CONSELHEIRO EDGARD CAMARGO RODRIGUES
CONSELHEIRO XXXXXX XXXXXXX XXXXXXXXX
PRIMEIRA CÂMARA DE 02/07/19 ITEM Nº41
CONTRATO DE GESTÃO
41 TC-045570/026/14
Contratante: Prefeitura Municipal de Cajamar.
Organização Social: Federação Nacional das Entidades Sociais e Comunitárias – FENAESC.
Autoridade(s) que firmou(aram) o(s) Instrumento(s): Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx (Prefeito) e Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx (Presidente).
Objeto: Operacionalização da gestão e execução das atividades e serviços de saúde no Hospital Municipal Enfermeiro Xxxxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxxxx.
Em Julgamento: Dispensa de Licitação (artigo 24, inciso IV da Lei Federal nº 8.666/93 e posteriores atualizações). Contrato de Gestão celebrado em 24-11-14. Valor – R$12.300.000,00. Justificativas apresentadas em decorrência de assinatura(s) de prazo, nos termos do artigo 2º, inciso XIII, da Lei Complementar nº 709/93, pelo Conselheiro Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx, publicada(s) no D.O.E. de 24-03-15.
Advogado(s): Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx (OAB/SP nº 264.600), Luiz Antonio de Oliveira (OAB/SP nº 85.692) e Xxxxxx xx Xxxxxxxx Xxxxxxxx (OAB/SP nº 274.018).
Fiscalizada por: GDF-1 - DSF-II.
Fiscalização atual: GDF-1 - DSF-I.
RELATÓRIO
Trata-se do contrato de gestão (emergencial) n° 01/14, firmado entre PREFEITURA DE CAJAMAR e FEDERAÇÃO NACIONAL DAS ENTIDADES SOCIAIS E COMUNITÁRIAS – FENAESC,
com vistas à operacionalização da gestão e execução das atividades e serviços de saúde no Hospital Municipal Enfermeiro Antonio Policarpo de Oliveira, Distrito do Polvilho, em Cajamar(1).
Convocados os interessados à prestação de esclarecimentos – sob acionamento do inciso XIII do artigo 2° da Lei Complementar n° 709/93 (fls. 230) - em face do relatório preliminar da Fiscalização (DF-1) – fls. 200-218 -, apontando possíveis vícios e incongruências por ocasião da lavratura do instrumento ora em apreço(2), Prefeitura de Cajamar alude “situação política caótica” que teria se instaurado no Município no último trimestre de 2014.
1) 24/11/14, R$ 12.300.000,00, 180 dias.
2) Em apertada síntese, coube a Fiscalização imputar possíveis carências, ao dar conta de que: (i) a FENAESC não era qualificada como Organização Social junto ao Poder Executivo de Cajamar e o atestado apresentado não confirma que ela efetivamente prestava serviços de assistência à saúde por pelo menos 5 (cinco) anos;
(ii) a contratada não apresentou proposta orçamentária e programa de investimentos e as planilhas elaboradas pela Prefeitura e pela FENAESC demonstrando a vantagem econômica do contrato de gestão apresentavam divergências no cotejo dos dados;
(iii) não foi publicada a decisão do Poder Público de firmar o Contrato de Gestão e não foi realizada a seleção e avaliação das propostas de eventuais entidades interessadas em gerir o Nosocômio Municipal; (iv) não foi estabelecida meta quantitativa para os Serviços de Apoio Diagnóstico e Terapêutico – SADT Externo; (v) não caracterização de situação emergencial que desse azo à contratação direta sob invocação da dispensa de licitação prevista no Artigo 24, IV, da Lei Federal nº 8.666/93,
Faz também referência ao afastamento do Prefeito e da Vice-Prefeita, em 20/10/14, pela Justiça Eleitoral, sendo substituídos pelo Presidente da Câmara, que impediu a prorrogação do contrato de concessão de uso do Hospital Municipal, firmado com Multimed Assistência Médico Odontológica, a 07 (sete) dias do prazo final de vigência de 20 (vinte) anos. (fls. 244)
Ao Prefeito afastado, a prorrogação da vigência do contrato de concessão de uso do Hospital Municipal celebrado em 1994 seria de interesse da Administração, dentro de suas diretrizes traçadas para a área da saúde e por isso nenhuma providência tempestiva com vistas à rescisão da avença foi adotada – eis que o contrato previa a extensão de sua vigência, pelo prazo de dez anos, condicionada ao interesse das partes. (fls. 245)
Já segundo o Prefeito interino, a opção pelo contrato de gestão traria “inúmeras vantagens” à Administração, mas o Município havia outorgado, nos termos da Lei Federal n° 9.637/98, o título de “Organização Social” a apenas duas entidades – Casa de Saúde Santa Marcelina e Instituto de Desenvolvimento Estratégico e Assistência Integral à Saúde (IDEAIS), “e dado o prazo de pouco mais de uma semana entre a decisão do mandatário e o término do contrato vigente, ambas declinaram, “por telefone mesmo”. (fls. 245/246)
Daí o Prefeito autorizar a contratação direta, com fundamento no artigo 24, IV, da Lei n° 8.666/93, posto que não se dispunha de tempo hábil para realizar o trâmite ordinário voltado à seleção pública de propostas das Organizações Sociais, eventualmente interessadas em assumir a gestão do Hospital Municipal. (fls. 249)
“Em todos os casos, a emergência significará a impossibilidade de se aguardar o decurso do prazo normal da licitação” e em Cajamar dispunha-se de apenas 07 (sete) dias úteis antes do término da vigência do contrato de concessão de uso, o que obviamente impossibilitava a instauração de procedimento adequado e compatível com a celebração de um contrato de gestão, nos moldes instituídos na Lei Federal n° 9.637/98, reprisado na Lei Municipal n° 1.186/05.
Proposta da FENAESC, de assunção imediata do Hospital Municipal, pelos mesmos valores percebidos pela Multimed, mas sujeita aos mecanismos de controle e desempenho, por si só demonstraria a vantagem da contratação emergencial. (fls. 249)
Registra “equívoco” ao nomear o instrumento da avença utilizando-se da expressão “contrato de gestão emergencial”, quando na verdade tratar-se-ia apenas e tão somente de um “contrato emergencial” – lastreado no artigo 24, IV, da Lei n° 8.666/93. (fls. 250)
Ao Município, “em que pese suas cláusulas e condições seguirem a “estrutura” de um “contrato de gestão”, não se trata de um “contrato de gestão” típico, regulamentado mediante a Lei Municipal n° 1.186/05”, impedindo a Administração de cumprir diversas exigências e determinações nela contidas, a exemplo da Proposta Orçamentária e do Programa de Investimentos, que “foram elaborados e apresentados pela própria Administração e não pela entidade, como seria usual em contratos de gestão “típicos””. (fls. 250)
Explica ainda a Prefeitura que, como cediço, não houve tempo para a realização da seleção e avaliação das propostas de
eventuais entidades interessadas em gerir o Nosocômio; “o que houve foi uma drástica alteração nas políticas públicas voltadas para a área da saúde, motivada pelas decisões emanadas da Justiça Eleitoral”. (fls. 251/253)
Salienta que, no contexto, a contratação emergencial da FENAESC mostrou-se adequada, “pois possibilitou tempo razoável à Administração Municipal vislumbrar novas possibilidades para a gestão do Hospital, bem como instituiu (ainda que temporariamente) um regime de trabalho que trouxe bons frutos à população cajamarense”. (fls. 254)
À Assessoria Técnica (Jurídico) a possível falta de isenção (da Administração) comprometeria todo o processo de escolha, razão de opinar pela irregularidade dos atos praticados. (fls. 258)
De acordo com a Assessoria Técnica-Chefia “a notória confusão observada nestes autos impedem a aprovação do procedimento adotado pela Prefeitura”. (fls. 260)
Na sua avaliação, “criou-se, ao que parece, um novo instrumento jurídico, que não se trata de contrato administrativo, nos termos da Lei Federal n° 8.666/93, tampouco de contrato de gestão, consoante as regras das Leis Federal n° 9.637/98 e Municipal n° 1.186/05, mas uma mistura de ambos, que penso ser inaceitável”. (fls. 261)
Nesses termos, conclui pela irregularidade da conduta praticada no âmbito do Município de Cajamar. (fls. 263)
Vista regimental ao Ministério Público. (fls.
263/verso)
Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Prefeito em exercício à época da contratação, reitera o arrazoado apresentado pela Municipalidade de Cajamar. (fls. 264/286)
À Secretaria-Diretoria Geral, “em que pese não caber a este Tribunal imiscuir-se em assuntos político-administrativos dos Municípios, no caso concreto, devido aos impactos na área da saúde e na seara orçamentária e financeira, não se pode deixar de destacar que a permanência do Sr. Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx perdurou de 20/10/14 a 12/01/15, cumprindo o período de 90 dias permitido por Lei até a realização de novas eleições, motivo pelo qual poderia ser mantido o contrato de concessão por um período suficiente para a regularização da situação eleitoral do Município, não necessariamente por outros 10 anos, visando à continuidade dos serviços prestados à população durante a turbulência administrativa nesse período”. (fls. 292)
Dá por certo que, “conhecedor do período transitório de 90 dias para o exercício do mandato até o advento de novas eleições, não parece razoável que o Prefeito interino reunisse condições de implantar uma nova forma de gerenciamento do Hospital, direta ou indiretamente, sob o risco de o novo gestor adotar outras diretrizes na área em questão, tornando ainda mais inconstante o atendimento à população, além do impacto orçamentário e financeiro do Município.” (fls. 293)
Ademais, “a avença, em virtude exclusivamente quanto ao prazo de vigência, seria um contrato emergencial; nessa hipótese o disposto no inciso I do artigo 26 da LF n° 8.666/93 teria sido cumprido, mas não os incisos II (razão da escolha do executante) e III (justificativa do preço), bem como os Princípios da Transparência, Impessoalidade e Eficiência”. (fls. 293)
Reporta-se, ainda, ao julgamento, de contrato posterior, firmado entre Prefeitura de Jandira e FENAESC, para a consecução do mesmo objeto no Nosocômio daquela Municipalidade, objeto do TC-009004-989-17-4, destacando trecho do voto prolatado, Conselheiro Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, e. Relator:
“Desta feita, o Executivo resolveu encetar ajuste direto, sem observar as regras legais basilares, dispensando o processo de seleção regular e promovendo contrato de gestão com entidade que, possivelmente, calculou idônea e respeitável, mas que já havia aplicado severo golpe em municípios da região.
Bastava ao Gestor empreender pesquisa nos canais oficiais para ter conhecimento de que corria junto à 2ª Vara Judicial da Comarca de Cajamar procedimento de investigação contra a organização que almejava contratar. Inclusive seria expedido mandado de prisão contra os dirigentes poucos dias após a celebração do indigitado contrato, em 28/4/17, consoante documento anexado às representações (mandado de prisão preventiva).
Não obstante, em face do açodamento em pactuar com aquela organização e pela inobservância das cautelas de estilo, o Poder Executivo acabou por levar a termo avença que só duraria 57
dias, sucumbindo à inexecução do quanto ajustado e mergulhando os cofres municipais em franco prejuízo, em face da realização de despesas sem alcançar resultados efetivos e sem a contrapartida laboral condizente.”
Na esteira dessa apuração, também conclui pela irregularidade dos atos praticados. (fls. 295)
Este o relatório.
GCECR MSP/RLP
TC-045570/026/14
VOTO
Não há dissentir das manifestações dos preopinantes da Assessoria Técnica (Jurídico e Chefia) e da SDG, reportando as mazelas e ilicitudes consumadas pela Prefeitura, por ocasião da celebração de contrato de gestão para operacionalização e execução das atividades e serviços de saúde no Hospital Municipal de Cajamar.
A toque de caixa, sob invocação do atendimento de situação emergencial alegadamente compreendida no artigo 24, inciso IV, da Lei n° 8.666/93, resolveu o Prefeito interino que iria substituir a entidade responsável pela gestão do Nosocômio Municipal, ponto exato onde começam os atropelos perpetrados.
Muito embora a regra invocada, de caráter excepcional, preste-se ao disciplinamento de demandas forjadas mediante a celebração de contratos administrativos, não esconde a Administração Municipal que as tarefas e responsabilidades arquitetadas na avença levada a efeito, em tudo e por tudo, entregam à compreensão tratar-se de contrato de gestão do equipamento público em destaque, gênero de ajuste no qual são disponibilizados recursos públicos a entidades do terceiro setor, necessariamente qualificadas como organizações sociais, para a realização do rol de atividades previstas na Lei Federal n° 9.637/98, entre as quais aquelas dirigidas à saúde.
No âmbito do Município de Cajamar é a Lei Municipal n° 1.186, de 11 de novembro de 2005, que regulamenta a qualificação
de entidades como organizações sociais e a celebração de contratos de gestão com a Municipalidade.
Ainda que de extrema gravidade, vão muito além as constatações de que a entidade signatária do contrato de gestão com a Administração não era detentora da referida qualificação na respectiva esfera de governo, como também de que não comprovou o mínimo de 05 (cinco) anos de efetiva prestação de serviços na área da saúde, nos termos do artigo 1°, Parágrafo único, c/c artigo 2°, Parágrafo único, da referida Lei Municipal.
Se não poderia a Prefeitura abdicar da aplicação das disposições contidas na Lei Municipal n° 1.186/05, pior quando a iniciativa escancara a açodada e irresponsável escolha pela contratação da Federação Nacional das Entidades Sociais e Comunitárias - FENAESC, eis que contratações de Organizações Sociais hão derivar de dispensa de certame legitimada no artigo 24, inciso XXIV, do Estatuto das Licitações, dando valia a critérios objetivos e impessoais, com observância aos princípios instituídos no artigo 37, “caput”, da Constituição Federal, nos termos decidido pelo STF na ADI n° 123/DF(3).
3) decisão do STF na ADI n° 1923/DF – publicada no DJE de 17/12/15, com trânsito em julgado em 04/02/16, julgou parcialmente procedente o pedido, apenas para conferir interpretação conforme à Constituição, à Lei n° 9.637/98 e ao art. 24, XXIV, da Lei Federal n° 8.666/93, incluído pela Lei n° 9.648/98, para que:
● o procedimento de qualificação seja conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 27 da Constituição Federal, e de acordo com parâmetros fixados em abstrato segundo o que prega o art. 20 da Lei n° 9.637/98;
Xxx se vê que a atuação recôndita do Prefeito interino no episódio, em detrimento de forjar a condução da contratação de forma pública, parece desafiar a transparência e a impessoalidade.
Ao seu tempo, competia a adoção de medidas preambulares, tais quais, a exemplo, as ações de divulgar publicamente a intenção de terceirizar a execução das atividades de prestação de serviços de saúde no Nosocômio, apresentando minuta do contrato de gestão que pretendia firmar, nela incluída todas as condições para consecução do ajuste, de convocar publicamente entidades interessadas, solicitando que apresentassem propostas para execução do objeto do futuro contrato, e de divulgar publicamente o resultado da seleção, justificando os fatores que foram considerados relevantes para a opção da escolha ao final do processo.
● a celebração de contrato de gestão seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da Constituição Federal;
● as hipóteses de dispensa de licitação para contratações (Lei n° 8.666/93, art. 24, XXIV) e outorga de permissão de uso de bem público (Lei n° 9.637/98, art. 12, § 3°) sejam conduzidas de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da Constituição Federal;
● os contratos a serem celebrados pela Organização Social com terceiros, com recursos públicos, sejam conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da Constituição Federal e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade;
● a seleção de pessoal pelas Organizações Sociais seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da Constituição Federal e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade.
Também não escapa à vista apontamentos subsidiários na r. decisão que se deparou com circunstâncias rigorosamente assemelhadas, igualmente protagonizadas pela FENAESC em contrato de gestão firmado com o Município vizinho de Jandira, para operacionalização e execução das ações de saúde do Pronto-Atendimento Municipal, assunto do TC-008636-989-17-0 (E. Primeira Câmara, sessão de 05/12/17, Conselheiro Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxx, e. Relator), nela ventilada inclusive a expedição de mandados de prisão contra os dirigentes da entidade, precisamente em razão de malfeitos cometidos no Município de Cajamar (associação criminosa para apropriação de recursos públicos), decerto no âmbito do contrato imediatamente posterior ao ora em apreço, também confiado à FENAESC em 25/05/15, com vigência de 25/05/15 a 24/05/20, objeto do TC-007439-989-15, sob minha relatoria, aguardando remate da instrução.
Destarte, autorizado inferir a quebra dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e economicidade, igualmente previstos no artigo 7°, “caput”, da Lei Municipal de regência, tão caros aos munícipes e contribuintes de Cajamar, voto pela irregularidade da dispensa de licitação e do contrato de gestão n° 01/14, acionando-se os incisos XV e XXVII do artigo 2° da Lei Complementar n° 709/93.
Voto ainda, com fundamento no artigo 104, inciso II, da Lei Complementar n° 709/93, pela aplicação de multa ao Sr. Xxxxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Prefeito de Cajamar à
época, autoridade responsável pelos atos praticados sub censura, no valor correspondente a 600 (seiscentas) UFESPs.
Por derradeiro, decorrido o prazo recursal, com o trânsito em julgado da presente decisão, e ausente prova junto a este Tribunal do recolhimento tempestivo da sanção pecuniária, fica o Cartório autorizado a adotar as providências necessárias ao encaminhamento do(s) débito(s) para inscrição em dívida ativa estadual e posterior cobrança judicial.
GCECR MSP/RLP