ACÓRDÃO
1ª Secção da Câmara do Trabalho
ACÓRDÃO
REC. N.º 610/17
OS JUÍZES DA CÂMARA DO TRABALHO DO TRIBUNAL SUPREMO ACORDAM EM CONFERÊNCIA, EM NOME DO POVO:
I - RELATÓRIO.
Na 3.ª Secção da Sala de Trabalho do Tribunal Provincial de Luanda, A Comissão Sindical e representativa dos Trabalhadores da
., sito na cidade de Luanda, com sede na Rua da Missão, n.º 123, 9.º andar, vieram intentar a Acção de Despedimento Colectivo contra a Empresa
, com sede na Rua da Missão, n.º 123, 9.º
andar, pedindo:
1. "Que a Requerida seja condenada a reconhecer os direitos dos trabalhadores e a actualizar a tabela salarial;
2. A condenação da Requerida nos trabalhos, até à data que vier a ser declarada como cessação da relação jurídico-Xxxxxxx;
3. A condenação da Requerida a cumprir as normas existentes quanto ao despedimento colectivo de trabalhadores;
4. A condenação da Requerida a passar à reforma os trabalhadores que legalmente estão em condições para o efeito.
5. A condenação da Requerida a pagar de forma actualizada e com retroactivos os impostos de segurança social;
6. A condenação da Requerida nas indemnizações condignas, a serem fixadas em execução de sentença;
7. A condenação da Requerida nas custas do processo e em procuradoria condigna aos mandatários dos Requerentes, no valor de AKZ 400.000,00 (quatrocentos mil kwanzas)."
Para sustentar a sua petição, os Requerentes arrolaram os seguintes factos:
“A Requerida é uma empresa em liquidação, por decisão do Estado angolano, na qualidade de accionista;
Para efectivar os desejos dos accionistas, foi criada uma Comissão Liquidatária, que teria, de entre outras actividades, a gestão do passivo e activo da empresa, bem como o relacionamento da empresa com os trabalhadores;
Tendo em conta a necessidade de chegar a um acordo amigável do termo da relação jurídico-Iaboral, a Requerida firmou um acordo com a Requerente (doc. 1);
De entre as várias questões reflectidas no acordo, está a regularização da tabela salarial de acordo com a vigente no país, pagamento dos salários em atraso, regularização do IRSS, bem como ao pagamento dos créditos existentes e a passagem de declarações de contagem de tempo e de comportamento;
Contrariando o acordo, a Requerida decidiu unilateralmente fazer valer a sua vontade, não reajustando os salários e não passando os trabalhadores à reforma em acto contínuo;
Logo após o acto negocial, a Requerida fez publicar no Jornal de Angola um anúncio em que manda os trabalhadores procederem ao levantamento dos documentos sobre o final de contrato;
A Requerida, mesmo só a partir de Julho de 2010, decidiu passar os documentos de cessação do vínculo laboral e passagem à reforma, o que se pode concluir que até antes da presente data mantinha o vínculo com os trabalhadores. Todavia, a
Requerida não pretende pagar os salários em dívida até à presente data nem as dívidas com a Segurança Social;
O Estado, na qualidade de accionista, decidiu indemnizar os trabalhadores e a Requerida chegou a solicitar ao Ministro da Finanças, Dr. Xxxxx Xxxxxx, a actualização salarial e o pagamento da diferença existente;
O Estado fez depositar na conta da Requerida o valor de AKZ 144.942.680,10 (cento e quarenta e quatro milhões, novecentos e quarenta e dois mil, seiscentos e oitenta kwanzas e dez cêntimos);
O dinheiro em referência foi usado no exclusivo interesse dos administradores, fazendo a seguinte distribuição:
-
- 7.046.142,02;
-
-
-
, 7 anos de serviço, recebeu AKZ 8.664.943,00;
, 7 anos de serviço, recebeu AKZ
, 7 anos de serviço, recebeu AKZ 7.046.142,02;
, 7 anos de serviço, recebeu AKZ 7.046.142,02;
, 7 anos de serviço, recebeu AKZ 7.042.142,00.
Em contrapartida, a Requerida atribuiu indemnizações de miséria aos trabalhadores, a título de exemplo:
- , 22 anos de serviço, receberia AKZ 603.453,00;
- , 13 anos de serviço, receberia AKZ 430.180,00;
- , Directora de Finanças, 31 anos de serviço,
receberia AKZ 4.356.934,00;
- ,20 anos de serviço, receberia AKZ 172.125,00;
Os dois quadros ilustram claramente como é que o dinheiro dado pelo Estado para indemnizar os trabalhadores estaria a ser usado mais a proveito da Comissão Liquidatária do que a favor dos trabalhadores.
Os trabalhadores sentem a necessidade de actualização da tabela salarial, porque a tabela actual não reflecte a realidade do país, a título de exemplo:
Quadro salarial de 2001
1. Director, salário mensal: AKZ 2.933,00;
2. Técnico superior de 1.ª classe: AKZ 2.078,00;
3. Chefe de departamento: AKZ 1.956,00;
4. Chefe de sector: AKZ 1.589,00;
5. Técnico médio de 1.ª classe: AKZ 1.467,00;
6. Técnico básico de 1.ª classe: AKZ 856,00;
7. Escriturário de 1.ª classe: AKZ 795,00;
8. Empregada de limpeza: AKZ 489,00;
9. Empregada de campo: AKZ 581,00.
Quadro salarial de 2003/4/5
10. Director, salário mensal: AKZ 44.435,00;
11. Técnico superior de 1.ª classe: 31.474,00;
12. Chefe de departamento: AKZ 29.623,00;
13. Chefe de sector: AKZ 24.069,00;
14. Técnico médio de 1.ª classe: AKZ 22.281,00;
15. Técnico básico de 1.ª classe: AKZ 13.600,00;
16. Escriturário de 1.ª classe: AKZ 8.798,00;
17. Empregada de limpeza: AKZ 6.800,00;
18. Empregada de campo: AKZ 5.276,00.
A Requerida não só não actualizou os salários, como não pretende pagar as indemnizações nos termos do previsto na Lei Geral de Trabalho.
Com vista a uma justa indemnização, a comissão representativa elaborou o mapa actualizado de salários".
Juntaram vários documentos - 8 a 33.
Notificada regularmente, a Requerida contestou (fls. 38-42), nos seguintes termos:
“A sociedade comercial há muito deixou de ter, parcialmente, existência jurídica a partir da data em que, por decisão do Conselho de Ministro da 2.ª República, isso no ano de 2004, decidiu pela sua extinção.
E para assegurar a gestão corrente da empresa, determinar o activo e passivo para pagamento de eventuais dívidas, no mesmo ano (2004) foi criada, por Xxxxxxxx do Ministro das Finanças, a Comissão Liquidatária que conduziu o processo até liquidação total da empresa.
A relação laboral foi formalmente extinta em Abril de 2009, data em que a Comissão Xxxxxxxx assinou a acta da última reunião negocial onde foram apresentadas as propostas para a finalização do processo e consequente início do pagamento de todas as indemnizações, cujo processo teve o seu fim no ano de 2010.
Da impugnação do Valor da Causa
O valor da causa indicado pelos Requentes foi fixado arbitrariamente, sem atender os critérios objectivos previstos na lei para a sua fixação.
Entretanto, atendendo ao facto de que os Requerentes já receberam a totalidade das indemnizações e compensações, a acção já não tem a utilidade económica do pedido, aliado ao facto de que a empresa há mais de 4 anos está extinta; ao abrigo do previsto no n.º1 do art.º315.º do CPC, deverá o Meritíssimo Juiz fixar o valor que considere adequado.
Por Excepção-Prescrição do Direito
A relação jurídico-Iaboral foi extinta em Abril de 2009, data em que se determinou o pagamento do último salário, tal como previsto na Acta da última Sessão Negocial (doc. 1, n.º5).
Ao abrigo do referido documento, a Comissão Sindical e representativa dos trabalhadores aceitou a proposta apresentada pelo Governo e, como consequência do entendimento obtido, em Novembro de 2009 deu-se início ao pagamento das indemnizações e compensações, conforme se pode provar através da informação oportunamente prestada aos ora Requerentes (vide penúltimo parágrafo doc. 1 e doc. 2).
Ao mesmo tempo, foi publicado no Jornal de Angola, jornal de maior circulação no país, um comunicado dando conhecimento do facto (doc. 3).
Portanto, desde Abril de 2009 até 2013 passaram mais de 4 anos sobre a data em que se extinguiu a relação jurídico-Iaboral e consequente pagamento das indemnizações.
Os prazos de prescrição e de caducidade de acção para a reintegração estão bem recortados nos art.ºs 300.º e 301.º da Lei Geral do Trabalho em vigor.
Como consequência da factualidade alegada e dos documentos juntos, o direito dos Requerentes já prescreveu.
Ao abrigo do disposto no art.º496.º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo laboral, a prescrição constitui excepção peremptória e importa a absolvição total do pedido.
No entanto, sem prescindir da defesa; por impugnação
Nos termos da acta da última reunião, a partir do mês de Abril de 2009 foi extinta a relação jurídico-Iaboral e consequentemente foi dado início ao processo de pagamento das indemnizações e compensações (idem doc. 1 ).
Os ora Requerentes aceitaram as propostas apresentadas e, como prova disso, a mesma foi assinada por todos e como consequência directa os Requerentes
receberam todas as remunerações a que tinham direito (vide doc. 1, pág. 3, último parágrafo).
Inclusive, em reconhecimento da contribuição dada pelos Requerentes ao longo dos tempos, ao valor das indemnizações foi acrescido um montante equivalente a 3,5 vezes o valor legal determinado, a título de compensações (doc. 1, pág. 2. n.º 2) .
Portanto, é desprovido de fundamentos de facto e de direito o alegado pelos Requerentes.
Ademais, para a reforma só foram instruídos os processos dos trabalhadores que à data tinham idade para o efeito.
Os demais factos dispensam comentários, pois, ao abrigo do disposto no art.º 490.º n.º 1, última parte, estão em manifesta oposição com a defesa considerada como um todo.
Isenção de Pagamento de Preparos e Custas Judiciais
A extinta empresa , foi uma empresa de capitais públicos, desde 2004
considerada tecnicamente falida e sem recursos financeiros.
Desde 2004 que não exerce qualquer actividade comercial, não tem património próprio e receitas próprias, todas as despesas pagas com as indemnizações e compensações tiveram suporte no Orçamento Geral do Estado.
Assim, uma vez extinta a , a Comissão Liquidatária carece de receitas para
o pagamento dos preparos e custas que vierem a ser contadas no processo, pelo que procede a devolução das guias emitidas."
Juntou procuração legal e vários documentos (fls. 43 a 48).
Em seguida, foi ordenada a notificação dos Requerentes para que se pronunciassem sobre as excepções suscitadas pela Requerida.
E, em resposta, os Requerentes afirmaram não proceder nenhuma das excepções invocadas, pois não há nos autos documento algum que comprove a rescisão dos contratos de trabalho, muito menos sentença que declare a falência da empresa (fls. 55).
Seguiram-se os demais termos processuais até à prolação do Despacho Saneador- Sentença.
Proferido o Despacho Saneador-Sentença, a acção foi julgada improcedente e a Requerida foi absolvida dos pedidos (fls.57-59).
Notificados da decisão (fls. 61), inconformados, os Requerentes interpuseram o recurso de apelação, que mereceu deferimento a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (fls. 64).
Cumpridas as formalidades legais, foram os autos remetidos para esta instância.
Nesta instância, distribuído o processo e elaborada a revisão, foi proferido o despacho preliminar e ordenado prazo para a apresentação das alegações (fls. 71 ).
No Tribunal ad quem, os Apelantes ofereceram as alegações (fls. 79-80), com as conclusões que passamos a transcrever:
1. "Em momento algum os Recorrentes tomaram conhecimento do documento que extingue a relação jurídico-Iaboral e que o Tribunal não se pronunciou quanto a esta questão;
2. A Recorrida, ao não ter entregado os valores devidos aos Recorrentes, como faz menção a acta da última sessão negocial, realizada no dia 28 de Abril de 2009, faz com que os contratos não fossem extintos, daí a prescrição não se operar e através da interrupção inutiliza o prazo da prescrição;
3. De igual modo, o Tribunal a quo, ao não respeitar que houvesse uma decisão de falência de um Tribunal competente, devido à caducidade, viola claramente a Constituição e a Lei;
4. Quem se arroga um direito tem a obrigação de provar, sob pena de recair a favor dos Recorridos, ou seja, não vale a inversão do ónus da prova;
5. A Recorrida, ao ter realizado os exames médicos de demissão, viola claramente a norma imperativa;
6. O Tribunal a quo, através do Juiz da causa, ao não ter assinado as fls. do saneador- sentença, faz com que seja nula;
7. O Tribunal a quo andou mal por ter julgado improcedente a presente acção, determinando a absolvição total do pedido;
8. Quanto à Recorrida, não cumpriu a regularização da reforma, pagamentos das indemnizações e dos certificados dos trabalhos."
O processo seguiu com vista para o Mº.Pº., que promoveu no sentido de se notificar a Apelada para a apresentação das contra-alegações, nos termos do art.º705.º do CPC (fls. 81v).
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
- Objecto do Recurso.
Sendo o âmbito e o objecto do recurso delimitados, para além das meras razões de direito e das questões de conhecimento oficioso, pelas conclusões formuladas pelas partes (art.os 660.º, n.º 2; 664.º; 684.º, n.º 3; e 690.º, n.º 1, todos do CPC), emergem como questões a apreciar e decidir sabermos se:
1. O facto de o Juiz da causa não ter assinado as folhas do Despacho Saneador- Sentença constitui nulidade da sentença, violando a aI. a) do n.º1 do art.º668.º do CPC;
2. O Tribunal "a quo" pronunciou-se ou não sobre a extinção da relação jurídico-Iaboral, violando a aI. d), n.º 1, do art.º668.º do CPC;
3. O Despacho Saneador-Sentença recorrido violou ou não o prazo da prescrição dos contratos;
4. O Tribunal "a quo" andou mal ou não por ter julgado improcedente a presente acção, determinando a absolvição total do pedido.
II- FUNDAMENTAÇÃO.
A sentença recorrida julgou como provado os seguintes factos:
“Julgamos haver apoio nos argumentos invocados pela parte requerida, porquanto compulsado o processo face à questão suscitada, verificamos que efectivamente a relação jurídico-Iaboral que vigorou entre as partes cessou a 28 de Abril do ano de 2009, conforme se pode observar do documento junto aos de fls. 43 a 48, tendo os requerentes proposto a presente Acção apenas a 15 de Maio do ano 2013, isto decorrido mais de um ano contado do dia seguinte àquele em que o contrato trabalho cessou."
- Decidindo.
1. Quanto à questão de sabermos se o facto de o Juiz da causa não ter assinado as folhas do Despacho Saneador-Sentença constitui nulidade da sentença, violando a aI. a) do n.º1 do art.º668.º do CPC, afirmamos:
A este propósito, os Apelantes alegam que "o Tribunal a quo, através do Juiz da causa, ao não ter assinado as folhas do saneador-sentença, faz com que seja nula a sentença".
Entretanto, no Despacho Saneador-Sentença recorrido é possível contemplar (fls. 57 a 59) a rubrica da Mm.ª Juíza nas duas primeiras folhas, bem como a assinatura da mesma no final da Sentença.
De que lado está a razão?
Estabelece a) do n.º 1 do art.º668.º CPC que:
1. É nula a sentença:
a) Quando não contenha a assinatura do juiz.
Vejamos, agora, se a Sentença sob recurso é nula.
As causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enunciadas no n.º 1 do art.º668.º do CPC, no qual se estabelece que é nula a sentença quando não contenha a assinatura do juiz (aI. a).
O Prof. Castro Mendes (in Direito Processual Civil, Vol. III, pág. 297), na análise dos vícios da sentença, enumera cinco tipos:
- Vícios de essência;
- Vícios de formação;
- Vícios de conteúdo;
- Vícios de forma;
- Vícios de limites.
Refere o mesmo Professor (ibidem, pág. 308) que uma sentença nula "não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia".
Para o Professor Xxxxx xx Xxxxxxx (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, págs. 668 e 669), "apenas a ’falta de assinatura do juiz’ constitui fundamento de nulidade, pois trata- se de um requisito de forma essencial. O acto nem sequer tem a aparência de sentença, tal como não tem a respectiva aparência o documento autêntico e o documento particular não assinados".
A respeito das demais situações previstas na norma, considera o mesmo autor tratar-se de "anulabilidade" da sentença e respeitam "à estrutura ou aos limites da sentença".
Entretanto, no entender do Professor Xxxxxxx xxx Xxxx (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, págs. 137 e 138, Coimbra, 1984), as omissões previstas no n.º 1 do art. 668.º, como as outras omissões e vícios aí contempladas, constituem não causas de inexistência da sentença, mas causas de meras nulidades sanáveis.
Para este Professor, o meio idóneo para reagir contra as nulidades da sentença é o estabelecido no art. 669.º; a parte não pode servir-se do recurso para fazer suprir ou reparar, directamente, as nulidades de sentença, há-de argui-las perante o Tribunal que as cometeu, por meio da reclamação pelo art.º669.º; a decisão proferida sobre esta reclamação é que pode ser objecto de recurso.
Com efeito, compulsados os autos, constatamos que as páginas do Despacho Saneador- Sentença se encontram devidamente rubricadas e assinadas na parte final pela Mm.ªJuíza da causa (vide fls. 57 a 59).
Contudo, ainda que existisse tal omissão, o n.º2 do art.º668.° afirma que a mesma pode ser suprida oficiosamente ou a requerimento de qualquer das partes, enquanto for possível colher assinatura do juiz que proferiu a decisão, o que dá ensejo ao Tribunal responsável pela nulidade para que supra o vício, completando ou corrigindo a sentença.
Pelo exposto, é nosso entendimento que a aludida questão está desprovida de suporte fáctico, daí que improcede nesta parte o recurso.
2. Quanto à questão de sabermos se o Tribunal "a quo" se pronunciou ou não sobre a extinção da relação jurídico-Iaboral, violando a aI. d), n.º 1, do artº668.º do CPC.
Neste sentido, os Apelantes afirmam que "em momento algum os Recorrentes tomaram conhecimento do documento que extingue a relação jurídico-Iaboral e que o Tribunal não se pronunciou quanto a esta questão".
Por outro lado, no Despacho Saneador-Sentença recorrido, a Mm.ª Juíza referiu- se a esta questão da seguinte forma: "Julgamos haver apoio nos argumentos invocados pela parte requerida, porquanto compulsado o processo face à questão suscitada, verificamos que efectivamente a relação jurídico-Iaboral que vigorou entre as partes cessou a 28 de Abril do ano de 2009, conforme se pode observar do documento junto a fls. 43 a 48, tendo os requerentes proposto a presente Acção apenas a 15 de Maio do ano de 2013, isto decorrido mais de um ano contado do dia seguinte àquele em que o contrato de trabalho cessou."
A este propósito, vejamos:
Afirmam os Apelantes que em momento algum os mesmos tomaram conhecimento do documento que extingue a relação jurídico-Iaboral e que o Despacho Saneador-Sentença recorrido padece de nulidade por omissão de pronúncia, conforme o n.º 1, aI. d), do art.º668.º do CPC.
O vício em causa está relacionado com a norma que disciplina a "ordem de julgamento" (art.º660.º n.º2).
Entretanto, tratando-se de despedimento colectivo, para a doutrina, é necessário que a extinção ou transformação dos postos de trabalho afecte o emprego de 5 ou mais trabalhadores, é necessário que a extinção seja feita simultaneamente e que o fundamento invocado seja o elemento unificante que reconduz a cessação daquela pluralidade de vínculos a um fenómeno homogéneo, regulado pela lei bloco.
Apesar de abranger uma pluralidade de trabalhadores, deve ser emitida uma declaração a cada trabalhador cujo contrato cessa e comunicada a intenção à Inspecção-Geral do Trabalho, observando-se o procedimento referido no art.º239.º da LGT. Há um motivo comum que determina a extinção individual de vários vínculos laborais.
O recurso ao despedimento colectivo com base em motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais não será só admitido em situações limite, como no caso de risco iminente de falência da empresa. Logo, não cabe ao tribunal apreciar o mérito das decisões do empregador, porque o empresário é livre de empreender um caminho ruinoso - vide Xxxxxxxx Xxxxxx (in Os Despedimentos à Luz da Nova Lei Geral do Trabalho), pág. 184, 1.ª ed., Outubro, 2015.
Do acima exposto, é nosso entendimento que a Apelada devia emitir uma declaração a cada trabalhador cujo contrato tenha cessado, cumprindo assim o estipulado legalmente. Porém, uma vez assinada a acta, na qual concordaram em considerar o mês de Abril como o último mês para pagamento de salários, os integrantes da Comissão Sindical e representativa dos trabalhadores implicitamente anuíram a cessação do vínculo contratual.
Destarte, fica patente que os trabalhadores tomaram conhecimento do documento que extinguiu a relação jurídico-Iaboral, considerando-se procedente os despedimentos.
Aliás, somos de entendimento que no caso a acta deve ser considerada documento idóneo, pois, caso contrário não faria sentido criar-se uma Comissão Sindical e representativa dos trabalhadores para o efeito.
De que lado está a razão? Vejamos:
Dispõe a aI. d) do art.º668.º do CPC que a sentença é nula quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito que o Juiz na Sentença "deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras".
Ora, como salienta o Prof. Xxxxxxx xxx Xxxx (in CPC Anotado, Vol. V, pág. 143):
“Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. º664.º) e, uma vez tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas".
Entretanto, no caso em apreço, a Mm.ª Juíza abordou, e bem, a questão da extinção da relação jurídico-Xxxxxxx, pois há muito o direito dos Apelantes havia prescrito, por terem intentado tardiamente a competente acção para o pagamento de indemnizações e compensações, conforme o previsto no n.º2 do art.º300.º da LGT.
Em suma, somos afirmar que o facto de a Mm.ª Juíza julgar procedente a questão da prescrição permitiu, e bem, que o Tribunal considerasse despiciendo conhecer da questão da extinção da relação jurídico-Iaboral, pois, julgada procedente a excepção peremptória, o Tribunal jamais podia conhecer da questão de mérito conforme estabelece a aI. b) do art.º510.º do CPC, conjugado com o n.º2 do art.º660º do mesmo diploma.
Destarte, não deve ser acolhida a questão suscitada.
3. Quanto à questão de sabermos se o Despacho Saneador-Sentença recorrido violou ou não o prazo da prescrição dos contratos, diremos:
Quanto a está questão, os Apelantes defendem que "a Recorrida, ao não ter entregado os valores devidos aos Recorrentes, como faz menção a acta da última sessão negocial, realizada no dia 28 de Abril de 2009, fez com que os contratos não fossem extintos, daí a prescrição não se operar e através da interrupção inutiliza o prazo da prescrição".
Já no Despacho Saneador-Sentença recorrido, a Mmª julgou "haver apoio nos argumentos invocados pela parte requerida, porquanto compulsado o processo face a questão suscitada, verifico que efectivamente a relação jurídico-Xxxxxxx que vigorou entre as partes cessou a 28 de Abril do ano de 2009, conforme se pode observar do documento junto aos de fls. 43 a 48, tendo os requerentes proposto a presente Acção apenas a 15 de Maio do ano 2013, isto decorrido mais de um ano contado do dia seguinte àquele em que o contrato trabalho cessou.
Nesta conformidade, prescreveu o prazo para os requerentes reclamarem judicialmente indemnizações e compensações decorrentes da cessação do contrato de trabalho com a empresa requerida, de acordo com os termos previstos no art.º300.º da LGT."
Da leitura atenta dos autos, primeiro vislumbramos no R.I (fls. 4, 4.º parágrafo) que os Requerentes ora Apelantes admitiram que "a Requerida mesmo só a partir Julho de 2010 decidiu passar os documentos de cessação do vínculo laboral e respectiva passagem à reforma, que se pode concluir que até antes da presente data se mantinha o vínculo com os trabalhadores".
Entretanto, na acta da última sessão negocial (fls. 46, 5.º ponto), considerou-se o mês de Abril como último mês de pagamento dos salários, o que foi aceite e assinado pela Comissão Sindical, conforme documento citado.
Resulta do n.º1 do art.º300.º da LGT que "todos os créditos, direitos e obrigações do trabalhador ou do empregador, resultantes da celebração e execução do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, extinguem-se por prescrição, decorrido um ano, contado do dia seguinte àquele em que o contrato cesse.”
Sendo a prescrição a forma de extinção de um direito pelo seu não exercício por um dado lapso de tempo fixado na lei, o que varia de caso para caso, encontram- se excluídos da prescrição apenas os direitos indisponíveis e todos isentos expressamente pela lei.
O n.º2 do art.º298.º do CC estipula que, quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
A lei estabelece com clareza a distinção entre prescrição e caducidade, pelo que respeita os respectivos âmbitos de aplicação.
O Prof. Xxxxxx xx Xxxxxxx definia caducidade como "instituto por via do qual os direitos potestativos se extinguem pelo facto de o seu não exercício prolongado por certo tempo" (in Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Almedina, 1964, pág.463).
A caducidade seria, portanto, aplicável aos direitos potestativos, enquanto a prescrição se aplicaria aos restantes direitos subjectivos.
No caso vertente, quanto à acta negocial que serviu para determinar a extinção da relação jurídico-Iaboral com os Apelantes, datada de 28 de Abril de 2009, à publicação da lista para indemnizações e compensações dos trabalhadores remetida para o Jornal de Angola, a 20 de Novembro de 2009, os Requerentes no seu R.I admitiram que "a Requerida mesmo só a partir Julho de 2010 decidiu passar os documentos de cessação do vínculo laboral” e apenas vieram interpor a acção a 15 de Maio de 2013, isto é, passados mais de dois anos sobre o conhecimento dos factos, atropelando o estabelecido no art.º300.º da LGT.
Dado que a prescrição se opera desde o momento do conhecimento da cessação dos contratos, independentemente do pagamento ou não dos créditos devidos, estamos em crer que prescreveu efectivamente o direito dos Apelantes solicitarem o pagamento dos mesmos.
Assim, não procede o recurso nesta parte. Bem andou o Tribunal "a quo".
Tendo em atenção o desfecho da 3.ª questão, o conhecimento da última fica prejudicado (art.º660.º n.º 2 CPC) ex vi do art.º59.º Dec. Exec. Conj. n.º 3/82 de 11 de Janeiro.
- Decisão:
Neste termos e fundamentos, os juízes desta Câmara acordam em julgar improcedente o recurso e, em consequência, manter a decisão recorrida.
Sem custas por imposição legal.
Luanda, 23 de Agosto de 2018 Tresa Buta
Xxxxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxx
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