pelo avalizado, do risco inicial que da prestação resulta para o avalista, faz parte da sua sujeição ao direito potestativo que assiste ao respectivo portador, de aposição da data do vencimento da obrigação cambiária que o mesmo incorpora, não se verificando em tal situação qualquer omissão passível de ser colmatada através do recurso ao conteúdo ao art. 239.º do CC.
II - Constituindo a obrigação assumida pelo dador do aval uma obrigação autónoma, relativamente à do objecto avalizado, não se mostra provada a ocorrência de qualquer das situações contempladas nas várias alíneas do art. 8.º do DL 446/85, de 25-10, dessa forma restando inviabilizada a aplicação dos comandos vertidos nos arts. 9.º, n.º 1, 13.º, n.º 2, 14.º e 15.º, do referido DL, e, consequentemente, a ocorrência de situação conducente, nos termos do art. 292.º do CC, à redução do negócio cambiário celebrado. 08-11-2005
Revista n.º 2699/05 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx
Aluguer de longa duração Veículo automóvel Caução
Cláusula penal Compensação Boa fé Indemnização
Cláusula contratual geral Nulidade
I - Num contrato de aluguer de longa duração de veículo automóvel, tendo as partes acordado que ao locatário poderá ser exigida uma caução para o bom cumprimento das obrigações decorrentes do contrato, estipulando que no termo desse haveria lugar a prestação de contas, respondendo a caução até à concorrência do seu montante pelo pagamento de todas as importâncias e/ou indemnização que o locatário nos termos do contrato houvesse de efectuar, sendo o excesso devolvido ou pago o remanescente pelo locatário, e, em caso de rescisão e denúncia o valor da caução reverteria na sua totalidade para a locadora; em primeiro lugar, haverá que dar à caução o fim a que se destina, de garantia de cumprimento das obrigações da locatária e, só depois, sendo caso disso, se analisará a convencionada função de cláusula penal, não se podendo aqui falar de compensação.
II - No contrato celebrado, autora e réus convencionaram que a falta de pagamento dos alugueres implicava a possibilidade de resolução do contrato pela autora, ficando os réus obrigados, além do mais, a pagar uma indemnização para fazer face aos prejuízos resultantes da desvalorização do veículo e do próprio incumprimento do contrato, não inferior a 75% do valor total dos alugueres acordados. Esta estipulação contém uma
cláusula penal que pode exercer uma função indemnizatória ou uma função compulsória, ou alternativa ou simultaneamente, uma e outra função.
III - Podendo as partes fixar por acordo o montante da indemnização exigível (art. 810, n.º 1, do CC), o fulcro da problemática está em saber se a estipulação acordada é abusiva; se excede o que é razoável face aos princípios da boa fé e ocorre por isso a nulidade; se é justificável a redução equitativa permitida pelo art. 812.º do CC; se a cláusula em causa é válida.
IV - As cláusulas penais serão nulas quando forem desproporcionadas aos danos a ressarcir, violando então o comando do art. 19.º, al. a), do DL 446/85, de 25-10, sendo a sanção a nulidade.
V - Haverá, pois, que proceder a uma ponderação de interesses, aparecendo como fim último desse controlo encontrar um adequado equilíbrio contratual de interesses, com respeito de ambas as partes, e assumindo sempre especial relevo a cláusula geral da boa fé.
VI - O aluguer de longa duração de veículo automóvel é um contrato de risco elevado, atento o risco de perecimento da viatura, a desvalorização inerente à duração e o desgaste. Tem-se, por isso, entendido que são de aceitar cláusulas penais que impõe encargos elevados sobre o devedor, até como forma de o “forçar” a cumprir.
VII - Mas, se é assim, a verdade é que feito o necessário juízo de razoabilidade, tem que se concluir que uma indemnização que tem como limite mínimo 75% do valor total é claramente desproporcionada. A sanção tem assim que ser a nulidade da cláusula, tal como foi decidido.
10-01-2006
Processo n.º 2572/05 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxxxx (Relator)
Reis Figueira Faria Antunes
Contrato de crédito ao consumo Forma do contrato
Forma escrita
Cláusula contratual geral Fiador
I - O art. 6.º do DL n.° 359/91, de 21-09, que, nos contratos de crédito ao consumo, exige a entrega de um exemplar do contrato ao consumidor no momento da respectiva assinatura, contempla a forma de conclusão do contrato em que ambas as partes se encontram presentes e, assim, não se aplica quando assinado pelo mutuário fora da presença do mutuante e a este enviado.
II - As cláusulas inseridas depois da assinatura de um dos contraentes são excluídas do contrato (art. 8.º, al. d), do DL n.° 446/85, disposição que não se limita a estabelecer a presunção do desconhecimento de tais cláusulas, elidível pelo utilizador).
III - Não constitui requisito substancial da fiança o conhecimento integral do âmbito da responsabilidade do fiador, bastando a determinabilidade do seu objecto.
IV- O art. 5.º do DL n.° 446/85 exige a entrega ao fiador de um exemplar do contrato, mas a fiança subsiste se os seus requisitos essenciais resultarem das condições particulares, integradas pelas disposições legais supletivas (art. 9.º, n.° 1, do mesmo diploma).
12-01-2006
Revista n.º 3756/05 - 2.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxxx
Cláusula contratual geral Dever de informar
I - Pré-formação, generalidade e imodificabilidade constituem as características essenciais das cláusulas contratuais gerais.
II - O dever de comunicação a que se reporta o art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25-10, não se cumpre com a mera comunicação, pelo utilizador, que de tal tem o encargo, ao aderente, o teor das preditas cláusulas, sendo, outrossim, necessário para que aquelas se considerem incluídas no contrato singular, que a comunicação, antes da conclusão do contrato, seja de molde a proporcionar à contraparte a possibilidade de um conhecimento completo e efectivo do clausulado, sem prejuízo de ao aderente igualmente se exigir comportamento diligente, para consecução de tal conhecimento.
III - O dever de informação a que alude o art. 6.º, n.º 2, do DL n.º 446/85, pressupõe uma iniciativa do aderente nesse sentido.
19-01-2006
Revista n.º 4052/05 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx
Contrato de prestação de serviços Serviço móvel terrestre
Cláusula contratual geral Acção inibitória
I - Não obstante a alteração introduzida no art. 1.º do DL n.º 446/85, de 25-10, pelo DL n.º 249/99, de 07-07, a referência nesse normativo àqueles que tenham a qualidade de “destinatário” abrange quaisquer contratos de adesão, com cláusulas gerais, independentemente de serem contratos de consumo ou outros contratos, nestes se incluindo os contratos entre empresários.
II - A publicação do DL n.º 249/99 teve como escopo harmonizar o conteúdo do art. 1.º do DL n.º 446/85, com o disposto no art. 9.º, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 24/96, de 31-07 (Lei de Defesa do Consumidor) de molde a englobar, expressamente, no âmbito de aplicabilidade do regime das cláusulas contratuais gerais, para o qual, aliás, aquele último normativo, remete, os contratos de adesão individualizados celebrados entre empresários e consumidores.
III - Sendo fixada nos contratos de adesão no domínio das operações de telecomunicações móveis terrestres uma pena que acresce ao cumprimento ou à indemnização pelo não cumprimento, tal cláusula reveste natureza exclusivamente compulsivo-sancionatória.
IV - Estatuindo-se na cláusula contratual geral em análise que a rescisão do contrato por parte do aderente determina o imediato vencimento da totalidade das mensalidades vincendas, relativas a cada SMT (Serviço Móvel Terrestre), bem como o valor, até ao
termo do contrato, correspondente aos consumos mínimos clausulados, tal cláusula penal deve ser qualificada como uma cláusula de reparação a forfait.
V - Um juízo de valor, abstractamente elaborado no momento da celebração dos contratos-tipo em análise não permite configurar, no âmbito da prestação de serviços de telecomunicações móveis terrestres, a verificação de qualquer desproporção sensível entre a indemnização no mesmo predeterminada para o seu incumprimento por parte do respectivo aderente, face aos danos que, em tal situação, resultam para o predisponente (cfr. art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85).
VI - A cláusula que consagra exclusivamente a comarca de Lisboa para a resolução dos litígios inerentes ao contrato-tipo em análise é nula, pois embora o contrato tenha como primaciais destinatários empresas cuja facturação mensal é bastante superior à dos clientes particulares do SMT, sendo do conhecimento público que a grande maioria delas têm a sua sede na área da comarca de Lisboa e limítrofes, tal não constitui razão para não serem assegurados os direitos conferidos às partes mais fracas, ou seja, os aderentes, de verem resolvidos os litígios na área da sua sede (cfr. art. 19.º, al. g), do DL n.º 446/85).
07-02-2006
Revista n.º 3659/05 - 6.ª Secção Sousa Leite (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxxx
Xxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de mútuo Contrato de adesão Cláusula contratual geral Assinatura
Nulidade
I - Resulta do exame do “contrato de mútuo” que nele constam na face as condições específicas e no verso as condições gerais.
II - Trata-se de um contrato de adesão, dado que o seu clausulado, de iniciativa exclusiva do negociador proponente, consta de impressos tipificados e previamente elaborados que são apresentados ao aderente para os assinar, caso concorde, obviamente, com a proposta apresentada e sem outra possibilidade para além de a poder aceitar ou rejeitar.
III - A Ré apôs a sua assinatura do lado esquerdo, ao fundo do rosto do contrato. Ou seja, o contraente-consumidor, em vez de assinar o contrato no final, como seria normal, assina-o na página anterior àquela onde constam as cláusulas gerais.
IV - Ora, nos termos do art. 8.º, al. d), do RJCCG, consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contraentes.
V - O citado dispositivo tem em vista afastar as cláusulas que o circunstancialismo exterior da celebração contratual aponte para a inexistência de mútuo consenso das partes para o conteúdo das cláusulas.
VI - Daqui decorre que as “Condições Gerais” que constam do verso do contrato têm de se considerar excluídas.
21-02-2006
Revista n.º 70/06 - 1.ª Secção Xxxxx Xx (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Cláusula contratual geral Dever de comunicação Dever de informar
Ónus da prova Contrato de seguro
I - No domínio dos contratos de adesão, e relativamente às cláusulas contratuais gerais, cabe ao predisponente de tais cláusulas o ónus da prova de que houve comunicação integral e adequada das mesmas ao aderente (art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25-10), a quem, por seu turno, compete demonstrar a inobservância do dever de informação (art. 6.º do mesmo diploma legal).
II - A não satisfação pelo predisponente do referido ónus da comunicação de uma concreta cláusula contratual geral não torna esta nula, mas antes inexistente, determinando a lei a sua exclusão do contrato (art. 8.º, al. a), do DL n.º 446/85).
02-03-2006
Revista n.º 2675/05 - 2.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Bettencourt de Faria
Xxxxxxxx xx Xxxxxxx (vencido)
Competência territorial
Pacto atributivo de competência Cláusula contratual geral Nulidade
I - Resulta do art. 19.º, al. g), do DL 446/85, de 25-10, com as alterações introduzidas pelos DL n.ºs 220/95, de 31-08 e 249/99, de 07-07, que não fica forçosamente ferida de nulidade toda a cláusula que estabeleça a competência de determinado tribunal, só pelo facto de dela resultar uma desvantagem para uma das partes. A sobredita al. g) é explícita em exigir graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem.
II - Ora, a R., domiciliada, para efeitos contratuais, nos seus escritórios de Lisboa, incluiu a cláusula “foro de Lisboa, com renúncia a qualquer outro” nos vários contratos de abastecimento de combustíveis celebrados com a A. e outros, documentados nos autos.
III - Se a instauração e pendência das acções na comarca de Lisboa comporta inconvenientes para os clientes da R., sediados noutras comarcas relativamente longínquas, como é o caso de Guimarães, também não deixaria de ser inconveniente para a R. vir a ter várias acções pendentes longe de Lisboa.
IV - Com efeito - ao contrário do que sucede com as Companhias de Seguros relativamente aos acidentes de viação - não consta que a ré tenha advogados contratados (por avença ou “à peça”) a exercer a actividade profissional na zona de Guimarães ou noutras zonas do país situadas longe de Lisboa, assistindo-lhe também, portanto, uma razão digna de consideração para ter incluído a citada cláusula nos vários contratos celebrados, pois seria afectada se tivesse de litigar em várias acções longe da capital.
V - A remessa dos presentes autos à comarca de Lisboa, constituirá um sacrifício para a A., demandando porventura gastos acrescidos, mas hoje em dia atenuados, atentos os avanços tecnológicos dos meios de transmissão dos actos processuais e dos meios de comunicação da pessoas. Essa desvantagem, além de não envolver, por isso, uma penosidade excessiva, é correlativa do interesse relevante da R. em concentrar no Tribunal Cível de Lisboa todos os processos em que seja interessada.
VI - A cláusula onde se refere que “para todas as questões emergentes do presente contrato as partes estipulam, com expressa renúncia a qualquer outro, o foro do Tribunal da comarca de Lisboa”, satisfaz o condicionalismo exigido pelo art. 100.º, n.ºs 1, 2 e 4, do CPC, mesmo não tendo havido negociação prévia das partes, uma vez que a A. não alegou que não teve consciência de aderir à referida cláusula, isto é, que não tomou conhecimento dela no momento da assinatura do contrato, que a não aceitou, que lhe foi imposta.
07-03-2006
Revista n.º 4113/05 - 1.ª Secção Faria Antunes
Xxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Assinatura
Nulidade
Pagamento em prestações Vencimento
Juros
Proveito comum do casal
I - São nulas, ao abrigo do disposto na al. d) do art. 8.º do DL n.º 446/85 de 25-10, as cláusulas contratuais gerais inseridas no documento que as titula, após a assinatura das partes contratantes.
II - O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda não decorreu, em face do não pagamento de alguma das prestações, previsto no art. 781.º do CC, não abrange a parte das prestações que representem juros remuneratórios cujo prazo de referência não chegou a decorrer.
III - A alegação de que o dinheiro mutuado "reverteu em proveito comum do casal atento até que o veículo que com o mútuo se adquiriu se destinar ao património comum do casal dos réus" é insusceptível de integrar a previsão da al. c) do n.º 1 do art. 1691.º do CC.
07-03-2006
Revista n.º 38/06 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de aluguer Cláusula contratual geral Cláusula penal
Nulidade
I - Constando no rosto do documento, precedendo as assinaturas, com o mesmo destaque das cláusulas singulares, uma “declaração” de conhecimento das “condições gerais” e concordância com as mesmas, e estando demonstrado que houve negociações prévias durante as quais foi entregue uma cópia do escrito que corporiza o contrato de aluguer em apreço, deverá entender-se que estas “cláusulas gerais que integram o contrato.
II - Tendo o contrato por objecto um fotocopiador e dois faxes, equipamentos normalmente sujeitos a significativo desgaste e rápidas desactualização e desvalorização, numa situação que faz recair sobre a locadora avultados riscos, desde o volume do capital investido na aquisição dos bens à dificuldade em recolocação no mercado, através de novos contratos de aluguer, de bens usados, compreende-se que a locadora tenha muito mais interesse no cumprimento do contrato que na sua resolução. III - Daí que não se possa considerar desproporcionada - para efeitos dos arts. 12.º e 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10 - a cláusula geral em que se estipula que, no caso de não pagamento das rendas pelo locatário, pode a locadora, para além do direito à restituição das coisas locadas e ao recebimento das rendas vencidas e não pagas, exigir indemnização igual a metade do valor das rendas vincendas.
21-03-2006
Revista n.º 396/06 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxx Xxxx
Contrato de locação financeira Veículo automóvel
Vícios da coisa
Exclusão de responsabilidade Cláusula contratual geral Nulidade
I - Entre as obrigações que a lei atribui ao locador inclui-se a do art. 9.º, n.º 1, al. b), do DL n.º 149/95, de 24-06: a de conceder ao locatário o gozo do bem para os fins a que este se destina, obrigação essa que pode ser satisfeita por ele directamente ou por intermédio do fornecedor, que então funciona como auxiliar do locador no cumprimento da obrigação de entrega, auxílio este que, em princípio, não afasta a responsabilidade que possa recair sobre o mesmo locador (art. 800.º do CC).
II - Mesmo que o art. 12.º do citado DL seja interpretado no sentido de se referir à própria situação jurídica do bem, isto é, como não se referindo apenas aos defeitos materiais, de fabrico ou de conservação de que tal bem enferme, mas também a eventuais vícios de direito que o afectem, - o que não parece correcto, visto nele se falar apenas nos vícios do bem e não nos vícios do direito sobre o bem -, do referido artigo não resulta a possibilidade de ficar excluída a responsabilidade da locadora, precisamente porque esta não tinha a faculdade de dispor ela própria do gozo do veículo locado (art. 117.º do CEst de 2001 e do actual, 121.º do anterior), nem, portanto, de proporcionar esse gozo à locatária, devido à falsidade da matrícula colocada no veículo, à falta de matrícula, à falta do boletim de importação, da declaração de venda do
respectivo importador, do comprovativo do pagamento do imposto automóvel, e ainda à falta do livrete e do título de registo de propriedade a favor da firma fornecedora.
III - Por isso tem aplicação na situação dos autos o disposto no art. 1034.º, n.º 1, al. a), do CC, expressamente ressalvado pelo citado art. 12.º e que, face à remissão que faz para o art. 1032.º, al. a), do mesmo Código, conduz a que se conclua que a locadora não deu cumprimento ao contrato, não tendo concedido à locatária o gozo do veículo a que o contrato se referia em condições de ser legalmente utilizado para os fins de circulação na via pública a que o mesmo obviamente se destinava.
IV - E tal incumprimento tem de ser havido como cometido com culpa, grave por a aquisição de um veículo automóvel sem os necessários documentos ou sem certificação da existência ou possibilidade de emissão destes constituir falta de observância de cuidados que a generalidade das pessoas, em princípio, observa, bem como porque, dada a actividade de locação financeira a que se dedicava, a ré tinha especial obrigação de saber quais os elementos que deviam acompanhar o veículo na sua transmissão de propriedade e na sua circulação na via pública, e tanto mais grosseira quanto é certo que o automóvel até se destinava a ser utilizado ou mesmo adquirido por outrem a quem, consequentemente, a ré bem sabia que os devia fornecer, culpa essa que se presume ( art. 799.º, n.º 1, do CC).
V - A cláusula geral do contrato de locação financeira, excluindo a responsabilidade da locadora independentemente do grau de culpa no caso de falta de registo, matrícula ou licenciamento, ou de falta de entrega da documentação necessária para tal, não constitui resultado da conjugação do disposto nos arts. 12.º e13.º do DL n.º 149/95, pois não se limita a consagrar a faculdade de a locatária accionar a fornecedora, antes a impedindo de exercer o seu direito à indemnização contra a locadora, pelo que tem de ser considerada nula, face ao disposto nos arts. 12.º e 18.º, al. c) do DL n.º 446/85, de 25- 10, ou pelo menos no art. 809.º do CC.
04-04-2006
Revista n.º 626/06 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxx
Contrato de seguro Contrato de adesão
Seguro de acidentes pessoais Cláusula contratual geral Dever de comunicação
Ónus da prova
Interpretação do negócio jurídico Matéria de facto
Matéria de direito
I - O dever de comunicação das cláusulas contratuais, constante do art. 5.º do Decreto- Lei n.º 466/85 de 25 de Outubro, destina-se a que o aderente conheça antecipadamente o conteúdo contratual, isto é, as cláusulas a inserir no negócio.
II - Esse dever acontece na fase de negociação, ou pré-contratual, e deve ser acompanhado de todos os esclarecimentos necessários, possibilitando ao aderente conhecer o significado e as implicações das cláusulas.
III - Nas cláusulas contratuais gerais, por constarem de texto pré-elaborado, a adesão faz-se com a emissão da proposta e aceitação do modelo.
IV - O ónus da prova da comunicação cabe ao contraente que submete as cláusulas ao outro.
V - As respostas negativas à matéria de facto não implicam que se tenha demonstrado o facto contrário, revelando apenas que tal não ficou provado, tudo se passando como se a matéria não tivesse sido alegada.
VI - Excluída uma cláusula por indemonstrada a sua prévia comunicação, o contrato subsiste sem ela, salvo se ocorrer uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou se gerar um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé.
VII - O seguro de acidentes pessoais associado à emissão de um cartão de crédito é negociado entre a entidade emitente do cartão e a seguradora, únicas partes no contrato, sendo o beneficiário integrado num grupo de titulares do cartão de crédito sem que tenha aderido ao contrato de seguro.
VIII - Determinar o sentido relevante de uma declaração negocial, tendo presente o art. 236.º, e não olvidando o n.º 1 do art. 238.º do CC, é aplicar o direito aos factos.
IX - O típico seguro de acidentes pessoais, conhecido por seguro de viagem, cobre os eventos lesivos ocorridos in itinere - independentemente de se tratar de deslocação de lazer ou de negócios - incluindo as que ocorrerem durante as curtas estadas de trânsito, e não abrange os que acontecem no exercício de uma actividade profissional que o segurado exercia fora da sua área de residência, durante as férias da sua profissão principal.
X - A morte do segurado, em seguros de vida associados a financiamentos imobiliários ou outros, implica o pagamento pela seguradora do capital em dívida à data do evento - morte - e a restituição pela entidade financiadora, ou pelo mutuante, pelo que recebeu após esse evento, já que, então, a responsabilidade pelo pagamento é da seguradora.
18-04-2006
Revista n.º 818/06 - 1.ª Secção Xxxxxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Cláusula contratual geral Gás natural
Tribunal competente Competência convencional
I - É válida a cláusula contratual geral que permite à Empresa A subcontratar com terceiros o fornecimento do gás, e a sua leitura, facturação e cobrança, já que a subcontratação não pode ter lugar sem autorização do Governo (art. 18.º, n.º 1, al. l), do DL 446/85, de 25-10, e Anexo I ao DL 33/91, de 16-01, Base XXIX n.º1).
II - É válida a cláusula contratual que estabelece um foro competente que não envolve graves inconvenientes para as partes contratantes (art. 19.º do DL 446/85, de 05-10, e 74.º do CPC).
09-05-2006
Processo n.º 437/06 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Cláusula contratual geral Dever de comunicação Dever de informar
Ónus da prova Ónus de alegação
I - A prova da comunicação (efectiva, adequada e esclarecedora) e da informação ao aderente, a que se reportam os arts. 5.º, n.º 3, e 6.º do DL n.º 446/85, de 25-10, cabe, nos termos de tais normativos, ao contraente que submete àquele as respectivas cláusulas contratuais gerais.
II - Previamente à prova do expresso em I, subsiste o ónus, por aquele que se quer fazer valer da violação dos deveres consignados nos preditos normativos, da alegação da factualidade donde flua tal infracção.
25-05-2006
Revista n.º 1016/06 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxxxxx Xxxxxxxxxx
Acção executiva Oposição à execução Livrança
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral
I - Ao contrato de crédito cuja totalidade do verso é integrada por diversas cláusulas impressas, designadas por “condições gerais financiamento para aquisição a crédito” é aplicável o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais.
II - Não devem ser consideradas excluídas do contrato as condições gerais impressas no verso do documento formalizador do contrato, assinado na página anterior àquela onde constam tais cláusulas gerais, se os embargantes se limitaram a alegar que lhes era impossível tomar conhecimento e consciência do teor dessas cláusulas com o fundamento fáctico, não provado, de que lhes não fora entregue uma cópia do mesmo.
III - Com esta defesa não puseram os embargantes em causa o dever de comunicação e informação sobre o conteúdo das cláusulas constantes do verso do escrito que formaliza o contrato, tendo, por isso, de concluir-se que, apesar de terem assinado o contrato ao fundo do rosto do documento, sabiam perfeitamente qual o conteúdo das cláusulas constantes do verso, tanto assim que, para a garantia a que alude a cláusula 10.ª das “condições gerais financiamento para aquisição a crédito” assinaram uma livrança em branco.
IV - Não sendo excluídas as cláusulas constantes do verso do documento, nomeadamente a 10.ª, vigora a convenção do preenchimento da livrança assinada em branco pelos embargantes.
V - Mesmo com a exclusão dessas cláusulas, designadamente da 10.ª, o facto de os embargantes terem procedido voluntariamente à entrega à financiadora do crédito de uma livrança assinada em branco, indica que o fizeram como garantia do cumprimento
das obrigações decorrentes do contrato, pelo que, não se provando o preenchimento abusivo da livrança dada à execução, os embargos teriam de improceder.
20-06-2006
Revista n.º 1668/06 - 1.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xx
Responsabilidade extracontratual Responsabilidade contratual Contrato de seguro
Sub-rogação
Cláusula contratual geral Cláusula compromissória
I - A sub-rogação consiste na substituição do credor na titularidade do direito a uma prestação fungível pelo terceiro que cumpra em lugar do devedor.
II - A fixação contratual do foro arbitral, sendo uma cláusula compromissória, pode ser havida como acessória do crédito, e, portanto, transmissível nos termos do disposto no art. 582.º do CC, aplicável ao caso por força do disposto no art. 594.º, ambos do CC.
III - Noutra perspectiva, tendo a sub-rogação sido constituída pelo credor, justifica-se que o devedor possa opor ao credor sub-rogado todos os meios de defesa que dispunha contra o primitivo credor, designadamente a excepção de preterição de tribunal arbitral. IV - A responsabilidade civil contratual supõe a verificação dos pressupostos comuns a ela e à responsabilidade extracontratual por facto ilícito, a saber: o acto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, sendo o acto ilícito o incumprimento ou o cumprimento defeituoso da prestação.
V - Nos casos em que, em princípio, possam concorrer os dois tipos de responsabilidade, se os danos decorrerem do incumprimento do contrato a responsabilidade civil será, toda ela, contratual, visto que a eventual responsabilidade extracontratual paralela fica consumida por aquela.
VI - A expressão “cláusulas inseridas em formulários depois da assinatura de algum dos contratantes” constante do art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10, significa cláusulas inseridas no verso do contrato, constando a assinatura da face respectiva ou inseridas em formulários anexados ao contrato, formalmente situados após a assinatura.
20-06-2006
Agravo n.º 1211/06 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Alves Velho
Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Cláusula contratual geral Assinatura
Exigibilidade da obrigação Vencimento da dívida Interpelação
Dívida comunicável Dívida de cônjuges
Proveito comum do casal Matéria de direito Matéria de facto Confissão de dívida Confissão judicial
I - Quando a lei (art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10) considera excluídas dos contratos singulares as cláusulas (contratuais gerais) inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contraentes, não pode estar a reportar-se à impressão das cláusulas em momento posterior à assinatura (critério cronológico), já que em relação a essa situação nunca se poderia falar, nem mesmo apenas do ponto de vista formal, em contrato, para além de que seria particularmente difícil a um dos contraentes conseguir imprimir as cláusulas em momento posterior à assinatura no exemplar entregue à contraparte, mas sim à sua localização no contrato relativamente à assinatura (critério de localização espacial), já que o que está em causa não é a existência da cláusula, mas o seu conhecimento pela contraparte por forma a se poder afirmar a sua vinculação.
II - O art. 781.º do CC deve ser interpretado no sentido de estabelecer uma antecipação da exigibilidade da prestação, e não o seu vencimento, pelo que só após a interpelação do devedor se consideram vencidas as prestações com datas posteriores de cumprimento; ao intentar a acção, exigindo da ré o pagamento de todas as prestações exigíveis, a autora veio a interpelá-la através da citação.
III - Determinar se uma dívida, assumida por um dos cônjuges, foi contraída em proveito comum do casal, significa averiguar se o dinheiro ou os bens em cuja aquisição foi aplicado se destinaram a satisfazer interesses comuns do casal; a expressão legal “proveito comum” traduz-se num conceito de natureza jurídica a preencher através dos factos materiais indicadores daquele destino, pelo que não se trata de matéria de facto passível de ser adquirida por confissão feita (art. 484.º, n.° 1, do CPC).
IV - Não releva igualmente a alegação de que o automóvel se destinou ao património comum do casal, pois o problema é o mesmo: o conceito de “património comum” é jurídico, dado que está associado ao conhecimento da data do casamento e respectivo regime de bens, não dispensando o silogismo judiciário e o recurso a actividade interpretativa.
V - Tendo o autor omitido o ónus de alegar, para provar, os factos de que pudesse concluir-se pelo “proveito comum”, enquanto pressuposto constitutivo da responsabilização de ambos os cônjuges, tal incumprimento determina a improcedência da sua pretensão relativamente ao cônjuge não contraente.
06-07-2006
Revista n.º 627/06 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Xxxxxxx) Xxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de seguro Seguro de vida
Interpretação da declaração negocial Cláusula contratual geral Comunicação
O aderente dum seguro de vida a quem as respectivas condições gerais foram regularmente comunicadas e dadas a conhecer só pode prevalecer-se da norma do art. 11.º do DL 445/85, de 25 de Outubro, que manda atender à interpretação mais favorável ao aderente, se por aplicação das regras gerais dos arts. 236.º e seguintes do Código Civil, e sem o recurso a elementos exteriores ao texto do contrato, não for possível fixar um sentido negocial unívoco, de harmonia com a impressão do destinatário.
11-07-2006
Revista n.º 1646/06 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator) * Xxxxx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxxxxx
Aluguer de longa duração Cláusula contratual geral Acção inibitória
Nulidade
Inutilidade superveniente da lide
I - Em acção inibitória de cláusulas contratuais gerais, não é proibida nos termos da al.
j) do n.º 1 do art. 22.º do DL n.º 446/85 de 25-10, a cláusula contratual geral que estipula num contrato de ALD que o locatário deve efectuar as reparações do veículo locado na oficina indicada no contrato ou em qualquer oficina oficial da marca do veículo em causa.
II - Não viola o disposto na al. g) do art. 18.º do citado decreto-lei a cláusula contratual geral que reconhece ao locador o direito de recuperar a viatura locada no local em que a mesma se encontrar, findo o contrato.
III - Também não é proibida nos termos da al. g) do art. 21.º do mesmo diploma, a cláusula contratual geral que estipule que a falta da assinatura do cônjuge do locatário não significa, em caso algum, que o contrato não tenha sido feito em proveito comum do casal.
IV - Em acção inibitória também não é proibida nos termos da al. g) do art. 19.º do mesmo decreto-lei, a cláusula contratual geral que fixa a competência exclusiva do tribunal da comarca de Lisboa para os litígios emergentes da execução do contrato em causa.
V - Na mesma acção inibitória, a circunstância de se haver provado que a ré deixou de usar as cláusulas contratuais gerais pretensamente nulas, e não haver já contratos com aquelas cláusulas por cumprir, não significa que a instância em causa se tenha tornado inútil supervenientemente.
VI - A cláusula contratual geral inserida num contrato de ALD que prevê que a imobilização da viatura locada por qualquer causa, não dispensa o locatário do pagamento pontual dos alugueres, nem vincula o locador a substituir aquela viatura, é nula por violar o disposto na al. c) do art. 18.º do mesmo diploma legal.
VII - A cláusula contratual geral inserida no mesmo tipo de contratos, que prevê que a destruição ou desaparecimento do veículo locado, ainda que não imputáveis ao locatário, não o desobriga de pagar a totalidade dos alugueres vencidos ou vincendos até final, bem como do pagamento do valor residual, é proibida pelo disposto na al. f) do art. 21.º do mesmo diploma legal
19-09-2006
Revista n.º 2616/06 - 6.ª Secção
Xxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de locação financeira Contrato de seguro
Furto
Exclusão da responsabilidade Cláusula contratual geral Dever de comunicação
Ónus da prova
I - Pretendendo a Autora que a Ré seguradora - com a qual celebrou contrato de seguro cuja cobertura abrangia o risco de furto do veículo locado - pagasse à respectiva beneficiária, a locadora financeira, ou à Autora, indemnização no valor equivalente ao capital segurado de 54.368,97 €, e sustentando a Ré a exclusão da sua responsabilidade por o desaparecimento do veículo ter ocorrido quando o condutor o deixou estacionado, sem o fechar, com as chaves na ignição, defronte de restaurante onde foi almoçar, o que integra a previsão de cláusula de exclusão de responsabilidade, à Ré compete, perante a invocação pela Autora da omissão da comunicação dessa cláusula especial, alegar e provar que a comunicação foi feita.
II - Não tendo a Ré alegado sequer que fez tal comunicação, essa cláusula, nos termos da qual “não está abrangida pela presente cobertura o desaparecimento de veículos dotados de sistemas de imobilização electrónica, excepto quando o seu proprietário esteja na posse de todas as chaves que, de origem, são entregues pelo representante da marca”, deve ter-se por excluída, por força do art. 8.º, al. a), do DL n.º 446/85, de 25-10. III - Sem prejuízo de se aceitar ter concorrido para a verificação do sinistro a conduta negligente do condutor do veículo da Autora, não é aplicável o regime de exclusão de responsabilidade a que alude o art. 505.º do CC.
IV - Com efeito, este preceito é aplicável no campo da responsabilidade extracontratual, emergindo, diferentemente, a accionada nos autos de contrato pelo qual a Ré se obrigou a indemnizar o beneficiário do seguro dos prejuízos sofridos no caso de verificação do risco coberto, sem exclusão dos sinistros causados com culpa do segurado, conforme a lei (art. 437.º, n.º 3, do CCom) e o teor do contrato (cláusula especial da apólice) o sufragam, ao excluírem apenas os danos dolosa ou intencionalmente causados pelo segurado ou pessoa por quem este seja responsável.
V - Nada tendo sido oportunamente alegado (só agora em sede de recurso) sobre o valor da viatura à data do desaparecimento, nem sobre se a Autora se propunha adquiri-la no final do contrato de locação, nem sobre a estabilidade do valor do prémio ao longo de todo o contrato e motivos dessa manutenção, e uma vez que a Autora continuou a pagar à locadora as rendas do contrato de locação, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora o valor das rendas devidas e pagas à locadora, por via da caducidade do contrato, isto é, a soma das rendas que estavam por liquidar à data do sinistro e até ao termo do contrato de locação financeira.
17-10-2006
Revista n.º 2604/06 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Cláusula contratual geral Dever de informar
Ónus da prova
I - Em matéria de cláusulas contratuais gerais, o cumprimento do dever de informação previsto nos arts. 5.º e 6.º do DL n.º 446/85 de 25-10 constitui ónus de prova do proponente.
II - Porém, a contraparte tem previamente de provar que o contrato em causa reveste a natureza de contrato de adesão, definida no art. 1.º do citado decreto-lei.
24-10-2006
Revista n.º 2978/06 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Contrato de adesão
Assinatura
Pagamento em prestações Vencimento da dívida Interpelação
I - As partes celebraram um contrato de mútuo oneroso, na modalidade especial de contrato de crédito ao consumo, previsto no art. 2.º do DL n.º 359/91, de 21-09, e regulado por este diploma.
II - Uma vez que o clausulado do contrato estava pré-determinado, isto é, tinha o seu conteúdo pré-fixado pelo autor, que a ré se limitou a aceitar, estamos perante um contrato de adesão a cujas cláusulas contratuais gerais é aplicável a disciplina do DL n.º 446/85, de 25/10.
III - O contrato subscrito pelas partes consta de um formulário impresso que o recorrente utiliza na concessão dos empréstimos a que se dedica como sociedade financeira; as condições gerais, em texto padronizado, estão inscritas no verso do contrato e depois das assinaturas dos outorgantes, que foram apostas na face logo a seguir às condições específicas.
IV - A cláusula das condições gerais do contrato onde consta que “A falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes”, deve ter-se por excluída do contrato, por força do disposto no art. 8.º, al. d), do referido DL n.º 446/85.
V - Não é exigível a um declaratário normal que, a partir da referência isolada às condições gerais na introdução do contrato, infira a existência de um clausulado no verso do mesmo (que não assinou).
VI - Em função dos seus elementos literal e finalístico, deve interpretar-se o art. 781.º do CC no sentido de que o vencimento imediato de todas as prestações não dispensa a interpelação do devedor; no caso, teria, portanto, o recorrente que interpelar primeiramente a recorrida sociedade para o cumprimento imediato de toda a obrigação. 24-10-2006
Revista n.º 3354/06 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contrato de mútuo Crédito ao consumo Juros remuneratórios Capitalização de juros
Interpretação da declaração negocial Cláusula contratual geral Condenação em quantia a liquidar
I - Os juros voluntários podem vencer-se findo o período de contabilização ou podem vencer-se antecipadamente, mas, em ambos os casos, apenas existe o crédito aos juros se o período de tempo de contabilização tiver efectivamente decorrido. Sem decurso do tempo, não existem juros, não existe remuneração do capital.
II - Do art. 781.º do CC resulta que a falta de pagamento de uma prestação de capital pode implicar o vencimento das restantes prestações de capital. Porém, esse preceito não determina o vencimento antecipado de prestações de juros.
III - Tendo as partes celebrado validamente um contrato de mútuo (art. 1142.º do CC), operação de crédito realizada por uma instituição de crédito ou para-bancária (art. 1.º do DL n.º 344/78, de 17-11), na modalidade de crédito ao consumo (art. 2.º do DL n.º 359/91, de 21-09), o qual deve ser qualificado como contrato de adesão (art. 1.º do DL n.º 446/85, de 25-10), a cláusula que determina que “A falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes” deve ser interpretada nos termos estabelecidos nos arts. 236.º do CC e 11.º do DL n.º 446/85.
IV - O seu sentido é o de que a falta de pagamento de uma mensalidade implica a perda do benefício do pagamento escalonado do capital emprestado. Um declaratário normal não interpretaria essa cláusula no sentido de que a falta de pagamento de uma mensalidade acarretaria o pagamento de todos os juros que nasceriam até ao fim do contrato.
V - Para decidir da admissibilidade da exigência pelo Banco mutuante de juros remuneratórios das prestações que foram consideradas vencidas face ao incumprimento do contrato pelo mutuário, é irrelevante a permissão da capitalização de juros (art. 5.º, n.ºs 0 x 0, xx XX x.x 000/00, xx 00-00 (xx redacção dada pelo DL n.º 83/86, de 06-05). Não podendo considerar-se que tenha nascido a obrigação de juros remuneratórios, esta não se venceu, inexistindo juros para capitalizar.
VI - Assim, haverá que deduzir de todo o peticionado os montantes referentes aos juros remuneratórios das prestações em dívida cujo período de tempo ainda não decorreu, bem como a importância referente à capitalização desses valores, condenando-se o devedor no pagamento de quantia a liquidar.
14-11-2006
Revista n.º 2718/06 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx (vencido)
Xxxxx Xx Xxxxxx Xxxxxx
Faria Antunes
Contrato de seguro
Dano causado por coisas ou actividades Exclusão de responsabilidade
Cláusula contratual geral Dever de informar
I - A cláusula, constante das condições particulares da apólice do seguro de responsabilidade civil por danos causados a terceiros decorrentes da actividade de construção civil, nos termos da qual a responsabilidade da seguradora é excluída no caso de danos resultantes da inobservância das disposições legais e/ou camarárias concernentes ao cumprimento das medidas de segurança adequadas que a Lei ou o uso recomendam, deve considerar-se excluída nos termos do art. 8.º, als. a) e b) do DL n.º 446/85, de 25-10, alterado pelo DL n.º 220/95, de 31-01.
II - Uma tal cláusula de exclusão, face à sua amplitude, retira praticamente a utilidade do seguro em causa, pelo que dificilmente qualquer empresário de construção civil o celebraria se fosse devidamente informado da sua cobertura tão residual, não tendo a seguradora alegado e provado que cumpriu os deveres de comunicação e informação da cláusula em causa.
14-11-2006
Revista n.º 3618/06 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx
Contrato de mútuo
Contrato de crédito ao consumo Pagamento em prestações Vencimento
Perda do benefício do prazo Exigibilidade da obrigação Cláusula contratual geral Juros remuneratórios
Juros de mora
I - Na liquidação da obrigação em prestações, a que alude o art. 781.º do CC, o vencimento imediato das restantes prestações, quando uma delas não é satisfeita, não exclui a necessidade de interpelação, dado tratar-se de uma faculdade do credor que a exercerá se assim o entender.
II - Significando, pois, a imediata exigibilidade dessas prestações e não que a data do seu vencimento passe a ser a da prestação faltosa.
III - Se o que ficou acordado num contrato foi que o não pagamento de uma das prestações implicava o vencimento imediato das restantes, é de entender que se remeteu para o conteúdo do art. 781.º, com o sentido atrás indicado e não que se acordou o seu vencimento automático.
IV - Reforça este entendimento o facto de se tratar de um contrato de adesão.
V - Num mútuo oneroso em que a obrigação de restituir integra diversas prestações, cada uma delas composta por capital e juros remuneratórios, o disposto no art. 781.º só é aplicável à parte do capital, pois só esta é que é uma obrigação cujo cumprimento foi dividido em diversas prestações.
VI - Os juros remuneratórios constituem prestações periódicas, sendo certo que nestas o não cumprimento de uma delas não importa o vencimento das seguintes que se reportam a períodos futuros, não se tendo ainda constituído ao tempo daquela que não foi cumprida.
16-11-2006
Revista n.º 2911/06 - 2.ª Secção Bettencourt de Faria (Relator) * Xxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Contrato de mútuo
Pagamento em prestações Cláusula contratual geral Falta de contestação Defesa por excepção Vencimento
Interpelação Conhecimento oficioso Proveito comum do casal Ónus de alegação
Ónus da prova
I - Autor e ré celebraram um contrato de crédito, entendido como o contrato por meio do qual um credor concede a um consumidor um crédito sob a forma de mútuo, cujo regime legal decorre do DL n.º 359/91, de 21-09, que veio regular novas formas de crédito ao consumo.
II - Não tendo o autor logrado provar que, anteriormente à propositura da acção, tenha interpelado a ré para proceder ao pagamento do valor correspondente a 9 prestações vencidas, a que se arroga direito, só com a citação da ré se deve considerar a mesma interpelada, nos termos do art. 805.º, n.º 1, do CC.
III - O disposto no art. 781.º do CC, por não ser uma norma imperativa, pode ser afastado pela livre vontade das partes contraentes.
IV - Resultando da factualidade provada que as partes convencionaram que a falta de pagamento de qualquer das prestações na data do respectivo vencimento implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações, independentemente de ter havido interpelação, e não tendo surgido oposição na presente acção, logo se constata que o contrato celebrado é válido, já que foi livremente celebrado entre as partes (art. 405.º do CC), sendo certo que a aludida cláusula das Condições Gerais não se inclui em matéria em que supletivamente o legislador quis regular o trato contratual.
V - Existindo e estando provada a vontade das partes no sentido de ter sido celebrado um contrato de mútuo com as condições gerais e específicas constantes no documento que ambas subscreveram, não tendo sido colocado nos autos que o aludido contrato seria um “formulário”, para os fins previstos no art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25- 10, e, não se equacionando, de igual modo, o facto de a recorrida não ter dado o seu
consentimento àquilo que foi acordado no contrato de mútuo, já que não foi deduzida qualquer excepção, por falta de contestação, nunca o clausulado firmado pelas partes poderia ter sido colocado em crise, como o foi, pelas instâncias.
VI - Assim, não poderia o julgador ter questionado a validade da eficácia daquela cláusula que, xxxxx foi firmada previamente à assinatura do contrato, e, que, por não integrar matéria imperativa, estava vedado conhecer, atenta a confissão operada.
VII - Em consonância com os arts. 342.º, n.º 1, e 467.º, n.º 1, al. d), do CPC, incumbe ao credor - que pretende responsabilizar ambos os cônjuges pelo pagamento de dívida contraída apenas por um deles, nos casos previstos na al. d) do n.º 1 do art. 1691.º do CC - articular factos materiais concretos indicadores do destino dado ao dinheiro.
VIII - O conceito de património comum é jurídico, desde logo porque anda associado ao conhecimento da data do casamento e respectivo regime de bens, sabido que é que só se pode falar em bens comuns se o casamento for no regime de comunhão geral ou, sendo- o na comunhão de adquiridos, após a celebração do contrato, não dispensando o silogismo judiciário o recurso à actividade interpretativa (cfr. arts. 1722.º e 1723.º do CC).
IX - Não tendo o autor alegado factos materiais concretos indicativos do proveito comum, terá que improceder o respectivo pedido relativamente ao réu. A tal não obsta a circunstância de os réus não terem contestado, porquanto o alegado na petição inicial não integra matéria de facto passível de ser adquirida pela confissão ficta, prevista no art. 484.º, n.º 1, do CPC.
21-11-2006
Revista n.º 3420/06 - 1.ª Secção Borges Soeiro (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx
Contrato de compra em grupo Cláusula contratual geral Nulidade
Sociedade comercial Liquidação Capacidade judiciária
I - A cláusula contratual inserida num contrato de participação em compras em grupo, no sentido de que a prestação a pagar pelo aderente ao grupo ficava dependente do preço do bem a adquirir não é abusiva nos termos do DL n.º 446/85, de 25-10, ou da Lei n.º 24/96, de 31-07.
II - A sociedade por quotas de administração de compras de bens em grupo, extinta por decisão governamental e em liquidação, representada pela liquidatária nomeada tem capacidade judiciária para propor acção de cobrança de créditos pertencentes àquela sociedade.
14-12-2006
Revista n.º 3973/06 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Cláusula contratual geral Dever de comunicação Ónus da alegação
Ónus da prova Exclusão de cláusula Culpa in contrahendo
I - O dever de comunicação do teor das cláusulas contratuais gerais tem duas vertentes: por um lado, o proponente deve comunicar na íntegra à outra parte as cláusulas contratuais gerais de que se sirva (art. 5.º, n.º 1, do DL n.º 446/85, de 25-10), por outro lado, ao fazer esta comunicação, deve realizá-la de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência (art. 5.º, n.º 2).
II - Querendo-se estimular o proponente a bem cumprir esse dever, o n.º 3 do art. 5.º faz recair sobre ele o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva.
III - O comando contido na al. a) do art. 8.º do referido DL, ao prescrever a exclusão das cláusulas não comunicadas nos termos do art. 5.º, tem que ser entendido - atenta a referida norma sobre o ónus da prova - como prescrevendo a exclusão das cláusulas em relação às quais se não prove terem sido comunicadas.
IV - Trata-se de, e ainda na fase de negociação, ou pré-contratual, comunicar quais as cláusulas a inserir no negócio mas, e também, prestar todos os esclarecimentos necessários, designadamente informando o aderente do seu significado e implicações. Este regime já podia ser detectado nos arts. 227.º, n.º 1, e 232.º do CC.
V - Todavia, previamente à prova de que a comunicação e a informação existiram e foram adequadas, “subsiste o ónus, para aquele que se quer fazer valer da violação desses deveres, de alegar a respectiva facticidade, nomeadamente que aderiu ao texto das cláusulas sem que o proponente lhas tivesse comunicado ou prestado os devidos esclarecimentos”.
23-01-2007
Revista n.º 4230/06 - 1.ª Secção Borges Soeiro (Relator)
Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxx
Acção inibitória Cláusula contratual geral Cartão de crédito
São nulas, porque violadoras do disposto no art. 21.º, xx. x), xx XX x.x 000/00, de 25-10, as cláusulas contratuais gerais insertas num contrato de emissão e utilização de cartões de crédito e débito, nos termos das quais: a) “o titular assume inteira responsabilidade pela utilização do cartão ou cartões solicitados, incluindo a responsabilidade pelo risco, não tendo o banco X a obrigação de verificar ou controlar quem os utilize”; b) “os prejuízos sofridos pelo titular em virtude da utilização fraudulenta no período anterior à notificação ao banco X referida no n.º 7.1 [cujo teor é o seguinte: “o titular obriga-se a avisar imediatamente e pelo meio telefónico ou outro mais expedito o banco X do extravio, furto ou roubo do cartão e a confirmar esse facto por escrito ao banco até às 12
horas do primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência”] serão suportados pelo titular, de acordo com as regras em vigor.
25-01-2007
Revista n.º 4624/06 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contrato de mútuo Cláusula contratual geral
Interpretação da declaração negocial Perda do benefício do prazo
Juros remuneratórios
I - A interpretação segundo a qual a alínea d) do art. 8.º do DL n.º 446/85, de 25-10, se refere às cláusulas “introduzidas após”, por oposição a “constantes”, ou seja, já escritas, atribuindo ao advérbio “depois” uma significação temporal e não de lugar, é incompatível com o regime da conclusão dos contratos, que o referido Decreto-Lei acolhe desde logo nos seus arts. 1.º, 2.º e 4.º, sem deixar qualquer dúvida sobre a preexistência e elaboração prévia das cláusulas gerais relativamente ao momento da declaração de aceitação ou adesão.
II - Acresce que tal interpretação esvaziaria de conteúdo e sentido o dever de comunicação prévia imposto pelo art. 5.º, cuja omissão é cominada, igualmente, com a exclusão das cláusulas (al. a) do mesmo art. 8.º).
III - Encontrando-se as assinaturas dos outorgantes no contrato na face do documento que constituiu a proposta contratual impressa, a seguir às “Condições Específicas”, e constando do verso as cláusulas gerais, têm estas de ter-se por excluídas do contrato singular, tudo se passando como se não existissem.
IV - Se o mutuante, exercendo o direito previsto no art. 781.º do CC, provoca o vencimento da totalidade das prestações, visando a recuperação imediata da totalidade do capital, não poderá exigir mais que o capital e a remuneração pela respectiva disponibilidade até ao momento da restituição. Ou seja, dos juros remuneratórios incluídos nas prestações, apenas são devidos os abrangidos pelas prestações de capital vencidas.
06-02-2007
Revista n.º 4524/06 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator)
Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxx
Matéria de facto Poderes da Relação Fundamentos de facto Prova documental Sociedade comercial Administrador
Poderes de representação Cláusula contratual geral
Dever de comunicação Embargos de executado Ónus da prova
I - Mesmo não tendo sido incluídos na fundamentação da sentença da 1.ª instância, entre os factos dados como assentes, determinados factos articulados provados por documentos, nada obsta a que a Relação os tome em consideração como fundamento para decidir a apelação.
II - Não forma caso julgado a decisão sobre a determinação dos fundamentos de facto conducentes à decisão do pleito.
III - A limitação dos poderes representativos dos administradores de sociedades comerciais, estabelecida em cláusula do contrato de sociedade, não resultante do objecto social, - como é o caso de cláusula que exija a assinatura de dois administradores para obrigar a sociedade para com terceiros -, não é oponível a terceiros.
IV - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra, e explicadas quando se justifique a sua aclaração, à parte aderente, já não tendo de o ser aos garantes desta.
V - É sobre o embargante que recai o ónus da prova de preenchimento abusivo do título de crédito dado à execução.
13-02-2007
Revista n.º 4617/06 - 6.ª Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx (Relator) * Xxxxxx Xxxxxxx
Xxxxxxx xx Xxxxxxx
Contrato de seguro Seguro-caução
Aluguer de longa duração Contrato de locação financeira Interpretação do contrato Cláusula contratual geral Matéria de facto
Matéria de direito
I - A circunstância de constar das cláusulas particulares do contrato de seguro-caução directa genérico a menção de a garantia se reportar às rendas concernentes ao contrato de aluguer de longa duração não obsta, só por si, à interpretação da globalidade do seu clausulado geral e particular no sentido de o risco por ele garantido se reportar ao incumprimento do contrato de locação financeira.
II - A interpretação das cláusulas contratuais envolve matéria de facto quando importa a reconstituição da vontade real das partes, constituindo matéria de direito quando, no desconhecimento de tal vontade, se deve proceder de harmonia com o art. 236.º, n.º 1, do CC.
III - Se ficou provado que a vontade real das outorgantes do contrato de seguro de caução directa-genérico foi garantir as rendas do aluguer de longa duração e essa vontade tiver um mínimo de correspondência no texto da apólice, deve entender-se que a cobertura contratual se reporta a estas últimas rendas, e não às da locação financeira, ainda que a globalidade do clausulado do contrato de seguro sugira mais intensamente a cobertura destas últimas.
01-03-2007
Revista n.º 4777/06 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de mútuo
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula
Juros remuneratórios
I - Convencionando-se no contrato de mútuo celebrado entre Autora e Réu que, em caso de mora, incidirá sobre o montante em débito e durante o tempo de mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de 4 pontos percentuais, estamos perante uma cláusula contratual geral, porque elaborada pela Autora, sem prévia negociação individual e em relação à qual os destinatários, ou seja os clientes da Autora se limitam a subscrever ou aceitar.
II - A palavra “depois” constante do art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10, não significa “em momento posterior à assinatura” (uma tal cláusula jamais poderia obrigar a parte), mas tem um significado espacial, reportando-se a cláusulas inseridas no verso do contrato, constando a assinatura da face respectiva, ou inseridas em formulários anexados ao contrato formalmente situados após a assinatura.
III - Mesmo que tenha ocorrido comunicação da cláusula em termos de o aderente ter podido dela se aperceber, se a cláusula consta de formulário ou anexo situado após (depois) da assinatura de algum dos contratantes, considera-se excluída do contrato. Assim, constando a cláusula referida em I de formulário no verso da proposta assinada, deve a mesma ter-se por excluída.
IV - O art. 781.º do CC abrange apenas a dívida de capital e os juros remuneratórios incluídos nas prestações de capital vencidas até ao momento da restituição.
27-03-2007
Revista n.º 279/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Assinatura
Dever de informação Dever de comunicação Fiança
I - O contrato de crédito ao consumo, nos termos do DL n.º 359/91, de 21-09, é um contrato de adesão, sujeito por isso ao regime das cláusulas contratuais gerais do DL n.º 446/85, de 25-10, com as posteriores alterações dos DL. n.ºs 220/95, de 31-08, e 249/99, de 07-07.
II - As cláusulas inseridas em formulários depois da assinatura dos contratantes que a al.
d) do art. 8.º do DL n.º 446/85 considera excluídas dos contratos singulares são também aquelas que, construídas antes pelo proponente, são incluídas no formulário apresentado abaixo da assinatura das partes contratantes.
III - Quando o funcionamento do regime das cláusulas contratuais gerais reconduz a vontade negocial dos contratantes às cláusulas específicas, negociadas entre as partes, a fiança prestada subsiste, dentro desses limites, ainda que perante o fiador o proponente não tenha cumprido o dever de informação ou não lhe tenha feito entrega do exemplar do contrato exigido pelo art. 5.º do DL n.º 446/85.
03-05-2007
Revista n.º 1650/06 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) * Custódio Montes
Mota Miranda
Documento autêntico Força probatória Cláusula contratual geral Venda a prestações Pagamento a prestações
Perda do benefício do prazo Interpelação
Fiador
I - A força probatória dos documentos autênticos considera-se desde logo estabelecida quanto à sua autenticidade e esta só poderá ser atacada pela via da falsidade.
II - Quanto à força probatória material, há que distinguir: também se considera haver prova plena a afastar apenas com a prova da falsidade, no que respeita à veracidade das atestações do funcionário documentador nos limites da sua competência e até onde o conteúdo verse sobre actos praticados por ele próprio; no que respeita à veracidade, ausência de vícios ou anomalia do que foi transmitido ao funcionário e vertido no documento ou, bem assim, às atestações deste fora dos seus limites de competência, existe plena liberdade de valoração probatória e, consequentemente, de impugnação.
III - Previamente à demonstração a que os ónus de prova previstos no DL n.º 446/85, de 25-10, se reportam, tem de haver a demonstração, a cargo da parte que quer beneficiar da invalidade das cláusulas contratuais gerais, de que estamos em terreno próprio destas. IV - A perda do benefício do prazo de pagamento de obrigações a prestações emergente do não pagamento de uma delas não vale quanto ao fiador.
V - E não é automático, carecendo a exigência de pagamento de todas as prestações assim vencidas de interpelação.
10-05-2007
Revista n.º 841/07 - 2.ª Secção Xxxx Xxxxxxxx (Relator) * Xxxxxxxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Cláusula contratual geral Contrato de prestação de serviços
Telecomunicações Denúncia
I - A ré contratou com a autora a prestação, por esta última, de serviços de telecomunicações, através da instalação do respectivo posto telefónico, e ainda a inserção em listas telefónicas de várias publicações anunciadoras, mediante o pagamento mensal de determinadas quantias e durante a anuidade de vigência daquelas listas.
II - Nas condições gerais do contrato foi inserida a seguinte cláusula: 1 - “O presente contrato será válido pelo prazo de vigência da edição da lista em que constem as figurações referidas nas condições particulares e considerar-se-á renovado para as edições seguintes, salvo se a PT ou o cliente o denunciarem nos termos dos n.ºs 2 e 3 desta cláusula”; 2 - “O cliente ou a PT poderão denunciar o presente contrato, por escrito, nos 30 dias seguintes à data da sua celebração, no entanto, a referida denúncia só poderá ser aceite até 90 dias antes do início da vigência da lista”; 3 - “Nas situações de renovação, a PT e o cliente poderão denunciar o presente contrato, por escrito, até 90 dias antes do início da vigência da edição seguinte. Nas situações em que a renovação não é automática, mas dá-se pela assinatura de um novo contrato, a PT ou o cliente poderão denunciá-lo, por escrito, nos 30 dias seguintes à data da sua celebração”.
III - Tal cláusula não é proibida pois prevê um prazo de denúncia normal (al. a) do n.º 1 do art. 22.º do DL n.º 446/85, de 25-10, na redacção do DL n.º 220/95, de 31-08).
10-05-2007
Revista n.º 1087/07 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
Cartão de crédito Cartão de débito Depósito bancário Abertura de crédito
Cláusula contratual geral Acção inibitória
I - Subjacente ao levantamento de numerário de uma máquina automática de caixa e à operação de pagamento automático está um contrato, designado por “contrato de utilização” do cartão.
II - Trata-se de um contrato acessório instrumental, em relação ao contrato de depósito bancário ou ao de abertura de crédito em conta corrente.
III - As cláusulas do “contrato de utilização” - contrato pré-elaborado e que apresenta todas as características de contrato de adesão - são unilateralmente impostas pelo banco, que é, em regra, o contraente mais forte, reduzindo-se a liberdade contratual do titular do cartão à decisão de aderir ou não ao contrato.
IV - Daí a exigência de um controlo a posteriori - controlo incidental - das condições gerais inseridas nesse tipo de contrato, ou do seu controlo preventivo - controlo abstracto -, através de uma acção inibitória, destinada a erradicar do tráfico jurídico condições gerais iníquas, independentemente da sua inclusão em contratos singulares, com vista ao restabelecimento do adequado equilíbrio, perdido na contratação massificada.
V - Tratando-se de cartões com um prazo determinado de validade, estamos perante contratos de prestação duradoura por tempo determinado.
VI - Deste modo, a denúncia deve fazer-se para o termo do prazo da sua renovação, não se justificando falar em falta de motivo justificado.
VII - No caso de resolução, esta tem de ser motivada, só sendo legítima, quando verificado o pressuposto, o evento, erigido em causa de resolução.
17-05-2007
Revista n.º 1295/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxx (Relator) *
Xxx Xxxxx
Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx
CTT
Cláusula contratual geral Nulidade
Responsabilidade contratual Exclusão da responsabilidade
I - Se em lado algum das condições gerais do contrato se faz menção a que foram redigidas em conformidade com a Portaria n.º 1036/83, de 13-12, e seu Anexo II, com a Lei n.º 102/99, de 26-07, e com o DL n.º 176/88, de 18-05, não é exigível à recorrida adivinhar que as condições de serviço oferecidas pela recorrente (CTT) não eram regidas pela lei geral vigente no país, mas por aquela legislação, com destaque para a Portaria.
II - Devem por isso as condições gerais em referência reger-se também pelo disposto no DL n.º 446/85, de 25-10, que regula as cláusulas contratuais gerais, não sendo convocável o disposto no al. a) do art. 3.º desse diploma, que exceptua da sua aplicação as cláusulas típicas aprovadas pelo legislador.
III - Aconselhar um determinado tipo de serviço, garantir que seria tempestivamente cumprido, e executá-lo apenas 3 dias após o prazo pretendido, quando podia ter sido tempestivamente realizado (a encomenda até chegou ao Funchal várias horas antes do termo do prazo), revela uma grave ou grosseira negligência, que a recorrente não afastou minimamente, como lhe competia (arts. 799.º, n.º 1, e 342.º, n.º 2, do CC).
IV - Bem andaram as instâncias ao considerar nula a cláusula 12.ª, por, ex vi art. 18.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10, serem em absoluto proibidas as cláusulas contratuais gerais que... limitam a responsabilidade por... mora, em caso de dolo ou culpa grave.
V - É aplicável in casu o regime geral da responsabilidade civil, pois foi nessa base que a recorrida contratou, confiando na boa fé a que a recorrente igualmente se encontrava obrigada, sabido que é a boa fé que deve presidir tanto às negociações preliminares como à formação e à execução dos contratos, sob pena de responder pelos danos culposamente causados à outra parte (arts. 227.º, n.º 1, e 762.º, n.º 2, do CC).
24-05-2007
Revista n.º 972/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxxxx Xxxxxx
Xxxxxxx Xxxxx
Cláusula contratual geral
Dever de comunicação Dever de informação Nulidade do contrato Ónus da prova Matéria de facto Recurso de revista
I - A fixação dos factos materiais de causa baseada nos meios de prova produzidos e de livre apreciação do julgador não cabe no âmbito do recurso de revista, ressalvadas as situações excepcionais do n.º 2, “in fine” do art. 722.º do CPC.
II - O dever de comunicação das cláusulas contratuais constante do art. 5.º do DL n.º 466/85 de 25-10 destina-se a que o aderente conheça antecipadamente o conteúdo contratual, isto é, as cláusulas a inserir no negócio.
III - O dever acontece na fase de negociação, ou pré-contratual, e deve ser acompanhado, se solicitado pelo aderente, de esclarecimentos necessários, possibilitando-lhe conhecer o significado e as implicações das cláusulas.
IV - O ónus da prova da comunicação cabe ao contraente que submete as cláusulas ao outro, bastando-se com a remessa do contrato, com todo o seu clausulado, ao aderente para que este o devolva uma vez firmado, designadamente tratando-se de uma sociedade comercial que dispõe de melhores meios de estudo e de análise do que um contraente individual.
V - Só uma grave distorção lesiva dos princípios da boa fé e lisura contratuais gera a nulidade do contrato nos termos do art. 9.º n.º 2 do DL n.º 446/85.
24-05-2007
Revista n.º 1337/07 - 1.ª Secção Xxxxxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Contrato de seguro Seguro automóvel
Exclusão de responsabilidade Interpretação da declaração negocial Nulidade de acórdão
Excesso de pronúncia Cláusula contratual geral Dever de comunicação
I - Padece de nulidade o acórdão da Relação na parte em que entende que as concretas cláusulas invocadas pela ré seguradora como excludentes da sua responsabilidade são cláusulas gerais e, por isso, teria esta de demonstrar que as tinha comunicado ao autor, o que não fez, tanto mais que nem sequer alegou tal facto, pois esta questão não foi suscitada na 1.ª instância nem nas conclusões da apelação.
II - A cláusula da concreta apólice que exclui do âmbito da cobertura do seguro os eventos produzidos por ocasião de desmoronamentos abrange o sinistro verificado no veículo do autor provocado pelo facto de o piso onde a viatura se encontrava ter cedido por não estar devidamente compactado.
III - A circunstância de o veículo do autor ter capotado, em consequência do desmoronamento, e de o risco de capotamento estar coberto pelo contrato em apreço não afasta a exclusão da responsabilidade da seguradora.
31-05-2007
Revista n.º 1089/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxx Xxxxxxx xx Xxxxx
Bettencourt de Faria (vencido)
Contrato de locação financeira Mora
Resolução do negócio Cláusula penal
Cláusula contratual geral Nulidade
A cláusula penal estabelecida num contrato de locação financeira segundo a qual, em caso de resolução do contrato por incumprimento do locatário, a locadora tem direito a receber do locatário o correspondente ao montante da última renda estipulada por cada mês, ou fracção deste, de mora do locatário na restituição dos equipamentos locados, não é nula nos termos do art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10.
12-06-2007
Revista n.º 1701/07 - 6.ª Secção Xxxx Xxxxxx (Relator) * Fonseca Ramos
Azevedo Ramos
Contrato de seguro Contrato de mútuo Cláusula contratual geral
Limites da responsabilidade da seguradora Dever de comunicação
Dever de informação Ónus da prova Exclusão de cláusula Invalidez
Interpretação da declaração negocial
I - A seguradora que invoca uma determinada cláusula para limitar a sua responsabilidade tem de alegar e provar o seu conhecimento completo e efectivo por parte do tomador de seguro na conclusão do contrato ou na fase a ela conducente (arts. 5.º, n.º 3, e 6.º, do DL n.º 446/85, de 25-10).
II - Não tendo a seguradora provado, conforme lhe competia, que cumpriu aquela obrigação quanto a determinada cláusula, a consequência é, nos termos do art. 8.º do DL n.º 446/85, de 25-10, a exclusão da mesma.
III - Garantindo o contrato celebrado entre os Autores e a Ré seguradora o pagamento do capital (mutuado) em dívida ao (Banco) beneficiário designado em caso de Morte ou Invalidez Absoluta e Definitiva de cada Pessoa Segura, sendo esta Invalidez definida no verso da apólice como a “impossibilidade total ou definitiva de exercer qualquer trabalho que dê remuneração ou lucro, necessitando da assistência permanente de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida”, não tendo esta parte da cláusula sido comunicada aos Autores, deverá a mesma considerar-se excluída do contrato.
IV - Ainda que assim não fosse, estando provado que o Autor se encontra reformado por invalidez, sendo portador de uma incapacidade geral permanente de 65%, com incapacidade para o exercício da sua actividade profissional, carecendo da assistência de um terceiro para se deslocar ao Banco, à Câmara Municipal ou a uma Repartição de Finanças por não possuir discernimento para aí tratar dos devidos assuntos, deverá entender-se que a previsão da referida cláusula se mostra preenchida.
V - Com efeito, atento o disposto no art. 10.º do DL n.º 446/85, não deve interpretar-se tal cláusula como abrangendo apenas as situações em que o segurado se encontra em estado vegetativo. A referida cláusula não alude a todos os actos normais da vida, mas apenas a actos normais da vida, os quais não se limitam a comer, falar, lavar-se, deitar- se, levantar-se, constituindo também “actos normais da vida” para um qualquer cidadão português a ida ao Banco, à Câmara Municipal ou à Repartição de Finanças.
26-06-2007
Revista n.º 1529/07 - 6.ª Secção Xxxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxx
Nuno Cameira
Centro comercial Cláusula contratual geral Nulidade do contrato Garantia bancária
I - É atípico, ou inominado, o contrato de cedência temporária do gozo de um espaço para instalação de uma loja num centro comercial.
II - Os contratos atípicos só estão sujeitos a forma se a lei o impuser expressamente, na ponderação do seu objecto ou efeitos.
III - Os contratos de cedência referidos em I) não estão sujeitos a escritura pública.
IV - Tem o ónus de alegar os factos, com indicação expressa das cláusulas, quem pretende fazer-se valer da sua natureza abusiva ou iníqua.
V - Terá de verificar-se um desequilíbrio importante e notório nas prestações com grave violação dos princípios da boa fé e lisura contratuais quando se apela para o n.º 2 do art. 9.º do DL n.º 446/85, de 25-10.
VI - A garantia bancária é estabelecida em benefício do credor não podendo o devedor invocar o seu não accionamento como causa do agravar a sua prestação.
05-07-2007
Revista n.º 2107/07 - 1.ª Secção Xxxxxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula Assinatura
Juros remuneratórios Proveito comum do casal
I - A preposição “depois” constante do art. 8.º, al. d), do DL n.º 446/85, de 25-10, na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 220/95, de 31-08, só pode ter um significado espacial, isto é, só pode reportar-se a cláusulas inseridas no verso do contrato, constando a assinatura da face respectiva, ou inseridas em formulários anexados ao contrato formalmente situados após a assinatura.
II - Na verdade, o que o legislador pretendeu com tal disposição, como aliás, com as contidas nos arts. 5.º, 6.º e nas restantes alíneas do art. 8.º, foi exercer um controlo efectivo ao nível da formação do acordo, tendo em conta a possibilidade de desconhecimento de algum aspecto importante do contrato, regulado por cláusulas gerais, considerando que o acordo de vontade se obtém por simples adesão às cláusulas pré-determinadas, com exclusão de negociação prévia.
III - Tendo as assinaturas dos Réus sido apostas logo na 1.ª folha da proposta contratual, só após essas assinaturas surgindo a cláusula 8.ª do contrato aqui em causa, em anexo ou no verso dessa proposta, num formulário contendo as condições gerais, deve tal cláusula ter-se por excluída do contrato, tudo se passando como se ela não existisse e, por conseguinte, os juros moratórios devidos não podem computar-se à taxa prevista na mesma cláusula, muito embora os Réus nem sequer tenham contestado a acção.
IV - Os juros remuneratórios devidos são apenas os relativos às prestações de capital vencidas.
V - Tendo a Autora indicado os Réus como casados para efeito de responsabilizar a ambos pela dívida, deverá entender-se, perante a falta de contestação desse estado civil, que o mesmo foi confessado, nos termos do art. 484.º do CPC.
VI - Porém, o proveito comum do casal não se presume, sendo necessário alegar factualidade concreta da qual o mesmo resulte. Saber-se se existe proveito comum ou património comum exige a interpretação e aplicação de regras jurídicas a determinada factualidade que deve estar determinada previamente. Trata-se, pois, de conceitos jurídicos e não de matéria de facto, de modo que não pode ter-se por adquirida pela confissão a que se refere o art. 484.º, n.º 1, do CPC.
VII - Sabendo-se que o Réu adquiriu um automóvel mas ignorando-se qual o fim visado, designadamente se o veículo se destinou ao uso comum do casal (já que o facto de se integrar no património comum do casal não garante a utilidade comum ou a sua utilização no interesse comum), não pode ter-se como demonstrado que a dívida contraída para a compra do dito veículo, tenha sido em proveito comum do casal.
11-09-2007
Revista n.º 2209/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Fiança
Cláusula contratual geral
Dever de informação Dever de comunicação Exclusão de cláusula
I - Provando-se que a 3.x Xx assinou o “termo de fiança”, que lhe foi apresentado pela sua filha, ora 2.ª Ré, para que fosse possível analisar se poderia ou não ser fiadora na aquisição de um veículo automóvel que os 1.º e 2.º Réus pretendiam adquirir, que a 2.ª Ré levou esse documento assinado pela 3.ª Ré, junto com cópia do bilhete de identidade e n.º de contribuinte, assim como do seu actual marido, ficando a aguardar se poderia ou não ser fiadora, que ficou à espera de obter a confirmação de que poderia ser fiadora, na expectativa de vir a ser agendada data para a sua assinatura do contrato definitivo, com todos os intervenientes, para o que a 3.ª Ré nunca foi convocada, e que ela desconhecia a existência dos contratos dos autos, é de concluir que, mais do que aplicar o regime do erro, existe um desconhecimento total do conteúdo exacto da declaração negocial formalizada.
II - É que ainda que a Ré quisesse prestar fiança a favor da sua filha ou do seu genro, tinha que estar informada sobre o conteúdo da obrigação que assumia para formar a sua declaração negocial de forma livre e esclarecida e em conformidade com o que seria a sua vontade caso estivesse na posse de todos os elementos para decidir.
III - Existe um dever de informação, comunicação e esclarecimento que impende sobre quem pretende utilizar, junto dos seus consumidores, formulários contratuais padronizados, como os dos autos, incumbindo ao Banco Autor esclarecer a 3.ª Ré da forma como se processava toda a formalização do negócio e o conteúdo das cláusulas que o compunham, de forma adequada e com a antecedência necessária (art. 5.º, n.º 2, do DL n.º 446/85, de 25-10).
IV - Como não cumpriu o dever de comunicação, seja por inércia própria, seja por optar por um procedimento negocial onde não está presente, mas em que não deixa de ter a obrigação de fazer cumprir tal dever, seja directamente, seja através do mediador que selecciona para esse efeito (normalmente o stand de automóveis), a consequência é que todas as cláusulas do contrato devem ter-se por excluídas relativamente à fiadora que delas desconhece o teor (art. 8.º, xx. x), xx XX x.x 000/00, xx 25-10).
11-09-2007
Revista n.º 2387/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxx
Xxxxx Xxxx
Modificabilidade da decisão de facto Poderes da Relação
Apreciação da prova Centro comercial
Contrato de instalação de lojista Contrato de arrendamento Forma do contrato
Forma escrita Prova proibida Prova testemunhal
Cláusula contratual geral
I - Ao modificar a matéria de facto, no contexto do art. 712.º do CPC, a Relação forma a sua própria convicção, tal como acontece com o tribunal da 1.ª instância, sem estar delimitado pela convicção que serviu de base à decisão deste.
II - É de qualificar como contrato atípico ou inominado, a cedência de espaços ou instalação de lojas em centros comerciais, por o rico e complexo circunstancialismo que o define se não confinar aos contratos típicos de arrendamento e mesmo de contrato misto de arrendamento e prestação de serviços.
III - Tendo as partes reduzido a escrito o contrato de instalação de lojista, não podem provar-se por testemunhas quaisquer acordos preliminares ao contrato que o infirmem ou contrariem.
IV - Para se averiguar se o contrato contém cláusulas contratuais abusivas, à face do contido no DL n.º 446/85, torna-se necessário que, preliminarmente, se definam as cláusulas integrantes desse contrato e não defini-las em função dos princípios contidos nesse diploma legal.
13-09-2007
Revista n.º 1857/07 - 7.ª Secção Custódio Montes (Relator) * Mota Miranda
Xxxxxxx Xxxxxxxx
Cláusula penal Conhecimento oficioso
Aluguer de automóvel sem condutor Cláusula contratual geral
Objecto indeterminável
I - A excessividade ou onerosidade de uma cláusula contratual geral não se consubstancia em matéria de conhecimento oficioso.
II - A prestação inserta na cláusula inserta nas “condições gerais” de um contrato de aluguer de longa duração - nos termos da qual “no caso de, cessando o aluguer, seja por o contrato ter expirado normalmente, seja por ter sido resolvido ou caducado, o cliente não devolver atempadamente o veículo, a X Rent terá direito, a título de cláusula penal por esta mora na devolução, a receber uma quantia igual ao dobro daquela a que teria direito se o aluguer permanecesse em vigor por um lapso de tempo igual ao da mora”-, embora não esteja determinada, é concretamente determinável pela aplicação da regra contratual dela constante, bastando ter em consideração a renda estipulada pelas partes nas “condições particulares”.
20-09-2007
Revista n.º 2647/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxx Xxxxxx
Xxxxxx Xxxxxxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Assinatura
Nulidade
Pagamento em prestações
Vencimento
Juros remuneratórios
I - O contrato de crédito ao consumo, nos termos do DL n.º 359/91, de 21-09, sendo contrato de adesão, está sujeito ao regime das cláusulas contratuais gerais do DL n.º 446/85, de 25-10, com as posteriores alterações dos DL n.º 220/95, de 31-08, e 249/99, de 07-07.
II - As cláusulas inseridas em formulários depois da assinatura dos contratantes que a al.
d) do art. 8.º do DL n.º 446/85 considera excluídas dos contratos singulares são também aquelas que, construídas antes pelo proponente, são incluídas no formulário apresentado abaixo da assinatura das partes contratantes.
III - O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda não decorreu, em face do não pagamento de alguma das prestações, previsto no art. 781.º do CC, não abrange a parte das prestações que representem juros remuneratórios cujo prazo de referência não chegou a decorrer.
20-09-2007
Revista n.º 2877/06 - 7.ª Secção Pires da Rosa (Relator) Custódio Montes
Mota Miranda
Contrato de seguro Cláusula contratual geral
Interpretação da declaração negocial
Regras interpretativas a observar, sendo o contrato, como o de seguro, de adesão, com cláusulas contratuais gerais, são: o teor das cláusulas particulares da apólice prevalece sobre o das cláusulas gerais daquela e in dubio contra stipulatorem (arts. 7.º e 11.º do DL n.º 446/85, de 25-10, alterado pelos DL n.º 220/95 e 249/99, de 31-08 e 07-07, respectivamente).
04-10-2007
Revista n.º 2636/07 - 2.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx
Xxxx Xxxxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Assinatura
Exclusão de cláusula Pagamento em prestações Vencimento
Perda do benefício do prazo Juros remuneratórios
I - Num contrato de adesão, sob a tutela do DL n.º 466/85, de 25-10, consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas inseridas em formulários depois da assinatura de algum dos contratantes (art. 8.º, al. d), do referido diploma).
II - São excluídas do contrato singular as cláusulas gerais que, de qualquer forma, não se mostrem conhecidas ou aceites pelo consumidor (no caso, mutuário), v.g., apondo- lhe uma simples rubrica.
III - Sendo o teor de uma concreta cláusula geral contratual idêntico ao estabelecido no art. 781.º do CC, deve entender-se que gozam ambos da mesma interpretação: ou seja, exigibilidade imediata mediante interpelação para pagar.
IV - O mutuante que, arrogando-se do direito concedido pelo art. 781.º do CC, provoca o vencimento da totalidade das prestações, visando a recuperação imediata da totalidade do capital, não poderá exigir mais que o capital e a remuneração pela respectiva disponibilidade até ao momento da restituição, ou seja, dos juros remuneratórios incluídos nas prestações apenas são devidos os abrangidos pelas prestações de capital vencidas.
04-10-2007
Revista n.º 3009/06 - 2.ª Xxxxxx Xxxxxxxxx xxx Xxxxxx (Relator) Xxxx Xxxxxxxx
Xxxxxxxx Xxxxx
Contrato de crédito ao consumo Fiador
Cláusula contratual geral Dever de informação Dever de comunicação Fiança
Objecto indeterminável
I - Não existe obrigação legal de o credor entregar cópia do contrato de mútuo ao fiador, pois este não pode ser considerado consumidor nos termos do art. 2.º do DL n.º 359/91, de 21-09.
II - Não tendo o fiador aderido ao contrato de mútuo, mas apenas garantido o pagamento de todas as responsabilidades que dele derivassem para o mutuário, deve concluir-se que não impende sobre o mutuante o ónus de comunicação e de informação previsto nos arts. 5.º e 6.º do DL n.º 446/85, de 25-10.
III - A validade da declaração de prestar fiança basta-se com a expressão da vontade pela forma escrita, não constituindo requisito substancial da mesma o conhecimento integral do âmbito da responsabilidade do fiador, isto sem prejuízo da determinabilidade do seu objecto.
IV - Não é nula, por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança vertida num documento nos termos do qual o fiador declarou que se constitui perante o mutuante fiador de todas e quaisquer obrigações que para o mutuário resultem do contrato de mútuo n.º X, celebrado na mesma data, e que a garantia que presta tem o conteúdo e o âmbito legal de uma fiança solidária, isto é, que responde solidariamente com o mutuário pelas obrigações decorrentes do contrato de mútuo, concretamente fixadas nele.
11-10-2007
Revista n.º 2481/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxx
Pires da Rosa
Contrato de crédito ao consumo Contrato de adesão
Cláusula contratual geral Dever de informação Cumprimento
Ónus da prova
Defesa do consumidor
I - Os contratos de crédito ao consumo são contratos de adesão, já que, a par de cláusulas específicas que exprimem a particularidade de cada negócio, contêm cláusulas pré-determinadas destinadas à massa dos consumidores e que não são passíveis de negociação individualizada, aplicando-se-lhe o regime das cláusulas contratuais gerais (CCG).
II - Neste tipo de contrato em que existe uma aceitação, não particularmente negociada pelo aderente, a lei visa a sua protecção, como parte contratualmente mais débil, assegurando de modo efectivo um “dever de informação” a cargo do proponente.
III - Essa comunicação deve abranger a totalidade das cláusulas e ser feita de modo adequado e pessoal e com antecedência compatível com a extensão e complexidade do contrato, de modo a tornar possível o seu conhecimento “completo e efectivo por quem use de comum diligência”.
IV - Nos contratos de crédito ao consumo em que intervêm, além do comprador, o financiador e o vendedor, não sendo simultâneas as assinaturas das três partes contratualmente envolvidas, sai afrontada a defesa do consumidor e o seu direito a ser informado, se o financiador, usando de CCG comete a terceiro (a entidade vendedora do bem) o dever de informação, como que numa delegação de competência que viola um seu dever pessoal, mais a mais, sendo o consumidor analfabeto (a sua assinatura no contrato foi aposta a rogo por não saber ler).
V - Não é exigível a pessoa analfabeta, que domine conceitos jurídicos como “mora”, “cláusula penal”, “rescisão do contrato” e “reserva de propriedade”, sobretudo se tais conceitos constaram das “Condições Gerais”, sendo, por isso, mais exigente o dever de informação.
VI - Quanto à ponderação de abuso do direito por parte do consumidor que invoca vícios do contrato, após o início da sua execução, o Tribunal deve actuar com particular prudência, já que, na relação de financiamento à aquisição de bens de consumo, é patente a desigualdade de meios entre o fornecedor dos bens ou serviços e o consumidor, sendo de equacionar se, ao actuar como actuou, a entidade financiadora da aquisição, prevalecendo-se de superioridade negocial em relação a quem recorreu ao crédito, não infringiu ela mesmo, em termos censuráveis, os deveres de cooperação, lealdade, e informação, em suma os princípios da boa fé.
VII - Se assim tiver acontecido não deve ser paralisado o direito do consumidor. 30-10-2007
Revista n.º 3048/07 - 6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator) *
Xxx Xxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Cláusula contratual geral
Anulação Televisão
I - O vínculo entre a produtora televisiva, ora Ré, e os concorrentes de um determinado programa de televisão não configura um negócio jurídico unilateral a que a lei atribua eficácia vinculativa, permitindo ao proponente, de acordo com o princípio da autonomia da vontade, o poder de fixar livremente o seu conteúdo.
II - Antes se trata de uma relação contratual bilateral, tendo as cláusulas a natureza de cláusulas contratuais gerais, sujeitas ao regime estabelecido pelo DL n.º 446/85, de 25- 10, não se podendo sequer considerar que tais relações contratuais se aproximam de relações entre empresários ou entidades equiparadas.
III - Não é desproporcionada a condenação a dar publicidade à proibição de utilização das cláusulas declaradas nulas, por intermédio de anúncio a publicar em 2 jornais diários de âmbito nacional e de grande circulação em 3 dias consecutivos, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão.
04-12-2007
Revista n.º 3810/07 - 1.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Poderes da Relação Impugnação da matéria de facto Contrato de seguro
Seguro de vida
Cláusula contratual geral Dever de comunicação Exclusão de responsabilidade Acidente de viação Alcoolemia
Nexo de causalidade Presunções judiciais
I - Não tendo o recurso de apelação envolvido a impugnação da decisão da matéria de facto proferida, não havendo fundamento para oficiosamente operar a sua alteração, tendo-se a Relação limitado a interpretá-la, não havia fundamento para que determinasse a renovação das provas.
II - Por não ter sido previamente comunicada ao tomador do seguro, não é oponível à pessoa segura a cláusula contratual geral integrada em contrato de seguro, segundo a qual a seguradora não garantia o pagamento das importâncias seguras caso o falecimento da pessoa segura fosse devido a acidente sobrevindo à primeira por virtude do consumo de bebidas alcoólicas.
III - Face à referida solução quanto a tal vertente de mérito, prejudicado fica o conhecimento da questão relativa à problemática quanto à interpretação da aludida cláusula no que concerne ao nexo de causalidade entre o consumo de bebidas alcoólicas pela pessoa segura e o acidente em que ela pereceu.
IV - É vedado o conhecimento no recurso de revista da ilegalidade invocada pelos recorridos eventualmente derivada de o tribunal da primeira instância haver considerado verificado o referido nexo de causalidade por via de presunção natural, por não se tratar
de situações susceptíveis de integrarem a ampliação do âmbito do recurso nem de substituição do tribunal recorrido.
10-01-2008
Revista n.º 4690/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Contrato de seguro
Condução sob o efeito do álcool Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula
Dever de comunicação
I - A cláusula incluída nas Condições Gerais de um contrato de seguro, segundo a qual não são objecto de cobertura os riscos devidos a acção de pessoa influenciada pelo álcool, encontra-se em consonância, no que toca à condução sobre o efeito do álcool, com normas prescritivas e de ordem pública definidas pelo direito positivo português.
II - A lei aplicável aos contratos de seguro que cubram riscos situados em território português não poderá envolver ofensa dos princípios fundamentais da ordem pública do Estado Português.
III - São tidos como contrários à ordem pública os contratos de seguro que garantam, designadamente, o risco de responsabilidade criminal.
IV - Por isso, embora tratando-se de uma cláusula contratual geral, a falta de comunicação ao segurado do teor dessa cláusula, ou a falta de informação sobre o seu concreto alcance e significado, não envolve a exclusão dessa cláusula, ao abrigo do art. 8.º als. a) e b), do DL n.º 446/85.
15-01-2008
Revista n.º 4318/07 - 6.ª Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator) * Xxxxx Xxxxxxx
Nuno Cameira
Contrato de mútuo Fiança
Contrato de adesão Cláusula contratual geral Dever de comunicação Nulidade
I - O dever de comunicação adequada consagrado no art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25- 10, reporta-se apenas às condições gerais do contrato, e não às particulares, onde constam os elementos essenciais do negócio, pelo que, sendo aquelas substituídas pelas normas supletivas aplicáveis, nada impõe a nulidade da fiança.
II - Com efeito, os elementos essenciais do mútuo e da fiança encontram-se integrados nas cláusulas particulares que precedem as assinaturas, no que se refere ao montante do financiamento, prazo de amortização, 1 AEG, e montante da entrada inicial e das prestações, podendo o restante do respectivo regime ser integrado por normas
supletivas, e, se necessário, com recurso às regras de integração do negócio jurídico, nos termos do art. 9.º do mesmo DL, que precisamente consagra a subsistência dos contratos singulares nos casos previstos no art. 8.º, vigorando na porte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso se necessário àquelas regras (n.º 1), apenas com duas excepções, em que estabelece a sanção da nulidade: quando, não obstante o recurso às regras supletivas afastadas pelas cláusulas contratuais gerais e aos elementos de integração dos negócios jurídicos, se apure uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais do contrato, ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé.
22-01-2008
Revista n.º 4319/07 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Respostas aos quesitos
Matéria de facto Matéria de direito Cartão de crédito Contrato de seguro
Seguro de acidentes pessoais Cláusula contratual geral Interpretação da declaração negocial Morte
Litigância de má fé
I - Não podendo o STJ, em regra, alterar a matéria de facto fixada pelas instâncias, já, porém, se contém nos seus poderes o conhecimento da questão - que de questão de direito se trata - de saber se as respostas dadas pelo julgador da matéria de facto excedem o âmbito da alegação fáctica e dão como assente matéria de facto que não foi alegada pelas partes.
II - Se as respostas aos quesitos ultrapassarem as fronteiras da factualidade alegada e quesitada, têm elas de se considerar não escritas, por força do estatuído no art. 664.º, n.º 4, do CPC, aplicável por analogia.
III - Embora a interpretação das declarações negociais constitua matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias, não está o STJ impedido de exercer censura sobre a decisão respectiva quando esta contraria o disposto nos arts. 236.º, n.º 1, e 238.º do CC, pois, neste caso não se trata de fixar apenas factos, mas de aplicar um critério normativo, uma disposição legal - ou seja, de interpretar as disposições legais com vista a fixar o seu sentido juridicamente relevante, o que constitui matéria de direito.
IV - Assiste-se, hoje em dia, a uma ligação e colaboração entre Bancos e Companhias de Seguros, dando lugar ao fenómeno designado por bancassurance, deixando a banca de estar confinada às actividades tradicionais de recolha de fundos e ao crédito ou financiamento, e interagindo com os seguros na distribuição de produtos financeiros, vendendo “produtos” de seguros através da sua rede de balcões.
V - A massificação das operações da Banca e dos Seguros levam os respectivos operadores a elaborar formulários ou impressos, contendo o clausulado que os clientes não estarão em condições de discutir, tendo apenas a alternativa de celebrar ou não o
contrato, com o conjunto padronizado ou normalizado de cláusulas que este apresenta (cláusulas contratuais gerais).
VI - A lei impõe ao proponente um conjunto de deveres, com vista à tutela do contraente que as subscreve por mera adesão: o dever de comunicação integral, prévia e adequada aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, o dever de informação e esclarecimento, e o dever de clareza e precisão, isto é, a sua redacção clara e precisa.
VII - Em matéria de interpretação das cláusulas contratuais gerais são aplicáveis, por força do disposto no art. 10.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, as normas dos arts. 236.º a 238.º do CC.
VIII - O sentido da declaração negocial do proponente é, pois, (art. 236.º, n.º 1) o que corresponda à compreensão virtual de uma figura padronizada de declaratário: um declaratário medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante.
IX - Todavia, por força do disposto na parte final do art. 10.º do DL n.º 446/85, a interpretação das cláusulas contratuais gerais deve fazer-se sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam, tendo-se, assim, em conta que as circunstâncias concretas dos contratos singulares podem conduzir a resultados interpretativos diferentes dos que resultam da análise de cláusulas abstractas, tomadas em si e por si, e possibilitando-se uma justiça material mais apurada.
X - As cláusulas ambíguas valem com o sentido que lhes daria um aderente normal, colocado na posição do aderente real (art. 11.º do DL n.º 446/85), não valendo aqui uma ressalva semelhante à da parte final do art. 236.º, n.º 1, do CC. E, em caso de dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente.
XI - A cláusula - constante de contrato de seguro de acidentes pessoais em viagem agregado a um cartão do sistema VISA, celebrado entre o banco emitente do cartão e uma seguradora - que estabelece o pagamento de uma soma em dinheiro, em caso de morte do titular do cartão em acidente sofrido em viagem, se a viagem tiver sido comprada com utilização do cartão, e uma soma (menor) se a viagem for comprada sem utilização do cartão, deve, à luz dos princípios constantes dos números anteriores, ser interpretada no sentido de incluir, na primeira modalidade, a utilização do cartão no pagamento da totalidade ou apenas de parte do preço da viagem.
XII - A condenação como litigante de má fé assenta num juízo de censura incidente sobre um comportamento inadequado à ideia de um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de Direito: não litiga de má fé a parte que não ultrapassa os limites da litigiosidade séria, aquela “que dimana da incerteza”.
29-01-2008
Revista n.º 4422/07 - 2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria
Xxxxxxx xx Xxxxx
Contrato de seguro Seguro de habitação Cláusula contratual geral Furto qualificado
Ónus da prova Inexistência jurídica
I - Não está afectada de ambiguidade ou nulidade a cláusula geral incluída em contrato de seguro multi-riscos habitação reportada ao conceito de furto qualificado densificado pela expressão “apropriação ilegítima de coisa alheia através de destruição ou rompimento de obstáculos, escalamento ou utilização de outras vias que não as destinadas a servir de entrada ao local onde ela se encontre, ou emprego de chave falsa, gazua ou instrumentos semelhantes que tenha deixado vestígios materiais inequívocos ou sido constatado por inquérito policial”.
II - O modo como devia ser revelada a entrada na casa de residência da recorrente por via de chaves falsas, gazua ou instrumento semelhante, incluindo a averiguação em inquérito policial, não integra o conceito de condição impossível.
III - No quadro da sua liberdade contratual, nos limites da lei, podem as partes incluir nos contratos de seguro de coisas as cláusulas que entenderem, independentemente de as haverem decalcado total ou parcialmente de normas constantes da globalidade do ordenamento jurídico, incluindo o penal, pelo que a mencionada sob I não está afectada de inexistência jurídica.
IV - Incumprido pela segurada o ónus de prova dos factos relativos à dinâmica da entrada de outrem na sua casa de residência para cometer o furto, nos termos da referida cláusula contratual, não pode impor à seguradora que a indemnize do dano derivado da perda de coisas objecto da subtracção fraudulenta.
07-02-2008
Revista n.º 4772/07 - 7.ª Secção Xxxxxxxx xx Xxxxx (Relator) * Xxxxxxxx xx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxx
Execução para pagamento de quantia certa Livrança em branco
Oposição à execução Contrato de mútuo
Contrato de crédito ao consumo Cláusula contratual geral Dever de comunicação
Avalista Preenchimento abusivo Relações imediatas
I - Tendo o oponente assinado o contrato de mútuo, embora exclusivamente na qualidade de avalista de uma livrança subscrita pelos mutuários e entregue à mutuante nos termos contratuais, significa isto que, no caso concreto, existe claramente entre a exequente (credora cambiária) e a oponente (avalista), uma relação causal, subjacente ao aval, por via da qual se estipulou determinado pacto de preenchimento para a livrança em branco subscrita pelos mutuários e avalizada pela oponente.
II - Quer dizer, no caso, estamos no domínio de relações imediatas, mesmo em relação à oponente avalista, pelo que lhe era lícito chamar à colação o não cumprimento do dever de comunicação das cláusulas contratuais gerais integradas no contrato de mútuo, pelo menos daquelas relacionadas com o não cumprimento e com o preenchimento da livrança avalizada.
III - Pela mesma ordem de razão, podia, no caso concreto, a oponente opor ao credor cambiário a excepção de preenchimento abusivo da livrança.
IV - Porém, como parece evidente, o que não podia a oponente era prevalecer-se das duas excepções simultaneamente, isto é, invocar a nulidade das cláusulas gerais, designadamente da cláusula 8.ª e o preenchimento abusivo da livrança.
V - Invocando a oponente a nulidade das cláusulas gerais, como invocou e sendo procedente, como é, tal arguição, fica a recorrente impossibilitada de prevalecer-se da excepção do preenchimento abusivo da livrança exequenda, também arguida.
VI - Consequentemente, mantém-se, a obrigação cambiária resultante do aval, respondendo a avalista/recorrente nos mesmos termos que a pessoa por ela afiançada (a nulidade das cláusulas gerais não gera a nulidade do aval - arts. 32.º e 77.º da LU).
04-03-2008
Revista n.º 4251/07 - 1.ª Secção Xxxxxxx Xxxxx (Relator)
Xxxxx Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
Contrato de crédito ao consumo Contrato de mútuo
Crédito bancário Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula Pagamento em prestações Vencimento
Interpelação
Juros remuneratórios
I - As cláusulas denominadas de “condições gerais” insertas no verso de contrato consideram-se excluídas do mesmo, nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 8.º do DL n.º 446/85, de 21-10, porque sendo cláusulas gerais, foram inseridas em formulários depois da assinatura de alguns dos contratantes.
II - Só é possível considerar vencidas todas as prestações posteriores à primeira prestação em dívida depois do credor interpelar o devedor para as pagar.
III - Exprimindo os juros remuneratórios o rendimento financeiro do capital mutuado, não podem ser incluídos nas prestações de capital cujo vencimento é antecipado, mas apenas nas prestações vencidas, havendo que distinguir as dívidas de capital e dos juros. 06-03-2008
Revista n.º 4617/07 - 2.x Xxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxxxxx (Relator) * Xxxxx Xxxxxxxx
Xxxxxx Xxxxxx
Silêncio
Proposta de contrato Cláusula contratual geral Dever de informação
Interpretação da declaração negocial
I - O silêncio por que opte face à proposta do segurado que vise a alteração do objecto do seguro - alteração essa consistente na inclusão de dois pavilhões nos locais de risco
contratualmente assumidos - não implica a vinculação da seguradora, nos termos do art. 218.º do CC.
II - A eficácia de semelhante modificação do objecto do contrato de seguro depende da aceitação expressa da seguradora, nos termos do art. 426.º § único, do CCom.
III - O segurado que na petição inicial não tiver alegado que determinada cláusula do seguro continha aspectos cuja aclaração se impunha à luz do princípio geral da boa fé fixado no art. 16.º do DL n.º 446/85, de 25-10, não poderá em sede de recurso valer-se da norma do art. 6.º deste diploma para obter a respectiva exclusão.
IV - Não há lugar à aplicação do art. 11.º do DL n.º 446/85, de 25-10, sobre cláusulas ambíguas, se tiver sido possível estabelecer um sentido negocial unívoco à estipulação analisada, de harmonia com a impressão do destinatário.
13-03-2008
Revista n.º 53/08 - 6.ª Secção Nuno Cameira (Relator) * Xxxxx Xxxxx
Xxxxxxx Xxxxxxx
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto
Nexo de causalidade Contrato de seguro Cláusula contratual geral
I - O juízo de causalidade numa perspectiva meramente naturalística de apuramento da relação causa-efeito, insere-se no plano puramente factual insindicável pelo STJ, nos termos e com as ressalvas dos arts. 729.º, n.º 1, e 722.º, n.º 2, do CPC.
II - Assente esse nexo naturalístico, pode o STJ verificar da existência de nexo de causalidade, o que se prende com a interpretação e aplicação do art. 563.º do CC.
III - De acordo com a doutrina da causalidade adequada, consagrada no art. 563.º do CC, o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou se apenas o tiver provocado por intercessão de circunstâncias anormais, anómalas ou imprevisíveis.
IV - O facto terá de ser, em concreto, conditio sine qua non do dano mas, também, em abstracto, causa normal e adequada da sua verificação, ainda que indirecta ou mediatamente.
V - Tendo sido clausulado no contrato de seguro várias situações de exclusão de responsabilidade referentes à carga transportada e sendo algumas perfeitamente claras - operações de carga e descarga, excesso, mau acondicionamento, estiva por forma a pôr em risco a estabilidade e controlo do veículo - a cláusula que se refere aos danos “causados por objectos transportados” deve, por ambígua, ser interpretada no sentido de danos causados apenas pela carga em si (v.g., corrosivo, inflamável), interpretação mais favorável ao segurado, de acordo com o n.º 2 do art. 11.º do DL n.º 446/85 (na redacção do DL n.º 290/95) que regula o regime das cláusulas contratuais gerais.
13-03-2008
Revista n.º 369/08 - 1.ª Secção Xxxxxxxxx Xxxxxx (Relator) * Xxxxxxx Xxxxx
Alves Velho
Embargos de executado Xxxxx em branco Avalista Preenchimento abusivo Ónus da prova
Cláusula contratual geral Dever de informação
I - Resultando dos factos assentes que as letras foram entregues à exequente em branco, só com as assinaturas de aceitante e avalistas, a fim de garantirem o pagamento das quantias que à sacadora fossem devidas pela aceitante em consequência de eventual incumprimento de dois contratos de financiamento para aquisição de dois veículos automóveis, podem os executados opor à exequente o incumprimento do acordo de preenchimento que tenham subscrito, desde que se encontrem no âmbito das relações imediatas, ou seja, enquanto o título não é detido por alguém estranho às relações extracartulares.
II - Esta excepção, dita de preenchimento abusivo, como excepção de direito material que é, deve ser articulada e provada pelos executados, face ao disposto no art. 342.º, n.º 2, do CC, o que implica serem os próprios executados os onerados com a prova dos termos do pacto.
III - As cláusulas contratuais gerais, à luz do disposto no art. 5.º do DL n.º 446/85, de 25-10, só têm de ser comunicadas, na íntegra, e explicadas quando se justifique a sua aclaração, à própria parte aderente, não tendo de o ser aos seus garantes.
IV - Sendo o dador de aval responsável da mesma forma que a pessoa por ele afiançada, daí resulta que os avalistas tenham de ver, em princípio, a sua responsabilidade manter- se equivalente à da primeira executada, sem que lhes possa já ser reconhecida razão, tanto mais que, não nos encontrando, aqui, perante uma situação de fiança, não lhes pode ser aplicado o disposto no art. 637.º do CC.
17-04-2008
Revista n.º 727/08 - 6.ª Secção Xxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxxx Xxxxx Xxxxx
Acção inibitória Banco
Cartão de crédito Cláusula contratual geral Assinatura
Legibilidade de documento Dever de informação Nulidade do contrato
Inutilidade superveniente da lide
I - Não chega que a leitura e a compreensão das cláusulas contratuais gerais sejam possíveis, já que o art. 9.º, n.º 2, al. a), da LDC, exige que a redacção seja clara e precisa e que os caracteres sejam facilmente legíveis, o que manifestamente não acontece com as propostas questionadas.
II - A inclusão de cláusulas contratuais gerais depois da assinatura do aderente ao contrato é também proibida por lei, que as considera excluídas dos contratos singulares efectivamente celebrados (art. 8.º, al. d), da LCCG), independentemente de se incluir, antes da assinatura, uma outra cláusula, onde se fez constar que há cláusulas inseridas após a assinatura e que o aderente delas tomou conhecimento.
III - Também a entrega ao consumidor de uma cópia do contrato é imposta por lei (art. 6.º do DL n.º 359/91, de 21-09, tendo o seu incumprimento como consequência a nulidade do contrato (art. 7.º do mesmo diploma).
IV - O art. 10.º da LDC (Lei n.º 24/96) apresenta uma maior abertura do que o art. 25.º da LCCG quanto ao objecto das acções inibitórias, admitindo-as para fazer cessar práticas lesivas dos direitos do consumidor, designadamente práticas comerciais expressamente proibidas por lei (al. c) do n.º 1 do citado preceito), como são todas as situações configuradas pela A. e dadas como provadas.
V - O facto de os Bancos X e Y terem sido incorporados noutro Banco que não comercializa os cartões de crédito a que se reportam as propostas de adesão questionadas, não acarreta a inutilidade superveniente da lide, na medida cm que se trata de acção preventiva, destinada a prevenir para o futuro práticas comerciais abusivas, que sempre poderiam ser reatadas pela entidade bancária que os absorveu.
29-04-2008
Revista n.º 4031/07 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator) Fonseca Ramos
Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx
Contrato de mútuo Cláusula contratual geral Contrato de adesão Requisitos
Dever de informação Fiança Subsidiariedade
I - Para que se considere a existência de um contrato de adesão não é bastante a existência de algumas cláusulas pré-ordenadas pelo oferente; importa que o núcleo essencial modelador do regime jurídico assumido constitua um bloco que se aceita ou repudia, sem qualquer possibilidade de negociação, e que o teor das cláusulas careçam de adequada informação para que o aderente saiba e pondere se é conforme aos seus interesses subscrever o texto impresso que lhe é proposto.
II - O dever de informação previsto no diploma que regula as cláusulas contratuais gerais (ccg) dever ser exercido de acordo com as circunstâncias do contrato, mormente o seu conteúdo, importando ponderar que o aderente, pelo simples facto de o ser, não pode prevalecer-se de qualquer omissão do dever de informação cometido ao proponente.
III - Tal dever de informar pauta-se pelo tipo contratual em causa e pelas circunstâncias da contratação.
IV - Contenderia com as regras da boa-fé exigíveis aos contraentes, mesmo no âmbito de contratos de adesão, se o aderente pudesse, sem mais, invocar o dever de informação, por mais claro que fosse o clausulado contratual e o ambiente em que negociou.
V - No caso de um empréstimo concedido por um Banco, não constando do contrato cláusulas envolvendo um exigente conhecimento de conceitos técnico-jurídicos, ou uma complexa teia de direitos e deveres recíprocos a demandar exigente esforço interpretativo, o dever de informar não pode ser erigido em dogma para que, invocada a sua violação, o aderente se desvincule das obrigações assumidas. Para que se aplique o regime das CCG. o contratante que invoca violação do dever de informação tem o ónus de provar que se está perante um contrato de adesão.
VII - Se quem invoca a existência de contrato de adesão interveio nas negociações com o alegado proponente e pôde discutir e contribuir para moldar o conteúdo contratual, em defesa dos seus interesses, não provou, como lhe competia, que tal contrato possa qualificar-se como de adesão.
VIII - Sendo a fiança dada, sem que por parte dos fiadores houvesse expressa renúncia ao benefício da excussão, ela resulta, tacitamente, do facto de terem assumido a condição de principais pagadores, pelo que não podem recusar o pagamento exigido pelo credor invocando a subsidiariedade da garantia.
13-05-2008
Revista n.º 1287/08 - 6.x Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Cartão de crédito Cartão de débito Banco
Conta bancária Conta conjunta Conta solidária
Cláusula contratual geral Cláusula contratual Comunicação
Nulidade Assinatura Letra
Exclusão de cláusula Exclusão de responsabilidade Ónus da prova
Inversão do ónus da prova Meios de prova
Presunção
Compensação de créditos Reconhecimento da dívida
I - O banco X utiliza no clausulado dos cartões (de crédito e de débito) uma letra de dimensão reduzida, com um espaço entre as linhas também muito reduzido, formando um texto muito compacto que torna a sua leitura difícil e cansativa mesmo para quem possua uma visão média, dificultando, consequentemente, a compreensão e apreensão do sentido do texto; daí que tal clausulado tenha de ser excluído dos contratos singulares, devendo o banco X abster-se da sua utilização em futuros contratos - arts. 8.º
e 9.º, n.º 2, al. a), e n.º 3, da Lei n.º 24/96, de 31-07, e art. 8.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10.
II - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco Y, a assinatura do aderente localiza-se antes das cláusulas contratuais gerais que se encontram apostas em folha imediatamente a seguir; porém, consta dos mesmos contratos em local situado antes da assinatura do aderente, uma declaração em que o aderente afirma ter tomado conhecimento e aceitar as condições de utilização do cartão. III - A exigência legal de a assinatura se localizar após as cláusulas para que estas sejam relevantes sobrepõe-se ao conhecimento manifestado pelo aderente; daí que tais cláusulas, por localizadas após, para além, a seguir à assinatura do aderente, em violação do art. 8.º, al. d), do DL 446/85, sejam inválidas e excluídas dos contratos, devendo o réu banco Y abster-se da sua futura utilização.
IV - Do clausulado dos cartões do banco Y resulta que o banco se exclui de qualquer responsabilidade que possa resultar das operações realizadas, com os cartões, entre o aderente, titular do cartão, e terceiros; ora, dispondo-se no art. 18.º, al. c), do DL n.º 446/85, que são proibidas as cláusulas que excluam ou limitem de modo directo ou indirecto a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave, e determinando-se no art. 21.º, al. d), do mesmo DL que são proibidas as cláusulas que excluam os deveres que recaiam sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação, ou estabeleçam nesse âmbito reparações ou indemnizações pecuniárias pré-determinadas, tem de se concluir pela sua proibição e consequente nulidade - art. 12.º do DL n.º 446/85.
V - Naquele clausulado estabelece-se uma confissão de dívida do titular do cartão; tal responsabilidade está, porém, excluída, nos casos de as ocorrências serem devidas a culpa ou negligência do banco e nos casos de uso abusivo ou fraudulento do cartão ocorridos após comunicação ao banco e nos casos de uso indevido ou fraudulento ocorridos antes dessa comunicação no que ultrapassar o limite estabelecido na cláusula 22.ª; assim, a distribuição de responsabilidade entre o banco e o titular do cartão obedece aos princípios da boa fé, não ocorrendo violação do disposto no art. 21.º, als. f) e g), do DL n.º 446/85.
VI - Quanto à 2.ª parte da cláusula 17.ª, cria-se ali um meio de prova bastante - os registos informáticos -, atribuindo-se-lhe uma força probatória em contrário do que resultaria da utilização de meios legais de prova, admissíveis em direito, excluindo-o do âmbito do princípio geral de livre apreciação dos meios de prova; quanto a esta parte da cláusula ocorre nulidade por violação do disposto no art. 21.º, al. g), do DL n.º 446/85. VII - Na cláusula 23.ª estabelece-se, para os casos de violação (com culpa grosseira ou dolo) daquelas obrigações de cuidado pelo titular do cartão, a exclusão dos benefícios que, para esse titular do cartão, resultariam de cláusulas que tenham por finalidade evitar ou reduzir os danos; esta cláusula não atribui ao banco a faculdade ou o direito de interpretar a conduta do titular do cartão, por isso tem-se esta cláusula por válida.
VIII - Na cláusula 34.ª estabelece-se que, havendo divergência entre os valores conferidos por dois empregados do banco, quando procederem à abertura dos envelopes, e os valores digitados pelo depositante, a prova do valor real e efectivo do depósito cabe ao depositante; não havendo qualquer inversão do ónus da prova, não ocorre violação do art. 21.º, al. g), do DL n.º 446/85.
IX - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco Z, autorizando-se o banco a proceder a compensação, debitando qualquer conta do titular do cartão pelas quantias não pagas, permite-se que o banco também debite e proceda a essa compensação com contas de que o titular do cartão não é o único titular da conta, com contas conjuntas ou solidárias; daí que, com tal autorização, o banco está a impor
ao titular do cartão a aceitação de débitos e compensação com créditos de terceiro, com créditos de quem não é titular do cartão, o que não pode aceitar-se, sendo tal cláusula proibida.
X - Nos contratos de adesão relativos aos cartões (de crédito e de débito) do banco X, estabelece-se, na cláusula 9.ª, para além da obrigação de pagamento, pelo aderente ao banco, de uma quantia por ano, a possibilidade de alteração unilateral pelo banco, mediante prévia comunicação ao titular do cartão; nela não se indica o seu montante, nem o critério para a sua actualização, nem o prazo para que a comunicação de alteração possa produzir efeitos, nem ainda quais os meios de que dispõe o titular do cartão para reagir, aceitando ou resolvendo o contrato.
XI - Na cláusula 29.ª, por sua vez, estabelece-se também a possibilidade de alteração unilateral do limite de crédito concedido ao titular do cartão; aqui também não se indica qualquer critério nem se aponta qualquer fundamento para essa alteração, nem qual o prazo a partir do qual a alteração desse limite produzirá efeitos; tais cláusulas - 9.ª e 29.ª
- são nulas por violação do disposto no art. 22.º, al. c), do DL n.º 446/85.
XII - Na cláusula 12.ª estabelece-se uma presunção - presunção de uso do cartão, presunção de que foi utilizado pelo titular quando for correcta a digitação do PIN e presunção de que o uso foi consentido ou facilitado culposamente pelo titular quando for utilizado por terceiro; estas presunções encontram-se em consonância com as regras que estabelecem a distribuição do ónus da prova; esta cláusula é, portanto, válida.
XIII - De várias cláusulas resulta a atribuição ao banco do poder de cobrar, debitando na conta-cartão, as quantias por despesas, encargos, taxas de juro e sobretaxas resultantes da celebração do contrato ou de utilização do cartão; em tais cláusulas não se indicam os seus montantes nem os critérios para a sua determinação; ora, não é permitido que o predisponente imponha ao aderente obrigações que não conhece integralmente e que, por isso, não pode ponderar antes de aderir ao contrato - arts. 5.º e 8.º, al. a), do DL n.º 446/85.
XIV - A cláusula 22.ª mantém a responsabilidade do titular do cartão findo o contrato e até à efectiva devolução do cartão; esta cláusula é nula por violação do disposto no art. 21.º, xx. x), xx XX x.x 000/00 - (xxxxxxxxx de alteração das regras de distribuição do risco).
XV - É válida a cláusula 23.ª que permite ao banco alterar unilateralmente as condições gerais de utilização, produzindo efeito se o aderente titular do cartão não resolver o contrato no prazo de 15 dias a contar da informação dessa alteração.
XVI - A cláusula 26.ª estabelece a irresponsabilidade do banco nos casos de não aceitação do cartão, pelo deficiente atendimento ou má qualidade dos bens ou serviços obtidos com a utilização do cartão pelo seu titular; esta cláusula é nula por violação do disposto nos arts. 18.º, al. c), e 21.º, al. g), do DL n.º 446/85.
XVII - Na cláusula 30.ª estabelece-se a presunção de que o titular do cartão recebeu, na morada indicada, o extracto e impõe-se ao titular do cartão o reconhecimento da dívida se não houver reclamação no prazo de 15 dias; esta cláusula é nula por violação do disposto no art. 19.º, al. d), do DL n.º 446/85.
XVIII - Na cláusula 45.ª estabelece-se a obrigação do titular do cartão de utilizar sempre o MBNet nas operações em ambientes abertos e determinou-se ainda que, em caso de incumprimento desta obrigação pelo titular do cartão, o banco pode inviabilizar a operação, não sendo de imputar ao banco qualquer responsabilidade por eventuais prejuízos, quer o banco inviabilize ou não inviabilize essa operação realizada sem utilização de MBNet; esta cláusula é válida.
15-05-2008
Revista n.º 357/08 - 7.ª Secção
Xxxx Xxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxxxxx
Maria dos Prazeres Beleza
Contrato de seguro Seguro de vida
Cláusula contratual geral Dever de informação Declaração inexacta Ónus da prova Anulabilidade
I - Embora o preenchimento do boletim de adesão ao seguro de vida, na modalidade de seguro de vida em grupo, tenha sido feita por uma funcionária do Banco, foi-o de harmonia com as declarações prestadas pelo cônjuge do falecido e que depois foi levado a assinar pelo mesmo, não tendo ficado a constar que uns escassos dias antes, o mesmo fora submetido a uma operação cirúrgica de extracção de um quisto na região inguinal na sequência de queixas que já remontavam a três meses antes, estando ainda na altura a aguardar-se pelo resultado da análise anátomo-patológica.
II - Perguntando-se no questionário se "o segurado sofre de alguma enfermidade diagnosticada ou segue algum tratamento médico" e se "o segurado nos últimos dez anos sofreu algum acidente ou foi submetido a alguma intervenção cirúrgica", apesar de não terem sido prestados esclarecimentos no momento do preenchimento do boletim, perante questões tão taxativas e claras quanto a dados de saúde do segurado, qualquer pessoa medianamente diligente e sagaz mesmo sem esclarecimentos adicionais da entidade bancária envolvida na preparação do contrato e como tal, dada a natureza deste, vinculada ao dever de informação nos termos previstos no diploma regulador das cláusulas contratuais gerais, facilmente depreenderia o alcance das mesmas. Ou seja, o falecido que subscreveu a apontado boletim com tais indicações não podia deixar de saber que tais informações não correspondiam à verdade.
III - Deste modo, cremos ter a seguradora recorrida feito prova de terem sido prestadas declarações inexactas e inverídicas no boletim que o segurado subscreveu e assumiu sobre o seu estado de saúde omitindo a intervenção cirúrgica a que fora submetido escassos dias antes, o que implicaria, como decidido pelas instâncias, a invalidade do contrato, por influir na existência e nas condições do próprio seguro, envolvendo esse procedimento lesão aos princípios da boa fé contratual que vincula ambas as partes.
20-05-2008
Revista n.º 1174/08 - 6.ª Secção Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx (Relator) Xxxxxxx Xxxxx
Xxxxx Xxxxxxx
Matéria de facto Sociedade comercial Representação Princípio dispositivo Respostas aos quesitos
Contrato de instalação de lojista
Contrato atípico Contrato de adesão Dever de comunicação Cláusula contratual Culpa in contrahendo Nulidade
Resolução do negócio Obrigação de indemnizar Interesse contratual positivo
I - Ter a Relação considerado na fundamentação que o Eng. M. representava a Ré é uma questão de convicção probatória, em face da reapreciação da prova gravada, não sendo de todo essencial que a qualidade de representante da Ré tivesse de ser feita documentalmente.
II - Não pode manter-se a resposta a quesito em que a Relação substituiu a palavra “prometido”, que constava na respectiva formulação, pela palavra “garantido”, porque não é lícito ao Tribunal responder além do que é indagado, sob pena de violar o princípio do dispositivo e incorrer em nulidade.
III - O contrato celebrado pelas partes e apelidado de Contrato-Promessa de Utilização de Espaço é um contrato atípico, com manifesta afinidade com os usualmente celebrados por lojistas que integram os seus estabelecimentos comerciais em centros comerciais, sendo estes unidades de dimensão maior que os habituais mercados, com uma gestão planificada coenvolvendo a prestação de serviços mediante uma retribuição, que, por não expressar apenas o valor locativo da área ocupada, não se pode considerar um contrato de arrendamento.
IV - Para que se considere a existência de um contrato de adesão não é bastante a existência de algumas cláusulas pré-ordenadas pelo oferente; importa que o núcleo essencial modelador do regime jurídico assumido constitua um bloco que se aceita ou repudia, sem qualquer possibilidade de negociação, e que o teor das cláusulas careçam de adequada informação para que o aderente saiba, e pondere se é conforme aos seus interesses subscrever o texto impresso que lhe é proposto.
V - Ora, a Autora, inclusivamente, procedeu a estudos com vista a aquilatar da viabilidade económica do negócio, sinal evidente que estava na posse de informação que recolheu, e que lhe permitiu acautelar os seus interesses em pé de igualdade com a Ré, pelo que não se pode considerar que o contrato, pese embora ter sido apresentado em modelo pré-impresso, é um contrato de adesão.
VI - Apesar de a Ré ter apresentado a sua proposta com base numa minuta que poderia servir e serviu de base aos contratos celebrados, o que releva é que o pretenso aderente, “in casu”, a Autora teve liberdade para discutir os termos da sua vinculação, daí que não se possa considerar que as cláusulas são nulas por violação do dever de informação. VII - A responsabilidade contratual pressupõe que a parte que rompe as negociações traia as expectativas que legitimamente incutiu na parte com quem negociava, de modo a que frustração do negócio exprima uma indesculpável violação da ética negocial, mormente da protecção da confiança e da prevenção do insucesso.
VIII - Provado que a Ré, nos preliminares do negócio assumiu compromissos que não poderia cumprir - eliminar mercados abastecedores num perímetro de 50 km - e, pese embora terem mediado dois anos de vigência de contrato com a Autora, não implementou medidas que seriam idóneas a satisfazer as legítimas expectativas da Autora, brandir agora com a violação das regras comunitárias da concorrência - arts. 85.º e 86.º do Tratado da Comunidade Europeia - e arts. 99.º, 20.º, 8.º, 3.º e 204.º da
Constituição da República - é assumir que nos preliminares e na execução do contrato a Ré violou as regras da boa-fé.
IX - A Cláusula do contrato onde se estabelece que “O incumprimento, por qualquer das partes outorgantes, das obrigações que para elas resultam deste Contrato de Utilização, não estando o mesmo sanado no prazo de 30 dias após a sua verificação e respectiva notificação, confere à parte não faltosa, direito de resolução dos mesmos, sem que haja lugar a qualquer indemnização ou compensação de qualquer natureza”, é nula, não impedindo a Autora de, resolvendo o contrato, pedir indemnização pelos prejuízos.
X - A obrigação de indemnizar em consequência da resolução do contrato compreende os danos emergentes e os lucros cessantes - arts. 562.º e 566.º do CC - que tenham com o facto violador do contrato um nexo de causalidade, o qual não existe entre o investimento em equipamentos, de que a Autora, como dona disporá no futuro, e a violação do contrato.
XI - A resolução do contrato, in casu, implica indemnização do interesse contratual negativo e não do interesse contratual positivo, pelo que em consequência da resolução a Autora deve ser indemnizada pelo dano “in contrahendo” - interesse contratual negativo - buscando-se a situação que teria se o contrato não tivesse, sequer, sido celebrado.
20-05-2008
Revista n.º 1253/08 - 6.x Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx (Relator) Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxx
Contrato de crédito ao consumo Juros remuneratórios
Cláusula contratual geral Exclusão de cláusula
I - Uma vez exigido o pagamento imediato das prestações em dívida, não são devidos os juros remuneratórios, correspondentes à disponibilidade do capital mutuado por determinado tempo, que não chegou a decorrer.
II - A exigência do pagamento desses juros remuneratórios viola os princípios gerais da boa fé, do equilíbrio das prestações e da proporcionalidade, sendo nulas quaisquer cláusulas que consagrem tal direito do credor.
III - A inserção de tais cláusulas na minuta do contrato, após a assinatura do mutuário, é proibida por lei, podendo tal proibição ser objecto de acção inibitória (art. 10.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 24/96, de 31-07).
IV - O conhecimento oficioso da nulidade em causa tem como limite a decisão recorrida, uma vez que o recorrente não pode sair prejudicado do recurso só por si interposto (proibição da reformatio in pejus), princípio que, apesar de não expressamente consagrado na nossa lei processual civil, a doutrina retira do art. 684.º do CPC.
17-06-2008
Revista n.º 1589/08 - 6.ª Secção Xxxxxxx Xxxxxxx (Relator)
Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx