Contract
1 | Análise dos contratos de programa
A aprovação do novo marco do saneamento muda o foco das discussões no setor. Hora de vol- tar a atenção aos contratos de programa. Con- tratos de Programa são os contratos firmados en- tre os municípios (titulares do serviço de água e saneamento) e as Companhias Estaduais de Sane- amento Básico (CESBs). Uma das características destes contratos é que eles são celebrados sem licitação. Diante deste cenário, o FGV CERI se fez um questionamento: do que falamos quando tra- tamos destes contratos? Destacamos aqui dois pontos: a falta de transparência e de metas bem definidas.
Constatou-se a dificuldade de acesso a estes con- tratos de prestação de serviço público entre dois entes da federação. Eles não estão disponíveis na maioria dos endereços eletrônicos, quer das CESBs, quer das agências que as regulam12. Vale ressaltar que existem casos de prestação do ser- viço por CESBs em municípios sem que haja o com- promisso firmado via contrato. Segundo informa o SNIS (2018), 26% dos municípios atendidos por CESBs encontram-se em situação irregular quanto ao abastecimento de água, sendo que em 21% a delegação está vencida e em 5% deles não há instrumento de delegação formalizado.
Figura 1. Percentual de municípios atendidos com abastecimento de água em situação irregular. Fonte: SNIS (2018).
Dada a falta de transparência, o FGV CERI deci- diu por começar a análise pela amostra de con-
1 Destaca-se como exemplos positivos, em que há a disponibilização dos contratos, os sites da SABESP, CAESB e ARSAE-MG.
2 Na tentativa de acesso a esses contratos, recebemos as mais diver- sas respostas. Um município, por exemplo, falou que o contrato de- veria ser solicitado para a CESB responsável. Em outro caso, uma
tratos firmados entre os municípios da região Su- deste e suas respectivas CESBs. Essa decisão foi
agência reguladora disse que o pedido de acesso a informação não era suficientemente específico e que a solicitação deveria ser feita diretamente a cada um dos municípios.
tomada pela disponibilidade de contratos e re- presentatividade da população atendida pelos serviços – 47% população com acesso ao serviço.
Realizou-se, portanto, o levantamento dos contra- tos de prestação de serviços de água e esgoto nos municípios atendidos pelas seguintes compa- nhias: Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE)3, Companhia Espírito San- tense de Saneamento (CESAN)4, Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA)5 e Com- panhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP)6.
Os contratos analisados são aqueles que foram disponibilizados e considerados vigentes, isto é, que estão dentro do prazo contratual (sendo ele inicial ou com prorrogação expressa ou tácita7). Isto porque, em alguns casos, há contratos que fo- ram assinados antes da década de 80 com prazo de 30 anos, mas que apresentam cláusula de prorrogação automática.
A Tabela 1 sintetiza o universo de municípios aten- didos por estas CESBs e a amostra de municípios cujos contratos foram acessados e analisados.
Tabela 1. Síntese dos contratos analisados
Número de municípios atendidos¹ | Número de municípios com contrato(s) acessados | Número de contratos ana- lisados* | |
CESAN – ES | 52 | 39 | 40 |
COPASA – MG | 581 | 555 | 618 |
CEDAE - RJ | 64 | 60 | 60 |
SABESP - SP | 000 | 000 | 000 |
Total | 1.066 | 1.020 | 1.081 |
*um município pode ter dois contratos (um de água e um de esgoto)
¹ SNIS, 2018
A relação entre o universo de municípios atendi- dos pelas CESBs e a amostra de municípios cujos contratos foram acessados pode ser vista na fi-
3 Contratos obtidos através de parceria com o Ministério da Econo- mia e BNDES.
4 Contratos obtidos via solicitação à agência reguladora.
5 Contratos obtidos através do endereço eletrônico da agência re- guladora.
gura 2. Pode-se notar que os contratos analisa- dos da SABESP e da COPASA têm maior repre- sentatividade no que se refere ao total de contra- tos firmados por essas companhias.
6 Contratos obtidos através do endereço eletrônico da própria com- panhia.
7 Nesta análise, foi considerado vigente quando era o contrato mais recente firmado entre o município e a CESB.
Figura 2. Representatividade dos municípios cujos contratos se obteve acesso
120%
100%
96%
94%
98%
80%
75%
60%
40%
20%
0%
ES
MG
RJ
SP
Também cabe destacar a diferença existente en- tre a amostra de municípios cujos contratos foram acessados e amostra de contratos analisados (Ta- bela 1). Esta diferença decorre do fato de alguns municípios possuírem contratos diversos para
prestação de água e para prestação de esgoto. Isto porque a delegação da prestação de tais serviços pode ter ocorrido em momentos distintos. A figura 3 apresenta a distribuição dos contratos conforme a data de assinatura.
48%
35%
93%
73%
Figura 3. Evolução da assinatura dos contratos de programa por CESBs
S A B E S P
C E S A N
00-00 00-00 00-00 00-00
C E D A E
00-09
C OP A S A
10-19
5%
2%
9%
3%
3%
0%
3%
Observa-se que a COPASA tem uma distribuição mais homogênea de seus contratos ao longo dos anos. Alguns dos seus contratos foram firmados na década de 60. Tanto a CEDAE quanto a SABESP apresentaram um salto na assinatura de contratos entre 2000 e 2009, enquanto a CESAN firmou
3%
2%
0%
22%
0,5%
21%
11%
29%
21%
18%
quase a integralidade dos seus contratos vigentes, e acessados, na última década.
Com relação às metas, ressalta-se a observância legal da obrigação de seu estabelecimento em todos os contratos (de concessões e de parceria), por força do disposto no artigo 11, da Lei
11.445/2007 (“Lei do Saneamento”). A existên- cia de metas contratuais é uma das condições de validade dos contratos que tenham por objeto a prestação de serviços públicos de saneamento básico. Desta forma, o FGV CERI realizou análise preliminar da existência de metas nos contratos acessados e adotou o entendimento de que um bom contrato de prestação de serviço define de forma clara seus objetivos através de indicadores e metas. Conforme melhor bibliografia, metas bem definidas são aquelas consideradas SMART, ou seja, específicas (S); mensuráveis (M); atingíveis (A); realistas (R) e com prazo definido (T).
Porém, considerando a necessidade de avaliação da capacidade de investimento das companhias, caso a caso, e a não disponibilidade de informa- ções a este respeito, foram desconsiderados dois critérios do método SMART: alcance e consecução das metas (metas atingíveis) e sua objetividade e racionalidade (metas realistas).
8Quando o contrato menciona que as metas estavam em algum anexo ou plano de saneamento, buscou-se no endereço eletrônico da companhia e da reguladora o respectivo documento. Caso não
Nesta análise preliminar, as metas presentes nos contratos são consideradas bem definidas se:
• Atendem aos critérios de especificidade e mensurabilidade, sendo acompanhadas de pelo menos um desses indicadores: cobertura dos serviços de abastecimento de água e es- goto, redução de perdas na distribuição e ampliação do tratamento de esgoto.
• Têm prazos definidos para seu cumprimento8.
Ademais, este trabalho se limitou à análise de contratos como um dos instrumentos para promo- ção de incentivos à prestação de serviços (obser- vando-se, assim, o dever legal da regulação de garantir o cumprimento das condições e metas es- tabelecidas nos contratos), ainda que se reco- nheça também o papel regulador de editar nor- mas que abrangem metas progressivas de expan- são e de qualidade dos serviços.
encontrado, considerou-se que tais metas não estariam bem defini- das.
Panorama
Figura 4. Caracterização das metas definidas nos contratos firmados entre CESBs e municípios na Região Sudeste
20 | 77,67 | 98,33 1,67 | 16,53 | |||||
83,47 | ||||||||
80 | ||||||||
22,33 | ||||||||
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
ES
MG
RJ
SP
Metas bem definidas? Sim Não
A SABESP e CESAN estão entre as empresas com maior proporção de contratos com metas bem de- finidas – aproximadamente 80%, dentre os ana- lisados. Uma hipótese para tanto é que os contra- tos dessas companhias são em média mais recen- tes. Na SABESP, 83% dos contratos foram firma- dos a partir de 2007, ano de promulgação da Lei do Saneamento. Verificou-se ainda que, todos os contratos assinados a partir do marco legal con- têm metas bem definidas. No caso da CESAN, 93% dos contratos acessados foram assinados a partir de 2010, sendo mais da metade firmados nos dois últimos anos – demostrando assim esforço para regularização da prestação dos serviços du- rante discussão da reforma do saneamento.
Por outro lado, a CEDAE aparece em pior posi- ção, não apresentando metas bem definidas na quase totalidade dos contratos analisados, ainda que 73% destes tenham sido firmados após o ano de 2007 . Isto evidencia o não atendimento da companhia ao dispositivo legal. Vale pontuar que,
em geral, os contratos da CEDAE possuem anexo com plano de metas, porém estas não se enqua- dram na definição utilizada nesta análise.
No caso da COPASA, mais de 60% dos contratos acessados são anteriores à Lei do Saneamento, o que pode explicar, em parte, a ausência de metas bem definidas. Em geral, os contratos firmados a partir de 2007 apresentam metas bem definidas (87%).
Em média, na região Sudeste, 55% dos contratos acessados carecem de metas bem definidas, con- forme definido nesta avaliação.
A análise preliminar do FGV CERI evidencia a di- ficuldade de acesso público aos contratos de pro- grama e a precariedade destes contratos, uma vez que todos deveriam conter, desde 2007, me- tas bem definidas, dificultando, assim, sobrema- neira o enforcement necessário para o monitora- mento da prestação do serviço de saneamento - sem clareza não há como verificar o cumprimento.
6 | Análise dos contratos de programa
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