NOVAS FÓRMULAS DE INSERÇÃO DO TRABALHADOR NO SISTEMA ECONÔMICO CAPITALISTA*
NOVAS FÓRMULAS DE INSERÇÃO DO TRABALHADOR NO SISTEMA ECONÔMICO CAPITALISTA*
1 - Novas Fórmulas de Contratação Trabalhista
A dinâmica econômica recente, tanto no Brasil como em outros países, anuncia uma ruptura com o paradigma do trabalho assalariado, como forma dominante de vinculação da força de trabalho. O avanço tecnológico mesclado a um crescimento com base em alta produtividade do trabalho e, portanto, com pouca geração de emprego, está revigorando e fazendo surgir novas formas de ocupação onde a instabilidade nos contratos de trabalho, os empregos a tempo parcial, a terceirização e a subcontratação de trabalhadores em domicílio, deixam de ser modalidades arcaicas ou condenadas ao desaparecimento, para ocupar o centro das novas estratégias de gestão da força de trabalho.1
O novo quadro apresenta como solução para as questões sociais a terceirização das economias, atribuindo-se às máquinas e à cibernética, toda a produção massiva standard, com a redução drástica do número de empregos produtivos para prover bens e serviços para a sociedade. 2
As transformações no mundo do trabalho, principalmente as alterações no processo produtivo têm levado ao surgimento de novas formas de contratação de trabalhadores, além da forma clássica que constitui categoria básica do Direito do Trabalho, qual seja, a prestação de serviços com subordinação, onerosidade, não- eventualidade, pessoalidade por pessoa física a um tomador dos serviços.
Este fenômeno também pode ser atribuído “à força expansionista constante do Direito do Trabalho ou à incorporação de quaisquer atividades em seu campo de gravitação”. 3
A forma descrita acima tem cedido espaço para novas modalidades de contratação da força de trabalho assalariada. O trabalho subordinado na empresa industrial foi o pressuposto de referência para as normas laborais, como também a origem dos sistemas de seguridade social.
2 – O Contrato de Trabalho
O Direito é uno, mas para fins didáticos é dividido em ramos jurídicos especializados. Cada ramo possui uma relação jurídica específica que constitui sua categoria central, em torno da qual “emergem princípios, normas e institutos jurídicos” 4 que denotam suas características fundamentais.
1 XXXXXXX, Xxxx. XXXX, Xxxx. LINHARES, Leila. XXXXX, Xxxxxx. Trabalho a domicílio: novas formas de contratação xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxx/xxxxxxxxxx/xxxxxxxxxx/xxxxx/xxxx/xxxx00.xxx. Capturado em 07/10/01.
2 LAMAS, Xxxx Xxxxxx. El empleo y las relaciones laborales em el umbral del siglo XXI: una perspectiva comparada. Revista Xxxxxxx xxx xxxxxxx, 0000-X, p. 660.
3 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx de. Relação de emprego – estrutura legal e supostos. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999. P. 483.
4 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Introdução ao Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 230.
A relação jurídica é o vínculo que impõe a submissão do objeto ao sujeito. Não existe relação jurídica entre o sujeito e o objeto; somente entre pessoas há relação jurídica, nunca entre o ser e a coisa.
Consoante o entendimento de XXXXXX XXXXX, em toda relação jurídica destacam-se quatro elementos fundamentais:
“ a) um sujeito ativo, que é o titular ou o beneficiário da relação;
b) um sujeito passivo, que é o devedor da prestação principal;
c) o vínculo de atributividade capaz de ligar uma pessoa a outra;
d) um objeto que é elemento em torno do qual se constitui a relação.” 5
O Direito do Trabalho construiu o seu arcabouço principiológico e normativo em torno de uma relação jurídica nuclear – “a relação de trabalho, mais especificadamente a relação de emprego”.6
A relação de trabalho compreende todas as relações jurídicas cujo objeto consiste em uma prestação de fazer consubstanciada em trabalho humano, 7 nas formas admitidas pelo ordenamento jurídico.
Já a relação de emprego corresponde a uma espécie de relação de trabalho. O contrato de emprego foi a fórmula mais elaborada na sociedade de economia capitalista, para conferir e assegurar ao trabalhador um patamar significativo de Direitos.
A relação de emprego funda-se na tutela especial que a lei confere ao trabalho e ao trabalhador, “cujos pólos são o empregado e o empregador e o seu objeto o trabalho”.8 A relação empregatícia é fenômeno sócio-jurídico que resulta da reunião de elementos reunidos em uma realidade social, denominados de elementos fático-jurídicos, 9 sem os quais não se configura a relação antes mencionada.
Estes elementos fático-jurídicos seriam cinco, nos termos dos arts. 2º e 3º, da CLT e assim expostos por XXXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX 10 : a) prestação de trabalho por pessoa física a um tomador qualquer; b) prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; c) efetuada com não-eventualidade; d) efetuada com subordinação ao tomador de serviços; e) prestação de serviços efetuada com onerosidade.
5 XXXXX, Xxxxxx. Lições preliminares de direito. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 213.
6 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Introdução ao Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 230.
7 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Op. cit., 1999, p. 230.
8 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx de. Relação de emprego e zona gris. Anais dos trabalhos da escola judicial do Tribunal Regional da 3ª região, Minas Gerais, 2000, p. 58.
9 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Introdução ao Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 248.
10 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Op. cit., 1999, p. 248.
O contrato configura-se um vínculo jurídico entre o sujeitos (ativo e passivo) e o objeto, que produz a relação jurídica e produz os efeitos entre as partes. 11
A análise dos elementos fáticos-jurídicos que compõem o contrato de trabalho permitirá ao operador jurídico aferir se do contrato de trabalho emerge uma relação empregatícia protegida pelo ramo juslaboral, ou não. Esta assertiva decorre do princípio da primazia da realidade sobre a forma que prevalece no ramo justrabalhista. Segundo esse princípio, existindo discordância entre a realidade fática e o que emerge de documentos ou acordos, prevalecerá o mundo dos fatos. 12
Observa-se uma tendência de desarticulação do Direito do Trabalho e de precarização dos contratos de trabalho, cujo alvo principal é o contrato de emprego, devido a sua importância sócio-econômica.
A relação empregatícia, que havia se tornado a mais importante relação de trabalho já existente, 13 perde espaço para novas formas de contratação da força de trabalho que reduzem o patamar de Direitos trabalhistas.
No período pós Segunda Guerra, a relação empregatícia e o Direito do Trabalho viveram seu ápice: o Estado de Bem-Estar Social instituía políticas sociais privilegiando esse modelo de contratação, que garantia um patamar mínimo de direitos aos trabalhadores.
A orientação da atual política econômica está substituindo o conceito de trabalho subordinado, pelo conceito de ocupação.14 Nesta mesma direção, afirma-se que o trabalho, como causa do contrato, está cedendo lugar ao trabalho específico ou tarefa, material ou imaterial, como resultado desejado ou a causa do contrato, 15 o que tem gerado a expansão dos contratos de trabalho temporários, eventual, autônomo e precário.
O Direito do Trabalho – visando regular as novas relações laborais que outrora não faziam parte do seu quadro protetivo – está promovendo um alargamento do conceito de subordinação.
A subordinação é um pressuposto jurídico para a formação do liame empregatício entre o empregado e o empregador. A subordinação não submete o obreiro a qualquer tipo de comando do empregador, nem o sujeita pessoalmente a ele. Consiste no poder, conferido ao empregador, de dirigir e comandar a execução
11 XXXXX, Xxxxxxx. Contratos. 17ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 12-13.
12 XXXXXXXXX, Xxxxxxx Xxx. Princípios de Direito do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 339.
13 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Introdução ao Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 231.
14 XXXXXX, Xxxxx Xxxxx. Flexibilização e os princípios do Direito do Trabalho. In: XXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx Xxxxx. Noções atuais de Direito do Trabalho: estudos em homenagem ao Professor Xxxxx Xxxxxxxxx. São Paulo: LTr, 1995, p. 113.
15 TRINDADE, Washington Luiz da. Formas novas contratuais entre o trabalho precário e o trabalho voluntário. Revista Trabalho e doutrina, n.18, setembro 1998, p. 55.
da obrigação contratual pela empregado; controlar o cumprimento dessa obrigação e aplicar penas disciplinares no caso de descumprimento do contrato. 16
Desta forma, o Direito do Trabalho, para não se afastar da realidade social e do seu intuito protetor da hipossuficiência do economicamente mais fraco, deve substituir a antiga noção de subordinação por uma noção mais atual, que permita a proteção, não em virtude da existência da subordinação, “mas em razão da debilidade contratual”.17
Sob este prisma, entende XXXXX XXXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX, 18 que o parágrafo único do art. 442, da CLT, acrescentado em 1994, ao mesmo tempo em que abriu oportunidades de trabalho no próprio campo do Direito do Trabalho, mas fora das hipóteses dos arts. 2º e 3º, do mesmo diploma legal, teve em vista a canalização de uma política jurídica flexível no tradicional conceito de trabalho tutelado, para atrair, para fora do ramo juslaboral, um feixe de relações jurídicas entre cooperados e cooperativas, e entre aqueles e os tomadores de serviços.
A relação jurídica existente entre os cooperados e os terceiros que contratam com a cooperativa, localiza-se em uma zona cinzenta do ramo justrabalhista. O vínculo jurídico entre as partes se aproxima de tal modo do contrato empregatício que, somente em caso concreto, será possível aferir se o contrato entre as partes é de natureza civil ou não. Este tema será abordado no próximo capítulo.
No momento, abordarei algumas modalidades de contrato de trabalho que configuram, de certa forma, um desvio em face dos fundamentos da relação empregatícia tradicional.
2.1 – O Contrato por Tempo Determinado – Lei n. 9.601/1998
O contrato de trabalho, normalmente é celebrado pelas partes para durar por tempo indeterminado: a regra é sua indeterminação. Uma das características comuns ao contrato de trabalho é a continuidade do vínculo com a permanência da prestação de serviços ao tomador; a provisoriedade é a exceção.
Como já vislumbrado anteriormente, a crise que atravessa o mundo do trabalho e que leva a sua reestruturação, alterou o Direito do Trabalho e, por conseqüência, o próprio contrato de trabalho.
16 MARANHÃO, Délio. XXXXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Direito do Trabalho. 17 ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Xxxxxxx Xxxxxx, 1996, p. 66-67.
17 ROBORTELLA, Xxxx Xxxxxx Xxxxxx. O moderno Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1994, p. 57.
18 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx de. Relação de emprego e zona gris. Anais dos trabalhos da escola judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Minas Gerais, 2000, p. 61.
trabalhistas às necessidades e especificidades de segmentos socioeconômicos e profissionais”.19
A Lei n. 9.601/1998 que disciplina o novo contrato a termo é um exemplo de flexibilização das leis trabalhistas, visto que permitiu a contratação de mão-de- obra através de contratos de trabalho precários e conseguiu “não apenas diminuir as restrições à pactuação dos contratos a termo – o que, por si só, compromete de modo grave a eficácia de princípios fundamentais do Direito (em particular, os princípios da norma mais favorável e da continuidade da relação de emprego).”20
Pode-se dizer que esta lei precarizou ainda mais o contrato de trabalho a termo, não só pela redução dos princípios e dos direitos trabalhistas conferidos a esta espécie de pacto. Como também, pelo aumento da hipótese de contratação através de contratos a termo e pela não submissão a certas regras trabalhistas comuns aos demais contratos de trabalho, como a redução do FGTS. Pois, realmente, “a precarização da mão-de-obra é uma nova exigência do capital”. 21
O diploma legal foi apresentado como uma saída para o desemprego; objetivo era “reduzir o custo direto e indireto da força de trabalho que a lei implementa”, 22 e criar novos empregos.
O que aconteceu, de fato, com a promulgação da lei foi a redução dos trabalhadores com o contrato de trabalho por tempo indeterminado com a sua substituição pelos contratos por tempo determinado.
Para alguns autores, a Lei n.9.601/1998 não se compatibiliza com a Constituição Federal de 1998, ora no conjunto, ora especificamente. Na primeira hipótese, haveria uma incompatibilidade da Lei com a Constituição, quando esta prevê a redução de Direitos trabalhistas permitindo uma maior flexibilização do contrato de trabalho e entra em choque com o princípio da norma mais favorável previsto no caput do art. 7º, haja vista a vedação de norma legal que atente contra os Direitos dos trabalhadores que visem à melhoria das suas condições sociais.23
Outra incompatibilidade derivaria do inciso I, do art. 7º, que prevê a proteção do empregado contra a despedida sem justa causa ou arbitrária, considerado um dispositivo de “eficácia contida” 24 que visa proteger o emprego. Desta forma, a regra é o contrato por tempo indeterminado e a exceção seria o contrato por tempo determinado; contudo, a Lei n.9.601/1998 “retira qualquer caráter
19 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. O novo contrato por tempo determinado: (Lei n. 9.601/1998). São Paulo, LTr, 1998, p. 58.
20 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Contrato de Trabalho – Caracterização, Distinções e Efeitos. São Paulo: LTr, 1999, p. 77.
21 RENAULT, Xxxx Xxxxxx Linhares. Antecedentes históricos do contrato de trabalho. In: RENAULT, Xxxx Xxxxxx Xxxxxxxx; DIAS, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. O novo contrato a prazo: teoria, prática e crítica da lei 9.601/1998. São Paulo: LTr, 1998, p. 91.
22 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. O novo contrato por tempo determinado: (Lei n. 9.601/1998). São Paulo, LTr, 1998, p. 59.
23 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. O novo contrato por tempo determinado: (Lei n. 9.601/1998). Xxx Xxxxx, XXx, 0000, p. 61.
24 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Op. cit., 1998, p. 61.
de excepcionalidade das contratações a termo, autorizando-as para qualquer atividade (...) desde que negociada coletivamente”.25
Vislumbra-se uma incompatibilidade específica quanto ao FGTS. A lei prevê a redução da obrigação trabalhista a 2% da remuneração do trabalhador contra os 8% previstos na Lei do FGTS para os outros trabalhadores, diante da vedação expressa de discriminação prevista no art. 5º, caput, Constituição Federal de 1988. Em compensação, permitem-se depósitos mensais vinculados, a favor do empregado, em estabelecimento bancário, com periodicidade para o saque segundo o parágrafo único do art. 2º da Lei n. 9.601/1998.
2.2 – O Contrato a Tempo Parcial – alteração da CLT
A jornada de trabalho também vem sendo alvo da flexibilização implementada pelo Estado brasileiro. Neste sentido, foi permitida a flexibilização da jornada de trabalho com a introdução no nosso ordenamento jurídico do contrato de trabalho a tempo parcial. Este contrato foi regulamentado pela medida provisória n. 1.709, de 6 de agosto de 1998 e outras que se seguiram a ela, sendo a última de n. 2.164-41, de 24 de agosto de 2001 (prorrogada por prazo indeterminado pelo art. 2º, da Emenda Constitucional n. 32/2001).
O trabalho a tempo parcial não é um fenômeno estranho ao ramo juslaboral; este ramo sempre permitiu a pactuação da jornada parcial de labor no Brasil, de maneira que a figura do trabalho a tempo parcial, regulamentada pela supracitada medida provisória, não é inovadora em sua essência.26 Nunca houve impedimento legal que inviabilizasse a contratação de empregados submetidos a contrato de trabalho com regime de tempo parcial.
A duração da jornada de trabalho prevista no art. 58-A da CLT é aquela realizada em regime de tempo parcial, cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais. O salário a ser pago aos trabalhadores que se submeterem a este regime será proporcional à jornada de trabalho em relação aos trabalhadores que cumpram tempo integral (art. 00-X, § 0x, xx XXX).
Os empregados que perfaçam a jornada integral de trabalho e quiserem aderir ao novo regime, só poderão fazê-lo perante a empresa, mediante negociação coletiva, entre os empregados e a empresa (art. 58-A, § 1º, da CLT).
As inovações da medida residem no novo critério de duração das férias pelos trabalhadores, que obedecerá aos parâmetros do art. 130, da CLT; e na impossibilidade de prestação de horas extras pelos obreiros (art. 59, § 4º, da CLT).
A implementação do contrato de trabalho a tempo parcial não é novidade para o mundo do trabalho. De acordo com o quadro abaixo, é possível vislumbrar o crescimento deste tipo de contrato, nos últimos anos, não somente no Brasil.
Crescimento do Emprego em Países Selecionados (1983-94)
25 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Op. cit., 1998, p. 62.
26 XXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Alterações contratuais trabalhistas. São Paulo: LTr, 2000, p.87.
Países | Crescimento do Emprego (%) Emprego Total Tempo Integral Tempo Parcial | ||
EUA | 20,0 | 17,3 | 2,7 |
Bélgica | 9,7 | 3,7 | 6,0 |
Dinamarca | 5,5 | 6,9 | -1,4 |
Alemanha | 8,6 | 2,3 | 6,3 |
Xxxxxx | 0,0 | 0,0 | -0,0 |
Xxxxxx | 0,0 | -5,2 | 5,2 |
Irlanda | 8,0 | 2,4 | 5,6 |
Itália | -2,7 | -4,1 | 1,4 |
Holanda | 19,9 | -2,5 | 22,4 |
Inglaterra | 10,3 | 3,0 | 7,3 |
Fonte: Xxxxxx Xxxxxx, Are Part-Time Jobs Better than no Jobs?, 1998.27
2.3 – Trabalho à Distância
O trabalho, no mais das vezes, é realizado no estabelecimento de propriedade do tomador de serviços, isto é, do empregador. No entanto, existem formas alternativas de prestação dos serviços, no que tange à localidade. O trabalho pode ser prestado tanto em localidade diversa da usual, graças aos avanços tecnológicos, que permitem a imediata comunicação via internet, do mesmo modo, que pode ser realizado no domicílio do prestador de serviços.
2.3.1 – Teletrabalho
Com o desenvolvimento tecnológico dos meios de comunicação, surge o teletrabalho como uma alternativa para substituir o trabalhador assalariado que, como é protegido pela legislação estatal com a concessão de garantias trabalhistas, é considerado muito “caro” para o empregador. O trabalho passa a ser realizado fora do âmbito da fábrica e o trabalhador passa a prestar serviços para o empregador na sua própria residência.
Pode-se definir o teletrabalho, segundo PINHO PEDREIRA, como “a atividade do trabalhador desenvolvida total ou parcialmente em locais distantes da sede principal da empresa, de forma telemática. Total ou parcialmente, porque há teletrabalho exercido em parte da empresa e em parte em locais dela distantes”.28
Noutros termos, o teletrabalho “é uma atividade e produção ou de serviço que permite o contato à distância entre o apropriador e o prestador da energia pessoal (...) a execução e entrega do resultado se complementarão mediante o uso da tecnologia da informação”.29
27 xxxx://xxx.xxxxxxxxxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx/000.xxx. Capturado em 07/10/01.
28 XXXXXXXX, Xxxxx. O teletrabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 64, n. 05, maio de 2000, p. 584.
29 XXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Curso de direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 115.
Desta forma, os serviços prestados pelo empregado para a empresa, se executados fora da sede da mesma, serão considerados teletrabalho, embora parte deste seja cumprido no estabelecimento da empresa.
As atividades profissionais cujo objeto seja o trabalho intelectual, ensejam a utilização desta forma de trabalho.
Este tipo de relação empregatícia apresenta vantagens e desvantagens. As vantagens consubstanciam-se na diminuição dos custos para a empresa; no conforto físico, psíquico e social para o trabalhador, que não tem que se deslocar para realizar a prestação dos serviços. 30
As desvantagens seriam as seguintes: a estrita compatibilidade entre o teletrabalho e a função do trabalhador; o nível de motivação do trabalhador; o isolamento do empregado que não interage com os colegas; a redução da autodisciplina; a falta de segurança profissional já que o teletrabalho torna o profissional responsável pela execução e entrega dos serviços. 31 Além disso, a ausência de uma jornada de trabalho pré-determinada levaria o empregado a laborar mais que o limite constitucional de 44 horas semanais, entrando no descanso semanal remunerado, direito de qualquer trabalhador, restaria prejudicado já que o trabalhador poderia laborar nestes dias para poder executar as tarefas demandadas.
O teletrabalho pode ser considerado um gênero da modalidade de trabalho realizado fora do estabelecimento da empresa.
A primeira espécie deste tipo de trabalho é o realizado em telecentros que são locais da empresa situados fora da sua sede central. É o caso do centro satélite (local descentralizado da própria empresa) que constituem em estabelecimentos separados da central, mas com ela conectados; 32 bem como o centro partilhado ou comunitário, ou seja, o realizado em locais descentralizados providenciados pela própria empresa.33
A segunda espécie de teletrabalho é o denominado nômade, realizado por trabalhadores que não têm lugar fixo para prestação e que passam a maior parte do tempo fora da empresa.34
A terceira forma básica é o trabalho transnacional, 35 que conecta os trabalhadores espalhados pelo mundo, mediante conferências realizadas via internet ou pelo telefone.
O último modelo de teletrabalho é o trabalho em domicílio, que trataremos no item a seguir.
30 XXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Op. cit., 2000, p. 116.
31 XXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Curso de direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 116.
32 XXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx. El viejo y el huevo trabajo a domicilio. Madri: Ibidem Edición, 1998, p. 60.
In: PEDREIRA, Pinho. O teletrabalho. LTr, São Paulo, v. 64, n. 05, maio 2000, p. 584.
33 PEDREIRA, Pinho. O teletrabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 64, n. 05, maio de 2000, p. 584.
34 PEDREIRA, Pinho. Op. cit., 2000, p. 584.
35 PEDREIRA, Pinho. Op. cit., 2000, p. 584.
2.3.2 – Trabalho em Domicílio
Esta modalidade de prestação laboral tem origem no trabalho artesanal,36 realizado pela família, na própria residência.
O trabalho em domicílio é regulado na CLT, no art. 6º, que não distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado. É regulado também no art. 83 da Consolidação, que prescreve que o trabalho pode ser realizado no estabelecimento do empregador ou no domicílio do empregado.
Trabalho em domicílio é aquele em que o seu executor trabalha em local de escolha própria, seja a sua casa ou uma oficina, só com membros de sua família, trabalhando profissionalmente por incumbência de terceiros, a quem vende o resultado do trabalho. Este tipo de contrato de trabalho coloca o prestador em uma zona fronteiriça entre o trabalhador autônomo e o subordinado. 37
A subordinação, neste tipo de contrato, é quase inexistente, já que o empregador não consegue fiscalizar a prestação de serviços do empregado. Da mesma forma, a pessoalidade do trabalhador deixa de ser parte integrante do próprio contrato.
O trabalho em domicílio é uma forma de subcontratação da força de trabalho porque o trabalho se confunde com a dinâmica familiar, impossibilitando a integração do trabalhador na empresa e no seu próprio sindicato, haja vista estar “ausente” do local de trabalho. 38 No Brasil, esta forma de prestação é comum no sul do país no setor calçadista e na indústria de confecção do Rio de Janeiro.
É uma modalidade de prestação de serviços pelos trabalhadores que tem se expandido com as mudanças perpetradas nos processos de produção dentro das fábricas. Configura-se uma espécie do trabalho realizado à distância. Originou-se do trabalho das costureiras que permaneciam em casa trabalhando.
Para XXXXXXXX XX XXXX, 39 estamos vivenciando a era da sociedade pós-industrial, que se caracteriza pela mudança nos modos de produção de mercadorias, de organização da sociedade e de entendimento do homem. O teletrabalho, ou trabalho prestado nas residências, permitirá ao trabalhador menos tempo despendido na execução de cada tarefa.40
Este entendimento é pertinente se considerarmos o enxugamento do número de trabalhadores nas empresas, causados não só pela automação, mas pela flexibilização das tarefas e dos próprios trabalhadores. Neste sentido, muitos trabalhadores que não realizavam tarefas físicas na fábrica, mas lidavam com
36 XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Direito do Trabalho. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 130.
37 XXXXX, Xxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx. Curso de direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 113.
38 XXXXXXX, Xxxx Xxxxxxx. Precarização do trabalho e impasses na organização coletiva no Brasil. In: Xxxxxxx, Xxxxxxx et al. Neoliberalismo, trabalho e sindicalismo. São Paulo: Boitempo, 1997, p. 89.
39 DE XXXX, Xxxxxxxx. O ócio criativo. Rio de Janeiro: Sextante, 2000, p. 66.
40 DE XXXX, Xxxxxxxx. Op. cit., 2000, p. 163.
informações imateriais, 41 passaram a desenvolver as suas atividades em sua própria residência.
Um fator que parece potencializar a identidade do local do trabalho com a residência do empregado é o desenvolvimento constante da tecnologia e da informação, 42 e do fato de o trabalho estar se tornando uma atividade cada vez mais intelectualizada, permitindo a migração do trabalhador.
3 – Trabalho Voluntário
Neste quadro de desagregação da relação empregatícia não poderia faltar referência ao trabalho voluntário, embora este não tenha relação direta com as outras formas contratuais trabalhistas nesta Dissertação.
O trabalho voluntário corretamente utilizado não é uma forma de precarização – esta afirmação seria uma radicalização. Pelo contrário, é um tipo de serviço que denota alto grau de solidariedade humana das pessoas, umas com as outras.
Sua inserção neste item se deve à regulamentação deste tipo de prestação de serviços pela Lei n. 9.608/1998, em um momento de flexibilização dos direitos trabalhistas. É mister remarcar que existe um acréscimo do trabalho voluntário, de cunho religioso, graças ao crescimento de seitas pelo país. No mais das vezes, no trabalho voluntário não está presente a voluntariedade do trabalho, mas uma autêntica relação de emprego.
A lei n. 9.608/1998 no art. 1º considera como serviço voluntário: toda atividade não remunerada prestada por pessoa física à entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada sem fins lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade.
Esta normatização exclui da tutela trabalhista o trabalho prestado em instituições de beneficências, ou outras instituições sem fins lucrativos, previstas no
§ 1º, do art. 2º, da CLT.
Como nos ensina XXXXX XXXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX, 43 o trabalho voluntário, em uma análise geral, seria aquele trabalho que se presta pela vontade própria do interessado. O conteúdo do trabalho voluntário será estabelecido em razão da eleição de classe de trabalho que a prestação e realização nele venham a se compreender. É o caso do trabalho religioso.
41 DE XXXX, Xxxxxxxx. Op. cit., 2000, p. 171.
42 XXXXX, Xxxxxx. Tofler: a terceira onda. In: DE XXXX, Xxxxxxxx (organizador). A sociedade pós- industrial. 3ª ed. São Paulo: SENAC, 2000, p. 188.
43 XXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx Xxxxxxx de. Relação de emprego – estrutura legal e supostos. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 130.
O trabalho forçado não se confunde com o trabalho voluntário, porque neste o trabalhador dispensa a remuneração direta, em dinheiro, enquanto no trabalho forçado o não pagamento de salário é violação da liberdade de trabalhar. 44
O contrato de trabalho voluntário se contrapõe ao contrato de emprego, pela ausência de onerosidade, pois o interesse do prestador do trabalho voluntário é o engajamento com os fins da atividade.
Quanto à subordinação, sabe-se que a execução do trabalho voluntário necessita de um mínimo de direção para a realização das tarefas. De sorte que a prestação de serviços voluntários, nos termos do art. 1º, da referida lei, é sem remuneração e mediante termo de adesão, não se fala em relação de emprego (art. 1º, parágrafo único e art. 2º, Lei n. 9.608/1998).
O fundamento do trabalho voluntário reside no sentimento fraterno advindo da própria prestação do serviço. 45 Contudo, se o trabalhador prestar serviços com as características do liame empregatício (art. 3º, da CLT), o vínculo jurídico entre ele e a entidade será de emprego.
4 – Consórcio de Empregadores no Meio Rural
No meio rural está ocorrendo um novo fenômeno que interessa ao Direito do Trabalho, tanto que está tramitando no Congresso Nacional o projeto de Lei n. 3.811, que altera a Lei n. 5.889/1973 e dispõe no art. 1º, II, a respeito do consórcio de empregadores rurais; comuns nos estados do Paraná, São Paulo e Minas Gerais.
O consórcio de empregadores rurais já foi previsto na Lei n. 10.256/2001 que regulamentou, para fins previdenciários, o ato jurídico conhecido como consórcio de empregadores rurais, equiparando-o ao empregador rural pessoa física.46
Pode ser conceituado, nos termos do art. 22-A, da Lei 10.256/2000: “como a união de produtores rurais pessoas físicas, mediante termo específico registrado no cartório de títulos e documentos, com vínculo de solidariedade passiva para fins previdenciários, tendo por objetivo a admissão, gerência e demissão de trabalhadores para prestação de serviços, exclusivamente aos membros, outorgando-se a um deles poderes expressos para atos de gestão e administração dessa mão-de-obra comum”.
O consórcio é constituído por produtores rurais pessoas físicas, e vem sendo utilizado para viabilizar uma utilização mais racional da mão-de-obra rural e evitar as fraudes na contratação de trabalhadores através de grileiros e da instituição de cooperativas de trabalho fraudulentas.
44 TRINDADE, Washington Luiz da. Novas formas contratuais entre o trabalho precário e o voluntário.
Trabalho e doutrina, São Paulo, n.18, set. 1998, p. 58.
45 XXXXXX, Xxxxx Xxxxxxxx de. Trabalho voluntário e trabalho religioso. Revista LTr, São Paulo, v. 60, n. 05, 2000, p. 590.
46 XXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Consórcio de empregadores rurais. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, n.
111, ago. 2001, p. 11.
De sorte que essa modalidade de contratação permite a expansão, no âmbito rural, da relação empregatícia protegida pela Consolidação das Leis Trabalhistas, garantindo ao trabalhador os seus direitos e maior chance de continuidade no vínculo empregatício, 47 graças ao sistema de rodízio do trabalhador pelas várias localidades dos membros do consórcio.
XXXXXX XXXXX XXXXXXX 48 enumera uma série de vantagens para o trabalhador contratado por um consórcio, a saber:
a) regularização dos contratos na área rural e conseqüente diminuição de contratos precários e irregulares;
b) maior proteção ao trabalhador que através da relação de emprego terá garantido seus direitos trabalhistas;
c) continuidade do vínculo devido à prestação habitual de serviços ao longo do ano;
d) a fixação do trabalhador em uma área já que não terá que se deslocar à procura de emprego;
e) o oferecimento ao trabalhador de equipamentos de proteção.
No sentido inverso ao da precarização, o consórcio de empregadores rurais é uma idéia surgida no âmbito social e apresenta um caminho distinto a ser seguido pelo Direito do Trabalho.
* Xxxxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxxx, mestra em Direito do Trabalho, professora substituta de Direito do Trabalho e Legislação Social da Puc-MG.
* Este artigo é parte integrante da dissertação de mestrado da autora apresentada à Puc-MG em 29/08/2002, sob o título “Cooperativas de Mão-de-Obra: Uma Análise a Partir da Relação de Emprego”.
47 XXXXXXXX, Xxxxx. A realidade dos consórcios em Minas Gerais. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, n. 111, ago. 2001. p. 13.
48 XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 173.