THALITA BARBOSA GIRALDI
PUCSP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX
A CLÁUSULA SUCESSÓRIA NOS CONTRATOS DE COHOUSING SÊNIOR
São Paulo 2022
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx
A cláusula sucessória nos contratos de cohousing sênior
Artigo Científico apresentado para aprovação no módulo de Monografia do curso de Pós-graduação Lato-Sensu em Direito Contratual, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP).
Professora Orientadora: M.e. Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx.
São Paulo 2022
A CLÁUSULA SUCESSÓRIA NOS CONTRATOS DE COHOUSING SÊNIOR
Xxxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxx0
Resumo: O trabalho permitirá o diálogo entre o direito contratual, direito sucessório e direito de propriedade, demonstrando a análise da possibilidade ou não de inserção de cláusulas sucessórias em contratos de cohousing que estabelecem limitação mínima de idade para a participação do morador.
Será demonstrado o contexto histórico do surgimento desse tipo de moradia, como está se desenvolvendo no Brasil e, ao final, será verificado se as cláusulas sucessórias podem impor limitação ao direito dos herdeiros para ingresso nesse tipo de moradia que lhe fora herdado e como pode ser resolvido esse tipo de problema, caso o herdeiro não preencha os requisitos necessários.
Palavras-chave: cohousing – sênior – herança – contrato – cláusula – uso
Abstract: The work will allow the dialogue between contract law, succession law and property law, demonstrating the analysis of the possibility or not of inserting succession clauses in cohousing contracts that establish minimum age limitation for the resident's participation.
The historical context of the emergence of this type of housing will be demonstrated, as well as how it is developing in Brazil and, at the end, it will be verified if the succession clauses can impose a limitation on the right of the heirs to enter this type of housing that was inherited and how this type of problem can be solved if the heir does not meet the necessary requirements.
Keywords: cohousing - senior - inheritance - contract - clause – use
1 INTRODUÇÃO
O contrato de cohousing aborda uma modalidade de moradia que visa um estilo de convívio para fortalecer a proximidade com o outro, a vida conjunta, a divisão de trabalho e a sustentabilidade.
Geralmente é composto por unidades imobiliárias autônomas que se agrupam em um espaço em comum de propriedade de todos os moradores. Também é possível que o cohousing se caracterize pela moradia de várias pessoas em uma mesma unidade, mas com os seus espaços particulares delimitados, como os quartos, por exemplo. No Brasil, popularmente conhecido pelas “repúblicas”, muito embora elas se encaixam na modalidade coliving.
1 Advogada, graduada em Direito pela Universidade São Judas e pós-graduanda em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Os moradores se juntam em prol de uma causa em comum como, por exemplo, idosos que tem um perfil mais sociável e pretendem conviver em grupo e dividir as atividades.
Como a prática ainda não é regulamentada pela legislação brasileira, todas as regras de convivência são regidas por via de contrato, como no tocante às regras sanitárias, de convívio, de divisão de tarefas e de gastos com as áreas em comum.
Difere-se do condomínio residencial e passa a se assemelhar a uma espécie de condomínio especial, sendo formalizado por via de um contrato.
Como o cohousing tem por objetivo a junção de pessoas por um propósito em comum, no caso de idosos, por exemplo, o contrato deve estabelecer que todos os ocupantes sejam maiores de determinada idade.
Neste mesmo contrato, portanto, deve haver cláusula que determina quais serão as regras cabíveis em caso de morte de um dos moradores. Mas e se um dos herdeiros não possuir o requisito básico para ingresso nesse cohousing, nesse caso, a idade mínima?
O objetivo do trabalho, portanto, é a análise das cláusulas sucessórias que impõem limitação ao direito de ingresso dos herdeiros através de estipulações que devem ser cumpridas por eles. Mesmo que herança seja uma mera expectativa de direito, ainda assim talvez a expectativa do herdeiro de adquirir a parte do imóvel ou a sua posse possa ser frustrada.
De forma geral, anseia-se que seja demonstrado de forma clara o que é necessário para desenvolvimento de cláusulas sobre a transmissão da cota parte do morador por via da herança nesse tipo de contrato. Para tanto, necessário questionar como os diplomas legais existentes no Brasil atualmente conseguem regular o tema, isto porque o assunto envolve três grandes bases jurídicas: o direito contratual e a livre vontade de dispor, o direito sucessório e o suposto direito patrimonial do herdeiro.
O objetivo é verificar quais são os tipos de contratos de cohousing existentes, como os moradores se organizam para estabelecer regras ao uso da propriedade e quais problemas enfrentam quando se deparam com a morte de um morador e transmissão para seus herdeiros, para que não se perca o objetivo do contrato do cohousing.
Se verificará, também, sobre a possibilidade ou não de inserção de cláusulas limitadoras ao direito de herdeiros receberem a cota parte do de cujus ou de possuírem direito sobre o cohousing de seu antecessor, mesmo não preenchendo os requisitos mínimos para ingresso nesse tipo de moradia.
O trabalho, a princípio, se baseará na limitação do herdeiro pelo quesito idade, mas demonstrará, também, outras formas limitadoras ao direito de propriedade dos herdeiros.
Por fim, necessário o estudo sobre a expectativa de direito do herdeiro e como a inserção dessas cláusulas afetam ou não o direito que tal indivíduo possa ter.
2 BREVE HISTÓRICO DO SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO
COHOUSING SÊNIOR
O cohousing, de acordo com Xxxxxxxx (2005, p. 195-227), é a divisão de áreas sociais comuns para melhor interação e divisão de despesas, mas que as pessoas ainda possuam sua privacidade e um ambiente colaborativo para morar.
O termo cohousing surge do inglês (collaborative house) e significa buscar uma melhora na qualidade de vida através da residência colaborativa e intencional. Basicamente, pessoas buscam viver em um modelo residencial formado por unidades privativas e áreas em comum em um mesmo ambiente físico para desfrutar de apoio mútuo, solidariedade e independência, através de um projeto intencional de vizinhança. Nesse modelo de moradia, existem instalações comuns para todos, bem como o seu gerenciamento pelos próprios moradores através de uma estrutura não hierárquica, ou seja, as decisões são tomadas por todos.
Essa forma de arquitetura social surge na Dinamarca, no ano de 1964, quando o arquiteto Xxx Xxxxxxx-Xxxxx começa a repensar nas opções atuais de moradia e acaba escrevendo o artigo “The Missing Link between Utopia and the Dated One-Family House”, descrevendo suas ideias e projeto. Mas somente no final de 1973 foi concluída a primeira construção.
Esse modelo de moradia vem com inspiração em outras formas alternativas de sociedade, como ecovilas, kibbutz, moshav, aldeias-lar, e surge, inicialmente, na Europa. A princípio, tratava-se de grupo de pessoas de classe média que buscavam viver juntos na região central das cidades, buscando melhorar as condições de vida (TUMMERS, 2016, p. 2023-2040) e passou a se mostrar extremamente benéfico para pessoas da terceira idade, podendo reduzir os níveis de solidão.
Basicamente, o cohousing a princípio se estrutura em duas grandes fases, de acordo com Xxxxxx (2019, p. 1349-1371): a primeira descrita como “uma nova consciência crítica das circunstâncias culturais, sociais e políticas”; e a segunda fase, a partir dos anos 80, quando cooperativas de novas moradias com apoio estatal começam a surgir, favorecendo o cohousing. Xxxxxxxx (2005, 195-227) ainda divide a primeira e segunda fase em regiões, esta surgindo na Europa Nórdica com comunidades mistas (casas alugadas e particulares) e aquela na América do Norte, sendo a maioria formada por casas privadas.
Existem diversas neologias para se identificar esse estilo social: “kollektivhus” na Suécia, “bofællesskab” na Dinamarca, “hausprojekt” na Alemanha, “habitat participativ” na França, e, as autoras Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx y Xxx Xxxxxxxxx Xxxxxx denominam o cohousing como “viviendas colaborativas”, tendo por certo que o termo que atualmente está se tornando universal é o cohousing.
Como o projeto não visa o lucro, os moradores administram o cohousing de maneira independente e sempre visando o processo participativo para a vida em comunidade.
Hoje em dia as co-habitações fazem parte dos planos diretores na Dinamarca, havendo uma expansão para outros países, como Espanha e Estados Unidos, que utilizam do modelo.
Tendo em vista que o cohousing é um modelo de moradia intencional, onde as pessoas se reúnem visando a semelhanças nos objetivos, surge então a terceira fase a partir da década de 90 que cria, então, o cohousing sênior, onde o intuito é de pessoas idosas conviverem em comunidade buscando a qualidade de vida, inclusão social, autonomia e independência.
Segundo Xxxxxxx Xxxxxxx (XXXXXXXX e XXXXXX, p. 198), arquiteto e autor de mais de 60 projetos de comunidades multigeracionais e sênior nos Estados Unidos e Canadá, o cohousing sênior é a alternativa mais saudável para idosos, pois elimina a ideia de que as pessoas acabam solitárias e isoladas em suas próprias casas ou de parentes.
Nesse tipo de cohousing, o sênior, objeto do trabalho, é estabelecido uma idade mínima para ingresso dos participantes, bem como também pode ser estabelecida uma idade máxima, pois o intuito do cohousing é a vida em participação comunitária. No caso de determinados idosos com limitações ou idade muito avançada, o cohousing sênior não é a saída mais viável, por não conseguirem colaborar com as tarefas da comunidade.
Justamente por essa razão, Xxxxx Xxxxxxxx Xxxxxx y Xxx Xxxxxxxxx Xxxxxx (2016,
p. 28) definem algumas motivações para pessoas idosas residirem em cohousing, como por exemplo: manter uma vida ativa em companhia com os demais, ajuda mútua para as necessidades cotidianas (compras, visitas, etc), encontrar um espaço adaptado para as próprias necessidades, coletivizar serviços, etc.
Esse modelo de cohousing sênior passou a existir depois de adaptações realizadas no cohousing tradicional multigeracional, onde indivíduos se juntam com o objetivo de conviver comunitariamente, mas não há a restrição em razão da idade, podendo se estender à jovens, solteiros e hippies, por exemplo, se mostrando muito benéfico até para casais que possuem filhos menores de idade, pois contam com a ajuda comunitária para criação e desenvolvimento das crianças. Embora seja um modelo mais recente, nota-se que atualmente os cohousing sêniors têm crescido substancialmente. A experiência surge na Holanda e logo ganhou força em outros países da Europa, passando a ser adotado pelos Estados Unidos em 2005. Em 2015 havia na Dinamarca mais de 250 cohousing sênior.
Esse tipo de expansão ocorreu porque esse modelo de moradia começou a receber incentivo direto do Estado na Dinamarca, depois que pesquisas governamentais e privadas demonstraram os diversos benefícios para os idosos, que passaram a viver em média 8 anos a mais que a média da população e davam menos despesas aos sistemas de saúde, tendo em vista a melhora na qualidade de vida.
Curiosamente, em 2019 foi aprovada a Lei 69 (“Bill 69”) em Otário, Canadá, chamada de “Golden Girls Act”. Trata-se do caso de quatro mulheres idosas solteiras que se mudaram para uma casa que atendia às suas necessidades à medida que envelhecessem, construindo cômodos mais acessíveis e estabelecendo regras de convivência.
Neste município em questão há escassez de oferta de opção de habitações acessíveis, longas filas de espera para asilos e uma população cada vez mais envelhecida.
Eis que essas mulheres encontraram a solução de residirem juntas. Embora tenham enfrentado problemas com a legislação antiga, a nova mudança legal facilitou a compra da propriedade por cohousing para indivíduos “não relacionados” (àqueles que não são da mesma família), possibilitando que elas adquirissem o imóvel e que cada uma tenha a fração de 25% da propriedade, não podendo mais as autoridades competentes não aprovarem o estatuto tendo por critério que a ocupação se destine a idosos não relacionados.
2.1 Cohousing sênior no Brasil
Como citado, esse modelo de moradia já tem sido explorado em diversos países Europeus, bem como nos Estados Unidos e Canadá, por exemplo. No Brasil, a arquiteta Xxxxxx Xxxxxxxxxxx é a principal impulsionadora da tendência, atuando ativamente em diversos grupos e disseminando a ideia.
Da mesma forma, o ex-professor de engenharia de alimentos da Unicamp, Xxxxx xx Xxxxx Xxxxxxxx, passou a se aprofundar no tema com outros colegas da instituição, que acabaram por iniciar o projeto da Vila Conviver, no ano de 2013, por iniciativa da GTMoradia/ADunicamp.
Outra iniciativa de cohousing é o da ViverXXI, que prevê se instalar na Granja Viana, em São Paulo, capital, ocupando um lote de 8 mil m². Quem está à frente do projeto é a psicóloga Xxxxxx Xxxxxxx.
Existe o site “Cohousing em rede” (xxxxx://xxx.xxxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx/xx) que demonstra algumas comunidades em formação no Brasil, mas atualmente, o projeto mais avançado é o da Vila Conviver, que está em elaboração do projeto arquitetônico para ser submetido à Prefeitura local.
Em atividade paralela à ideia, a construtora Cyrela entregou o primeiro sênior residence em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Trata-se de obra que visa atender às necessidades do público +60 (anos), possuindo área privativa e também atividades voltadas ao público, como fisioterapia, nutricionista, meditação, consulta médica e até mesmo serviço hospitalar.
Também já existem no Brasil algumas outras ideias que se assemelham ao cohousing para auxiliar os idosos. É o caso, por exemplo, do Hotel Paço das Palmeiras, localizado no bairro Capim Macio na cidade de Natal. A ideia do hotel é oferecer um espaço exclusivo para idosos para atender às necessidades deles. Possui infraestrutura direcionada para a terceira idade, salas de convivência, biblioteca com computadores, sala para multiterapias, jardins e varandas, proporcionando experiência e bem estar para idosos que queiram passar uma temporada, alguns dias ou viver definitivamente.
Em São Paulo, a Prefeitura oferece a Instituição de Longa Permanência para Idoso (ILPI), que visa o desenvolvimento do idoso para a interação social com pessoas da comunidade. Trata-se de estrutura física adequada para pessoas de 60 anos ou mais, de ambos os sexos, que não dispõe de condições de permanecer nos seus núcleos familiares, seja por situação financeira fragilizada, por negligência, abusos ou maus tratos. Nesse caso, o intuito é a inclusão desses idosos e cuidado, não sendo necessário ter como
requisito a participação ativa do indivíduo, assim como se exige no cohousing para a vivência em comunidade. No caso do ILPI, o importante é a inclusão e melhora das condições de vida desse sênior, podendo participar, inclusive, aqueles com deficiência, evitando práticas segregacionistas.
O fato é que a ideia de possuir um cohousing sênior em território brasileiro com os mesmos moldes de co-habitações típicas de lugares com o formato já implementado, ainda está na fase embrionária.
Isto porque, para nascer um cohousing, é necessário que se possua: grupo de pessoas interessadas, empreendimento e, às vezes, iniciativa pública. As incorporadoras brasileiras devem se adaptar a esse tipo de moradia definindo características do empreendimento a partir de uma análise fundamentada das particularidades e intenções dos moradores, uma vez que é um modelo de moradia bem diferente do tradicional.
Entretanto, já há movimentações interessantes ocorrendo no Brasil para disseminação da ideia. O Sindicato das Empresas de Compra, Venda e Administração de Imóveis de São Paulo (SECOVI-SP), por exemplo, já possui curso de planejamento e implantação de cohousing, voltado especialmente para arquitetos, urbanistas e engenheiros, com o objetivo de compartilhar os fundamentos da ideia, de forma a capacitar os participantes a planejarem e desenvolverem esses grupos de comunidades.
Se formos analisar juridicamente, se percebe que a ideia se assemelha a legislação de condomínio, em que o Código Civil Brasileiro (CC) (BRASIL, 2002), no seu artigo 1.331, 1.358-A, 1.358-C, afirma que pode existir tanto em edificações, quanto em loteamento, quanto em multipropriedade, mas sempre com a figura do administrador (síndico), que pode ou não ser condômino, sempre se organizando através da convenção de condomínio e atas de assembleia.
Ocorre que, encaixar o cohousing na legislação condominial faria com que a ideia principal fosse perdida, pois no condomínio há a figura do síndico e no cohousing não; bem como a ideia do condomínio é conviver isoladamente em um ambiente em comum, já no cohousing visa-se o oposto: viver em comunidade e em colaboração.
Além disso, a ideia do cohousing é possuir um grupo de pessoas com os mesmos ideais em comum. Criá-lo em semelhança ao condomínio daria a possibilidade dos moradores alienarem seus imóveis, entrando no cohousing pessoas que não possuem o mesmo objetivo, fazendo com que o grupo se extinga.
Ainda é necessário o desenvolvimento da legislação em paralelo com a ideia central, bem como o surgimento de unidades de cohousing em território brasileiro para se ter mais base de como estão se desenvolvendo. O que pode se sugerir para regulação desse sistema, a princípio, é o estabelecimento do cohousing através do contrato.
A legislação brasileira estabelece que é lícito às partes estipularem contratos atípicos (art. 425 do CC), sempre prevalecendo a boa-fé, probidade e princípio da intervenção mínima nas relações contratuais privadas (art. 421, parágrafo único e 422 do CC).
Sendo assim, é plenamente possível os moradores estabeleceram a forma de convivência, desenvolvimento e estrutura através de um contrato. A questão maior, objeto desse artigo, é com relação a cláusula sucessória, que será apresentada posteriormente.
3 ELEMENTOS DO CONTRATO DE COHOUSING
XxXxxxxxx y Xxxxxx (1988, p. 16) inventaram a nomenclatura cohousing e definem como características essenciais desse modelo: equipamentos comunitários, casas e economias individuais, autogestão pelos próprios residentes, equidade (sem estrutura hierárquica), processo participativo e comunidade intencional.
Primeiramente, para se ter credibilidade frente ao Estado, bem como direitos, investimentos e acordos, segundo Xxxxxxxxxxx e Xxxxxxxxxxx (2005, p. 168-172), é necessário que os moradores, com o intuito de constituição da cohousing, definam o tipo de organização que será adotada. A seguir algumas delas:
a) Associação: Associações de pessoas com um propósito em comum. Normalmente é a forma mais segura de começar um cohousing.
b) Propriedade privada: Geralmente é a forma menos sustentável de cohousing. A unidade privada é negociada pelo preço do mercado.
c) Parceria público-privada: Associações dependentes dos Estados locais, direta e indiretamente, cooperando com empresas públicas ou privadas.
d) Cooperativa: Sublocam casas ou apartamentos através de um contrato de aluguel com os grupos de cohousing. O interessado “compra” a sua cota de ação para participar desse modelo.
É claro que essas são as formas tradicionais de como a cohousing pode se constituir, entretanto, com o avanço do crescimento desse tipo de moradia, vão surgindo novas formas que envolvam outros tipos de posse e propriedade, como por exemplo, a participação a partir de cotas de ações e as PPPs, que são firmadas entre os municípios.
Após essa definição é que se saberá qual o modelo de contrato será adotado pelo
cohousing e quais os elementos específicos serão necessários.
Entretanto, sabe-se que para a existência de uma vida em comunidade é necessário o estabelecimento da forma de gestão. No caso de cohousing sênior, sugere-se que o contrato possua alguns elementos que possam ser considerados gerais, independente da forma organizacional que será adotada. Abaixo alguns itens que podem servir de estímulo:
a) Os objetivos do cohousing: Xxxxxxxxxx descrever a localização, princípios, missão da comunidade, forma de admissão dos moradores, quem pode participar, estrutura adotada pela cohousing (propriedade privada, parceria público-privada etc).
b) Idade mínima e forma de participação: Cláusulas que estabeleçam quem pode ingressar nesse modelo de cohousing, quais os direitos e deveres do interessado após o ingresso, admissão e desligamento e/ou exclusão do associado, bem como se na estrutura
escolhida para formação do cohousing, será necessário o desembolso monetário dos moradores para ingresso.
c) Gerenciamento das áreas comuns e áreas privadas: Formas de organização, direitos e deveres dos moradores, como a rotina será implementada, quais os itens e estruturas que serão oferecidos aos moradores para a vida em comunidade, quais as disposições que as áreas privadas oferecem, regras e proibições para poderem conviver harmoniosamente.
d) Dissolução da cohousing: Por quais motivos pode haver a dissolução, como ocorre, formas de liquidação, e forma de distribuição do patrimônio remanescente.
3.1 A cláusula sucessória no contrato de xxxxxxxxx e o direito do herdeiro
O direito sucessório se encontra respaldado a partir do artigo 1.784 do Código Civil, e, nas palavras de Xxxxxx Xxxxxxx Xxxxxxxxx, a sucessão é “o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar da outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens” (XXXXXXXXX, 2019, p.13), sendo que encontramos nos incisos do artigo 1.829 a ordem de sucessão legítima que determina qual herdeiro tem preferência no bem deixado.
Tendo em vista a fase incipiente da implantação do cohousing sênior no Brasil e que ainda não há legislação específica (muito embora se aplique o direito condominial de forma análoga), verifica-se que os grupos costumam se organizar por via de contrato, inclusive no tocante à sucessão da fração do idoso sobre aquele lote.
É comum verificar em algumas espécies de contrato a cláusula que obriga o estipulante e os seus herdeiros e sucessores. Mas e a cláusula que dispõe sobre a possibilidade dos herdeiros adquirirem um direito, tal como a herança da cota parte do cohousing?
No caso da Vila Conviver, o grupo se originou através da criação de uma associação, possuindo o estatuto que estabelece todas as regras quanto ao cohousing. O estatuto analisado atualmente está servindo como base para a criação dos demais. No estatuto é possível verificar cláusulas que estabelecem a idade mínima para participação, a forma de adesão, informa que deixará de ser associado aquele que falecer e, também, as providências a serem tomadas em caso de falecimento.
Em uma das cláusulas, por exemplo, se estabelece que o herdeiro que preencher todos os requisitos para ser admitido como associado, terá preferência para residir. Surge, então, o questionamento de como se resolverá a questão se o herdeiro não preencher o requisito da idade, por exemplo.
O Estatuto em comento conseguiu resolver a questão elaborando cláusula que impõe a obrigação de restituir aos herdeiros o valor que foi integralizado pelo falecido; mas o problema maior sobre o assunto é se as disposições em questão ou outras similares possuem validade. O contrato não estaria violando a expectativa do direito do herdeiro de ocupar o bem?
Temos como direito de propriedade aquele que atribui poderes ao proprietário da coisa, podendo usar, gozar, dispor e reaver, sendo restrita à sua função social conjugando
os interesses do proprietário e o do Estado (DINIZ, 1995, p. 87). Ademais, a própria Constituição Federal (CF) (BRASIL, 1988) no seu artigo 5º, XXII, estabelece que o direito de propriedade é direito fundamental, passando o CC a estabelecer os seus elementos constitutivos no artigo 1.228. A propriedade pode ser exercida sobre bens móveis ou bens imóveis, considerando imóvel o direito à sucessão aberta, conforme artigo 80, II do CC.
O artigo 426 do CC dispõe que “não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva”.
O que é preciso primeiramente ser entendido é o modelo adotado pelo cohousing. Verifica-se que no Brasil, em razão da fragilidade da legislação, os grupos direcionadores da ideia possuem a tendência de adotar o modelo de moradia compartilhada através da criação de associação, justamente visando evitar problemas com relação ao direito de propriedade dos moradores.
A associação é uma organização de pessoas com o objetivo em comum e, caso o grupo opte por adotar esse tipo, a propriedade das cotas das unidades autônomas e espaços em comum é toda da associação.
Os moradores, para participarem desse tipo de cohousing, devem ter o mesmo objetivo da associação e efetuar o pagamento referente a sua cota, que corresponde à fração ideal do imóvel que irá residir, bem como outros pagamentos para permanecer associado, como mensalidade, despesas extraordinárias etc. Esse valor não se refere à compra do bem, mas sim o valor da cota para ser associado e ocupá-lo.
Caso o morador não queira mais ser associado, o valor integralizado referente à sua cota será ressarcido. Assim como, em caso de morte do morador e caso o herdeiro não queira se associar ou não possua os requisitos para associar-se, o valor integralizado anteriormente será disponibilizado ao herdeiro ou ao espólio, passando a integrar no monte mor do inventário.
Nota-se que, no caso de cohousing por associação, os herdeiros do morador falecido não possuem o direito de propriedade da cota, mas dispõe de um direito de uso, caso se enquadre nos requisitos para ser um morador.
O direito de uso está disposto no artigo 1.412 e 1.413 do CC, aplicando-se as regras do usufruto, no que não for contrário à sua natureza. De acordo com Xxxxxx Xxxxxx (2013, p. 504), o usuário possui o simples direito de usar a coisa alheia, entendido como ius utendi, enquanto o usufrutuário, aquele que usa e pode perceber os frutos da coisa, possui o utendi et fruendi. O usufruto não é objeto do presente estudo, somente deve ser aplicada as regras ao uso naquilo que a legislação não dispõe sobre esse último instituto.
Na visão desta autora, não é aplicável o usufruto ao modelo de cohousing, uma vez que o usufrutuário poderia dispor do bem como se dono fosse (art. 1.394, CC). Poderia, então, locar o imóvel e perceber do valor da locação, não sendo compatível essa conduta com os princípios do cohousing sênior, por exemplo, pois tiraria a autonomia da associação de controle dos moradores e possivelmente perderia o objeto do cohousing.
Ressalta-se que, caso o grupo opte pelo modelo de associação com reserva de uso para os seus moradores, a averbação deverá ser feita no Cartório de Registro de Imóveis, conforme o artigo 1.391 do CC (aplicável ao direito real de uso) para que tenha validade.
Um adendo interessante é que o direito de uso, assim como o de usufruto, é cancelado no cartório de registro de imóveis nas hipóteses dos incisos do artigo 1.410, sendo a morte do usuário uma das possibilidades.
Então o problema surge quanto à forma de transmissão do uso. Pois, conforme artigo 1.410 do CC, o tempo máximo de que o usuário pode dispor desse direito é o da sua vida, se for pessoal natural.
Tendo como lei que o uso se extingue com a morte, entende-se, pois, que não há transmissibilidade por sucessão. Ou seja, o usuário, aqui retratado como morador de um cohousing, em caso de falecimento, não irá passar aos seus herdeiros o direito de uso que possui sobre a coisa, no caso, a fração do imóvel da associação.
Ademais, no tocante à organização de associações, o Código Civil também esclarece que “se o associado for titular de cota ou fração ideal do patrimônio da associação, a transferência daquela não importará, de per si, na atribuição da qualidade de associado ao adquirente ou ao herdeiro, salvo disposição diversa do estatuto” (art. 56, parágrafo único, CC). Portanto, a associação poderá definir quem poderá associar-se, havendo recusa justificável de ingresso caso o herdeiro não possua a qualidade estabelecida em estatuto, como por exemplo o quesito da idade, limitações físicas e impossibilidade de participar da vida em sociedade no cohousing, objetivos conflitantes etc.
Sendo assim, o Código Civil admite que possam haver cotas ou frações do patrimônio da associação (que diz respeito ao seu patrimônio total) e, quanto a titularidade dessa cota, há a possibilidade de ser transferida por ato inter vivos, bem como por sucessão hereditária, o que não significa que há a transferência simultânea ao herdeiro para que se transforme em associado, conforme explicado.
Podendo a associação de cohousing definir quem irá se associar, poderá então haver um herdeiro ou espólio titular da cota patrimonial, mas que não poderá se associar, em razão de não cumprir os critérios estabelecidos no estatuto. Não há que se falar em frustração da expectativa de direito de uso do herdeiro, vez que trata-se de regime diferenciado (o da associação e o relativo ao direito de uso), não se negando a participação por mero critério discriminatório, mas sim por um critério que é legalmente permitido e que corrobora para que o objetivo do cohousing. Como tratado em tópicos anteriores, o cohousing é uma comunidade colaborativa e intencional, formado por pessoas com o mesmo objetivo e perfil sociocrata, uma vez que não só participam do grupo, mas também ajudam a gerir.
Em síntese, é possível e legal a criação de cláusulas pela associação do cohousing que estabeleçam que para ingresso do morador é necessária a integralização de determinada cota para usufruir do bem e permanecer associado. Com a morte desse morador, a titularidade dessa cota poderá ser transferida ao herdeiro, satisfazendo este com o reembolso do valor anteriormente pago pelo de cujus. Em contrapartida, não poderá o herdeiro reclamar um suposto direito de uso do bem da associação, pois o direito
real de uso do morador falecido se extinguiu com a sua morte, não sendo transmissível aos herdeiros. A associação, por mera liberalidade, poderá constar em seu contrato (estatuto) disposições que possam fazer incluir nesta comunidade herdeiros que possuem interesse em adentrar. Porém, no caso de o herdeiro não possuir os requisitos necessários para este cohousing em específico, terá que se dar por satisfeito ao receber a recusa da participação e todo o valor ressarcido.
Uma outra forma possível de criação de cohousing é através das cooperativas (MORENO, 2020, p. 3). Ao contrário das associações, as cooperativas possuem capital social, o que facilita, então, os financiamentos em instituições financeiras, por exemplo.
As cooperativas são regidas pela Lei 5.764/1971 (BRASIL, 1971) e necessitam de, no mínimo, 20 participantes para serem constituídas (art. 6º, I da Lei) através de estatuto. O capital social é dividido em quotas-partes e o ingresso nas cooperativas é livre, podendo a cooperativa estabelecer condições de ingresso em seu estatuto, devendo o cooperador integralizar valor para participação.
No caso das cooperativas, a Lei específica estabelece que a exclusão do cooperado por ocorrer pela sua morte (art. 13, “b”). Portanto, caso o cohousing adote esse modelo, a Lei estabelece que os herdeiros do falecido receberão a restituição do valor integralizado mediante a apresentação de formal de partilha ou alvará judicial, que será devidamente corrigido monetariamente.
Também há a possibilidade da criação do cohousing utilizando o modelo do condomínio. Em pesquisas realizadas pela autora, até o momento não se encontrou grupos de cohousing no Brasil interessados em adotar essa forma, uma vez que a legislação existente poderia dificultar demasiadamente justamente a questão da sucessão (informação verbal2).
Na legislação brasileira vigente, o CC dedica um capítulo inteiro para tratar sobre o condomínio, também existindo a Lei 4.591/64 que dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias.
Xxxxxxxxx (2018, p. 156 e 157) define o condomínio como quando pertence a mais de um titular os direitos elementares do proprietário, não havendo conflito com o princípio da exclusividade, pois cada condômino possui a propriedade da sua parte ideal. O condômino pode usar da coisa, reivindicá-la, defender a sua posse e alhear a respectiva parte indivisa, devendo contribuir financeiramente na proporção da sua parte (art. 1.315, CC).
No tocante à sucessão, a legislação já estabelece que “aplicam-se à divisão do condomínio, no que couber, as regras de partilha de herança” (art. 1.321, CC). Ou seja, por ser o morador titular de um direito de propriedade, com o seu falecimento, ocorrerá a
2 A pesquisa foi realizada consultando o Xxxxx Xxxxxxxxxx, engenheiro civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP), com especialização em administração pelo Curso de Especialização em Administração para Graduados pela Fundação Xxxxxxx Xxxxxx (CEAG – FGV), criador do 1º Curso Internacional de Cohousing (2021) (xxx.xxxxxxxxxxxxxx.xxx.xx) e do 1º Fórum de Moradia para a Longevidade (FreeAging com Estadão e Secovi - 2017), o qual possui amplo domínio sobre o assunto, consultado em São Paulo, em fevereiro de 2022.
sucessão da forma como dispõe Código Civil, seguindo a ordem de sucessão legítima, que fará a partilha entre os herdeiros, se tornando proprietários sobre aquele imóvel.
Diferentemente da forma como foi abordada anteriormente sobre a associação, que não dá o direito de propriedade ao associado, mas sim o direito de uso se o herdeiro estiver em condições de associar-se.
Com essa análise, verifica-se ser difícil conciliar a legislação condominial com uma forma de instituição do cohousing. É claro que o cohousing, propriamente dito, não deixa de se assemelhar e até ser um condomínio, pois a ideia de condomínio é justamente o direito exercido por mais de uma pessoa sobre o mesmo objeto. Mas com relação a sua forma, aqui no Brasil é delicado conseguir adaptar a questão da cláusula sucessória do cohousing no modelo de condomínio, uma vez que o cohousing perderia o controle sobre quem integraria esse grupo.
Como exposto em capítulos anteriores, o intuito do cohousing é a vivência em comunidade por um grupo de pessoas que possuem um objetivo em comum. Assim, antes mesmo de se criar o cohousing, há uma espécie de troca entre os futuros moradores, a fim de entender se possuem o mesmo objetivo e se serão capacitados a morarem nesse futuro grupo. No cohousing sênior, razões físicas e mentais importam, por exemplo, bem como o fator idade e a capacidade econômica dos indivíduos.
E, no caso de condomínio, a propriedade que seria do morador, após o seu falecimento será passada integralmente para os herdeiros, independente de preencherem os requisitos citados anteriormente ou os estipulados em convenção.
A convenção de condomínio é o ato pelo qual se institui o condomínio e onde contém todas as regras gerais, o modo de usar as coisas e os espaços em comum, a discriminação das partes de propriedade exclusiva, etc. Junto com a convenção, é possível, através de contrato ou deliberação em assembleia, aprovar o Regimento Interno, documento que regulamenta as questões do dia-a-dia e disciplina dos moradores.
Entretanto, não é possível a criação de cláusula limitadora ao direito de propriedade do herdeiro, vez que seria inconstitucional por violar o direito de herança, contido no artigo 5º, XXX da CF.
Desta forma, entende-se, a princípio, que o cohousing criado através do condomínio não é a estrutura ideal para esse tipo de moradia no Brasil, não sendo possível, pelo menos até o momento, limitar o direito de propriedade do herdeiro e o seu ingresso para prosseguir com os objetivos iniciais do cohousing, caso fosse adotada essa forma.
3.2 Formas de adequação da cláusula sucessória
Sabe-se que o contrato constitui negócio jurídico bilateral e plurilateral, possuindo, assim, os mesmos requisitos de validade dos negócios jurídicos em geral, conforme explica Xxxxxx Xxxxxxx (2020, p. 16).
Por essa razão é que, para que a celebração do instrumento do cohousing tenha validade, necessário que possua alguns elementos essenciais, tais como: agente capaz,
vontade livre, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita e não defesa em lei.
Sendo assim, a elaboração das cláusulas que irão dispor sobre como ocorrerá a possível transmissão aos herdeiros deve obedecer aos termos mencionados, com o risco de serem declaradas como inválidas ou até mesmo nulas.
É nesse sentido, por exemplo, que não vemos como possível no Brasil o cohousing ser instituído por condomínio, assim como mencionado anteriormente, visto que há uma proibição legal de disposições que limitem o direito de herança.
Desta forma, conforme demonstrado com o estudo da legislação brasileira e tentativa de início do cohousing nesse país, é possível a inserção de cláusula sucessória no tocante ao direito do herdeiro sobre a cota do patrimônio da associação, se essa for a modalidade escolhida.
Com isso, o ideal é que a cláusula ou as cláusulas estejam dispostas no contrato.
Se for associação, por exemplo, o instrumento que rege é o estatuto.
Se formos analisar no tocante à disposição no contrato, primeiramente é necessário que o cohousing saiba que deve informar que em caso de falecimento o morador deixará de ser associado e que, então, inicia-se o procedimento para possível admissão no cohousing e/ou reembolso do valor integralizado anteriormente pelo falecido.
É interessante que no instrumento também seja explicado que não se trata sobre aquisição da propriedade, mas sim sobre o direito de uso do bem.
No capítulo que irá dispor sobre a cláusula sucessória, é necessário informar como será realizada a transmissão: os requisitos que o cohousing estabelece para ingresso do herdeiro potencial morador; como será resolvida a relação em caso de mais de um herdeiro; como será o processo de admissão; das regras gerais; o tempo em que o herdeiro terá direito de usar a cota, caso ingresse etc.
Como a Lei exige o registro do direito de uso (artigo 1.391 do CC), necessário que conste no estatuto (ou contrato) que o direito somente irá se perfazer após o registro, bem como seu cancelamento deverá também ser averbado.
De modo geral, as cláusulas contratuais sobre a sucessão somente não poderão ir contra às legislações vigentes, respeitando o direito de propriedade do cohousing e estabelecendo, também, como será realizado o ingresso do morador ou o reembolso do valor integralizado.
4 CONCLUSÃO
A proposta do artigo era demonstrar uma visão geral sobre o surgimento do cohousing, qual o seu objetivo, como se desenvolveu pelo mundo e como está sendo implementado no Brasil, com enfoque para o cohousing sênior, que visa uma melhora na qualidade de vida da população mais madura.
Verificou-se que o seu surgimento está intimamente ligado ao apoio mútuo e intencional através da vida em sociedade, surgindo a princípio na Dinamarca, mas se expandindo para outros países da Europa, bem como na América do Norte e, também, na América do Sul, tendo o cohousing sênior surgido somente na década de 90.
No Brasil, essa forma de moradia ainda está em fase inicial. Os modelos existentes ainda estão se adaptando para a implementação, porém existem grupos interessados com projetos sérios e outros que se assemelham a essa ideia, como hotéis com serviços especializados para idosos e projetos sociais de inclusão da população madura, por exemplo.
O enfoque do trabalho é a compreensão de como pode ficar a questão da sucessão para os herdeiros no modelo de cohousing sênior, buscando alternativas que sejam consideradas válidas no sistema de legislação brasileira, que ainda não possui disposições específicas para essa forma de moradia.
O artigo tratou de três formas de constituição do cohousing: a associação, a cooperativa e o condomínio (que não é aplicável ao modelo no Brasil, por enquanto). Entretanto, é provável que na posterioridade surjam outras formas menos burocráticas para a convivência em grupo com o intuito de ser cohousing. Nada impede que a população em geral desenvolva modelos específicos e que contribuam para a ideia inicial do projeto, que é a vida em comunidade sênior de forma integrativa, desde que não conflitem com as legislações atuais.
Com a análise das leis aplicáveis e atualmente vigentes no Brasil, qual seja, Constituição Federal, Código Civil e outras fontes específicas ou esparsas, verificou-se que a melhor forma, neste momento, de se adequar a cláusula sucessória no modelo de cohousing sênior, é a comunidade se inserindo na forma de associação.
Isto porque, ao constituir o cohousing através desse viés, a propriedade será exclusivamente da associação, tendo o morador o direito de uso da sua cota parte adquirida através da integralização monetária feita.
Assim, em caso de falecimento do morador, o valor que foi recebido pelo cohousing será ressarcido aos herdeiros e, caso seja de interesse do herdeiro de usar da unidade que o de cujus vivia, o cohousing analisará se ele preenche os requisitos necessários estabelecidos em estatuto, sendo válida a recusa em caso de não preenchimento, uma vez que o direito de uso não é transmissível, estando diante, portanto, de uma mera liberalidade do cohousing.
Para que tenham validade as cláusulas que disponham sobre essa questão da sucessão aos herdeiros, é sempre requisito que estejam estipuladas em conformidade com a legislação vigente e não haja conflito entre os diplomas legais. É por essa razão, portanto, que não se sugere que o cohousing se utilize de um modelo condominial, dadas as explicações realizadas no decorrer do trabalho.
Por fim, sugere-se que o sistema de normas brasileiro ao longo do tempo se adapte e estabeleça normas concretas para esse novo estilo de moradia, que vem se popularizando em diversos países e, consequentemente, também no Brasil,
principalmente para que seja possível se utilizar das leis condominiais juntamente com o
cohousing, sem ferir as disposições no tocante à sucessão.
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