POSSIBILIDADE DE SUCESSÃO DIRETA EM
POSSIBILIDADE DE SUCESSÃO DIRETA EM
PROCESSO DE EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA, SEM A EXPRESSA ANUÊNCIA
DOS SUCEDIDOS E SEM A EXISTÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. LIMITES OBJETIVOS PARA A HABILITAÇÃO DO SUCESSOR
PROCESSUAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE E VERWIRKUNG OU SUPRESSIO
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx0
PALAVRAS-CHAVE: EXECUÇÃO. FAZENDA PÚBLICA. SUCESSÃO. PRECATÓRIO JUDICIAL.
1 SUBSTRATO FÁTICO
AFCF e ABCF propuseram AÇÃO DE INDENIZAÇÃO (Desapropriação Indireta) contra o
DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM DO (ESTADO) (distribuição em 30.03.1990),
devido à ocupação de parte de área de sua propriedade rural para a construção do trecho Cidade01/Cida- de02, integrante da Rodovia XX 000.
Recebida a inicial, citado o réu e oferecida contestação, teve o feito normal processamento pelo rito ordinário do CPC de 1973, sendo prolatada sentença em 22.02.1996 (Proc. 000000 - fls.04/12), onde se fez constar na parte dispositiva o acolhimento do pedido formulado, com a condenação do réu ao pagamento de indenização no montante de Cz$ 2.113.848,00 (dois milhões, cento e treze mil e oitocentos e quarenta e oito cruzados), acrescido de correção monetária a partir de 01.1987, de juros compensatórios no percentual de 12% (doze por cento) ao ano a partir de 05.1969 (efetiva implantação da rodovia) e de juros moratórios no percentual de 06% (seis por cento) ao ano, a partir do trânsito em julgado.
Interposta apelação, o V. Acórdão de 18.12.1996 (Proc. 000000 - fls. 23/26), por maioria de votos, deu parcial provimento ao apelo, apenas para reduzir o montante da verba honorária fixada, man- tendo-se no mais o que havia sido decidido no juízo “a quo”; o que por sua vez foi mantido em sede de Embargos Infringentes, pelo V. Acórdão de 18.10.2001 (Proc. 000000 - fls. 43/47).
Aos 14.12.2001 foi certificado o trânsito em julgado no processo de conhecimento (Proc. 000000 - fls. 52). Ao que se sabe não houve interposição de ação rescisória, ação anulatória ou Querela nullitatis insanabilis da decisão transitada em julgado até a presente data.
Em 04.04.2002 os autores, então exequentes, distribuíram EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDI- CIAL, contra o réu, então executado, pleiteando o recebimento de R$ 2.104.434,58 (dois milhões, cento
1 Livre Docente em Direito Processual Civil pela PUCSP e com graduação (1984), mestrado (1992) e doutorado (1996) pela mesma instituição de ensino superior, realizou estudos de pós-doutorado na Università degli Studi di Milano em 1999/2000. Professor de Direito Processual Civil dos cursos de graduação, mestrado e doutorado da PUCSP, professor efetivo da UFMF, da Escola Paulista da Magistratura e de inúmeros cursos de especialização. Juiz de Direito aposentado.
Revista da PGE/MS - Edição n. 15
e quatro mil, quatrocentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), atualizados até 31.03.2002,
mediante a expedição de Precatório Judicial (Proc. 000000 - fls. 53/56).
Ofertados embargos à execução de título judicial, os exequentes concordaram com o valor indicado como correto, calculado em R$ 2.079.630,11 (dois milhões, setenta e nove mil, seiscentos e trin- ta reais e onze centavos), na data base de 03.2002 (Proc. 000000 - fls. 82). Por isso, em 24.03.2003, foi proferida a R. Sentença que acolheu como correto o valor indicado (fls. 89/91), transitada em julgado aos 23.04.2003 (fls. 93).
Promovida à atualização do valor fixado, o que alcançou o montante de R$ 2.621.286,57 (dois milhões, seiscentos e vinte e um mil, duzentos e oitenta e seis reais e cinquenta e sete centavos), em 05.2003 (fls. 95), houve a “homologação do cálculo” (fls. 112) e a expedição de carta requisitória de pre- catório judicial em 10.11.2003 (fls. 121/122).
Paralisado o feito a espera do pagamento do valor devido, em 30.07.2010, AB e sua mulher EAS, adquirentes de duas áreas que somam 90,95 % do total de área que sofreu a desapropriação indireta (Proc. 000000 - fls. 261/264 e 265/267), pleitearam perante o Preclaro Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do [...] a sub-rogação desse percentual no montante a ser indenizado (fls. 166/172), pedido esse expressamen- te rejeitado pela R. Decisão Monocrática encartada as fls. 372, do Processo 000000, aos 07.05.2014.
Diante da rejeição do pleito formulado perante esse Xxxxxxx Xxxxxxxxx, AB e sua mulher EAS, em 03.07.2014, mais uma vez pediram a sub-rogação, agora perante o Nobre Juízo da Comarca de Cida- de02 (Proc. 000000 – fls. 160/161) que, após a manifestação dos exequentes, aos 04.10.2016, houve por bem acolher o pedido e decretar a sub-rogação de percentual de 90,95 % do total de área que sofreu a de- sapropriação indireta.
2 SUBSTRATO JURÍDICO
2.1 PERGUNTA-SE: É POSSÍVEL A SUCESSÃO PROCESSUAL DIRETA, EM EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA, SEM A EXPRESSA ANUÊNCIA DOS SUCEDIDOS?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Caracterizado o pedido de sucessão processual inter vivos como um ato processual dispositivo da parte, a falta de anuência ex- pressa do sucedido impede que se produzam os efeitos descritos no art. 200, in fine, do CPC, qualquer que seja o procedimento, inclusive na execução contra a fazenda pública.
Antes de abordar o tema específico da consulta formulada, apenas com a finalidade de contex- tualizar o âmbito temporal da discussão, há necessidade de observar que a R. Decisão “a quo” que acolheu o pedido de sub-rogação foi prolatada aos 04.10.2016, quando já em vigor o atual Código de Processo Civil. Portanto, em se tratando a sucessão no processo de matéria regulamentada por normas que ostentam natureza processual, aplicáveis de imediato após sua entrada em vigor, o procedimento adequado é o que está regulamentado pela Lei n. 13.105, de 16.03.2015, o novo Código de Processo Civil.
Nesse passo, já tivemos a oportunidade de salientar2 que a determinação do juízo competente
2 XXXXXXXX XXXX, Xxxxx xx, XXXXXXXX XXXX, Xxxxx Xxxxxxx de, XXXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx de. Curso de direito processual civil. São Paulo: Verbatim, 2015. Vol. I, p. 360-363.
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para conhecer e para decidir determinada demanda depende, além das regras que regulam a competência em seus diversos aspectos, da fixação de um marco temporal, sem o que cada alteração na situação de fato ou de direito pode implicar na alteração da competência inicialmente fixada. Daí a razão pela qual o art. 43, do CPC, estabelece que “Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta, ...”; o que se denomina princípio da “perpetuatio jurisdictionis” ou princípio da perpetuação da jurisdição.
O mesmo acontece, embora com um maior número de exceções, no tocante determinação do polo ativo e do polo passivo da demanda, fixados quando da propositura da ação, que para alguns toma a denominação de “perpetuatio legitimationis”. Em outros termos, em regra, a propositura do feito implica na fixação das partes e da sua legitimação para a causa até o seu final, sendo possível eventual alteração apenas nas hipóteses previstas nos art. 338 e 339, do CPC, e, nas hipóteses previstas nos art. 108 até 110, do CPC, essas referentes à sucessão das partes no processo em curso.
A redação dos preceitos sofreu poucas alterações com relação aos art. 41 a 43, do CPC de 1973, mas corrigiu uma imprecisão (art. 108) que era objeto de robusta crítica por parte da doutrina, pro- movendo a substituição do termo “substituição processual” pelo termo “sucessão voluntária” (sucessão processual), o que nos dá uma ideia mais exata da natureza do instituto em comento. A tal respeito alertava Arruda Alvim:
“É curial que o vocábulo do art. 41 (substituição) nada tem a ver com o instituto da substituição processual. Acreditamos, todavia, que preferível teria sido deixar de lado a expressão substituição e falar o legislador em sucessão no processo. A expressão sucessão no processo não é desconhecida na literatura processual...”.3
Realmente, o instituto aqui tratado não guarda semelhança alguma com a substituição proces- sual. Enquanto na substituição, por força do disposto no art. 18, do CPC, o substituto pleiteia direito alheio em nome próprio, desde que autorizado por lei; na sucessão processual, também nos casos previstos por lei, acontece à sucessão da parte originária no processo por alguém que adquire direitos com relação ao objeto litigioso ou sucede a parte original em razão de seu falecimento. Daí a existência de duas espécies de sucessão processual tratadas pela lei: a) a voluntária ou inter vivos (art. 109), que se opera por força da alienação da coisa ou do objeto litigioso; e, a b) obrigatória ou causa mortis (art. 110), que se opera por força do falecimento de uma das partes.
Diante de tais aspectos podemos definir o instituto da sucessão processual como o fenômeno da sucessão da parte originária no processo, que se dá porque alguém adquire direitos com relação à coisa litigiosa ou com relação ao objeto litigioso (sucessão voluntária); ou, porque sucede a parte em razão de seu falecimento (sucessão obrigatória).
Enquanto a sucessão obrigatória decorre do mero falecimento de uma das partes, a sucessão voluntária, como se disse, deve ser expressamente autorizada por lei, conforme dispõe o art. 109, do CPC. Essa autorização expressa, entretanto, deve ser entendida como ausência de vedação a transmissão do obje- to litigioso, na medida em que aquilo que tiver caráter patrimonial em regra poderá ser alienado livremente pela parte, respeitadas as limitações de ordem procedimental e as relativas aos direitos indisponíveis.
Promovida à sucessão voluntária, a alienação da coisa ou do direito litigioso não altera a le-
3 XXXXXX XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: XX, 0000. p. 293.
gitimidade das partes (art. 109), a não ser que a parte contrária concorde com a sucessão operada. Nesse
sentido já alertava Xxxxx Xxxxx, ao analisar o art. 42, §1º, do CPC de 1973:
“Concordância na substituição da parte – O § 1° admite a substituição voluntária da parte originária pelo adquirente da coisa ou cessionário do direito objeto da demanda, mas a subordina ao consen- timento da parte contrária. Se esta não concordar, a substituição não poderá ser feita, devendo a causa continuar com o alienante ou cedente, observados os efeitos referidos no § 3° já comentado. Mas se a parte contrária anuir na substituição, ela se fará, e o alienante ou cedente será excluído do processo.”.4
Nesse caso, pois, o adquirente ou cessionário poderá ingressar no processo como parte, ope- rando-se a extromissão da parte originária. Mas se a parte contrária não estiver de acordo com a sucessão processual que se operou, poderá o adquirente ou o cessionário intervir no processo como assistente do alienante ou do cedente, fazendo-o na modalidade de assistência litisconsorcial (§2º), já que passa a ter uma relação jurídica com o adversário do assistido, sendo que a sentença proferida entre as partes originá- rias estende os seus efeitos ao adquirente ou ao cessionário (§3º).
Não há previsão expressa da maneira pela qual deverá se processar o incidente relativo à ad- missão da sucessão processual no feito. Daí, ocorrendo à sucessão voluntária e com a finalidade de agilizar a solução do incidente, deverão o sucedido e o sucessor, em petição simples e que não possui requisitos específicos, pleitear a substituição, juntando o documento comprobatório da alienação ou da cessão. E conveniente, ainda, que seja formulado pedido sucessivo de assistência, para o caso de eventual discordân- cia da parte contrária. Em seguida, levando em conta os princípios da brevidade e da utilidade dos prazos processuais, deverá o magistrado fixar prazo para a manifestação da parte contrária. Aceitando a sucessão ou mantendo-se inerte, o magistrado determinará a substituição da parte e a alteração dos registros. Caso contrário, admitirá o terceiro como assistente litisconsorcial.
Em quaisquer das situações apontadas, entretanto, há necessidade da expressa concordância do sucedido para que se efetive a sucessão nos autos do processo. Não é possível a quem não é parte, o que faz com que seja terceiro, mesmo que ostente interesse jurídico, ingressar no processo ao arrepio da vontade da própria parte que vem a suceder. Isso porque o pedido de sucessão processual, como espécie de ato processual, também se submete aos requisitos de validade e de eficácia dos atos processuais em geral.
Tal pedido deve ser classificado como um ato processual da parte, a cujo respeito já tivemos a oportunidade de afirmar que “Além dos atos postulatórios, as partes também praticam atos processuais chamados de dispositivos, já que visam especificamente dispor de um direito ou de uma faculdade proces- sual, produzindo consequências práticas no curso do processo. Trata-se da hipótese em que uma das partes desiste da produção de uma determinada prova ou do pedido de homologação do acordo que entabularam. Tais atos, por força do disposto no art. 200, in fine, do CPC, produzem imediatamente a constituição, a modificação ou a extinção de direitos processuais; à exceção da desistência da ação, que somente pro- duzirá efeitos após a homologação por sentença (parágrafo único). Também por força do teor do citado preceito, que repete a redação do art. 158, do CPC de 1973, os atos dispositivos podem ser divididos em atos unilaterais e atos bilaterais. Enquanto estes exigem a participação de ambas partes, aqueles podem ser praticados por apenas uma delas.”.5
4 BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao código de processo civil. 6ª e.. Rio de Janeiro: Forense, 1991. v. I, p. 150.
5 XXXXXXXX XXXX, x. 499-500.
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Em outros termos, se os atos das partes são classificados pela lei, em atenção à doutrina de Xxxxxxxxx, como atos postulatórios, atos dispositivos e atos instrutórios, não sendo o pedido de sucessão postulatório ou instrutório, então se trata de ato dispositivo, na modalidade bilateral porque exige a aceitação tanto do sujeito ativo, quanto do sujeito passivo para que se processe a sucessão. Daí a razão pela qual a falta de concordância expressa do sujeito ativo impede que o terceiro pratique ato processual válido no processo, sendo inviável a substituição praticada sem a expressa concordância daquele que será excluído do feito.
Em termos práticos, alias, agiu muito bem a lei ao estabelecer como requisito para a validade do ato processual a participação do sucedido, do sucessor e da parte contrária. Afinal, mesmo após uma transmissão expressa do direito material, o que não aconteceu no caso em estudo, o sucedido ou a parte contrária podem objetar a validade do negócio jurídico realizado.
Pense-se, por exemplo, na alienação do objeto litigioso mediante pagamento a prazo, na qual o adquirente não paga nem mesmo a primeira das parcelas pactuadas ou no caso do pagamento com cheque sem provisão de fundos, havendo no contrato clausula expressa de resolução. Se o sucedido não tivesse, obri- gatoriamente, que formular o pedido de sucessão em conjunto com o sucessor, muito fácil ficaria para a parte contrária, em conluio com o sucessor, armar uma escaramuça para o sucedido, oferecendo-lhe condições excelentes para a realização de negócio e induzindo-o a realiza-lo. Com isso o sucedido perderia a vantagem econômica no processo onde se viu sucedido, sem poder impedir a ocorrência da fraude. O mesmo se diga no caso da possibilidade da realização de compensação de créditos entre sucessor e sucedido, que estaria impe- dida em virtude de não necessidade da participação do sucedido no pedido de sucessão processual.
Destarte, portanto, a única resposta possível à questão formulada é a de que, em se tratando o pedido de sucessão processual de ato processual dispositivo da parte, a falta de anuência expressa do sucedido impede que se produzam os efeitos descritos no art. 200, in fine, do CPC, qualquer que seja o procedimento, inclusive na execução contra a fazenda pública.
2.2 PERGUNTA-SE: HAVENDO A TRANSMISSÃO DE IMÓVEL EXPROPRIADO É POSSÍVEL PRESUMIR, SENDO OMISSA A ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA, QUE OS ALIENANTES CONCORDARAM COM A TRANSMISSÃO DO OBJETO LITIGIOSO DO FEITO ONDE SERÃO INDENIZADOS PELA EXPROPRIAÇÃO?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Diante das circunstâncias do caso em estudo não é possível presumir que a transmissão do imóvel expropriado implicou na concor- dância dos exequentes quanto à transmissão do objeto litigioso do feito onde serão indenizados pela expropriação. Não há presunção legal em razão da ausência de norma que estabeleça a sub-rogação e também não há sub-rogação convencional, uma vez que o art. 347, I, do Código Civil, ao se valer da locução “...expressamente lhe transfere todos os seus direitos...”, exige que a transmissão se faça mediante clausula expressa e destacada, como ocorre com a evicção, que apresenta mecanismo semelhante no art. 448, do Código civil. Ao contrário, se presunção homi- nis houvesse, essa militaria em favor dos exequentes, já que o valor da indenização supera o valor da aquisição da propriedade de 508,8232 hectares, de terras altamente férteis e bastante bem loca- lizadas, o que faria com que os exequentes pagassem para os adquirentes ficar com a propriedade.
Já tivemos a oportunidade de afirmar6 que as presunções não são propriamente fatos prova-
6 XXXXXXXX XXXX, Xxxxx xx, XXXXXXXX XXXX, Xxxxx Xxxxxxx de, XXXXXXXX, Xxxxxxxx Xxxxx Xxxxxxxxx de. Curso de direito processual civil. São Paulo: Verbatim, 2015. Vol. II, p. 224-225.
dos ou mesmo as afirmações de fatos que se pretendem comprovar, mas sim um raciocínio lógico que se desenvolve, partindo dos fatos conhecidos e provados para chegar a um fato não provado. Trata-se de um mecanismo utilizado para partir de fatos provados e concluir pela existência de um fato que não foi real- mente comprovado. Na lição de Xxxx Xxxxxxx Xxxxx “...as presunções constituem raciocínios, deduções e não propriamente meio de prova.”.7 Nesse mesmo sentido as colocações de Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxxxx ao ensinar que:
“Não dependem de prova, ainda quando negados pelo adversário, os fatos ´em cujo favor milita presunção de existência ou veracidade` (Art. 334, inc. IV). Alegado um fato que a lei manda presu- mir (presunções legis) ou que os tribunais presumem segundo as máximas de experiência dos juízes (Art. 335, presunção hominis), essa alegação será reputada verdadeira e ocorrido o fato alegado; a alegação fica portanto excluída do objeto da prova, ainda quando contrariada pela negativa que a parte contrária haja formulado.”;8 e, de Xxxxxx Xxxxx Xxxxxxx quando afirma que “Fato presumido é aquele resultante da conclusão de um fato conhecido e provado. Vale dizer, a presunção importa em forma de raciocínio do juiz, que, a partir de um fato provado, chega à conclusão da existência de outro.”.9
A dinâmica dessa operação mental que se realiza é muito bem explicada por Xxxxxxxxxx quando apresenta a relação que existe entre a dedução e a prova indireta:
“A prova indireta se apresenta quando o juiz não percebe o fato a provar, senão um fato diverso deste. Portanto, a percepção do juiz não basta aqui por si só para a busca do fato a provar, senão há de integrar-se com a dedução do fato a provar a respeito do fato percebido. A atividade do juiz se faz complexa: percepção e dedução. A busca do fato a provar, não percebido mediante o fato diverso percebido pelo juiz, cabe precisamente mediante um procedimento lógico de dedução. O juiz cons- trói um silogismo, no qual a premissa menor está construída pela posição do fato percebido diverso do fato a provar, e a conclusão pela afirmação da verdade ou não (existência ou inexistência) do fato a provar, [...] Deve-se reconhecer a natureza estritamente lógica desta operação.”.10
Realmente, efetivada a prova, seja qual for o meio empregado, a comprovação dela decorrente não atinge uma afirmação de direito formulada pelas partes. Atinge fato ou afirmação de direito que acaba por permitir um raciocínio lógico dedutivo e que leva a conclusão da comprovação da afirmação de direito que se pretende demonstrar. Tal situação, dentre outras, sempre acontece quando há necessidade de com- provar em algum feito a intenção de uma das partes. Xxxxxx, como seria possível comprovar, de modo dire- to, que uma pessoa agiu imbuída de boa-fé ou de má-fé? Não há como penetrar da esfera de intimidade da pessoa e dali retirar uma comprovação direta de que agiu para prejudicar ou para beneficiar outrem. Apenas uma análise de situações anómalas e que induzem a existência de má-fé, afora as presunções legais, é que poderá dar ensejo a conclusão de que a afirmação de direito a comprovar está efetivamente demonstrada.
Várias são as formas de classificar essas presunções, sendo as mais comuns àquelas que as classificam tendo em vista a sua origem e tendo em vista a sua eficácia. Quanto à origem as presunções são comuns ou do homem (hominis), quando são oriundas desse raciocínio realizado pelo magistrado e que acima apresentamos; e, são legais (juris), quando decorrem da própria lei (v.g.: art. 344, do CPC – presunção de veracidade dos fatos articulados na inicial no caso de revelia). Nenhuma dessas espécies de
7 XXXXX, Xxxx Xxxxxxx. A prova no direito processual civil. 3ª ed.. São Paulo: XX, 0000. p. 66.
8 DINAMARCO, Xxxxxxx Xxxxxx. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. III, p. 63.
9 XXXXXXX, Xxxxxx Xxxxx. Princípio da proibição da prova ilícita. In XXXXXXXX XXXX, Xxxxx xx (Xxxxx.), XXXXX, Xxxxx Xxxxxxxxx xx Xxxxxx (Coord.). Princípios processuais civis na Constituição. São Paulo: Xxxxxxxx, 0000. p. 259.
10 XXXXXXXXXX, Xxxxxxxxx. A prova civil. 2ª ed.. Campinas: Bookseller, 2002. p. 90-91.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
presunção se verifica no caso que se submete a estudo.
No que toca a presunção legal, não há norma que expressamente a preveja, seja no Código Ci- vil em vigor, seja no Código Civil de 1916, que é o diploma aplicável caso, já que a alienação dos imóveis se deu em 23.07.1999 (Proc. 000000 - fls. 261-264) e em 15.02.2000 (Proc. 00000 - fls. 265-267), época em que ainda vigia o Código Civil revogado. Ao contrário, uma interpretação sistemática dos art. 347, I e 448, do atual diploma, sucessores com o mesmo teor dos art. 986, I, e 1.107, parágrafo único, do Código Civil de 1916, induz a conclusão de que a transmissão do objeto litigioso deveria constar expressamente das escrituras de compra e venda do imóvel, numa clausula destacada e em separado, o que não aconteceu.
Estabelece o art. 448, do Código Civil, que as partes podem, “...por clausula expressa...” al- terar o regime da responsabilidade que decorre da evicção. Daí, se não existe no instrumento de compra e venda uma clausula expressa, que usualmente encontra-se destacada no corpo do texto, assim como nos autos em exame foi destacada por letras em caixa alta a “SUB-ROGAÇÃO PARCIAL DE CLAUSULAS DE INALIENABILIDADE, INCOMUNICABILIDADE E IMPENHORABILIDADE” (Proc. 000000 -
fls. 263), então os alienantes são responsáveis perante os adquirentes nos exatos limites da lei.
Ora, se o art. 347, I, do Código Civil, que trata da sub-rogação convencional, indica que esta deve reputar-se perfeita e acabada quando o credor recebe o pagamento do terceiro e “...expressamente lhe transfere todos os seus direitos...”, então porque nesse caso não seria necessária clausula expressa e destacada como acontece no caso da evicção? Da mesma forma como lá ocorreu, aqui a lei também exige uma manifestação inequívoca da vontade das partes, o que não aconteceu no caso concreto. Se não exis- te no instrumento uma clausula expressa e destacada dispondo de maneira diversa, então não acontece a transferência na forma prevista pelo art. 349, do Código Civil.
Do mesmo modo que não existe a presunção legal, também não se verifica a existência de pre- sunções comuns (hominis), já que do feito em análise não emerge uma conjuntura composta de situações anômalas, capazes de induzir a conclusão do julgador no sentido de que houve a alienação do objeto liti- gioso. Ao contrário, situações anômalas existem no sentido de que a alienação efetivamente não aconteceu.
Por primeiro, não há como negar que os adquirentes conheciam a existência da estrada no local, ali construída há mais de 30 anos (1969) da aquisição das áreas (23.07.1999 e 15.02.2000), situação que caracteriza a ocorrência de fato notório,11 que independe de comprovação. Alias os memoriais juntados pelos próprios adquirentes (Proc. 00000 - fls. 268/274) e que serviram de base para a lavratura das escritu- ras demonstram inequívoca ciência da redução da área, razão pela qual não é crível que tenham efetuado o pagamento pela aquisição sem descontar o montante ocupado pela estrada.
Como ninguém que esteja no exercício das suas faculdades mentais normais paga mais do que
11 XXXXXXXX XXXX. Curso..., Vol. II, p. 222. “Diante do exposto podemos identificar três circunstâncias que são necessá- rias ao reconhecimento de um fato como notório: a) ele deve ser conhecido por um grupo mais ou menos identificado de pes- soas (ex.: moradores de uma região, integrantes de uma categoria profissional ou frequentadores habituais de u determinado local); b) ele deve se referir a um momento certo (data ou período determinado); e, c) ele deve ter uma delimitação espacial, isto é, seu conhecimento se estende por um território mais ou menos preciso ou passível de precisão. Vê-se, portanto, que o que caracteriza determinado fato como notório é a circunstância de que ele é reconhecido por um determinado grupo ou categoria de pessoas, num determinado momento e local, situação que faz com que não se instaure controvérsia a seu respeito. Mesmo que tal fato seja importante ao deslinde do feito, não há controvérsia sobre a sua existência e, por isso, não há questão a ser submetida à prova pelo magistrado. Daí a razão pela qual não há necessidade de produzir prova sobre a época do ano em que se realiza a colheita da cana numa determinada região, fato notório para os habitantes das cidades que convivem com a fuligem decorrente das queimadas há várias décadas.”.
está efetivamente adquirindo, bem como em razão da situação dos adquirentes, ele empresário do agrone- gócio e ela advogada, a conjuntura é contrária à ideia de que o objeto litigioso foi transmitido quando da venda da área.
Não bastasse, se os exequentes houvessem realmente transmitido o objeto litigioso para os adquirentes, o que não aconteceu, estariam pagando para vender a área, já que o valor da indenização, já naquela época, era superior ao valor da aquisição.
Os exequentes promoveram a divisão amigável da Fazenda Santo Antônio (Proc. 00000 - fls. 258/260), transformando-a em duas áreas (Lote A e Lote B), que posteriormente foram separadamente vendidas para os adquirentes. O Lote Parte A foi alienado aos 23.07.1999 pelo valor declarado de R$ 550.000,00 (quinhentos e cinquenta mil reais), conforme consta da escritura juntada a fls. 261/264 do Proc. 000000; enquanto o Lote Parte B foi alienado aos 15.02.2000 pelo valor declarado de R$ 750.000,00 (sete- centos e cinquenta mil reais), conforme consta da escritura juntada a fls. 265/267 do Proc. 00000. Portanto, ambos os lotes, cuja soma das áreas atinge 508,8232 hectares, foram adquiridas pelo valor total de R$ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil reais).
Por seu turno, por força do determinado na R. Sentença, mantida pelo V. Acórdão transitado em julgado em 14.12.2001, valor da condenação foi fixado em CZ 2.113.849,00 (dois milhões, cento e treze mil e oitocentos e quarenta e nove cruzados novos), na data base janeiro/1987, sujeito a correção monetá- ria a partir de janeiro/1987, bem como da incidência de juros compensatórios de 12% (doze por cento) ao ano, a partir de maio/1969 (data da implantação da rodovia) e de juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano a partir do trânsito em julgado. Em sede de execução esse valor foi corrigido até 03.2002, quando se apurou o montante da indenização em R$ 2.079.630,11 (dois milhões, setenta e nove mil, seiscentos e trinta reais e onze centavos).
Atualizando o valor fixado na sentença até data da alienação das glebas, conforme consta do Anexo 01, obtemos os seguintes valores:
a) Para a data da alienação do Lote Parte A (23.07.1999)
Valor original convertido da condenação | R$ 419.703,35 |
Valor corrigido (redução) de 03.2002* até 07.1999 (0,8200653) | R$ 344.184,16 |
Juros compensatórios de 05.1969 até 07.1999 (362,0%) | R$ 1.245.946,65 |
Juros moratórios (a partir do trânsito em julgado – 14.12.2001) | R$ zero |
Total | R$ 1.590.130,81 |
* Data do cálculo fixado na decisão dos embargos, transitada em julgado.
b) Para a data da alienação do Lote Parte B (15.02.2000)
Valor original convertido da condenação | R$ 419.703,35 |
Valor corrigido (redução) de 03.2002* até 02.2000 (0,8613480) | R$ 361.510,62 |
Juros compensatórios de 05.1969 até 02.2000 (369,0%) | R$ 1.333.974,20 |
Juros moratórios (a partir do trânsito em julgado – 14.12.2001) | R$ zero |
Total | R$ 1.695.484,82 |
* Data do cálculo fixado na decisão dos embargos, transitada em julgado.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
Se tivesse acontecido à venda do objeto litigioso da ação de indenização, repita-se em tom de ênfase, os adquirentes das áreas, que remonta 508,8232 hectares de terras altamente férteis e bastante bem localizadas, estariam recebendo os seguintes valores para adquirir os imóveis:
a) Valor pago pela área total adquirida | R$ 1.300.000,00 |
b) Valor corrigido para 27.07.1999 | R$ 1.590.130,81 |
c) Valor corrigido para 15.02.2000 | R$ 1.695.484,82 |
d) Saldo em favor dos adquirentes (b – a = d) | R$ 290.130,81 |
e) Saldo em favor dos adquirentes (c – a = e) | R$ 395.484,82 |
Na melhor das situações (d), portanto, os adquirentes estariam recebendo R$ 290.130,81 (du- zentos e noventa mil, cento e trinta reais e oitenta e um centavos), em julho de 1999, para adquirir a pro- priedade, o que é absolutamente despropositado e sem qualquer suporte legal, configurando verdadeiro enriquecimento sem causa.
E nem se diga, aqui, que o fato de Xxxxxxxxx ter ficado com 9,05 % do total da área beneficia os adquirentes, pois a diferença entre o valor pago e valor da indenização, ambos na mesma data, atinge mon- tante superior a 10%; ou; que não houve definição da atualização para cada área de forma individualizada, pois tal circunstância depende de uma verificação minuciosa da cadeira de filiação do imóvel, inclusive para que se verifique onde ocorreu a sub-rogação das clausulas e deveres existentes á época da alienação, o que depende de iniciativa dos próprios adquirentes da área.
Destarte, se há uma presunção hominis no caso em estudo essa milita em favor dos exequentes, na medida em que as situações anômalas detectadas estão no sentido de que a alienação do objeto litigioso efetivamente não aconteceu.
Pelo exposto torna-se forçosa a concussão de que, diante das circunstâncias do caso em estudo, não é possível presumir que a transmissão do imóvel expropriado implicou na concordância dos exequen- tes quanto à transmissão do objeto litigioso do feito onde serão indenizados pela expropriação. Não há presunção legal em razão da ausência de norma que estabeleça a sub-rogação e também não há sub-roga- ção convencional, uma vez que o art. 347, I, do Código Civil, ao se valer da locução “...expressamente lhe transfere todos os seus direitos...”, exige que a transmissão se faça mediante clausula expressa e destacada, como ocorre com a evicção, que apresenta mecanismo semelhante no art. 448, do Código civil. Ao contrá- rio, se presunção hominis houvesse, essa militaria em favor dos exequentes, já que o valor da indenização supera o valor da aquisição da propriedade de 508,8232 hectares, de terras altamente férteis e bastante bem localizadas; o que faria com que os exequentes pagassem para os adquirentes ficar com a propriedade.
2.3 PERGUNTA-SE: NÃO SENDO POSSÍVEL A SUCESSÃO PROCESSUAL DIRETA, SEM A EXPRESSA ANUÊNCIA DOS SUCEDIDOS, PODEM OS ADQUIRENTES DO IMÓVEL ONDE SE DEU A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA INTERVIR COMO PARTES NO PROCESSO DE INDENIZAÇÃO?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Os adquirentes do imóvel onde se deu a desapropriação indireta não possuem título executivo, judicial ou extrajudicial, que produza eficácia executiva apta a permitir sua admissão como exequentes na execução contra a fazenda que ora se analisa. Por isso, diante do princípio do título, não podem intervir direta-
mente na execução já instaurada. Para isso teriam que propor uma ação de conhecimento com a finalidade de formar um título executivo, para só então, obtendo sucesso em sua pretensão, promover a penhora do precatório judicial.
Embora sejam várias as modalidades de procedimentos executivos, alocados como espécies de cumprimento da sentença ou como espécies de procedimentos executivos autônomos, em todos eles há a necessidade da existência de um título executivo que legitime o exequente a promover atividade executiva. Por isso um dos princípios que rege a execução é o princípio do título, sobre o qual tivemos a grata opor- tunidade tecer breves considerações em obra que homenageou o Professor Araken de Assis.
Dissemos, na ocasião,12 que a execução civil de origem romana sempre exigiu a existência de título executivo, ou equivalente, para que pudesse ter seguimento. Ou o exequente tinha execução apare- lhada com um título, ou então deveria se utilizar de um processo de conhecimento autônomo para formar o título e, só então, manusear o processo executivo. Tal situação restava incontestável para a doutrina e estava presente no princípio contido no revogado art. 583 do CPC,13 segundo o qual não havia execução sem título executivo, denominado originalmente nulla executio sine titulo.
Porém, a introdução em nosso sistema da antecipação de tutela e da tutela monitória acabaram por alterar substancialmente a compreensão do instituto “título executivo” e da sua necessidade para que fosse viável a utilização de tutela executiva, na medida em que restou evidente a possibilidade de alteração do mundo de fato (traço característico do ato executivo) sem a existência de um processo de execução apa- relhado com um título judicial ou extrajudicial de concepção tradicional. Com isso surgiu nova polêmica: é efetivamente possível a realização de atividade executiva sem a existência de um título executivo?
Para Araken de Assis, bem como para aqueles que entendem existente o princípio do título, a resposta é negativa, na medida em que “...a pretensão de executar sempre se baseará no título executivo. Celebre metáfora ao título designou de ‘bilhete de ingresso’, ostentado pelo credor para acudir ao proce- dimento in executivis.”.14
A solução da questão passa pela compreensão do que é um título executivo, que modernamente não mais pode ser atrelado a concepção da doutrina tradicional. Daí a lição de Xxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx ao ensinar que:
“Os fatos jurídicos geram os efeitos que lhe são atribuídos pela norma jurídica; e não se pode dizer que é o fato que dá existência a determinado efeito, senão que, a rigor, o que sucede é a produção de efeitos jurídicos pela norma, que confere (imputa) tais efeitos ao fato em questão. Daí ser possível que a norma jurídica atribua, de modo excepcional, a um ato oral eficácia executiva – sob esse pris- ma, tal ato, mesmo oral, poderia ser considerado título executivo, como já se admitiu na doutrina. O próprio ordenamento jurídico processual prevê, atualmente, títulos executivos emitidos pelo pró- prio credor, nos quais a participação do devedor, se não é irrelevante, está em segundo plano. [...] Assim, localiza-se na norma jurídica, e não no documento, o cerne da definição do título executivo, muito embora aquele outro elemento faça-se presente, com alguma constância, na tipificação do título executivo.”.15
12 XXXXXXXX XXXX, Xxxxx xx. Princípios informativos da execução civil. In XXXXXX XXXXX, Xxxx Xxxxxx xx et. all (Coord). Execução civil e temas afins: do CPC/1973 ao novo CPC – estudos em homenagem ao Professor Xxxxxx xx Xxxxx. São Paulo: RT, 0000.
13 CPC de 1973. Art. 583. Toda execução tem por base título executivo judicial ou extrajudicial.
14 XXXXX, Xxxxxx de. Manual da execução. 14ª ed.. São Paulo: RT, 0000. p. 111.
15 XXXXXX, Xxxx Xxxxxx Xxxxxx. Execução civil – Princípios fundamentais. São Paulo: RT, 0000. p. 79-81.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
No mesmo diapasão a lição de Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxx Xxxx, transcrita e elogiada por Xxxxxx xx Xxxxx,16 para quem:
“a execução da decisão antecipatória de tutela não é execução sem título permitida. Acreditamos que a decisão antecipatória de tutela, apesar de não estar relacionada como título executivo judicial, principalmente por seu conteúdo, cumpre o princípio de que não há execução sem título. Até porque a satisfação definitiva pode vir a ocorrer como consequência da confirmação desta decisão.”.17
Destarte, portanto, pelo princípio do título, para promover atividade executiva há sempre ne- cessidade de um título executivo, compreendido como um “instrumento necessário para a propositura e desenvolvimento válido da execução...”,18 seja ele taxativamente previsto pela lei (como título judicial ou extrajudicial) ou implicitamente reconhecido pelo sistema, isso para que uma decisão judicial possa produ- zir os efeitos práticos que dela se esperam. Com essa nova roupagem não há como negar vigência a ideia de que não há atividade executiva sem título executivo, sendo ainda correto afirmar que nulla executio sine titulo. O que mudou foi o perfil do título executivo e não a necessidade da sua existência para aparelhar a prática dos atos executivos.
Sendo indispensável a existência de um título executivo, sob o enfoque da sua origem, con- forme já dissemos,19 tais documentos se classificam como títulos executivos judiciais, títulos executivos extrajudiciais e títulos executivos mistos ou híbridos. Em regra, mas nem sempre, os títulos extrajudiciais são os produzidos pelas partes sem a intervenção direta do magistrado na sua constituição, enquanto os títulos judiciais dependem da intervenção direta do magistrado para que possam adquirir eficácia executi- va. Já os títulos mistos são aqueles que dependem tanto da intervenção judicial, quanto da intervenção das partes.20 É o que se dá, por exemplo, com a sentença que concede a imissão na posse de um imóvel, mas não sem que antes se dê a comprovação da indenização de uma determinada benfeitoria. Dentre outras re- gras esparsas, os títulos executivos judiciais estão agrupados no art. 515, do CPC, sucessor do art. 475-N, do CPC de 1973; e, os títulos executivos extrajudiciais então previstos no art. 784, do CPC, sucessor do art. 585, do CPC de 1973.
Os títulos executivos judiciais gozam de eficácia executiva (aptidão para produzir efeito execu- tivo), o que permite a prática de atos de sub-rogação ou de atos de coerção aptos a fazer cumprir o que está determinado no próprio título. São, por excelência, documentos que carregam a certeza jurídica de uma decisão judicial já transitada ou com potencial para transitar em julgado. Existem documentos, entretanto, que embora não apresentem essa “certeza” do título executivo judicial, apresentam um forte grau de pro- babilidade de que o seu conteúdo seja verdadeiro. A esses documentos a legislação de cada um dos povos ou de períodos diversos de um mesmo povo, umas mais, outras menos, costumam atribuir eficácia execu-
16 ASSIS, p. 111.
17 XXXX, Xxxxx Xxxxxxx xx Xxxxxxxxxx. As modificações no conceito de sentença à luz dos princípios do sincretismo e da nulla executio sine título – Alterações em face da Lei 11.232/2005. In Execução civil – Estudos em homenagem ao Professor Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx. Coord.: XXXXXX, Xxxxxx Xxxxxxx, XXXXXXX, Xxxx Xxxxxxxxx, XXXX XXXXXX, Xxxxxx, XXX- XXXX, Xxxxxx Xxxxxx Xxxxx. São Paulo: RT, 0000. p. 203.
18 XXXXXXXX XXXX, Xxxxx xx. A defesa do executado e dos terceiros na execução forçada. São Paulo: RT, 0000. p. 25.
19 XXXXXXXX XXXX, Xxxxx..., Vol. III, p. 99-.
20 XXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxx. Título executivo e liquidação. São Paulo: RT, 0000. p. 69. “São os títulos mistos, aqueles em que a norma jurídica individualizada tem seus elementos integrativos representados por documentação em parte de origem extrajudicial e em parte já com certificado judicial. São exemplos dessa terceira espécie os títulos que embasam a execução de obrigação sujeita a condição ou termo (CPC, art.572), que são compostos (a) por uma sentença a respeito da relação obriga- cional e (b) por prova (de origem extrajudicial) da ocorrência do termo ou da condição.”.
tiva como se títulos judiciais fossem, ao menos para permitir que eles dispensem uma ação de acertamento anterior a prática de atos executivos. Em outros termos, esses documentos recebem da lei uma eficácia que dispensa um processo de acertamento anterior, abrindo-se desde logo a porta da via executiva. A atribuição de eficácia executiva a um determinado documento, portanto, representa uma opção do legislador. Se lhe parece que o documento apresenta um grau de “certeza” suficiente, então a lei processual lhe atribui eficá- cia executiva,21 caso contrário, servirá apenas como prova documental numa ação de acertamento ou como um documento apto a dar ensejo à via monitória.
Diante do exposto afirma a doutrina que quanto aos títulos executivos extrajudiciais vale o princípio da tipicidade ou da reserva legal,22 isto é, cabe exclusivamente a lei à tarefa de disciplinar quais são os documentos que, além dos títulos judiciais, gozam dessa eficácia executiva. Sobre o tema já tivemos a oportunidade de sustentar que:
“..., não nos deve escapar que os títulos executivos seguem o princípio da taxatividade, não existin- do títulos diversos daqueles que estão previstos em lei. A atribuição da eficácia executiva, portanto, segue razões de política legislativa, variando conforme os valores que cada sociedade estabelece como prioritários. Assim sendo, são títulos que têm eficácia executiva, no nosso sistema legal, os títulos expressamente indicados pelo art. 585 do CPC e aqueles que a legislação esparsa atribui tal qualidade, conforme indica o último inciso do mesmo preceito. Exemplo recente desta sistemática nos foi ofertado pela reforma que se procedeu em nosso estatuto processual, com a atribuição de eficácia executiva à debênture, que antes da vigência da Lei n.º 8.953, de 13.12.1994, era título de crédito que não podia embasar execução, tendo a finalidade específica de servir apenas como meio de prova de crédito.”.23
As escrituras de compra e venda dos imóveis cuja desapropriação indireta deu ensejo à in- denização, com certeza não podem ser classificadas como um título executivo judicial, pois não houve intervenção judicial na sua formação; mas podem ser classificadas como um título executivo extrajudicial, tipificado pelo art. 784, II, do CPC, que elenca “a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor”, cujo principal exemplo é a escritura de confissão de dívida, lavradas normalmente quando credor e devedor pretendem repactuar um negócio que não será adimplido na forma convencionada, pro- cedendo-se perante o tabelião uma novação da dívida existente.
Nada obstante, as escrituras de compra e venda de imóveis, quando dispõe apenas sobre esse negócio jurídico, tem a sua eficácia executiva limitada a transmissão da posse do bem do alienante para o adquirente. Tanto é assim que existe um procedimento executivo autônomo específico para a hipótese, a “execução para entrega de coisa certa” (art. 806 até 810, do CPC), que no caso de imóveis se dá mediante a imissão na posse do bem (art. 806, §2º, do CPC), embora seja mais comum que o exequente se utilize da ação de conhecimento, com eficácia executiva lato sensu, denominada imissão na posse.
De qualquer forma, a eficácia executiva dessa espécie de título se resume a efetivar o negócio
jurídico compra e venda, que se dá mediante a imissão na posse do bem. Quando as partes querem que dele
21 SHIMURA, p. 260-261. “De efeito, ao direito material – Código Civil, Código Comercial e leis extravagantes respectivas
-, cabe criar e regular os títulos quanto à sua constituição, formalidades intrínsecas, direitos e obrigações que decorrem para as partes. Ao direito processual compete indicar sua eficácia, mediante ação e procedimento próprios.”.
22 XXXXXXXXX, Xxxxxxx Xxxxxx. Manual da execução civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 130. “Em relação aos títulos extrajudiciais vige o princípio da tipicidade, que deve ser rigorosamente considerado pelo operador do direito. Tipicidade ou ‘reserva legal’ não significa que ali, no art. 585 do CPC, estejam ‘todos’ os títulos executivos extrajudiciais e, menos ainda, que tais títulos não possam ser criados por legislação federal extravagante. A tipicidade significa dizer que não há título executivo sem prévia lei que o defina como tal.”.
23 XXXXXXXX XXXX. A defesa..., p. 30.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
se extraia uma eficácia executiva própria para o recebimento de valores devem fazer constar expressamente no instrumento tal circunstância, o que normalmente se vê quando na escritura existe a referência à emissão de promissórias pro soluto ou pro solvendo. Afinal, se a escritura por si só fosse suficiente para produzir tal eficácia executiva, então qual seria a razão de existir dessas promissórias pro soluto ou pro solvendo?
Daí as razões pelas quais é possível afirmar que os adquirentes do imóvel não possuem título, judicial ou extrajudicial, que produza eficácia executiva apta a permitir sua admissão como exequentes na execução contra a fazenda que ora se analisa. Por isso teriam que propor uma ação de conhecimento com a finalidade de formar um título executivo, para só então, obtendo sucesso em sua pretensão, promover a penhora do precatório judicial.
2.4 PERGUNTA-SE: HÁ LIMITES OBJETIVOS PARA A HABILITAÇÃO DO SUCESSOR
PROCESSUAL? QUAIS SÃO ELES NO CASO EM EXAME?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é positiva. Houvesse a possibilidade de su- cessão direta na execução, o que já vimos não ser possível, teria ela como limites objetivos o montante dispendido pelos sucessores na aquisição da área, no caso concreto inferior ao valor da indenização, dele devendo ainda ser excluídos os juros compensatórios acumulados antes das alienações efetivadas, já que a indenização pelo uso somente poderá ser atribuída a quem tem o direito de uso, que antes da alienação não poderia ser exercitado pelos sucessores e ad- quirentes da área.
AB e sua mulher EAS fundaram a sua pretensão na afirmação de que adquiriram o imóvel objeto da desapropriação indireta dos exequentes, razão pela qual se sub-rogaram no direito a receber o valor da indenização. Por isso, fundados no art. 100, §13º, da Constituição Federal, pleitearam e tiveram atendido, em primeiro grau, o seu pedido de sub-rogação em percentual superior a 90% (noventa por cento) do valor do precatório judicial.
Embora seja questionável a natureza jurídica do negócio descrito (o que não vem ao caso dis- cutir no momento), uma vez que não houve um contrato próprio de sub-rogação ou de cessão de crédito, com o recebimento de pagamento e a expressa transferência de direitos, mas apenas uma sub-rogação por derivação da compra e venda de um imóvel, tais institutos não possuem o atributo da multiplicação das vantagens obtidas num negócio jurídico, havendo limitações objetivas, ou seja, no que toca a extensão dos direitos transmitidos.
Fundada a pretensão dos adquirentes no art. 347, I, do Código Civil, que apresenta uma das hipóteses de sub-rogação convencional, equiparável à cessão de crédito por força do disposto no art. 348, não podem os adquirentes, diante da proibição constante do art. 350, receber direitos ou ações em montante patrimonial que exceda o valor do desembolso.
Observa-se, por primeiro, que embora o art. 350, do Código Civil, tenha início com a especificação
da sub-rogação legal, de há muito já se sustenta, com toda a razão, que o seu conteúdo se aplica também à sub-
-rogação convencional. Nesse sentido a escorreita lição do clássico X.X. xx Xxxxxxxx Xxxxxx no sentido de que:
“Não nos parece possível que a sub-rogação convencional possa, em hipótese alguma, produzir
efeitos mais extensos do que a legal, nem que a lei possa ser interpretada ao pé da letra, pois impor-
xxxxx em admitir a desfiguração do instituto da sub-rogação, que exclui qualquer idéia de especula- ção, para se ater ao pagamento, do qual é uma consequência imediata, dentro dos limites do valor respectivo. Em apoio ao nosso ponto de vista está o art. 990, seguinte, [atual art. 351] que concede preferência ao credor originário se os bens do devedor não chegarem a saldar integralmente o que a êle e ao sub-rogado ficar a dever o devedor. De fato, o que o art. 990 revela é que, continuando o credor originário a ter direitos creditórios, a sub-rogação feita produziu efeitos apenas até a soma que tiver desembolsado pelo sub-rogado, porque, de outra forma, não teria cabimento a preferência, justamente porque o credor originário não teria mais direito algum, transferidos ao sub-rogado que foram todos eles, com referência ao total do débito. O sub-rogado não poderá exercer os direitos e as ações do devedor, senão até a soma, que tiver desembolsado para desobrigar o devedor.”.24
A clareza e precisão de interpretação das regras legais, agora constantes dos art. 350 e 351, do Código Civil, ficam ainda mais evidentes quando se constata, como acima fizemos, que no caso em estudo o valor pago pela aquisição de toda a propriedade, com área superior a 500 (quinhentos) hectares, é menor do que o valor da indenização pela desapropriação indireta da área de 89.760 m2, inferior a 09 (nove) hectares (Proc. 000000 - fls. 08).
Nesse passo, o primeiro dos parâmetros que deve ser levado em consideração para delimitar os limites objetivos da atuação dos adquirentes é o valor pago pela área, ou seja, a suposta “sub-rogação” no direito ao recebimento do precatório não pode exceder o valor dispendido na compra e venda.
Mas não é só. Assim como os alienantes da área nada teriam a receber, a título de juros mora- tórios, antes do trânsito em julgado, simplesmente porque alienaram o imóvel antes desse momento pro- cessual, os adquirentes nada têm a receber a título de juros compensatórios antes da aquisição do imóvel, pois o V. Acórdão que definiu os limites do título (Proc. 000000 - fls. 25), mantido em sede de embargos infringentes, foi expresso em seus argumentos no sentido de ter entendido que “os juros compensatórios, é sabido, destinam-se a compensar o proprietário pela perda do uso do bem expropriado até que seja devida e equanimemente indenizado. Têm como termo “a quo”, na chamada desapropriação indireta, a ocupação perpetrada pelo desapropriante, a qual, sendo indeterminada na espécie dos autos, deve ser tida – conforme delimitou o “decisum” – como a implantação da rodovia sub-trecho Cidade01/Cidade02 em maio de 1969 (f. 206).”.
Daí, estando definido na decisão transitada em julgado que os juros compensatórios se prestam a indenizar a perda do uso da área (art. 1.412, do Código Civil), e, se os adquirentes passaram ter direito ao uso apenas a partir da aquisição do imóvel; então nada tem a receber antes da aquisição porque não podiam exercitar o direito que a gerou. Pagar o montante dos juros compensatórios acumulados antes da aquisição das áreas diretamente aos adquirentes, em última análise, consistiria em deixar os exequentes sem a Justa Indenização que prevê a Constituição Federal, ofendendo a coisa julgada.
Portanto, em conclusão, houvesse a possibilidade de sucessão direta na execução, o que já vi- mos não ser possível, teria ela como limites objetivos o montante dispendido pelos sucessores na aquisição da área, no caso concreto inferior ao valor da indenização, dele devendo ser excluídos os juros compen- satórios acumulados antes das alienações efetivadas, já que a indenização pelo uso somente poderá ser atribuída a quem tem o direito de uso, que antes da alienação não poderia ser exercitado pelos sucessores e adquirentes da área.
24 XXXXXXXX XXXXXX, X.X. xx. Código civil brasileiro interpretado. 7ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Xxxxxxx Xxxxxx, 1955. Volume XIII, p. 106-107.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
2.5 PERGUNTA-SE: HÁ OUTRAS CONSIDERAÇÕES DE IMPORTÂNCIA PERTINENTES AO
CASO CONCRETO?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é positiva. A inação dos adquirentes fez com que a sua pretensão fosse fulminada pela prescrição intercorrente, não podendo mais se habili- tar ao recebimento dos valores objeto do precatório judicial. Ocorre que, alienado o Lote Parte A em 23.07.1999 e o Lote Parte B em 15.02.2000, o pedido de sub-rogação dos adquirentes somente poderia ter sido formulado, na melhor das hipóteses, até 15.02.2005, mas foi proposto apenas aos 30.09.2010 (fls. 173), tendo transcorrido prazo superior ao prazo de 05 anos previs- to no art. 205, §5º, I, do Código Civil.
Subsidiariamente, mesmo que os requisitos objetivos não estivessem preenchidos, teria ocorri- do a Verwirkung ou Supressio,25 devido à ocorrência de um retardamento desleal do processo, o que carac- teriza o mencionado fenômeno jurídico.
Por qualquer dos motivos a sucessão dos exequentes não pode acontecer, sendo possível ao juízo ad quem reconhecer desde logo tal impossibilidade em grau de recurso, uma vez que prescrição é matéria cuja apreciação pode se dar de ofício, em qualquer grau de jurisdição.
Vimos acima que os exequentes promoveram a divisão amigável da Fazenda Santo Antônio (Proc. 00000 - fls. 258/260), transformando-a em duas áreas (Lote A e Lote B), que posteriormente foram separadamente vendidas para os adquirentes. O Lote Parte A foi alienado aos 23.07.1999 e o Lote Parte B foi alienado aos 15.02.2000. Paralisado o feito a espera do pagamento do valor devido (30.07.2010), o pleito de sub-rogação formulado perante o Preclaro Presidente do Tribunal de Justiça do Estado [...] foi for- mulado em 30.09.2010 (fls. 173) e rejeitado pela R. Decisão Monocrática encartada as fls. 372, do Processo 000000, aos 07.05.2014; sendo renovado perante o Nobre juízo “a quo” aos 03.07.2014 (fls. 160/161).
Realizado o cotejo das datas indicadas verifica-se, desde logo, que o alegado direito dos ad- quirentes a sub-rogação dos valores do precatório há muito já foi fulminado pela prescrição intercorrente.
Mesmo antes da entrada em vigor do atual CPC, a doutrina e a jurisprudência já reconheciam a existência da denominada prescrição intercorrente, ou seja, da prescrição da pretensão executória quando um processo de execução, devido à inação do exequente, fica paralisado por certo tempo. Prova material disso é o teor da Súmula 314, do STJ, publicada no DJ de 08.02.2006, segundo a qual “Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente.”.
Não bastasse, a razão da sua existência é muito bem explicitada por Xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx
ao ensinar que:
“Justifica-se a prescrição intercorrente com o argumento de que a eternização da execução é incom- patível com a garantia constitucional de duração razoável do processo e de observância de tramitação conducente à rápida solução de litígios (CF,art.5°, LXXVIII). Tampouco, se pode admitir que a inércia do exequente, qualquer que seja sua causa, redunde em tornar imprescritível uma obrigação patrimo- nial. O sistema de prescrição, adotado por nosso ordenamento jurídico, é incompatível com pretensões obrigacionais imprescritíveis. Nem mesmo se subordina a prescrição civil a algum tipo de culpa por
25 XXXXXXXXX, Xxxxxxxx. A proibição do comportamento contraditório – Tutela da confiança e venire contra factum proprium. 3ª ed.. Rio de janeiro: Xxxxxxx, 0000. p. 185. “A expressão Verwirkung, também referida pela doutrina dos países latinos como supressio ou caducidade, foi consagrada pela jurisprudência alemã a partir do fim da Primeira Guerra Mundial, para designar a inadmissibilidade de exercício de um direito por seu retardamento desleal.”.
parte do credor na determinação da inércia no exercício da pretensão. A prescrição, salvo os casos legais de suspensão ou interrupção, flui objetivamente, pelo simples decurso do tempo.”.26
Nesse passo o atual CPC merece elogios ao ter positivado a existência da prescrição intercor- rente nos art. 921, §4º, 924, V e 1.056, mas não fica imune a críticas porque o fez de maneira muito tímida, deixando de tratar do instituto em aspectos essenciais, o que ficará a cargo da doutrina e da jurisprudência.
De qualquer forma, se a prescrição intercorrente atinge a pretensão do exequente inerte, que não promove atos executivos aptos a dar um andamento adequado ao procedimento, então não há porque deixar de atingir também a pretensão dos possíveis sucessores do exequente, que deixam de formulá-la no período em que se dá a prescrição intercorrente.
O Código Civil de 1916 não previa um prazo prescricional específico para a cobrança de dí- vidas líquidas ou liquidáveis por mero cálculo aritmético, que atualmente não é mais considerada ilíquida pelo CPC, constantes de instrumento público, o que agora está previsto pelo art. 206, §5º, I, do Código Civil, que estipulou o prazo de prescrição de 05 (cinco) anos. Daí, considerando-se que se aplicava ao caso o prazo geral de 20 (vinte) anos constante do art. 177 do Código revogado, que foi reduzido para os mencionados 05 (cinco) anos, então deve ser considerada a possibilidade da incidência da regra inserta no art. 2.028, do atual Código Civil.
Todavia, além da redução do prazo o artigo exige a presença de um segundo requisito para que o prazo prescricional seja o previsto na lei anterior, que é o transcurso de mais de metade do tempo esta- belecido na lei revogada, o que não se verifica no caso em exame. Quando da entrada em vigor do novo Código ainda não havia transcorrido metade do prazo previsto na lei anterior, ou seja, o prazo de 10 (dez) anos, razão pela qual se aplica ao caso em exame o art. 206, §5º, I, do atual Código Civil.
Destarte, pois, alienado o Lote Parte A em 23.07.1999 e o Lote Parte B em 15.02.2000, o pedido de sub-rogação dos adquirentes somente poderia ter sido formulado, na melhor das hipóteses, até 15.02.2005, mas foi proposto apenas aos 30.09.2010 (fls. 173). Por isso a inação dos adquirentes fez com que a sua pretensão fosse fulminada pela prescrição intercorrente, não podendo se habilitar ao recebimento dos valores objeto do precatório judicial.
Subsidiariamente, mesmo que os requisitos objetivos não estivessem preenchidos, teria ocor- rido a Verwirkung ou Supressio,27 que em tese poderia ser demonstrada na ação de conhecimento que os adquirentes sucessores deveriam ter proposto para obter um título executivo apto a lhes permitir o aceso à via executiva. Afinal, esperar mais de dez anos para se habilitar na execução é indício de um retardamento desleal do processo, o que caracteriza a ocorrência do mencionado fenômeno jurídico.
Em resumo, seja por conta da ocorrência da prescrição intercorrente da pretensão dos adquirentes em se habilitar na execução, seja subsidiariamente por conta da ocorrência da supressio, a sucessão dos exe- quentes não pode acontecer, sendo possível ao juízo ad quem reconhecer tal impossibilidade em grau de re- curso, uma vez que prescrição é matéria cuja apreciação pode se dar de ofício, em qualquer grau de jurisdição.
26 XXXXXXXX XXXXXX, p. 752.
27 XXXXXXXXX, Xxxxxxxx. A proibição do comportamento contraditório – Tutela da confiança e venire contra factum pro- prium. 3ª ed.. Rio de janeiro: Xxxxxxx, 0000. p. 185. “A expressão Verwirkung, também referida pela doutrina dos países latinos como supressio ou caducidade, foi consagrada pela jurisprudência alemã a partir do fim da Primeira Guerra Mundial, para designar a inadmissibilidade de exercício de um direito por seu retardamento desleal.”.
Xxxxx xx Xxxxxxxx Xxxx
3 SUMÁRIO DAS CONCLUSÕES - CONSULTAS E RESPOSTAS.
01. Pergunta-se: É possível a sucessão processual direta, em execução contra a Fazenda Pú- blica, sem a expressa anuência dos sucedidos?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Caracterizado o pedido de sucessão processual inter vivos como um ato processual dispositivo da parte, a falta de anuência expres- sa do sucedido impede que se produzam os efeitos descritos no art. 200, in fine, do CPC, qualquer que seja o procedimento, inclusive na execução contra a fazenda pública.
02. Pergunta-se: Havendo a transmissão de imóvel expropriado é possível presumir, sendo omissa a escritura pública de compra e venda, que os alienantes concordaram com a transmissão do objeto litigioso do feito onde serão indenizados pela expropriação?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Diante das circunstân- cias do caso em estudo não é possível presumir que a transmissão do imóvel expropriado implicou na concordância dos exequentes quanto à transmissão do objeto litigioso do feito onde serão indenizados pela expropriação. Não há presunção legal em razão da ausência de norma que estabeleça a sub-rogação e também não há sub-rogação convencional, uma vez que o art. 347, I, do Código Civil, ao se valer da lo- cução “...expressamente lhe transfere todos os seus direitos...”, exige que a transmissão se faça mediante clausula expressa e destacada, como ocorre com a evicção, que apresenta mecanismo semelhante no art. 448, do Código civil. Ao contrário, se presunção hominis houvesse, essa militaria em favor dos exequentes, já que o valor da indenização supera o valor da aquisição da propriedade de 508,8232 hectares, de terras altamente férteis e bastante bem localizadas, o que faria com que os exequentes pagassem para os adqui- rentes ficar com a propriedade.
03. Pergunta-se: Não sendo possível a sucessão processual direta, sem a expressa anuência dos sucedidos, podem os adquirentes do imóvel onde se deu a desapropriação indireta intervir como partes no processo de indenização?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é negativa. Os adquirentes do imó- vel onde se deu a desapropriação indireta não possuem título executivo, judicial ou extrajudicial, que produza eficácia executiva apta a permitir sua admissão como exequentes na execução contra a fazenda que ora se analisa. Por isso, diante do princípio do título, não podem intervir diretamente na execução já instaurada. Para isso teriam que propor uma ação de conhecimento com a finalidade de formar um título executivo, para só então, obtendo sucesso em sua pretensão, promover a penhora do precatório judicial.
04. Pergunta-se: Há limites objetivos para a habilitação do sucessor processual? Quais são
eles no caso em exame?
Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é positiva. Houvesse a possibilidade de sucessão direta na execução, o que já vimos não ser possível, teria ela como limites objetivos o mon- tante dispendido pelos sucessores na aquisição da área, no caso concreto inferior ao valor da indenização, dele devendo ser excluídos os juros compensatórios acumulados antes das alienações efetivadas, já que a indenização pelo uso somente poderá ser atribuída a quem tem o direito de uso, que antes da alienação não poderia ser exercitado pelos sucessores e adquirentes da área.
Possibilidade de sucessão direta em processo de execução contra a Fazenda Pública, sem a expressa anuência dos sucedidos e sem a existência de título executivo.
05. Pergunta-se: Há outras considerações de importância pertinentes ao caso concreto? Respondo: Conforme abaixo segue explicitado, a resposta é positiva. A inação dos adquiren-
xxx fez com que a sua pretensão fosse fulminada pela prescrição intercorrente, não podendo mais se ha- bilitar ao recebimento dos valores objeto do precatório judicial. Ocorre que, alienado o Lote Parte A em 23.07.1999 e o Lote Parte B em 15.02.2000, o pedido de sub-rogação dos adquirentes somente poderia ter sido formulado, na melhor das hipóteses, até 15.02.2005, mas foi proposto apenas aos 30.09.2010 (fls. 173), tendo transcorrido prazo superior ao prazo de 05 anos previsto no art. 205, §5º, I, do Código Civil.
Subsidiariamente, mesmo que os requisitos objetivos não estivessem preenchidos, teria ocorri- do a Verwirkung ou Supressio,28 devido à ocorrência de um retardamento desleal do processo, o que carac- teriza o mencionado fenômeno jurídico.
Por qualquer dos motivos a sucessão dos exequentes não pode acontecer, sendo possível ao juízo ad quem reconhecer desde logo tal impossibilidade em grau de recurso, uma vez que prescrição é matéria cuja apreciação pode se dar de ofício, em qualquer grau de jurisdição.
Este é o meu parecer.
São Paulo/Campo Grande, XX de XXXX de 201X. XXXXX XX XXXXXXXX XXXX
28 XXXXXXXXX, Xxxxxxxx. A proibição do comportamento contraditório – Tutela da confiança e venire contra factum proprium. 3ª ed.. Rio de janeiro: Xxxxxxx, 0000. p. 185. “A expressão Verwirkung, também referida pela doutrina dos países latinos como supressio ou caducidade, foi consagrada pela jurisprudência alemã a partir do fim da Primeira Guerra Mundial, para designar a inadmissibilidade de exercício de um direito por seu retardamento desleal.”.