Resumo
Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento*
Government procurement within the scope of the WTO: brazilian legislative policy in light of the right to development
Xxxxx Xxxxxx xx Xxxxxxxxxx**
Resumo
O tema comércio internacional e direito ao desenvolvimento, sob a perspectiva das compras governamentais, tem sido objeto de discussões importantes, principalmente no que diz respeito à adesão dos países em desenvolvimento às regras existentes no âmbito do Acordo sobre Compras Governamentais (GPA, ou Government Procurement Agreement) da OMC, que em 2014 completou vinte anos de sua assinatura. O presente artigo tem por objetivo apresentar um estudo jurídico acerca da postura política legislativa brasileira no plano das compras governamentais, diante de um aparente conflito de interesses normativos no Direito Internacional e à luz das normas e princípios contidos na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU e no GPA, a fim de verificar se há uma tendência legislativa protecionista de mercado das compras públicas nacionais ou se o Brasil privilegia a liberalização comercial no setor público. Para tanto, o estudo desenvolveu-se por meio do método comparativo, no qual, em um primeiro momento, analisou-se o direito fundamental ao desenvolvimento, nos planos normativos internacional e nacional. Em seguida, explorou-se o GPA sob o prisma das iniciativas propostas nas Reuniões Ministeriais, desenvolvidas ao longo dos seus vintes anos, bem como o de sua flexibilização. Posteriormente, investigou-se a política legislativa de compras governamental brasileira, destacando-se a intensa utilização da licitação como instrumento de políticas públicas econômicas, sociais e ambientais. Conclui-se que, ao não aderir ao GPA, o Brasil adotou uma postura de política protecionista do mercado de compras públicas, em que atualmente é questionada a efetividade do mecanismo da margem de preferência, bem como se esta se encontra sob pressão em razão da aproximação de parceiros comerciais ao Acordo da OMC. Em relação à temática do artigo, pode-se afirmar que o assunto é inquietante e dinâmico e que o ponto de vista apresentado é inédito e valioso, quando se considera o estudo das compras governamentais sob a lente do aparente conflito de normas e princípios basilares do Direito Internacional.
Palavras-chaves: Comércio internacional. OMC. Desenvolvimento. Compras governamentais. Políticas discriminatórias.
Abstract
The theme of international trade and the right to development, from the perspective of government procurement, has been the subject of many important discussions. In particular, there has been much debate about the adherence
DOI: 10.5102/rdi.v11i2.3087
* Recebido em: 25.10.2014 Aceito em: 30.11.2014
** Mestre em Direito pelo UniCeub, xxxxx.xxx@xxxxxxx.xxx.
of developing countries to the existing rules under the WTO Agreement on Government Procurement (GPA), which in 2014 marked 20 years since its signing. The purpose of this paper is to present a legal analysis of Brazilian legislative policy regarding government procurement in response to an apparent conflict of interests of normative international law and in light of the rules and principles contained in the Declaration on the Right to Development of the UN and the GPA. This analysis verified if there is a trend towards protectionist legislation in national public procurement or if Brazil privileges trade liberalization in the public sector. To this end, the study was developed using a comparative method, in which it first analyzed the fundamental right to development in international and national regulatory plans. We then explored the GPA through the prism of the initiatives proposed at ministerial meetings, developed over its 20 years of existence, in addition to its flexibility. Subsequently, the legislative policy of Brazilian government purchases was investigated, with special emphasis to the intense use of public procurement as a tool for economic, social and environmental policies. In conclusion, it was determined that by not joining the GPA, Brazil adopted a protectionist policy regarding the government procurement market. Nowadays, this attitude has been questioned as to the effectiveness of the margin of preference mechanism and is under pressure due to the approximation of commercial partners to the WTO agreement. Regarding the theme of this article, it can be stated that the subject matter at hand is an instigating and dynamic one and that the view presented here is novel and can contribute to the study of government procurement, through the lens of the apparent conflict of regulations and basic principles of international law.
Keywords: International trade. WTO. Development. Government procurement. Discriminatory policies.
1 Introdução
A temática das compras governamentais está inserida
das maiores oportunidades de negócios, em razão dos valores envolvidos e da visão de que o Estado é o mais importante cliente na maioria das economias ao redor do mundo.
A compreensão do fenômeno jurídico- administrativo da contratação pública não pode prescindir da análise de sua necessária correspondência com o contexto político, econômico, social e cultural, verificável e real, em que opera de modo dinâmico, em movimento e realização, e que se circunscreve historicamente em sua concretização.
De caráter bastante atual, a presente pesquisa tem por finalidade contribuir para a consolidação do entendimento de que as relações comerciais entre as nações causam impactos, na efetivação dos direitos humanos e nas possibilidades de desenvolvimento dos Estados e das pessoas, devendo haver uma aproximação desses três temas: direitos humanos, relações comerciais e desenvolvimento.
Assim, por muito tempo, o direito ao desenvolvimento foi interpretado, pelos Estados em desenvolvimento ou menos desenvolvidos,1 como um proeminente direito relacionado a obrigações externas a esses grupos, no qual os países desenvolvidos teriam o dever de promover o desenvolvimento daqueles menos favorecidos. Obviamente, um direito fundamentado somente em obrigações de terceiros tornar-se-ia um direito político, sendo efetivado apenas por acordos de “boas intenções” em decisões políticas. Assim, o conceito de direito ao desenvolvimento deveria ser ampliado, exigindo ações pragmáticas e atribuindo, da mesma forma, aos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos, responsabilidades de promoção do desenvolvimento, por meio de políticas públicas domésticas.2
Simultaneamente aos fenômenos da ampliação do conceito de desenvolvimento e da consolidação dos direitos humanos, em meados da década de 1990, as compras governamentais tiveram seu paradigma modificado de atividade secundária e instrumental, com
em um campo de pesquisa dinâmico, no qual diversas
questões jurídicas, econômicas, de políticas públicas e de relações comerciais formam uma combinação que é complexa para ambos os setores, o público e o privado. Para o primeiro, as questões relacionadas às compras e sua regulação podem ser instrumentos de efetivação de políticas públicas, quer sejam econômicas, sociais ou ambientais. Para o segundo, significam a maior ou uma
1 O Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) inicialmente se referia a dois grupos de países: os desenvolvidos e os menos desenvolvidos. Os países em desenvolvimento passaram a constituir um novo grupo a partir da criação da Cláusula de Habilitação, em 1979.
2 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Desenvolvimento e tratamento especial diferenciado na OMC: uma abordagem sob a perspectiva da doutrina do stare decisis – Parte II. Revista de Direito Econômico Socioambiental, Curitiba, v. 3, n. 2, jul./dez. 2012. p. 310.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
o fim de atender uma demanda imediata do Estado, para instrumento de desenvolvimento econômico, em razão dos valores empregados na atividade contratual estatal. Dessa percepção, diversos marcos internacionais foram estabelecidos por organismos e blocos internacionais de importante representação, como, por exemplo, Organização Mundial do Comércio (OMC), United Nations Commission on International Trade Law (UNCITRAL) e North American Free Trade Agreement ( NAFTA), a fim de reconhecer a importância do Estado como contratante.3
Estabelecida a aproximação dos temas direitos humanos, relações comerciais e desenvolvimento, posteriormente faz-se necessária a análise da internação do plano normativo internacional das compras públicas, com ênfase no Acordo sobre Compras Governamentais da OMC (Government Procurement Agreement– GPA), que completa vinte anos, no plano jurídico internacional.
No sistema policêntrico4 de produção do direito, no qual não há somente a fonte estatal, não se pode mais considerar o Poder Legislativo como o titular do monopólio de sua produção. Na pluralidade normativa, tem-se a incorporação de ditames locais, regionais, nacionais, comunitárias e internacionais. Por conseguinte, atualmente, o regime de compras governamentais é regulado em três ordens: i) interno (nacional e local); ii) internacional (produto de pactos, acordos e convenções); e iii) o concreto particular, no âmbito de cada contrato celebrado.5
Partindo-se da premissa de que problemas globais requerem soluções globais, a internacionalização da questão da regulação das compras públicas apresenta desafios que se referem a obstáculos práticos à competição, transparência e igualdade de tratamento, entre outras questões, ou que implica outros aspectos como a harmonização de normas, o adequado uso de
3 XXXXXXXXX-XXXXXX, Xxxxxxx. Introduction: the global challenges of international public procurement. In: . International Public Procurement. London: Globe Law and Business, 2009. p. 10.
4 Sistema jurídico que tem por característica a capacidade de substituir “a coerção pelo consenso, o comando pela negociação, a decisão imperativa pela persuasão, a intervenção controladora por mecanismos descentralizados de auto direção e, por fim, a responsabilização individual pela organizacional, nas condutas potencialmente comprometedoras do equilíbrio sistêmico da sociedade.” Xxxxxxx XXXXX, Xxxx Xxxxxxx. O direito na economia globalizada. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 194.
5 XXXXX, Xxxxxxx. Licitación pública. 4. ed. Buenos Aires: Hispania Libros, 2010. p. 2.
tecnologia, a luta contra a corrupção, a sustentabilidade ambiental e a defesa da competição nas contratações públicas contra qualquer forma de distorção.6
Diante do problema posto, o artigo tem por objetivo confirmar a hipótese de que o legislador brasileiro, ao estabelecer o plano normativo nacional de compras governamentais e segundo o conceito de policy space,7 harmonizou a norma brasileira ao Direito Internacional ao adotar e privilegiar o direito fundamental ao desenvolvimento econômico, com verdadeiro status de norma jus cogens, 8 disposto na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas – ONU (1986). Ao mesmo tempo, optou por não aderir ao GPA (1994), da OMC, pois, fazendo isso, em tese poderia contrariar o Princípio da Não-Discriminação,9 ao
6 XXXXXXXXX-XXXXXX, Xxxxxxx. Introduction: the global challenges of international public procurement. In: . International Public Procurement. London: Globe Law and Business, 2009.p. 9.
7 Policy Space trata da liberdade de escolha, conferida aos países em desenvolvimento, para optar pela melhor combinação de políticas possíveis para alcançar um desenvolvimento econômico sustentável e equitativo, segundo o seu único e individual caráter social, político, econômico e condições ambientais. Ele se refere ao espaço para políticas nacionais, especialmente nas áreas de comércio, investimento e desenvolvimento industrial e reflete a ideia de que os governos devem ter flexibilidade para avaliar o trade- off entre os benefícios de aceitar regras internacionais e as restrições impostas pela perda de espaço político. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx/xxxxx/xxxxxx/0/xxxxxxxx/0000/ DOC20476.pdf >. Acesso em: 30 set. 2014.
8 Dispõem o artigo 53 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969 que: “A norma do jus cogens é aquela norma imperativa de Direito Internacional geral, aceita e reconhecida pela sociedade internacional em sua totalidade, como uma norma cuja derrogação é proibida e só pode sofrer modificação por meio de outra norma da mesma natureza”. Já para o Dicionário Diplomático, jus cogens significa o direito taxativo, ou seja, o conjunto de normas inderrogáveis mediante consentimento das partes e que não admitem pacto contrária dada à natureza do bem que tais normas tutelam: a ordem pública. A tais normas designadas por imperativas, opõem- se outras que dependem da vontade das partes, ou seja, normas dispositivas.
9 O Artigo III: 1 e 2 do GPA dispõe sobre o princípio fundamental de Não-Discriminação. Primeiramente, uma Parte do GPA deve estabelecer tratamento “não menos favorável” a produtos, serviços e fornecedores de outras Partes do GPA do que o tratamento dado aos produtos, serviços e fornecedores domésticos. Além disso, uma Parte do GPA deve tratar os produtos, serviços ou fornecedores de uma Parte do GPA não menos favoravelmente do que o tratamento determinado a qualquer outra Parte do GPA (não-discriminação entre Partes estrangeiras do GPA). Ademais, o GPA obriga as Partes a garantir que as entidades governamentais não discriminem entre fornecedores locais devido à participação
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
adotar privilégios aos produtos e empresas nacionais, por meio do afastamento do processo licitatório e da aplicação da margem de preferência, para adjudicação do contratado. Para atingir tal objetivo, o autor utiliza-se do método comparativo ao analisar os planos normativos internacionais (OMC e ONU) e nacionais (Constituição Federal de 1988 e legislação infraconstitucional de compras governamentais).
Inicialmente, o artigo tratará do direito fundamental ao desenvolvimento no Direito Internacional e na Constituição de Federal de 1988 e, posteriormente, abordará o plano normativo sobre compras governamentais da OMC, especificamente no que se refere ao Acordo sobre Compras Governamentais, com ênfase no Princípio da Não-Discriminação. Em seguida, será estudada a internação do direito ao desenvolvimento na legislação brasileira de compras governamentais, destacando-se a aplicação da margem de preferência aos produtos nacionais. Da análise dos planos normativos, dos princípios e do direito fundamental, o artigo concluirá sobre a postura política adotada pelo Brasil em matéria de compras governamentais. Adverte-se que, pela dimensão e importância do tema, não se tem o intuito e nem a possibilidade de exploração plena do assunto; todavia, tem-se por objetivo contribuir para a discussão acadêmica ao levantar mais um ponto de vista sobre essa temática, de característica tão dinâmica quanto instigante.
2 Plano normativo da ONU e o direito fundamental ao desenvolvimento
O presente tópico iniciar-se-á com o seguinte questionamento: qual é a relação entre o direito internacional e o desenvolvimento econômico? Certamente, pode haver diversas respostas e de natureza bem diferente, se essa questão for posta a um país desenvolvido ou a um país em desenvolvimento ou de menor desenvolvimento relativo. Assim, a
resposta somente pode ser dada pelo próprio direito internacional,10 e resta uma afirmação provocativa de Xxxx Xxxxxxxxx, em 1976, de que “nenhum esclarecimento foi oferecido até hoje para explicar por que os países pobres são pobres e os países ricos são ricos.”11
Considerando o direito como estratégico para o desenvolvimento, aquele passou a ser visto como instrumento destinado à regulação das relações entre agentes privados e Estado com vistas a aumentar a eficiência econômica. Dessa maneira, o direito seria responsável por proporcionar um ambiente de garantia da transparência e da segurança nas relações econômicas mediante a proteção ao direito de propriedade, edição de normas contratuais e societárias, que garantissem segurança e fluidez, e manutenção de um sistema judicial efetivo.12
O direito ao desenvolvimento envolve conflitos distributivos que precisam ser analisados sob a luz da conexão de distribuição e justiça, afastando-se a ideia das relações não somente no plano econômico, mas também nas possíveis reflexões normativas pertinentes ao direito contemporâneo. Sob a lente econômica, o desenvolvimento não tem qualquer compromisso prévio com uma concepção jurídica ou moral de desenvolvimento. Colocado em perspectiva de sua natureza jurídica, desperta questionamentos como, por exemplo, se esse é realmente um direito ou um princípio e se ele pode ser utilizado como padrão para as decisões judiciais.13
Com as ideias colocadas por Xxxx Xxxxxx, que propôs um aumento da intervenção estatal na economia como modo de corrigir os malefícios gerados pelo sistema capitalista de produção, o direito
10 COSTA, Ligia Maura. OMC e direito internacional do
desenvolvimento sustentável. São Paulo: Quartier Latin, 2013. p. 243.
11 XXXXXX, Xxxxx X. A riqueza e a pobreza das nações: por que algumas são tão ricas e outras tão pobres. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
12 XXXXX, Xxxxxxx Xxxxx; XXXXXXXXXXX, Xxxxxxx.
estrangeira ou afiliação, e que tais entidades não discriminem entre entidades locais devido ao local de produção do bem ou serviço fornecido, sob a condição de que as Regras de Origem do Artigo IV do GPA sejam respeitadas. Esse dispositivo dá ao princípio da Não- Discriminação uma aplicação mais efetiva, uma vez que visa às ações individuais das entidades governamentais e evita a discriminação individual. Para garantir o princípio da Não-Discriminação, o Artigo III é complementado por outros dispositivos constantes do Acordo, que enfatizam os procedimentos para assegurar transparência das leis, regulamentos, procedimentos e práticas relacionadas às Compras Governamentais.
Litígio de interesse público e desenvolvimento. O direito ao desenvolvimento sob a perspectiva do pensamento jurídico contemporâneo. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 93.
13 XXXX, Xxxx Xxxxxx. O direito ao desenvolvimento sob a perspectiva do pensamento jurídico contemporâneo. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 32.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
ao desenvolvimento apresenta-se como uma dimensão dos direitos humanos econômicos, nivelando seu campo de interesse de livre mercado e de justiça social, com a intervenção dirigente do poder público, que observa o comportamento dos agentes do setor e de sua correspondência com os valores concernentes ao primado dos direitos humanos. Como desdobramento destes, o direito ao desenvolvimento constitui-se em uma prerrogativa inerente à natureza humana, surgindo daí a necessidade estatal de elaborar e consagrar políticas públicas voltadas para sua concretização.14
No direito internacional, o direito ao desenvolvimento foi situado nos diversos acordos e tratados internacionais, que têm por finalidade regulamentar as condições mínimas e vitais para a humanidade. A primeira referência ao respectivo direito foi disposta na Carta das Nações Unidas, de 26 de junho de 1946, no artigo 1º, que trata dos objetivos das Nações Unidas, em seu parágrafo 3º, ao estipular que seja realizada a cooperação internacional, com a resolução dos problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, promovendo e estimulando o respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião. Para realizar tal objetivo, no mesmo diploma, no capítulo X, foi criado o Conselho Econômico e Social, estabelecendo funções e atribuições que são exercidas por meio de suas comissões e que têm como escopo o estudo de questões econômicas e sociais e a proteção dos direitos humanos.
Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos
tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.
A fim de complementar as diretrizes contidas na DUDH, foi assinado o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), adotado pela Assembleia Geral da ONU, em 1966, constituindo-se no principal instrumento internacional de proteção dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e consolidando uma série de direitos já declarados na DUDH. O PIDESC, ao lado da Declaração e do Pacto dos Direitos Civis e Políticos, configura-se como instrumento da denominada Declaração Internacional de Direitos Humanos.
Atualmente, as mais importantes declarações e resoluções pertinentes ao direito do desenvolvimento utilizados no direito internacional são: i) Resolução nº 2.626 – estratégia Internacional do Desenvolvimento; ii) Resolução nº 3.201 – Declaração da Nova Ordem Econômica Internacional; iii) Resolução nº 3.202 – Declaração do Programa de Ação; e iv) Resolução nº
3.291 – Carta dos Direitos e deveres Econômicos dos
Estados.15
Como assinalado no primeiro dos Princípios Linburg,16 os direitos econômicos, sociais e culturais, como instrumentos fundamentais ao desenvolvimento, formam parte integral do direito internacional dos direitos humanos, sendo esse direito objeto de obrigações específicas contratadas no contexto de vários
Humanos (DUDH), considerada como um documento
marco na história dos direitos humanos, por ter sido elaborada por representantes de diferentes origens jurídicas e culturais de todas as regiões do mundo, estabeleceu a proteção universal dos direitos humanos pela primeira vez. A Declaração foi proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris, em 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução 217 A
(III) da Assembleia Geral. Assim como na Carta das Nações Unidas, na DUDH está disposto no seu artigo XXI que todo ser humano, como membro da sociedade,
14 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 124.
15 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 126.
16 Um grupo de especialistas de destaque no campo do direito internacional, convocado pela Comissão Internacional sobre Juristas, da Faculdade de Direito Universidade de Limburg (Maastricht, Países Baixos) e do Instituto de Direitos Urban Morgan Humana da Universidadede Cincinnati (Ohio, EUAAmerica), reuniu-se em Masstricht, no período de 2 a 6 de junho 1986, com o propósito de analisar a natureza e a extensão das obrigações dos Estados Partes no âmbito do Pacto Econômico Internacional, Social e Culturais. Do encontro, surgiram os princípios Linburg. Disponível em: <http:// xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxx/xxxxxxxxxx/xxx- principios-de-limburg-sobre-la-aplicacion-del-pacto-internacional- de-derechos-economicos-sociales-y-culturales-2.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
instrumentos internacionais, especialmente o PIDESC. No mesmo documento, no princípio de número onze, ressalta-se a importância da participação de todos os setores, em especial da participação popular, em cada etapa do processo, incluindo a formulação, aplicação e revisão de políticas nacionais, com o objetivo de realização dos direitos acima citados.17
Não obstante os documentos normativos já citados, o direito ao desenvolvimento se consagra definitivamente como direito fundamental, quando da aprovação da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, da ONU, em 14 de dezembro de 1986, adotada pela resolução nº 41/128 da Assembleia Geral das Nações Unidas. Com um extenso preâmbulo e dez artigos, a Declaração firma o entendimento de desenvolvimento como um processo econômico, social, cultural e político abrangente, que visa à melhoria constante do bem-estar de toda a população e de todos os indivíduos com base na sua participação ativa, livre e significativa no processo de desenvolvimento e na justa distribuição dos benefícios dele derivados.
A Declaração proclama, no primeiro eixo, que o direito ao desenvolvimento é inalienável em virtude do fato de que todos os seres humanos e todos os povos têm o direito de participar, de contribuir e de gozar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, de forma que todos os direitos humanos e liberdades fundamentais se possam plenamente realizar. No segundo eixo, o respectivo direito humano implica também a plena realização do direito dos povos à autodeterminação, o qual inclui, sem prejuízo das disposições pertinentes de ambos os Pactos Internacionais sobre Direitos Humanos, o exercício do seu direito inalienável à plena soberania sobre todas as suas riquezas e recursos naturais.
Portanto, os Direitos Humanos e, entre eles, o direito ao desenvolvimento, compreendido como direito de terceira geração e de caráter difuso, devem ocupar uma posição hierarquicamente superior aos demais tratados
garantidoras do desenvolvimento sem que se olvide dos critérios estruturantes de transformação social.
Não mais sendo discutível a natureza do direito ao desenvolvimento como direito fundamental e jus cogens, faz-se necessário classificá-lo. Pelo seu caráter difuso, reconhecido pela indivisibilidade dos bens que tutela, o direito ao desenvolvimento pode ser classificado, como dito, como pertencente à terceira geração, de natureza difusa, sendo considerado como um “direito de solidariedade”.
Os indivíduos, nessa acepção, são os destinatários reais dos benefícios, mas somente o são mediatamente, uma vez que — notadamente — sobrepõe-se o interesse coletivo ao individual.18
Por fim, conclui-se parcialmente que, com a exposição do plano internacional sobre o direito ao desenvolvimento, fica assim disposto que o Estado passa a ser o sujeito passivo dessa relação e o principal responsável em criar as condições favoráveis ao desenvolvimento supranacional e interno dos povos e dos indivíduos.19 Em seguida, será analisado o direito fundamental ao desenvolvimento no âmbito da Constituição Federal do Brasil de 1988.
3 O direito fundamental ao desenvolvimento na Constituição Federal de 1988
Como analisada no tópico anterior, a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986 vem sendo considerada parte integrante da Carta Internacional dos Direitos Humanos, ao lado da Carta de São Francisco, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos dois Pactos Internacionais de Direitos de 1966: o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; e o Pacto dos Direitos Civis e Políticos. Na Declaração de 1986, está previsto no artigo 6º, item 2, que “todos os direitos humanos e liberdades fundamentais são indivisíveis e interdependentes; atenção igual e consideração urgente devem ser dadas
internacionais com verdadeiro status de norma jus cogens,
para que se garanta o cumprimento de todas as normas
17 UNIVERSIDAD NACIONAL DE LA PLATA. Los principios de Limburg sobre la aplicación del pacto internacional de derechos económicos, sociales y culturales. Disponível em: <http:// xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxx/xxxxxxxxxx/xxx- principios-de-limburg-sobre-la-aplicacion-del-pacto-internacional- de-derechos-economicos-sociales-y-culturales-2.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2014.
18 XXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Direito ao desenvolvimento como direito fundamental. In: CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI. p. 6952-6971. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxxxxx/xxxxx/xx/ manoel_messias_peixinho.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2014.
19 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 127-128.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
à implementação, promoção e proteção dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais”.
Como signatário dos principais tratados e pactos internacionais sobre a questão do desenvolvimento, o Brasil estabeleceu em sua Constituição Federal de 1988 alguns dispositivos constitucionais no sentido de promover tal direito fundamental, como veremos a seguir. Não obstante, há um intenso debate na doutrina e na jurisprudência em relação à incorporação dos tratados internacionais de direito humanos (TIDH) no ordenamento jurídico brasileiro, no qual se destacam quatro linhas de pensamento, quanto ao reconhecimento da natureza e hierarquia dos TIDH em relação ao direito pátrio: i) corrente que reconhece a natureza supranacional; ii) corrente que reconhece a natureza constitucional; iii) corrente que reconhece a natureza de lei ordinária; e iv) corrente que reconhece a natureza supralegal.20
No presente trabalho, adota-se o entendimento segundo o qual os tratados de Direitos Humanos possuem estatura constitucional, assegurando a essas normas a aplicabilidade imediata em nível nacional e internacional desde o ato de ratificação, escusando intermediações legislativas, em face do seu caráter especial em relação aos tratados internacionais sobre as demais matérias. Sob a lente utilizada, os conflitos emergentes entre o tratado e a Constituição devem ser solucionados pela aplicação da norma mais favorável à vítima da violação do direito humano, titular do direito, tarefa hermenêutica de incumbência dos tribunais nacionais e dos órgãos de aplicação do Direito.21
Na vigente Constituição Federal, a interpretação sistêmica de seus dispositivos leva-nos a concluir
20 EMERIQUE, Xxxxxx Xxxxxxx; GUERRA, Sidney. A incorporação dos tratados internacionais de direitos humanos na ordem jurídica brasileira. Revista Jurídica, Brasília, v. 10, n. 90, p.01-34, abr./maio, 2008. Ed. Esp. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx. br/ccivil_03/revista/Rev_90/Artigos/PDF/SidneyGuerra_Rev90. pdf>. Acesso em: 30 ago. 2014. Sobre a relação entre os tratados
sobre a prevalência do princípio da compatibilização do interesse privado com o coletivo e difuso, não podendo os últimos oprimir os interesses individuais. Assim, o interesse coletivo deve ser compatibilizado com a livre iniciativa e com o princípio da liberdade econômica, em virtude de que a liberdade privada não pode ser suprimida em um sistema capitalista.22 Não se pode pensar num Estado comprometido com o desenvolvimento nacional, fundamentado somente no critério econômico, mas sim aliado a critérios estruturantes de transformação social.
O texto da Carta Magna de 1988 estabeleceu expressamente a garantia ao desenvolvimento nacional, como um dos objetivos fundamentais da República do Brasil, no inciso II do artigo 3º, bem como reconheceu, em seu elenco de direitos fundamentais, o denominado direito ao desenvolvimento. O reconhecimento desse direito tem por consequência o dever do Estado em intervir na esfera privada, por meio de incentivo, fomento e condução do desenvolvimento, principalmente nas etapas de formulação e implementação de políticas públicas que tenham por finalidade a efetivação dos direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais.23
Em outra passagem, no preâmbulo da Constituição, o direito ao desenvolvimento restou consolidado ao dispor que, ao instituir o Estado Democrático, cabe assegurar, entre outros valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, o desenvolvimento. Assim, tanto o governo como a Administração Pública devem agir para a concretização desse desiderato.
No que tange o direito ao desenvolvimento como direito fundamental, não há expressamente na Constituição disposição nesse sentido. Não obstante, pode-se afirmar que o respectivo direito enquadra-se na regra disposta pelo § 2º, do artigo 5º, que enuncia que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
internacionais de direitos humanos e a Constituição Federal Brasileira,
os autores entendem que a hierarquia dos tratados é estabelecida conforme o atendimento de requisitos dispostos no §3º, do art. 5º, da CF, ou não. No primeiro caso, conforme o §3º, os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. No segundo caso, o entendimento jurisprudencial é de que se trata de normas supralegais (STF).
21 PIOVESAN, Flávia. A Constituição Brasileira de 1988 e
os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. In:
. Temas de direitos humanos. 2. ed. São Paulo: Xxx Xxxxxxx, 2003. p. 44-56.
22 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 131.
23 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx xx. Direito ao Desenvolvimento na Constituição Brasileira de 1988. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n.16, nov./ dez./jan., p. 2. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx. com/revista/REDAE-16-NOVEMBRO-2008-XXXXXXX%20 XXXXXXX.pdf>. Acesso em: 30 set. 2014. p. 2.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Logo, os direitos fundamentais fora do catálogo podem ser escritos, se presentes na Lei Maior ou em tratados internacionais, ou não escritos, decorrentes do regime e dos princípios. Faz-se necessário, para serem assim qualificados, que os direitos fundamentais fora de catálogo preencham os critérios de conteúdo (substância) e importância (relevância), para que possam ser equiparados aos direitos integrantes do elenco do Título dos Direitos e Garantias Fundamentais da Constituição Federal de 1988.24
Da defesa de que o direito ao desenvolvimento é um direito fundamental e da previsão da dignidade da pessoa humana, como fundamento da República (artigo 1º, III, CF), do qual todos os demais princípios derivam e que norteia todas as regras jurídicas, o Estado contemporâneo tem o papel indutor, promotor e garantidor do desenvolvimento nacional, tendo como norteador de suas ações a pessoa humana. Assim, é dever estatal “exercer ações em número, extensão e profundidade suficientes para bem desincumbir-se da obrigação constitucional de realizar um dos valores que fundamentam a República Federativa do Brasil: a dignidade da pessoa humana”.25
Da mesma forma, a dignidade da pessoa humana é novamente abordada, quando da elaboração da Constituição econômica, na qual está inserida a ordem econômica brasileira, nos artigos 170 e seguintes da Constituição Brasileira vigente. No caput do artigo
170 está disposto que, a fim de assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social, a ordem econômica brasileira deve ser fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa. O constituinte brasileiro evidencia dessa forma que na Carta Magna de 1988 há o direito civil e empresarial, que regula os interesses individuais, e o direito econômico, que regula o direito difuso e o coletivo.
Para se atingir o fim de assegurar a todos a existência digna, o Estado tem a possibilidade de intervir na esfera econômica sempre que julgar necessário para se
24 XXXXXX, Xxxx Xxxxxxxx. A eficácia dos direitos fundamentais. 3.
ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 99.
25 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx xx. Direito ao Desenvolvimento na Constituição Brasileira de 1988. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 16, nov./ dez./jan., p. 2. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx. com/revista/REDAE-16-NOVEMBRO-2008-XXXXXXX%20 XXXXXXX.pdf>. Acesso em: 30 set. 2014. p 10.
alcançar os fins constitucionais e proteger e viabilizar os princípios por ela estabelecidos. A ordem econômica brasileira, por meio dos seus nove princípios, sistematiza o campo das atividades lucrativas e, ao mesmo tempo, “compatibiliza o seu desenvolvimento com a efetividade das políticas de redução das desigualdades sociais e erradicação da pobreza”.26
Conclui-se que o direito ao desenvolvimento, entre os direitos econômicos, é um direito de intervenção na ordem econômica, considerando que a Constituição, embora reconheça o poder econômico, reconhece também que este pode ser exercido de forma contrária à efetivação de direitos sociais, cabendo nesses casos a intervenção estatal. Nesse sentido, a Constituição Brasileira outorga ao Estado a atividade de regulação da economia, no seu artigo 174, caput, atribuindo um papel de agente normativo e regulador da atividade econômica, por meio da execução de funções como fiscalizar, regular e planejar a economia, sendo essa última indicativa para o setor privado e determinante para o público.
Por fim, afirma-se que a atividade regulatória e normativa estatal tem por finalidade essencial a realização dos valores fundamentais da República, dispostos nos artigo 1º e 3º da Carta Magna, não fundamentando, portanto, suas ações estatais somente nos princípios da ordem econômica, arrolados no artigo constitucional
170.27 A seguir, serão explorados os principais fatos e considerações sobre o Government Procurement Agreement, ao longo dos seus vinte anos de vigência.
4 Os vinte anos do Agreement on Government Procurement (GPA)
Até o fim da década de 1980, as compras governamentais não eram reconhecidas como uma distinta e separada disciplina, sendo entendidas como um conjunto de regras puramente internas, utilizadas pelo Estado para contratar com o setor
26 XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013. p. 135.
27 XXXXXX, Xxxxxxx. Função regulatória da licitação. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 19, ago./set./out., 2009. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx/xxxxxxx/ REDAE-19-AGOSTO-2009-XXXXXXX-XXXXXX.pdf>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
privado a fim de satisfazer necessidades públicas. Todavia, essa visão foi sendo modificada no sentido de visualizar o Government procurement como um instrumento de ampliação de demandas, estimulação de desenvolvimento econômico, criação de empregos e desenvolvimento regionais. Paralelamente à mudança de paradigma descrita, instituições e novas regras de comércio internacional surgiram e dominaram a arena global, valorizando as compras governamentais como parte vital para uma nova ordem econômica.28
Nesse sentido, em meados dos anos 1990, importantes marcos internacionais foram estabelecidos no cenário mundial, como o Government Procurement Agreement (GPA) da OMC; o Law on Procurement of Goods, Construction and Services da United Nations Commission on International Trade Law (UNCITRAL),29 e outros instrumentos internacionais que envolviam o tema como, por exemplo, North America Free Trade Agreement (NAFTA), de 1994. Logo, ficou claro que o tema das compras governamentais havia se tornado uma questão de interesse internacional, e que foram estabelecidos princípios fundamentais para a sua regulamentação, como: eficiência, efetividade, justiça, abertura aos estrangeiros, competição, transparência, controle e adequado gerenciamento de conflitos.30
As compras governamentais (government procurement, em inglês) referem-se ao processo de compras, leasing, arrendamentos e contratações realizados por entidades ou agências governamentais.
Na OMC, o GPA, que regulamenta esta modalidade, faz parte dos chamados acordos
28 XXXXXXXXX-XXXXXX, Xxxxxxx. Introduction: the global challenges of international public procurement. In: . International Public Procurement. London: Globe Law and Business, 2009. p. 9.
29 Órgão judicial principal do sistema das Nações Unidas no campo do direito comercial internacional. Corpo jurídico com a adesão universal, dedicado à reformada legislação societária em todo o mundo há mais de 40 anos. O papel da UNCITRAL é modernizar e harmonizar as regras do comércio internacional. Em 2011, foi editada uma nova versão da Lei Modelo de Contratações Públicas. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxxxxx/xx/xxxxxxxx_ texts/procurement_infrastructure/2011Model.html>. Acesso em: 15 out. 2014.
30 XXXXXXXXX-XXXXXX, Xxxxxxx. Introduction: the global challenges of international public procurement. In: . International Public Procurement. London: Globe Law and Business, 2009. p. 10.
plurilaterais,31 negociados na Rodada de Tóquio32 e renegociado na Rodada Uruguai (entre os anos de 1986 e 1994), contendo direitos e obrigações para as partes signatárias. Seu objetivo principal é estender às compras governamentais de um país os princípios basilares da Nação Mais Favorecida ou Most-Favoured Nation (MFN)33 e o do tratamento nacional ou nation and National Treatment (NT),34 ou seja, a concessão de tratamento não menos favorável do que o concedido aos produtores e fornecedores nacionais. O GPA foi renovado em 15 de abril de 1994, mesma data de criação da OMC, tendo entrado em vigor em 1º de janeiro de 1996 e sendo vigente até os dias atuais.
Logo, o estabelecimento do GPA teve por escopo a superação do paradigma presente em quase todo o século XX, no qual as contratações públicas permitiriam alcançar objetivos de bem-estar nacional, aplicando- se mecanismos de discriminação que privilegiariam a “aquisição doméstica” ou “preferencial”, como forma de estímulo à indústria nacional e de concentração de ganhos nas empresas nacionais.35 Em sentido contrário, o GPA parte do pressuposto segundo o qual as políticas discriminatórias prejudicam o bem-estar mundial, de forma que a liberalização da contratação pública seria uma consequência necessária para garantir o bem- estar.36
Cabe destaque para a análise do período no qual o GPA foi negociado, o ano de 1994, por meio da Rodada Uruguai. Portanto, o Acordo “nasceu em um contexto neoliberal, onde a integração de mercados e a vislumbrada eliminação de barreiras ao livre comércio significavam a ordem do dia’. Seu objetivo, portanto, seria o da liberalização, estando quaisquer outros objetivos relegados à condição de exceções.”37 Logo,
31 A OMC, segundo seu acordo constitutivo, tem o encargo de administrar dois tipos de acordos, os multilaterais e os plurilaterais. Os primeiros são vinculantes para todos os membros da OMC, enquanto os plurilaterais são de decisão voluntária. Os acordos multilaterais estão dispostos nos anexos 1, 2 e 3 do Acordo Constitutivo da OMC, e os plurilaterais, em seu anexo 4.
32 O primeiro Acordo sobre compras governamentais foi assinado em 1979, entrando em vigor em 1981, e foi a seguir emendado em 1987. As emendas entraram em vigor em 1988.
33 GATT 1947, artigo I.1.
34 GATT 1947, artigo III.4.
35 XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013. p 29-30.
36 XxXXXX, Xxxxxxx; XxXXXXXX, Xxxx. Government procurement and international trade. Journal of International Economics. v. 26, 1989. p. 292.
37 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. A OMC e o policy space dos
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
as questões ligadas ao desenvolvimento pareciam estar bloqueadas nos foros econômicos e comerciais, olvidando-se de que a importância cada vez maior dos direitos humanos, na ordem internacional, estava vinculada aos temas econômicos.38
Outra questão relevante refere-se aos Estados- membros que aderiram ao GPA no primeiro momento, em 1o de janeiro de 1996, data em que o Acordo passou a vigorar.39 Dos 21 países aderentes ao Acordo de Compras Governamentais, oito estavam entre as dez maiores economias do mundo (Brasil e China estavam entre as dez, mas não aderiram),40 o que sugere que o GPA, pelo menos no primeiro momento, parecia mais atrativo aos países desenvolvidos e economicamente mais fortes. Pelo fato de o acordo ser plurilateral e de adesão não obrigatória, conclui-se, da mesma forma, que os países em desenvolvimento e menos desenvolvidos se posicionaram segundo a lógica de que quanto menos compromissos assumidos, melhor para esses Estados, pois teriam maior flexibilidade para a regulamentação interna de políticas públicas ( policy space).41
Os governos, ao aderir ao GPA e abdicar de políticas domésticas discriminatórias, procuravam alcançar duas finalidades: i) a redução da despesa pública possibilitada pela concorrência internacional, que resultaria da abertura da contratação pública; e ii) o incremento das exportações, diante da conquista de novos mercados resultante da reciprocidade associada à liberalização da contratação pública.42
Ainda na década de 1990, mais cinco países aderiram
ao GPA: República da Coreia, Hong Kong (China),
Estados: questões de flexibilidade, desenvolvimento sustentável e políticas públicas no GATT e GATS. In: XXXXXX XXXXXX, Xxxxxxx do; XXXXX XXXXXX, Xxxxxxx (Org.). A OMC: desafios e perspectivas. São Paulo: Aduaneiras, 2014. p 65.
38 PERRONE-MOISÉS, Xxxxxxx. Direito ao desenvolvimento e
Liechtenstein, Países Baixos, com respeito a Aruba, e Singapura. Já nos anos 2000, mais dezesseis países se associaram ao GPA: Armênia, Taipei (China), Islândia, Chipre, Eslovênia, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta, Polônia, República Checa y República Eslovaca, Bulgária, Romênia e Croácia. Da lista apresentada, não se vislumbra nenhuma grande potência econômica, que pudesse proporcionar uma nova dinâmica ou dimensão ao Acordo.
Atualmente, o GPA possui 43 membros signatários da OMC, com destaque à adesão total dos 28 membros da União Europeia, dos Estados Unidos da América e do Japão. Outros 27 membros e quatro organizações internacionais participam como observadores no Comitê de Contratação Pública do GPA. Dez desses membros,43 com destaque à China, que estão na situação de observador, se encontram em processo de adesão ao Acordo.44 O GPA revisado cria novas possibilidades comerciais de até US$ 100 bilhões para as empresas dos Estados membros participantes do acordo, incluindo EUA, União Europeia e Japão, que representam mais de 60% da economia global.45
Como o objetivo de regular as compras governamentais em um nível multilateral mais amplo, iniciativas foram tomadas ao longo do tempo, a fim de ampliar e consolidar o GPA. A primeira delas foi o estabelecimento de um mandato ao Grupo de Trabalho sobre Transparência em Compras Governamentais, na Primeira Reunião Ministerial da OMC, ocorrida em Cingapura, no ano de 1996, que tinha por finalidade “conduzir um estudo sobre transparência nas práticas de compras governamentais, levando em consideração políticas nacionais, e, baseado neste estudo” e no trabalho de outras organizações internacionais relevantes sobre a simplificação dos procedimentos comerciais “desenvolverem elementos para a inclusão em um Acordo negociado.” 46
investimentos estrangeiros. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxxx, 1998. p. 69.
39 WORLD TRADE ORGANIZATION. Parties, observers and accessions. Disponível em: <xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/ gproc_e/memobs_e.htm>. Acesso em: 30 set. 2014.
40 Canadá, Estados Unidos, Japão, Alemanha, Espanha, França, Itália, Reino Unido, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Noruega, Suíça, Finlândia, Israel, Grécia, Irlanda, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal e Suécia (em negrito, os países que estavam entre as dez maiores economias do mundo, em 1995).
41 XXXXXXXX, Xxxxxxx. Desenvolvimento e tratamento especial diferenciado na OMC: uma abordagem sob a perspectiva da doutrina do stare decisis – Parte II. Revista de Direito Econômico Socioambiental, Curitiba, v.3, n. 2. jul./dez. 2012. p. 311.
42 XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013. p. 30.
43 China, Nova Zelândia, Montenegro, Albânia, Geórgia, Jordânia, Quirguistão, Moldova, Oman e Ucrânia.
44 WORLD TRADE ORGANIZATION. Parties, observers and accessions. Disponível em: <xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/ gproc_e/memobs_e.htm>. Acesso em: 30 set. 2014.
45 XXXXXXX, Xxxxx. OMC revisa acordo de compra governamental; Brasil prefere não aderir. 15 dez. 2011. Valor Econômico, São Paulo. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx. br/internacional/1141028/omc-revisa-acordo-de-compra- governamental-brasil-prefere-nao-aderir#ixzz3GiEEYTZg>. Acesso em: 30 set. 2014.
46 WORLD TRADE ORGANIZATION. Singapore WTO Ministerial 1996: Ministerial Declaration wt/min(96)/dec. Artigo 21 - Transparency in Government Procurement. Disponível em:
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
Em 1998, num cenário em que as economias de alguns Membros da OMC experimentavam dificuldades como consequência das perturbações do mercado financeiro, foi realizada a Segunda Reunião Ministerial da OMC, em Genebra, que teve, basicamente, como objetivo as negociações sobre telecomunicações e serviços financeiros e marcou o início da vigência do Acordo sobre Tecnologia da Informação, não sendo tratados assuntos relacionados às compras governamentais.47 Da mesma forma, em dezembro de 1999, na Terceira Reunião Ministerial da OMC, em Seattle, as disposições relativas às compras governamentais não sofreram alterações.
Após duas Reuniões Ministeriais da OMC sem abordagem do tema das Compras Governamentais, na Quarta Reunião Ministerial de Doha, em 2001, ele retornou à agenda, exatamente abordando e restringindo a negociação ao escopo da transparência, e afirmando que essas negociações deveriam ser baseadas no progresso do Grupo de Trabalho, estabelecido em Singapura. Em outras palavras, ficaram definidas em Doha, as seguintes proposições: i) as negociações só teriam início, depois da quinta Conferência Ministerial de 2003, se houvesse um consenso explícito nessa reunião sobre as modalidades de negociação (não houve tal consenso); ii) as negociações se limitariam à transparência e não incluiriam questões de acesso ao mercado; e iii) um acordo multilateral sobre transparência nas compras governamentais levaria a uma exigência de assistência técnica e fomento à capacitação nos países mais pobres.48
A Quinta Reunião Ministerial da OMC ocorreu em Cancun, em setembro de 2013, e teve por missão principal realizar um balanço dos progressos realizados nas negociações e outros trabalhos no marco estabelecido no Programa de Doha para o Desenvolvimento. No texto Ministerial de Cancun, no seu artigo 16, considerando os trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Trabalho sobre a Transparência da Contratação pública, decidiu-se iniciar as negociações
<xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/xxx00_x/ wtodec_e.htm >.Acesso em: 01 set. 2014.
47 WORLD TRADE ORGANIZATION. Geneva WTO Ministerial 1998: Ministerial Declaration. Disponível em: <http:// xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/xxx00_x/xxxxxx_x. htm>. Acesso em: 01 set. 2014.
48 WORLD TRADE ORGANIZATION. Doha WTO Ministerial 2001: Ministerial Declaration. Disponível em: <http:// xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/xxx00_x/xxxxxxx_x. htm>. Acesso em: 01 set. 2014.
sobre a base das modalidades estabelecidas no anexo D do documento, que trata das seguintes questões: i) as negociações relativas a um acordo multilateral sobre transparência da contratação pública se basearão no parágrafo 26, da Declaração de Doha; ii) fica acordado que os contratos abrangidos pelo GPA podem extrapolar a esfera nacional de contratação e que haveria um limite mínimo do valor dos contratos a ser abrangidos pelo GPA; e iii) reafirma-se que nas negociações se levaria em conta as prioridades de desenvolvimento dos participantes, especialmente as dos países menos desenvolvidos.49
A Xxxxx Xxxxxxx Ministerial da OMC, realizada em Hong Kong, em dezembro de 2005, e a Sétima Reunião, em Genebra, em dezembro de 2009, não trouxeram nenhuma novidade ou abordagem sobre o tema das Compras Governamentais.
A Oitava Conferência Ministerial também foi realizada em Genebra, em dezembro de 2011. Foram realizadas três sessões de trabalho com os seguintes temas: “importância do Sistema Multilateral de Comércio e a OMC”, “Comércio e Desenvolvimento” e “Desenvolvimento de Doha”. Como fato importante da Conferência, destaca-se a aprovação da adesão da Rússia ao Organismo. Em relação às compras governamentais, a Conferência marcou a finalização das negociações do GPA, no primeiro dia do evento, com 42 países signatários, negociação que estava há dez anos em curso, em razão de divergências envolvendo principalmente União Europeia, Estados Unidos e Japão. Conclui-se que, com a aprovação, um novo mercado de US$ 100 bilhões de contratos públicos, além dos US$ 50 bilhões iniciais, estaria aberto aos países aderentes ao GPA, com a ampliação da cobertura do Acordo para agências governamentais e ministérios.50
Da mesma forma que a Sexta e a Sétima Reuniões da OMC não apresentaram abordagens sobre as compras públicas, a Nona Reunião Ministerial realizada em Bali, em dezembro de 2013, adotou a mesma postura, concentrando seus trabalhos na ampliação
49 WORLD TRADE ORGANIZATION. Anexos Del proyecto de Texto Ministerial de Cancún. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/xxx00_x/ draft_decl_annex_rev2_s.htm>. Acesso em: 03 set. 2014.
50 INTERNATIONAL CENTRE FOR TRADE AND SUSTAINABLE DEVELOPMENT (ICTSD). Acordo sobre compras governamentais inaugura Ministerial da OMC. Disponível em:<http:// xxx.xxxxx.xxx/xxxxxxx-xxxx/xxxxxx/xxxx/xxxxxx-xxxxx- compras-governamentais-inaugura-ministerial-da-omc>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
das questões que formam parte das negociações mais amplas da Rodada de Doha, resultando no documento denominado Pacote de Bali.
Da análise das nove Reuniões Ministeriais da OMC, ao longo desses vinte anos, pode se concluir que a transparência foi o único tema a entrar na pauta da OMC, deixando de ser abordadas nas negociações, questões de relevância como, por exemplo, o acesso ao mercado e o direito ao desenvolvimento social, econômico e ambiental, pelos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos, por meio das compras governamentais. Todavia, existe uma percepção de que, ao focar na transparência, pode se avançar um passo na direção de converter o GPA num acordo multilateral, obrigando os Estados-membros a aderirem a ele, não mais permitindo que a adesão seja um ato voluntário.
Nesse sentido, a transparência está voltada para a efetivação de exigências no sentido de divulgação de informações, normas de aquisições e termos contratuais pelos governos aderentes, não tangenciando assuntos importantes e centrais, como acessos mais livres por empresas estrangeiras, por meio da efetivação de princípios, como do tratamento nacional dos fornecedores, independentemente da propriedade, da filiação ou da origem do produto ou do serviço. Logo, as futuras negociações no âmbito do GPA deverão abordar assuntos relacionados à maior acessibilidade ao mercado pelas empresas estrangeiras, sob o prisma do direito fundamental ao desenvolvimento.
Atualmente, no plano internacional, o GPA estabelece, para os países signatários, uma estrutura de direitos e obrigações à qual as partes devem se adaptar quanto a sua legislação nacional, regulamentos, procedimentos e práticas relacionadas às compras governamentais. Dentre os aspectos relevantes, destacam-se principalmente matérias relativas
e Plurilaterais (anexo 4),52 de adesão opcional. Dos quatro acordos plurilaterais, o Brasil assinou somente o Acordo Internacional sobre Carne Bovina e, como a maior parte dos países em desenvolvimento, não é signatário do GPA,53 segundo o argumento de que o país não considera interessante a adesão ao Acordo, porque prefere privilegiar empresas do Mercosul na aquisições de bens e serviços pelo governo.
Esse posicionamento brasileiro vai ao encontro da negociação do Protocolo de Contratações Públicas do Mercosul, estabelecido por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, que tem por finalidade assegurar tratamento não discriminatório aos bens, serviços e obras públicas originárias fornecidas por provedores e prestadores dos Estados Partes do bloco. O Protocolo de Contratações Públicas, que foi ratificado apenas pela Argentina e não chegou a entrar em vigor, está sendo revisto desde 2010, com negociações que abrangem o marco normativo e seus anexos e que deverão ser concluídas antes que o novo texto do Protocolo seja ratificado e internalizado pelo Brasil e pelos demais Estados Partes do Mercosul.54
Todavia, o argumento brasileiro para não adoção do GAP, baseado no critério da preferência regionalista por produtos de empresas do Mercosul, parece não ter sustentação na produção legislativa, nos últimos vinte anos. O Brasil tem consciência de que possui ampla vantagem no que se refere às compras governamentais em relação aos outros membros do Mercosul e, como será visto em detalhe no próximo tópico, adota uma postura de proteção às suas próprias empresas nacionais, conforme a disposição contida no § 5º do artigo 3º do Estatuto de Licitações e Contratos (Lei nº 8.666/93), alterado pela Lei nº 12.349/2010, na qual se estabelece de forma indubitável a preferência para
à transparência, à integridade e ao acesso aos
mercados nacionais de compras públicas, em razão da representatividade expressiva das compras públicas, que representam entre 10 a 15% do PIB das economias nacionais, constituindo num mercado significativo e um aspecto importante do comércio internacional.51
Conforme mencionado, os acordos assinados durante a Rodada Uruguai são classificados em: Acordos Multilaterais (anexos 1, 2 e 3), de adesão obrigatória;
51 WORLD TRADE ORGANIZATION. WTO and Government Procurement. Disponível em: <xxxx://xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/ tratop_e/gproc_e/gproc_e.htm>. Acesso em: 30 set. 2014.
52 Anexos: 4A - Acordo sobre Comércio de Aeronaves Civis, 4B - Acordo sobre Compras Governamentais, 4C- Acordo Internacional de Produtos Lácteos e 4D- Acordo Internacional sobre Carne Bovina
53 XXXXXXX, Xxxxx. OMC revisa acordo de compra governamental; Brasil prefere não aderir. Valor Econômico, São Paulo, 15 dez. 2011. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx. br/internacional/1141028/omc-revisa-acordo-de-compra- governamental-brasil-prefere-nao-aderir#ixzz3GiEEYTZg>. Acesso em: 30 set. 2014.
54 BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Negociações internacionais de compras governamentais. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx//xxxxx/xxxxxxx/xxxxxxx. php?area=5&menu=3542>. Acesso em: 01 out. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras.
Outros argumentos são levantados no sentido da não necessidade de adesão brasileira ao GPA, como por exemplo: i) a similitude das regras previstas no GPA e na legislação brasileira, que garante um procedimento célere e isonômico; ii) a não adesão ao GPA garante a produção normativa que assegura a preferência a produtos nacionais, diretriz disposta na Constituição Federal sobre a promoção do desenvolvimento nacional; e iii) as regras previstas no ordenamento nacional já preveem maneiras eficazes de igualar os participantes, sejam eles nacionais ou estrangeiros.55
Em contrapartida, a OMC defende que o GPA traz benefícios potenciais ao Brasil, como: i) ganho comercial baseado no acesso juridicamente garantido às licitações realizadas pelos governos dos países participantes; ii) manutenção do mercado aberto; iii) aumento da confiança no sistema de compras; e iv) melhora do value for Money,56 pela elevação da concorrência e uso mais eficiente e efetivo dos recursos públicos. Xxxxxxxx atraentes de contratações públicas, como da China, por exemplo, estão sendo abertos parcialmente para os membros do GPA, com a estimativa de US$ 1,1 trilhão. No entanto, há manifestações por parte de comissários da União Europeia,57 no sentido de que, sem a adesão ao GPA ou acordo bilateral com a UE, empresas brasileiras não terão a garantia jurídica de participar de licitações de compras pelos governos europeus.58
55 SANCHES MONASSA, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxxx. É interessante para o Brasil aderir ao acordo sobre compras governamentais da OMC? Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 10, n. 1, p. 72-84. 2013.
56 É um termo usado para avaliar se uma organização obteve ou não o máximo de benefício dos produtos e serviços, dentro dos recursos disponíveis para isso. Alguns elementos podem ser subjetivos, difíceis de medir, intangíveis e incompreendidos. Ele não só mede o custo de bens e serviços, mas também tem em conta o mix de qualidade, custo, utilização de recursos e adequação ao uso.
Da composição dos argumentos favoráveis e desfavoráveis à adoção do GPA, surge o questionamento sobre qual seja o equilíbrio entre a política de livre comércio estabelecida no Acordo da OMC, fundamentada no Princípio da Não Discriminação, e a flexibilidade e o policy space dos Estados-Membros, e a consequente margem de manobra para a efetivação de políticas públicas voltadas a um processo de inclusão social e de redistribuição de riquezas.
Não se pode olvidar de que, ao fim do século XX e início do XXI, tem sido reclamado um novo intervencionismo estatal por um cenário que configura a urgência de implantação de políticas públicas, principalmente para a garantia de direitos humanos, entre os quais o direito ao desenvolvimento, objeto deste artigo, e de uma proteção do meio ambiente. Logo, as normas internacionais que controlam o comércio internacional, incluindo o GPA, não podem perder o foco na questão do desenvolvimento, devendo ser instrumento para tal propósito. Sendo assim, dada a assimetria entre os Estados que se tornaram parceiros dentro do sistema da OMC, é “necessário garantir-lhes uma margem de atuação ( policy space) para a promoção de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento sustentável dentro de seus territórios.”59
A flexibilidade ou policy space do Estado nas compras governamentais possui três eixos na aplicação das regras de liberalização que auxiliam a entender as limitações aplicáveis ao acordo e mitigação do princípio da Não Discriminação: i) a segregação do mercado; ii) a identificação das situações às quais as regras se aplicam; e iii) a explícita indicação de situações admitidas como exceções.60
Em relação à segregação do mercado, considera- se que as compras governamentais podem incluir tanto o comércio de bens quanto o de serviços. Quanto ao segundo eixo, pretende-se a delimitação da abrangência do escopo da contratação, em relação ao alcance dos níveis da administração pública
57 A União Europeia espera celebrar um acordo bi-regional com
o Mercosul e, com isso, ter acesso às compras públicas do governo federal, tanto para o executivo, como para empresas estatais, como a Petrobras. Em XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Sensibilidades no acordo União Europeia-Mercosul. São Paulo: Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais.
58 XXXXXXX, Xxxxx. OMC revisa acordo de compra governamental; Brasil prefere não aderir. Valor Econômico, São Paulo, 15 dez. 2011. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxx.xxx. br/internacional/1141028/omc-revisa-acordo-de-compra- governamental-brasil-prefere-nao-aderir#ixzz3GiEEYTZg>. Acesso em: 30 set. 2014.
59 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. A OMC e o policy space dos Estados: questões de flexibilidade, desenvolvimento sustentável e políticas públicas no GATT e GATS. In: XXXXXX XXXXXX, Xxxxxxx do; XXXXX XXXXXX, Xxxxxxx (Org.). A OMC: desafios e perspectivas. São Paulo: Aduaneiras, 2014. p 43-74.
60 XXXXX, X.; XXXXXXX, S. Government procurement. In: XXXXXXXXX, X. X.; XXXX, X. X. Xxxxxxxxxxxx trade agreement policies for development: a handbook. Washington: World Bank, 2011,
p. 375. Disponível em: <xxxxx://xxxxxxxxxxxxx.xxxxxxxxx.xxx/ bitstream/handle/10986/2329/634040PUB0Pref00Box0361517B0 PUBLIC0.pdf?sequence=4>. Acesso em: 01 out. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
(federal, estadual, municipal, empresas estatais) e ao valor mínimo de compras ou contratos alcançáveis, em razão da onerosidade dos baixos contratos. O terceiro eixo de preocupação nos capítulos sobre compras governamentais, que para o presente artigo é o mais relevante, “está em como reconhecer nas suas disposições a importância do Estado e de suas instituições como um agente econômico — no caso do comprador — na implementação ou no fortalecimento de determinadas políticas públicas.” Os dispositivos relacionados a esse eixo são enquadrados em três grupos: “i) offsets ou condicionalidades; ii) set-asides ou preferências; e, em algumas situações, iii) exceções stricto sensu nos capítulos de compras governamentais, que podem incluir tanto o comércio de bens quanto o de serviços.”61
Como se pode constatar, tais provisões podem objetivar tanto a preservação, ou sua proibição, da possibilidade de definição de condicionalidades para participar de um processo de compras, com vistas a promover o desenvolvimento econômico e social, quanto a proteção a determinados grupos, como favorecimento à implementação de outras políticas públicas, como as ambientais, no caso das exceções.
Concluindo parcialmente, defende-se que a flexibilidade aos princípios gerais de livre-comércio, que visa a não discriminação entre nacionais ou estrangeiros ou o tratamento nacional, está regulamentada por dispositivos que estabelecem margens de preferência, condicionalidades (offsets ou acordos de compensação), regras de origem, especificações técnicas, exclusões e exceções, cujo conjunto de normas assegura o necessário policy space aos Estados-Membros aderente ao GPA, principalmente aos países em desenvolvimento e os menos desenvolvidos, para a efetivação de políticas públicas que realizem o direito humano econômico e fundamental ao desenvolvimento econômico, social e ambiental. No próximo tópico, será abordada a política legislativa das compras governamentais brasileira, sob a
5 A política legislativa das compras governamentais brasileira: a licitação como instrumento regulatório e realizador do direito ao desenvolvimento
A licitação, com sua característica procedimental, desde sempre, foi vista como uma atividade de caráter instrumental e secundária, pois visava única e exclusivamente atender a uma necessidade imediata: a aquisição de um bem ou a prestação de um serviço.62 Na nova concepção, segundo as normas de direito internacional e do ordenamento jurídico nacional, há uma finalidade material adicional ou extraordinária, de forma indireta e mediata, no sentido de satisfazer outros interesses também reconhecidos como relevantes pelo Direito, agrupados em objetivos secundários, que não se confundem com a finalidade material direta e imediata.63
A licitação, que tem a adjudicação e a assinatura do contrato administrativo como o resultado do seu processo, inaugura a implementação da regulação contratual, quando da elaboração do seu edital, com a definição de critérios de participação no certame, que podem ser de ordem econômica, social, ambiental ou tecnológica, como, por exemplo, e escolha do contratado. Em outras palavras, a Administração regula quem participará da licitação. Da mesma forma, a Administração não é livre para a escolha de tais critérios, pois está vinculada constitucionalmente a um conjunto de regras e princípios que também regulamentam o Estado contratante. Assim, ela utiliza- se do seu poder de contratação ou de compra para regular o mercado, ao definir o formato do contrato desejado.64
Nesse sentido, a discricionariedade na elaboração do edital licitatório envolve o exercício de uma competência regulatória, por interferir na estrutura do mercado, devendo ser técnica, em razão de que os aspectos políticos, geralmente inseridos numa determinada política pública, são definidos em leis,
perspectiva da utilização da licitação como instrumento
regulatório e realizador do direito ao desenvolvimento.
61 XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxx. A Regulação de Compras Governamentais nos Acordos Preferenciais de Comércio. In: XXXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxxxx; XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. (Org.). Tendências regulatórias nos acordos preferenciais de comércio no século XXI: os casos de Estados Unidos, União Europeia, China e Índia. Brasília: IPEA, 2013. p. 243-245. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/ agencia/images/stories/PDFs/livros/livros/livro_tendencias_ regulatorias1.pdf> Acesso em: 02 out. 2014.
62 Desde a Lei Federal nº 4.536/1922 e o Decreto n. 15.783/1922, a legislação previa a concorrência prévia para a contratação administrativa e para a alienação de bens, conforme XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1964.
p. 244. Todavia, no presente trabalho, será abordada a exigência prévia somente em relação ao contrato administrativo.
63 XXXXXXXX, Xxxxxx. A licitação pública no Brasil e sua finalidade legal: a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 35.
64 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito administrativo regulatório. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 307-308.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
acordos comunitários e tratados internacionais. Nessa ideia, cita-se como exemplo a atribuição de margens de preferências para determinados setores da indústria ou da sociedade ou a restrição a participação de estrangeiros em certames nacionais, no exercício do denominado policy space. Por competência regulatória técnica, entende-se a edição de regras que possam restringir a formação de monopólios, concentrações e dominações de mercados, que, por outro lado, sacrificam a competição desejada, como a previsão das denominadas cláusulas de barreira, que têm amparo constitucional no art. 173, §4º.65
Diante desse movimento regulatório e desregulatório nas contratações públicas, com ênfase na fase de licitação, importante se faz o exame cuidadoso desse movimento pendular, no contexto da regulamentação geral do Estado, a fim de se verificar se tal fenômeno é uma política isolada ou se está contida num plano maior estatal. Essa oscilação entre os extremos da regulação insuficiente e excessiva é produzida, em parte, pelos custos reais que estão associados às duas práticas, sendo potencializados por reformas legislativas que visam combater abusos ou escândalos que ganhem atenção política, mas que podem não ser representativas do funcionamento característico do sistema de compras e de funcionamento de determinado mercado. Em suma, pelo fato de que há custos reais associados tanto com regulação como com não regulamentação, na função de compras governamentais, em um sistema de compras ideal será necessário encontrar o equilíbrio entre os custos de excesso de regulamentação e os custos da regulação insuficiente.66
Xxxxxxx Xxxxxx, ao trabalhar na desregulamentação da indústria aérea nos Estados Unidos na década de 1970, afirma que as características centrais recomendadas para a regulação das contratações governamentais seguem as seguintes premissas: i) em primeiro lugar, nenhum regulamento é apropriado, a menos que “o mercado não esteja regulamentado e que possua defeitos graves para que a regulamentação venha oferecer uma cura”; ii) em segundo lugar, quando a regulação é justificada, deve se empregar a
menos restritiva alternativa, utilizando-se da regulação clássica, apenas quando os meios menos restritivos não vão funcionar; e iii) entre as alternativas menos restritivas para a regulação clássica a ser considerada são abordagens baseadas em incentivos, tais como redução de impostos e criação de regimes de direitos especiais de mercado, as exigências e requisitos de divulgação e a aproximação nas negociações. A palavra de ordem primordial é preservar, na medida do possível, as vantagens inerentes dos mercados competitivos.67
Tradicionalmente, nodireitobrasileiro enarespectiva doutrina e jurisprudência, a licitação possuía dois objetivos fundamentais ou finalidades legais, que eram preconizados no artigo 3º, caput da Lei nº 8.666/1993: a garantia da observância do princípio constitucional da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração. Com o advento da Lei nº 12.349/2010, uma nova finalidade legal foi acrescida às outras duas existentes: a promoção do desenvolvimento econômico sustentável. Logo, a proposta mais vantajosa mitigou a importância do critério econômico da seleção e atribuiu relevância àquelas que possam garantir benefícios sociais, ambientais e econômicos, derivados do direito fundamental ao desenvolvimento, modificando toda política de contratação governamental, ao utilizar o seu poder de compra para implementar políticas públicas novas e desenvolver aquelas já existentes.
Com a nova finalidade legal estabelecida, o processo licitatório passou a ser visto sob uma ótica constitucional, “de consagração de valores pluralísticos, de onde deixou de ser tida como mero instrumento de compra do governo para se tornar mais um vetor de garantia dos interesses coletivos e do desenvolvimento nacional”, manifestando-se a função regulatória da licitação, com mecanismos que privilegiem aqueles licitantes que exerçam suas atividades empresariais, com objetivos além do lucro, com ações que contribuam com o desenvolvimento econômico sustentável nacional.68
Para ser considerado o desenvolvimento como plenamente sustentável, existem três vieses de abordagem: o econômico, o social e o ambiental. O econômico leva em consideração a necessidade mínima
65 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito administrativo
regulatório. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p 310-313.
66 XXXXXXX, Xxxxxx X. Regulation and Deregulation in Public Procurement Law Reform in the United States. In: . Advancing public procurement experiences: experiences, innovation and knowledge sharing. Boca Raton, PrAcademics Press, 2006, p 1-28. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxx.xx/XXXX0/XXXX/Xxxxxxx_0. pdf>. Acesso em: 04 out. 2014.
67 XXXXXX, Xxxxxxx X. Regulation and Its Reform. Cambridge,
MA: Harvard University Press, 1982. p. 184-188.
68 ACOCELLA, Jéssica; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx. O
papel regulatório e de fomento das licitações públicas, 2013. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/xxXxxx/00,XX000000,00000-Xx papel+regulatorio+e+de+fomento+das+licitacoes+publicas>. Acesso em: 01 set. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
de sistemas econômicos que assegurem, de forma contínua, o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) e do PIB per capita (PPC), retroalimentando a economia e surtindo efeitos positivos na sociedade. O social se funda em valores de democracia e equidade, contribuindo para a expansão das capacidades humanas e da qualidade de vida, reforçando a sustentabilidade econômica e vice- versa. Já o ambiental vem numa relação simbiótica com o social e econômico, pois não há como imaginar qualidade de vida em um ambiente degradado, com a ameaça da condição e da sobrevivência dos seres vivos. Da mesma forma, há de se ter equilíbrio entre crescimento econômico e degradação ambiental, não justificando qualquer crescimento que possa trazer a inviabilidade da existência humana.69
A partir da visão constitucionalizada da licitação, entende-se possível a edição de medidas legislativas e administrativas ativas, como, por exemplo, a Lei nº 12.349/2010, com o objetivo de repudiar, incentivar ou direcionar as atividades dos entes privados, quando da contratação pública, e de realizar preferências pelo Estado para o desenvolvimento de determinado tipo de segmento econômico.70
Na própria Lei nº 8.666/1993, há uma forma de interferência direta do Estado no domínio econômico, por conta da regra do art. 24, VI, que dispõe que a licitação será dispensável, quando a União tiver que
seus mercados, como, por exemplo, o fomento à participação de pequenos agricultores e cooperativas.71
Nesse mesmo sentido, defende-se que o dispositivo vincula-se à tentativa de a União influenciar o mercado de bens e serviços, por meio da oferta ou aquisição de bens ou serviços, a fim de restabelecer o equilíbrio do mercado. A União, atuando para normalizar o abastecimento ou regular preços, efetivará contratações em igualdade com os particulares, intervindo no mercado para incrementar a oferta ou a procura. “A intervenção da União se tornaria ineficaz se fosse precedida de licitação, porque não influenciaria a oferta e a demanda”.72
Assim, a evolução histórica do procedimento licitatório no Brasil está estritamente ligada à atuação da Administração Pública na consecução do interesse público, que sofreu uma readequação substancial ao longo dos anos, em razão das constantes transformações políticas, sociais e econômicas e com a inserção do Estado brasileiro como agente condutor da economia e da aquisição de bens e serviços.73
Partindo-se da ideia de que o dever de licitar traduz- se numa política pública, na medida em que pressupõe ser a disputa seletiva isonômica aquela que habilita o Estado à consecução da melhor prestação contratual,74 o seu afastamento ou mitigação, por meio de regras de preferência75 ou proteção de grupos econômicos, deve
intervir no domínio econômico para regular preços ou
normalizar o abastecimento.
Nessa hipótese, não há acordo de vontades, mas desapropriação regulada pela ordem econômica constitucional, instituída, em especial, pelos artigos 173, §4º, da CF, e no artigo 170, III, que estabelece o Princípio da Função Social da Propriedade. Nota- se que o dispositivo, neste caso, tem por finalidade a formatação de um mercado livre, utilizando-se da função regulatória da licitação, cuja competência em normatizar é da União, por se tratar de caso de dispensabilidade da licitação. Todavia, nada impede que estados e municípios, por força do artigo 174, CF, possam, por via da regulação, promover e defender
69 XXXXXXXX, Xxxxxx. A licitação pública no Brasil e sua finalidade legal: a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 52-55.
70 XXXXXX, Xxxxxxx. Função Regulatória da Licitação. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 19, ago./set./out., 2009. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx/xxxxxxx/ REDAE-19-AGOSTO-2009-XXXXXXX-XXXXXX.pdf>. Acesso em: 30 set. 2014.
71 XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 104-105. No mesmo sentido, NIEBUHR, Xxxx xx Xxxxxxx. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública. 3. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 257. Em sentido oposto, XXXXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 271. “Somente à União cabe intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento, podendo fazê-lo mediante aquisições ou alienações de gêneros ou produtos, inclusive no Exterior, que dispensarão a prévia licitação dada a índole peculiar da intervenção.”
72 XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 13. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 302.
73 XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. O procedimento licitatório como microssistema jurídico: apontamentos e Reflexões in Rio de Janeiro (Estado). Tribunal de Contas. Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 2, n. 5, jan./jun. 2013. p. 41.
74 XXXXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx; XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxxxx. Políticas públicas nas licitações e contratações administrativas. 2 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 33.
75 XxXXXX, R. P., XxXXXXXX, X. Auctions and Bidding. Journal of Economic Literature, v. 25, p. 699-738. 1987. p. 716. O objetivo da adoção de margem de preferência em uma licitação é igualar as condições de competição quando os licitantes possuem assimetrias estruturais de custos que impedem a eficiência de uma licitação. Do ponto de vista da teoria econômica, o valor da margem
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
ser analisada sob a ótica de política governamental. Até o presente momento, o legislador brasileiro sinalizou quais são os setores a serem desenvolvidos, em razão de 14 decretos específicos editados pelo Governo Federal, por meio da Comissão Interministerial de Compras Públicas, instituída pelo decreto nº 7.546/2011, atribuindo a margem de preferência a produtos nacionais, conforme segue:76
i) Decreto nº 7.709/2012 – motoniveladoras e
retroescavadeiras;
ii) Decreto nº 7.713/2012 – fármacos e medicamentos;
iii) Decreto nº 7.756/2012 – confecções e calçados;
iv) Decreto nº 7.767/2012 – equipamentos médico- hospitalares;
v) Decreto nº 7.810/2012 – papel moeda;
de preferência deve ser o suficiente para equiparar assimetrias competitivas que levam a diferenças na utilidade (para o comprador) entre a melhor oferta estrangeira e a melhor oferta nacional.
76 BRASIL. Ministério do desenvolvimento, Indústria e Comércio. Relatório de acompanhamento da medidas sistêmicas: junho de 2014. Disponível em:<xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/Xxxxxx/ Medidas%20Sist%C3%AAmicas%20PBM%20-%20Rel%20%20 de%20Acomp%20junho%2014.pdf>. Acesso em: 15 out. 2014.
vi) Decreto nº 7.812/2012 – veículos para vias férreas;
vii) Decreto nº 7.816/2012 – caminhões, furgões, e implementos rodoviários;
viii) Decreto nº 7.843/2012 – disco para moeda;
ix) Decreto nº 7.840/2012 – perfuratriz e patrulha mecanizada;
x) Decreto nº 7.903/2013 – equipamentos de tecnologia
e comunicação;
xi) Decreto nº 8.002/2013 – pás carregadoras, tratores
de lagarta e produtos afins;
xii) Decreto nº 8.186/2014 – licenciamento de uso de programas de computador e serviços correlatos;
xiii) Decreto nº 8.185/2014 – brinquedos, jogos, artigos para divertimento ou para esporte; e
xiv) Decreto nº 8.224/2014 – máquinas e equipamentos
especificados no decreto.
Além da Lei nº 8.666/1993, alterada pela Lei nº 12.349/2010, diversas outras medidas legislativas dispõemou regulamentamodireitoaodesenvolvimento, como forma de regulação de mercado, todavia com ênfase na implementação de políticas publicas sociais, ambientais e econômicas, conforme Quadro 1, a seguir:
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
Quadro 1: Políticas públicas nas licitações
Legislação | Política Pública efetivada | Dispositivo na Lei nº 8.666/1993 | Dispositivos em outras normas |
Legislação | Política Pública efetivada | Dispositivo na Lei nº 8.666/1993 | Dispositivos em outras normas |
Lei 8.666/93 | Preservação ao meio ambiente | Inciso X, art 6º e IncisoVII art 12 | Art. 170, VI CF/88 e Portaria nº 61/2008 MMA |
Política Fundiária | Art. 17 – licitação dispensada | ||
Preservação do patrimônio histórico | Inc. XV, art. 24 | § 1º art. 216 CF | |
Geração de emprego e inclusão social | Inc. XXVII, art. 24 | Lei nº 11.445/2007 | |
Reequipamento das Forças Armadas e Defesa nacional | Incisos XVIII, XIX, XXVIII, art. 24 | ||
Participação em Força de Paz | Inciso XXIX, art. 24 | Lei nº 11.783/ 2008 inseriu o inciso | |
Apoio ao deficiente físico | Inciso XX, art. 24 | Art. 203, IV, CF/88 | |
Ciência e tecnologia | Inciso XXI, art. 24 | Art. 218, CF/88 | |
Proteção ao trabalho do menor (infantil) | Inciso V, art. 27 | Lei nº 9.854/1999 | |
Incentivo à produção de bens e serviços de informática (PPB Nacional) | Art45, § 4º, Lei nº 8.666 Decreto nº 7.174/2010 | Lei nº 11.077/2004 (acesso ao pregão) | |
Políticas Públicas nas leis extravagantes | |||
Legislação | Política Pública efetivada | Dispositivos em outras normas | |
Lei nº 8.248/1991 – Lei nacional de informática | Preferência na contratação de bens e serviços de informática e automação nacionais | Decreto nº 7.174/2010 | |
LC nº 123/2006 | Favorecimento às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte | Art. 170 e 179 da CF/88 | |
Lei nº 11.284/2006 | Gestão de florestas (terceirização) | Decreto nº 6.063/2007 – artigos 29 a 43 | |
Lei nº 12.305 /2010 – Política Nacional de Resíduos Sólidos | Promoção do consumo sustentável pela administração pública (art. 7º, inciso XI da Lei) | Inciso I, do artigo 44, do Decreto nº 7404/2010 – contratação de cooperativas de catadores de material reciclável. |
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-209.
Lei nº 12.349/2010 | Desenvolvimento Econômico Sustentável (fomento econômico, social e ambiental) | Regulamentada pelo Decreto nº 7.546/2011 e mais onze decretos específicos. |
Estabelece margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais, com objetivo de desenvolver a indústria nacional | ||
Lei nº 12.440/2010 | Proteção ao trabalhador - Exigência da CNDT para contratar com o poder público | Estabelece a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas |
Lei nº 12.598/2012 | Estabelece normas especiais para as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa. | Decretos nº 7.970/13 e nº 8.122/2013 (Retid Defesa) |
Portaria nº 837/2012 do Ministério da Saúde | Objetivo de redução de preços de produtos estratégicos para saúde | Estabelece Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) |
Fonte: Elaboração do autor.
Após a apresentação dos dados do Quadro 1 e da análise do plano normativo que regula as compras governamentais brasileiras, a primeira conclusão é de que a postura da política de contratação pública nacional está na utilização intensiva da licitação, no sentido de efetivar as políticas públicas econômicas, sociais e ambientais no Brasil, políticas essas distribuídas em, no mínimo, uma lei complementar, sete leis ordinárias, dezenas de decretos e portarias, caracterizando uma verdadeira inflação legislativa77 no tema.
A segunda conclusão evidente, resultado da excessiva produção legislativa, é que o Brasil adota uma posição protecionista e está preocupado em garantir o mercado de contratação pública para as empresas brasileiras, principalmente aquelas relacionadas ao Plano Brasil Maior (PBM)78 e ao Plano de Aceleração
77 Segundo Xxxxxxxxxx, a expressão inflação legislativa refere-se à produção em massa de leis, também chamada por ele de “hipertrofia da lei”, que decorria de certo fascínio que a sociedade moderna tem pelas leis, não percebendo que à medida que “cresce o número das leis jurídicas, diminui a possibilidade de sua formação cuidadosa e equilibrada”. XXXXXXXXXX, Xxxxxxxxx. A morte do direito. Belo Horizonte: Líder, 2003, p. 9-10.
78 O Plano Brasil Maior é a política industrial, tecnológica e de comércio exterior do Governo Federal. O desafio do Plano Brasil Maior é: 1) sustentar o crescimento econômico inclusivo num contexto econômico adverso; e 2) sair da crise internacional
ao Crescimento (PAC).79 Ao mesmo tempo, tem ciência da dificuldade em ingressar em mercados de compras governamentais de países desenvolvidos. Logo, é natural que o Governo Federal não queira assinar, no momento, o GPA, que se apresenta totalmente oposto à decisão política protecionista da legislação brasileira, a qual, por sua vez, se utilizando do policy space, busca a efetivação do direito fundamental ao desenvolvimento.
Da comparação das exigências do GPA com a legislação nacional, reside a questão central de saber se a política discriminatória constitui um mecanismo eficiente de alcançar objetivos que não reflete, de forma imediata, uma natureza financeira ou, ainda, se essas metas podem ser realizadas de forma não discriminatória. Assim, o governo e o legislador
em melhor posição do que entrou, o que resultaria numa mudança estrutural da inserção do país na economia mundial. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/000>. Acesso em:
15 out. 2014.
79 A Lei nº 12.745/2012 permite que o Governo Federal exija percentual mínimo de produtos e serviços nacionais nas obras do PAC, e o Decreto nº 7.888/2013 inaugurou o novo instrumento determinando que 80% do custo financeiro associado às obras de mobilidade urbana do PAC sejam destinados aos produtos nacionais elencados na Portaria Interministerial MP/MDIC nº 95, de 3 abr. 2013.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
brasileiro põem-se diante do dilema do prisioneiro,80 em que o Brasil atua isoladamente, prosseguindo políticas discriminatórias que afetam o interesse global, dado que há a opção de cooperar (fazendo parte do GPA) ou não cooperar (ficando excluído do GPA). Ao mesmo tempo, existe a pressão que os beneficiados pela discriminação exercem sobre as autoridades, a fim de maximizar seus ganhos.81
Na esfera da OMC, a estratégia na área de compras governamentais brasileira tem reforçado três pontos:
“i) o entendimento de que a agenda da OMC já é demasiadamente extensa para incorporar novos temas, o que o inibiria de assumir novos compromissos junto à organização; ii) o de que o Brasil aceita discutir apenas princípios de transparência nas suas licitações, respeitando-se a circunscrição apenas às atividades do governo central; e iii) o entendimento de que pretende manter o seu espaço para o desenvolvimento de políticas públicas, garantindo o tratamento discriminatório a empresas e prestadores de serviços brasileiros e, eventualmente, do Mercosul.” 82
Todavia, dois aspectos estão colocando as orientações protecionistas da política brasileira em xeque: o primeiro refere-se à crescente adesão de outros parceiros comerciais às regras em compras governamentais, como o Chile e a Argentina, que hoje se encontram na situação de observadores do GPA/OMC; e, segundo, a participação brasileira, em processos de negociação mais complexos, como a retomada das negociações para um acordo bi-
80 O Dilema dos Prisioneiros foi inventado em 1950 por Xxxxxxx Xxxxx e Xxxxxx Xxxxxxx, e foi adaptado e divulgado por A.W.Xxxxxx. O dilema do prisioneiro é um problema da teoria dos jogos e trata da natureza da cooperação. Neste problema supõe-se que cada jogador, de modo independente, quer aumentar ao máximo a sua própria vantagem sem lhe importar o resultado do outro jogador. O dilema prova que quando cada um de nós, individualmente, escolhe aquilo que é do seu interesse próprio, pode-se gerar um resultado pior do que ficaria se tivesse sido feita uma escolha que fosse do interesse coletivo.
81 XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013, p. 36.
82 XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxx. A Regulação de Compras Governamentais nos Acordos Preferenciais de Comércio. In: XXXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxxxx; XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. (Org.). Tendências regulatórias nos acordos preferenciais de comércio no século XXI: os casos de Estados Unidos, União Européia, China e Índia. Brasília: IPEA, 2013. p. 243-
245. Disponível em: <xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxx/ stories/PDFs/livros/livros/livro_tendencias_regulatorias1.pdf>. Acesso em: 02 out. 2014.
regional entre União Europeia e Mercosul, no qual o Brasil oferece uma pequena margem, de 3%, para os produtores europeus, em relação a preços de países de fora do bloco sul-americano.
Outra questão relacionada à política de adoção da margem de preferência a produtos nacionais é a efetividade da política, que, para a sua análise, necessita de indicadores de desempenho econômicos e sociais. Dados levantados pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a pedido da gerência-executiva de política industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), afirmam que, mesmo favorecidas por margens de preferência que permitem vencer licitações do setor público, cobrando preços até 25% maiores que os concorrentes estrangeiros,83 as empresas nacionais perderam, para fornecedores de outros países, a chance de abastecer compras do governo brasileiro equivalentes a R$ 965 milhões, entre abril de 2012 e outubro de 2013. Nem com permissão para preços mais altos as empresas nacionais se mostraram competitivas em setores como fármacos, medicamentos e equipamentos médicos, uma das áreas prioritárias para o governo, e desejadas por fornecedores americanos e europeus..84
Ao adotar a política de compras públicas por meio de margens de preferência, o governo calculava atingir R$ 15 bilhões em compras, sendo que o índice atingido ficou em apenas 14% desse valor, tanto em 2012 quanto no ano passado, até o mês de outubro. Causas como a falta de competitividade do produtor nacional, ou a ausência de fabricantes no país, levaram os estrangeiros a aumentar sua participação no fornecimento de fármacos, medicamentos e equipamentos médicos, de 2012 para 2013. No caso dos fármacos e remédios, os fabricantes garantiram o fornecimento de apenas 10% do total de produtos comprados pelo governo. Além disso, em 95% dos casos nos quais a margem mínima poderia ser usada, ela foi insuficiente para beneficiar fornecedores nacionais, porque os concorrentes
83 EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO. O governo unificou em 25% a margem de preferência para as compras públicas: o percentual será aplicado até 2020 nas licitações federais para produtos manufaturados e serviços nacionais. Brasília, 2014. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/0000/00/xxxxxx- de-preferencia-para-compras-do-governo-sera-estendida-para-25>. Acesso em: 16 out. 2014.
84 XXX, Xxxxxx. Menos R$ 1 Bi em vendas ao Governo. Valor Econômico, São Paulo, 17 mar. 2014. Disponível em: <http:// xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxx/0000000/xxxxx-x-0-xx-xx-xxxxxx-xx- governo>. Acesso em: 16 out. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
estrangeiros apresentaram preços pelo menos 25% menores que os dos laboratórios no país.85
Da análise dos dados, pode-se concluir que o mecanismo de privilégio aos nacionais pode gerar resultados positivos, se bem operados, ou negativos, se mal gerenciados. Com pouco lapso temporal para análise do caso brasileiro, não há condições de averiguar tendências positivas ou negativas, se a margem de preferência está fomentando a diversificação industrial, agregando valor e promovendo o desenvolvimento tecnológico, ou se está gerando custos desnecessários para o Estado, para a própria indústria, para os consumidores e para os contribuintes. Apesar de não conclusivos em relação a tendências, os dados apresentados no estudo da CNI são um bom indicador para questionamentos em relação à eficácia da medida.
Em sede de conclusão parcial, a última questão levantada nesse tópico refere-se a disputas de arenas por possíveis grupos beneficiados pela regulamentação por meio da aplicação da margem de preferência. Partindo-se das considerações realizadas por Xxxx, pode-se afirmar que a implementação de políticas públicas, por meio da aplicação de preferências nas licitações, enquadra-se na categoria das políticas públicas regulatórias, em razão da utilização do mercado e do poder de compras estatal, para alcançar objetivos e executar ações estratégicas nas áreas de políticas públicas econômicas e sociais. Obviamente que na arena distributiva haverá uma multiplicidade de grupos organizados em torno de relações de interesses setoriais com a finalidade de inserção do respectivo setor econômico nas políticas governamentais e consequente inserção na condição de favorecido da política. Logo, resta o questionamento sobre quais setores industriais serão beneficiados em maior ou menor escala. Todavia há a certeza de que serão estabelecidas arenas de políticas públicas, com atores disputando o ingresso na agenda desenvolvimentista estatal.86 Realizada a conclusão parcial, nesse momento serão feitas as considerações finais do presente artigo.
85 XXX, Xxxxxx. Menos R$ 1 Bi em vendas ao Governo. Valor Econômico, São Paulo, 17 mar. 2014. Disponível em: <http:// xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxx/0000000/xxxxx-x-0-xx-xx-xxxxxx-xx- governo>. Acesso em: 16 out. 2014.
86 XXXX, Xxxxxxxx X. Distribution, regulation, redistribution: the functions of government. In: . Public Policies and Their Politics. Xxxxxx, X.X. Xxxxxx e Company Inc. New York: 1996. p. 7.
6 Considerações finais
O presente artigo buscou apresentar a consolidação e a aproximação de três temas inter-relacionados entre si: os direitos humanos, as relações comerciais e econômicas e o direito ao desenvolvimento. Assim, a partir da análise desenvolvida no trabalho, procurou-se estabelecer a inter-relação entre regras, compromissos e obrigações sobre os temas, contidos no âmbito do Direito Internacional, com destaque aos documentos elaborados pela ONU e pela OMC, e do Direito interno.
Para tanto, apresentou-se, por um lado, o direito ao desenvolvimento como direito fundamental econômico, de caráter difuso, de terceira geração, consagrado como inalienável pela Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU (1986) e insculpido em diversas passagens da Constituição Federal de 1988. De outro, a liberdade à concorrência, com o princípio basilar da Não Discriminação, englobando a Cláusula da Nação Mais Favorecida e o Princípio do Tratamento Nacional, os quais proíbem tratamento discriminatório em relação a produtos e países contratantes do Government Procurement Agreement (GPA), da OMC, que completa vinte anos, no plano jurídico internacional.
No mesmo sentido, verificou-se que o Brasil, ao não aderir ao GPA, adotou uma postura política de promoção do desenvolvimento nacional sustentável, atribuindo uma terceira finalidade legal à licitação, por meio da Lei nº 12.349/2010, utilizando-se da flexibilidade em normatizar ou do denominado policy space. A partir dessa diretriz e com a finalidade de operacionalizar a política estabelecida, um conjunto expressivo de normas correlatas à Lei nº 8.666/93 foi editado, caracterizando o que Xxxxxxxxxx denominou de inflação legislativa, na área das compras governamentais.
Tal conjunto de normas concebe privilégios aos produtos e aos serviços nacionais, em detrimento dos concorrentes estrangeiros, com a disposição do Estado nacional em pagar até 25% mais caro por aqueles produtos, por meio do mecanismo da margem de preferência, que é adotado por diversos países, principalmente os em desenvolvimento. Todavia, os dados levantados no primeiro ano de vigência da regulamentação da Lei nº 12.349/2010 não sinalizaram de maneira satisfatória, acendendo a primeira luz de alerta sobre a eficiência do referido mecanismo no desenvolvimento de políticas públicas econômicas, sociais e ambientais.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
Aliado à possibilidade de ineficiência do mecanismo da margem de preferência adotada, dois outros aspectos pressionam a política estatal de compras governamentais brasileira, em relação à adesão ao GPA, colocando em dúvida a consequente harmonização da produção normativa nacional com as normas de direito internacional: a aproximação de parceiros do Mercosul ao GPA, na condição de observadores, como o Chile e a Argentina, e os processos de negociação mais complexos, dos quais o Brasil faz parte, como a retomada das negociações para um acordo bi-regional entre União Europeia e Mercosul, sobre o referido tema.
Diante do todo exposto, conclui-se que, mesmo o Brasil não sendo signatário do GPA, o sistema de
compras governamentais brasileiro assemelha-se muito ao Acordo da OMC, em matéria de transparência e procedimento. Todavia, a adoção de margem de preferência e de privilégios aos nacionais nos contratos públicos atinge frontalmente, no primeiro momento, o princípio basilar do Direito do Comércio Internacional da Não Discriminação. Da mesma forma, a política protecionista das compras governamentais brasileira está sob pressão em razão de questões internas (dúvidas sobre a eficiência do mecanismo e condições dos produtores nacionais em se beneficiar do privilégio) e internacionais (aproximação de parceiros comerciais ao GPA e negociações de acordos mais complexos).
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
Referências
ACOCELLA, Jéssica; XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxx. O papel regulatório e de fomento das licitações públicas, 2013. Disponível em: <http: /xxx.xxxxxxxx.xxx.xx/ dePeso/16,MI182325,71043-O+papel+regulatorio+e+ de+fomento+das+licitacoes+publicas>. Acesso em: 01 set. 2014.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Negociações Internacionais de Compras Governamentais. Disponível em: <http: /xxx.xxxx.xxx. br /sitio/interna/interna.php?area=5&menu=3542>. Acesso em: 01 out. 2014.
BRASIL. Ministério do desenvolvimento, Indústria e Comércio. Relatório de acompanhamento das medidas sistêmicas: junho de 2014. Disponível em:
<xxxx://xxx.xxxx.xxx.xx/Xxxxxx/Xxxxxxx%00
Sist%C3%AAmicas%20PBM%20-%20Rel%20%20
de%20Acomp%20junho%2014.pdf>. Acesso em: 15
out. 2014.
BRASIL. Ministério do desenvolvimento, Indústria e Comércio. Plano Brasil Maior. Disponível em: <http: / xxx.xxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxxx/000>. Acesso em: 15 out. 2014.
XXXXXX, Xxxxxxx X.. Regulation and its reform.
Cambridge, MA: Harvard University Press, 1982.
XXXXXXXXXX, Xxxxxxxxx. A morte do direito. Belo Horizonte: Líder, 2003.
COSTA, Ligia Maura. OMC e direito internacional do desenvolvimento sustentável. São Paulo: Quartier Latin, 2013.
XXXXX, Xxxxxxx Xxxxx; XXXXXXXXXXX, Xxxxxxx. Litígio de interesse público e desenvolvimento. O direito ao desenvolvimento sob a perspectiva do pensamento jurídico contemporâneo. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da.; XXXXXXXXX XXXXXXX, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013.
XXXXX, X.; XXXXXXX, X. Governmentprocurement. In: XXXXXXXXX, X. X.; XXXX, X. X. Xxxxxxxxxxxx trade agreement policies for development: a handbook. Washington: World Bank, 2011.
XXXX, Xxxx Xxxxxx. O direito ao desenvolvimento sob a perspectiva do pensamento jurídico contemporâneo. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013.
XXXXX, Xxxxxxx. Licitación pública. 4. ed. Buenos Aires: Hispania Libros, 2010.
ELDIS. Policy Space. Disponível em: <http: /www. xxxxx.xxx/xxxxx/xxxxxx/0/xxxxxxxx/0000/XXX00000. pdf>.Acesso em: 30 set. 2014.
EMERIQUE, Xxxxxx Xxxxxxx; GUERRA, Sidney. A incorporação dos tratados internacionais de direitos humanos na ordem jurídica brasileira. Revista Jurídica, Brasília, v. 10, n. 90, p. 01-34, abr./maio, 2008. Ed. Esp. Disponível em: <http: /www.planalto. xxx.xx/xxxxxx_00/xxxxxxx/Xxx_00/Xxxxxxx/XXX/ SidneyGuerra_Rev90.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2014.
EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO. O
governo unificou em 25% a margem de preferência para as compras públicas: o percentual será aplicado até 2020 nas licitações federais para produtos manufaturados e serviços nacionais. Brasília, 2014. Disponível em: <http: /www. xxx.xxx.xx/xxxxxxxx/xxxxxxxx/0000/00/xxxxxx-xx- preferencia-para-compras-do-governo-sera-estendida- para-25>. Acesso em 16 out. 2014.
XXXXXX, Xxxxxxx. Função Regulatória da Licitação. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador, n. 19, ago./set./out. 2009. Disponível em: <http: /xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx/ revista/REDAE-19-AGOSTO-2009-XXXXXXX-
FERRAZ.pdf>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXXXX, Xxxxxx. A licitação pública no Brasil e sua finalidade legal: a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. O procedimento licitatório como microssistema jurídico: apontamentos e Reflexões in Rio de Janeiro (Estado). Tribunal de Contas. Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 2, n. 5, jan./jun. 2013.
XXXXXXXXX-XXXXXX, Xxxxxxx. Introduction: the global challenges o international public procurement.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
In:
______. International Public Procurement. London:
NOVEMBRO-2008-GUSTAVO%20JUSTINO.pdf>.
Globe Law and Business, 2009.
INTERNATIONAL CENTRE FOR TRADE AND SUSTAINABLE DEVELOPMENT (ICTSD). Acordo
sobre compras governamentais inaugura Ministerial da OMC. Disponível em: <http: /xxx.xxxxx.xxx/xxxxxxx-xxxx/ pontes/news/acordo-sobre-compras-governamentais- inaugura-ministerial-da-omc>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 13. ed. São Paulo: Dialética, 2009.
XXXXXX, Xxxxx X. A riqueza e a pobreza das nações: por que algumas são tão ricas e outras tão pobres. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
XXX, Xxxxxx. Menos R$ 1 Bi em vendas ao Governo.
Valor Econômico, São Paulo, 17 mar. 2014. Disponível em:
<http: /xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxx/0000000/xxxxx-x-0- bi-em-vendas-ao-governo>. Acesso em: 16 out. 2014.
XXXX, Xxxxxxxx X. Distribution, regulation, redistribution: the functions of government. In:
______. Public Policies and Their Politics. Xxxxxx, X.X.
Norton e Company Inc. New York: 1996.
XxXXXX, Xxxxxxx; XxXXXXXX, Xxxx. Government procurement and international trade. Journal of International Economics, v. 26, 1989.
XxXXXX, R. P., XxXXXXXX, X. Auctions and Bidding. Journal of Economic Literature. v. 25, p. 699-738, . 1987.
XXXXXXX, Xxxxx. OMC revisa acordo de compra governamental; Brasil prefere não aderir. Valor Econômico, São Paulo, 15 dez. 2011. Disponível em:
<http: /xxx.xxxxx.xxx.xx/xxxxxxxxxxxxx/0000000/ omc-revisa-acordo-de-compra-governamental-brasil- prefere-nao-aderir#ixzz3GiEEYTZg>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXXX, Xxxx xx Xxxxxxx. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública. 3. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxx de. Direito ao Desenvolvimento na Constituição Brasileira de 1988. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 16, nov./dez./jan. Disponível em: <http: / xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx/xxxxxxx/XXXXX-00 -
Acesso em: 30 set. 2014, p. 2.
XXXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. Direito ao desenvolvimento como direito fundamental. Disponível em: <http: /xxx.xxxxxxx.xxx.xx/xxxxxx/ arquivos/anais/bh/manoel_messias_peixinho.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2014.
XXXXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
XXXXXXX XXXXXX, Xxxxx Xxxxxx; XXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxxxx. Políticas públicas nas licitações e contratações administrativas. 2 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
XXXXXXX-XXXXXX, Cláudia. Direito ao desenvolvimento e investimentos estrangeiros. São Paulo: Xxxxxxxx Xxxxxx, 1998.
PIOVESAN, Flávia. A Constituição brasileira de 1988 e os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. In _. Temas de Direitos Humanos. 2. ed.
São Paulo: Xxx Xxxxxxx, 2003.
XXXXXXXXX, Xxxx Xxxxx. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013.
XXXXXXXX, Xxxxxxx. Desenvolvimentoetratamento especial diferenciado na OMC: uma abordagem sob a perspectiva da doutrina do stare decisis – Parte II. Revista de Direito Econômico Socioambiental, Curitiba, v. 3, n. 2, jul./dez. 2012.
SANCHES MONASSA, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxxx. É interessante para o Brasil aderir ao acordo sobre compras governamentais da OMC? Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 10, n. 1, p. 72- 84. 2013.
XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx; XXXXXXX, Xxxxxx xx Xxxxxxx. A Regulação de Compras Governamentais nos Acordos Preferenciais de Comércio. In: XXXXXXXX, Xxxx Xxxxx Xxxxxxx; XXXXXXX XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxx. (Org.). Tendências regulatórias nos acordos preferenciais de comércio no século XXI: os casos de Estados Unidos, União Europeia, China e Índia. Brasília: IPEA, 2013. p. 243-245. Disponível
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.
em: <http: /xxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxxx/xxxxxx/xxxxxxx/ PDFs/livros/livros/livro_tendencias_regulatorias1. pdf> Acesso em: 02 out. 2014.
XXXXXX, Xxxx Xxxxxxxx. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
XXXXXXX, Xxxxxx X. Regulation and Deregulation in Public Procurement Law Reform in the United States. In: ______. Advancing public procurement experiences: experiences, innovation and knowledge sharing. Boca Raton, PrAcademics Press, 2006, cap. 9, p 1-28. Disponível em: <http: /xxx.xxxx.xx/XXXX0/XXXX/ Chapter_9.pdf>. Acesso em: 04 out. 2014.
XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI: uma análise da normatização internacional e da Constituição Brasileira. In: XXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxxxx da; NASPOLINI SANCHES, Samyra; XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx. (Org.). Direito e desenvolvimento no Brasil no século XXI. Brasília: IPEA; CONPEDI, 2013.
XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito administrativo
contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
XXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx. Direito administrativo regulatório. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
UNCITRAL.LeiModelodeContrataçõesPúblicas.Disponível em: <http: /xxx.xxxxxxxx.xxx/xxxxxxxx/xx/xxxxxxxx_ texts/procurement_infrastructure/2011Model.html>. Acesso em: 15 out. 2014.
UNIVERSIDAD NACIONAL DE LA PLATA.
Los principios de Limburg sobre la aplicación del pacto internacional de derechos económicos, sociales y culturales. Disponível em: <http: / xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxxx.xxx.xx/xxxxxx/xxxxx/ documentos/los-principios-de-limburg-sobre-la- aplicacion-del-pacto-internacional-de-derechos-
economicos-sociales-y-culturales-2.pdf>. Acesso em:
26 ago. 2014.
XXXXXX, Xxxxxxx Xxxxx. A OMC e o policy space dos Estados: questões de flexibilidade, desenvolvimento sustentável e políticas públicas no GATT e GATS. In: XXXXXX XXXXXX, Xxxxxxx do; XXXXX XXXXXX,
Xxxxxxx (Org.). A OMC: desafios e perspectivas. São Paulo: Aduaneiras, 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. Anexos del
proyecto de texto ministerial de Xxxxxx. Disponível em:
<http: /xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/ min03_s/draft_decl_annex_rev2_s.htm>. Acesso em: 03 set. 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. Doha WTO
Ministerial 2001: Ministerial Declaration. Disponível em:
<http: /xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/ min01_e/mindecl_e.htm>. Acesso em: 01 set. 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. Geneva WTO
Ministerial 1998: Ministerial Declaration. Disponível em:
<http: /xxx.xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxxx_x/ min98_e/mindec_e.htm>. Acesso em: 01 set. 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. Parties, observers and accessions. Disponível em: <http: /xxx.xxx.xxx/ english/tratop_e/gproc_e/memobs_e.htm>. Acesso em: 30 set. 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. Singapore
WTO Ministerial 1996: Ministerial Declaration wt/ min(96)/dec. Artigo 21 - Transparency in Government Procurement. Disponível em: <http: /xxx.xxx.xxx/ english/thewto_e/minist_e/min96_e/wtodec_e.htm
>.Acesso em: 01 set. 2014.
WORLD TRADE ORGANIZATION. WTO and
Government Procurement. Disponível em: <http: /www. xxx.xxx/xxxxxxx/xxxxxx_x/xxxxx_x/xxxxx_x.xxx>. Acesso em: 30 set. 2014.
XXXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx do. Contratações públicas no âmbito da OMC: a política legislativa brasileira à luz do direito ao desenvolvimento. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 12, n. 2, 2014 p. 191-216.