VIA VESTING AGREEMENT
A CAPITALIZAÇÃO DAS STARTUPS NO VALE DA MORTE
VIA VESTING AGREEMENT
The capitalization of startups in Death Valley through Vesting Agreement
Xxxxx Xxxxxxx Xxxx Xxxxxxxxxxx 1
Xxxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx 2
ÁREA: Direito Comercial. Startups. Contrato de Vesting Agreement.
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo abordar a utilização do contrato de Vesting (Vesting Agreement) para a capitalização de startups no chamado “Vale da Morte” - momento inicial e definitivo para que a em- presa prospere no mercado.
PALAVRAS-CHAVE: Startups – Capitalização – Vale da Morte – Investi- mento em Startup – Financiamento de Startup – Vesting Agreement
ABSTRACT: This article aims to address the use of the Vesting Agreement for the capitalization of startups in the so-called “Death Valley” - initial and definitive moment for the company to prosper in the market.
KEYWORDS: Startups – Capitalization – Death Valley – Startup Invest- ment – Startup Financing – Vesting Agreement
1 Doutora em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Mestre em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Profes- sora da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professo- ra convidada do Instituto de Empresa de Madrid, Espanha e da Universidad de Castilla La Mancha (Albacete, Espanha). xxxxxxx@xxxxxxxxxxx.xxx.xx
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Ciclo de Vida. 3. Financiamento no “Vale da Morte”. 4. Vesting Agreement. 5. Conclusão. 6. Referências.
1.INTRODUÇÃO
As startups surgiram para revolucionar o sistema empresarial tradicional. Buscam a inovação em diversos ramos de atuação, desenvolvendo um modelo de negócio escalável e de alto potencial econômico3, também marcado por sua rapidez e agilidade.
De acordo com XXXXXXXXX E CÂMARA (2018), as startups são empresas em fase inicial que possuem um modelo de negócio inovador, escalável e repetível, com foco em soluções tecnológicas4.
Impulsionado pelo ambiente tecnológico e pelas facilidades promovidas pela Internet, o empreendedorismo através das startups já ganhou notoriedade no mercado. Sua dinâmica é muito peculiar e está intimamente associada à pro- moção de ideias e a sua aplicação em verdadeira forma de tentativa e erro – e assim as criações surgem e desaparecem com toda a agilidade característica dessas empresas.
Por isso, é dito que uma startup compreende uma “instituição humana proje- tada para criar um novo produto ou serviço sob condições de extrema incerteza”5.
Ocorre que, a fim de viabilizar os testes e o funcionamento propriamente dito da empresa, é necessário estruturá-la e capitalizá-la.
2.CICLO DE VIDA
É comum que a criação de uma startup promissora esteja vinculada aos passos mais elementares intrínsecos ao seu desenvolvimento. Tais passos são intimamente relacionados às diferentes formas de capitalização, de modo que sejam adequadas para cada fase de maturação das empresas.
3 INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. Governança Corporativa para
Startups & Scale-ups. São Paulo: IBGC, 2019. P. 7
4 XXXXXXXXX, F. M.; XXXXXX, D. T. Startups: Da ideia ao lançamento. São Paulo: Novatec, 2018.
5 XXXX, Xxxx. The Lean Startup: How today’s entrepreneurs use continuous innovation to creat radically successful business. S.l: Crown Business, 2011.
Segundo Xxxxxxx e Marchiori (2019), o ciclo de vida das startups é compos- to por quatro etapas: ideação, validação, crescimento e maturidade, sendo que cada uma delas apresenta desafios específicos6.
A concepção da startup se mostra como o primeiro passo de todo o seu de- senvolvimento, momento em que a oportunidade é identificada e se desenvolve a solução apresentada para a necessidade que os idealizadores visam suprir através da nova organização.
Em seguida, a sua viabilidade continua sendo estudada na fase de gestação, agora através da elaboração de estudos e protótipos, por exemplo. Costuma ser neste momento que os próximos passos são traçados e quando os maiores in- vestimentos são captados.
A prova do funcionamento da startup ocorre após seu nascimento, seguido ou não de sua validação. É quando se verifica a demanda do mercado em relação ao produto oferecido, após seu lançamento.
Finalmente, o decorrer do processo leva ao crescimento ou término da em- presa, averiguando-se o potencial de crescimento da atividade a que se destina.
3.FINANCIAMENTO NO “VALE DA MORTE”
A forma de capitalização ou funding das startups dependerá de seu modelo de negócio e de sua fase de desenvolvimento. Até que o seu potencial seja de- monstrado e o modelo de negócio validado pelo mercado (após o seu efetivo nascimento) as startups são consideradas no “Vale da Morte”. Isso porque as empresas ainda estão em uma fase de desenvolvimento e aprovação, contando com pouca ou nenhuma receita.
Ou seja, sem que ainda ocorra a aferição de lucro, todas as medidas tomadas pelo empreendedor nesse estágio costumam implicar na utilização do dinheiro em caixa. Nessa fase, o financiamento costuma ser do menor valor necessário para a entrada desta empresa no mercado, que se dá pelo desenvolvimento dos produtos e da equipe inicial, bem como a captação dos primeiros clientes da empresa, quando popularmente ainda se diz estar “no negativo”.
A situação é revertida com as primeiras vendas, aumento da escala de atua- ção e a expansão da estrutura da empresa através de lucros iniciais e receitas crescentes.
6 XXXXXXX, X. X. X.; XXXXXXXXX, M. L. Empreendedorismo e startups: Desenvolvimento de negócios inovadores. São Paulo: Saraiva, 2019.
De acordo com XXXXXXXXXXX, acadêmico de gestão de negócios da Harvard Business School:
“Quando as empresas investem em inovações disruptivas, elas enfrentam um desafio importante: os produtos e tecno- logias não podem ser desenvolvidos de uma só vez. Eles são construídos ao longo do tempo, em um processo iterativo e interativo. Para serem bem-sucedidas, as empresas preci- sam atravessar o que eu chamo de “vale da morte”. Esse vale é a lacuna que existe entre a criação de um produto e sua entrada no mercado.”7
Dadas as características mencionadas, a aplicação de valores pelos investi- dores em startups no Vale da Morte é considerada de alto risco, porque é muito comum que esse tipo de empresa encerre as suas atividades de forma abrupta. No entanto, caso o negócio prospere, o retorno do investimento realizado tam- bém será proporcional ao risco inicialmente assumido.
4. VESTING AGREEMENT
O chamado Vesting Agreement é uma forma de atrair e manter colaboradores de uma empresa a partir da expectativa de valorização futura do negócio e da contribuição daquela pessoa para o seu faturamento.
Através do acordo é fornecida ao colaborador a possibilidade de partici- pação na empresa, sem que seja necessária uma contribuição pecuniária direta. Xxxxxxx Xxxxx (2019, p. 57):
“O vesting agreement é uma ferramenta essencial para ali- nhar os interesses dos fundadores de uma startup com os in- vestidores, permitindo que estes últimos recebam uma par- cela do capital da empresa ao longo do tempo, condicionada ao cumprimento de determinadas metas e prazos”.8
O contrato de vesting visa oferecer uma contraprestação aos serviços de um colaborador, como uma forma de retenção de talentos pelas startups, especial-
7 XXXXXXXXXXX, Xxxxxxx X. O Dilema da Inovação: Quando as Novas Tecnologias Levam Em- presas ao Fracasso. São Paulo: Makron Books, 2000, p. 117.
8 XXXXX, Xxxxx. Direito das startups: uma abordagem prática. 2. ed. São Paulo: Almedina, 2019, p. 57.
mente em fase de validação (no “Vale da Morte”), momento em que não costuma existir abundância de recursos.
Logo, a distribuição de ações ou de sua possibilidade de compra, configura uma forma de recompensa por um trabalho que já foi ou que ainda será de- senvolvido, seja a curto ou a longo prazo. Se trata de um bom método para o engajamento e comprometimento por parte daqueles que compõe a estrutura da empresa.
Além de tornar a empresa multidisciplinar a partir do recrutamento de bons profissionais, que podem contribuir de diversas maneiras para o crescimento do negócio, o contrato de vesting se mostra eficiente, moderno e tecnológico e reforça o espírito inovador das startups.
A ideia reside em atrelar metas pessoais dos investidores aos objetivos co- letivos da empresa, retendo talentos na estruturação da empresa, garantindo o comprometimento dos fundadores com a empresa, além de motivá-los a traba- lhar de forma árdua e tomar decisões que colaborem para o aumento do valor da empresa9.
Para Xxxxxxxx (2020, p. 97), “o vesting agreement pode ser uma forma de di- luir o risco do investimento em uma startup, pois permite que os investidores recebam um retorno proporcional ao cumprimento de metas e prazos estabe- lecidos, o que incentiva o alinhamento de interesses entre fundadores e inves- tidores”10.
Contudo, a forma de investimento não deve ser franqueada a qualquer cola- borador de forma indiscriminada, sendo recomendado que haja um alinhamen- to entre os valores pessoais do possível investidor e da sociedade.
Difere, portanto, das opções de ações, que viabilizam a aquisição de parti- cipação societária por colaboradores de empresas após período determinado e por um valor também pré-estabelecido, reguladas pela Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/7611).
9 XXXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXX, Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxxxx. Investimento em startups: como nego- ciar com investidores e proteger seu negócio. São Paulo: Atlas, 2020, p. 25.
10 XXXXXXXX, Xxxxxx. Empreendedorismo e Inovação: Desafios e Tendências. São Paulo: Atlas, 2020, p. 97.
11 Lei nº 6.404/76: “Art. 168. O estatuto pode conter autorização para aumento do capital social independentemente de reforma estatutária. (...) § 3º O estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembleia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas natu- rais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.”
Apesar da semelhança, as opções de ações viabilizam a aquisição de partici- pação societária em um período e com um valor determinado, que costuma ser inferior ao praticado no mercado e são destinadas exclusivamente à algumas categorias de colaboradores e estão restritas às sociedades anônimas.
Em seu turno, o vesting agreement não possui regulamentação ou delimita- ção específica, podendo ser ofertado em qualquer tipo de organização e para quaisquer colaboradores, sendo bem mais atrativo para empresas como as star- tups, que são inovadoras e escaláveis.
Nesse sentido, deve ser sopesado o risco de se utilizar deste instrumento que ainda carece de regulamentação específica no Brasil. Alguns pontos de atenção dizem respeito a possibilidade de judicialização para o reconhecimento de vín- culo empregatício por colaboradores ou, ainda, litígios societários que discutam sobre a forma ou porcentagem de participação na empresa.
Para dar segurança jurídica às partes, o acordo precisa ser muito bem re- digido, minimizando o risco de possíveis divergências. Logo, algumas cláusu- las-chave devem ser observadas ao elaborar um bom contrato de vesting, tais como:
* Cláusulas de good leaver e bad leaver: compreende uma forma de benefício àqueles acionistas que deixarem a empresa com um bom relacionamento, cumprimento os deveres contratuais esta- belecidos, em comparação aos acionistas que também deixarem a empresa, mas que tiveres desrespeitado algum termo con- tratual. Essas cláusulas têm como objetivo alinhar os interesses dos sócios e evitar disputas na saída de um membro da empresa (DANTAS; VASCONCELOS, 2020, p. 87)12;
* Cláusula de aceleração: dispõe sobre a possibilidade de aquisi- ção de ações pelo colaborador em questão de forma mais rápida em determinadas circunstâncias, tal como negócios de compra e venda ou alterações substanciais no quadro societário;
* Cláusula de lock-up: cria uma limitação através de um período no qual os sócios não poderão alienar as suas ações, gerando um cenário de estabilidade na administração da empresa;
12 DANTAS, F. C.; XXXXXXXXXXX, F. C. Manual de direito empresarial: Sociedades empresárias e operações societárias. São Paulo: Juspodivm, 2020.
* Cláusula de desempenho: indicada para aumentar a efetividade na dinâmica empresarial, deve listar com grande nível de deta- lhe os objetivos que devem ser atingidos pelo colaborador, bem como as formas de avaliação quanto ao atingimento de tais me- tas;
* Cláusula de Cliff: discorre sobre um período mínimo em que o colaborador deve permanecer na sociedade para que, então, possa ter direito à participação societária. Figura, em termos ge- rais, como um período de carência13 que antecede o momento em que a transferência das ações possa começar a ocorrer de forma gradual;
* Cláusulas de resolução contratual: se trata de um ponto que requer muita atenção, pois deve dispor acerca do término con- tratual, especialmente tendo em vista todas as possibilidades de desligamento do colaborador, alterações na estrutura em- presarial etc. Além de hipóteses de encerramento contratual, a cláusula deve também dispor sobre o que ocorrerá em relação à participação societária.
Já em relação aos dados envolvidos na transação, estes costumam ter uma boa proteção, especialmente pelo envolvimento e o interesse em ambas as par- tes de que o negócio prospere da melhor forma possível.
A duração do contrato será estabelecida de acordo com o interesse das par- tes, mas costuma ter um período destinado ao Cliff (avaliação do futuro sócio), seguido da transferência gradual de participação societária.
Por sua vez, a transferência da participação na empresa também está ligada às cláusulas de aceleração e desempenho. Deve ser redigida com um grande nível de detalhes, explorando as possibilidades e as condições relacionadas aos prazos e metas.
5.CONCLUSÃO
As startups se diferenciam das demais formas de empresas justamente por sua articulação, busca por eficiência e por resultados assertivos. Utilizar-se de
13 XXXXXXXXX, X. X. Guia de startups: Como empreender com sucesso em empresas inova- doras. São Paulo: Évora, 2016.
um contrato de vesting implica em valorizar metas coletivas, unificando e forta- lecendo a atuação dos colaboradores em prol do crescimento da empresa.
Em qualquer organização empresarial o investimento financeiro e intelec- tual se mostra muito importante e isso é ainda mais forte em empresas em es- tágio inicial, como as startups no Vale da Morte – que visam a adequação de seu modelo de negócio e bons investimentos para validação das ideias e seu lançamento no mercado.
É comum que a maioria das startups não saia desta posição, sendo evidente, portanto, o motivo pelo qual é dito se tratar de um investimento de alto risco, pois não costuma haver garantia de seu retorno.
Tendo em vista que startups em validação possuem recursos limitados, o ves- ting é peça chave para atrair e reter talentos e se mostra eficaz e seguro para maiores retornos financeiros.
Investimentos bem planejados podem ser rapidamente validados pelo mer- cado, impulsionando o crescimento da startup e trazendo grandes benefícios aos investidores. Em um mercado que se atualiza em velocidade cada vez maior, é indispensável conhecer as tendências legais e contratuais.
6.REFERÊNCIAS
XXXXXXXXXXX, Xxxxxxx X. O Dilema da Inovação: Quando as Novas Tecnologias Levam Empresas ao Fracasso. São Paulo: Makron Books, 2000, p. 117.
XXXXXX, F. C.; XXXXXXXXXXX, F. C. Manual de direito empresarial: So- ciedades empresárias e operações societárias. São Paulo: Juspodivm, 2020.
XXXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXX, Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxxxx. Investimento em startups: como negociar com investidores e proteger seu negócio. São Paulo: Atlas, 2020, p. 25.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. Governança
Corporativa para Startups & Scale-ups. São Paulo: IBGC, 2019. P. 7
XXXXXXXXX, F. M. Guia de startups: Como empreender com sucesso em empresas inovadoras. São Paulo: Évora, 2016.
XXXXXXXXX, F. M.; XXXXXX, D. T. Startups: Da ideia ao lançamento. São
Paulo: Novatec, 2018.
XXXXXXX, X. X. X.; XXXXXXXXX, M. L. Empreendedorismo e startups: Desenvolvimento de negócios inovadores. São Paulo: Saraiva, 2019.
XXXXXXXX, Xxxxxx. Empreendedorismo e Inovação: Desafios e Tendên- cias. São Paulo: Atlas, 2020, p. 97.
XXXX, Xxxx. The Lean Startup: How today’s entrepreneurs use continu- ous innovation to creat radically successful business. S.l: Crown Bu- siness, 2011.
XXXXX, Xxxxx. Direito das startups: uma abordagem prática. 2. ed. São
Xxxxx: Almedina, 2019, p. 57.