A Conformidade na Divulgação dos Estoques nas Empresas do Setor de Atuação Consumo Cíclico–Calçados Listadas na BM&FBovespa
A Conformidade na Divulgação dos Estoques nas Empresas do Setor de Atuação Consumo Cíclico–Calçados Listadas na BM&FBovespa
XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXX
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
XXXXX XX XXXXX XXXXXXXX
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
XXXXXXX XXXXXX XXXX
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
XXXX XXXXXXXXX XXXXX XXXXXX
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Resumo
Este estudo exploratório teve como objetivo investigar a conformidade das informações sobre os estoques pelas companhias do setor de consumo cíclico-calçados, listadas na Bolsa de Valores-B3, por meio da análise das notas explicativas às demonstrações contábeis destas companhias. A amostra constituiu-se de quatro companhias que se enquadraram no setor em 2016 e divulgaram suas informações contábeis ao mercado. A pesquisa foi orientada através de procedimentos de análise documental e revisão bibliográfica, tendo como base as notas explicativas às demonstrações contábeis publicadas pelas companhias referentes ao exercício de 2016. As divulgações de informações adicionais sobre as demonstrações contábeis de modo uniforme pelas companhias fornecem melhores condições aos usuários destas informações para tomada de decisões, sendo que a observância das normas contábeis de maneira uniforme reduz a assimetria informacional, evitando que sejam divulgadas informações que não refletem a realidade das companhias ao mercado e divulgando aquelas que são entendidas como minimamente necessárias para cada elemento patrimonial. Foram analisadas a compatibilidade das divulgações realizadas sobre os seus estoques com as normas inerentes aplicáveis a estas companhias no período, em especial ao CPC 16 – Estoques, e o nível de comparabilidade entre as informações divulgadas pelas companhias sobre estes ativos. Os resultados apontaram que, na média das companhias da amostra, apenas 47% das informações cuja divulgação é exigida pela norma contábil foram apresentadas em notas explicativas, apontando também que as informações das companhias deste setor não são uniformes, apesar da semelhança de suas operações, fato este que prejudica a comparabilidade entre as informações sobre estoques divulgadas pelas companhias.
Palavras chave: Comparabilidade contábil. Normas internacionais. Pronunciamentos contábeis. Estoques.
1 Introdução
O processo de convergência da contabilidade brasileira às normas internacionais já ocorreu há quase uma década, sendo um marco histórico na profissão contábil brasileira, e provocou largo movimento da classe contábil, incluindo pesquisadores, professores, profissionais e estudantes, num esforço comum para a adoção do novo padrão contábil alinhado às normas internacionais, cujo objetivo maior é promover a comparabilidade das informações contábeis em nível global.
Dentre as diversas inovações trazidas a partir da promulgação da Lei n. 11.638/2007, atenção especial foi dada à normatização dos procedimentos de mensuração, evidenciação, reconhecimento e divulgação dos estoques, que foi regulamentada através do Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC 16, editado a partir da conversão e adaptação da norma International Accounting Standard - IAS 02 (International Accounting Standards Board - IASB). Tal pronunciamento, conforme delineado em seu item 1, tem por objetivo:
(...) estabelecer o tratamento contábil para os estoques. A questão fundamental na contabilização dos estoques é quanto ao valor do custo a ser reconhecido como ativo e mantido nos registros até que as respectivas receitas sejam reconhecidas. Este Pronunciamento proporciona orientação sobre a determinação do valor de custo dos estoques e sobre o seu subsequente reconhecimento como despesa em resultado, incluindo qualquer redução ao valor realizável líquido. Também proporciona orientação sobre o método e os critérios usados para atribuir custos aos estoques.
A implementação das normas internacionais no padrão International Accounting Standards Board (IASB) influencia as organizações a procurarem melhores formas de mensurar seus estoques (Murphy, 2005).
Conforme Iudícibus (2015, p. 193),
o termo estoque é utilizado para designar o agregado de itens de propriedade tangível, que: 1. são estocados para venda no curso dos negócios; 2. estão em processo de produção para tal venda; ou 3. estão para ser consumidos na produção dos bens ou serviços que se tornarão disponíveis para venda.
Tal informação é de elevada importância, conforme Xxxxxxx, Gelbcke, Santos e Iudícibus (2013), pois estoques estão intimamente ligados às principais áreas de operação das companhias, essencialmente para empresas com atividades mercantis, visto serem os estoques elementos cruciais do capital de giro, consistindo no foco da atividade comercial das companhias.
Neste contexto, o setor das indústrias de calçados enquadra-se neste grupo de companhias cujos estoques possuem vital relevância, haja vista que todo o processo operacional destas companhias está construído no entorno deste produto, através do qual serão atingidos os objetivos destas companhias.
Assim sendo, o objetivo deste estudo é investigar a conformidade das divulgações sobre os estoques nas demonstrações contábeis do setor de atuação consumo cíclico-calçados listadas na Bolsa de Valores-B3 por meio da análise das notas explicativas às demonstrações contábeis, visto que, por serem do mesmo setor de atuação, pressupõe-se maior comparabilidade entre suas informações divulgadas referentes aos estoques.
O artigo está estruturado em cinco itens, incluída esta introdução, seguida dos itens 2 a 5, nos quais serão abordados respectivamente: o referencial teórico que suporta este estudo; os aspectos metodológicos do estudo; os resultados alcançados; os argumentos conclusivos e limitações do estudo; e, ao final, apresentam-se as referências.
2 Referencial Teórico
A estrutura conceitual básica das normas contábeis brasileiras, normatizada através do CPC 00, assim delimita o objetivo dos relatórios contábeis:
O objetivo do relatório contábil-financeiro de propósito geral é fornecer informações contábil-financeiras acerca da entidade que reporta essa informação (reporting entity) que sejam úteis a investidores existentes e em potencial, a credores por empréstimos e a outros credores, quando da tomada de decisão ligada ao fornecimento de recursos para a entidade.
Destaca-se, do objetivo conceitual trazido pela norma, a característica de utilidade das informações a serem reportadas pelas entidades, sendo que, para garantir que essa utilidade seja alcançada, o mesmo pronunciamento delimita as características qualitativas das demonstrações contábeis, sendo elas segregadas em características qualitativas fundamentais (relevância, materialidade e representação fidedigna) e de melhoria (comparabilidade, verificabilidade, tempestividade e compreensibilidade).
A característica de melhoria comparabilidade permite aos usuários a comparação de dois ou mais itens similares e, partindo do pressuposto que ambas as companhias estão sujeitas às mesmas normas, permite consequentemente a comparação entre itens similares das demonstrações contábeis de companhias similares.
Iudícibus, Xxxxxx e Xxxxx (2017) asseveram que a comparabilidade por si só não significa uniformidade, necessária para que a informação seja comparável, para que coisas iguais pareçam iguais e coisas diferentes pareçam diferentes.
Neste viés, a uniformidade na aplicação das normas pelas companhias reduz a ocorrência de assimetria informacional, definida por Iudícibus (2015) como a ocorrência de divulgação, pelas companhias, de informações que não refletem a realidade econômica da empresa ao mercado, que terá como resultado prejuízos para o processo de análise e avaliação consistente do andamento das companhias.
As informações úteis a serem divulgadas pelas companhias, conforme Xxxxxxxxxx e Xxx Xxxxx (1999), seriam aquelas que contêm volumes mínimos de informações compatíveis com o objetivo de tornar as informações contábeis confiáveis e compreensíveis para seus usuários.
A importância da divulgação de informações úteis pelas companhias em suas demonstrações contábeis tem sido objeto de estudos na área. Dantas, Xxxxxxxxx, Xxxxxx e Xxxxxx (2005) destacam que maiores níveis de divulgação das informações contábeis beneficiam os usuários e promovem a valorização da companhia no mercado através do aumento da confiança dos investidores, credores e demais stakeholders, porém relatam a relutância de algumas companhias em promover maiores divulgações sob o argumento de proteção de informações estratégicas para seus negócios.
Xxxxx, Xxxxx, Xxxxxxx x Xxxxxxxx (2015) buscaram associar, em seu ensaio teórico, elementos referentes à economia da informação com aspectos da teoria da divulgação em pesquisas sobre contabilidade, no qual afirmam que a assimetria informacional provoca aumento do custo de capital provocado pela adversidade dos investidores, destacando ainda a possibilidade da influência de eventuais conflitos de agência, que poderiam distorcer as
divulgações da companhia sob a ótica do risco moral em situação onde o agente poderia manipular as informações a serem divulgadas para seu benefício próprio.
Pontarolo, Klosowski, Xxxxxxx e Xxxxxxxx (2017) pesquisaram o nível de evidenciação das informações em notas explicativas em empresas do setor de construção civil participantes do mercado aberto em 2013, identificando que, em média, 81,54% das divulgações requeridas pela norma contábil aplicável ao segmento foram atendidas.
Dentre o rol de informações constantes nas demonstrações contábeis sujeitas a divulgações específicas encontram-se os estoques que, conforme a sua norma contábil (Comitê de Pronunciamentos Contábeis [CPC] 16), são definidos como ativos: “(a) mantidos para venda no curso normal dos negócios; (b) em processo de produção para venda; ou (c) na forma de materiais ou suprimentos a serem consumidos ou transformados no processo de produção ou na prestação de serviços”.
A mesma norma discorre sobre as formas de mensuração, determinando que os estoques devem ser mensurados pelo valor de custo, entendido como todos os custos de aquisição e transformação destes ativos, incluindo-se os incorridos para trazer estes estoques a sua condição ou localização atuais, ou pelo valor realizável líquido, dos dois o menor, definindo valor realizável líquido como “o preço de venda estimado no curso normal dos negócios deduzido dos custos estimados para sua conclusão e dos gastos estimados necessários para se concretizar a venda.” (Xxxxxxxx & Xxxxxx, 2013, p. 78).
O CPC 16 esclarece ainda que o valor realizável líquido a ser calculado não pode ser superior ao valor justo, haja vista que este se refere ao valor de venda, no mercado, destes estoques deduzidos das despesas necessárias para realização de sua venda.
Em relação às divulgações das informações qualitativas pelas companhias nos seus processos de reportar as informações contábeis aos usuários destas informações, conforme o CPC 26 – Apresentação das demonstrações contábeis, cabe às notas explicativas apresentar informações adicionais em relação às apresentadas nas demonstrações contábeis. Dentre estas informações adicionais, conforme o CPC 26, item 112, alínea b), as notas explicativas têm a função de “divulgar a informação requerida pelos Pronunciamentos Técnicos, Orientações e Interpretações do CPC que não tenha sido apresentada nas demonstrações contábeis”.
No que concerne aos estoques, o Pronunciamento Técnico - CPC 16, em seu item 36, delimita as divulgações obrigatórias que as companhias devem realizar:
As demonstrações contábeis devem divulgar:
(a) as políticas contábeis adotadas na mensuração dos estoques, incluindo formas e critérios de valoração utilizados;
(b) o valor total escriturado em estoques e o valor registrado em outras contas apropriadas para a entidade;
(c) o valor de estoques escriturados pelo valor justo menos os custos de venda;
(d) o valor de estoques reconhecido como despesa durante o período;
(e) o valor de qualquer redução de estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34;
(f) o valor de toda reversão de qualquer redução do valor dos estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34;
(g) as circunstâncias ou os acontecimentos que conduziram à reversão de redução de estoques de acordo com o item 34; e
(h) o montante escriturado de estoques dados como penhor de garantia a passivos.
O mesmo Pronunciamento, em seu item 37, considera útil para os usuários a informação relativa a valores contábeis registrados nas diferentes classificações de estoques e a proporção de alterações nesses ativos, exemplificando as classificações comumente adotadas como:
mercadorias, bens de consumo de produção, materiais, produto em elaboração e produtos acabados.
Conforme Xxxxxxx et al. (2013), a nota explicativa dos estoques pode discriminar os saldos por conta, quer sejam produtos acabados, matérias-primas, almoxarifado e a provisão para redução ao valor de mercado, entre outras.
Estudos conduzidos sobre as notas explicativas às demonstrações contábeis apontam que os profissionais contábeis no Brasil possuem dificuldade em elaborar este instrumento informacional de forma clara e eficiente, conforme estudo de Xxxxxx e Xxxxx (2013), que pesquisaram a carga horária destinada ao estudo sobre notas explicativas nos cursos de graduação em ciências contábeis no Brasil: 58% dos cursos de graduação destinam apenas entre 1 e 10 horas de aula a conteúdos sobre notas explicativas.
Xxxxx, Xxxxx e Xxxxx (2014) estudaram o nível de comparabilidade das informações divulgadas pelas companhias em seus relatórios financeiros das empresas que compõem o Índice Brasil 50, apurando os índices de comparabilidade das informações sobre estoques (CPC 16), imobilizado (CPC 27), intangível (CPC 04) e instrumentos financeiros (CPC 38), e observaram que são baixos os índices médios de comparabilidade concernentes aos estoques (0,34), enquanto os demais itens apresentaram no mínimo 0,90 no índice de comparabilidade aplicado.
Xxxxxx, Xxxxxxxxx e Liszbinski (2013) verificaram o nível de adesão à norma internacional referente aos estoques (International Accounting Standard [IAS] 2) em empresas do Mercosul, e analisaram informações contábeis de empresas da Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela, identificando tanto práticas convergentes quanto parcialmente convergentes em empresas industriais, sendo as empresas brasileiras e venezuelanas as que apresentaram maior aderência às determinações da norma internacional IAS 2.
Estudos realizados sobre as divulgações de informações contábeis abordaram os níveis de divulgações sobre ativos intangíveis, divulgações sobre créditos de carbono e divulgações voluntárias de informações gerenciais, porém não estudaram especificamente as divulgações requeridas sobre os estoques das companhias (Xxxxxxxxx, Xxxxxxxxx, & Xxxx, 2014; Xxxxx, Xxxxx, Xxxxxxx, & Xxxxxxxx, 2015; Xxxxxxx, Xxxxxx, Xxxxxxxx, & Savi, 2016).
3 Metodologia
Esta pesquisa é descritiva conforme Xxx (2010), por analisar a conformidade das divulgações sobre estoques das empresas do setor de consumo cíclico-calçados listadas na BM&FBovespa.
Possui característica qualitativa e documental por basear-se na análise do conteúdo das notas explicativas (dados secundários) destas companhias (Richardson, 2011).
A população e amostra da pesquisa foi escolhida por conveniência, e é composta das companhias do setor de consumo cíclico-calçados listadas na B3 e que divulgaram suas informações contábeis em 2016, conforme Tabela 1:
Tabela 1. Empresas que compõem a amostra
Empresas
ALPARGATAS S.A. CAMBUCI S.A. GRENDENE S.A.
VULCABRAS/AZALEIA S.A.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Com base nas notas explicativas às demonstrações contábeis das companhias que compõem a amostra serão analisadas as divulgações referentes aos estoques tendo como base os requisitos constantes na norma contábil aplicável a esta informação (CPC 16).
4 Análise dos Resultados
Ao analisar detidamente as demonstrações contábeis divulgadas pelas quatro companhias que compõem a população deste estudo, observa-se a relevância dos saldos em estoques frente aos ativos totais destas companhias nos exercícios de 2016 e 2015, que representaram em média 16,5% dos seus ativos, conforme demonstrado na Tabela 2:
Tabela 2. Demonstrativo da representatividade dos estoques em relação ao ativo total
Estoques | Ativo Total (AT) | % em relação ao AT | ||||
Exercícios findos em: | 31/12/2016 | 31/12/2005 | 31/12/2016 | 31/12/2005 | 31/12/2016 | 31/12/2005 |
ALPARGATAS S.A. | 652.408 | 633.664 | 3.782.052 | 3.763.470 | 17,25% | 16,84% |
CAMBUCI S.A. | 58.334 | 51.993 | 224.018 | 269.473 | 26,04% | 19,29% |
GRENDENE S.A. | 260.646 | 261.462 | 3.253.820 | 3.045.642 | 8,01% | 8,58% |
VULCABRAS/AZALEIA S.A. | 189.923 | 234.077 | 1.078.668 | 1.237.154 | 17,61% | 18,92% |
Média | 290.328 | 295.299 | 2.084.640 | 2.078.935 | 17% | 16% |
Fonte: Adaptado do site da BM&FBovespa (2016).
Subsequentemente, analisou-se a conformidade das divulgações das companhias com a determinação contida no CPC 16, que elenca as oito informações básicas sobre os estoques a serem divulgadas, apresentadas na Tabela 3 a seguir.
Tabela 3: Demonstrativo de adesão das companhias aos critérios de divulgação determinados pelo CPC 16.
Divulgações conforme CPC 16: | ALPARGATAS S.A. | CAMBUCI S.A. | GRENDENE S.A. | VULCABRAS/ AZALEIA S.A. | % Médio por item |
(a) as políticas contábeis adotadas na mensuração dos estoques, incluindo formas e critérios de valoração utilizados | Sim | Não | Não | Não | 25% |
(b) o valor total escriturado em estoques e o valor registrado em outras contas apropriadas para a entidade | Sim | Sim | Sim | Sim | 100% |
(c) o valor de estoques escriturados pelo valor justo menos os custos de venda | Não | Não | Não | Não | 0% |
(d) o valor de estoques reconhecido como despesa durante o período | Não | Não | Não | Sim | 25% |
(e) o valor de qualquer redução de estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34 | Sim | Sim | Sim | Sim | 100% |
(f) o valor de toda reversão de qualquer redução do valor dos estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34 | Sim | Sim | Sim | Sim | 100% |
Divulgações conforme CPC 16: | ALPARGATAS S.A. | CAMBUCI S.A. | GRENDENE S.A. | VULCABRAS/ AZALEIA S.A. | % Médio por item |
(g) as circunstâncias ou os acontecimentos que conduziram à reversão de redução de estoques de acordo com o item 34 | Não | Não | Não | Não | 0% |
(h) o montante escriturado de estoques dados como penhor de garantia a passivos. | Não | Não | Sim | Não | 25% |
% Média por empresa | 50% | 37,50% | 50% | 50% | 47% |
Fonte: Elaborado pelos autores.
Observa-se que, em média, apenas 47% das divulgações sobre os estoques determinadas pela norma foram apresentadas pelas companhias em suas notas explicativas, sendo que nenhuma das companhias da amostra apresentou mais de 50% das informações que deveriam ter divulgado.
A seguir apresenta-se a análise dos resultados para cada um dos oito itens de divulgação sobre os estoques obrigatórios, conforme o item 37 do CPC 16:
(a) as políticas contábeis adotadas na mensuração dos estoques, incluindo formas e critérios de valoração utilizados
Resultado: Neste item, somente uma das quatro companhias divulgou os critérios adotados para mensuração e os critérios de valoração utilizados, o que representa 25% do total da amostra, contudo ao afirmar que os registros são realizados pelo custo médio de aquisição ou produção, ajustados ao valor de mercado e por eventuais perdas quando aplicáveis, a companhia não citou se foi realizado este ajuste ao valor de mercado no período, bem como seu reflexo no resultado do exercício apresentado.
(b) o valor total escriturado em estoques e o valor registrado em outras contas apropriadas para a entidade
Resultado: Neste item, todas as companhias divulgaram adequadamente a informação, ou seja, 100% do total da amostra, segregando em contas diferentes para classificar mercadorias disponíveis para venda, em processo de produção, em importação e matérias-primas.
(c) o valor de estoques escriturados pelo valor justo menos os custos de venda
Resultado: Neste item, nenhuma das quatro companhias divulgou o valor de estoques a valor justo, não tendo apresentado justificativas da não adoção deste procedimento. A companhia ALPARGATAS S.A. afirmou que seus estoques são ajustados a valor de mercado quando aplicável, porém não especificou se, no exercício em tela, foi efetuada esta avaliação e qual seu reflexo no resultado.
(d) o valor de estoques reconhecido como despesa durante o período
Resultado: Neste item, apenas uma das quatro companhias divulgou os valores reconhecidos como despesa no exercício decorrentes da baixa dos estoques vendidos, representando apenas 25% do total da amostra.
(e) o valor de qualquer redução de estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34
Resultado: Neste item, todas as companhias divulgaram adequadamente a informação em relação ao valor das provisões para perda, porém poucas explicações foram dadas sobre os critérios e a metodologia aplicados pelas companhias para o registro destas perdas.
(f) o valor de toda reversão de qualquer redução do valor dos estoques reconhecida no resultado do período de acordo com o item 34
Resultado: Neste item, 100% do total da amostra das companhias divulgaram adequadamente os valores das reversões registradas, porém nenhuma delas teceu esclarecimentos sobre os critérios utilizados para subsidiar estes registros.
(g) as circunstâncias ou os acontecimentos que conduziram à reversão de redução de estoques de acordo com o item 34
Resultado: Neste item, nenhuma companhia forneceu explicações nas notas explicativas sobre os procedimentos que originaram as reversões registradas em suas demonstrações contábeis.
(h) o montante escriturado de estoques dados como penhor de garantia a passivos
Resultado: Neste item apenas 25% da amostra, representando uma companhia, citou a inexistência de ônus sobre seus estoques.
Observou-se, nesta análise das informações apresentadas pelas companhias, a predominância do cumprimento dos aspectos de divulgação numérica dos valores de cada companhia, não sendo apresentadas maiores informações sobre as políticas de mensuração, as circunstâncias ou acontecimentos que deram origem à reversão de redução de estoques e eventuais restrições destes ativos por penhor ou garantia a terceiros.
Em relação às divulgações das classificações das contas de estoque, observou-se que as quatro companhias atenderam ao exigido no item 37 do CPC 16, sendo que as classificações comuns entre elas foram: i) produtos acabados, ii) produtos em elaboração, iii) matérias- primas, iv) importações em andamento e v) perdas estimadas. Apresenta-se, na tabela 4, a seguir o conteúdo descritivo das notas explicativas das companhias analisadas.
Tabela 4: Detalhamento das Notas Explicativas
Companhia | Nota Explicativa Divulgada |
Alpargatas S.A. | São registrados pelo custo médio de aquisição ou produção, ajustados ao valor de mercado e por eventuais perdas, quando aplicável. As contas que formam o grupo de estoque são: produtos acabados, produtos em processo, matérias-primas, importações em andamento, outros e provisão para perdas dos estoques. A movimentação da provisão para perdas nos estoques foi demonstrada. |
Cambuci S.A. | As contas que formam o grupo de estoque são: produtos acabados, produtos em elaboração, matérias-primas, importações em andamento e matérias-primas em trânsito. Os gastos com importações em andamento estão relacionados, principalmente, às operações de aquisição de matéria-prima e produtos acabados da companhia. Os estoques estão segurados contra incêndio. Sua cobertura é determinada em função dos valores e grau de riscos envolvidos. A Companhia tem como política avaliar mensalmente o giro dos estoques e, para os itens de baixa rotatividade ou obsoletos, são constituídas provisões com perdas. A classificação das perdas por obsolescência no resultado é apresentada em outras despesas operacionais. A movimentação da provisão obsolescência foi demonstrada. |
Grendene S.A. | As contas que formam o grupo de estoque são: calçados, móveis, insumos e componentes, matérias-primas, materiais de embalagem, materiais intermediários e diversos, mercadoria para revenda, matrizes e ferramentais, adiantamento a fornecedores, importações em andamento, estoque em poder de terceiros, perdas estimadas para ajuste dos estoques obsoletos. A movimentação das perdas estimadas para ajuste dos estoques obsoletos foi demonstrada. Não há quaisquer ônus reais, garantias prestadas e/ou restrições à plena utilização dos estoques. |
Vulcabras/Azaleia S.A. | As contas que formam o grupo de estoque são: produtos acabados, produtos em elaboração, matérias-primas, importações em andamento, mercadorias em trânsito e material de embalagem e almoxarifado. Critérios de mensuração da provisão (impairment) - As sociedades controladas, com base em análise histórica e estimativa de perdas, constituem provisão para perdas na realização de estoques. Nos estoques de matérias-primas e produtos em elaboração foi provisionada a totalidade dos itens sem movimentação há mais de 180 dias. Nos estoques de produtos acabados foram avaliados todos os itens e provisionadas as potenciais perdas frente às perspectivas de venda de cada um deles, efetuando a provisão de 100% dos itens que apresentaram margem de contribuição negativa. Foram demonstrados os valores com a provisão para perdas de produtos acabados, a provisão para perdas sobre as matérias-primas e a provisão para perdas de produtos em elaboração. O valor de matéria-prima, mão de obra e custos indiretos de fabricação utilizados na composição dos custos de produtos vendidos foi informado. A movimentação da provisão para perdas na realização do estoque foi demonstrada. |
Fonte: Adaptado do site da BM&FBovespa (2016).
Neste sentido, algumas companhias apresentaram maior abertura no detalhamento de suas contas de estoques que outras, de acordo com as peculiaridades de cada uma, o que não prejudica a análise e a comparabilidade concernente aos itens principais acima destacados.
Todavia, observou-se que a ausência de uniformidade nas divulgações evidencia de fato dificuldades no entendimento da situação dos estoques das companhias, corroborando com o entendimento de Iudícibus (2017) sobre a assimetria informacional.
Esta análise corrobora também com os achados de Xxxxx et al. (2014) que apontaram serem baixos os índices médios de comparabilidade concernentes aos estoques (CPC 16), sendo confirmado que, mesmo entre companhias do mesmo setor operacional sujeitas às mesmas normas contábeis, a comparabilidade das informações dos estoques destas companhias fica prejudicada pela ausência de divulgações conforme a norma contábil aplicável.
A companhia VULCABRAS/AZALEIA S.A. teceu comentários maiores em suas notas explicativas sobre os critérios de mensuração das perdas registradas em seus estoques, especificando também os valores de custo atribuídos ao resultado do período em face das
baixas dos produtos vendidos, contudo não teceu comentários sobre os critérios utilizados para mensuração dos estoques em si que se encontram registrados em seus ativos.
A companhia CAMBUCI S.A. divulgou que adota, como critério, avaliação mensal do giro dos estoques, constituindo provisão para perda para itens de baixa rotatividade, sem especificar em qual proporção ou determinar o que entende por baixa rotatividade. Informou que os seus estoques são segurados contra incêndio, sem mencionar, no entanto, os montantes destas coberturas vigentes na data da publicação das demonstrações contábeis. Não divulgou também os critérios de mensuração aplicados ao saldo existente em estoques. Em relação aos gastos com importações em andamentos, ela foi a única a comentar com quais operações estes gastos estão relacionados.
A companhia GRENDENE S.A. limitou-se a comentar sobre a inexistência de ônus reais e garantias e/ou restrições sobre os saldos de estoques, não fazendo qualquer menção aos critérios de mensuração adotados, à existência de seguros ou procedimentos de avaliação adotados para perdas.
A companhia ALPARGATAS S.A., por sua vez, limitou-se a afirmar que seus estoques “são registrados pelo custo médio de aquisição ou produção, ajustados ao valor de mercado e por eventuais perdas, quando aplicável”, não especificando se realizou ou não, durante o período, tais mensurações a valor de mercado e quais seus impactos no resultado e no saldo dos estoques apresentados, também não forneceu informações sobre eventuais ônus, garantias ou sobre seguros contratados para estes ativos.
A análise das divulgações sobre os estoques das companhias que compõem a amostra revela que pouca atenção foi dada aos aspectos qualitativos da informação em conformidade como o CPC 16 e CPC 00, restando sem respostas várias questões que poderiam ser levantadas sobre estes ativos pelos usuários destas informações, com base no pressuposto da comparabilidade entre estas empresas e outras que adotam as mesmas normativas contábeis em outros países.
5 Considerações Finais
Este estudo teve por objetivo analisar a conformidade das divulgações sobre estoques das companhias listadas na Bolsa de Valores-B3, especificamente as classificadas como componentes do setor de consumo cíclico-calçados no ano de 2016.
Os resultados revelaram que, em média, apenas 47% das divulgações exigidas pela norma contábil inerente aos estoques foram apresentadas pelas companhias em suas demonstrações contábeis, sendo as informações referentes aos valores dos estoques e suas classificações as mais divulgadas, enquanto as informações sobre os critérios de mensuração, a existência de ônus e/ou restrições e a existência de seguros e seus montantes foram pouco mencionados pelas companhias.
Todavia, confirmou-se que a ausência de uniformidade nas divulgações dificulta o entendimento da situação dos estoques das companhias, corroborando com o entendimento de Iudícibus (2017) sobre a assimetria informacional.
Para futuras pesquisas, sugerimos analisar companhias de outros setores com ações listadas na BM&FBovespa, comparando o nível de divulgação entre todas as companhias listadas nestes setores. Outra oportunidade seria comparar as divulgações sobre os estoques de empresas do setor de calçados de outros países que adotam as normas internacionais de contabilidade para testar a comparabilidade entre as empresas deste setor em nível internacional.
Referências
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