A CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL
A CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL
Alunos: Xxxx Xxxxx e Ruan Fernandes Castello Orientadores: Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxxxxx Terra e Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx
Introdução
A prática de transferir a posição de contratante não é uma atividade moderna, pelo contrário. O instituto da cessão da posição contratual está presente no direito pátrio antes mesmo da vigência do Código Civil de 1916, a partir, por exemplo, da realização muito comum à época de transferência de clientela, que não cessava com a mera transmissão do estabelecimento comercial e aviamento1.
Muitas vezes, um dos contratantes deseja excluir-se integralmente de uma relação contratual já existente, a fim de transferir todos os seus direitos e obrigações oriundos de tal relação a um terceiro. Este, por sua vez, deseja assumir o contrato, para ocupar o lugar do contratante originário, passando a contrair todos os direitos e deveres provenientes daquela relação jurídica. E, para isso, a celebração do contrato de cessão da posição contratual é a forma mais célere e direta de se realizar a sua transferência.
De modo introdutório, pode-se dizer que o instituto consiste na transferência da posição contratual do cedente a um terceiro, que passa a ocupar o lugar daquele na relação jurídica. Conforme observa XXXXXX XXXX XXXXX, “[o] efeito típico principal da cessão de contrato, caracterizador da sua função económico-social, é a transferência da posição contratual, no estádio de desenvolvimento em que se encontrava no momento da eficácia do negócio, de uma das partes do contrato para outra” 2, verificando-se “a extinção subjectiva da relação contratual, quanto ao cedente” 3.
A despeito da sua relevância prática, grande parte dos sistemas jurídicos existentes ainda não disciplinam a cessão da posição contratual, e, no Brasil não é diferente. Mesmo havendo previsão em inúmeros dispositivos da legislação especial4, o Código Civil de 2002 ausentou-se de disciplinar especificamente a cessão de posição contratual. Tal ausência, todavia, não impede que inúmeros contratos sejam cotidianamente cedidos a terceiros, tornando ainda mais indispensável os esforços da doutrina e da jurisprudência para encontrar soluções jurídicas para os impactos gerados por este instituto.
Objetivos
Ao longo da pesquisa, desenvolvida durante o segundo semestre de 2020 e o primeiro semestre de 2021, o grupo conduziu estudos com a finalidade de analisar as interpretações conferidas pela doutrina e pela jurisprudência sobre o instituto da cessão de posição contratual. Foi conferido especial enfoque para (i) a análise das características fundamentais da cessão de posição contratual e (ii) a diferenciação da cessão da posição contratual com outros institutos, tais como a cessão de crédito e o subcontrato. Compreendidos tais parâmetros, buscou-se
1 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx; Cessão da Posição Contratual: estrutura e função. Revista Brasileira de Direito Civil, vol. 5, Rio de Janeiro, jul./set. 2015. p. 27.
2 XXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx da. Cessão da Posição Contratual. Coimbra: Livraria Almedina, 1982. p. 450.
3 XXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx xx. Cessão da Posição Contratual. Coimbra: Livraria Almedina, 1982. p. 450.
4 Conforme anota Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx, “a lei n.º 8.004/1990 dispõe sobre a transmissão do financiamento no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação, enquanto a Lei n.º 8.245/1991 (Lei de locações) expressamente regula a cessão da posição do contrato de locação, entre outras previsões legais” (XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx; Cessão da Posição Contratual: estrutura e função. Revista Brasileira de Direito Civil, vol. 5, Rio de Janeiro, jul./set. 2015. p. 28).
perceber, em um segundo momento, como tem se comportado a jurisprudência em relação à caracterização da cessão de posição contratual.
Metodologia
A pesquisa foi desenvolvida a partir de um cronograma dividido em duas fases. Na primeira, ocorreram encontros quinzenais nos quais analisaram-se textos doutrinários divergentes ou complementares sobre a cessão de posição contratual. Nesses encontros, cada pesquisador fazia breves comentários acerca dos textos encaminhados para, em seguida, iniciar- se um debate com questionamentos e propostas interpretativas.
Na segunda fase, com a bagagem teórica adquirida com as discussões e análise dos textos, passou-se ao exame de decisões judiciais proferidas a partir de 2010 por alguns dos principais tribunais brasileiros (STJ, TJRJ, TJSP, TJMG, TJPR e TJRS), os quais foram escolhidos por possuírem maior quantidade de julgados5. Assim, os julgados que mais chamaram a atenção do grupo foram adicionados a uma planilha, posteriormente encaminhada aos orientadores e, ao final, debatidos entre todos.
Resultados da Pesquisa
1. Noções Gerais acerca do instituto da Cessão da Posição Contratual
A cessão da posição contratual consiste na transferência, por uma das partes, de todos os seus direitos e obrigações, oriundos de um contrato, a um terceiro. Com isso, a partir do instrumento da cessão, o terceiro assume o contrato, ocupando o lugar do contratante originário e, assim, contraindo todos os direitos e obrigações provenientes daquela relação jurídica.
Nesse passo, o fenômeno de transmissão em análise consiste em um negócio jurídico tripartite6: em um dos lados se tem o sujeito que cede o contrato original (cedente); no outro, aquele que assume o contrato (cessionário); e, por fim, o sujeito que permanece no contrato, nos mesmos termos do contrato originário, com a única diferença da mutação subjetiva da contraparte (o cedido). O cedente sai de cena para que o cessionário passe a ocupar o seu lugar naquela relação jurídica, enquanto o cedido passa a ser contraparte de um outro sujeito.
O cedente transfere ao cessionário a sua integral posição jurídica, que consiste não somente na titularidade de um crédito ou no encargo de uma dívida, isoladamente considerados, mas em todo o conjunto de direitos e deveres, faculdades, poderes, ônus e sujeições derivados do contrato, ou seja, a sua posição contratual.
Em que pese o alto valor prático do instituto para a sociedade, o Código Civil de 2002 foi silente ao estabelecer as regras para a cessão da posição contratual. As soluções que se aplicam ao instituto, muitas das vezes, acabam resultando, consequentemente, da aplicação análoga das regras de outros institutos, em especial as que concernem à cessão de crédito e assunção de dívidas. Contudo, a cessão da posição contratual, por transferir direitos e deveres que vão além dos débitos e créditos, possui questões específicas que vão além do regramento de tais institutos análogos, sendo “uma forma de transmissão com alcance maior que uma cessão de crédito ou assunção de dívida, ainda que considerados conjuntamente”7.
5 A título de exemplo, o TJSP, em 2020, alcançou a marca de 4.352.289 processos julgados, sendo 3.320.002 sentenças em primeira instância e 1.032.287 decisões em segunda instância. Confira-se: xxxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/Xxxxxxxx/Xxxxxxx?xxxxxxXxxxxxxx00000. Acesso em 28.06.2021.
6 Nessa linha, Xxxxxx Xxxx Xxxxx anota: “Trata-se, destarte, dum tipo negocial, onde concorrem três declarações de vontade. Acresce a necessidade, no caso de adesão preventiva do cedido à transmissão da posição contratual, da notificação ou reconhecimento desta, sem o que a cessão não tem eficácia” (XXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx xx. Cessão da Posição Contratual. Coimbra: Livraria Xxxxxxxx, 0000. p. 72).
7 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Quartier Latin, 2019. p. 52.
As dívidas e os créditos transferidos estão conectados a uma situação jurídica mais ampla
– a posição contratual – e as regras referentes aos institutos análogos não levam em consideração a transmissão integral desse complexo de direitos e obrigações que advêm do contrato. Existem, no caso, dois distintos negócios jurídicos: (i) o contrato-base, aquele que contém a posição a ser transferida; e (ii) o contrato-instrumento, o qual transfere a posição contratual8.
O contrato-instrumento não surge com o propósito de transferir autonomamente os elementos individuais da relação contratual a um terceiro, mas de uma necessidade prática de se transferir a própria posição jurídica emergente da qualidade de parte no contrato, em todo o seu complexo, no estágio de desenvolvimento em que se encontra. Almeja-se atribuir a um terceiro, estranho à formação do contrato-base, todos os direitos e deveres que deste possam derivar, de forma célere e direta.
A relevância prática é notória. Diversos são os setores e indústrias que têm a necessidade de atribuir de forma direta a um terceiro toda essa gama de direitos e obrigações. Com a cessão da posição contratual, um contratante pode transferir a terceiros a sua posição em um negócio, seja almejando a realização de lucro, a redução dos seus riscos ou até mesmo a remediação de adversidades supervenientes à formação do contrato-base. Desse modo, a cessão possibilita que uma pessoa transfira a outrem seus créditos e débitos sem ter que desfazer o negócio jurídico inicial com o cedido, sempre com a autorização deste, e, ainda, sem ter de convencê-lo a reestabelecer os mesmos termos com um terceiro estranho ao contrato-base. Ou seja, a partir do contrato-instrumento, um único ato transmite toda a posição contratual de uma pessoa a outra, possibilitando a circulação do contrato em sua integralidade9.
Entende-se, portanto, que a cessão da posição contratual, como fenômeno de circulação que é, surge como um veículo para o fluxo das relações jurídicas. É uma exigência da vida comercial e não mera construção jurídico-teórica. Há a necessidade de se ter um instrumento pouco custoso, simples e seguro, sem a exigência de destravar o negócio já concluído e recompô-lo entre as novas partes – o que poderia levar a novas negociações, formalidades e custos.
Nesse sentido, “seja com ou sem regulamentação legislativa específica, o instituto existe por força das exigências da circulação econômica, mesmo porque não há vedação expressa no direito brasileiro”10. E, conforme já fora salientado, resolve problema prático na medida em que a cessão de crédito, mesmo que considerada conjuntamente com a assunção de dívida, não realiza a transferência integral da posição contratual: restam os deveres laterais, secundários ou acessórios, expectativa, ônus etc.
2. Natureza Jurídica da Cessão da Posição Contratual
Ante a ausência de regra expressa e específica quanto à cessão de posição contratual, em que apenas se prevê a cessão de créditos e a assunção de dívidas, a doutrina busca classificar a cessão do contrato em um dos institutos positivados. Consequentemente, surgiram diversas teorias para explicar a sua natureza jurídica.
São duas as principais correntes doutrinárias que merecem a nossa atenção, a saber: (i) a teoria atomística; e (ii) a teoria unitária.
Todavia, importante desde logo destacar que as teorias não formam blocos monolíticos, em que todos os autores que adotam uma ou outra são amparados. As teorias, “[e]xpostas por
8 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Quartier Latin, 2019. p. 53. 9 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxx, 0000. p. 54. 10 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Quartier Latin, 2019. p. 55.
autores diversos, grande maravilha seria se constituíssem, ambos os grupos, blocos monolíticos de doutrinas sem nuances diferenciais, consoante os seus formuladores”11.
2.1. Teoria Atomística ou da Decomposição
A teoria atomística, também conhecida como teoria da decomposição, conforme a própria denominação leva a entender, propõe a decomposição da cessão a fim de dissociar-se a transmissão dos créditos da transmissão dos débitos.
Aqueles que apoiam a teoria entendem que a posição contratual a ser cedida é composta de elementos ativos e passivos, que devem ser considerados de modo independente. Na cessão, transferem-se os dois elementos, decompondo-se a figura em uma junção de cessão de crédito e assunção de dívida. Estes dois institutos, juntos, atingiriam os efeitos que se pretende com a celebração da cessão.
Como já salientado, os autores que aderem à teoria atomística, todavia, não formam um grupo ou bloco monolítico, mas acabam encontrando certos desconcertos com os outros juristas que também a defendem12. Há determinados elementos comuns que, quando considerados, originam pensamentos autônomos, mesmo que dentro de uma só concepção da natureza jurídica do instituto.
Dentre as discordâncias, os juristas que defendem a teoria da decomposição encontram ponto em comum ao visualizarem na cessão de contratos uma combinação da cessão de créditos com a transferência dos débitos. A cessão da posição no negócio jurídico nada mais seria do que a soma de negócios autônomos, uma mera combinação de uma cessão global das dívidas e créditos oriundos do contrato.
“Essa teoria susta, assim, que a relação contratual em si não é transferível, mas pode ser fragmentada em créditos e débitos que podem, isoladamente, ceder-se.”13. Apenas quando ambos são transferidos para um mesmo sujeito é que este se torna titular da inteira relação jurídica originária.
Como consequência prática, entende-se que o cessionário não se torna parte do contrato cedido; torna-se apenas parte da relação contratual cedida – que não se confunde com o contrato em si –, assim como aqueles que assumem crédito ou dívida são tão somente parte de uma dessas relações14.
Entretanto, embora possível sobre o aspecto teórico, a teoria da decomposição viola frontalmente a vontade das partes (diga-se de passagem, o fundamento para a própria admissibilidade do instituto), pois decompõe um único ato negocial em duas vontades distintas. Desse modo, como anota XXXXXXXXX XXXXXX XXXXXX, a adoção da teoria atomística não expressaria adequadamente a ideia da cessão de contrato, “que supõe uma transmissão global e unitária de direitos e obrigações”15.
2.2. Teoria Unitária
Na investigação de uma adequada interpretação da cessão de contrato, a fim de suprir a ausência de completude da cumulação de uma cessão de crédito com assunção de dívidas, surge a teoria unitária16.
11 XXXX XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx da. Cessão da Posição Contratual. Coimbra: Livraria Xxxxxxxx, 0000. pp. 198- 199.
12 XXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Cessão da Posição Contratual. 2ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007, p. 57.
13 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxx, 0000. p. 57.
14 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxx, 0000. p. 58.
15 TELLES, Xxxxxxxxx Xxxxxx. Manual dos contratos em geral. Coimbra: Coimbra Editora, 2002. p. 453.
16 Xxxxxx Xxxxxxxxxx anota que os “maiores entusiastas [da teoria unitária] foram Siber na Alemanha (este inicialmente defensor da teoria atomística, tendo posteriormente mudado de posição) e Mossa e Puleo na Itália”. (XXXXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxx, 0000. pp. 62-63).
A corrente unitária afirma que a cessão não deve ser considerada como uma transferência singular de créditos e débitos, mas como uma transferência em bloco, na qual não se distinguem elementos passivos e ativos do contratante. A posição contratual seria uma unidade indissolúvel, que como tal se transfere diretamente ao cessionário. Assim, transmite-se, simultaneamente, por meio de um único ato, os direitos e obrigações decorrentes do contrato- base.
A decomposição da cessão em dois negócios jurídicos distintos não corresponde à verdadeira vontade das partes, já que tanto o cedente como o cessionário, ao celebrarem a cessão, almejam a transmissão integral e unitária da posição jurídica do primeiro ao segundo. Isso porque a cessão de todos os créditos e débitos, obrigações e deveres, não esgotam o conteúdo do negócio jurídico a ser cedido pois ficariam de fora da cessão os direitos formativos, os deveres acessórios, as expectativas etc.
Para essa teoria, na cessão, há a transmissão de vínculos criados pelo contrato, vistos de forma unitária, e não como uma simples soma de créditos e débitos. Os créditos e dívidas até podem ser repassados na sua individualidade, mas tais transmissões não permitem o repasse, por exemplo, dos direitos potestativos – somente a cessão unitária dos vínculos é capaz de transferir todos os efeitos do contrato-base.
Entende-se, portanto, que, a despeito do que defende a teoria atomística, a combinação dos créditos e débitos que derivam do contrato não são suficientes para alcançar as vontades das partes que, na verdade, pretendem transferir a relação jurídica fundamental originada pelo contrato-base. Nas palavras de PONTES DE MIRANDA, o que se pretende transmitir “é a relação jurídica fundamental, e não soma de relações jurídicas de crédito ou de dívida” 17.
O recurso a este pensamento (relação contratual) possibilita o preenchimento da lacuna gerada pela contestação da doutrina atomística. Em sua substituição, impõe-se a doutrina de natureza unitária da cessão da posição contratual. Esta concepção da cessão da posição contratual como um sistema unitário corresponde à vontade das partes e às concepções do tráfico.
Nesse sentido, importante destacar que, atualmente, doutrina e jurisprudência aderiram majoritariamente à tese unitária, seja no que se refere à cessão por si só considerada, seja acerca dos efeitos que se produzem na relação contratual cedida18. A cessão é, portanto, relação jurídica que não se confunde com a mera cessão de créditos ou de débitos; é figura jurídica com elementos próprios, que a distinguem das demais e a individualizam.
Esse entendimento, contudo, não afasta, no direito brasileiro, ainda que por emprego de analogia, a incidência das regras relativas aos institutos da cessão de créditos e à assunção de dívidas na cessão de contrato. Ante a carência de disciplina específica da cessão de posição contratual, os institutos ora mencionados são os que mais a ela se assemelham, conforme dispõem os artigos 286 a 298 e 299 a 303 do Código Civil.
3. A Cessão de Posição Contratual e os Institutos Afins
A cessão contratual é, em partes, muito semelhante a outros institutos regrados pelo direito brasileiro, em especial o Código Civil de 2002, o que acaba causando a alguns estudiosos iniciais do tema uma certa dificuldade em vislumbrar a existência autônoma do instituto.
Nesse sentido, a fim de firmar o entendimento de que a cessão de posição do contrato é uma figura autônoma de substancial relevância para o ordenamento jurídico-econômico, é importante destacar as peculiaridades que o instituto possui perante os demais, em especial (i) a cessão de crédito e (ii) o subcontrato.
17 XXXXXX XX XXXXXXX, Xxxxxxxxx Xxxxxxxxxx. Tratado de Direito Privado. t. XXIII. 3ª ed. São Paulo: Revista do Tribunais, 1984, p. 406.
18 XXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Cessão da Posição Contratual. 2ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007, p. 59.
3.1. Cessão de Crédito
Como fora visto, a cessão de posição contratual consiste em um negócio tripartite, em que a anuência de todas as partes é fundamental para a validade do instrumento. A cessão de crédito, por sua vez, consiste em um negócio bilateral pelo qual o credor de uma obrigação (cedente) transfere, no todo ou em parte, a um terceiro (cessionário), independentemente do consentimento do devedor (cedido), o seu crédito19 – sem que ocorra a extinção do vínculo obrigacional. E, assim como na cessão contratual, esta transferência pode ser tanto onerosa como gratuita, ou seja, o terceiro pode comprar o crédito ou simplesmente recebê-lo gratuitamente, como se opera em uma doação.
O objeto da cessão pode englobar todos os créditos existentes, desde que a isso não se opuser a natureza da obrigação, tal como nas personalíssimas, ou a lei, tal como nas hipóteses de créditos alimentícios20, crédito penhorado21 e o crédito do órfão pelo tutor22. Pode, também, o devedor impedir a cessão do crédito desde que expresse isso no contrato originário do direito creditório23.
Na cessão de crédito, englobam-se ao crédito todas as garantias e direitos potestativos
inerentes ao crédito – e não à relação jurídica fundamental, como ocorre na cessão do contrato
–, tal como o direito de escolha nas obrigações alternativas e o direito de constituir o devedor em mora. E, caso as partes não estipulem de forma diversa, compreendem-se também os direitos acessórios ao crédito (tal como os juros).
“O devedor, por sua vez, não participa do negócio, visto que seu consentimento é dispensável, porque, teoricamente, a pessoa do credor lhe é indiferente. Seja este quem for, o montante pelo qual é responsável continua a ser o mesmo.”24. Todavia, observe-se que mesmo a posição jurídica do devedor não se agrave, ela é atingida, pois trata-se de fato que o interessa na medida em que se altera a o destinatário da prestação. Ao invés de pagar ao credor originário, o devedor deve pagar a quem lhe tomou o lugar – razão pela qual, mesmo sendo um negócio bilateral, ao ser celebrada a cessão, entende-se a necessidade de notificar o devedor acerca da cessão. Caso contrário, na substituição de um dos polos da relação, o pagamento feito de boa- fé pelo devedor ao credor originário será considerado legítimo e eficaz25.
3.2. Subcontrato
A cessão de posição contratual também não se confunde com o subcontrato. Isso porque o subcontrato se configura “quando um dos contratantes transfere a terceiro, sem se desvincular, a utilidade correspondente à sua posição contratual”26. Ou seja, trata-se de um contrato derivado de um contrato-base, que com ele guarda relação de dependência e acessoriedade, na medida
19 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx da. Cessão de posição contratual. In: Teoria Geral dos Contratos. Coordenado por Renan Lotufo e Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. São Paulo: Atlas, 2011, p. 398.
20 Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.
21 Art. 298. O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de terceiro.
22 Art. 1.749. Art. 1.749. Ainda com a autorização judicial, não pode o tutor, sob pena de nulidade: (...) III - constituir-se cessionário de crédito ou de direito, contra o menor.
23 Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
24 NASCIMENTO, Xxxxxx Xxxxxxx. Cessão de Contrato. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxx, 0000, p. 24.
25 Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
26 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 27ª ed. Atualizado por Xxxxxxx Xxxxx e Xxxxxxxxx Xxxxxxxx xx Xxxxx. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 137.
em que ambos coexistem27. Nas palavras de XXXXXX XXXXXX, “surge uma segunda relação contratual, sem alteração da primeira, havendo apenas um dos sujeitos que é titular de ambos os contratos”28.
Diferente, portanto, da cessão de posição contratual, que, como visto, (i) não implica formação de novo contrato, mas apenas substituição de um contratante por outro no mesmo contrato – cedente pelo cessionário, (ii) exige o consentimento do cedido para sua validade e
(iii) há transmissão de direitos e deveres de posição contratual29. Sua atuação é particular: “rompe[r] o vínculo contratual que unia os contratantes primitivos, desobrigando por completo o cedente, negócio jurídico que pressupõe a transferência de todos os direitos e obrigações”30. Para além da doutrina, essa diferenciação também tem se refletido nas decisões judiciais. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”), em ação de cobrança pela execução de obras de redes de distribuição de energia elétrica, entendeu que uma empreiteira era parte legítima da ação, uma vez que “não cedeu sua posição contratual”, mas, na realidade, era parte de subcontrato, notadamente de uma subempreitada, “que é celebrado “à sombra de outro, que o precedeu”, ou seja, o negócio que “toma por base outro já existente, guardando
com ele uma relação de dependência, visto que submete ao destino do contrato principal”31.
4. Jurisprudência: Anuência do Cedido e Responsabilidade Contratual do Cedente
Com o arcabouço teórico adquirido com as pesquisas doutrinárias, passou-se à etapa de averiguação das decisões judiciais sobre o instituto da cessão de posição contratual. Nesse exercício, dois pontos mereceram destaque, uma vez que foram os mais recorrentes na jurisprudência coletada e realçam a importância de se delimitar as características da cessão de posição contratual: (i) a anuência do cedido e (ii) a responsabilidade contratual do cedente.
Quanto ao primeiro ponto, ele se mostra particularmente importante para a correta diferenciação entre a cessão de crédito e a cessão de posição contratual: enquanto na cessão de crédito, é necessário apenas que o cedente notifique o cedido, na cessão de posição contratual se exige a expressa anuência do cedido em relação à cessão de posição contratual do cedente. Essa questão foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça, que esposa o entendimento de que a anuência do cedido é requisito de validade da cessão de posição contratual, a qual não se confunde com a cessão de crédito. Veja-se:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA. AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES. CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO. VALIDADE DA CESSÃO. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DA COMPANHIA TELEFÔNICA CEDIDA. RAZÕES RECURSAIS QUE ALEGAM A DISPENSA DESSA ANUÊNCIA POR SE TRATAR DE
27 XXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx da. Cessão de posição contratual. In: Teoria Geral dos Contratos. Coordenado por Renan Lotufo e Xxxxxxxx Xxxxxx Xxxxx. São Paulo: Atlas, 2011, p. 400.
28 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2020, pp. 82.
29 Nas lições de XXXXXX XXXXXX XXXXXX e XXXXXXX XXXXXXXX, “[n]a subcontratação, não há qualquer forma de transmissão de direitos ou deveres, já que, a rigor, não se estabelece relação direta entre contratante e subcontratado, diferenciando-a da cessão de posição contratual. Há aqui novo contrato cujo objeto abrange, totalmente ou em parte, o conteúdo do contrato anterior. A relação contratual anterior permanece, todavia, intacta, sem qualquer modificação subjetiva, coexistindo esse contrato originário com o novo contrato, derivado e dependente” (XXXXXXXX, Xxxxxxx; XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxx; BANDEIRA, Xxxxx Xxxxx. Fundamentos do direito civil, vol. 3 – Contratos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 116).
30 XXXX, Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx de. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Xxxxxxxx Xxxxxxxxx [et al.]. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 446.
31 “Subempreitada. Execução de obras de redes e linhas de distribuição de energia elétrica. Não pagamento do preço e rompimento do vínculo. Cobrança acolhida na sentença, inclusive da multa compensatória. Recursos das rés. Legitimidade passiva aferida e ausência de vício no instrumento de mandato. Vínculos das partes mantidos, não havendo cessão da posição contratual pela empreiteira, mas elaboração de subempreitada, com relação de acessoriedade.” (...) (TJSP, Apelação Cível 4012238-50.2013.8.26.0576, Rel. Kioitsi Chicuta, 32ª Câmara de Direito Privado, j. em 20/08/2018).
CESSÃO DE CRÉDITO. INSTITUTOS JURÍDICOS DISTINTOS. INCIDÊNCIA DAS
SÚMULAS N. 5 E 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A cessão de posição contratual é instituto jurídico que não se confunde com a cessão de crédito. 2. Para que a cessão de crédito seja eficaz em relação ao cedido, basta que o cedente o notifique. Tratando-se de cessão contratual, porém, é preciso que haja anuência do contratante cedido. 3. De acordo com o Tribunal de origem, teria havido, no caso, uma cessão de contrato, e não uma cessão de crédito. Assim, como a cedida não anuiu com essa transferência, ela seria invalidada/ineficaz em relação à empresa telefônica, carecendo o cessionário de legitimidade para pleitear, dessa sociedade, a complementação de ações. (...)32
Em outra oportunidade, o STJ, na mesma linha, estabeleceu que razão de ser dessa exigência da anuência do cedido é permitir a “análise, pelo cedido, da capacidade econômico- financeira do cessionário, de molde a não correr o risco de eventual inadimplemento”, de modo que o cedido, ao vislumbrar risco de inadimplemento do cessionário, poderia “impor como condição a responsabilidade subsidiária do cedente, não lhe permitindo a completa exoneração, o que, de regra, deflui da transmissão de posição contratual”33.
Esse detalhe tem sido levado em consideração por diversos Tribunais Estaduais, de modo a expressar que a anuência do cedido é exigida apenas na cessão de posição contratual, ao passo que a cessão de crédito se contenta com a notificação do cedido:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – CESSÃO DE CRÉDITO DE COTA DE CONSÓRCIO CANCELADA – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO DA ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO – ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE ANUÊNCIA EM RELAÇÃO AO NEGÓCIO JURÍDICO – NÃO ACOLHIMENTO – CESSÃO DE CRÉDITO QUE NÃO SE CONFUNDE COM CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL – DEVEDORA DEVIDAMENTE NOTIFICADA, NOS TERMOS DO ART. 290 DO CÓDIGO CIVIL – CESSÃO EFICAZ (...)34.
***
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA. CESSÃO DE COTA DE CONSÓCIO CANCELADA. AUSÊNCIA DE ANUÊNCIA DA ADMINISTRADORA. IRRELEVÂNCIA. CESSÃO DE CRÉDITO QUE NÃO SE CONFUNDE COM CESSÃO DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES(...)35.
Já em relação ao segundo ponto, a atribuição de responsabilidade contratual na cessão de posição contratual tem diferenças importantes em relação à cessão de crédito e ao subcontrato.
32 STJ, AgInt no REsp 1591138/RS, Rel. Ministro Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxx, Terceira Turma, j. em 13/09/2016.
33 “DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL. ANUÊNCIA DO CEDIDO. EFEITOS DA CESSÃO EM RELAÇÃO AO CEDENTE. RELEVÂNCIA QUANTO À POSSIBILIDADE DE INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. (...) 2. A anuência do cedido é elemento necessário à validade do negócio jurídico, residindo sua finalidade na possibilidade de análise, pelo cedido, da capacidade econômico-financeira do cessionário, de molde a não correr o risco de eventual inadimplemento; nesse ponto, assemelhando-se à figura do assentimento na assunção de dívida”. (...) (STJ, REsp 1036530/SC, Rel. Ministro Xxxxx Xxxxx, Rel. p/ Acórdão Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxx, j. em 25/03/2014).
34 TJPR, Apelação 0014486-63.2019.8.16.0014, Rel. Des. Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx, 18ª Câmara Cível, j. em 31/05/2021.
35 TJSP, Apelação Cível 1124763-52.2020.8.26.0100, Rel. Des. Xxxxxx Xxxx, 22ª Câmara de Direito Privado, j. em 01/07/2021. No mesmo sentido: TJSP, Agravo de Instrumento nº 2163149-85.2016.8.26.0000. Rel. Des. Xxxx Xxxxxxxxx, 6ª Câmara de Direito Privado, j. em 01/12/2016.
Como exposto no item 1, com a cessão de posição contratual, o cedente transfere ao cessionário “o conjunto de direitos e deveres, faculdades, poderes, ônus e sujeições originariamente pertencentes”36, deixando, assim, de “deter qualquer direito decorrente da avença, afigurando-se parte ilegítima para o ajuizamento da demanda”37. Esse cenário, contudo, muda na cessão de crédito e no subcontrato.
Na cessão de crédito, como visto, transfere-se tão somente o crédito objeto do negócio jurídico, de sorte que a responsabilidade do cedente do crédito no tocante ao resto do contrato se mantém. Essa questão foi recentemente tratada pelo TJSP, que ao julgar ação de rescisão contratual de compromisso de compra e venda de imóvel, assinalou que “a cessionária adquiriu apenas os créditos imobiliários, não tendo assumido a posição contratual da cedente nos contratos de compra de venda, remanescendo a responsabilidade desta perante os adquirentes”38. Assim, consignou-se que, por se tratar de cessão de crédito, e não de contrato, a cessionária não poderia ser responsabilizada pelo descumprimento de obrigação contratual de entregar o imóvel:
“De fato, a cessão de crédito não se confunde com a cessão de posição contratual. Enquanto por meio desta o cedente cede ao cessionário todos os seus direitos e obrigações oriundos de determinado contrato, por meio daquela somente os créditos são repassados ao cessionário, permanecendo o cedente responsável perante o devedor pelas obrigações assumidas. No caso em exame, como houve somente a cessão dos recebíveis, não é possível atribuir à cessionária a responsabilidade por eventual atraso na entrega do imóvel, que deu ensejo ao pedido de rescisão contratual”.
Isto é, na cessão de crédito, o cedente não se desliga totalmente do contrato, mas tão somente de créditos específicos, podendo ser responsabilizado por quaisquer inadimplementos da parte do contrato que não cedeu.
No subcontrato, a responsabilidade contratual também se difere da que permeia a cessão de posição contratual, uma vez que se cria nova relação jurídica, diferente da firmada no contrato-base39. Desse modo, a responsabilidade contratual é adstrita às partes do contrato, de sorte que, em princípio, por inadimplementos do subcontrato, só respondem os subcontratantes, e não as partes do contrato-base, em virtude da ausência de relação jurídica.
Tal discussão é particularmente latente no campo da construção civil, notadamente nas demandas entre partes de contratos de empreitada e de subempreitada. A orientação dos Tribunais Estaduais pesquisados tem sido de pautar a imputação de responsabilidade na
36 “A cessão de posição contratual é figura admitida pelo ordenamento jurídico, mormente ante o disposto nos arts. 421 e 425 do CC, consubstanciada na transmissão de obrigações em que uma das partes de um contrato (cedente) vê-se substituída por terceiro (cessionário), o qual assume integralmente o conjunto de direitos e deveres, faculdades, poderes, ônus e sujeições originariamente pertencentes àquele contratante original; sendo certa, portanto, a existência de dois negócios jurídicos distintos:
(i) o contrato-base, em que se insere a posição a ser transferida; e (ii) o contrato-instrumento, o qual veicula a transferência propriamente dita” (STJ, REsp 1036530/SC, Rel. Ministro Xxxxx Xxxxx, Rel. p/ Acórdão Ministro Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx, Xxxxxx Xxxxx, j. em 25/03/2014).
37 TJMG, Apelação Cível 1.0000.20.542675-2/001, Rel. Des. Xxxxxx Xxxxxxxx, 9ª Câmara Cível, j. em 02/12/2020.
38 TJSP, Apelação Cível 1003517-54.2017.8.26.0663, Rel. Des. Xxxx xx Xxxxx, 10ª Câmara de Direito Privado, j. em 22/06/2021. 39 Nas palavras de Xxxxxxx Xxxxx, “[a] função prática do subcontrato é ser o recurso técnico que proporciona o gozo, por terceiro, das utilidades de um contrato, mediante a realização de novo contrato do qual não participa o outro contratante, e por forma que não acarreta a extinção do contrato de que deriva” (XXXXX, Orlando. Contratos. atualizadores Xxxxxxx Xxxxx e Reginalda Xxxxxxxx xx Xxxxx. 00x xx. Xxx xx Xxxxxxx: Forense, 2019, p. 138).
existência de relação jurídica. Nesse sentido, há decisões que acolhem a ilegitimidade passiva de donos de obra – que são parte de contrato de empreitada com empreiteiras – em ações de cobrança movidas por subempreiteiras em relação a obrigações contidas em subempreitadas – que envolvem empreiteiras e subempreiteiras –, em razão de não serem parte do referido subcontrato. Confira-se:
APELAÇÃO – Ação de cobrança – Sentença de procedência – Contrato de empreitada – Subcontratação – Autora, subcontratada, que demanda o pagamento do débito da dona da obra
– Impossibilidade – Inexistência de contratação entre as partes – Quantia que deve ser demandada da empresa com quem celebrou contrato de empreitada – Ilegitimidade passiva reconhecida – Sentença reformada – Recurso provido40.
***
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - NULIDADE DA SENTENÇA - REJEITADA - CONTRATO DE SUBEMPREITADA - INADIMPLEMENTO DA EMPREITEIRA - ILEGITIMIDADE
PASSIVA DA CONTRATANTE/DONA DA OBRA (...) Os contratos de empreitada e subempreitada são distintos, não podendo ser imputada à dona da obra, a responsabilidade por eventual inadimplemento da empreiteira com a subempreiteira, se inexiste previsão contratual quanto a isso41.
Ou seja, no subcontrato, a responsabilidade contratual se limita aos subcontratantes, não havendo que se falar em transferência de direitos e obrigações, como na cessão de posição contratual.
Conclusão
Em virtude das considerações expostas ao longo deste artigo, confirma-se que a cessão de posição contratual, embora seja instituto de utilidade prática notória, carece de regime jurídico estruturado no Código Civil de 2002, fazendo com que a sua aplicação dependa dos melhores esforços da doutrina e da jurisprudência.
Nos itens 1 a 3, demonstrou-se que a doutrina nacional vem se debruçando sobre o instituto da cessão de posição contratual, de modo a contribuir para uma aplicação técnica e coerente do instituto nas relações contratuais. Viu-se que a cessão de posição contratual é instituto que tem importância prática singular, de modo que possui características próprias, diferentes das relacionadas à cessão de crédito e ao subcontrato, demandando, portanto, soluções jurídicas particulares.
No item 4, demonstrou-se que a jurisprudência também tem acompanhado o movimento da doutrina e desempenhado papel importante no desenvolvimento das discussões sobre a cessão de posição contratual, na medida em que há cada vez mais decisões acerca do tema. Dessas decisões, destacou-se duas reflexões que têm sido mais frequentes: a anuência do cedido e a responsabilidade contratual do cedente, que devem ser lidas com atenção à diferenciação entre cessão de posição contratual, cessão de crédito e subcontrato.
Desse modo, o grupo chegou à percepção de que a carência de disciplina específica não impede a aplicação da cessão de posição contratual no direito brasileiro, sendo as contribuições
40 TJSP, Apelação Cível 1108378-68.2016.8.26.0100, Rel. Xxxxxx Xxxx, 17ª Câmara de Direito Privado, j. em 29/01/2020.
41 TJMG, Apelação Cível 1.0372.14.000137-4/001, Rel. Xxxxxx Xxxxx xx Xxxxxxx Xxxxxx, 18ª Câmara Cível, j. em 26/05/2020. No mesmo sentido: TJMG, Apelação Cível 1.0024.13.302343-2/001, Rel. Des. Xxxxxxx Xxxxxxxx, 14ª Câmara Cível, j. em 08/07/2021.
tanto da doutrina quanto da jurisprudência essenciais para a estruturação de um regime jurídico próprio da cessão de posição contratual.
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